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A PRECÁRIA LEGISLAÇÃO DO TELETRABALHO

Anderson Matos da Silva Santana

1. INTRODUÇÃO

Diante da nova dinâmica das relações sociais em que tudo muda rapidamente,
não há dúvidas de que o teletrabalho simboliza, na contemporaneidade, uma das mais
consideráveis tendências de estruturação produtiva. O avanço da tecnologia da dados e
comunicação, associado às vantagens de produtividade e locomoção urbana, alongaram
de maneira relevante o interesse pela configuração do teletrabalho.

Em 2017, a Lei nº 13.467 reconfigurou a Consolidação das Leis do Trabalho


(CLT), que dentre outras coisas, introduziu ao texto celetário o Capítulo do
Teletrabalho. Este texto tem como objetivo abordar a discussão referente às
responsabilidades legais que o empregador possui perante à saúde e segurança do
teletrabalhador, considerando a supressão legislativa e a mitigação na esfera das
obrigações patronais diante dessa categoria de trabalhadores.

Até a Reforma Trabalhista, não se falava em dispositivo jurídico que


normatizasse efetivamente o conteúdo relacionado ao teletrabalho. Na verdade, o artigo
6º da CLT, elucidava tímidas definições do trabalho em domicílio, razão pela qual, é
possível entender rapidamente que estas não se mostraram minimamente capazes de
englobar o teletrabalho na sua amplitude.

A partir daí, a única alteração que focou realmente nas relações trabalhistas
inerentes ao teletrabalho, foi a modificação trazida pela Lei n° 12.551 de dezembro de
2011, que mudou o art. 6º da CLT, adicionando ao teletrabalho a perspectiva de ter a
natureza jurídica de exercício laboral subordinado, ou seja, outorgava ao teletrabalhador
não apenas a realização de uma atividade autônoma, mas, também, de uma atividade
percebida com vínculo empregatício.

Todavia foi a Lei 13.467/2017 que acarretou significativas mudanças à lei


trabalhista. Dentro dessa nova restruturação relativo ao trabalho, a Reforma Trabalhista
fomentou interferências direta ao teletrabalho, uma vez que essa “nova” forma de
trabalho adquire regulamentação no Capítulo II-A, do novo estatuto do trabalho.

Perante essas considerações feitas acerca do teletrabalho, convém agora


prosseguir em uma reflexão que envolve as incidências da vigente normatização do
Teletrabalho no âmbito da proteção e saúde do colaborador e suas consequências no
novel modelo e cotidiano laboral, e, à vista disso, na rotina social dos trabalhadores
brasileiros.

A Reforma de 2017 ao tratar sobre à prevenção de doenças e acidentes de


trabalho na conjuntura do teletrabalho limitou-se apenas a conferir ao setor patronal a
obrigação de mero dever de instrução. O novo artigo 75-E da CLT não só é omissa
sobre a responsabilidade do empregador de supervisionar e fazer cumprir as normas
referentes a segurança e saúde no trabalho como também não disciplina a obrigação
patronal de fornecer Equipamentos de Proteção Individual – EPI.

É nesse cenário de negligência legislativa e de ausência de jurisprudência


consolidada em razão da recente normatização, que se torna inevitável um exame
específico referente à extensão da vinculação legal do empregador à obrigação de
prevenir doenças e acidentes de trabalho no ambiente de teletrabalho, especialmente por
interferir exatamente no direito fundamental do trabalhador à redução dos riscos
inerentes ao trabalho.

Dessa forma, será feita uma pequena análise reflexiva do amparo jurídico
ofertado aos teletrabalhadores pelo ordenamento jurídico brasileiro, objetivando a
proteção efetiva dessa classe de colaboradores como fração, de fato, hipossuficiente da
relação entre trabalhador e empregador, e, perante a inexistência de uma normatização
legal que regularize amplamente as peculiaridades do teletrabalho é fundamental
analisar a probabilidade de aplicação subsidiária do Direito Comparado, nos termos do
art. da CLT.

Além disso, frente a problemática de efetuar a gerência sobre a jornada


trabalhista e as dificuldades pertinente à fiscalização das circunstância laborais, para
eventual responsabilização do empregador em casos de doença ou acidente de trabalho,
é imprescindível discernir quais são as obrigações jurídicas do patrão no que se refere à
saúde e segurança do colaborador e, investigar se os esses deveres, se encaixam nos
moldes da dinâmica e da natureza do Teletrabalho.
2. CONCEITO E NATUREZA DO TELETRABALHO

Em 1996, na convenção 177, a Organização Internacional do Trabalho (OIT)


denominou o teletrabalho como “forma de trabalho efetuada em lugar distante do
escritório central e/ou do centro de produção, que permita a separação física e implique
o uso de uma nova tecnologia facilitadora da comunicação”. O escritor Manuel Estrada
por sua vez, considera que o teletrabalho compreende na atividade laboral realizada com
ou sem subordinação por intermédio de mecanismos antigos ou novos de
telecomunicação devido a existência de uma relação de trabalho que permite a execução
à distância em que não existe a necessidade da presença física do trabalhador em uma
localidade específica. (ESTRADA, 2017)

Em consonância com as definições acima, o novo artigo 75-B da Consolidação


das Leis Trabalhistas, conferida pela pela Lei nº 13.467, estabelece que o teletrabalho é
“a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador,
com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza,
não se constituam como trabalho externo”.

Ultrapassada a conceituação é importante delimitar também a natureza jurídica


do teletrabalho. Apesar de existir discordância na doutrina, é possível assentir com a
ideia de Vera Regina Loureiro Winter “a qualificação jurídica desses trabalhadores
depende de seu conteúdo obrigacional, ou seja, de como se vai realizar a prestação de
serviços, podendo ser tanto de natureza comercial quanto civil ou trabalhista”.

O entusiasta do Direito Trabalhista, Manuel Estrada concorda com o


posicionamento de Winter e expõe que apenas o exame das circunstancias concretas do
exercício da prestação laboral conseguem determinar a natureza jurídica do teletrabalho,
isto por que essa atividade pode conter elementos cíveis, comerciais ou trabalhista e
nesse caso é fundamental analisar se então presentes as exigências fundamentais que
caracteriza a relação de emprego que são trabalho prestado por pessoa física, de maneira
não eventual, onerosa, subordinada e pessoal. (ESTRADA, 2017)

É importante salientar que era latente a necessidade de normatização do instituto


do teletrabalho, visto que os trabalhadores desta categoria não possuíam nenhum
amparo social. Mesmo como essa evidente situação alguns pensadores do Direito
Trabalhista não concordavam com essa urgente regulamentação.

O mencionado escritor Manuel Estrada, por exemplo, escreveu um artigo em


2014 que evidenciava claramente seu posicionamento acerca da desnecessidade de uma
criação de dispositivo normativo que tratasse especificamente do teletrabalho, de acordo
com ele o Direito Trabalhista Brasileiro é plenamente capaz de elidir controvérsias
alusivas ao trabalho à distância, ou seja, era dispensável a edição de um novo
regulamento. Já Vera Winter tem um posicionamento contrário do escritor Estrada, ela
afirma que era urgente a regulamentação própria do teletrabalho, em virtude das
oscilações existentes entre este e o trabalho a domicílio e salientava ainda o dever de
amparar o trabalho tecnológico e, consequentemente, a logística do teletrabalho e o seu
âmbito laboral.

O estabelecimento da Lei 13.467, apelidada de Reforma Trabalhista preocupou-


se em efetivar uma legislação acolhedora da matéria concernente ao Teletrabalho. A
integração do Capítulo do Teletrabalho à CLT é objeto de estudos e críticas,
principalmente das normas referentes à exclusão do teletrabalho do capítulo II. Capítulo
este que trata da duração do trabalho; a validade do negociado sobre o legislado no
âmbito de teletrabalho; e a disposição sobre a forma de prestação do serviço.

Esse posicionamento do legislador em excluir o Teletrabalhador das proteções


positivadas no Capítulo II da Consolidação das Leis Trabalhistas suscitou o
posicionamento do magistrado Geraldo Magela Melo, no qual entende que nesta
mencionada reforma o legislador descumpriu o objetivo jurídico de proteção ao
colaborador da categoria de teletrabalho, visto que as questões fundamentais na relação
empregado e patrão são todas direcionada para a convenção entre as partes. Esta
circunstância obriga os empregados à subsunção à ordens empresariais, ante o medo de
desemprego imediato. (MELO, 2017).
Após essas considerações sobre o teletrabalho, segue agora as reflexões sobre o
posição do empregador nas relações de trabalho, principalmente sua colocação no que
se refere ao relacionamento colaborador, empregador e as obrigações deste perante
aquele.

3. O PAPEL DO EMPREGADOR PERANTE ACIDENTE DE TRABALHO


O artigo 19 da lei 8.213/91 traz a ideia do que seria um acidente de trabalho,
veja in verbis:

“Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a


serviço de empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do
trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei,
provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a
perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”
(BRASIL, 1991).

De acordo com Dallagrave, há dois tipos de responsabilidade em um contrato


trabalhista, o primeiro provém da inadimplência culposa de obrigação, em outras
palavras, acontece quando o patrão não cumpre com a obrigatoriedade de fazer,
revelando-se, por conseguinte, em responsabilidade civil objetiva. Já o seguinte tipo,
está vinculada ao dano, cujo nexo de causalidade é a realização regular da atividade
profissional, isto é, quando o contratante não coopera para a concretização do dano,
todavia mesmo assim, assume a responsabilidade objetiva em ração de sua assunção oo
perigo da atividade empresarial. (DALLEGRAVE, 2017)

Compreende-se das concepção do advogado José Afonso Dallegrave Neto e do


art. 2º da CLT que na realização de um contrato trabalhista consolida-se a seguinte
afirmação: o empregador não só é responsável integralmente pelos riscos inerentes ao
exercício da atividade laboral, como também o é por qualquer perigo proveniente da
organização mesmo que não houver relação direta com o exercício da atividade
trabalhista.

Ainda nesse sentido Dallegrave aduz que ao trabalhador é assegurado o direito


de permanecer-se incólume, motivo pelo qual, perante a conjuntura de qualquer dano
seja ele existencial, material ou estético, a responsabilização incidirá sempre na pessoa
do contratante, já que esse último assumiu do risco da atividade. (DALLEGRAVE,
2017).

Portanto, é cabível percebe que o contratante pode ser responsabilizado


subjetivamente ou objetivamente pelo dano decorrente de eventual acidente de trabalho.
Será a aplicação efetiva da responsabilidade objetiva pela ocorrência de infortúnio no
âmbito do labor de atividades reputadas como propícias a oferecer reais riscos aos
trabalhadores, ao passo que, será aplicada a responsabilidade subjetiva se o desempenho
do serviço usual ocorrer sem a exposição à riscos.
Tendo em vista que o objetivo deste texto é relação trabalhista no regime de
Teletrabalho e consequentemente o papel do empregador em assegurar a saúde do
teletrabalhador, se faz necessário direcionar a incidência de responsabilidade do
empregador, por acidente de trabalho nesse sentido.

A essência jurídica do Teletrabalho consiste no exercício de atividades através


do uso de recursos telemáticos e apesar do empregado desenvolver suas atividades fora
das dependências da empresa e fora do seu ambiente residencial, a prestação desses
serviços, por sua natureza, não é suscetível a exposição regular do empregado ao perigo.

Nessa contextualização vale ressaltar que para o exercício do Teletrabalho é


necessário o aplicações em produtos tecnológicos e conexões informáticas, sem contar
com as despesas relacionadas a instalações e manutenções, investimentos estes que
devem ser assumidos pelo patrão em consonância com a disposição do art. 75-D da
CLT. (SOUZA JÚNIOR, et al., 2017).

Voltando para a questão referente à saúde do empregado, Antônio Umberto


Júnior (et. al.) afirma que os telecolaboradores: “[...] são mais propensos a atuar em
ambientes com pouca luminosidade, temperatura imprópria, postura inadequada e em
execução de movimentos repetitivos e tarefas monótonas”. Sem contar que os
teletrabalhadores estão mais suscetíveis à aquisição de distúrbios psicossociais, já que o
modelo de teletrabalho estimula a privação do empregado ao convívio social com os
demais companheiros de trabalho.

Para agravar ainda mais a situação do teletrabalhador, o direito à desconexão do


trabalho requer maior afinco por parte do colaborador que exerce sua função de casa,
dado que o cenário preponderantemente tecnológico viabiliza a possibilidade efetiva do
trabalho em tempo integral, e pode submeter essa categoria de trabalhadores a um maior
grau de fadiga visual e mental, o que pode acarretar ansiedade, depressão e LER/DORT
(SOUZA JÚNIOR, et al., 2017). Nesse contexto é fundamental lembrar que o artigo 3º
da OIT nº 155 concretiza a ideia de que direito à saúde no ambiente de trabalho envolve
não só a prevenção de acidentes ou doenças ocupacionais, mas também, o bem-estar
físico e mental do trabalhador.

Buscando garantir a integridade física e mental dos teletrabalhadores, a lei


13.467 de 2017 consignou a norma legal referentes à prevenção de doenças e acidente
de trabalho:
“Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira
expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e
acidentes de trabalho. Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de
responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo
empregador.”

O supracitado dispositivo do texto celetário atesta a ausência de vinculação legal


do contratante ao dever de prevenir doenças e acidentes de trabalho, sintetizando apenas
na obrigação patronal ao mero dever de instrução, isto é, o art. 75-E da CLT não só se
cala sobre a responsabilidade do empregador de supervisionar e fazer cumprir as normas
referentes a segurança e saúde no trabalho, como também não prevê a obrigação
patronal de fornecer Equipamentos de Proteção Individual – EPI.

Apesar do mencionado dispositivo da CLT ser omisso, vários pensadores do


Direito Trabalhista entendem que ainda prevalece a atribuição do ônus da avaliação
técnica dos perigos no âmbito do teletrabalho à imagem do empregador, não devendo
ser interpretado o artigo 75-E, como uma excludente da obrigação do empregador de
detectar prováveis perigos ao ambiente do teletrabalho apenas pela existência de uma
instrução. Ao identificar um ambiente inadequado o contratante deve torná-lo
apropriado, controlá-lo e assim, prevenir as doenças ocupacionais e acidentes de
trabalho. (SOUZA JÚNIOR, et al., 2017).

Em concordância com o disposto acima o profissional em Medicina do


Trabalho, Rodrigo Tadeu (2017), argumenta que a execução, pelo contratante, da
Norma Regulamentadora nº14, item 1.7, é essencial para garantir o direito fundamental
do colaborador à mitigação dos perigos inerentes ao exercício laboral, em conformidade
com o art. 7º, XXII, da Constituição Federal, motivo pelo qual o descumprimento das
diretrizes da referida norma no âmbito do Teletrabalho configura negligência do
empregador.

Se bem que, na ausência de outra disciplina legal que regulamente todas as


peculiaridades do teletrabalho, se faz imperioso considerar a probabilidade de aplicação
subsidiária do Direito Comparado, segundo previsão do art. 8º da CLT. Cumpre
destacar, portanto, a disposição do art. 169 do Código de Trabalho de Portugal, ipsis
verbis:

Artigo 169.º Igualdade de tratamento de trabalhador em regime de


teletrabalho. 1 - O trabalhador em regime de teletrabalho tem os mesmos
direitos e deveres dos demais trabalhadores, nomeadamente no que se refere
a formação e promoção ou carreira profissionais, limites do período normal
de trabalho e outras condições de trabalho, segurança e saúde no trabalho e
reparação de danos emergentes de acidente de trabalho ou doença
profissional. (grifo meu)

Por fim, é preciso entender que a responsabilidade do contratante perante às


modalidade de teletrabalho não pode vincular-se absolutamente à literalidade do art. 75-
E da Consolidação das Leis Trabalhistas, é preciso estar também em concordância com
as bases principiológicas de proteção ao trabalhador. Resta, portanto, examinar
cautelosamente as obrigações jurídicas do patrão relacionadas à segurança e a
integridade física e mental do telecolaborador.

4. DE QUEM É A RESPONSABILIDADE PELA SEGURANÇA E


INTREGRIDADE FÍSICA DO TELETRABALHADOR?

Novas maneiras de trabalhar induzem formas novas de adoecer, todavia aquelas


surgem despreocupadas com os novos riscos que podem prejudicar saúde do trabalhador
(MOTA, 2011). O teletrabalho se encaixa perfeitamente na alegação de Daniel Mota
visto que o legislador brasileiro não se atentou para uma estruturação adequada do
teletrabalho, pois negligenciou medidas preventivas importantes para as proteção à
saúde desse trabalhador. Pelo contrário, absurdamente, reduziu as obrigações patronais
no texto do art. 75-E da CLT.

Francisco Lima Filho (2019), por sua vez, afirma que é necessário existir um
cuidado social para proporcionar um meio trabalhista saudável, seguro, especialmente
com o aparecimento de diversas maneiras formas de trabalho e que reclamam a
utilização de tecnologias cada vez mais sofisticadas. A preservação de um ambiente
apropriado deriva da coexistência das responsabilidades empresariais com o direito
fundamental do colaborador à intimidade e à privacidade.

Apesar da normatização do teletrabalho ser insatisfatória, o colaborador dessa


categoria não pode permanecer à mercê de uma indevida e inapropriada proteção à sua
saúde, higiene e segurança, de maneira que fica a Constituição e todo ordenamento
legislativo responsáveis por assegurar uma satisfatória proteção à saúde do
teletrabalhador. (MIZIARA, 2018). Dessa forma, ao interpretar os novos dispositivos
legais celetistas, é preciso que operador do Direito intérprete a norma considerando toda
a sistemática normativa pré-existente. Somente assim, o aplicador do Direito conseguirá
convergir a direção de um dispositivo infraconstitucional com a vontade do constituinte
originário emanada na Carta Magna.

Diante dessa circunstância é essencial que o empregador assegure os direitos


inalienáveis e irrenunciáveis de seus colaboradores, quais sejam a segurança, a saúde e a
vida. Nessa perspectiva, Francisco Lima Filho (2019) expressa que “ao empregador é
vedado praticar atos que tenham por objetivo eliminar ou reduzir esses direitos,
inclusive em obséquio ao princípio vedatório do retrocesso social”.

De acordo com Rodrigues Domingues (2018) o contratante deve “vistoriar e


adequar o ambiente de trabalho do empregado submetido no teletrabalho, sob pena de
ter sua culpa presumida no evento danoso”. Já Talita Nunes (2018), por sua vez,
defende a realização de vistoria para conferir se o teletrabalhador se encontra saudável
fisicamente e mentalmente, ressalta ainda que o dever patronal de fiscalização e
promoção de redução de riscos pode ser desincumbido através de exames periódicos e
visitas do trabalhador à sede empregatícia.

Ao buscar exercer suas obrigações de fiscalização, instrução e manutenção do


ambiente de teletrabalho, o empregador deve primeiramente conhecer, de fato, a
situação que este trabalhador se encontra (NUNES, 2019).

Adequar a supracitada previsão legislativa ao labor realizado à distância é o


grande desafio que o operador do direito encontrará, eis que de um lado se tem uma
legislação insuficiente com relação ao teletrabalho somado as peculiaridades desse
regime de labor, e de outro se tem o fato de que os dispositivos referentes à segurança e
medicina do trabalho são dirigidos a todas as modalidades de relações de trabalho, por
não haver exclusão expressa da modalidade do teletrabalho.

O fato de o trabalho ser exercido em domicílio intensifica a dificuldade de


discriminar o acidente de trabalho ou doença laboral de um acidente doméstico, visto
que nesses casos a linha é tênue, pela confusão existente entre ambiente do lar e
ambiente de trabalho. Nesses casos é fundamental que o conjunto probatório do
acidente de trabalho seja bastante consistente. Desse modo, Denise Fincato (2008 apud
NUNES 2018) expressa que, é extremamente essencial que a perícia médica examine
detalhadamente as conjunturas inerentes ao ambiente do teletrabalho, desconsiderando
do modus operandi de uma perícia padrão, cujo ambiente avaliado é o próprio
estabelecimento patronal.

Outro fato que prejudica a identificação de problemas de saúde decorrente


teletrabalho é o fato de o teletrabalhador não estar sujeito ao regime da duração da
jornada de trabalho, ou seja, o simples fato de não se poder delimitar a hora do acidente
e o exato local do acidente intrinca em conseguir classificar o infortúnio como acidente
de trabalho. Em sentido análogo ocorre para determinar a origem da doença ocupacional
sofrida pelo teletrabalhador, já que as doenças físicas e distúrbios mentais são capazes
de ser naturalmente confundidos como proveniente de circunstâncias corriqueiras extra
laborais.

Uma alternativa para efetivar a fiscalização do ambiente laboral, o contratante


pode agendar a data e horário para visitar a residência do telempregado. Todavia, nessas
circunstâncias o empregador deve precaver-se para não colidir com os direitos à
privacidade e intimidade do trabalhador em busca do exercício do direito de supervisão
da empresa. (LIMA FILHO, 2019).

Sem contar que a entidade contratante deve realizar averiguação prévia,


concedendo ao teletrabalhador equipamentos de proteção individual adequados, arcando
com os dispêndios necessários seja com a aquisição ou manutenção do maquinário, seja
com mobília compatível com a proteção da ergonomia. Referente ao perigo de
isolamento do colaborador, o patrão precisa estimular, habitualmente, atividades em
equipe dos teletrabalhadores através do uso da tecnologia ou até mesmo o estímulo de
encontros presenciais. (MASSI, 2017).

É importância ainda que o contratante determine jornadas limites de trabalho e o


uso de, no mínimo, um dia de descanso por semana, para que não ocorra a exaustão
mental e física. Para tanto, o empregador deve propor medidas de acompanhamento da
jornada trabalhista para os trabalhadores cujo suas funções são online e a instalação de
programas tecnológicos para detectar e limitar o labor empregado cuja função seja
offline. Nesses casos mecanismos de monitoramento como câmera de vídeo, telefonia,
e-mail coorporativo, aplicativos transmissores de dados e mensagens são formas
eficazes de controle (NUNES, 2018).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O teletrabalho é uma nova forma de contratar um colaborador. Esta produção


textual expôs o seu conceito e como se deu a sua concretização legislação brasileira. Em
seguida trouxe reflexões doutrinária acerca dessa modalidade laboral, visto que o
ordenamento é deficiente ao tratá-la em sua legislação específica.

O presente texto fomenta ao leitor ao entendimento de que a estruturação do


teletrabalho instalada pela Lei 13.5467 deveria ter sido mais específica em diversos
aspectos, principalmente no ponto concernente às responsabilidades jurídicas do patrão
perante a saúde e segurança do trabalhador que está exercendo sua função de casa,
objeto primordial desta produção.

Este texto ressalta que houve omissão legislativa na redação no art. 75-E da CLT
visto que confere apenas ao contratante de telecolaborador o encargo de instruir o seu
funcionário sobre saúde e segurança no ambiente de trabalho em flagrante contradição à
lógica do ordenamento jurídico brasileiro trabalhista que confere ao empregador
tradicional a obrigação de instrução, fiscalização e cumprimento de todas as normas
proveniente da saúde e medicina do trabalho.

A partir dessa negligência legislativa, o texto buscou analisar como se dá a


obrigação patronal perante o art. 75-E do CLT juntamente com todo ordenamento
jurídico brasileiro. Concluiu-se então que o mais importante nessa situação interpretar e
aplicar as normas do novo capítulo referente ao teletrabalho a luz da constituição e dos
princípios basilares do Direito Trabalhista e assim confira real efetividade ao objetivo
de mitigar os perigos intrínsecos no exercício da atividade laboral.

REFERÊNCIAS

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LIMA FILHO, Francisco das Chagas. O Dever de Proteção e Fiscalização no Contrato


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