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Entre risco da insignificância e risco do absurdo:

nesse intervalo encontra-se a zona da ação


eficaz, portadora de sentido e de valor. Éa zona
do risco oceito. Nem excesso de precauções
contra o imprevisível porque paralisaria toda
vontade de agir, nem mera submissão ao acaso,
.iá que demasiada tolerância diante da incerteza
levaria rapidamente à calástrofe. A partir daí,
cada um, na interação com o mundo, com os
outros, consigo mesmo, escolhe entre distintos
regimes de risco. INTERAçOES ARRISCADAS
Muitos, não se sentindo à vontade a não
ser num ambiente perfeitamente sob controle,
gostariam de programar a vida inteira, como
se fosse um relógio. Alguns, ao contrário,
amantes do imprevisto e confiantes no próprio
intuilo, preferem ajustar-se, no momento
mesmo, à especificidade de cada situação e
captar as oportunidades no vôo. Outros, ao
crerem reconhecer porlodos os cantos ao redor
Eric Landowski
maquinações e complôs, pensam não poder
alcançar seus fins senão manipulando aqueles
com os quais têm que tratar. outros ainda,
Traduzido do francês por
deixando de lado toda idéia de planificação, de
estralégia ou de sintonia com outrem, confiam Luiza Helena O. da Silva
na boa estrela, esperando coincidências felizes
que o destino terá decidido a seu favor.
Programaçã0, manipulaçã0, ajustamento
sensÍvel, assentimento face ao aleatório: cada
um desses tipos de conduta traduz um modo
especffico de ser no mundo. Cotejar os regimes
de sen¡ido que os sustentam respectivamente,
extrair os princípios e a sintaxe correspondentes
sob a forma de um modelo gerol do interoção,
isso deveria ensinar-nos bastante a respeilo
da nossa condição de seres semióticos
constantemente em busca de sentido, ajudar-nos a
aclarar a complexidade das práticas observáveis
nas esferas de atividade mais diversas Ida
conversaçåo à dança, por exemplo, ou da política
à guerra I e, quiçá, permitir-nos imaginar um
saber-viver semioticamente fundado.
@ Eric l¿ndowski 2014 @ F*ta$o dæ Lerru e Co¡es Edi¡o¡a 2014
INTERAçöES ARRISCADAS
Vedada, nos termos da lei, a reprodut'o total ou pucial deste livro.
Ncsa edi$o respeirou-sc o novo Aco¡do Onográfico da Língua Portuguea.

Tltulo original: Zcs intaactiorc risquées


(Limogs Pulim, 2005, Coll. Actæ Sémiodques @ Eric Landowski)
Tmduido do f¡ancês por Luia Helcna Oliveim da Silva e rwisado pelo auror.

Dirc$o Editoriaft Kathia Cædlho e A¡a Claudia de Oliveira


Capæ Cláudia Gucia Viccntini
Rcvisão: José Plinio Cmanho Bc¡toloni
EditonÉo: CD Srudio Soluþcs Grá6ø

Tiaduido do francè por Luia Hclena Olivein da Silva


Eric Landowsk¡
Comelho Editorial: Ana Claudia de Oliveira, José Luiz Fiorin, Moema Rebouçø, Yrua
Fechine

Dados Internacionais de Catalogação na Publica$o (CIP)


Traduzido do francês por
Ficha Caalográfica Luiza Helena O. da Silva
landowski, Eric
Interaçóes urisedæ / Eric Landowski; tmd. Luia Helena Olivein da Silva. - São Paulo:
EstaÉo dæ I¡tru e Co¡es: Centro de Pesquisæ Sociosemiótiæ,2014.
128 p.; 16 x23 Cm
Bibliognfia.

Tímlo original: "Les interactions risqué*"


ISBN: 978-85-68552-03-2

1 Aøo.2. Interueo social. 3. Comportamento de risco.4. Senso (Filosota).


5. Semióriq. I. Tln¡lo.

cDD 302
302.2
121.3

Publiedo com o apoio do CENTRO DE PESQUISAS SOCIOSSEMIóTICAS - CpS


Pondficia Unive¡sidade Católie de São Paulo
São Paulo
Est-Øo dæ Iætru e Cos Editon 2014
Ru Cardoso de Almeida, 788 cj. 144 -Perdiæs
05013-001 São Paulo
Telefu:55 1l 4191-8183 I 11 419l-8668
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Estação
das Letras
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SU MARIO

PREFÁcIo, PoR JosÉ, wrz FIoRTN 7

I - ENTRE swrróTlcA, ANTRopoLocIA E FILoSoFIA lt


Marginalidade do sentido, precariedade do sujeito 14
Entre a insignificância e o sem sentido, o risco aceito 17

II - DA PROGRAMAçÃO À nsrnnrÉCn 2t
Duas formas de regularidade 22
fu condições da interação estratégica 25
Incertezas da manipulação 29

lII - PROBLEMAS DE INTERPRETAçÃO E DE FRONTEIRAS 3I


Do tecnológico ao político 32
Rcgularidade da irregularidade 34
A parte do simbólico 37
Du¡s formas de motivação 4l
N. o REGTME DO AJUSTAMENTO 47
hrcr scç Fazer crer, fazer sentir 48
Dr¡¡¡ formas de sensibilidade 5r
Qucm perde ganha 55
V - PREVER O INESPERADO, ANTECIPAR O IMPREVISTO 6t
Riscos contingentes, riscos necessários 62
Pontos de vista, aspecros e esdlos de vida 65 PREFACIO
O regime do acidente 70
Duas formas do acaso 74
VI - SOB O RISCO DO SENTIDO 8t
Modelo: relações sintáticas 81
Investimentos semânticos 90
Aquém da interação, a coincidência 95 Natureza da gente náo cabe em certeza nenhuma
Guimarães Rosa, Grand.e Sertão; Wredas.
vrr - TEoRTAS DA TNTERAçÃO E TNTERAçÕES rnónrcns 103

POSFÁCIO, POR JACQUES FONTAMLLE r09 Uma afirmaçáo corrente entre os semioticistas era que o nível narrativo
tinha sido o patamar mais bem desenvolvido do percurso gerativo do
Bibliografia sentido. Essa asseveração levou à crença de que a notável redução operada
tt5 por Greimas nas funções proppianas chegara a um modelo de narratividade
fndice de noções 119 elegante, simples d universal. Proclamava-se que o chamado esquema
fndice de coisas e temas 123 narrativo canônico, com suas quatro fases, a manipulação, a competência,
a performance e a sanção, dava conta da análise de todas as narrativas. Não
era um molde que se aplicava mecanicamente às narrativas reais, mas era um
modelo de previsibilidade, que permitia a compreensão de cada narrativa em
toda a sua complexidade. Disseminou-se então a certeza de que a estrutura
proposta por Greimas era verdadeira e, portanto, o arcabouço teórico do nível
narrativo estava pronto. No entanto , náo é assim que as coisas se Passam no
domfnio da ciência.
O discurso regido pela modalidade da certeza é o discurso religioso.
Nclc, explica-se tudo: de onde viemos, para onde varnos, qual é o sentido do
æfrimento e assim por diante. Ele enuncia dogmas a que se adere pela fe' O
di¡curso científico é modalizado pela contingência. Ele propõe modelos parciais
& cxplicaçáo da realidade. Por isso, não chega nunca à verdade absoluta. Ao
Gofltrlrio, nele, ela é sempre provisória. É por essa razão que a ciência progride
nnprc. A ft é algo alheio à ciência. Enquanto o dogma fecha o discurso
rllgioso, o conhecimento é uma aventura aberta a múltiplas possibilidades.
A certeza dos semioticistas aceÍca da descrição do nível narrativo foi
fhl¡da pela publicação, em 2005, de Interações arriscadas, de Eric Landowski.
I ntcraçócs,{ rrisr rtl,¡ r Prefácio

É' .ts" obra que aparecc agor¿l crìì porruguês. Nesse texto brilhante, A programaçáo é o modelo em que o estado resultante da transformação
Landowski
mostra que não exisre um modclo clc narrarividade, mas quatro. é o efeito de uma causa. A manipulaçáo é o modelo em que se transformam
Um postulado básico do projcto de Hjelmslev, exposro em seus Prolegômenos "estados de almd', em que se busca, essencialmente por intermédio dapersuasáo,
a uma teorla da li,nguagem, é que a todo procesro .orr.iporrde um sistemà-e
é este motivar alguém a agir de uma determinada maneira. O acidente (o acaso) é o
que permite analisa¡ e descrever aquele com um número ¡estrito de premissas. modelo que descreve acontecimentos que, por sua própria natvreza' escapam
Isso significa que o processo é constituído de um número limitado d.
elementos a qu"lq,tèt determinação. O ajustamento é o modelo em que os parceiros da
que reaparecem em interaçao, sentindo a maneira de agir um do outro, vão construindo in feri os
lorr". combinações. A teoria rem que ser preditiva, pois
permite fazer um cálculo das combinações aceitáveis, prognosti.ando, derr" princípios da relação. Esses modelos estão ligados a esdlos de vida: o rotineiro,
forma, os evenros possíveis e as condiçõ.i d...r" realizaçio.r" o aventureiro, o prudente, etc.
Eric Landowski, na melhor tradição da semiótica narrariva e discursiva, O sistema preconizado por Landowski alarga exponencialmente as
segue os princípios hjelmslevianos, pois o que faz é um cálculo dedutivo
de condições de aplicabilidade da teoria narrativa. Com efeito, com a noçáo
possibilidades do sistema. Seu grandã p".ro è mosrrar que a narratividade não de programaçáo, a teoria descreve não apenas as ações realizadas pelos seres
apenas tem um sistema, mas que ela é um sistema. humanìs, mas também os eventos naturais. No entanto, Landowski não
Fundado na oposição continaidøde us. descontinuidade estabelece para nesse ponto, que seria a consequência natural de propor um regime de
regimes de interação. Fazendo o cálculo das possibilidades do sistema, programação. Ele mostra também que esse regime pode regular aorganizaçáo
verifica-
s€ que, se há uma interação contínua e uma ãescontínua, há também uma, não social e política, gerando regimes mais ou menos totalitários. Da mesma
descontínua e uma, não contínua. Por outro lado, o semioticista francês íança forma, a manipula çãio é o modelo das sociedades democráticas, pois o trabalho
mão da oposição necessidade us. possibilidade. Por conseguinte, consrara-se a político é sempre uma persuasáo, já que o poder funda sua legitimidade
existência d a não possibilidade e a não necessidade. Isso implta que há um regime i.,um acordo de vontades. Ao estudar o regime do acidente, Landowski
governado pela regularidade; um, pela casualidade; u-, nìostrâ o que fazem'os seres humanos em sua ânsia de compreender todos os
þ.h rräo ,.gul"ridíde e ;¡contecimentos e aí analisa os papéis temáticos do fatalista, do supersticioso,
um, pela não casualidade. O primeiro é denominado prågr"m açãa-; osegundo,
acaso (ou acidente); o rerceiro, ajustamento . o q,.r".ìo, manipllaçao. Ã ideia .lo homem de fe. Por esses exemplos, tem-se aPenas uma pálida noçáo das
de risco preside a esses regimes de interação. com ef.ito, qr"rrrt ¡rossibilidades descritivas abertas pelo modelo proposto Por Landowski.
regime menos risco ele apresenta. Assim, a programa
-áir r.g,rl", o irl" permite descrever, com rigor, mudanças culturais, noções diversas de
nàoapresenra n..rh,r-
çáo
risco, pois é absolutamente previsível e, portanto, roça a insignificância. o llistória, práticas sociais distintas, diferentes concepções de arte (de poesia,
acaso é possível, mas absoluram€nre imprevisível e, por .orrr.g:,rirrr., esrá
na ¡r,rr cxemplo) e assim por diante.
fimbria do absurdo. A manipulação, sendo da ordËm do nãã imprevisível, Se erigir esse amplo sistema de narratividade fosse o único mérito do
apresenta uma regularidade nem totalmente imprevisível, mas também náo tcxt,r, ele já-te:;ira um lugar assegurado entre os mais importantes escritos da
absolutamente previsÍvel._o ajustamenro, sendo å domínio do não previsível, rr.r¡riritica. No entanto, ele contém outras preciosidades. O estruturalismo
manifesta uma casualidade que pode ser compreendida. Esses quaüo regimes rcnrl)rc foi acusado de operar com sistemas estáticos. Landowski demonstra
¡r.rr.r nós que isso nãLo é verdade. O sistema que ele arquitetou
de interaçáo dão lugar a quarro modelos nariativos, ,r- gorreriado por",r-" tem um
da regularid"l.j y-, por uma lógica da eventualiãade; um, por uma r ¡r.it(.r dinâmico, pois permite deslizamentos de um regime ao outro. Esses
fógica
lógica da intencionalidade. .r-, pot.r-ã lógica da sensibilidade. ,lcrl.rcrrrnentos possibilitam estudar, de maneira bem fina, os diferentes
Como se obsewa, Eric Landowski não destruiu o modelo de narratividade l¡r.( (.\so.s que manifestam o sistema, pois uma série de passagens graduais liga
descrito por Greimas, mas, fazendo um rigoroso cálculo de probabilidades, ,,,,r r"¡iirnc a outro: da manipulação à programaçio,do ajustamento ao acidente
mostrou que ele é uma das possibilidades, enrre ourras, de nariatividade. r, ¡rri¡rr ¡ror diante. Landowski analisa, com muito aPuro, as superposições
,l¡.¡rcr r<.¡¡imes, as transições entre eles, as fronteiras fluidas que os delimitam,
¡ ,r'r ur\iviclade em sua aplicação.
1. L. Hjelmslev, Prolegômenos a uma teoria da linguagem, são paulo, perspectiva,
1975, p. g
Iaterações A¡¡iscadas

modelo proposro por Landowski é tão elegante e tão simples que,


.o -óbvio,
quando o entendemos, não podemos deixar de eolam"r: Mas é é
evidente,
:9-o ninguém tinhavisto isso antes! No entanto, não nos enganemos,
estamos diante de uma fulguranre obra de um grande semioticistã. Só um
cAP íru lo I

notável cientista é capaz de enxergar aquilo que, ãepois de explicado, parece ENTRE SEMIÓTICA, ANTROPOLOGIA E
claro,
_inequív9co,
indiscutível. D*.y Ribeiro, ,r.r- ì."to que aparece em seu FILOSOFIA
liwo Sobre o óbuio: ensaios insólitof , diz:
Acho mesmo que os cien¡isras trabalham é com o óbvio. o negócio

*H .::¡:":Hï ;;it iå:,*"å#r,'*'u*aïî.,É


;:JJï:"î.lînff '"%tr"*1iîi;.îï,".ïii:ä;riï1ð.îliiïî
procedimenro é que par9c9 um jogo sem fim. De fato, só conseguimos
desmascara¡ uma obviedade para descobrir outras, mais óbvias-ainda.
(...)

É, óbvio, por exemplo, que todo santo dia o sol nasce, se levanta, dá
suawofra pelo_céu, e se põe. Sabemos hoje muito bem que isto não é Ao pretender dar conta das condições de emergência do sentido nos
discursos ã nas práticas significantes mais diversas, a semiótica se aPresenta
:':':iîxfi ,i':l;x*Ïffi :f i,;åîffiå,î:ïä:::1äî:: como uma disciplina com PersPectivas empíricas e descritivas, uma entre
passaram por sacrificios, recordados por todos, porque disseram que
Deus estava nos enganando com aquele espetáculã di¿írio. Demonstrar outras, no âmbito das ciêàcias humanas. Próxima tanto da linguística
que a coisa não era como parecia, além de muito dificil, foi penoso, quanto da antropologia, dotou-se de uma metalinguagem e de modelos que
todos sabemos. llre permite- dèt"t.rr.r, nãto as coisas mesmas' mas a maneira como lhes
o que Eric Landowsl<t fez, nesra obra, foi retirar os véus legados pela atribìímos sentido projetando sobre elas um olhar que organiza suas relaçóes'
-
tradição, paramosrrar-nos, demaneiralímpida, como funcionaanariatividade. Esse deslocamento,-que constitui a especificidade da disciplina, fixa também
seus limites: deixando de lado a questão do ser das coisas, restringimo-nos a
Na capital paulista, na cerúlea tarde do equinócio da primavera de20l4.
tnalisar, comparar, interpretar os dispositivos simbólicos através dos quais a
Luiz Fiorin rcalidade ch.ga a significar Para os sujeitos. Assim, observadores distanciados
José
por exigência de método e relativistas pol profissáo, nos manteríamos, por isso
m.r-o, descomprometidos e seríamos céticos por hábito.
Mas isso não é taJvez senão aparência. Porque, de nossas
aPesar
prccauções epistemológicas e dos cuidados metodológicos de que nos
i*l."-or, coitinua pr.r.nt., no âmago de nossa interrogação sobre o sentido,
Ume questão origin:íria, absolutamente ingênua por comPançio: é a questão
ü"sintido da uida'- da vida mesma, nem mais nem menos. Essa expressão,
frtqucnte na boca de Greimas, encontra diversos equivalentes em seus escritos.
Poi cxemplo, nas primeiras páginas de Sernântica estratural, onde se trata de
¡to.r., -odo de úr-rro--""dõ enquanto mundo significante. "O mundo
hUm¡no se define essencialmente como o mundo da significaçáo". E o autor
t'póc a refledr" sobre as especificidades dessa realidade "ao mesmo temPo
2. D. Ribeiro. Sobre o óbaio: ensaios insólitos, Porto AJegre, LepM, 1979
ações Arriscadas e Filosofia
Entre Semiótica' Antropologia

onipresente e muldforme": a significação enquanro dimensão


existencial de que acreditando limitar-se a construir o sentido dos textos ou das práticas
nossa condiçãor.
tomadas por obietos, na realidade, apenas pelo fato de utilizar tais modelos, já
Mas, se a interrogação fundamental que sustenra nossas se toma posição, implicitamente, sobre o estatuto das coisas mesmas.
investigações,
mesmo as mais empíricas, concerne ao "sentido da vida",
se o que Isso é o que sucede, por exemplo, com o "esquema narrativo", embora
ou em todo caso as modva em profundidade, pertence a ". ;u".tifi.",
essa ora.-í"- q; seja um dos instrumentos de análise menos questionado da semiótica enquanto
consiste exatamente gênero de semiótica q,r. F"r.-os, "ciência do texto" e, por extensão, enquanto teoria da açio. Derivado de
_o ou ao quar aspiramis?
Em uma simples an:ílise dos discursos e das práticas significantes?
ou não será análises do conto popular, pondo a ordern como um dado primeiro e seu
que na realidade nossas perspectivas úrtimas ultr"p*r"ir
em parre esse quadro, restabelecimento final como mete em si, ele traz consigo uma visáo de mundo
por assim dizer, demasiado modesto? De fato, eläger como
åb;.ro d.,.fl.rã" que implica em si mesma toda uma "filosofia". Aliás, ao caracterizá-lo como
última uma questão tão geral como a "siruaçáo å'. rr.-.rL, ..lireralmenre um "quadro formal no qual vem a inscrever-se o senddo da vida", o próprio
assediado por significações que o solicitam de toda
-
,ã.rd.
parre',, a manhã até Greimas foi o primeiro a atribuirlhe o valor de um "modelo ideológico"3.
a noite e desde a idade pré-natal até a morte",
-, iså não pode não leva¡ a um Isso, evidentemente, não é razão suficiente para rechaçáJo! Mas semelhante
trabalho de tipo quase filosófico, próximo à fenomenol"gã.
reconhecimento atenua inevitavelmente a idéia que poderíamos querer fazer
Cada uma dessas opções tem seus partidários e seria f;ícil
radical izar as de uma ciência semiótica pura, totalmente dedutiva e sem compromisso
diferenças de atitudes episiemológicas que opõem uma .lgn-. Não há semiótica (nem nenhuma outra ciência humana ou social) livre
ciência do ,.*ro, a. iigo,
extremo' a uma reflexão mais livre sobre a experiência de todo compromisso com o sentido; e nenhum de nossos instrumentos de
do sentido. corrt.rão,
esse. desnível pode, e mesmo deve ser ,.rp.r"áo, análise deixa de estar contaminado, em maior ou menor grau, Por seu objeto.
porque ,"-b¿- é, em certa
medida, ilusório. Não existe por um hdä.uma så-iåti." Se isso salta aos olhos no caso do esquema narrativo, é igualmente óbvio no
p"ra e dura, dig;;
do nome de ciência, e, por outro, uma orientação puramËrr* que se refere ao "esquema actancial", o qual procede de uma concepção moral,
i-p..rsionista
por esÞr ancorada na experiência. uma refle*áo psicológica, social, política e até jurídica muito precisa, do estatuto do sujeito
"b.*"não éinspirãções
às ou às
interrogações filosóficas e orientada para o existencial em relação com seu "destinador". O mesmo ocorre com configurações mais
necessariamente
menos rigorosa em termos de conceptu alizaçãoe de particulares, como a "manipulaçáo" ea "programaçio", das quais, entre outras'
procedimentos de análise _
menos "dura" uma orientaçãô exclusirr"-.rrrË centrada na descrição nos ocuparemos em breve.
_gue dos
textos-objetos. Inversamente, mesmo a orientação analítica
mais atenta a sua Com efeito, nas páginas que seguem se tratârá de confrontar entre si
própria cientificidade (a mais vigilante em matèria de metalinguagem,
a mais diversos regimes de construçáo do sentido que, como se verá, estão ligados,
exigenre quanro à formalizaçáoi amoderizações, a
mais irrtr"n.ig.nte frente îo plano empírico, a distintos tipos de práticas interacionais e, do ponto de
aos demônios da intuição e do vivido) nao påde ..pura,,
na realidad..., vi¡ta teórico, a outras tantas problemáticas possíveis da interação. Ao analisar
que a do semioticista suspeito de frouidão,-que confessa -"i,
estar comprometido ¡lnto essas práticas quanto as modalidades de sua teorizaSo em semiótica,
no que se esconde atrás de seu objeto, a sabèr, na questão
do sentido ou do noeso objetivo será de duas ordens. Primeiro, de ordem técnica: partindo do
valor da "vida". Porque, mesmo se se opra pela priÅeir"
os moderos ¡:¡me das esquematizações gramaticais (ou narrativas) existentes, trataremos
que se.esforça pof consrruir para implementá-la nao sao "ai*d.,jamais, e, no nosso
domínio, não-podem ser puros instrumentos descritivor,'rr..rrro,
& completá-las, adicionando alguns instrumentos novos de descrição. E ao
e vazios de olgmo tempo, levando em conta as observações anteriores, nos p€rguntaremos'
conteúdo. Inclusive os mais gerais, os mais absûaros .
o, -.lho, formalizados lluir profundamente, pela significação e pelo alcance antropológico de tais
são em si mesmos portadores de sentido e, com
frequência, de varores. Ainda ¡tOdclos interacionais. Esses, em sua diversidade, assim como as práticas das
çnb dao conta, remetem a ontologias distintas, e cada uma delas supóe um

l. AJ. Greimas , Sémantiøue smtaurale,paris, l¿rousse, 1966, p.7


e l2.Trad,. pon. Semântica estrataral, Dictionnaire røisonné d¿s scimces du kngage, Paris, Hachette,
São Paulo, Cultri:/Edusp, t973.
8. Tiad. port. Dicionário d¿ semiótica, São Paulo, Cultrix,
2.lbid., p.12.
Int€rações A¡riscadas Entre Semiótica, Antropologia e Filosofia

regime específico de relações com o mundo: quais são, pois, caso a caso, suas
salvaçáo, uma liberaçáo - uma "escapatórid', dizia Greimas6. Contudo, se o
implicações em termos existenciais? Essa reflexáo desembocará na construção
sentido é o que pode salvar-nos, como pretender que estejamos "condenados"
de um metamodelo de ordem mais geral, que permitirá explicitar o estilo de
a ele? Paradoxo puramente aparente, que reside aPenas no fato de que a
resposta que, finalmente, cada uma das configurações assim postas em relação
fórmula extraída de Merleau-Ponty é elíptica. Para compreendê-la, basta
dá à questão do "sentido da vida".
completáJa: aquilo a que estamos condenados é a consiuir o sentido. É,
Geralmente, enquanto semioticistas, tentarnos não tomar a nós mesmos às custas desse esforço que podemos, por um lado, evitar que as coisas
por "fiIósofos". Não obstante, anatutezamesma de nosso projeto, que consiste "p.tt*
sè imobilizem em uma continuidade sem allvio, na qual tudo permaneceria
em dar conta das maneiras socialmente atestadas de construir o sentido, leva- "igual ao mesmo", e escepar assim ao vazio do tédio, ou, Por outro lado,
-nos a filosofar permanentemente, como por delegação, ao esquematizar os r.[.t"t a excessiva plenitude da dor, tratando de ultrapassar o sentimento de
princípios de construção do sentido que se utilizam onde se cria sentido. O que quì "n"d" concord" com nadd', enquanto que o excesso de heterogeneidadt
querlamos pôr em destaque aqui é, precisamenre, o conreúdo filosófico latente entre os componentes da experiência tende a impedir-nos de ver nela algo mais
e o alcance existencial dos modelos que desse modo elaboramos, dimensões que uma pura descontinuidade. Condenados ao trabalho da semiose, tal é em
geralmente mascaradas pela tecnicidade de nossos insrrumenros e de nossos su-" ,rori" condiçáo se queremos viver enquanto sujeitos e não simplesmente
objetivos imediatos. Como corpos, seja.- t- estado vegetativo de letargia, despersonalizados pela
¡usência ã. toda relaçio com o valor, seja reduzidos ao estado convulsivo de
¡nimais torturados, prisioneiros dessa presença todo poderosa que é a dor.
Marginalidade do sentido, precaridade do suje¡to Mas essa experiência salvadora somente é possível dentro de margens
Otreitas. Porque, embora a zoÍLa mediana que se estende entre Caribdis e
Para caracterizar nossa condição, ou pelo menos a do "escritor", Barthes E¡cila7 - ..tttã Dor e Enfado, entre a explosão do sentido e sua diluiçio na
tomou de Merleau-Ponty uma ßrmula bastante esrranha, que Greimas também lndiferença - nos apareça, enquanto conseguimos manter-nos nela, como um
gostava de repeti¡ generalizando-a: seres semióticos por natureza, esraríamos ñ¡r daTianquilidaãe onde a presença do sentido seria evidente, o Sem-sentido,
por natureza "condenados ao sentido"4. Mas o verdadeiro não será antes que, æmpre próúmo, espreita-nos a cada instante. Náo se deve suspeitar de qualquer
longe de impor-nos sua presença, o sentido deve ser conquistado sobre um pcrsimiit"o por princípio em relação a essa visáo um Pouco dtametizante. Ela
fundo primitivo de sem sentido? Dois tipos de experiências muito ordinárias ä¡.orr. da pie."iiedade mesma das condições da emergência do sentido. Para
parecem atestá-lo. Primeiro, o enfado, esse esrado de alma no qual o mundo, menos desde Saussure, que se
{Uc haja sentido, é preciso, sabe-se disso pelo
vazio de sentido, de interesse, de valor, dá a impressão de estar ausente e no ldCntifiquem diferenças Pertinentes, o que supõe pôr em relaçáo elementos
qual, correladvamente, o sujeito permânece prostrado no sentimento de sua GOmparåveis entre si. Dè fato, dois elementos não podem_ser considerados
própria incapacidade de existir. Depois, a experiência da dor, na qual o mundo Omo "diferentes", e a distância que os separa não é suscetível de fazer sentido,
parece, ao contrário, concentrar-se inteiro nos limites do próprio corpo sob a I ncnos que, de um outro ponto de vista, se lhes possa considerar também
forma de uma presença invasiva, a do mal que insiste .- tar-nos, de ütto idêáticos: se eles diferem entre si, somente pode ser sob um certo ângalo
"tor-.t
maneira tão mais dificil de suportar quanro nos parece privado de sentido5. ¡¡& um certo Ponto de uista,participando ao mesmo temPo de uma ordem de
A partir de tais esrados de aprisionamento na insignificância ou na ¡b que, por lhes ser comum, osfaz, precisamente, comPafáveis. Dizer quea
insensatez, concebe-se que a experiência do sentido possa ser vista como uma Of do téu,-hoj., é diferente à de ontem à mesma hora, não tem nada de firtil,
o efeito de
lq* podemos efetivamente comParar uma à outra e compreender
i¡ddó que resulta de seu contraste. Em contrapartida, dizer dessa mesma cor
4. M. Merleau -P,onty, Fenomenologia da pncepçã0, São Paulo, Ma¡tins Fontes, 20 I I tp. XfV na ediSo
francesa, Paris, Gallima¡d, 19 451.
f. Gnimrs, Dø imperfeição, Sáo Paulo, Hackeç 2002,2" pxte-
5. Cf A. Schopenhauer, Le monde comme uolonté et conzme représentation (1819),em particular o capítulo
crhr quc diñculta-m a passagem entre Itália e Sicília, temidos pelos marinheiros daAntiguidade.
57.
Interações A¡riscadas Entre Semiótica, Antropologia e Filosofia

que ela difere da forma das nuvens que passam não teria senrido algum, à falta de vista de uma ética e de uma estética da prática do sentido. Esboça, assim,
de uma dimensão comum que justifique tal colocação em relaçáo. piessupondo uma filosofia baseada em postulados estritamente semióticos, reladva, se
um equillbrio precário entre identidade e diferença (ou no plano da percepção, não à vida em geral, pelo menos ao valor existencial de diferentes "estilos de
entre continuidade e descontinuidade), o sentido não pode consequenremenre vida" possíveis enquanto regimes distintos de relações com o sentido. A um
configurar-se, ele também - como o sujeito - senão no interior de uma estilo catastrofista que oscila enrre resignação ante a insignificância e espera
margem estreita, em uma zona intermedi:íria onde as coisas não nos perecem do deslumbramento, Greimas opõe uma atitude voluntarista, baseada no
tediosamente idênticas umas às outras, nem insuportavelmente privadas de exercício de um "fazÊr estético" que aponta p{a a construção controlada de
relações entre si. um mundo significante. Prolongaremos aqui essa reflexão, enfatizando uma
Isso quer dizer que o fato de que percebamos o mundo ora disforicamente, noção raramente levada em consideração pelas problemáticas que buscam
como insignificante ou insensato, ora euforicarnente, como carregado de estabelecer o vínculo entre princípios de construção do sentido e modalidades
sentido, náo depende pura e simplesmente de humores subjetivos, da interação: a noção de risco.
-.rt"rrt.,
e inexplicáveis: nem o enfado, nem a dor, nem sua superação carecem de
fundamento. vão acompanhados da diversidade dos regimes de presença e de
interação nos quais se inscrevem nossas relações com o mundo e com o ourro, Entre a insignificânc¡a e o sem sentido, o r¡sco
regimes dos quais procede ranro a caprura do sentido na experiência de todos ace¡to
os dias, quanto sua dissolução no indiferenciado ou, ao contrário, sua explosão
no incoerente. Desse modo, comparar entre si diferentes regimes de construção Nem como noçáo, muito menos como valor, o "risco" náo gozade uma
do sentido subjacentes a nossa maneira de estar no mundã e de interagir com dn estima em nossos dias. Somente seu oposto, a "segurança", está na ordem
o que nos rodeia ou com aqueles com os quais convivemos, deveria iluminar- do dia. É, a ela que se aspira, aquilo qn. i. exige, o qr't. sè impoe em todos
nos sobre nossa condição enquanto sujeitos semióticos, e talvez até permitir- o¡ âmbitos. É em s.u nome q,rã, dorã.'"trte, juitifica-ìe quase iudo, desde a
nos imaginar os princípios de um saber uiuer semioticamente fundado. Nem rupervisão escrupulosa dos comportamentos individuais - incluindo aqueles
desapego total, que terminaria por reduzir toda alteridade ao mesmo, nem quc poderiam ser considerados como os mais inofensivos e anódinos - até
imersão cega na vivência, que impediria relacionar os elemenros enrre si, o lt piores violações ao direito internacional. No enranro, por maior que seja
simples sentimento de que hd sentid,o supõe uma relação interativa equilibrada, t prudência de uma condura, por mais meticulosas as precauções das quais
por assim dizer em partes iguais, enrre o mundo e o sujeito: à diitância de oo¡ rodeamos, uma interação, quaisquer que sejam a natuÍeza e o estatuto
si mesmo, mas não demasiado; em contato com as coisas em geral e com os tquilo com o qual ou daqueles or quais entramos rela$o, nunca
outros, mas também não demais. Iú, nem pode estar totalmente isenta"o-de riscos, nem para siem
mesmo, nem para
Em Da imperfeição, Greimas interpreta as transições e, sobrerudo, as O outros. Essa constataçáo nã'o provém de uma visão pessimista, não mais que
rupturas entre momentos de aparição do sentido e movimentos de refltxo I constata$o relativa à alternativa entre senddo e sem sentido; ela raduz uma
em direção ao sem sentido, em rermos de uma dialética do contínuo e do F¡sidade de estrutura tal que jamais se evita um risco determinado senão
descontínuo que intervém no plano da percepção e da interaéo com o mundo lpondo-se, ao mesmo tempo, a outro.
que nos rodeia8. Mais ainda, indica também o que daí pode resultar do ponto Para proteger-se, por exemplo, conrra o risco dos acidentes de estrada,
!I æi., evitar certos riscos vinculados a uma multiplicidade depequenes
Ct A. J. Greimas, op. c!t, e nosso comenrá¡io em Passions sans norn (paris, pUF, 2004, pp. 49-56, bincr"s, tomamos milhares de precauções hoje consagradas sob a forma de
9.
"Pour une sémitioque sensible". Tiad. port. "Para uma semiótica senslvel", Rev. Edacação t tù)t¡¿o*, ;hIù tantas proibições de ordem pública - proibição de acelerar, de parar,
30,2,2005.), onde estabelecemos a distinção, retomada aqui mesmo, entre duas formas de não-sentido,".
uma ligada a9 contínuo - sucessão monótona, "¡otina" regida pela necessidade, produzindo pelo excesso
de coesão o "dessemantizado" (a insigniÊcância e o enfado) ãutra relacio nadaão d¿scontínz'o sucessão
-, - do não contínua, ordenamenro regido por escolhas não necessárias (a "fanusia"), que tende
caótica de "acidentes' regida pelo acaso, produzindo pelo excesso de heterogeneidade o "sem sentidd'
, a outra na instaura$o do não descontínuo, encadeamento regido por uma ordem não
(no prazer ou na dor) e, correlativamente, entre dois modos de emergêncL do sentido, um baseado
- (o "hábito"), que tende ao "harmônico"
Interações Arriscadas E¡tre Semiótica, Antropologia e Filosofia

cujo desfecho não poderia ser, a rigor, senão a proibiçáo conduzir rapidamente à catiístrofe. Porém, entre rejeição categórica (e ilusória)
de virar, de dobrar - a todo risco e aceitaçáo sem reserva (e louca) do puro azar, frcapor determinar
cúegórica de sair de casa. O risco, sempre possível, de morte por acidente,
a. natuÍeza e o grau de probabilidade dos riscos que aceitamos assumir em cada
emergência da descontinuidade absoluta (e insensata), é substituído assim, a
circunstância particular.
pÍazo, por uma morte certa, devido ao enrijecimento do corPo e à petrificação
do sentido em uma continuidade que exclui toda ruptura mas, ao mesmo Num plano geral, as escolhas que podemos efetuar a respeito (na medida
tempo também, toda diferença geradora de sentido ou de valor. Que nada ..T q,t. as situações concreras permitam escolher) se reduzem a optar enrre
se mova e tudo terá, se náo a vida assegurada,, ao menos um final tranquilo, diferentes regirnes dr interação e, por isso mesmo, enrre regimes dz sentido
uma morte tão indiferente (e portanto insignitcante) quanto a vida que e distintos. Esses dois níveis estão intimamenre relacionados. De uma parte, é
precedeu. Assim, longe de eliminar o risco, fim ao qual muitos Parecem aspirar, fácil constatar empiricamenre que, quanto mais nos aplicamo, g"rh", .-
essa prudência extrema inspirada pela obsessão de segurança nãLo faz, na termos de segurança no plano pragmático da interaçáo, mais nos " expomos,
realidade, mais que expressar a preferência comumente difundida para um em geral, ao risco de perder no ourro plano - o da produção de sentido. E
certo tipo de riscos, por oposição a outros. Morrer de tédio a fogo lento, vice-versa. Por outra parte, e sobretudo, por maior que seja a diversidade das
junto à lareira? Ou morrer de prazer e, portanto, também de dor, mas a formas de interaçáo, é possível mosrrar, como tr"t"té-o. de fazêlo, que essa
grande velocidade? Enquanto a escolha se apresentava como uma questáo de diversidade remete a um número muito limitado de princípios elernentares
preferências morais e estéticas pessoais, a eleição era livre. Mas já não o é em relativos à maneira de construir as relações do sujeito com o mundo, com
uma sociedade que, fazendo da segurança seu valor suPremo, não somente se o outro e consigo mesmo, princípios que implicam concepções distintas do
dedica a assegurar a proteção legítima acadaum de nós contra as imprudências que significa "ter sentido". A partir dessas hipóteses, confrontaremos, desde o
ou a malevolência de outros, como também se encarrega de proteger-nos dos ponto de vista de seus pressupostos e de suas implicações no plano da teoria
riscos que queremos tomar por nossa própria conta, frente a nós mesmos. do sentido, regimes de interação muito diferentes uns de outros, mas que,
Náo obstante, seria demasiado simplista oPor termo a termo, como tomados em conjunto, formam sistema.
se se tratasse das únicas opções possíveis, Por um lado uma moral social Tiadicionalmenre, a semiótica narrativa apenas reconhece duas formas
conservadora, de inspiraçáo feminina (ou, para sermos mais precisos' uma de interaçáo: por um lado, a "operação" ou ação programada sobre as coisas,
moral de má mãe de famllia), fundada exclusivamente na prudência e, Por ñ¡ndada, como se verá, em cerros princípios de regutaridade; por outro lado,
outro, uma atitude individualista, de estilo romântico, visando à exploração I "manipulação" estratégica, que põe em relação sujeitos regidos por um
do desconhecido, à superação dos limites, à criação do novo e que, por isso princípio geral de intencionalidad¿. Retomando as definições clássicas desses
mesmo, vaforiza, por princípio o arriscar-se. Aplicada ao pé da letra, nem dois regimes, começaremos por fazer aparecer alguns dos problemas que elas
uma nem outra seria sustentável de modo duradouro. Uma sociedade que, deixam em suspenso (capítulos II e III). Porém, dedicar-nos-emos sobietudo,
em nome da conservaçio da vida, náo permitisse a seus membros atuar a em seguida, a mostrar que, se se quer dar conta, por menos exaustivamente
não ser baseando-se em certezas absolutas condenar-se-ia a um imobilismo quc seja, das práticas efetivas de consrruçáo do sentido na interação, é
mortal; em sentido inverso, nenhum indivíduo, por mais "irresponsável" que nccessário introduzir, ao lado dessas duas primeiras configurações, pelo menos
seja na busca de descobertas ou de emoções fortes, tampouco pode lançar-se üm terceiro regime, fundado na sensibilidad.e dos intera-cr"r,,.rr o regime do
trjustamento" (cap.
indefinidamente à aventura sem um mínimo de precauções... Uma vez mais, IV). Ficará então por ver se o conjunto constituído pela
somente dentro de uma margem bastante estreita se situa a zona das ações üticulação desses três regimes enrre si é suficienre, ou se a lógica do moãelo
possíveis, tanto no plano social quanto no plano individual. Essa zona é a lrrim esboçado exige algum complemento (cap. V a VII).
do risco aceito em relação com o mundo, com o outro, consigo mesmo: nem
rejeiçáo a todo risco, pois exigir que se preveja o imprevisível ou simplesmente
impor demasiadas precauçóes antes de agir não poderia desembocar senão na
inibição de qualquer desejo de açio, nem pura submissáo ao aleatório, uma vez
que uma excessiva tolerância frente à incerteza teria todas as possibilidades de
cAP íru lo I I
DA PRoGRAMAçÃo À ESTRATÉcln

Ao concentrar-se nas condições de emergência do sentido, excluindo as


qucstões de ordem ontológica, a perspectiva semiótica autoriza, em princípio,
I @ntentar-se com conceitos puramente "operacionais" (isto é, que devem
0ferecer um valor discriminatório suficientá p"t" permitir a descriÉo dos
dlæutsor, dos sistemas de pensamento ou das práticas significantes), sem que
hr n...rridade de interrõgar-se acerca do r..r grau de"validade em ,.l"iao
Om o que poderia definir, em termos filosóficos, o "ser" mesmo das coisas.
fbd¡via, mesmo assim, em semiótica como nos demais campos, os conceitos
Io são proficuamente utilizáveis senão com a condição de estarem bem
üt¡truldos - evidência que implica, queira-se ou não, um mínimo de reflexão
Ibre seuspndamentos.
No presente caso, a oposição entre "operar" e "manipular" (e a partir
|ll, entre programação e estratégia) somente se compreende por referência
I um¡ série de distinções mais elementares que a fundamentam, ao menos
þitivam.nt.. Se a própria noção de ação implica em todos os casos a idéia de
do mundo, é posslvel localizar os efeitos transformadores do agir
um ou outro de dois planos distintosl. Ora atuamos diretamente sobre o
material: por exemplo, deslocamos coisas, reunimos ou separamos suas
isto é, realizamos entre algumas unidades conjunções e disjunções que
pr resultado fazer ser novas realidades (construir ou destruir uma casa,
cidade, um pafs), ou modificar os estados de cerros objetos existentes

Àf , Grcimas e J. Counés, op. cit., verbetes "Fazsi , "Manipulação", "Operação"


Interaçóes Arriscadas Da Progranação à Estratégia

(acender ou apagar uma lâmpada, congelar ou descongelar alimentos)2. Ora, de ação particulares, mas que, em certos contextos, permitirão antecipar até
em outras circunstâncias, ao contráfio, delegamos a outrem o cumPrimento nos mínimos detalhes os comportamentos dos atores (humanos ou náo) que
desse gênero de operações pragmáticas: nossa ação limitando-se então a atuar deles sáo investidos. Assim ocorre em particular no universo do .orrto
de tal sorte que outro agente as execute, o"fazer ser" cede ltgar aofazerfazer. popular, onde a identidade de todo aror, concebida de maneira radicalmente
Enquanto que no primeiro caso a ação se analisa como um processo substancialista, se reduz à definição de um papel temático-funcional do qual,
articulado .- t.t-ot de interobjetividade e de exterioridade, no segundo' Por construçáo, quer se úate de uma coisa ou de uma pessoa, não poderá
o fazer se define em rermos de intersubjetividade e de interioridade: oPerar escapar nem desviar de modo algum. Se o personagem é definido como
consiste em atuar a partir de fora (tipicamente, Por meio de uma força) "pescador", apenas pescará; se outro é "Íe7", será sornente rei: cada qual se
sobre a localizaçio, a forma, a composição ou o estado de algum objeto; ao limita, em suma, a "recitar sua lição".
contrário, ma.niPuhr é sempre imiscuir-se em certo grau na "vida interior" com frequência se tem criticado esse modelo por seu caráter
de outrem, é tàtar de influenciar (tipicamente, Por meio da persuasão) nos mecanicista. E, de fato, somente nos conros ou em seu modelã mais primitivo,
motivos que outro sujeito possa ter Para atuar num sentido determinado. os reis, com o prerexro de que são reis, náo fazem mais que reinai... Mas se
Em outros termos, enquanto que, do Ponto de vista narrativo, a operação se yf a grande segurança que, em contrapartida, esse modelo oferece. se, por
confunde com a execução de uma performance que tem como efeito direto hipótese, o parceiro ou o adversário com quem lido, ou o objeto sobre o qi"l
I

a transformação de algum "estado de coisas", a manipulaçáo aPonta Para ou com o qual quero operar, atua conforme um programa de comportamento i

úansformaf o mundo mediante uma conduta estratégice Prévia que tem em determinado, do qual não poderá desviar-se (e nao, por .*.*plo, em função
vista, se náo em todos os casos os "estados de almd', ao menos a comPetência de.uma subjetividade cambiante cuja característicaionsistiria em escapar a
de outro sujeito, o "querer fazer" que o levará a agir' seia oPerando por si ¡odo conhecimento seguro), se, por conseguinte, posso antecipar a maïeira
mesmo sobre o mundo como tal, seja maniPulândo por sua vez outro suieito' GOmo atuará ou reagirá as minhas iniciativas, posso enrão interagir com ele r

seja até mesmo segundo outro Procedimento que ainda falta por identificar Þm certa tranquilidadê. Em todo caso, posso calcular com bastanìe exatidão ,

e por definir. ü riscos que assumo ao confrontar-me com ele.


This condições não vigoram somenre no imaginário etnoliterário. Ao
Þntrário, nunca se encontram tão bem reunidas como quando lidamos com
Duas formas de regularidade frrceirgs cujos comportelnentos obedecem a leis de causalidade do tipo daquelas
lpc as ciências da narureza estabelecem. Tâis leis explicitando, de algum moão, os '
Retomemos primeiro a problemática da ação considerada como operação,
FÉi. temáticos imutáveis das coisas em suas mútuas relações, é o ãonhecimento,
isto é, enquanto "fazer ser": como dar conta da possibilidade de atuar sobre iHrs qu. nos permite atuar sobre o mundo ftsico. Dafábúcaou do laboratóriol
coisas? Þ precrso proceder aqui por reduções s-ucessivas I ozinha, é assim, programando operações que consistem em tirar partido das
rplaridadgs de comporramenro - em ouü; pahvras, dos programas virtuais\
rpróprias dos objetos tomados como matéria-prima, q,t..orrt*ímos cada diai
Þtrcs objetos de todo tipo, começando por modestas sopas3.
essa idéia se ffaduz, em termos de gramática narrativa' na noção precisa Mas a_vida é feita, taryb(m, de relações co'q_e _eqq:e pessoas. Ora, se I
papel terná.tico. Um aparelho eletrônico, Por exemplo, tem um "programa-, Écmo, d; .idì;
oata à que ,.-p.-r"r.iå-r.- q* J; :{ffi"'fL;
animal seus "instintos" , um artesão seu "ofício", e assim sucessivamente: fa*.r, é mais dificil dizer com antecipação, por'exemplo, a que grau exaro
$
t
tantos papéis temáticos que náo apenas delimitam semanticamente
A.J. Greimas, "La soupe au pistou ou la construction d'un objet de valeur", Actes Sémiotiques,I,
ln') (rced. in Da Sens ,I1, Paris, Seuil, 1983), trad. port. Revista Signifcaçã0,
11, 1996; I. Fontanille,
2. Cf. Fr. Bastide, "Le traitement de la matière: opérations élémentaires" , Acæs
¡togramation de I'action", in Slmiotique du discoars, Limoges, PULIM, 1998, pp. 189-199 Grad.
DL 89, 1987. S¡niótica d¿ discurso, S'ao Paulo, Contexto, 2008).
Inte rações Arriscadas Da Programaçáo à Estratégia

de provocaçio teú" que submeter o interlocutor com o quâl discutimos para se produzem na naturezd'4. Ao suspender ou neutralizar a oposição entre as
fazê-lo perder o sangue-frio e vê-lo ferver de cólera. Apenas o que jâ está" regularidades que dependem da causalidade fisica e as que ãstão vinculadas
ìi programado é programável: isso é o que (em princípio) faz a diferença entre a invariantes de caráter social, a sintaxe narrativa da operação programada
-
os esados da matéria e os "estados de alma" a menos que regressemos ao faz, pois, muito mais que descrever um regime de interaSo
".rtoo.riros.
Ela
universo do conto popular, onde essas distinções náo entram em jogo. Ou ¡raduz ao mesmo tempo um modo de apreensão do mundo radicalmente
que passemos àquele do teatro guiñol. Lâ, o policial (em termos de papéis determinista: visão filosoficamente rudimentar, sem dúvida, contudo tanto
temáticos, o colérico por definição) não poderá deixar de se encolerizar assim mais pregnante quanro permanece geralmente implícita.
que Polichinelo ou outro arruaceiro lhe lance a palavra de estímulo apropriada. não visam evidentemenre a invalidar as noções
Essas observações
Ou ainda, a menos que imaginemos uma cena social onde reinariam princípios æmióticas de operação e de programação sob o prerexto de que seus
equivalentes: onde cada um se definiria por um catâter nosologicamente
Pressupostos vão ao enconrro do que é hoje geralmente considerado como
repertoriado, por um estatuto socioprofissional evidente e perfeitamente uma necessária ultrapassagem de toda perspectiva grosseiramente determinista.
assumido, pela fidelidade indefectível a certos ideais, por gostos, hábitos, um Com efeito, nosso papel não consiste em estatuir aceÍca da validade das
emprego do tempo imutáveis, por uma aparência exterior, uma maneira de modelizações narrarivas em nome de uma ou outra filosofia. Ao contrário, o
vestir-se, de apresentar-se, sempre idêntica, pelo respeito inveterado a certas que nos comPete é extrair as implicações ideológicas inerentes aos discursos e
regras, maneiras, ritos ou cerimoniais, por um modo estereotipado de falar e b práticas tomados como objetos de descrições semióticas, implicações que os
mesmo de pensar, em suma, por uma série de prograrnas fixados de uma vez modelos elaborados pera essas descrições inevitavelm.nt. em parre,
por todas a propósito de todos os aspectos da vida em sociedade. conta própria, até conferirlhes a aparência de uma
"rr,t-em,dogmática
necessidade
Jþr
Com a condiçáo de adicionar algumas matizes, uma tal cena não tem, quando não sáo submetidos a uma reflexão crítica.
para diz.er a verdade, nada de utópico. Ela nos parece mesmo táo familiar
que nos obriga a reconhecer, ao lado das formas de regularidade fundadas
sobre o princípio da causalidade fisica, um segundo dpo de regularidades, de As condições da interação estratégica
outra natureza mas quase tão rígidas quanto a seus efeitos. Correspondendo
a condicionamentos socioculturais, sendo o objeto de aprendizagens e se É uma configuração totalmente distinta que se apresenra quando se
exprimindo por práticas rotineiras, trata-se de regularidades cujo princlpio
.
Þlta para discursos e práticas que põem em relação o que, proiriamente
--
derivada coerção socia/, ou mesmo se confunde com ela. Ora, desde o momento Iando, pode chamar - em rermos de gramiti." r"rr".irr" sujeitos.
se
em que regularidades desse gênero se deixam reconhecer e, em consequência, thnscendendo tanto as relações de causa e efe.-ito sobre o plano ftsico qíanto
tornam globalmente previsíveis os comportamentos do outro, nada impede I regularidades comportamentais programadas pelo social, as condurasã.,t-
aplicar às relações entre as 'þessoas" o mesmo modelo de gestão Iujeito", conforme sua definição, só podem provir da motiuação ou de razões.
que aquele que se considera mais apropriado quando se trata da gestão & certezas fundadas na necessidade - "a ágia fewe a 100 graus", "o policial
nossasielaçõès com os objetos "inanimados". É precisamente o que a lrve de raiva com a apaúção do arruaceiio" - cedem lug"ar a uma ielativa
do fazer ser autoriza por princípio e sem reserva ao estender, sob o manto }ßrrrc" , como saber ã que leva o outro a agir, se ele não"é nem uma coisa
noção aparentemente neutra de papel temático, aidéiade estritas l¡rc as coisas nem uma marionete? Do regiitro das interações baseadas em
de comportamento a todos os tipos de atores possíveis. Ft ou outro dos princípios de regakridad.e- causal ou social - que pressupõe
Náo é necessário sublinhar que a lógica daaçãLo assim concebida programação, passamos agora a outro regime, de tipo manipulatório
absolutamente de todas as teorias cl¿íssicas nesse domínio, teorias que, estratégico), baseado em um princípio de intencionalidad¿. Sobre esse
retomar os termos de Paul Ricoeur, fundam-se precisamente no postulado to, a literatura disponível em semióti ca é notadamenre mais abundanre e
que os jogos de linguagem referentes a "ações cumpridas pelos homens"
são redutlveis àqueles de que dispomos para tratar dos "acontecimentos
Ricæur, Da tøcte à l'action, Paris, Seuil, 1986, p. 169.Trad. port. Porto, Rés, 1990.
Interacões Ar¡iscadas Da Programação à Estratégia

mais conhecida que aquela relativa à modelizaçio da programaçáo. Isso nos t¡m dos actantes pelo outro. E se, no primeiro caso, as razóes para submeter-
dispensará de entrar em maiores detalhes5. sc àvontade do manipulador eram fundamenralmente de ordãm econômica,
O núcleo da problemática concerne às diferentes formas do"fazer fazer". ncste segundo caso, as motivações para dobrar-se a ela são essencialmente de
Uma primeira série de procedimentos, do tipo da tentação (ou da promessa) ordem identitária.
e da ameaçø, obtém sua eficácia, respectivamente persuasiva ou dissuasiva, Seja o que for, o manipulador propõe sempre ao ourro uma forma i
do valor, positivo ou negativo, dos objetos com os quais o manipulador se ou or.ltra de intercâmbio - barganha econômica ou chantagem à honra, ,i
compromete a retribuir - a recompensar ou a castigar - o sujeito manipulado, ou pelo menos, ao amor próprio. Assim, para alcançar seus fins, ele pode
conforme aceite ou recllse agir segundo a vontade de seu parceiro. Desse tcntat segundo os dados da situação, mostrar-se tentador: "Se queres fazer
modo, o processo apela à capacidade das partes para comparar entre si o valor t:rl coisa para mim, podes estar certo de que te recompensarei", ou julgar
dos diferentes valores em jogo e avaliar as vantagens e os custos da transação nrris eficaz parecer autoritário e ameaçador: "Tens ceÍteza de que te atreves
considerada. Em tais casos, já que se trata de intercâmbio entre valores, é a ¡ fazer isso contra minha vontade? Dar-te-ei o merecido", ou, ao contrário,
partir de røzões que podem ser consideradas em última instância como de como adulador e sedutor: "Tu sabes que te considero um gênio, um herói,
ordem econômica, que se estabelece (ou não) um acordo entre os respectivos t¡ttra mulher liberada: faz isto se não queres que passe a duvidar de ri", ou
projetos do manipulador e do manipulado. Antropologicamente falando, a lil¡almente provocador: "É claro que não és capaz de fazer isso. Prova-me o
manipulação assim entendida depende de uma problemática mais geral de contrário se náo queres que te tome por um imbecil, por uma donzela, por
troca e de contrato. um covarde, etc."
Junto a isso, formulas mais complexas, do tipo da lisonja ou da O que nos parece que deve ser reddo nesse esrágio, porque é o que
prouocøção, jogam com as conotações, positivas ou negativas, da imagern que ofcrcce o melhor critério de demarcação em relaçáo ao regime da programação,
1 o manipuladar faz ou pretende fazer daquele que deseja manipular. Nesse d o fato de que, no marco da manipulação, pelo menos um dos arores, isto é, o
caso, a idéia consiste em que o segundo cumprirá o programa desejado pelo nurnipulador em potencial, atribui ao seu parceiro, qualquer que esre seja (no
primeiro para demonstrar-lhe (e quem sabe, também para demonstrar-se) que (u¡o de Dom Quixote, são os moinhos), r* esraruro semiótico idêntico ao
está "à altura" do simulacro positivo que lhe é apresentado ou, ao contrário, quc reconhece para si mesmo: o de um sujeito. Isso implica que o ourro, sendo
que não é tão incapaz nem táo ruim como o outro crê ou finge crer. Aqui a eol¡siderado um sujeito, deve, do ponto de vista do primeiro, ser também capaz
manipulação encontra seu fundamento na motiudção propriamente subjetiva: dc rcconhecer ou de atribuir a seu interlocutor o estatuto e as competências
I ao sujeito importa tanto ser reconhecido como tal, com todas as ¡lc t¡m sujeito.
ã competências que isso envolve, que se sente obrigado a atuar co Mas além dessa capacidade de reconhecimento múruo, como em espelho,
a imagem que deseja oferecer (e oferecer-se) de si mesmo. Nèssa rl r¡ttc faz de cada um desses atores verdadeiros actantes sujeitos é sobretudo
forma, a interação estratégica já náo se desenvolve num plano "horizontal" unr tipo de competência específica, de ordem sintática e modal. Obviamente,
no qual os parceiros podem trocar valores objetivos, mas num eixo "vertical", lnr lu.sive as coisas, e de uma maneira geral os não-sujeitos, têm também certas
isto é, hierárquico, onde sua confrontação põe em jogo o reconhecimento hhilidades, uma "competêncid', no sentido defaculdade defazer. Mas se rrara
l0tlo de uma competência semanticamente determinada, que se reduz aos
'¡x¡xtis temáticos" dos quais temos falado anres - papéis cuja definição se opõe
5. Cf ent¡e outros, A.J. Greimas e J. Courtés, Dicionário de semiótica, op. cit. (vetbetes "Competência" I rl.r "competência modal" do mesmo modo que a noçáo de regularidade se
"Factitividade", "Manipulação", "Modalidade"); A. J. Greimas, "A propos dt jei', Actes
II, 13, 1980; id., "Le déÊ", Actes Sémiotiques,Y, 20, 1982 (reed. in Du sens II, Paris, Seuil, 1983); qrlk:r de intencionalidade e que, finalmente, a de programação se distingue da
Fabb¡i et E. Landowski (eds.), Explorations snatëgiques, Actes Sëmiotiques,Y7,25,1983; P t nurnipulação. Enquanto que o papel temático delimita praxeologicamenre
"Prolègomènes à une théo¡ie de l'action', Actes Sémiotiques,YII, 62, 1985; E. Landowski, A
s þur de um ator e faz dele um agente funcional, a comperência modal lhe
refletida, São Paulo, Pontes, 1992 (3' parte, "Interaçóes"); J.-M. Floch, Sëmiotique, marketing
communication, Paris, PUF, 1990; J. Alonso, "Scyles stratégiques et sémiotiques dans la Gr¡lirc, essencialmente, o querer que fará dele um "sujeiro". A essas distinções
Degrés, 102,2000; E. Bertin, "Penser la stratègie dans le champ de la communication", Noaueaux 6lrs¡rondem modos de relaçáo entre acrantes profundamenre diferentes.
Sémiotiques, W, 89, 2003.
Intcraçõcs Arriscadas Da Programação à Estratégia

Por um lado, sejam de ordem câusal ou de ordem social, as regularidades


de que depende o caláter programado dos comportarnentos de um ator têm
lncertezas da manipulação
por efeito produzir ao mesmo tempo identidades impermeáveis entre si e
Há evidentemenre aqui um paradoxo: para que o outro nos apareça
,

esferas de ação hermeticamente compartimentadas: um pode (e não pode


como manipulável (e não como programado), há que supor que suas ações
;

mais que) ousabe (e não sabe mais que) fazer isto - pescar -, e outro, aquilo: i
sáo intencionais, que seu comportamento é motiuado
governar. Cada um desempenha seu papel, segue seu programa ou executa seu j - e, ao mesmo tempo, é
precisamente isso o que rorna o exercício da manipulaçáo tão delicado. Para
plano de atividade por sua própria conta e em seu lugar, independentemente
do que possem estar fazendo os outros egentes que o rodeiam. Algo assim Prever com precisão a conduta do parceiro em uma circunstância determinada,
cm rigor seria necessário poder conhecer náo apenas seu ponto de vista em
como o que ocorre em uma empresa com organograma de divisáo do trabalho
rclação à situação considerada, mas também a ordem geral de suas preferências,
demasiadamente rígido ou, outrora, no sistema soviético dos colcoses da
tcu sistema de valores, e, mais amplamente ainda, os princípios orientadores
belle époqué. Cada um está inteira e exclusivamente dedicado a sua tarefa.
de szus juízos, o tipo de racionalidade que o guia. É, todo esse conjunro o
Os papéis temáticos circunscrevem, desse modo, funções especializadas cuja
que faz dele um sujeito semioticamente 'tompãrente", e por isso mesmo um
característica consiste em náo se comunicarem diretamente entre si.
interlocutor tão dificilmente previsível.
Pelo contrário, ao náo estar ligada a conteúdo predeterminado algum,
Isso ocorre não tanto por causa do número quanto em razio da natureza
ao não programar pragmaticamente nada específico, a competência modal,
dos parâmetros em jogo. Na realidade, p"t" q.t.m não quisesse interagir
atributo dos sujeitos (para os quais nãLo faz mais que articular em termos
oom seu parceiro a náo ser com pleno conhecimento de causa - com toda
precisos a intencionalidade que os constitui como tais), tem por efeito
tggurança - somente haveria duas soluções. A primeira seria poder reduzir
aproximar uns dos outros os actantes que a possuem, em vez de separáJos.
outrem ao estatuto de não-sujeito; em ourras palavras, teria que descobrir
Todo sujeito pode, assim, (e isso é o que o converte em sujeito "motivado"
Lipotéticas leis, ou ao,menos, regularidades objetiváveis, que programariam
e de "razão") quere¡ ou crer, ou saber, etc., e, por consequência, também
o cncadeamento das ações, e para isso, primeiro, dos estados de alma ou das
querer que o outro queira (ou não queira), crer que crê, saber que sabe etc.,
e fazê-lo saber. Compartilhada pelos sujeitos, essa competência propriamente ¡dxoes das pessoas. É o que se observa exemplarmenre em Maquiavel, cujo
Frlncipe conhece por experiência o grau exato de pressão necessário para
semiótica os habilita para se "comunicarerri' entre si e, por isso mesmo,
os faz manipuláveis uns pelos outros, tanto em funçáo de suas respectivas Jbjugar a qualquer um de seus vassalos pelo receio, a ganância ou o medo
motivações e razões, quanto a partir de cálculos que efetuam no que concerne
ù desonra. Ou, solução alternativa, ,. o o,rtro deve cãntinuar sendo uma
à competência modal de seus interlocutores. Josoa-sujeito, seria necessário poder identificar-se com ele e penetrar sua
snsciência (sem falar de seu "inconscienre"): proeza fora de todo alcance, e
Mas, uma vez mais, diferentemente do papel temático, nada disso tem otjo fantasma, náo obstanre, nos guia quando, no intento de persuadir ou de
por efeito encerrar os atores em esquemas comportamentais predefinidos. Iduzir alguém, começamos por rrarar de colocarmo-nos em rteu lugar" por
Resulta que, embora competência assim constituída dê motivo à interpretação
a
lcio de uma espécie de empatia. Felizmente, nesse domínio, a intuiçãó t.uËh-
(mais que a um conhecimento propriamente dito) e possa ser infuenciada
* com frequência mais eficaz que muitas práticas de caráter científico.
(sobretudo pelo "fazer persuasivo"), ela não pode ser a garantia, para nenhum
Tanto que em seguida, para escolher enrre a panóplia de procedimentos
dos interactantes, de qualquer ceÍtezafrente ao outro.
!rn ipulatórios disponíveis o que pudesse ser estrategicamente mais adequado
f¡ cada caso particular, a teorla não nos presta grande ajuda. Suponhamos
, apanhado em falta na estrada, eu não encontre argumentos para justificar
minha conduta. Que tipo de estratégia de persuasão adotar
uma situação desse gênero para que o policial encolerizado ei-lo aqui de
-
, agora incumbido de aplicar o regulamento -"façavista grossa"? Tratar
6. Cf. l.-P Petitimbert, "Entre I'ordre et le chaos, la précarité comme stratégie d'entreprise", ¡cd uzi-lo? Demasiado arriscado, poderia funcionar! Tentar ameaçáJo?
Sémiotiqaes, I 16, 20 13 (http://epublications.unilim.frl¡evues/as/).
Interações Arriscadas

As possibilidades são nulas. Lisonjeá-lo? Não seriadifícil, mas que humilhaçáo!


Entáo, na falta de melhor soluçáo, ver se haveria jeito de corrompê-lo com
alguma tentação? Por que não? Mas haveria de estar seguro de que esse CAP ITU LO III
gênero de regateio seja parte dos usos do lugar. Como podemos ver, toda
escolha estratégica expressa essencialmente a maneira como o manipulador PROBLEMAS DE INTERPRETAçÃO E DE
constrói a competência (volitiva, deôntica, cognitiva, epistêmica, etc.) do FRONTEI RAS
outro e o modo como localiza os pontos sensíveis, as falhas ou as zonas
críticas, suscetíveis, a seus olhos, de fazer manipulável seu interlocutor. Sob
o risco, evidentemente, de equivocar-se por completo. Deixemos, pois, que
nosso policial nos aplique a infraçio.

Cada um dos dois regimes que acabamos de evocar se define por urn
laiunto de características semânticas e sintáticas específicas e precisas. Mas essas
ffniçO.r técnicas, úteis para a descrição dos textos e das práticas significantes,
råo suficientes. Porque, uma vez definido o que exatamente se entende
cesas palavras,'þrogramação", "manipulação (e, logo, "ajustamento"),
a questáo de saber o que quer dizer, naprâtica- em nossas próprias
cotidianas ou aquelas dos grupos aos quais pertencemos ou estamos
-, o fato de nos conduzir de acordo com um ou outro desses
de interação, seja que recorramos a eles para agir sobre o contexto
þ contrário, que nos deixemos conduzir por programas ou manipulações
quais não somos responsáveis, mas que nos envolvem enquanto seu
Na verdade, entre esses regimes, a teoria define úansições, assim como
su perposições e combinações POSsrveß. N a_ plano das práticas,
a regra. Dei uma serle de Pro blemas de fronteiras e de limiares
rfl preciso examinar. Todavia, mesmo nessas condições, cada um deles
um estilo particular de relações com o mundo e com o outro, o que
outra série de problemas, desta vez de interpretação. Com efeito, em
opiniíro, além da elaboraçáo de conceitos operacionais, além mesmo das
lxrssfveis, uma das vocações, senão a principal, da abordagem semiótica
a significação moral, as implicações políticas, o potencial estético,
¡ul:tvra, o valor existencial, como dissemos inicialmente, das práticas
de sentido que implementainos, conscientemente ou não, por
ou apenas por hábito, para responder à diversidade das situações que
c tkrs encontros que experenciamos dia após dia. Q,r"l é, pois, num
Interaçóes A¡riscadas Problemas de Interpretação e de F¡ontei¡as

plano geral, a significação que implica cada um dos regimes de interaçio até Porque, se o estrategista-manipulador reconhece o querer do outro e, melhor
aqui considerados? linda, conhecêlo em profundidade, a torná-lo tão transparente
se se dedica a
quanto possível, a detectar suas determinações (entendendo-se que, se o querer
funda o sujeito, náo pressupõe necessariemente sua autonomia), é unicamente
Do tecnológico ao polít¡co para manipulálo com maior segurança, para ganhar mais poder sobre ele,
Ituando sobre suas motivaçóes e suas razóes, eventualmente as mais secretas.
Aprogramação preside,em primeiro lugar, as atividades de tipo tecnológico Ncsse quadro, o reconhecimento do outro'enquanto sujeito nãlo é,, portanto,
que concernem as nossas relações com as coisas. Mas ela pode também subjazer mais que um momento necessário no processo de dominá-lo e instrumentalizâ-
a um modo de organização social e política de tipo tecnocrático, no que tange -lo mediante a obtenção, mais ou menos forçada, de seu consentimento.
às relações entre as pessoas. Dado que esses dois aspectos podem muito - Outras tantas limitações que desenham o contrário da configuração que
bem seguir de máos dadas, quanto melhor se conseguir conjugáJos, mais se lpresentaremos mais adiante sob o nome de regime de ajustamento.
aproximará de um regime de segurança perfeita, sem acidentes nem desvios de No entanto, entre programaçáo e estratégia, a fronteira náo é tã;o
qualquer tipo. Sua aliança culmina na organizaçáo de sociedades totalit:írias ¡t¡nque quanto pode parecer. Em primeiro lugar, ela não coincide senão
de tipo burocrático, espécies de máquinas humanas a serviço da máquina de ¡p¡rentemente com aquilo que separa o universo das coisas inanimadas e a
produçáo. Aí, como no filme de Fritz Lang, Mentípolis, as coisas se submetem cnr social das relações entre pessoas ou coletividades humanas. De fato, se
estritamente a seu modo de emprego e os indivíduos se encontram reduzidos O clcmentos do mundo natural - o que chamamos "as coisas" - são o que
a uma só e única função: servir a Moloch, figura emblemática do complexo lo para nós, a saber, entidades privadas de motivações e razóes, é somente,
tecnológico-econômico. Alcançado seu ponto de perfeição, o aparato assim F fundo, em função do olhar objetivante - reificante - que projetamos
concebido aliena tão radicalmente os homens, reduzindo-os táo bem ao bbitualmente sobre eles. Isso equivale a admitir, em conformidade com um
estatuto de executantes programados em função das necessidades da máquina, il postulados elementares da semiótica narrativa, que o estatuto actancial
que é apenas ela, a máquina, que pode eventualmente inverter o processo, Ò ut ator qualquer, isto é, o tipo de competência que lhe será reconhecido,
adquirindo por sua vez a competência própria de um sujeito, justamente llo ¿ dado no plano ontológico mas resulta de uma construção efetuada
aquela que os homens perderam. Como se, a partir de um certo estágio de
fdo observador. É, porque eu decido - eu mesmo ou minha cultura, mas
desenvolvimento, o robô fosse capaz de ultrapassar seu próprio programa, de se fnmcnre não a natureza - que os homens, diferentemente das coisas, têm
voltar contra o sistema que o produziu e tomar a iniciativa da revolta. Simples It'querer", Que me parece natural os rnanipukr (politicamente), dirigindo-
ficçáo, ou pretguração do que a sociedade cibernética está às vias de cumprir? ,.1 r ruas motivações e a suas taz6es, enquanto que eu não pretenda senão
A manipulação - e mais amplamente a estrdt¿giã, que desenvolve jnotrar (tecnologicamente) as coisas, jogando com as causas que as
uma maior escala a mesma lógica do"fazer fazeÍ" - constitui, em seu ,llnrmin"m enquanto entidades "inanimadas", QU€r dizer, "sem alma". Mas a
o recurso das sociedades civis fundadas na interdependência dos inversa não é excluída a priori. Evidencia-o o fato de que, em culturas
Nelas, a atividade de base toma a forma de um trabalho político, n&¡ são necessariamente muito distantes nem particularmente primitivas,
essencialmente como um trabalho de persuasão que visa ao acordo entre práticas de interação, ditas mágicas, frequentemente muito eficazes,
vontades, acordo esse explicitamente consagrado, ou não, sob a forma ftlx)usam sobre a atribuição das qualidades mais características de um
contratos. Interagir desse modo é, portanto, em primeiro lugar, atribuir - uma intencionalidade, uma vontade, boa ou má, uma capacidade
outro ou nele reconhecer uma 'Tontade" e, apartir daí, procurar pesar sobre - a objetos quaisquer do mundo não humano, dos mais sagrados aos
razões de agir: é tentar fazë-lo querer isso e não aquilo, de modo que - de triviais (como o computador que nos "quer mal" e diante do qual nos
grado ou, como se diz, 'ã morte na alma" - náo possa deixar de querer os para não bater nele). E do mesmo modo, nada exclui tampouco
o que se planeja a seu respeito. Isso equivale adizer que aqui o t¡s de fazer a isso alusáo - a possibilidade de interagir com nossos
do outro enquanto fonte de vontade não equivale, propriamente falando, não mais politicamente, tratando-os como sujeitos de razáo,
reconlftcêJo como oatro enquanto tal, por si mesmo, enquanto c de paixão, mas tecnocraticamente, ou mesmo tecnologicamente,
Interaçóes Arriscadas Problemas de Interpretaçáo e de Fro¡teiras

como se eles se reduzissem a entidades programáveis, ou pior, a uma matéria ¡,or definição, não é uma coisa submetida a regularidades de tipo causal,
é
já, programada. Todas essas possibilidades formam sistema, e cada uma delas lrct¡uentemente diffcil ver de antemão em que nível tais qualidades poderiam
encontra, antropologicamente, várias ilustrações concretasl. .c nrenifestar. Até mesmo sucede de encontrar-se frente a comPortamentos
Mas matizar ou dialetizar a oposição enrre programaçáo e esrrarégia rlr¡c parecem depender de motivações tão inaPreensíveis que todo prognóstico
não é somente admitir que se trata de uma distinçáo cqa aplicação varia em rolntì-se, à primeira vista, impossível. Porém, mesmo em tais casos, não é
função da relatividade dos contextos ou das culturas. É também reconhecer rrrr¡rossível descobrir em um nível subjacente algum princípio invariante
a pluridimensionalidade e, por conseguinte, a polissemia das grandezas de rfuc, desvelando as razóes da aparente "sem tazáo" dos comportamentos
todas as ordens com as quais podemos tratar. Se o sentido não é encerrado rr¡¡ctli:rtamente observáveis, possa, apesar de tudo, servir de Ponto de apoio
objetivamente nas coisas, também não está submetido à pura subjetividade f,¡r.r cscolher procedimentos interativos adequados. Um exemplo tomado da
dos pontos de vista. "Tlansversal" em relação a essas distinções, ele depende r,x iologia eleitoral nos permitirá explicitar esse ponto.
certamente do olhar do sujeito, mâs somente nos limites que impõem as 'lbdos os estudos especializados demonstram que, ainda que os eleitores
estruturas imanentes dos próprios objetos levados em consideração. Disso ynt(.nì com toda liberdade (o que é o mínimo Por sujeitos expressando-se
decorre a plurimodalidade possível de toda interação, inclusive entre humanos. .lclrtro cle um Estado de direito), o sufrágio é, em geral, globalmente previsível.
Considere-se a relação entre médico e pacientet. E porque o segundo se l¡¡.1,, sc passa como se ele dependesse quase diretamente de uma combinação
apresenta como uma pluralidade de instâncias que o primeiro pode escolher ,le ¡r.rrirnetros objetiváveis, entre os quais se encontram, principalmente, a
entre diversos regimes de interação, isto é, nesse caso, de üatamento. Ele pode ¡l¡rlc, () sexo, o nível de escolaridade e de renda, o meio profissional e social,
primeiramente considerar o paciente como um simples organismo doente - o r lrlr.r5:rrr religiosa e alocalizaçáo geogrâfrca. Isso é o que tornou possível uma
corpo-objeto que ele ausculta se presta a isso - e programar sua cura remetendo "¡r,,¡rrrfìl da opinião política", Para retomar os termos de seu fundador' André
aos efeitos fisiológicos previsíveis, uma vez experimentalmente estabelecidos, \r¡¡lrictl'. Há por exemplo, na França, regiões de domínio católico onde se
dos medicamentos apropriados. Mas o mesmo médico pode também se dirigir nrtr rrr;rioritariamente na direita, e regióes "descristianizadas" tradicionalmente
ao doente enquanto corpo-sujeito - â pessoa que vem consultá-lo talvez f¡rrrr.ivr.is à esquerda, como se o comportamento eleitoral esdvesse socialmente
preferiria que fosse assim - e intentar curar o mesmo mal, conside¡ado sob Vt¡r,tttttrrlo pera um ou outro lado do tabuleiro político. Isso é o que, em
outro ângulo, por uma estratégia de persuasão pertencente, de perto ou de l¡tnt lpi( ), fìlrnece aos partidos uma base sólida para empreender suas estratégias
longe, à psicoterapia. Ou ainda, já que um não exclui o outro mas que, muito .b r ¡ll¡P;llìlìa.
pelo contrário, os dois têm chance de reforçar-se mutuamenre, o traramento No cntanto, como a impressa o constata ironicamente quase a cada
poderá conjugar a intervenção fundada no princípio científico de causalidade .! nrt tlr i(), cssâs constantes de fundo não impedem que os institutos de pesquisa
e a manipulação de ordem intersubjetiva.
* ,,¡,¡¡¡i,¡¡¡ sc equivoquem em suas previsões. Hoje, se assiste cada vez mais
frc.¡rr,.rrrt.rn",lt. ã "terremotos" eleitorais que, indo em sentido contrário a tudo

Regularidade da irregularidade fr rr. .rr r('(lirava saber, parecem despojar de toda credibilidade as hipóteses da
trx,l,,1,,r.r .'lcitoral. As regiões consideradas conservadoras se põem a votar
il.o¡rr,.rtlrr, c vice-versa. Como explicar esses deslocamentos, essas aParentes
Seja como for, para interagir com o outro limitando os riscos, C fr.;,,i.,,r.l.rtlcs com relação às "leis;'da ciência política? É necessário admitir
imprescindível poder contar com um mínimo de constância da sua parre e, r¡r., \,'r(,, iurtes estável e explicável - Siegfried descrevia a França política de
portanto, de previsibilidade em seus comportamentos. Mas como outrem, lf rf¡r¡¡(.rrrrr sóculo -,agoÍasetornoualeatório?Issoequivaleriaadizer queas

1. Cf. E. Landowski, I Sociedade refløida, op. cit., cap. 1 1, "Explorações estratégicas".


I t r,,.nr...,1. trl,lrau politique de k France de I'oøest sous h III klpabliqu¿, Paris, Colin, 1913, e "Une
2. Cf.E. Landowski, "Faire signe, faire sens: régimes de signification du corps", Passions sans nom, op. cir.,
frgryr.-,1, l,'l,inionpoliriqueest-ellepossible?",NouaelleReuueFrønçaise,nov.7937, assimcomo
cap. 4.'frad. port. in M.A. Babo e J.A. Mourão (orgs.), O campo da semititica, Reaista de Comunicação e ifÉ *.r.,. ,1,,,,.. rcxtol .- À.¡. Greimas e E. Landowski (orgs.), Intodução à análise do discarso em
Linguagens, 29, Porto,200 1, pp. 27 l-286. t.n¡ -"...,, \.r,, l':tulo, Global, 1986.
Inte raçõe s Ar¡iscadas Problemas de Interpretaçáo e de Fronteiras

escolhas dos eleitores náo são mais nem programadas por qualquer conjunto esquerda quanto um de direita. O que ocorre é que os partidos de ambos os
de fatores sociais identificáveis, nem sequer motivadas por uma racionalidade lados rivalizam entre si para tirar proveito desse sentimento de insegurança, de
objetivável - em outros termos, que os cidadãos já náo têm identidade política modo que o eleitor pode passar alternativamente de um extremo a outro com
definida. Do ponto de vista dos candidatos, semelhante conclusão teria o a intenção precisa de alcançar em todos os casos o mesmo objetivo. Para ele, o
inconveniente imediato de priváJos de todo ponto de referência no momento importante consiste em exprimir, por qualquer meio que seja, esse sentimento
de definir uma linha de conduta a fim de atrair os eleitores. Que discursos lhes persistente de insegurança que o motiva fundamentalmente. Nessas condições,
dirigir para convencê-los, persuadi-los ou seduzi-los, se a inconstância de seu ¡ua inconstância de superflcie, no nível do voto, náo îaduz, em definitivo,
voto deve ser interpretada como a manifestação de uma pura irresolução? uma inquietante irresolução, mas, ao contrário, um desejo profundamente
Para sair desse impasse, devem-se distinguir dois planos. Admitir-se-á cnraizado, de ordem por assim dizer existencial, e, portanto, durável: ela reflete
primeiramente que, em superftcie, a escolha de uma boa parte do eleitorado r visão ansiosa que esse grupo social faz da situação de concorrência estatutária
depende de fatores contingentes, por exemplo, do " looþ" , desigualmente nl qual a evolução demográfica e social o tem colocado.
etrativo, das personalidades que representam localmente cada partido. Mas Encontra-se, essim, um nível de regularidadeláronde a incertezaparecia
se formulará também a hipótese de que talvez, mais em profundidade, exista lnicialmente dominar. Esse resultado náo a:utoriza certamente a considerar o
uma determinação de caráter menos leviano, da ordem da motivação ou da dcitor como mecanicamente determinado por sua condiçáo socioeconômica,
programação (ou que articule as duas), que conduz a categoria problemática ñrs impede, em todo caso, de imaginá-lo como um sujeito imprevisível
dos eleitores considerados "instáveis" a votar uma vez na esquerda, na seguinte ¡lo escutando senão a voz errática de seu "livre arbítrio". Uma campanha
na direita, e talvez uma outra vez unda a se abster, e que essa determinação é, *itoral concebida sobre uma tal base deveria procurar articular um discurso
ao contrário, relativamente constante, interpretável e, portanto, indutora de llntégico visando diretamente às motivações do eleitorado e um discurso
efeitos previsíveis. Pois, de um modo mais geral, não é necessariamente porque fogramático integrando o conhecimento que se pode ter das determinações
se é irresoluto, isto é, sem razóes nem motivações, que de um momento a lcl¡is das ditas motivações.
outro se troca de posição; ao contrário, isso ocorre com frequência porque,
em um segundo nível, há justificativas boas, e estáveis, para serem variáveis
em um primeiro nívela. I perte do simbólico
O que é suscetível de constituir esse núcleo estável subjacente pode
ser de nàtvreza extremamente diversa, pois seu conreúdo depende do tipo No entanto, não parece ainda suficiente admitir que programaçáo e
de configuração sociopolítica no qual os agentes se encontram colocados. No longe de se opor em todos os casos, possem se conjugar. Talvez fosse
entanto, quando se procura compreender a volatilidade atual de uma grande te superar, ou pelo menos, relativizar a oposiçáo mesme entre leis de
parte do corpo eleitoral, há um fator que ressalta com particular frequência. e princípio de motiva$o. Pois entre esses dois extremos, adivinha-se
Sabe-se que o sentimento de insegurança, seja profissional ou de estatuto, e às tþc haver lugar para outra coisa ainda. Empiricamente, entre programação
vezes até pessoal, que engendra geralmente, além de um determinado limite, cat¡sal e escolhas motivadas, ou justificadas por alguma nzio, encontraln-
a vizinhança de populações de origem estrangeira ou oriundas de regiões pllno coletivo, práticas ritualizadas e, no plano individual, toda sorte de
economicamente, socialmente, culturalmente distintas tende a produzir cotidianas enquadradas pelo uso, pelo hábito, pelo costume, pelas regras
comportamentos defensivos do tipo xenófobo5. E, coisa surpreendente, se viver ou simplesmente pela moda - maneiras de se vestir, de conversar,
constata que pode,resultar, aleatoriamente à primeira vista, tanto um voto inr o espaço da casa, de divertir-se, de alimentar-se, de cuidar-se, e
tnr tliante -, cuja estabilidade (ainda que seja somente relativÐ parece
r "programações" de ordem intermediária, mais diffceis de definir que a
4. Cf . Passions sans notî, op. cit., "Formes du goût: I'inconstance nécessaire", pp. 248-250.
c¡r¡salidade. Acima, nós as caracterizamos provisoriarnente, em termos
5. Cf por exemplo N. Elias e J. L. Scotson, The Established an the Oatsid¿rs: a Sociological Enqairy
o v¡rgos e, devemos reconheceS quase tautológicos, como decorrentes
Communiry Pro blems, I-ondres, Sage, 1 965. social". De que se trata mais precisamente?
r
Interaçóe s Arriscadas Problcmas de Interpretaçáo e de Fronteiras

O ponto delicado é que, embora esses algoritmos de comportamento de cozinha e as prateleiras do aparador; de outra parte, a tareft da abelha
de caráter rotineiro e, se se preferir, estereotipado, apresentem-se de modo que, também carregada de provisões, retorna à colmeia, táo preocupada
quase tão regular e aparentemente tão coercitivo como se fossem causalmente quanto a dona de casa de fazer reinar a ordem no seu lar. Ainda que a senhora
determinados, eles, ao mesmo tempo, a maior parte das vezes eparecem provavelmante execute seu trabalho de organizaçáo sem nem mesmo nele
seja como queridos, seja, pelo menos, como assarnidos por aqueles que se pensar, ou, como se diz, pensando em outra coisa (ou talvez em nada), se fosse
conformam, como se a seus olhos fizessem parte da ordem natural das coisas. nccessário - se alguém lhe perguntasse - ela estaria certamente em condições
Isso quer dizer que tais regularidades, longe de se imporem sem razáo ou dc justificar sua maneira de organizar as coisas. Têm para isso mil argumentos
motivo ou de serem seguidas como puros automatismos'ãnônimos" (como diz substanciais, de ordem funcional ou estética: "Porque assim é mais cômodo,
Merleau-Ponty, falando do corpo6), exprimem, ainda que seja confusamente, nrais saudável, mais bonito, etc.". E, na falta deles, saberia justificar mais
do ponto de vista dos agentes envolvidos, algo de sua idenddade. Se para eles formalmente, em termos autorreferenciais: "É como tenho feito sempre", ou
essas condutas são "inquestionáveis", é porque por trás delas há sentido, ainda linda, à maneira dos pais que, cansados de explicações, invocam a evidência
que o conteúdo preciso desse sentido não seja, ou não seja mais, diretamente indiscudvel: "Porque é assim e ponto final" - o que constitui, filosoficamente,
acessível. "Por que esse rito particular? Por que se faz desse modo? - Porque I ¡nclhor das razóes para o ente ser o que é, e, semioticamente, uma maneira
é assim que se faz, porque é assim que se deve fazer". Isso quer dizer que se corrro qualquer outra de remeter a uma autoridade superior, à figura do
trata de uma necessidade de ordem sirnbólica. Regulando os comportamentos ïc.stinador" qr'r. se supõe ter instituído, evidentemente por boas razões, o
enquanto práticas significantes, programando-os num modo propriamente urt) cm questão. Se semelhantes justificativas estáo ao alcance ta"mbém de
sociossemiótico, esse tipo de concreções socioculturais - ritos, usos, hábitos lllttr criança a propósito de não importa qual de suas práticas, elas estão, ao
- introduz um coeficiente de previsibilidade nos comportâmentos e, desse "' Gontrário, fora do alcance da abelha de nossa história, e ainda, pelo que se sabe,
modo, fornece uma base que permite definir, em relação com os atores & toda abelha. Tämbém elas cumprem algoritmicamente suas tarefas caseiras,
sociais, procedimentos interativos eficazes, a meio caminho entre manobras Dü scm que se coloque - nem, até onde se sabe, possa de algum modo se
fundadas sobre o conhecimento de determinações estritas, de ordem causal, e Oloc,¡r - a questão do sentido de sua prática. Retorna-se, portanto, nesse caso,
manipulaçóes estratégicas, que apelam diretamente à competência modal das lpr,rgt"-"çáo snicto sensa, excluída toda motivação.
pessoas-sujeitos. l'.m outras palavras, um algoritmo pode ser motivado, ou não. Se ele
Mas levar adiante o valor simbólico assumido de comportamentos d, c( porque se inscreve no quadro de uma programação stricto senstt,
que procedem do hábito, do ritual e de outras formas de regularidade que por um princípio de regularidade que pode ser de ordem física,
escapam à ordem da causalidade nem constitui uma descoberta nem resolve ou de qualquer outra natureza, mas que remete em todos os casos
todos os problemas. Equivale simplesmente a constatar que, quando é In¡¡ li¡ rma ou outra de causalidade. É, o regime do qual dependem em
necessário, os agentes são de qualquer modo e em qualquer grau capazes dc l¡rio as coisas, ainda que, dado o caso, possa valer também para os
justificar por motivações ou razles a regularidade dos comportamentos em s, como acontece quando algum poder irresistível venha a reduzi-los
questão, explicitando o sentido que eles tomam a seus próprios olhos. Em lrt.¡tuto de coisa (veja-se Fritz Lang), ou como poderiaadvir também se
consequência, por que não admitir que esses comportamentos, apesar de seu hllr¡"nr renunciassem a sua própria competência modal, situaçáo limite
aparente automatismo, são rnotiuados, e não, ou não apenas j)rogramados? n¡r, l)áìrece absolutamente impensável, por exemplo num contexto
Para comparar entre si coisas comparáveis, consideremos duas práticar .r.¡ucle da ficção científica. Em contrapartida, excetuados esses
fortemente reguladas, que apresentam inclusive o aspecto de r¡rÍcrììos, e deixando de lado também os comportamentos ou gestos
imutáveis: de uma parte os procedimentos seguidos pela dona de casa r¡tc reflexos", redrzíveis ao neurofisiológico, admitiremos, levando
ao retornar do mercado, distribui suas provisões entre a geladeira, o ßrntJ () que antecede, que o conjunto dos comportamentos humanos
, antropomorfos, que é sempre possível de atribuir a qualquer
irlade não humana) dependem da motivação e do princípio de
6. Cf. Fenomenologia da percepçã0, op. cit. (pp. 98-104 na edição francesa) h¡l¡¡lithde. Como se acaba de ver, mesmo os algoritmos tão rotineiros
Problemas de Interpre tação e de Fronte iras
Interaçóes Arriscadas

e "insignificantes" quanto aqueles da dona de casa arrumando o quarto, ou Duas formas de motivação
tão automatizados e, como se diz, "dessemantizados", quanto, por exemplo,
o modo de dar nó na gravataou de lavar as mãos, podem, em certo sentido, Em primeiro lugar, temos uma motivtçio snicto tensu. E aquela que
ser considerâdos como motivados. motiva o "inventor do quotidiano" descrito há alguns anos Por Michel de
Contudo, em lugar de se limitar a executar mecanicamente esse gênero (ìerteau, isto é, o sujeito desejoso de questionar a cada instante e eventualmente
de esquemas de comportamento já inscritos na memória individual, familiar, de redefinir o sentido que dá aos objetos que o rodeiam, mesmo os mais
profissional ou, mais amplamente, social (reservando-se sempre a possibilidade banais, assim como a suas próprias práticas, incluídas aquelas consideradas
de dizer que se os seguimos é porque os consideramos justificâdos por tal ou como mais óbvias. Desse modo, ele reconstrói cada dia seu próprio mundo
qual.razáo),pode-se ressemantizá-los e, por mais triviais que sejam, transformá- c¡ìquanto universo significantes. Em segundo lugar, há uma motivação
-los em práticas concertadas: lavar as mãos, fazer sua cama, organizar suas qrrc se limita a acompanhar a realização de pfogramas de comportamento
coisas como todo mundo, certamente, mas não exatamente da mesma maneira: xrcialmente regulados, explicitando o valor simbólico que lhes é possível
a seu próprio modo, redefinindo, reatribuindo motivo a cada detalhe dessas üsociar. Enquanto a primeira é uma motivação uítica aPta a fundamentar
operações, um pouco como o músico que, em vez de seguir ao pé da letra o lecisões - é ela que age para abolir ou instituir práticas determinadas -' a
enunciado de uma partitura daria a sua execução o valor de um novo ato de r¡¡rrnda, de tipo ,onlrniual, subjaz \ execução di práticas instituídas. É a
enunciação. Mais ainda, quando se observa como aparecem novos esquemas er¡r.s motivações de segundo tipo que fecorfem, em caso de necessidade, os
de comportamento, constata-se que o que os faz nascer é frequentemente um Njcitos que utilizam os objetos em conformidade com sua função atribuída
gesto inaugural de oposição deliberada aos algoritmos fixados que o meio - corn sua"ffirdance"e: se me assento nesta cadeira, é porque uma cadeira é
apresenta como a normaT. A moda, o bom tom, o bom uso, as boas maneiras, o h|¡a para se sentar -, olr, de um modo mais geral, que executam sem Pensar'
tmlt¡uinalmente", algoritmos socialmente predefinidos, mas conservando
bom gosto, o bom senso desejariam que se faça d¿ste modo, mas o sujeito julga
melhor e então resolve fazer d.esse outro... Sem dúvida, é necessário de novo Imprc a capacidade de reivindicaÍ e, até certo ponto, de demonstrar sua
estar "motivado" - e inclusive fortemente motivado - paraseguir assim, contra (e
Jrttirrôncia se somente se) necessário.
a corrente. A tal ponto que a motivação que então entra em jogo não pode lì.csultam dessas observações três configurações fundamentais: num
ser exatamente da mesma natureza que a do conformista que se compraz em tlllcrrro, regularidades de comportamento causølrnente determinadas,
respeitar os usos e justifica o fato de observá-los dizendofse) que lhe parecem as noções de motivação e de
frryl.rrneções em sentido estrito, para as quais
racionais, agradáveis, apropriados ou de qualquer maneira bem-vindos. btOn. ionalidade não sáo pertinentes; no outro extremo, comportamentos que
Aqui, portanto, é novamente necessário chegar até o final do raciocínio: I r. ¡xrtlcm relacionar com a cornPetência modal de sujeitos guiados Por uma
da mesma maneira que distinguimos duas formas de programação, uma fundada )Xtvlçiio de ordem decisional, para os quais o que agora nio é Pertinente
sobre regularidades fisicas ou biológicas procedentes da causalidade, outra sobrc l r. rroçíres de programação e de causalidade; e, mais interessante, entre os
regularidades de comportamento de ordem social e simbólica, devemos agorl þ, t,rnjugando a programação de ordem simbólica e a motivação de ordem
admitir que a noçáo de motivação também toma duas formas distintæ. lrrrrrrrrl, prograrnações rnotiuadas , ou se for preferível, motiuações ?rogra.madas
F rlt,r lrrgar a comportamen tos de nafiJÍeza complexa, senão paradoxal,
ntcntc automatizadas e suscetíveis, no entanto, de serem assumidos
r ollcdecessem a boas razões ou a bons motivos - comportamentos'

ll .fr ( crtc:¡rr, L'inuention du quotid.ien, Paris, UGE, 1980. Tiad. port. A inuenção do cotidiano,
þrrr,,, Vrrcs, 1994.
7. Cf. A.l. G¡eimas, "Le beau geste", Recherches Sémiotiques / Semiotic Inquiry,Xlll, 7 -2, 1991, c
comentário in "O semioticisra e seu duplo" (i¡ A.C. de Oliveira e E. Landowski (orgs.) , Do intdiglnl f f r.rlrrrrn,"'t'heTheoryofAffordances",inR.ShaweJ.Bransford,Perceiuing,Acting,and
sensíuel. Em torno da obr4 de AJ. Greirtas, São Paulo, Educ, 1 995).
t'r'
Problemas de Interpretaçáo e de Frontei¡as
Interações Arriscadas

e "insignificantes" quanto aqueles da dona de casa arrumando o quarto, ou Duas formas de motivação
tão automatizados e) como se diz, "dessemantizados", quanto, por exemplo,
o modo de dar nó na gravata ou de lavar as mãos, podem, em certo senddo, Em primeiro luga¡ temos uma motivaçáo stricto ttnto. E aquela que
ser considerados como motivados. motiva o "inventor do quotidiano" descrito há alguns anos por Michel de
Contudo, em lugar de se limitar a executar mecanicamente esse gênero Certeau, isto é, o sujeito desejoso de questionar a cada instante e eventualmente
de esquemas de comportamento já inscritos na memória individual, familiar, de redefinir o sentido que dá aos objetos que o rodeiam, mesmo os mais
profissional ou, mais amplamente, social (reservando-se sempre a possibilidade banais, assim como a suas próprias práticas, incluídas aquelas consideradas
de dizer que se os seguimos é porque os consideramos justificados por tal ou como mais óbvias. Desse modo, ele reconstrói cada dia seu próprio mundo
qual razão), pode-se ressemantizá-los e, por mais triviais que sejam, transformá- cnquanto universo significantes. Em segundo lugar, há uma motivação
-los em práticas concertadas: lavar as mãos, fazer sua cama, organizar suas quc se limita a acompanhar a realização de programas de comportamento
coisas como todo mundo, certarnente, mas não exatamente da mesma maneira: locialmente regulados, explicitando o valor simbólico que lhes é possível
a seu próprio modo, redefinindo, reatribuindo motivo a cada detalhe dessas l¡¡ociar. Enquanto a primeira é uma motivação crítica aPte a fundamentar
operações, um pouco como o músico que, em vez de seguir ao pé da letra o tcisAes - é ela que age para abolir ou instituir práticas determinadas -' â
enunciado de uma partitura daria a sua execuçáo o valor de um novo ato de ttgunda, de tipo ,oolrriual, subjaz à execução di práticas instituídas. É, a
enunciação. Mais ainda, quando se observa como aparecem novos esquemas I¡s motivações de segundo tipo que recofrem, em caso de necessidade, os
de comportamento, consteta-se que o que os faz nascer é frequentemente um Ifeitos que utilizam os objetos em conformidade com sua função atribuída
gesto inaugural de oposição deliberada aos algoritmos fixados que o meio . oom sua"ffirdancd'e: se me assento nesta cadeira, é porque uma cadeira é
apresenta como a normaT. A moda, o bom tom, o bom uso, as boas maneiras, o ln poro se sentar -, ou, de um modo mais geral, que executam sem Pensar,
bom gosto, o bom senso desejariam que se faça deste modo, mas o sujeito julga hquinalmente", algoritmos socialmente predefinidos, mas conservando
melhor e então resolve fazer desse outro... Sem dúvida, é necessário de novo ftprc a capacidade de reivindicar e, até certo ponto, de demonstrar sua
estar "motivado" - e inclusive fortemente motivado - paraseguir assim, contra se (e somente se) necessário.
a corrente. A tal ponto que a motivação que então entra em jogo não pode Rcsultam dessas observações três configurações fundamentais: num
ser exatamente da mesma nattJreza que a do conformista que se compraz em regularidades de comportamento caasalmente determinadas,
respeitar os usos e justifica o fato de observá-los dizendotse) que lhe parecem maçóes em senddo estrito, para as quais as noções de motivação e de
racionais, agradáveis, apropriados ou de qualquer maneira bem-vindos. ionalidade não são pertinentes; no outro extremo, comportamentos que
Aqui, portanto, é novamente necessário chegar até o final do raciocínio: I pxlcm relacionar com a cornPetência modal de sujeitos guiados Por uma
da mesma maneira que distinguimos duas formas de programação, uma fundada ordem decisional, para os quais o que agora náo é pertinente
sobre regularidades fisicas ou biológicas procedentes da causalidade, outra sobre ¡ noções de programação e de causalidade; e, mais interessante, entre os
regularidades de comportamento de ordem social e simbólica, devemos agora conjugando a programação de ordem simbólica e a motivação de ordem
admitir que a noção de motivação também toma duas formas distintas. , p ro grarnaç õ es rno tiu adas , ou se for preferível, rnotiuações Progrd.rnadas

dlo lugar a comportamentos de natureza complexa, senão paradoxal,


automatizadas e suscetíveis, no entanto, de serem assumidos
r obcdecessem a boas razões ou a bons motivos - comPortamentos'

I ( c¡tcau, L'inuention du quotid'ien, Pa¡is, UGE, 1980. Tiad. pott. A inaenção dt cotidiano,
¡. V¡zcs, 1994.
7. Cf. A.J. Greimas, "Le beau gest€', Recherches Sémiotiqaes / Semiotic Inqairy,Xlll, l-2, 1993, e nos¡o
comentá¡io in "O semioticista e seu duplo" (in Â.C. de Oliveira e E. Landowski (oræ), D¿ inteligracl n
(itl¡on, "The Theory of Affordances", in R. Shaw e J. Bransford, Perceiuing, Acting and
sensíuel. Em torno da obral dz AJ. Greirnas, São Paulo, Educ, 1995). llft
T
Interações ¡riscadas P¡oblemas de Interpretaçáo e de F¡onteiras

portanto, dessemantizados enquanto práxis praticadas e, ao mesmo rempo, o programa como um todo não analisado, convencido de que é a própria
ressemantizáveis por menos que o sujeito se veja levado a reposicionar-se como rt a maneira "natural" de fazen
observador de sua própria prâtica. "neit",
Para o sujeito cujo comportamento se encontra regulado desse modo,
De modo correlaro, podem-se imaginar três figuras -tipo o atiuo tudo se p"rr" .o-o se qualquei um - ele mesmo ou uma instância destinadora
Puro, q[e nem por um instante deixa de executar seus programas, sempre superioi - tivesse ,t- di" dãcidido, depois de uma madura reflexáo, o melhor
os mesmos, sem jamais se pergunrar por quê; o pensatiuo ueleidoso, que, ao urã ,r" matéria e instaurado de tal sorte o que se converteria mais tarde em uma
contrário, interroga-se a tal ponto a respeito de suas motivações e razões de instituição, um modo de fazer que se deve respeitar com toda confiança, seguir
agrr, sobre o que desejaria, sobre o que deveria ou sobre o que poderia fazer, às cegas, "em nome do pai", se nos errevemos a dizer - do pai fundador. seu
que, afinal, nunca faznada; e entre os dois, o semi-programado-semi-motiuado, nomã pode bem ter sido esquecido com o temPo, mas seu gesto' impresso nas
que mantém sua reflexáo sob reserva por trás do que faz ou, o que é quase o memóiias, continuar inesquecível, sendo indefinidamente repeddo. Sabe-se,
mesmo, age esquecendo (ou talvez só com a condiçáo de esquecer) que está rc está convencido de que esse encadeamento preciso de.gestos teve uma vez,
fazendo o que ele escolheu fazer - ele mesmo ou o Outro (o destinador) em num dado lugar, na origem, um sentido, uma tazio de ser, motivos totalmente
quem confia. Chamemo-lo SenhorTodo-Mundo. Quanto ao quarro caso, o do claros. O fat; de que tenham sido perdidos de vista não os impede de existir
Sujeito que teria a "consciência" de tudo que faz e que a cadainstante saberia G, se fossem bem procurados, certamente seriam reencontrados. Se o
costume
exatamente por que faz o que está fazendo, verdadeiro sujeito-herói hegeliano, fOi instituído, . ,ã se tem mantido, só pode ser porque existiram boas razões
encarnaçáo do espírito absoluto ou, visro sob o ângulo caricaturesco, farsanre D¡ra instaurá-lo tal como foi. Isso é o que explica também Por que náo se
do "metaquerer"r0, grotesco pela pretensáo, é demasiado utópico para poder ilwc jamais mudar um detalhe de um ritual, de um costume, de um hábito:
levá-lo a sério no presente modelo. t ganham seu valor e sua necessidade somente pelo fato de ser o que eles têm
Pode-se ver melhor agora em que consistem esses comportamentos cujo ldã r.-pr., não se pode mudar qualquer elemento deles, por menor que seja,
estatuto nos parecia problemático. Apresentando-se de uma vez programados ln destrui-los inteiramente.
e motivados, não remetem nem à ordem da estrita regularidade causal, Mas o sujeito sempre pode retomar a iniciativa.,Em lugar de continuar
nem àquela da pura intencionalidade decisional. Thata-se de esteretitiltos ftrcr como se deve somente Porq ue um dia, um outro, ou ele mesmo, há
cornPortdrnentais equivalentes, no plano praxeológico, aos "sintagmas fixados" tempo, estipulou que sena assim que se faria daí em diante, pode,
dos gramáticos: como olho-de-sogra ou pé-de-cabra, cujos elementos rompante - aproveitando ,lgr- acidente - ser levado a deixar Por um
constitutivos perderam seu valor original mas que, tomados em bloco, fazem tc de executar maquinalmen te e com total confiança o mesmo sintagma,
sentido, lavar-as-mãos, preparar-um-cafe, ou talvez ainda fazer4ua-prece r o olhar, ver-se realizando, interrogar-se por uma vez sobre as razões de
(para os crentes sem fervor) constituem outros tantos algoritmos q,t. re 'ltcccssidade" e, de repente, talvez, aperceber-se de que poderia proceder
tende a assumir em bloco como totalidades constituídas, sem que haja lugar, tcmente. E ainda, no fim das contas, decidir, sim, atuar doravante de
"normalmente", para se perguntar sobre cada um dos elementos em que se lnodo - com bons motivos, também, mas evidentemente diferentes,
decompõem: abrir a rorneira de água fria ou de água quente? utrlizai âgua cm substância quanto em estatuto, daqueles que motivavam eté então
corrente ou encher a pia? somente enxaguar ou primeiro ensaboar? secar frlcliclade ao uso instituído.
ou não? com a toalha ou com o ventilador? etc. Entre todas as articulações
A tliferença entre as duas ordens de motivações, aquelas que justificam
possíveis para o mínimo programa comportamental, o uso, o hábito, o rito, a
r¡timentoànormaeaq uelas que motivam sua transgressão, náo se
moda ou ainda as manias pessoais, opram por tal ou tal percurso determinado
rr<l fato, por exemplo, de que a primeira não seria conhecida e
que será visto como normal por aquele que o segue enquânro que não tenha
irr de algo como o "inconsciente coletivo", enquanto que a outra seria
que examinálo detalhadamente. Sem rer que se interrogar, execura-se lllc : ambas podem muito bem ser assumidas com toda lucidez. A
d clc ordem aspectual. Há, de um lado, a motivaçáo do fundador
I'ltitrador", inicial ou final e, em muitos casos' os dois ao mesmo
10. Cf. l.-Cl. Coquet, Le discours a son sujet,I, Pa¡is, Klinclsieck, 1984.
Interações Arriscadas Problemas de Interpretaçáo e de Ftonteiras

tempo), que insraura os novos riros ou usos, frequentemente abolindo os já manipulador que propõe determinados valores face a um Sujeito comPetente'
instituídos. E há a modvação do sujeito execuranre, que segue humildemenie isto é, capaz de decidir 'þor conta própria" se aceitará ou não as proposiçóes
e meticulosamenre os algoritmos definidos pelo precedenti, dizendo-se que, que lhe são feitas e, consequentemente, se se conformará ou não aos esquemas
mesmo se não vê bem a sua razáo de ser, ela deve existir. Tal motivaçáo define, de conduta que seu interlocutor pretende fazë-lo seguir. Mas tal configuração,
oor exemplo, a relação do discípulo fanático por seu guru, como também a de inspiração fortemente voluntarista, representa somente um caso entre
do maníaco com respeito a si mesmo,incapaz de libeiar-se das rotinas que, outros e ela é superável em duas direções. Primeiramente, ela pode ser superada
num passado distante, ele mesmo se impôs. E num domínio totalmente por cima, no sentido de que, em lugar de se impor ao sujeito "a montante",
diferente, recorre-se também a essa motivação de tipo concessivolr quando, como uma instância transcendente a priori, o destinador-manipulador pode
4*d9 ao operário preocupado pelo aspecto rotineiro dos gestos que repere também aparecer como uma figura inventada pelo próprio sujeito para dar
dia a dia maquinalmenre na linha de monragem, explica-se á el. qùe deveria um sentido ao curso de sua vida, conferindo uma aparência de tazáo ao acaso
se satisfazer de saber que, embora ele represenre apenas um ínfimo elo dentro que a preside. Voltaremos a esse Ponto. Ou ainda, superação 'þor baixo",
dafâbrica, sua contribuição pessoal ganha sentidoao integrar-se numa grande ou a jusante, na medida em que, em sentido inverso, a figura mesma de um
sintagmática que o engloba e o ultrapassa. dcstinador concebido como uma instância autônoma, a distância e "acima"
Em termos aspectuais, essa motivação-confiança, que fundamenta do sujeito, pode perfeitamente se borrar ou mesmo se aPagar totalmente
tanto a fidelidade do "crenre" no quadro religioso, quanro a resignação do Fm que o sujeito chegue ao ponto de se desviar de um esquema de conduta
"executante" no âmbito dos algoritmos técnicos, é duratiua: aãompanha &finido. Para guiar e regular seu agir, a Presença tutelar de uma instância
discretamente e sustenta o cumprimento dos programas vigentes e, de lnodo hhrarquicamente superior e claramente identificada não é uma necessidade
mais geral, a reiteratividade das práticas instituídas. Entinde-se, assim, o lboluta. A simples adesão, ainda que apenas intencional, do sujeito a seus
papel essencial que a motivação desse tipo é chamada a jogar nas estratégias Ióprios estereótipos comportamentais, uma vez instituídos como se viu, pode
de consolidação do poder, seja no plano político ou em o,riro, domínios.l{o tturr em sl mesmo, Pafa ele, uma "motivaçáo" tão exigente quanto o
contrário, a motivação-decisão é pontuøl: é ela que preside à crítica dos hábitos, imento de um dever contratual ou a obrigação sentida face a algum grande
à ruptura da continuidade dos riros, ao questionamento das instituições e ro. E em última instância, mais abaixo ainda - ainda mais longe de toda e
à instauração de novas maneiras de fazer, individuais ou coletivas. porque, r transcendência -, pode-se prever que a motivação, fixando-se ainda
inicialmente, roda inovação rem necessidade de ser motivada no sentido mais poderá em algum momento dar lugar à pura e simples regularidade,
forte do termo. É preciso opor seu ualor atestado ao que, por conüaste, aparece ualquer desdnador nem manipulador, mas também, finalmente' sem
como o aalor conuencional dos usos em vigência ou dos ritos já estabelecidos: Não há, portanto, solução de continuidade entre intencionalidøde e
para os detratores da tradição e os reinventores do sentido, todos esses valores e, consequentemente, nenhuma ruPtura entre manipulação e
não passam de velhas manias e superstições, de gestos imemoriais carentes de ação. Ao contrário, uma série de passagens graduais ligam esses dois
conteúdo e que não mais têm razáo de ser além de sua força de inércia aliada a lum ao outro. Retornaremos a isso também.
uma espécie de letargia, à apatia, à ausência de senso crítico e de imaginação,
em suma, à alienaçáo que pesa sobre a massa dos que a eles permanecèm fiéis.
Todas essas considerações tendem a relativizar a imagem que se faz
tradicionalmenre, em semiótica narrativa, da cena da "manìpulaião". para
dar conta do que faz agir um sujeito, pode-se cerramenre, .rr,.
-.ritos casos,
prosseguir postulando a figura de um Destinador mandanre, na posição de um

I l. "Concessivo", uma vez que consiste em conceder a out¡a instância a responsabilidade do


sentido. O
te¡mo é tomado a Claude Zilberberg.
CAPITULO IV
O REGIME DE AJUSTAMENTO

Mas, antes disso, consideremos um terceiro regime, o da interaçáo


Se ele certamente comporta mais riscos que os precedentes
prático da gestão das relações en tre atores abre, em compensaçao,
mals amplas em termos de cnaçao do senddo. Todavia, Por que
,t2
3Crmo, ou mals exatatnente, meta termo novo, aJustamento Se nos
necessário introduzi-Iol, é porque precisamos de um nome para
um tipo de processo interativo do qual as relações com o mundo
assim como com o outro' nos oferecem diariamente a exPeriência
um excelente conhecimento intuitivo, mas do qual
semióticos disponíveis de programaçio e manipulação não
dar conta2. Isso não quer dizer que os Processos de ajustamento
a uma "outra semióticd', distinta daquela a que Pertencem os
Característicos das duas configurações anteriores. Ao contrário, temos
de sentido e de interação que náo somente interdefinem-se no
mas que, ademais, napráticadas interações concretas, referem a

sentido" (in I. Assis Silva (org), Corpo e sentidn, 5âO Paulo,


Landowski (org) Sémiotiqae gourutande. Noaueaux Actes
no7n, op. cit. (cap. 6).

nlo é surpreendente, dado que os modelos da semiótica narrâtlva foram elaborados sob
lingufstica e, ademais, e Parür da análise de um gênero literá¡io (.- Propp, ú¿tava-se
^

quc' de fato, não tematrzeve o tlPo de interações que nos lnteressam aqur (.f. Pdssions
fl.¡zl. Dc modo maß geral, dessa forma de inteligência sensível que e o a.,ustemento, se
a tc disse da mètis, fo¡ma de inteligência astuta que eParece semPfe 'enffe linhas
lc¡ que nao se preocupa em qualquer rnomento em explicitar sue natufeza M.
Vcrnlnt, Les fvses dz lintelligence. La mètis des Grecs, Paris, Flammarion, 1974, P. 9.
Interações Arriscadas O Regime de Ajustanento

procedimentos destinados a articular-se uns com os outros ou a interferirem comporta, porém, aspectos comuns com a sintaxe da manipulação. Ambos
entre si, como já ocorùa entre programação e manipulação. Mas, antes de supõem que o parceiro com o qual se interage e com quem, no caso, tenta
examinar aquilo que os une, comecemos por ressaltar o que os diferencia. ajustar-se, seja tratado como um actante sujeito de pleno direito, e não como
uma coisa de comportamento estriramenre programado. Isso, qualquer que seja
tua natureza actorial, humana ou não (poderá ser, como em uns dos exemplos
Fazer ser, fazer crer, lazer sent¡r que consideraremos mais adiante, um animal, um carro ou um avião, uma
pnisagem, a neve, um exército inimigo, etc). Daí duas especificações essenciais
O que denominamos "ajustamento" não consiste nem em adaptar-se quanto a seu estatuto. A primeira é que, por não estar limitado à execuçáo de
unilateralmente a um outro ator, nem, em sentido inverso, em levar esse outro dgoritmos preestabelecidos, seu comportamenro tem por vocação variar em
a submeter-se ao primeiro. ônção da diversidade dos contextos: no ajustam.ttto .o-o na manipulação,
mesmas causas não produzem sempre e automaticamente os mesmos efeitos.
A.adaptaçáo unilateral a um outro correspondeàprogramação. Sabendo
que a água está, incondicionalmente, 'þrogramadì' apassar do estado líquido irso que faz de ambos procedimentos práticas mais arriscadas que as da
ao estado sólido ou gasoso em função da temperatr.lra, se é de gelo ou de vapor
Tal se deve ao fato de que o fazer do outro ator, aquele a que
de que se precisa, sabe-se que é necessário e suficiente adaptar nossos próprios
ou com o qual se ajusta, náo está encerrado nos limites de um papel
mas suspenso às reações abertas de uma "competêncid'. Contudo,
programas aos seus - dar-nos ao trabalho de colocar em um recipiente a
essencial, essa competência pode ser de duas ordens diferentes - e é
quantidade de á.gaa desejada e esperer o tempo necessário para elevá-la, por
meio de algum dispositivo apropriado, à temperatura requerida- a fim de obter o que faz a diferença entre manipulação e ajustamento.
com segurança o resultado almejado ou, em outras palavras, para fazer ser o A competência dos sujeitos "manipuláveis", conforme já sublinhado,
estado buscado. No estado atual das ciências experimentais, não se conhecem com petência modal. Ora, é chegado o momenro de explicitá-lo, essa
outros meios, mas sabemos que esse é confiável e até mesmo infalível. Isso quer competência, que constitui a chave de toda a gramâtica narrativa
dizer que uma interaçio é de ordem programática quando, para chegar a seus vcrdade, em rlltima instância, dominada ou determinada pelo elemenro
fins, é suficiente que o ator se apoie em certas determinações preexistentes, claro que um sujeito só pode ser, por definição, um sujeito de
estáveis e cognoscíveis, do comportamento do outro. Agora, nas in (ou, mais geralmente, de intencionalidade), e manipular outro, é
que dependem do ajustamento, o ator com o qual se interage "querer" fazer. Não rejeitamos tais postulados de base. Mas pan fazer
certamente, também, pelo fato de que seu comportamento obedece a um sujeito "queira" fazer qualquer coisa, é necessário, ao menos, fazê-
dinâmica própria, mas essa dinâmica, no estado atual dos conhecimentos crer, otJfazê.-lo saber que teria vantagem, de um ou outro ponto
que se dispõe, não é redutível, como no caso precedente, a leis (objetivamente, no caso da promessa e da ameaça; subjetivamenre, se
e objetiváveis. É,, ao contrá¡io, na interaçáo mesma, em função do que dc lisonja ou de provocação), em querer fazê-lo. Para isso, é preciso
um dos participantes encontra e, mais precisamente, sente na maneira de por persuadi-lo ou por convencê-lo: uma vez mais, é o único meio
de seu parceiro, ou de seu adversário, que os princípios da interação tgore, diferentemente do que sucedia na programaçáo, é um meio
Pouco a pouco. ¡cm de infalível). Pelo menos é assim, muito restritivamente à nossa
Mas o ajustamento não se reduz tampouco à inversão dos termos quc o manipulador vê as coisas - igual ao semioticista até o presente!
configuração precedente, em que o sujeito operador deve se adaptar ao no cstado atual da teoria, tudo se passa como se, uma vez excluído
(às propriedades da água, por exemplo), de tal modo que seria agora o I drrrples recurso à força, que levaria a reduzir o ourro ao estaturo
mada, a única maneira possível de influenciálo - de ter prise
a dever submeter-se a ele. Essa eventualidade corresponde à
operação cujo princípio consiste, como se viu, a empreender - consistisse em concebêJo como um ser consciente de si mesmo,
persuasivos com o objetivo de que o sujeito manipulado náo possa,
deixar de conformar-se ao querer do estrategista-manipulador. O aj ¡Ir. rlonner prise", Actes Sèmiotiqaes, 112,2009. <hnp://epublications.unilim.frlrev¡¡es/
Interações Arriscadas O Regime de Aiustamento

seguro de seus inreresses e senhor de suas paixões (entre Descartes e Ricardo) e, mesmos sujeitos como dotados, ademais, de um corpo e, por isso mesmo,
so-bre essa base, dirigir-se a ele por meio da comunicaçáo persuasiva. Segundo de uma sensibilidade. Consequentemente, a interação não mais se assentará
¡obre o crer, mas sobre o fazer sentir - não mais sobre a persuasão, entre
t\
essa perspectiva, interagir se resume a "comunicar". Náo necessariamente por
üoc;s verbais, pois ninguém contesta que se pode fazer entender também inteligências, mas so o , entre sêñsiEifitades: tazer sentrr qu-9 se
pelo gesto ou, por exemplo, pela proxêmica (assim, no desenrolar de uma fato mesmo,
ãrise ãiplomátiða entre dois países, um deslocamento de tropas adquire por
si mesmo valor dissuasivo). Mas qualquer que seja o modo de expressão que lm - sem so LDor seu etc. ue
se utilize, é, afinal, sempre à racionalidade (entendida sob uma ou outra t que as manter respectrvamente
de suas diversas formas posslveisa) e às motivações da outra Parte, e mais o sujerto e e entre o sujelto
especificamenre a sua capacidade de avaliaçáo dos valores em jogo, que o e seu ln (que sePâra necessarlarnente o
manipulador-estrategista se dirige. que se trocam) cede agora
o caso,
Nos processos de ajustamento, a maneira como um ator influencia um
quê sè-nfe-mè-õorpos
ouüo passa por caminhos bem diferentes: náo mais pela comunicaçáo de
objetos autônomos (mensagens, simulacros, valores modais ou objetos-valor)
que desempenham a função de discursos persuasivos ou dissuasivos no quadro
d. .r-" lógica da "junção", mas pelo contato ("contagioso") - o que implica s formas de sensibilidade
uma problemática da "uniáo"5. Os interactantes não perdem, por isso, sua
competência modal, se eles a têm (o que náo é absolutamente necessáfio), mas, Ncsse ponto, nossa tarefa seria mais simples se o modelo que tentamos
em todo caso, não mais é ela que principalmente os guia. Porque a cena não tivesse que se aplicar unicamente às relações entre atores humanos
é mais aquela onde uma das partes Procura unilateralmente envolver a ouûa, ou coletivos) e se pudéssemos deixa¡ de lado a quesrão dos nossos
por boa ou por má vontade, propondo-lhe em troca alguma dc interação com as coisas. Mas o modelo perderia enrão, a nossos
Estamos lidando agora com uma interação entre iguais, na qual as uma parte essencial de seu interesse. Nosso objetivo é dar conta em
coordenam suas dinâmicas por meio de um þzer coniunto. E o que homogêneos do conjunto dos processos interativos nos quais podemos
nova' ou ao nos realmente comprometidos na experiência vivida de todos os dias.
Permrte arustâr-se assim uma à outra é uma capacidade
uma competência particular hn tal, é necessário que pessoas e coisas possuam atributos comuns
a conhecer: a capacid4de dç pcrmitam interagir de igual modo com todas elas, qualquer que seja
competência dita modal, nós to actorial. Ora, se admito que os homens, e mesmo as mulheres, são
Na programaçáo face ao su]elto, havia somente dadas q uen dotados de uma "sensibilidade" (ainda que esteja por ser definida), e
de matéria e de energla, forças cegas que nao se conheciam a sl mesmas atribuí-la também a algumas espécies de animais mais evolufdos,
te não se pode atribuí-la a coisas, a menos que adotássemos frente
que também neo podiam conhecer ,lgo ott alguém a. seu redor, mas
em contrapardda, obedeciam sem o menor equívoco ou dewio possível visão de tipo animista que dependeria de uma epistemologia bem
determinadas leis naturais, constantes por definição. Com dlquela que rege a nossa problemática... Consequenremente, deve-
^ ün mais, desdobrar o novo conceito que acabamos de introduzir:
apareceram "sujeitos", atores maleáveis já que dotados de inteligência e
gma relativa autonomia. Com o ajustamento, acabamos de reconhecer rcconhecemos dois tipos de regularidades que podem servir de
lntcrações programadas, e logo dois tipos de motivações sobre as

4. Cf. A.J. Greimas, "Le savoir et le croi¡e: un seul unive¡s cognitif", in H. Parret (org-)' De la nt nom, op. cit, cap.6, "En deçà des stratégies, la présence contagieuse", pp. 105-137.
Approches epistémolagiques ø serniotiques, Berlim, de Gruyteç 1983. ou allm das estratégias, a ?resença contagiosa, São Paulo, Edições CPS (Documentos
cit., 'Jonction uersus lJnioti' , pp. 57'69. 14 P.
5. Cf. Passions sans nom, oP.
Iqteraçöes Ar¡iscadas O Regime de Ajustamento

quais a manipulação pode apoiar-se, deve-se postular ainda duas formas de rnsu, isto é, de ordem decisional. Uma e outra implicam uma capacidade
sensibilidade suscetíveis de fundar os Processos de ajustamento. dc interpretaçáo em relaçáo aos dados exteriores e, junras, recobrem bem o
Primeiramente, uma sensibilidade no sentido mais usual do termo: a que abarca a ideia de "sujeito" enquanto ator ao mesmo tempo estesicamente
sensibilidadr Perce7tiaaque nos permite náo apenas experimentar pelos senddos tpto a perceber o mundo e modalmenre comperente para lhe atribuir sentido.
as variações perceptíveis do mundo exterior (ligadas à presença de outros corPos- Dado que o outro tipo de motivação, a motivação consensual, ou programada,
-sujeito ou aos elementos do mundo-objeto) e de sentir as modulações internas t aproxima, de seu lado, da segunda forma de programação reconhecida mais
que afetam os estados do corpo próprio, mas também interpretar o conjunto ßima, aquela de ordem simbólica, o conjunto dessas noções se fecha sobre
dessas soluções de continuidade em termos de sensaçóes diferenciadas que mesmo. Em outras palavras, os diferentes níveis de pertinência que foram
fazempor si mesmas senddo. Em seguida, uma sensibilidade que chamaremos formam um conjunto coerenre cujos elementos se interdefinem,
de sensibilidade reatiuai é aquela que atribuímos, Por exemplo, aos toques do Portanto, a passar de uns a ourros - possibilidade cujo inreresse
teclado de um computador ou ao pedal do acelerador quando dizemos que mais adiante.
estão muito e, às vezes, demasiadamente, 'tensíveis". O que se entende por isso Seja o que fo¡ pare rerornar dessa digressão ao regime de interaçáo de
é que sáo construídos de modo tal que reagem muito exatamente, e inclusive nos ocupamos, o do ajustamento, outra de suas características de base
rápido demais ao nosso gosto, não ao q ue "sentem" no sentido precedente do em que, so b esse regime, nenhum dos atores planeja exatamente, de
termo (porque desse ponto de vista se entende que náo sentem nada), mas tecipada, aquilo que deverá resultar da interaçáo com seu parceiro. É
impulsos mecânicos, elétricos ou outros, aos quais os submetemos. da parte do outro parceiro quando esse outro é uma coisa, e continua
Sob a forma dessa sensibilidade reativa, a comPetência estésica verdade quando se rrata de uma pessoa. o objetivo fundamental
ser atribuída ao conjunto do reino animal (o problema foi caro a não consiste aqui, para nenhum deles, em fazer com que
sobretudo a respeito do cachorro e da ameba, aos quais atribuía mesmo realize um programa preestabelecido em detalhe. No que concerne
alma), mas também ao reino vegetal, e, por fim, a uma grande Parte emergência de efeitos de sentido inéditos, isso constitui
obj etos ditos inanimados. Assim, para aqueles que os conhecem através
sua própria prâtica, um automóvel de qualidade, um planador, Ltm piano,
muitas outras "coisas" com as quais frequentemente se interage só
possuem incontestavelmente uma sensibilidade reativa desse tipo.
permite entreter com elas, às vezes mais ainda que com parceiros
relações de ajustamento gradficantes, isto é, geradoras de sentido e de
numa mútua rcalizaçáo (accomplissernent) de si.
De um ponto de vista epistemológico geral, a sensibilidade reativa
está muito -d4 programaSo
yricto s_ercq.- que
ttos estivermos por antecipação enquanto programadores ou
causal - e talvez seja mesmo uma de suas formas posslveis.
mais rapidamente terminariam nossas ações - manobras ou
muitos dos aparelhos eletrônicos utilizados como parceiros de jogos ou para
de simulação destinados à aprendizagem (por exemplo, para pilotos de - por tender a uma ererna repetição do mesmo. Monotonia, er€,
conras, só produziria insignificância - e enfado.
sáo tão sofisticados, tão finos nas suas reações aos movimentos mals
sutis do utilizador que dáo a impressáo de que a máquina "sente" seu tudo se cansa", dizia Valmonr, o herói de Lzgações Perryosas
Obviamente, se trata de uma ilusão, mas que mostra que entre a n¡ matéria. Para ele, semioticista da manipulaçáo e até das
levada a um grau de refinamento muito elevado, e o ajustamento h lettre, tudo é questão de cálculo: os estados de alma que
a distância não é absolutamente intransponível. Ademais, a outra procura produzir no outro são obtidos por meio de
sensibilidade, a perceptiva, tem bastantes afinidades com a motivação dc objetos modais destinados a configurar a seu favor a disposição
O Regime de Ajustamento
Interações A¡riscadas

afetiva de sua presa. Não há dúvida de que, seguindo a mesma inspiraçáo ¡ror meio da realizaçáo mesma do outro dançarino. As ligações perigosas
prccedentemente evocadas - não tão perigosas na realidade, enquanto seu
é possível descrever sob a forma de sequências modais canônicas toda sorte
rc.sultado estava fixado de antemão - começam a partir daí a ser substituídas
de estratégias com objetivos patêmicos, e ainda tirar delas algumas receitas
práticas: fazer o otJtÍo crer' fazè-lo querer'crer' fazer com que ele não Possa ¡rr interações um pouco mais arriscadas, pequenas ou grandes aventuras que
¡)nìente o são na medida em que, precisamente, no início não se sabe até onde
nao auerer crer - e assim por dianteT. Mas reduzir os processos e as relações
chegar.
complexas que o desenvolvimento das paixões implica a um tal gênero de ¡xlem
slntagmas-tlpo equivale a submeter essa matéria Particularmen te sensível a Contudo, a dança é alvez um exemplo demasiado belo, um caso fäcil
uma visão racionalizante e de fundo pragmatista que apenas deixa lugar ao &mais. Dado que a relevância do modelo continua por ser demonstrada,
que se pode chamar candida-mente a "sensibilidade". E, sobretudo, uma tal fñrcuremos testá-lo em relação com outro registro: a guerra. Vejamos como os
orientação leva a privilegiar por princípio um Pon to de vista unilateral sobre Ith rcgimes considerados até o momento se aplicam e qual é seu resultado no
as relações de interação, como se náo fôssemos, cada qual a seu turno, nada tllno da produção de sentido.
mais que os manipuladores ou os programadores uns dos outros. A
da manipulaçio, como a da programação ainda que por outros
introduz assim na observação do real, isto é, dos textos e das práticas, um om perde ganha
que leva a ignorar outros asPectos' tafvezmesmo, em certos casos
(por um ti
de deformação profissional), a neglicenciar certas possibilidades no Plano (ìom relação à conduta da guerra, pode-se reconhecer primeiro uma
experiência vivida. gcm estritamente programática. Ela consiste em analisar os conflitos
No oposto, sob o regime do ajustamento' o q ue cada um dos in lcrmos de puras relações de força. Disso decorre uma definição muito
i visa através das relações sensíveis que os unem nao é mais (ou em todo tanto dos objetivos quanto dos meios da luta: trata-se de derrotar o
cessa de se¡ unicamente) de ordem da "liq uidaçáo da falta" ou da satisfação
submetendo-o á uma potência de fogo superior a sua e suficiente para
-lo. Assim como um engenheiro que conhece as leis de resistência dos
necessidades pessoais. Cada qual busca, antes de tudo, descobrir uma
de realização mútuê. Éoqu. se vê, tipicamente, no caso da dança. pode indicar a quantidade de dinamite necessária para destruir um
dançarinos podem, sem dúvida, primeiramente' contentar-se em do mesmo modo, paraagradar um chefe de Estado que seria tomado
lado a lado, mas cada um por si, um tal tipo de Programa r bélico, um Estado-maior pode facilmente avaliar a quantidade de
fixo como, por exemplo, uma'ïalsd' dançada segundo as regras: isso não rcquerida para reduzir a cinzas o território de um Estado qualquer
mais que a^execução-de um ritual mundano. Pode ocorref também que rtlo como inimigo. Vimos recentemente um exemplo notável de
dos bailarinos, considerando-se mais expert que o outro, Procure rm tttc destruição por uma brutalidade cega. Para sermos mais claros,
seu esdlo, querendo fazë-lo dançar a sua maneira: o exercício se trans rlc lìagdá, em20O3.
entáo num Processo manipulatório, ao qual o parceiro pode resistir, M¡t ,, curso da história mostrou que, embora a batalha tenha terminado
submeter de bom grado Mas se ambos querem fazer dessa valsa uma c, haveria que se fazer algo muito distinto dessas destruições
gra tificante, criadora de sentido e de valor, será necessário que Procurem, flilra que a guerra mesma tenha sido ganha. Por exemplo, se poderia
ao dançar, a melhor maneira de se aj ustar um ao outro de modo que cadr lx)r uma conduta digna do nome de esnatégia. Entendemos como
Possa realizar-se plenamente
como dançarino - nãio cada qual Para seu rorttluta da guerra que náo se resumiria a planepr a aniquilação ftsica
independentemente do companheiro ou em seu prejuízo' mas, ao con reduzindo-o ao estatuto de coisa, mas que seria fundada no
rcnto do adversário enquanto corpo político. Em tal caso, a opção
tcria sido a destruição desenfreada das armas, das infra-estruturas
ou, mais
7.Yer A.J m¡is, das populações. Têria tomado seu lugar um sentido do uso da
H. Par¡et,
t987
8. Em francês, accomPlissement munel. O substantivo accomplissement, que envolve a idéia
dc ¡tt.rrdando as devidas proporções, se pode qualificar de dialógico em
no modo como o su;'eito concretiza suas potencialidades, não tem equivalente exato em portugttlr
Inte¡ações A¡riscadas O Regime de Ajustamento

seu princípio, de modo que o transporte, a colocação em Posição de ataque e essa encenação permitiu, sobretudo, durante esse tempo, implementar o
inclusive o emprego das armas, realizados de modo inteligente, teriam passado dispositivo logístico de uma invasão já.programada de antemáo em todos seus
à categoria de meios de dissuasão, pelo menos tanto quanto de destruição. detalhes de ordem técnica.
Mas pode-se aindavislumbrar um terceiro princípio de gestão de conflitos, Segundo tempo: estando finalmente pronro o dispositivo em quesrão, a
concebido em termos de ajastarnento, cujo primeiro interesse reside no fato de Casa Branca põe fim a todo e qualquer simulacro de estratégia e o Pentágono
que permite, ao menos teoricamente, ir mais longe na economia dos recursos pssa à execução de seu programa de destruiçáo massiva. Dada a desigualdade
- das armas, e quem sabe também das vidas. Em vez de atacar o inimigo "de & forças, o exército adversário opõe apenas uma aparenre resistência, a tal
frente", de procurar aniquiláJo programando a dinâmica mortífera das forçæ o estado-maior iraquiano
tonto que nesse momento surpreende que não
de destruição, ou de intentar neutralizá-lo, em posição ofensiva ou defensiva, lnha aparentemente "estratégia" alguma. No entanto, o fato de deixar que
por meio de alguma estratégia manipulatória adequada, uma conduta militar I invasor empreendesse seu próprio programa até o final, até sua "vitóriÌ',
inspirada nesse terceiro princípio consistiria em deixar, na medida do uma estratégia, em forma de ajustamento, no estilo de Kutusov face ao
que o adversário seguisse sua própria propensáo a fim de tirar parddo Exército napoleônico - e talvez, a única aplicável, dado o caso. Isso,
ajustando-se, precisamente, a seus movimentos. Se o inimigo na frto, permitiu manter em reserva para a fase seguinte o máximo de seus
contrâ-ataca, ou se o agressor persiste em avançar, que lhe deixem recursos militares em vez de dilapidá-los na tenrariva heroica, mas
livre e que avance, então, como Napoleão nas planícies da Rússia! dc fazer frente ao agressor. Porque, no fim das conras, quem é o ganhador
diante dele, incitando-o mesmo a penetrar cade vez mais longe até onde é o perdedor se, ao final da batalha, o 'iencedor" river conseguido
impulso o leva, pode-se estar seguro de que, cedo ou tarde, chegará ao pon todo um país e dizimar sua população, mas tenha deixado quase
onde ele mesmo acabaú. por esgotar suas forças. Como na arte do judô, as tropas adversárias?
como em uma dança (mas dessa vez uma dança de morte, e numa Terceiro tempo: depois de haver seguido sem graves danos sua inclinação
muito diferente), üata-se de permitir que o outro se realize -"s'accornplisse" , depois de ter reduzido a cinzas tudo a seu redo¡ o exército yankee,
favorecendo, nesse caso, o desenvolvimento das potencialidades a
que encerra em si mesmo sem o saber, ou daquelas implicadas, sem que se
I não tem nada, ou muito pouco a destruir, muda novamenre sua linha
Constatando que a "democracia" anunciada não é alcançada
conta, no algoritmo no qual está envolvido. Então, o desequilíbrio inicial velmente porque náo é programável
o mais forte e o mais fraco perde sua pertinência, e a diferença entre
-, decide por consrruí-la. Para
I necessário persuadir, conciliar a boa vontade, negocia¡ invenrar um
derrota sua univocidade. uma opinião, eleitores, em suma, manltular de novo enquanto
Mutøtis rnutandis, é o que se pôde observar a partir de um certo a massacrar aqui e ali, e mesmo a torturar quando necessário,
no desenrolar do conflito ao qual aludimos, ou mais exatamente, dessa pelo prazer de operar sobre carne viva. Então, frenre a esse Tio
ainda em curso, anos após a prètensa vitória das potências aliadas. É, Snt alma de programador que pena visivelmente por converrer-se em
analisar sob esse ângulo as fases sucessivas de tal processo, que mostram (e que, carente da mínima sensibilidade para compreender o
de um campo a outro, as três linhas de conduta que acabamos de quc o rodeia, revela-se inapto para infiltrar-se nas populações que
foram articuladas entre si de modo evolutivo. Primeiro tempo: combi controlar), reaparece o adversário, o exército do antigo regime,
ultimatos ao adversário, discursos na tribuna da ONU e mediação de que, não tendo sido derrotado na fase anterio¡ acaba sendo
comissão de especialistas, o governo americano finge, sem excessiva nte "dissolvido" pelas autoridades norte-arnericanas. Ora, na
jogar o jogo estratégico da negociaçáo. Tal encenação destinava-se não a mctlida em que o ocupante permanece prisioneiro de esquemas
com que o adversário renunciasse aos projetos que lhe eram atribuídos, os rígidos e convencionais, o adversário - para o bem ou para
a manipular a opiniáo nacional e internacional. Ti:atava-se de tlcpende do campo a que se refere) - mosrra sua capacidade de
que aquela guerra era indispensável à manutençáo da paz em nlvel I rcu inimigo, de levantar ou contornar as barreiras que ele erige
e ao estabelecimento da democracia no plano local. Na realidade, ¡lc suas casernas e de seus quartéis fortificados, de surpreendêlo
O Regine de Ajustamento
Interações Ar¡iscadas

até em sua intimidade, como se o sentisse no mais profundo. Começava aí cvidentes, mas também pelo simples fato de que quem se encontra levado a
uma guerrilha cuja característica consiste em que' como em toda forma de cntrar em guerra náo é sempre o mais forte (ou, o que remete ao mesmo, o
mais rico). Toda arte militar consiste justamente em dar chances ao mais débil
ajustamento e diferentemente das relações Programadas or1 manipulatórias,
ninguém pode fixar antecipadamente o fechamento dos efeitos de sentido, ¡ubstituindo, em maior medida possível, as relaçóes de força pelas relações
eufóricos ou disforicos, que poderá engendrar. dc sentido. Inversamente, reduzir friamente o exercício da guerra a uma pura
técnica de devastação é suprimir de seu próprio horizonte a existência mesma
Esses três tipos de abordagens, que poderiam ser etiquetados
do sentido. O risco inerente ao uso da força bruta é que essa opção, ao negar ao
respectivamente pelos nomes de Clausewitz (na condiçáo de simplificar
outro a qualidade de sujeito, desfigura ao mesmo tempo aquele que a utiliza,
consideravelmente sua teoria), de Maquiavel e de Chuang-Tzu' ao mesmo
û¡nsforma-o em louco pela própria potência, em não-sujeito. O vencedor
tempo que correspondem a três regimes de interação distintos,
no sem sentido se o único discurso que Possa ter para celebrar sua
a outros tantos regt mes de sentido diferentes. Como temos ia consiste apenas em repetir que é o mais forte. O paranoico também
postulado, esses dois aspectos são interdependentes. Com efeito, o que
crê sozinho no mundo e püa sempre o mais forte, além de se considerar
regrme oferece em termos de segurança no plano pragmático da in
o representante de Deus na terra. A diferença é que, em geral, não lhe
isto é, no nível do campo de batalha, varia em sentido inverso com relaçáo
rmitido pâssar ao ato. A esse respeito, o cinema oferece diversos exemplos
riscos que implica no plano da interaçáo simbólica (isto é, em termos de
numa outra guerra conduzida por princípios análogos, a do Vietnã,
do sentido), ![uer seja entre os beligerantes ou no interior de seus
rando o percurso trágSco do guerreiro que, a medida que experimenta no
campos. Reexaminemos desse Ponto de vista cada uma dessas opções-
de batalha em que consiste esse gênero de guerra programada, a medida
A opçáo do tipo programático minimiza os riscos de ordem triunfa por meio de uma carnificina generalizada de todo vivente, acaba
e maximiza os de ordem simbólica. O que se pode esperar dessa opção cair ele mesmo no puro sem sentido, num delírio místico e numa loucura
conj untamente, o mínimo de baixas possíveis no que concerne às que náo tem outra saída senão o suicídioe.
troPas, e o maior dano possível no âmbito de todas as relações de
Enquanto a abordagem programática, seguida à risca, reduz assim a
quer se rate da moral, do direito, das relações internacionais ou,
à execuçáo de algoritmos mecânicos impecáveis e irrefreáveis para o
finalmen te, do clima político interior ao país beligerante. Assegurar-se,
mas, ao final das contas, ruinosos também para o agressor, a opção
de atacar, de que é fisicamente, operacionalmente, mais forte, e au
deixa, por natureza, Llma maior margem de incerteza relativa ao
a etacaf âPenas nessa condição (portanto, gestar todo tempo necessário
e ao resultado do processo. No plano prático, a segurança é por
reunlr a quantidade de tropas e de material requeridos Para dispor de
menor quando se tem que negociar, dissuadit pressionar pelas vias
superioridade absoluta) é, poder-se-ia dizer, tomar as precauções que
ou ameaçar, fazer tecuar, fazer renunciar mediante preparativos
bom senso, a sabedoria e a prudência. Efetivamente, assim se podem
, que quando, uma vez dispondo dos meios para isso, basta aniquilar
ao máximo os riscos sobre o terreno no momento da confrontaçáo.
rio. Contrariamente à decisão de submeter o inimigo a ferro e fogo,
ponto de vista, não importa que tais precauções sejam sumamente
tlc toda estratégia manipulatória depende das reações de um adversário
essencial é que, face à opinião pública, a vitória aPareça como certa' tconrpetência modal" é sempre diftcil de apreende¡ razáo pela qual
materialmente necessária e não como simplesmente possível - em
cstrategista-manipulador pode estar absolutamente seguro de que a
sentido próprio, como Programada. E é isso o que' de fato, a vitória vem
tlrtada será a melhor. lJma incerteza irredutível paira sempre, portanto,
a Partlr de um certo grau de engajameto quantitativo. Se a regr^ é que o
o rlcance efetivo dos instrumentos de dissuasáo implementados por
forte ganha, basta, com efeito, sabendo que no plano da balística as
das partes. Incerteza partilhada que permitetaJvez compreender por
causas produzem sempre os mesmos efeitos, contar o número de
a paz mundial se sustentave na estratégia nuclear denominada,
possuídos por uma e outra parte para saber antecipadamente qual ve
Mas essa aritmética é de pouco alcance. Primeiramente' o
inspira não pode ser erigido como princípio geral. Por razões o Êlme de Oliver Stone, Heauen and Earth, e o clássico na matérra, Apocaþpse Nout,
cínico que
l ( irppola.
Interaçóes A¡riscadas

cAP íru lo v
PREVER O INESPERADO, ANTECIPAR O
I M PREVI STO

Mas retornemos a nosso ponto de partida. Hoje em dia, ninguém pode


ignorar - nos repetem à exaustão - que o perigo está em todas as partes e que
þmos expostos a riscos de toda ordem. Temos portanto que distinguir.
O primeiro lugar pertence por direito aos riscos maiores - cataclismos,
maremotos, terremotos - bruscas e devastadoras descontinuidades
as quais nada se pode fazer. Por certo, é possível assegurar-se contra os
devidos a tempestades e, até certo ponto, por meio de construções
tissísmicas", precaver-se inclusive contra os efeitos de tremores de terra.
continua sendo difícil prevê-los e mais ainda impedi-los. Não apenas por
amplitude mas, se permitido dizer, em razáo de seu estatuto semiótico
mais precisamente actancial. A prova é que existe outro risco, não menos
e que, porém, se conseguir até agora marìter a distância: o risco
A mzáo é que, contra ele, é (ou pelo menos, até o momento, foi)
precaver-se, tanto politicamente, rnanipulando por meio de estratégias
dissuasão aqueles que quereriam ou poderiam recorrer à bomba (o que supõe
o dissuador a tenha também - da a "corrida armamentistd' -, sem o que,
nos tempos em que os Estados Unidos tinham seu monopólio, outras
poderiam ser impunemente programadas), e tecnologicamente,
meio da produção de mísseis e antimísseis que Programam (em princípio)
ruição dos mísseis de um eventual agressor.
Em contrapartida, niohininguém a manipular, nada a programar, nem
nada com o que se poderia ajustar para evitar os ciclones, os
as erupções vulcânicas, ou seus efeitos. O fato de que eles tenham
Pre ver o Inesperado, Antecipar o Imprevisto
Inte rações Arriscadas

termo a atividade considerada, quer a dita falha provenha da imprudência


luearnáoéatribuívelaqualquermalquerençaouimPrudênciaporPaftede ou da inadvertência, da ignorância ou da inabilidade, da cegueira ou da
'Jru:ilå;ä;"'l q"' ã' provocar;;-å alguma falta
"'-':*::.a parecem insensibilidade do sujeito agente.
vítimas' Em suma' tais riscos náo
ou negligência por p""t ãt suas às Esse princípio é vrílido para cada um dos três regimes de interação
lue habitamos este mundo' um instante
expostos
vinculados *a, q"Jï; i;;¿ considerados até aqui. Por exemplo, colocar os feijões para cozinhar tarde
nós os deixaremos Por
forças da natureza' Consequentemente' demais a fim de que estejam ao ponto no momento de servir a sopa (ao
de lado, .orrrid.,*ão *lä
dtpt"ät- ¿t alguma fo'mã de "interação" pesto): programação frusnada por falta de saber-fazer; acreditar que o policial
propriamente dita' encolerizado se aplacaria à visão dos 100 francos deslizados juntamente com
a licença de motorista, quando se deveria ter adivinhado que tal não seria
suficiente para demovê-lo, ou que se tÍata'va de uma pessoa que náo se deixa
Riscos contingentes' riscos necessár¡os subornar: manipuløção abortada por erro de apreciação; ficar irritado porque
ou náo' sentiu irritação no tom da voz da terna esposa, quando se tratava apenas
Permanecem, pois' os riscos
que corremos' conscientemente (como ela o explicará mais tarde) de simples precipitação: ajustamento falho
com os outros ou com o meio ambiente' e
ao, nós mesmos' interagirmos prá'tica é por causa de sensibilidade equivocada. Teoricamente, tudo isso podia ser
frequentemente com os-dois
ao mesmo temPo' CoSo nenhuma evitado. Vê-se claramente a que se devem todos esses fracassos: seja a algum
juristas'
dt ;åJ;"podt-" distinguir' -"f"lT:^f-em os quiproquó que levou à escolha de um regime de interação inadequado para
isenta de riscos que as
somente pOtttt em perigo o agente
as interaçóes que, em princíiio' o contexto, seja, uma vez eleito o regime de interação adequado, a um e¡ro
io'" da pista' p"'" qttt- acre'dita saber
aiustar-se
empreende 1.,qt'i""åå"ho técnico na execução do projeto.
àspropriedadesestésicasdanevenáocompactada)eaquelas.quePornatureza
J.o1"t.r"ir", isto é, concernentes aos interactantes Os quiproquós sáo equívocos relativos à qualidade actancial do ator com
oodem também.J;;;;;,
tG*[,'j,.î'Jr;î;;;td"de numa pirt. r"pí.t" de crianças). Mas é uma distinçáo o qual se interage. Isso é o que origina as desventuras respectivas de Dom
ainda que stj" mtnos clássica:
aquela que se Quixote quando desafia os moinhos de vento, isto é, quando tenta manipular
mais elemer,."' qt';iãij;;;;å' e os que um ator estritamente programado; ou, em senddo inverso, as do bruto do
entre os ,ir.o, ã..otrentes ào fracasso
oode fazer, para toda atividade, Têxas que queria poder manobrar apenas pela força sujeitos motivados, como
êxito'
:.";;';;; f ","do*"1-ente' quand o se æm se eles fossem unicamente programados; ou ainda as da mulher de Putifar
de um empreendimento qualquer
O risco banal de f'"t"""' narealtzaçáo um quando tenta seduzirJosé, como se este pudesse ser estesicamente sensível a suas
em tt"' pode ser evitado' Em rigor'
é de ordem contingente' E' "-¡"e nos casos investidas amorosas e ajustar-se a elas, quando está decididarnente motivado
imputavef a -quem o sofreu' Mesmo
fracasso é efetivamente semPre coß frequência' náo cm um sentido diametralmente oposto; e também, finalmente, as de Charlot,
Essa cômodå t*pressáo"
de uma .*..ptio"'l "má soite"! por r¡ue, indo um pouco mais longe, gostaria (em Tèmpos Modernos) que as coisas
pelo responsável pãr n- dano
ocorrido sua
é mais que um "iiii-do i*t¡"to ;;;i rnesmas, programadas como estão, sucumbissem a seus sorrisos por contágio
"ra
Jt""lp"'f outro' desviando a atençáo de
causa para tentar a tomar scnsível - e assim por diante até o esgotamento da combinatória. Nenhum
em conta' o que o teria levado
certos fatores q""'l';;i;; ¿t'¡nt*^' rlcsses erros se teria produzido se aquele que teria que sofrer as consequências
tivesse usado um pouco mais de atenção (na programaçáo), de discernimento
asprecauçóesnecessáriasParaevitar.queestesinterviessemouparaprecaver-
_se conrra ,.,r, .rrlî;,,ã'"i.i.or. A b; ã" ,r.rd"d,., üffiâ. peripectiva j:.ll (na manipulação) ou de sensibilidade (no ajustamento).
rigor não ,.- i"'"tî'* pl""o prático' Se seguida à risca' em Partlcular
-;i""'å"t Os erros técnicos são às vezes igualmente fatais: tentar manobrar um
"o qtË muitos gostariam hoje de
nos tribunai, tp"'" t
¿"1
"iìÃJ" rapidamente por paralisar toda
,.r-irr"ri" ,rbieto efetivamente manobrável, por estar programado, mas sem recorrer
fazer passar - pri-.i- plano), teórico: i boa manobra: apertar o acelerador em lugar do freio; despejar primeiro o
judiciais. Mas ela oferece um interesse
açáo por medo d*-;;."J... exrstc lcite na xícara antes do chá e não o inverso. Ou querer manipular um sujeito
;;i;;" Jo então se pode afirmar que náo
se adotada p.l" de alguma ¡rcrFeitamente manipulável mas escolhendo uma má manipulação: optar por
p-ossa esraf ,åu.io""¿o à inobservância
nenhum fracasso que náo "".io"ínio, a bom
das condiçóes particulares das
q""ir d;;;;ãia a possibilidade de levar
Prcver o Inesperado, Antecipar o Imprevisto
Interaçóes Ar¡iscadas

-se a seus olhos na eterna reprodução do mesmo exercício, num passatempo


Drovocar um covarde, um poltráo' um
frouxo' em lugar de ameaçilo; ameâçar monótono, rotineiro por força da facilidade, sem sabor e finalmente tedioso.
:'ilï:; ä;., d. ou ainda, renrar ajustar-se a um parceî.,1ï Em uma palavra, o risco que ele corre é que a arte mais acabada da manipulaçio,
"J"ü-r". ou com o rltmo
ärrp"t," mas fazê-lo de modo desajeitado' comse pilotasse uma moto; no
exagero
que constituía sua razão de viver e até sua paixão, se transforme em triste e
montar a cavalo com
-"ã.qì"¿": na equitaçáo,
genril sorriso com um gesto
"inãpropriado". com muita
insignifi cante progrâm açáol .

flerte, responder a um Generalizando a partir desse caso, o risco inerente ao êxito num regime de
água demais na panela Para que
frequência, rais erros ,ão d. caráter ^præunl, interaçáo como a manipulação seria então passar - regressar - à programação,
possa ferver ,.*po,"!l"itt'hçao
dt-¡' Para que a ameaça Possa ser levada isto é, a um regime de interaçáo inferior em termos de possibilidades de
"
a sério, pressa demais-na carícía.para_que
ä Po:t" ter lugar' etc'
"j,tít"-.llo evitados facilmente criação de sentido. Por um lado, a manipulação, pelo simples fato de que
Mas, de novo, com ]*õ; -'"i, d. jeito, teriam sido póe em relação "sujeitos" - isto é, actantes em grande medida habilitados
todos esses fracassos' para escolher seus percursos em função de motivações ou de razões ligadas a
Pelocontrário,náopodemserevitadososriscosimplicadosnofato uma competência modal que nada limita a priori -, oferece um inventário de
programa, de uma manipulaçáo o.u de
mesmo de ter sucess, na execuçáo de um possibilidades narrativas extremamente aberto. Por outro lado, a programaçáo,
determin"dos. porque a que se,expõe entáo' é aos riscos
ïlõo-.nto "q,rit que por natureza encerra os protagonistas em configurações semânticas
inerentesaopróprioregimedeinteraçáo..m.ujoquadro_seatua.Eàdiferença imutáveis (os papéis temáticos encontrados mais acima), determina um
ptodtt'em efeitos de uma
dos riscos d. fr""",'l" iq"a q"*då "to"tttt*' registro objetivamente mais reduzido, em todo caso em termos quantitativos.
náo somenre, por definiçáo, não se
sravidade variável ;;;Ër; prämático - Mas para além das possibilidades narrativas que abrem respectivamente cada
adicìonar-se evenruais danos
ärr- ;äilJ;;;p:;;áo,'.oåo a isso podem uma dessas duas sintaxes da gramática da narrativa, o que está em jogo é a
adjacentes), o, ,ir.o"" que nos^exPó '
o ê*ito se medem no plano simbólico' latitude de invenção do sujeito mesmo que conta, e, em primeiro lugar, que r¿
sentido ou, o que é mais grave, ao
isto é, em rermos á;;;", infligidos ao conta o que conta. Em função do tipo de figuras actanciais a sua disposiçáo, é
ä;ã. r.rrtido vigente na situãção considerada' ele, o narrador ou o enunciador (ou seja, o sujeito que diz a história ou que a
Vejamosporexemploemqueconsisteoriscodeserbernsucedidoparaum vive, e não apenas o sujeito do enunciado, inscrito na história que está sendo
manipuladore,maisprecisamente'Paraumsedutor'Náoumsedutoracidental' contada), quem, ao regressar da visão estratégica para a visão programâtica,
extraordinário na vida monótona' quase
para quem ,., ,,r..,,å seria um evento perde uma parte de sua liberdade relativa à maneira com que pode construir o
ummilagre,-"r,,"t-"t'ip"t"dorpertinaz'habitual'irresistível'estiloDom mundo enquanto mundo significante.
náo conseguir seduzir é
contingenté e pragmático' de
Juan. O risco acidental, poderia lhe resistir? Para ele'
É possível estender esse princípio às duas outras configurações, ou,
praticamen,. .rrrlo "o que lhe ão"tt"'ì' ö't- em outras palavras, sustentar que todo regime é orientado para um outro e
Dortanto, um sucesso a mais náo represe"t"-
g'""ãt coisa: quase nada de novo
o"ltoi"""'rü.*ä;..ir., e, anre si mesmo, í-p1", confirmaçáo
de um poder que a toda mudança de regime de interação corresponde paralelamente uma
" que começa a enfastiálo' De tal mudança de regime de sentido? E é necessário que tais mudanças se f"ç"-
de seduçáo ja ot"btlttido: dupla repetição sempre no sentido de uma regressão antes que no de um progresso?
modo que, no q;J;; d. pJ"åfpø a. i"..r"çao manipulatória que lhe é tão
caro, o ,ir.o sir.rbJli.o in.årrt. "o ..t
êxito indefectível cresce dramaücamente
uma de suas novâs conquistas' o
na proporçáo de t*" ;;t"t-s' Com cada Pontos de vista, aspectos e est¡los de vida
atividade que constitui o motor de sua
perigo que o ameaça consiste em que a
sentido e seu valor para
vida, seduzir, ,.rr,,ì"t po' pt'dt' åo-pltt""""ttìtt' Regressão ou progresso? A questão só tem sentido admitindo-se que os
para si mesmo por meio da relação
ele; em que a r.d;;#- tþo dt dt'"'fio regimes de sentido e de interaçáo náo são simples contgurações formais a nossa
de instigador para um noviço'
com o outro -, ..ät"¿o o q"t podt tot"po""'
emseucasosemetamorfoseiepouco"po,,"oemumaespéciedealgoritmo converter-
;.-.; iao p.rf.i.t-ente trilhado' tão infalível' que termine Por l. Caso particularmente ilustrado, no cinema, por Casanoaa, de Federico Fellini.
Preve¡ o Inesperado, Antecipar o Imp¡evisto
Interações Arriscadas

modo mais prosaico, a outros tantos estilos (ou "formas") de vida disdntos3.
disposiçáo,Purassintaxescomfunçãoutilitária,dasquaisnosPoderíamos nada'
comPrometa fundamentalmente em Essas variantes comportamentais dependeriam do simples dado psicológico -
servir à vontade sem que isso nos eles têm, de
pontuais de seu emprego' e não teríamos nada afazer senão constatá-Ias - se os regimes que sáo objeto
Na realidad.e, além da's .ir..rrrstâncias
dessas predileções divergentes não se articulassem entre si segundo uma lógica
;.;;ã.;; nossa hi;ótese inicial' umãcance existencial' face ao qual nos que não deve nada à psicologia mas procede de uma organizaçio estrutural
de interactante
Evidentementå, o contexto e o tiPo imanente. Tal lógica permite ao mesmo tempo interdefinir os respectivos
sempre, a eleiçáo do regime de interaçáo
enconrramos ditam por si sós, quase conteúdos de significação de cada um desses regimes, prever em certa medida
mais adequ"do p"r" cada caso .*
,.r-ä, funcionais. Isso não impede que
seu ordenamento sintagmático sob a forma de 'þercursos de vidd' (de ordem
emumplano-.,'o,*p.'n"ia,independentementedascontingênciasquese filogenética ou ontogenética) e finalmente, também, dar conta dos juízos de
tais regimes seiayr objeto de preferências
relacionam ao lugar e ao momento,
ttáo de paixões' que variam de um
-t'-ã
valor de que são objeto a cada instante na sociedade.
e valorizações diferenciais, se
a ourro. De fató, qualquer que seja o projeto Isso nos obriga a voltar à maneira como se põe aqui a questão axiológica,
indivíduo ou de
"^;;õ;'rocial o-problema a resolver ou o assunto que isto é, aquela da eventual "inferioridade" (ou "superioridade") de um regime
treaJizar,os t.âmitei"i-p"t"der' por "gosto''2
se levará a cabo, ;"-öi;;;i; - dig"-or, para simplificar, desses com relação a outro. Questão de ponto de vista, se dirá, objetando assim que a
geral t"- -"i''do queì"t'ot
modus resposta depende unicamente de um juízo subjetivo, das preferências de cada
- a privilegiar de "-"i*tira cômod"' num meio ambiente um e que, portanto, a questão não é semioticamente Pertinente. Todavia, com
"{:;u"rL";;;o'r¿.""¿o,lt",
oþerand.i.Há p.sso"s "pt""tinsistem em programar
""'it'äo-se a
sob controle de.parte Parte' os 'þontos de vista" se passa como com os 'þé-de-moleque": em vez de tomar
o deserrrroLrim.nto da mínima operação, expressões como essas em bloco, convém em certos casos ressemantizar seus
táo minucior",,'.rr,.1.r""ã f "rr*.1 das coisas
pessoas tanto quanto a ordem termos constitutivos. Um ponto de vista designa então, em primeiro lugar, um
procurando ,.g.rl"' "'"tividade das
vendo iedor aPenas maquinaçóes ponto - uma posição e uma situação - no espaço e no tempo: aquele a Partir
como se fossem p"ptl p"ot"do; ou;as' "o seus fins senáo imaginando
encontrar do qual um sujeito olha a'iista", ou mais geralmente o objeto que observa.
e complôs, p.rrr""t qt'e náo poderiam lidar;
aqueles com os quais têm que Nesse sentido, se a língua permitisse, se deveria poder falar tanto do "instante"
a maneira -"i, .o,,'|lexa de manipular
outras ainda, ,ráo *'.orrrentando à
ri.ret senáo no imprevisto, Prontos Para de vista que se adota frente ao desenrolar de um processo considerado em sua
ao þairoi, preferem confiar em duração, quanto do "ponto" de vista a partir do qual se olha um percurso em
ocasiáo ";".1*;;b.los", a ajustar-se
mesmo' em sua extensão. Ora, em muitos casos similares aos que nos ocupam, a'iistd'
^gaÍrara
sua intuiçáo, ,ro ,"t' faro, na sua
capacidade de sentir no momento
que se apresenta não é simplesmente qualquer coisa oferecida à contemplaçáo
ato'osPormenoresdeumasituaçaoouasdisposiçõesíntimasdaquelescom
os quais se põem em relaçáo; outras'.enfi-'
t- l"gar de tudo isso' deixando desinteressada (como uma "vista pitoresca" aos olhos do turista), mas algo do
o outro' confiam
esrrarégia ou de sintãnia com ,,Cl,Jz^Í mesmo gênero que a montanlta olhada pelo ciclista caro a Jean-Paul Sartre.
de lado toda idéia¿.;i;äãe os dedos',
e Se contentaráo com Como o filósofo (e mais precisamente, no caso, o fenomenólogo) o mostrou
aPenas na sua..boa estreld,, na Sorte,
na análise desse exemplo, o sentido e o valor da vista mudam totalmente em
esperandoq.r."p'o"idêncialhesconcedaalgumacidentefeliz-atitudenáo
äa experiência empírica' da qual Funçáo do ponto de vista onde se situa o observador - o ciclista -, seja na situação
menos atestada que as precedentes t'o fU"o
,ro pl"no de um modelo geral de de partida da corrida, seja na sua posição de chegadaa. Fenomenologicamente,
logo teremos que .*ir"i, as consequên'.à,
e também semioticamente, a montanha não tem com efeito o mesmo aspecto
interaçáo.
de que nos ocupamos remetem quando está diante de si, ainda por ser escalada, quando se está subindo-a, e,
Tirdo isso equivale adizer que os regimes 'estar
de no rnundo' ou' dito de finalmente, quando se a olha do alto do cume.
a ourras ranras -#|fr;;;ä.'ãi.t."å"das'
.i. Sobre a distinção terminológica entre "estilo" e "forma" de vida, cf, E. l¿ndowski, "Régimes de sens
São Paulo' Centro dc ct sryles de vie", Actes Sémiotiqur.¡ <http://epublications.unilim.frlrevues/as/>, ll5,2012; "Formes de
2 Sobre essa noção comPlexa, cf.
E. Landowski, Pour une sémioúque du goût,
2013.Yer tambérrrE' Landowski e J.L. Fiorin l'r¡ltérité et styles devie", Recherches Sérniotiques / Semiotic Inquiry, XIII, 1-2, 1993, pp. 69-93.
(Documentos de estudo, 6),
Pesquisas Sociossemióticas
Paulo, Eúc, 1997 , 27 4 P' .1. L'Etre et le néant, op. cit., p.538.
(orgs.), O gosto da gente, o gosto das coisas, Sáo
Prever o Inespcrado, Antecipar o Imprevisto
Interaçóes Arriscadas

f'o1ma semelhante a partir daí poderia vir a ser, procede-se em geral indutivamenre. O imaginário
aplica-
Em termos apenas mais abstratos' isso
se
{e romanesco, mas também o discurso das ciências humanas e sociais constroem
julgam*io' q'" os sujeitos podt- emitir globalmente sobre o
propósito d'os ou descrevem dinâmicas individuais ou coletivas que o discurso social, e em
valor respectivo de oi' ot' q""it ttgí*es de sentido e de interação enquanto particular o midiático, rransforma em percursos de vida estereotipados: no
'"i¿" diþ.r.n.i"dos, conforme seiam para.eles
da
fundamento, d. .r.ä* ¿. passado, o romance de bancas de jornal e o horóscopo semanal, hoje os reality
montanha vista de baixo)' que definam
ordem do projeto (.;; a subida da L sltotas e telenovelas, de preferência made in W Globo, ou Holþutood. Aisso
a uma "fatia de vidi' já passadø'
sua experiê ncia' ern curso' oúque-remetam que se alia uma literatura inesgotável, procedente também, com frequência, da
,vida do seduror,,, de vista "incoativo" do noviço
-rrrí¿.r"d" do pontopode aParecer-co1o belo sonho; América do Norte, que, inspirada essencialmenre navulgarização psicanalítica,
se imagina virrendo-" po' ""tttipaçáo' ,"t "terminativo" faz do conselho psico-socio-moral (a chamada "auto-ajuda") sua especialidade.
vista ,it,r"åo no limite do
ao contrário, segundo o ponro de- e uma O que os modelos assim difundidos propõem explicitamenre, em geral em
náo é mais qYt y- velho hábito
de um Dom-Juan-*-jï;Jt"-tudo' nome da saúde e de uma melhor qualidade de vida em um mundo cheio de
a experiência (como sobre uma coisa
banal rotin". O, po"tJ' dt "i"" sobre perigos, ou em nome da realizaçio pessoal e do êxito na interação cotidiana,
Åas relativos em. primeiro lugar à
qualquer) ,ao, poi,, tt'iamente' relativos' é com toda evidência uma normalidade a que os sujeitos sáo incitados a se
posiçáodoobservadoremrelaçáoàexperiênciaconsiderada.Estáelaainda conformar ao mesmo tempo que nela se reconhecerem.
das coisas concluídas? Täis posições
diante dele? Está rriu.n¿o-"i Ei elapari.
outros tantos "pontos de vistd' Resta saber em que medida, aos olhos de indivíduos suposramenre
objetiváveis .- ,..-ã' "'pttto"i' determinam inseguros sobre si mesmos e em busca de soluções reconfortantes para seus
ou de preferências subietivas'
distintos, desta vez "á-r."'.i¿" de opinióes 'þroblemas", os esquemas de interpretaçáo da experiência recorrentes nesse
o atual - jamais adquire seu
Contudo, Para um sujeito' o presente - vasto corPus têm autoridade e aré que ponro os itinerários-tipo que aí se
sentidoeseuvalorunicamenteenquantopontodechegada,istoé,comoPonto encontram sáo recebidos pelos destinatários como prefigurações plausíveis de
c"imina em um aqui-agora diferente da
final de um trajeto já percorrido e qu: seu próprio porvir. Ern todo caso, o espaço consagrado pelas mídias à difusão
adquire igualmente um senddo e
situação de que h"ttJñ;tdo; o "qtti-"gora desses modelos é hoje em dia táo amplo que se pode pergunrar se, sob o pretexto
då p""iá"' is.to é' em funçáo dos
um valor determinados enquanto "ouo iot"o de remediar as inquietudes difusas de cada um, rais modelos não têm por efeito,
.tåp", ulteriores. Para entender
caminhos que permite enrrever p"r".rr.nr,r"i, se não por objetivo, estender ao máximo o espaço social do prá-programado.
comoumsujeito-to,,'p"t"deseuprópriopresente'énecessárioportanto
é ao mesmo tempo Sistematicamente incitar a substituir toda forma de questionamenro crítico
na qual-se encontrâ'
entender como, .rn fu"çao da posiçãã pelo gosto do prêt-à-porter e do unívoco à guisa de pensamenro, reduzir com
levado a interpretar ,tt' p"""åo' ã" o'dettt d: realiz,all:-l' " rePresentar seu
nas isso um pouco mais a cada dia a margem de autonomia dos sujeitos e, em
porvir enquanto que se abre. Isso nos convida a estender
";;Ë;cial última instância, ajudálos a re¡minar um belo dia com a busca do sentido: o
duas d'ireções, retrosPecdvamente e ProsPectivamente" os segmentos dos estilo do discurso evoluiu, mas a idéia mesma de fazer do mundo uma nova
por
olr.*"a*' A tit"lo de exe mplo' seguimos ainda mas "- -:T:"-':
;;;"t;a inexperiente. entuslasta no Menópolis não parece muito envelhecida.
å i.i.r.rárío do sedutor: manipulador novaro, No entanto, em vez de a
início - progr"*"Jo' bk'é' infalível mas
perfeit"þt*': desiludido ao final' submeter-se esquemas interpretativos
De onde tinha que vir o primeiro preestabelecidos de fora e professoralmenre proposros ou impostos (já que é
M's antesao ,ro,ri'io". ffi'*¿,."fadado? tio frequentemente em nome da ciência ou de seus sucedâneos que hoje se
de manipuladàr) seu projeto de
para poder fazer davida de sedutor t."i;* normalizam os modos de vida), pode-se renrar adotar, do interio¡ a perspecriva
seus.diÁ no aborrecimento da repetição,
se
vida? E lagoÍa.,se náo quer rermtnar diante tle um sujeito que está vivendo sua própria história e que, ignorando por
aspira a sair da i,,,ìg"ìfitat'cia que
o aflige' quais perspectivas se abrem
rnilagre os modelos instituídos em circulaçáo no seu enrorno, ou conseguindo
d.i., gr"-ador desiludido?
pro
liberar-se deles, procuraria bravamente descobrir por si mesmo um senrido
Paradar,apartirdoatual'umconteúdoaorealizadoeaopotencial'
-
trrna significaçáo e uma orientaçáo - para seu próprio percurso de vida, visto
o que um sujeito teve de ser
ou seja, para conjecturar' retrosPecüvamente' antecipar o que â .r partfu de um dos ltontos pelos quais transita. A quais desses ponros atender
;;; :;; L.td-.átt o que é' e prospecdvamente' para
Preve r o Inesperado, Antecipar o Imprcvisto

Interaçócs Arriscadas
à mesma rede de conceitos e relações que aqueles que definem os três regimes
de nosso
para começar? Como a escolha
tU n:1: ser arbitrária' partamos de sentido e de interação já descritos. Enquanto irrupções da descontinuidade
Dontoinicial,enüedoispolos:entrearnsignificância_repetiçáomonótona a mais radical no curso das coisas, produzem ao mesmo tempo as maiores
rumor e fúria exteriores ou
si ou em si - e o sem sãntido' incertezas no plano do conhecimento e, evidentemente, as piores destruiçóes
åî#î'.';î;;ã. de si mesmo'
¿."i;;;;, diferenÇa rraumarizante dentro e as mais terríveis dores. Improvável, mas impossível de excluir, sua
ö;ä;;iã*.¡ Ou ainda' se quiser reduzir tudo
a uma
Entre, aqui, o ..'t"do,=ãlil " do'' geral'
possibilidadefazpakar sobre todos aameaçado risco puro a despeito de todos
conteúdo e Por isio mtsmo de alcance
catesoria -"i, .tt-tit ^',uLi^de os sistemas de segurança - física, social, moral - que uma sociedade pode
.Irr'r ro e des continuidade' se dar. Abalando todos os valores da ordem, um cataclismo não é, dito de
"r¡"uidade prever dedutivamente' outro modo, nada mais que a añrmaçáo do termo negativo da categoria cujo
Esse mínimo epistemológico -suficiente Para
é
q,r. r. abriráo gradativamente termo positivo é a programação. E se, gradativamenre, perturba o conjunto
num plano muito ,Jr"t, ;r".*cialidades suas interaÇóes com o mundo'
dt em do universo semântico onde se situam também os ourros regimes, é porque
diante de nosso ,.,;t-ito na busca ""tiJo dentro de
uma série de percursos orientados está nele incluído. Ao polarizá-lo, faz dele um universo renso, animado do
Seu encadeamenro à.i*Li""rá
uma topogr"fi"
thtg""*o"em breve (Diagrama 1' p' 80)' interior por uma dinâmica própria. Assim, pois, as calamidades naturais
"u,å"gJ;;;;;q""l têm por direito seu lugar legítimo em nossa topografia. E em uma escala
menor, ocorre o mesmo com os acidentes da vida corrente, com todos esses
fracassos que atribuímos à má sorte quando um processo de programação, de
O regime do acidente manipulação ou de ajustamento sai mal.
como Ponto de'na1il1
Em Da Imperfeição' Greimas adota :-i::::
na ongem um
Além disso, até o acidente feliz, a sorte, também se inscreve nas mesmas
ele, ou pelo menos nos textos que analisa' o mundo é categorias. Sigamos com a história do seduto¡ agora ado sedutor-apesar-de-si,
Þara táo
da ordern' ð;;;;" to"'o'' Thata-se mesmo de um mundo náo que jamais tenha tentado sequer seduzir (porque não se crê capaz). Se na sua
-rrrrd.o que, para
sáo táo bem programadas vida bem ordenada inopinadamente ocorrer um "caso", será ele o primeiro
ordenado, orrd. tod". as interaçóes cusar,.sair dessa "rodnd''
numa letargia;;r;d, é neclssário, custe o que a se surpreender ante tamanha "sorte": milagre ou catástrofe? Como sabê-lo
cair em
a' a estesià' a sensibilidade' o corPo' exatamente? Sente que perdeu o "rìorte", ao mesmo tempo que seus velhos
Por isso, Greimas inventa' ou reinvent aiuda de
chamamos o ajustarnentïi com hábitos. Uma descontinuidade tão imprevisra, apenas crível, e perturbadora
suma, as condiçõe';;t"t";;o lot do',Programas fixados
oo em diversos planos, apresenta de fato, na vida dele, todas as caracterísricas
um acidente que permita a negåção " "'po"çäo máximo de
de um coriiiano mar.adã pelo do acidente. Mais geralmente, do ponto de vista de uma teoria do acidente,
de antemão, ocorrerá a passagem a uma
pela insignificância e o enfado' pouco importa que em razio da narureza de suas repercussões pragmáticas,
segurança possível, e to""q"t"'emente onde'
.rr,r. náo"seráo nada seguras mas certas descontinuidades sejam vividas disforicamente como desastres e ourras
vida,,outra,, na qual as relaçóes ".a"T-r,estédio náo seja' talvez' mais que um
M-as o euforicamente como acontecimentos felizes (ainda que se possa sempre
em contraPartida, tt"' i"-'ä"ntido' portanto do
d. ,i.o',.Ji;;;;;' ¿ f"-ili"' a todos' Partamos encontrar um pervertido que se compraz com o pior e um melancólico que
privilégio como
contos: e se rudo na origem fosse, veja apenas o lado negativo das melhores surpresas). No plano simbólico - do
ponto oposro ;|'q.r.r. ãË creimas e dos
ponto de vista do regime de sentido - todas essas descontinuidades produzem
.rosmitos,acidente,intranquilid"d.,irrstabilidade,agitaçáoefúria'desordem'
o mesmo tipo de efeitos. Não dando vazáo a qualquer forma de compreensáo,
;;;t - ""* apaltvra, descontinuidade?
raio e os ciclones' Como sáo elas nos colocam diante do sem senddo; excluindo toda possibilidade de
Aqui reencontramos os terremotos' o nem da
fenômenos q". J;;endem dt p'ogo"'ações. bem conhecidas' antecipaçáo, elas não nos oferecem moralmente segurança alguma: em uma
"; nós os deixamos de fora do
manipulação, ,""i"0i"fiJ;;Ii'it'*t; ¿i,"". No enranto, mesmo assim, eles
palavra, elas nos afundam no absurdo.
É claro que em geral, enquanto o acidente for sem gravidade, ninguém
camÞo d" irrt.r"çà"*"ö;l;;rrr. e, ademais, os
:""#"ä'i;;äpil.'J*, .o.r,ingências da vida pránîca, se queixa, nem mesmo presta atenção a seu absurdo. Mesmo feliz, diz-se o
deles pertencem
princípios ¿. semiótica que permitem dar conta
""i""fåCao
Prever o Inesperado, Antecipar o Imprevisto
Interaçóes A¡riscadas

que Por analisar-lhe as condições, os efeitos, a significaçáo, o alcance. Isso é o que


sido poucos (subentendendo-se se
acidentado, que os danos tenham
comparação com o ö;:;it"*i*
,i¿"ll B se acomoda ainda melhor quando observa inclusive ao ler novamente, com cuidado, Da Imperfetçã0.

o inesperado ,. "p""tîo 'ob a forma


u^^ boo dád'iua' Entáo' deixando de Nesse livro, Greimas deixa de lado questões de manipulação,
alegra-se da gratuidade lnexllifl--------------e1*:: não pertinentes ao nível de análise eleito por ele. Mas a partir de uma
inquietar-se p.l" i"tt'ã à" 'ottt' sarr
favor por asri* dir.r."ído do céu.
um ãom sem contraPartida, que Permlte problemática da programaçio que lhe serve de base, ele, pela primeiravez
deumavezdosistemadetroca(emoutraspalavras,-daesferadamanipulaçáo) no conjunto de sua obra, volta seu olhar para elementos que constituiráo
ä;!F1iï:::.h'#å1).ä;*î;rurui::tr:iïL::ii:Iïi- a base de dois regimes de sentido que náo tinham até então encontrado
lugar algum na teoria dele e que, por estarem ainda à espera de ser nela
'-:iräitt:i.TTJ ".ro.ra do inesp.r"dt"'lp"'*ho regime de interação'
n integrados, e consolidados, retêm especialmente nossa atençáo: o regime do
o acaso - náo dâ motivo à ajastarnento e o regime do acidente. Embora Greimas esboce um e outro,
no qual o comportamt"io do outro - ^gora.' Puro
razio. garantia alguma no plano náo os distingue entre si. Ao contrário, o que ele chama acidente estético,
interpretaçáo alguma fundada na
no momento em que as possibilidades ou, às .vezes, "acontecimento estético" - verdadeiro sintagma fixo na sua
prático. Absurd'o, mas que importa' "rao'of.r..e
custo neã ¿ demasiadamente
de benefício náo sáo abiolut"*.rrt. nulas e o escritura e ao mesmo tempo noção chave ao longo do livro - superpõe,
do herói de Dostoievski (que só aparecerá'
grande! É o cálculo ;" j;;;d-,-.,ao
condensa, confunde esses dois regimes. Daí, ao nosso ver, duas limitações,
mais tarde)' mas, -¡J 'î"¿tsto'
do turfista ou do colhedor de cogumelos' ambas, no entanto, superáveis. Por um lado, uma concepção restritiva da
d" irr..rr.ra. Pessoas frequentemente muito
sensatas'
estética e, mais ainda, da experiência estésica. Ao menos na primeira parte'
;ñ;^;ui"-fu.". Greimas as reduz sistematicamente a uma estética do sublime tratada em
sáocapazes'senaodeconciliar,aomenosdelazermetodicamentealternaros e
do náo.sentido qy. :áo.." insignificância termos de uma filosofia da sensação pura, Pontual, efêmera, indizível. Isso
contrários, a saber, esses dois polos
o sem sentido: d.urante a semana,
,r-"'rri¿" r^zo^và', docilmente submetida se opõe à concepçáo processual da interação entre sensibilidades que, de
segura. e até acompanhada de
um
ao regime ¿^ p.s,îinçnn"onìp1tt"*ente nossa parte, enfatiza'mos e que, fazendo intervir as noções de coordenaçã;o e
dia de
pouco de tédio p";i;;;"d^sua
invariáv.t .o'iiru.rid"de, e no domingo, de aprendizagem, conduz à idéia de ajustamentos recíprocos entre actantes6.
submissáo
(segundo os gostos), louca
corridas hípicas." Por outro lado, limitação ainda mais contundente, uma visão sumária do que
"ãiJiuã1.-".g"*.los Porque o apostador sagaz e o
aos âzares do r.gi-ããJ ac¡d¡ntíGe[z ounão). poderia ser uma semiótica do acaso e do acidente que náo se concentrasse
conhecer'os borrs números ou os
lugares
micófilo iniciado p;d; ;;;..rrd., os demais se Por
unicamente nos efeitos "deslumbrantes" do inesperado. E a necessidade de
menos surpreendidos que superar essas limitações que nos obriga a dar aqui de novo um passo a mais,
adequados, mas nem po' iiso seráo achado, nem menos
az^, acertam."* ;^;;h;ã;, o" reaTizam urn verdadeiro desdobrando os dois princípios que Greimas trata sincreticamente - o sensíuel
desapontados no caso contrário' de um lado, o aleatório, de outro - para. fazer deles a base de dois novos
'intenc¡onatidade, regimes de sentido e de interaçio, ao mesmo tempo distintos e autônomos
Domesmomodoquearegulørid.ad,e,princípio-PressuPostoportoda
base necessária
de interaçáó, q.r. apesar dos laços que os unem como se verá a seguir.
forma programática " a sensibilid.ade, condiçáo de toda
para
t;ä"r- toda manipulaçáo estratégic", . i,r. Se nesse estágio náo é mais oportuno voltar à problemática do sensível e
constitui o princípio do ajustamento, necessitarnos, em contraPartida, justificar o lugar igualmente
J;'îã;-" de ajustarnen.t:, ^ aleatoriedade
e de interaçáo autônomo - o quarto
fundador d. orr.ro^r.gi-J a. sentido do
essencial que pretendemos conferir à problemática do acaso e ao regime do
(e último) - a ser tolo-c"do no mesmo
plano.qt': o' outros três: o regime acidente no quadro de uma semiótica da interaçáo desenvolvida em toda sua
dependemos
acid.ente.C.rrio'"'iã"tt' o to"httJ-os dËsde semPre' dele extensão7.
"¿t
cadainstante, falamos dele sem
..rr"r, mas sem jamais haver chegado - ao
a de presença' a
menos ,r" ,.-i¿ää^I-*r"*izâ-lo, a explicitar seu modo 6. Cf. Passions sans norn, op. cz¡., "Lesthésie comme processus et comme apprentissage", pp. 153-158.
7. Em trabalhos posteriores, o autor designa também o regime do acidente como regime åo assentirttento.
Enquanto que a primeira denominação traduz uma perspectiva objetivante que enfatiza o ca¡áter
imp-revisívefe "aciáental" do que acontece, a segunda adota o ponto de vista do sujeito que, submetendo-
5. Da ImPerfeição' oP' cit' PP' 89-98.
Prever o Inesperado, Antecipar o Imprevisto
Interaçóes .Arriscadas

a sociedade política em sua totalidade efetivamente submetida


se a eleição fosse
ao puro acâso, passa-se não certamente a uma segurança Perfeita (que poderia ser
Duas formas do acaso garantida apenas pela redução do corpo político a um sistema comPletamente
programado - verdadeira conffadição nos termos), mas ao menos aos riscos
Comonemtodososacidentessáo,evidentemente,felizes,pôr-se
não pode constituir um princípio de limitados que toda relação entre sujeitos implica. Nessa configuração, o acaso é,
sistematicamente à.qp-; J" i".rp.*do
que o que se portanto, superado de antemão umavez que se parte do posdado de que não é
;ã";; geral e drrr"do"'o' Em numerosas situações' Por menos ¿por
acaso" que as pessoas agem, aparentemente, 'ão acaso". LJma vez reduzido
ö;ï;oì*h" ag"ã" i-porrância, essa ariilde seria no mínimo perigosa
e, frequentemente, ,,ii.id"' Dä oma.maneira ou outra' é necessário' portanto' o âcaso ao esraruto de uma aparência enganosa atrás da qual se oculta a realidade
suPerar o que. a.descontinuidade de uma intencionalidade ou de uma causalidade a descobriç estão dadas as
na maioria dos casos, enconffar meros para
p.l" d.fittiçaã deiinhas práticas de condiçóes de passagem de um regime a outro - nesse caso, a possibilidade de
náo control"d".o-poria de incapacitante atitudes uma escaPaniria de ordem científica que Permita sair do regime do acaso para
conduta, ,".r.o qrr"ri" fr*t á" tott""'çao do seniido' Diferentes uma
"" poder-se-á ver que cada uma corresponde a entrar no da manipulação (por meio de estratégias eleitorais bem pensadas).
,.,p"itåt
sáo possíveis a esse
maneira específica ;;;"fidrrar.semioticarnente
esse actante problemático' Contudo, em vez de procurar suPerar o aleatório, pode-se também
discursos'
em diferentes assumi-lo como tal, isto é, admitir que existem de fato fenômenos culaapaúçáo
ou, em todo caso, ãl toít"cido' que recobrem'
outras' não é explicável por qualquel regularidade de ordem causal nem por qualquel
pJ"rrr"t como "azaÍ" r "sorte", "acaso" e algumas
fundada na fe nos poderes da constante de ordem simbólica. Deixemos de lado, :umavez que se limitam ao
Pode-se, por exemplo, adotar uma atiude
à maneira positivista' numa certa
forma caso anterior, as situações nas quais o fenômeno Parece irredutível à ordem da
ciência e, mais ,l"'"t"tt,
proft "po""r' Entáo'para liberar-sedas incertezas causalidade unicamente porque náo se sabe ainda, ou não totalrnente, a que lei
d.e racionalidade inerente às coisas mesmas.
sair da eipécie de angústia semiótica obedece, embora estejamos convencidos de que chegará' o dia em que' graças
e afastar os riscos, ou simplesmente Para
diante.dìssa forma de náo-sentido que rePresenta aos 'þrogressos da ciêncid', dele se poderá dar conta em termos deterministas.
[* i-pfi.* o ^ .^pltú^þodeixar de considerar o aleatório como um caráter Pelo momento, não se sabe muito bem como o vírus X interage com as células
o puro acaso, ,.* ;;;;i; Y, porém não se duvida de que, em alguns anos, o enigma será resolvido e se
tentar consequentemente
iråd.r,irr.l do modo d'e aparição dos fenômenos e
Esse é o procedimento que conhecerá exatamente o programa ao qual esse vírus obedece. Por uma razáo
substituir o azílr pelo seu .onirário, a necessidade.
po[iOlogo face aos comPortamentos eleitorais' analoga, deixemos de lado os casos em que se tratam certos fenômenos como
observamos acima ;;;ã
não obedec., à d.t.t-inaçáo alguma' se fossem aleatórios não porque se reconhece que o são, mas Porque as variáveis
se, num nível superficial, o voto parece
definir qualquer tática programârica' que põem em jogo sáo tão numerosas ou tão comPlexas que é praticamente
se parece errático forrro de não iermitir
" pto..rro de ajustamento frente aos (mas não teoricamente) excluído emPreender o cálculo, ou Porque é mais
qualquer estratégiarnian;**4 nenhum princípio
o nível dt åb"*"çáo' descobrir um econômico dar conta do comportamento do objeto considerado em termos de
eleitores, pro".rr"r-r.-1,
'i"¿""¿o aos comPortarnentos probabilidades com a ajuda de métodos estatísticos.
J.l.g"i"ii¿"¿. subjacente que possa conferir um sentido Do aparentemente
obr.ädor, a desfeito de's,r" inconstância manifesta' Resta entáo um núcleo verdadeiramente irredutível de fenômenos a
análise, a significação escondida' E ao respeito dos quais se pode considefar que escapam ao determinismo causal, não
carenre de sentido se extrai em suma, por
mesmo tempo, ¿o ,ir.o ilimitado qrr.,
dern dos canJidatos, acabaria por afetar de maneira relativa ou provisória, mas por natureza e de modo absoluto. Com
isso, não se visa evidentemente um tipo de manifestaçóes sui generis que náo
dependem de leis científicas porque remetem (ou se supõe que devam remeter)
a forças misteriosas e não objetiváveis, como o rnana que habitaria as coisas, ou
a instâncias transcendentes como a"afmÌ'ou a'Tontade divina" - todas noções
que segurâmente são também relevantes no quadro de uma analítica geral da
interaçáo, mas em um outro lugar (a saber, o da manipulação, vista segundo
Prever o Inesperado, Antccipar o Imptevisto

Inte raçóes A¡riscadas

a gesto mesmo do matemático que, colocando diante de si essa forma Pura de


em alguns momentos' considerando uma regularidade perfeita mas sem sentido, a constitui como seu "objeto", nos
uma Perspectiva que encontraremos
cena da oração). NJ;ä.;üil;;;
d",oñr..r,dência, mas sim do acaso, do confins do ser e do nada? Em que consiste, como "esdlo de vida", uma vida
acaso mesmo' enquanto conceito
matemático' que se tÍataagorà'
semiótico? - em todo caso uma vida do espfuito - cujo núcleo só adquire existência se se
encontramos aí' do ponto de vista pode dizer, no puro risco do acaso?
Que tipo d,e entidade de um
constrói a figura ão acaso.à maneira
pode-se considerar ;;-;;ê""ia nele reconhecer
Encontra-se em comparaçáo um terreno mais conhecido se, deixando
q"d rå;;ãe interagir? para isso,"seria necessário
actã.ntecom o seu agir' â esfera do pensamento científico, considera-se uma segunda maneira de
papel temático
uma comPetência ou ao menos um 1Ï--1:tt-tta assumir a aleatoriedade como tal. Ela tem sido abundantemente estudada em
que)' 1o co-nstruir a chamada lei antropologia mas é observável também na multiplicidade de práticas cotidianas
Embora náo seja " "t*í^påt
"*-1ftgt científico confere ao acaso os atributos
pt"'ã^ttto
de
que se relacionam com a "superstição" ou o "fatalismo" ante ao acaso. Aqui,
d.os grandes núrneros,o
umainstânciaatuanteepositivamenteidentificável.Leidenaturezamuito o acaso se coloca além de todo domínio. Seu estatuto o aproxima de uma
particular pois, ainda q"t åáo
qt'Jluer relaçao da ordem da causalidade figura de ordem mítica à qual uma verdadeira competência modal é atribuída,
""dt"" då't"'"' a existência de uma
(nem, evidenteme";J;;ì;"t;;""¡i¿"¿ð' "o pois a sorte nos quer o bem ou o mal - mâs os elementos constitutivos dessa
lei' permite plîrt:* De fato' essa -ompetência
regularidad. obr.*iäi tU, "t-"-toda " são rigorosamente incognoscíveis. É, possível que a sorte tenha
delimit" o å*po' as condições e os limites
Iei sem causas ,r..,,.n"ii¿ades suas "razões" e não há dúvida de que tenha "intenções": aos olhos do fatalista,
aPesar ã" contradiçáo dos
do exercício do que devemos chamar' "p"""'e o acâso a cálculos a sorte é rm acaso motiuado, que faz contrapeso ao acaso 'þrogramado" dos
à'"í'
termos, trm acds.;"g";;;t' A partir "tb*tit"do o estatísticos. Mas ninguém pode dizer o quê o "motivd'. Como no caso do
fundamentados, é possível reconhecer
de probabilidade maåmadcamente destinador no sentido clássico da gramática narrativa, trata-se de uma instância
e, ao mesmo temPo'
;rã;* deatório de um grande número de fenômenos racionais'
hierarquicamente superior, justa ou injusta, da qual depende o destino dos
áJni., em relaçáo a elesiondutas de interação sujeitos aos quais ela. atribui soberanamente favores e desgraças. Entretanto,
enquanto figura,actancial continua
Apesar disso, o estatuto do acaso contrariamente à figura clássica, esse destinador não propõe contrato algum,
sendo problemático. Considtremos'
po' fdtä d9 algg meJhor' que se trata de nem exige nada, e muito menos se compromete a coisa alguma em troca daquilo
Paradoxal porque se' Por que os sujeitos poderiam comprometer-se a fazer "por ele" a fim de ganhar sua
uma forma limite, e paradoxal, de autodestinador.
definição, o âcaso ;íä."dJ J. ;+" que lhe seja exte.rior (e, portanto, de benevolência. Se não há aqui leis estocásticas, não há, tampouco, Tábuas da Lei,
nem se pode di'er que dependa de nem contrato. Na realidade, lida-se unicamente com um destinador "final",
nenhum d.rtirr"doï!'"ìitt "¡" "'pttioi próprio dt!t:'
si. mesmo,como taso dá umator t^pu d' instaurar seu um juiz que, contrariamente ao destinador-mandatário inicial do conto, não
"'i"^o .- .rÅ" irrrtância legisladora (em posição se comunica com os sujeitos. Nem procura incentivar alguém em uma direçáo
-fazerdesdobrando-se interiormente
tott"o'" (em posiçáo de,sujeito)' Ao contrário'
é
de destinad.r) . ;;; qualquer, nem justifica ele mesmo suas decisões. Consequentemente, há, ao
somenre na sua própria manifestaçáo,
,.riir".rdo-se (por exemplo, ry:Ï::î,1: menos aqui algo em comum com a figura do acaso no discurso científico: náo
umasériedenúmerostiradosàsorte'enáooutra)'queoacasoseautolnstltul' cria valor e náo enuncia sentido ,Igr-. Tal é o terrível adversário com que tem
em ato, como sua própria lei - mas 'ã
dt'dob'""""to.nem reflexividade de enfrentar-se o verdadeiro jogador - agora sim, o de Dostoievsþ.
assim''Btanto como a imanência mesma'
de qualquer tiPo. O aãaso ^Parrece' Nessas condições, é inteiramente às cegas que o sujeito que se coloca
quanto como *ã"t"ãe"åi" "b'ol*"'
itto sem poder ser considerado' rressa configuração - o "supersticioso" - é levado aagir. Para tentar atrair a sorte,
"
noentanto,.o*o'."instânciacriadoradesentidonemdevalor.Nisso,
da autodestinação que se
por improvável que ela seja inclusive a seus próprios olhos, os únicos métodos,
grande figura
a figura do acaso difere dessa outra os únicos procedimentos aos quais pode recorrer sáo táo aleatórios quanto o
i;;;;r;i.otOgi"o (iqurl - sãrá uma pura coincidência? - se rrcaso, do qual crê depender. Para ele, seria impossível recorrer aos métodos
chama.,Deus,,
".
mosrfe pelo contrário em todos ã, *p..io,
conforme às definiçóes gramaticais
cstatísticos de previsáo que, pera o científico, abrem a via de uma programação
mesma ordem de ideias' igualmente
do esquem" ,r"rr*ù canônico)' E na clo fazer sob a forma de cálculos, observações e modelos, dos quais resultam
de ser analisado' que pensar do
perturbador. ,¡åì'.- -"io, medida à.rp.r"
Prever o Inesperado, Antecipar o Imprevisto
Interações Arriscadas

E
ciências empíricas capazes integrar''variáveis aleatórias" a seus dados'
de_ razáo, ou, se lhe é atribuída uma intencionalidade, esta náo é conhecida -,
náo pode ver Por trás do acaso a figura nem de ordem estésica: indeterminado, incorpóreo, intocável mesmo que
diferentemente do espírito religioso'
"d,eËretos", pór.insondáveis que sejam, onipresente, náo é sensível a"nada (nem a si mesmo). Desse modo, se não
de um destinador p;ã;il;.ticujos
procederiam d. ;;;;; l; t*;" ou de intencånalidade transcendental: o há competência, e, no entanto, pode agir, fazer advir acidentes, desastrosos
supersticioso . o";t"'"titi" " f iu"- assim, dos recursos que fornece a "oraçáo"'
^.r.rrr.
visa a persuadir
ou mágicos, é necessário pelo menos que tenha um papel. Longe, porém,
,""'"rp"rir¿rio ao revés pelo qual o de repetir sempre os mesmos algoritmos como fazem os atores devidamente
esse procedimento
favor' programados conforme algum papel, este varia ao infinito suas performances
ser, á.stirrador modvando-o a seu
tais sujeitos t:igtT (sem se proibir de repetiJas em certas ocasiões): seu papel não pode, portanto,
À falta de tudo isso, como verdadeiros bricoleurs, ser um papel temático - é mesmo exatamente o oposto. Para definir seu estatuto
parasi,comométodosdetransaçãocomoimprevisível,todaumapanópliade semiótico, somos portanto obrigados a inventar uma posição nova no quadro
gestos åbrigatórios. ou tabus e fórmulas
talismãs, um amonroado de signos, de da gramática narrativa e discursiva, necessidade que não tem, ademais, nada
outrãs socialmente codificados e
esoréricas. Uns fixados idiossiãcraticarnente, caráter
de seu de surpreendente, uma vez que a figura em questão constitui a chave mestra de
ritualizados, .rr., p'å-ttãi-t"to' "dquirem um sentido' a despeito e técnicas um regime semiótico até o presente não tematizado.
âDarentemente heteróclito e arbitrírio, se comparados aos métodos
uma
i|,.,"j.i];îi;;1.-.",ados sob ourros regirnes, com os quais entretêm Essa posição é a do actante joker. Como o joker ou o trunfo de certos
propiciatórias jogos de cartas, seu papel é o de não ter papel algum, ou melhoç de poder
relaçáo ambígua. Com efeito' vistas -"itãt Pertol,"t--1:1'l*t
cumpri-los todos, indiferentemente. Como batizar um tal papel, uma vez
dosupersticiososeaPresentam'em.superfíti"'tomomulllPoucodiferentes
dos outros regimes de interaçáo' estabelecido que se define como o contrário de um papel "temático"? Pelo
f,] ö; fro..di-irros característiios de sua significaçáo. Se nenhuma seu modo de intervenção, o acaso se apresenta como um actante com papel
Mas sáo muito diJ;;;;r;" por,,o de vista
d.dä,"PtP;;;;";t f"l""do' J" pro-gramaçáo' nem da crítico: é ele que decide a orientação e ainda, frequentemente, o resultado dos
dessas práticas "t*
menos Parecem todas esforçar-se Para processos nos quais intervém. É verdade que se pode também nele reconhecer
manipulaçáo, nem do "j''st"-ento'.ao
o saber, algumas das práticas que um papel catalítico: como o catalisador dos químicos, quaisquer que sejam os
simular, embora mal e sem necessariamente
se o destinãdor invisível e mudo' efeitos que desencadeia ao seu redor, ele mesmo não sofre a menor repercussão.
dependem desses outros três regime''.:o-o
imotivado e sem ;;; ;-ùi se dirigem essas.gesticulaçóes emprestadas, Mas, sobretrdo, capaz de üanstornar (sem jamais querer mal a ninguém) ou
Dá,se um ntí nurnd corda (no de fazer triunfar (sem a menor boa intenção) não importa qual programa
pudesse, po, ,or.", få*tU.e-f'" t^"'po"äê-las' na madeira (a
,;õ;;;;')t "p"'e"tä de programtçio; toca+edrdos: em curso, não importa qual manipulação, náo importa qual ajustamento, o
Brasil, contra
", ór"çao; *uzarn-se os metáfora acaso merece ser reconhecido como o possuidor de um papel catastnifco por
da cruz): simulacroãe manipulaçáo pela
excelência.
de um tiPo de ajustamento' etc'
geral' o Retenhamos, pois, esse último qualificativo para fazer contrapeso ao
O regime do acidente rePousa' pois' sobre um, Princípio papel "temático" no modelo abaixo, em forma de elipse.
daaleatoriedade_doacaso_9ue,.o-oo,trêsprecedentes'manifesta-se
oPostas'.P,or um l'do' tt
essencialmerr.. ,.g"t'd'o duas foi-"" :::1:^"i: nao
;- fenômenã imanente e vazio de sentido e' consequentemente'
;;; suPostamente,dele dependem senão
se pretende ver nas manifestações, que
calculâvel' Por outro lado'
a resulanr. ¿. .ä""e-UrøiUard.r'*otr*,itica
os fenômerro, d. orá.- aleatória remerem
a uma probabilidade mítica,
e impenetr-,í,r.1, a fatalidade. Sob
dependente de uma instância rr"rrr..rrã.rrte
uma e orr,r" for-", ;;;;;"nsgride
o' t'q"t-"^' actanciais conhecidos' Em
,rarr"tiv", o acaso náo tem cornPetência
tefmos técnicos tomados da gramática
definível: ,r.- ¿.- orienl m"od"l - porque
ou não é motivado' e age sem
lnterações Arriscadas

Ew
t6

føsiþir
Fø¡otc*h cAPíru¡-o vl
Regine de ùt4¿çåo:
Regime de inteeção:
APROGRAMAÇAO
fimd¿& m
Reg¡¡ltid¿de
causal
OACIDENTE
fr¡ndådo ß SOB O RISCO DO SENTIDO
aleao¡ieda¡le
reguluidzde
(papel tønâtico).
î þapel catastóñæ).
Regulridade
sisbólica
Regime & s4tido:
Regime de stido: ø"itw€,
o "iæigøiñøtè' .

Regine de risco:
Regime de risco: o nsco pm.
asegw@.

Docøti¡uül¡ilo
Coti¡¡ül¡ils

C@¡tcltf¡o
ils
Coú¡tolstüo
ds '¡væl¡¡at
Substituindo as linhas retas do quadrado semiórico cl:íssico por linhas
'p¡ø¡ocl¡" curvas, e fazendo assim aparecer zonas de trânsito em lugar drs porçoes fixas,
pontuais por definição, do esquema habitual, essa foima de aprlsentação
IV vjsa a pôr em evidência os processos anres do que o sisrema que o.s sustental.
u Nlo-mtinuid¡¡ie
N[o-d¡¡c@ti¡ûidrds A sua leitura deveria.por conseguinte ser feita n maneira d. ,r- percarso, o
Regine de int6a9åo:
qual se desenrolará em dois rempos: primeiro, a parrir da zona do acidente
Regine de int@çåo:
A NIi{TIIPUILAÇAO
MotiYaçäo
Sæibilidade
pøceptiw
oAJUSIANIÐ'ITo
m
t:-g da manipulaçio e, dali, seguindo até o regime da programaçáo, ponro
m cman¿l
I
îndado
"
de chegada provisório. Este. rlltimo regime, que-define
fimdgda
itÞacioîalìdade
î
wibilidade
(@mpet¡ûcia
"-ï'rjo é- q".
(corDetCncia
moilal).
MotiEçåo
Smibilidaóe
¡atiw
estésica). prevalecem a ordem, a estabilidade e ã continuidade, pode, com efeito, ler
decisória
Regime do sotido: considerado, segundo oyrr-a p.erspecriva (aquela adotada,-co mo já,indicado, em
Regime de mtitlo: -f¿æ sqtidd',
" tq sìgaiñcLçÁo" , Da lrnperfeição), como dado'ha origem". Enxergado deste moáo, ele constitui
Regine de rircor
Regime tle ri*o: aiñgwg. um ponto.de partida alternativo. Daí um segunão movimenro, que conduzirá
o deo liøitzdo,
Fø¡@tif desta vez da programaçáo ao ajustamento, e*finalmenre, para f."h", o circuito,
Fffiqffi
do ajustamento de novo ao regime do acaso e do acidenie.

Diagrama 1 Modelo: relações sintáxicas


Ao mesmo rempo p€rcurso iniciático para um hipotético sujeito em
busca de senrido nas suas rèhções interativas o para nós, simples
"o* -,rrrdJ.,
Percurso de leitura, um ral esquema vale em primeiro lugar pel", lirrh"" d. forç"

esse ponro Passions sa,ns nom, op. cit., pp. 267-26g, onde indic¿mos algumas vanragens da
1.,_91::ol.
drpse por compara$o com o quadrado.
Sob o Risco do Sentido

Inter¿çóes Arriscadas
Esse elemento motor será com frequência sua prática mesma da
manipulaçáo, que terá tido por efeito transformar insensivelmenre tanro sua
queoorientamequesimbolizamtrêstiposdeflechasgraficamentedistintas:
pontilhado, quatro
e duas-em d,iagonal; ãm maneira de "manipular" quanto o sentido e o valor que atribui a esse modo
em ffaço conrínuo, i;;;;t."is diferenças de
ne de interação. Será necessário, por exemplo, que tenha passado de uma prática
flechas menores. Essas diferenças ".,;;;;;*îp-."dtaàs de oração fundada na motivaçio dzcisiona/, modalidade fervorosa da relação
signincaçáoq*ii;ilä;ñ-iï"':s;:å'.ïf;i:Täåt"H'n1",.[o: com o destinador, a um simples ritual de oração, prâtica quase maquinal e
PPf::#';,ffi :"å?"il,.i':fr dessemantizada, justificada somenre dentro da motivaçáo consensual. Engajado
rüä;;;;;'poa*'-"dis'linguir
de uma zon,- - por assim, dizer' nessa via, náo reza mais que por um tipo de fidelidade não questionadaa
os momenros nos dil;õÃào ^outra
contínuos que conecmm entre
sl os
si mesmo. E uma vez alcançado esse estágio, ainda 'þraticante", conforme o
na rota ao longo de um dos quat'o Taços proviso riamente
regimes num.r"¿o' ¿îäìV J "qotlt"'os
t tuais o-s111t3-r;ra caso, mâs agora sem fé, está, por assim dizer, maduro para passâr à zona de
as práticas de
dentro de uma ou outra dessas
qt'"t'o .:o+' t"P::lÏ:::Ïdo
ali estáo em vigor-: espécie de
percursos
programações causais e'þositivas".

sentido d. irrt"r"çä".rp..ril"Jque fr'..h* þ o "tithadas' cada


Contudo, apenas acabada essa primeira metamorfose, há toda chance de
"
i n to c o,num mes
miil:TËi]"aä Ë;' ;;;".,'^ que se inicie um novo processo de transformaçáo que, cedo ou tarde, conduzirá
tlgttmas observaçóes' nosso manipulador, agora convertido em programador, a superar também essa
um desses momentos 'ãqtttt
Elas conduzem de uma a
outra
nova etapa. Com entusiasmo, descobre primeiro a possibilidade de programar
Primeiramente' as flechas menores' dos regimes
prin ipio frndador de cada um com sucesso certas operações para cuj arealizaçáo não dispunha na erapa arirerior
das duas formas sob as quais g A
considerado, ("1.;;;dåã.,
i.i.n.i"^"Jiå"¿., .t..) pode. se dos quaffo
apresentar'
de outro recurso senão o de remeter-se ao suposto bem-querer das gentes e até das

hipótese, nesse nível' consiste


t- qt"' tto interior dã cada um ffansforma coisas. Enfermo ou vítima de qualquer ouma fatalidade do destino, deslumbra-
neutra' -"' qut"" exercício-mesmo -se ao poder constatar agora que é mais eficaz recorrer aos remédios fornecidos
regimes, nenhuma prâtica'é o uso' aprende-se a
como fosse somentå po'qt"' com pela ciência que implorar, como fazia antes, o favor dos bons ou maus gênios
a maneira
"""t'"t' da naútreza. E muito r.þido, apropria-se do conhecimento de toda espécie de
dominálamelhore,Porisso,aperceber*"i,.l","-entesuaspotencialidades
técnicas operatórias, considerando todas com a mesma reverência, quer sejam
e seus limites'
um sujeito que' 1rum dado momento' de
se
elas de um interesse vital ou de uma ordem mais trivial. ora bricoleur, ora
Imaginemos o percurso de absurdo e pleno cozinheiro, segue com escrupulosa aplicaçã.o os modos de emprego e respeita
encontresse r"b;;.ïîä"äi"¿ä^l.i¿rio,'caótico, acabasse de as receitas como palavras do evangelho. E pouco a pouco, como Bouvard e
perigos (azonat ão t'qt"*a) 1ue, P*";;P--o^ît:.:tttno'
e
um pai' um chefe' um b.rxo'
dtstinador - Pécuchet2, mete na cabeça que rem de planejar também, com o mesmo método,
inventar a hgura ätìtl ¿t um
um deus, Pouco importa -.T,q""1
pt'do" se dirigir e que' por sua própria todo o emprego de seu tempo, tanto seu trabalho como seus passatempos, seus
lhe trouxesse ao mesmo tt-oo
um pouco de encontros, sua carreira, apoiado e até aplaudido por seu entorno que, em geral,
existência (real ou suposta)' se"tido' Û-" vez efetuado compartilha de seu mesmo gosto pela ordem. Entretanto, eis que então começa
sesurança . o de que
" "å;;;-t'm
""'i-åto ir,r.J"¿o no universo da manipulaçáo a chegarJhe intermitentemente esse tipo de vazio da alma matizado de tédio
.rã. g.r.o fu"d"å;;;r.¿ áoråu"r,,. dele se dirigir a seu
(zona II), á" t""ç" (daí.a:t"Cut como modo que Greimas associa à rotina, fastidiosa e tranquila, de uma quotidianidade
"q'"tt seja) e da fidúcia (dado
qu€ somente a confrança em excessivamente ordenada. A bem da verdade, pelo momenro, trata-se somente
destinador, qualquer que
reconhecidos também pelo
outro permltem de um mal menor que se esforça por aguentar, considerando-o como o preço a
cerros valores . i;;;l;;i"iipior de que
interagir estrategicamente)' n
p-'t á"i' ""1" t*t1 ?^t^î"t"ttdade pagar em troca da segurança e do conforto conquistados com grande esforço e
que continua apreciando acima de tudo. Assim, pois, o verdadeiro risco de um
umdiaeledêumpassoamalsrumoumuniversomaissesuroainda,ou'em (III)' Mas
mais Pt';;;;q"ele da progi"maçao cstilo de vida tão bem programado está em ourra parre.
rodo caso, mais terrestre ou
terá sido previamentt qi" "lgo o'"ih" levado a sair da
para isso,
assim-
"tt""i'ìå
to','o tinha sido necessário quc
zona de manipulaçáo' "ï"'io""'t"tã
da zona do acaso' l. Referência a personagens da obra homônima de Gustave Flaubert. (NdT)
orrar" .oir" o incitasse a sair
Interaçóe s Arriscadas
Sob o Risco do Scntido

Täl risco reside no fato de que a programação não se deixa Por muito bom senso (aqueles um pouco menos
supersdciosos que a média), pera
tempo conter nos limites da funcionalidade. Ela tende a impor-se Por si de um destino mítico què ,. pode
desafiar ou conjur"r. Ao contrário,
idéia
mes^ma, como um fim em si. Otganizat suas atividades com vistas a objetivos ganha
uma primeira vez, vortará a tentá-lo, se
.onfiando'n, ,""-u"" esffera, e logo,
determinados é uma coisa; programá-las Parâ que tudo esteja sob regra e crendo rer vencido a prova qualificante,
acreditará .., ;i;; peh sorte. Tar
assegurar-se de si mesmo esiar em ordem é outra. Mas é fácil passar sem o risco ine¡ente qn"r,r: expoe não quem perde, mas quem é

solu!áo de continuidade do senso Prático, do espírito de previsáo e de "o


regime. Porque é necissário que s.ja ganha sob esse
rorir.rrr. depois de tei sorrido o suficiente
método, do amor pelas coisas bem feitas, a uma patologia delirante, inerente que a sorte vire, como s€, pâra se
manifestal sorre esperasse por princípio
ao princípio rn.rrno da program àçãio; aob_sessáo pela regularidade. Obsessão o momenro em oue o jogador teria terminado " T;
por q,r.,i;'h;.
p.lä d.t"ihe, hiperativismoiem objetivo, fantasma de um mundo totalmente Depois disso, não s.r.i" d;;;;";;.;". "poi*t,rdo
se sinta incrinado a orienrar-se até
controlado, a paixão Programática tem estruturalmente tendência, por outro regime, um regim¡ um pouco
incerro _ il;r" de novo, rumo
sua própria lógica, a desembocar em uma forma paradoxal do trágico,_ o uma ou ourra variante da manipulação. -.rro, a
trá.giro do tøíat, como em Kakfa, Becket ou Pinget. À fotç" de instalar Não nos escepa
9u1nt1 há de esquemático nos cenários que acabamos
poi tod", as partes nofmas praxeológicas - de classificação, de higiene, -de de esboçar' Nossa iirtenção é, no
ao pé da letra, o programador m:íxiåo, indicar o gênero de processos
þrecedência, à. pro.edimento - e de segui-las mutações, dent¡o de. cada regime,
que teriam q.r. ,.r'"rrJir"do. a partir
de
,. tr".rrfor-a irisensivelmente, insidiosamente, inexoravelmente talvez, em de
textuais prec,rso.s ou de práticas
maníaco da prescrição e da obediência, independentemente tanto de toda ??y
cle crrcunscrever o devir estruturl
empiricamente observáveis a fim
próprio de .ad" ,- a* estilos de vida
visada funciånal quanto de toda interrogaçáo sobre o sentido do "dever- correspondentes. Nessa perspectiva,
Ëa qu. se prever que as oposições
fazer" que ele mesmo criou para si. As regularidades que se.impôs adquirem que Propusemos aqui duas formas bin¿í¡ias
p"r".lå aforçade necessidades quase causais, das quais deixa de ser sujeito -
de sensibilidade se reverariam
de acaso,'d.-oårr"Cão,Ie regularidade,
para converter-se em objeto. Menos prisioneiro de suas obrigaçóes sociais
- rapidamente insuficienr.r. Ir.o
quer dizer que
no lugar das quatro flechas po"uhäa",
Jo .rq,r.*", reriam que ser previstas,
que d. suas próprias compulsões organizacionais, necessitará, se não quer nesse nível, pequenas etyses ¡.á
que articulariam a lógica interna
instalar-se ,r" lo,r..rt" , ir ité o final dessa experiência e encontrar qualquer mini-percursos de t¡ansfor-"çao de outros ranros
ig"A_.rrt. complexos:
desordem fora da norma Para ser levado um belo dia a se interrogar sobre
o porquê de todos esses algoritmos impecáveis. Constatando entáo que
.rå, ,rão tinham senrido algùm e que, ao segui-los, náo fez mais que perder l,ógiæ da çgulaidadc
seu tempo, encontrará aliez a força para transgredi-los, para ultrapassá- LogiB da atcdøicdade

-los em to.." de outro regime, no qual um mínimo de sentido e de valor


poderia de novo emergir ãa intet"ção porque esta teria enfim cessado de
ãrt", ptogt"mada. Esse outro regime será o do ajustamento' Itrjgi@ da inænciqatidade
Logicæ da sæibüdade
Não há dúvida de que tamPouco Permanecerá indefinidamente nessa
nova zona: veremos mais aãiante aquilo que pode levá-lo a sair para dirigir-se
atéa.zona.do acaso. Suponhamos, pãrém, queiá,chegou ao limiar dessa última Diagrama2
regiio. N, face ao aleàtório, o qn. o ameaça ni¡o é tanto o risco, evidente, Enûeranro, uma tar construção
de perder quanto' paradoxalmente, o de ganhar. Perder., no jogo, 1o ".*9t' trabalho' Retornemos, enrão,
urtrapassa os limites do presente
nos negóciór, . p.rã., desde o início poderia, ao contrário, salvá-lo! Perderia,
,rorro modero simprificado (Diagrama
consideremos agora as flechas "o r) e
mas uma aposta medida, visto que â sorte - sua má late¡ais d. tr"ço, condnuos. EIas
obviarÀente, ,,r" indicam um
"port", ¡rrimeiro tipo de Passagem, "regressiva", ."-; dizíamos
sorre - ainda não ì teria converrid; em um verdadeiro jogador, num louco, t ourro' viu-se, com efeiro, qú. o risco inerenrü;gtr" ;;ir"", de um regime
num apaixonado. E em compensaçáo, ganharia a vantagem d9 não ser tentado d o de "cair" na programação' isto r"d, *no;parøção
a subsiituir à idéia da probabilidade estatística, partilhada pelos indivíduos de
é, de passar d. ,.r",irr"menre
"-;;;L.
Interaçóes Arriscadas Sob o Risco do Sentido

aberta a Possibilidade de efeitos


incerto mas que, nessa mesma medida, deixa que consütuem ao. mesmo tempo seu oftcio, sua paixão e sua razão
de viver
mesmo rempo que
ã.,*,i¿. imprevistos, a um universo mais seguro_ao do sentido e à dissoluçáo
os colocam a cada instante à beira da descontinuid-ade
carastrófica no limite -
nronenso. Dor força da redundância, ao esvaziamelnto do acidente -, esses cam_peões do ajustamento
são também, se é possíver assim
consiste em derivar
#åöid'.*.,"11ì-.,ri."mente, o risco do ajustørnento dizer, os grandes ."-p.6.,
da supérstição face ; Jã;porrirr.l.
demos algumas indicações
rumo ao acídente e, Portanto' ao sem-sentido' Já Todavia, é necessário ir mais rolge. Generarizando,
d.r..-re pergunrar se
referenres às modalijades dessa inclinação
qua;do falávamós das.práticas de o ajustamento enquanto tal, esse equilíËrio
os riscos de acidentes eram instável entre abandono e conüole,
;;;;;ilh". Pod,er-se-á objetar 9t':, t- tais cãsos' entre deixar-fazer e retomar, náo é sempre (mesmo
práticd um jogo com o limite,
*-gr".r. desiguais na
demasiadamenteevidentes.Assim,pois,parajustificare,generelidacle'da
regimes, é preciso verificar
r-" Å"r.ira
de ,oç"rî impensável, de
relaçáo de implicaç; õ-"". .rro äo¡.,rltitttot aproximar-se cada vezmais perto do irreversível,
ponrå ã., n q,r.rrr.-..r,"
sua Pertinência em outros contextos' acabar por cair nele.- Desse ponto d.e vista,
.r- "d", mais úelas'pdi"; ;;;
Há,naverdadegrandesafinidadesentreoestilodecondutasque esperam por ser escriras a dtulo de uma
do regime do acidente' O
semiótica existencial ,.ï"
implica a interação por ajustamento e o espírito por tema a a*e da derrapagem controkda. porque
é possível qu."pnJ"a"
ìoda prática
núcleo de significaçáo que lhes é -comum 'Ë
dt"""" poi oposiçáo aos esdlos de ajustamento seja d. tudo um pôr a prårra ri
e manipulação' "nto com -.r-o através de uma
de vida domirradol t* "'tit"1"çao entre Programaçáo. em leis físicas relação toral e a¡riscada o outro, ,r- þôr-.."à prova que, para atingir
que pressupóem tr- de sentido eståvel' assentado seu pleno valor, exigiria se¡ levado ,.,, porrro :";;;;. No ápice do
e onde primam "té
constantes, .*ot¿,r,"¿o fo"o"t'"tos' fixado em instituiçóes'
""'i"t"o
ajustamento , a realizaçáo úrtima r'accomprissrkrn,
- -J f"ã*i" ser arcançada
a circunspe çáo, a ñãd;;;;-o ,.rli.*o. No lado oposro, os regimes do assumindo-se o risco iminente da morte. Assim
poder-så-i" .rr,.rr¿er melhor
. áo formam em seu conjunto uma "constdin:t-:t:Ï certos comportamentos à primeira vista estranhoa ,,irracionais,,
_ que se
"¡"ri"-.ï.o "åid..,.t
iiria Geo.g Simmel, onde o sentidn 11a;da é a cada
instante posto em Jogo. observam em esfe¡as deatividade que não comporram-
"por e¡¡reve o sociólogo' perigo fisico, mas ond.e
Tiata-se d" .onrt.l"i io- i^ o"n'ur¿' Nela' ÏT þd1, (sem as quais
a imbricação entre práticas de ajustamenro
ao ourro e riscós de acidentes, ao
;;ã;ã;i"d. d" fbi;;. ¿" "i"*i¿ade intelËctual.do indivíduo" que se
menos profissionais, é particularmente estreita.
plrrível se ajustar ao ourro, nem aproveit,o a oportunidade
"aã-a temPo' "por outro ladã' abandonamo-nos
por completo ,, , { o caso, por exemplo' entre os comediantes, cuja obsessão pelo ,,mau
apresenta) . olhado" é bem conhecidã, mas também €nrre
"o -.ráo d" ås qu"is podem num só instante favorecer-nos os poríticos apesar de sua
ä forç", . x .rt"rrl., "id", manip.uladorr po_r vocação e de progra;"d;r;"r
no, destruir Por comPleto"3'
or'r
lï"T"_d-r
rsto é, de gente muito "realista". Mas o oftcio-da"política
necessidade,
do toureiro prestes a não consiste
Pense-se, por exemplo, nos rituais complicados tT r-1série tranquila de discursos.prog¡amados pela razáo (ouseu "p.rr",
antes de entrar na pista' A.gestos
subsdtuto,
enrrar na arena ou do .orrådo, de automóveis doutrina) e de discursos manipuåt¿iios .m foi-"
em ambos os casos práticas dr ' d. prà-.rras. Arém ou
de caráter explicitamente religioso se mesclam ;rquém da retórica argumenrariva, tar oficio implica
,#ù;, ao menos de
"supersriçáo"a. Tais campeóes - tais
conjuraçáo d" ,";^;;; à.p-.rra.- da vcz em quando (notadamenre em rempo
d. .år., _", a"_b¿m, d.e modo
,," de amoldar-se à dinâmica dc
apaixonados _ do ajustamento.são mestr., ",..
tnais banal, em período eleitoral), ,r- .årr",o,
direto ou ,.mediatizad.o,,, com
bólido - aPenas
uma força infinitaiente superior à.:i? aquela do touro ou do
.
I
rs cidadãos, assim como encontros face f^rá
q". ,;q;r;; a cada instante
pelo jogo, corpo ;;rp, ã* sensibilidades, percePtiva ou,readva, próprias , tom € o gesro oporrunos, isto é, uma ^qualidád. d. pr.rença intimamenre
" coãrdenando seus resPectivos
um homem e a um "rri*"I ou a uma máquina ...:r:::::"-.":. - às disposições, às expectati.,"., movimenros,
eminentemente arriscada's' "¿:r..ada "o, poder
movimenror. N" rn.¿iia em que esse tipo då práticas ¡os humores do auditório, não para dobrar-se a-eles mas para ,^pn^r,
rcavivar, cumprir suas porenciiidades de sentido5.
T.ndà em visra que o

trad' A' Guillain' Paris' LA¡che' 2002'p'77'


3. G. Simmel, La PhilosoPhie dz l'auenture(l911), "Shikattr p
4. Sobre critérios semióticos de diferenciaçáo
entre religião e superstição' cf' E' Landowski' \ l"l' Presenças do outro, op- cit.,"o herói mediador", pp. 196-20r; passions
''' sans nom, op. cit,,,Dianain
na7", ørt. cit. 'rr' , pp. 206-2t\.Tiad. þort. Galáxia,Z,il61."'
Interações Artiscadas Sob o Risco do Sentido

anrenor porque somenre um


sucesso desse tipo de confrontaçóes, mesmo cuidadosamente preParadas, não espaço tridimensiolal permiti
riafazê_raaparecer:
rrara-se da recursiuidaded"r
pode jamai, ,.i de antemão' para obtê-lo, requer-se sem dúvida r.l"ioË,
Aplicável a todos os processos
*,r.
unidades revadas em conside
ração.
"rr.g,rrado
não somente na sua própria intuição frente ao outro, aúordados ",
ttrna gt".tde confiança
-.r-o "ré;;;;"ärJro"¿.
leque de percursos possíveis abre ainda o
-"s ai.rda no favor da sorte, que, nesse tipo de circunstâncias, pode tanto
"o
rempo que murtiprica as possib'idades
de sua interoretaçãã. Se, "horiro.,iJi..,r.f
contribuir para fazer milagres quanto, como notava Simmel a propósito de i¿Ë"ì-'ä.'ä;"r. bidimensional
do esquem"), ,oåo t.g,;;;"r;;äo
outros aventureiros, arruinar em um instante toda uma carreira. Vários debates
implicação ou por coitradição,
. ¿. interação ,*å. a um ourro
Þor
televisivos permanecem na memória para testemunhá-lo. Compreende- 'verticalmenre" (enrre ."ol ö;;iod.
-se que, ,r.rr"r condições, grandes mestres do ajustamento em política (que
.ïi_9.J; superposros "d.-"is r.g.r
pr"rror. i-"gìn"'"-enre
é' recursivamenre'. sua própria reirodução. no espaço), isto
talvez atribuam valor real somente a essa forma limite de prova política, a Assim,,r'-""-".ripuração
rer como objeto de faier q,r. pode
mais aleatória que seja) tenham sido frequentemente grandes supersticiosos, à o suieito -""þJ;il-')io)4oupor
escuta dos augúrios de seus asûólogos ou de suas cartomantes6.
:'iJï:il:f: Hg', åî;::i:1¡; ;;;;;iîä^ i t",
sua
..;; ñ.ú
vez

Entretanto, retornemos uma última vez a nosso esquema geral e, depois -f


ar urras r.íáçã.,
ffi.i," äi: ï:ili1ï: j:j;
p rosra m
das flechas laterais, fixemo-nos, mais brevemente, nas duas relações que faltam
o i,,
üil;:r:iainda,
um novo programa no compuraãor);
o-u ì.iã.rrae pode seÍ ,,feriz,,,
ser descritas, aquelas rePresentadas pelas diagonais. Por oposiçáo aos riscos de
de possibilid,ad; "-
enquanro produz as condições
caída de um regime em outro, rePresentam respectivamente' Por uma parte' fortuito (é porque encontrei po, ¿ ;ä; aconrecimenro
uma "escapatória" possível fora da esfera perigosa do aleatório puro, que leva trve a sorte de...); e finalmente,
u^,
",' fur"rro;;;"" ;"rde, graças a ele,
até à manþulação, ã, pot outra, mediante a Passagem ao ajustamento' a via de
um primeiro .*iroro
dado parceiro (por exempro, ";.r'rì*.îro com um
uma liberação com relãçáo aos Pesares de um mundo rigidamente programado. uma ,ilJä;
""ã."rìuí¿e
a outras experiências partilhadas,
em linhas g;r"ì;ã;;".räi "dra)
pode abrir a via
O primeiró percurso, q,ra .ottãat, em suma do "caos" ao "cosmos", é atestado ao seu princípio, embora rr"r,rr.za quanro
mais profundas...
so6ret.rdo pélos mitos; ò segundo, onde, ao inverso, a "aventurd'vem subverter
Mas aqui rambém, as rerações
a ordem, é mais tematizado pela literatura, do conto popular ao "bovarismo", se comprexificam rapidamente.
da recursividåde propri"-.rrr. Ao lado
passando pelo gênero fant¿ísiico. É a esse último gênero que se deve uma das Jii], r.g""¿"; qual uma iít.oçao
de um dado regime comanda,r_" dependente
il.tstr"ções liter:írias mais emblemáticas desse percurso) em todas suas etaPas:
para uma recursividade de caráter
oirr" d. ;,;;;;'îpä, iu também lugar
,r"r"-rå do romance do apren diz de feiticeiro, ou do sábio genial embora oblíquo, or.r. .,r.çrrt{i..r"a.rr.ra
o funcionamento de um regime tal que
Iouco, que, cansado de suas tantas certezas, cria, como escapada para Passar d.tåmirr"do å-rrrå"--ou condiciona
funcionamento de um ourro
da ptogiamaçio ao ajustamento, um artefato sensíuel, monstro à maneira de i.gi-.. Assim, ."-;;ì;;;r-oport,r.ridade o
observar rapidamente, o d.r.når";;;r. de
Ft"nkJtrsteit, q.t. por sua vez, como era de se esPerar' escaPa logo ao_ conüole dia programn,
das tecnorogias permite hoje
¿. t¿ ;F:";*. esras ,rj^m-r^ples em
de seu criador (d. iní.io somente reativa, sua sensibilidade se transforma em
a seus usuários^áqyT
(nesse caso, se poderia de ajustar_se
competência perceptiva autônoma), volta-se contra ele e, numa catásûofe sensibilidade. Da
incrusive àä^p",|;ros) dotados
de
finique ilustia pãrr"g.- do ajustamento (no caso, entre criador e criatura) -:,ïL-9i",1;
muito bem buscar ajustar+eà ;.f"iå., i,iüJ"o;*,væ, pode_
"õì*ã,ä,.;;;;;.*;:""
"
aleatóiio, reduz o lugar por excelência da ordem - o laboratório científico,
se
maneira d.
para chegar, a partir d1li, a hexis, apenas
templo pagáo da "lei" - ao estado de caos. no discurso da publicidadeT.^rtt "i-i)ï;purá-h,.";;;;;i... .o-,,-.r,r.
E.t-úrrioå i"rra".i",
Para concluir o inventário de relações em jogo no conjunto dessa situado *u'"-rnto da.ie.r.i" åil ä.r{::": p*i;;;_.. a um prano
construçáo, cabe mencionar finalmente uma propriedade sintáxica comum produzir'oprogramas? Levar.- .;";;; "
po., qveo azar não poderia
a todo modelo desse gênero, mas que não pode estar figurada no diagrama L.,rrririd"dË ¿" Ji".*. que articula
relações entre regimes poderia as
"r.il;;; zir auma*ør-"r"çro, em rermos
6. Cf. por exemplo, para citar uma, denrre os especialistas na maté¡ia, E. Tessier, Sous le signe dc
i',2i"i,h:Î;;;Eit;'Jil9ïi:.¿:iffi'u1. ra pubricité" semiotica, 163, 1/4,2007;
trad,. pon.
Mittenand, Paris, Editition no 7, 1997.
lnterações -Arriscadas
Sob o Risco do Scnrirl,,

semióticos, de grandes questóes sobre "origem". Se o que se suPõe


existir o que poderia se! nesses domínios, o comporramento
é de atores cujo habitus
no começo é um mundå d" ordem, um mundo Programado' necessário seria, pelo contrário, esrruturado segundo
do, ,.gi*,
que ele -.r-o proceda de uma ordem primeira com relaçáo a
ele (e assim ou do acaso. um breve exame de"uma ouüa "ìógi."configuração do ";rrrt"-.nt,,
d.r.á gê";r;;-;
sucessivamente, como nâ ontologia clássica)? ou, náo seriâ,
antes, o Produto conuersação
- que também se presra a modulaçõ., ,i,rito variadas I v"i .ro.
aleatório de um caos origin"l, ,im simples acidente numa descontinuidade permitir precisar algu5rs últimos pontos concernenres
a cada um dos ,.g;;;
cega, como numa ontologia de inspiração
"pós-moderna"? revisados (e mais particularm.t t. o da manipulação),
e, em seguid.a, rerornaç
de modo mais geral, ao conceiro mesmo d. ¿irr..r"çáo,i'.-ì.-i¿,i.".

lnvestimentos semânticos . A noção de conversação, simples "troca verbal", como diz muito
laconicamente o dicionários, re.obr. na realidade
todo .r- r.q,r. d. p;ári;;
discursivas heterogêneas cuja significação e alcance
ser existenciar, para os
As interpretaçóes que podem ser dadas e as conclusóes que Podem protagonistas da interlocução, t'"ii"- por complero
tudo como em função do regime
obtidas d. r- -oå.lo å.rrå gêrr.ro, que se apresenta antes de de interação e de sentido no quadro ä. qJ;;
p""d;res
Como se colocam
uma sinraxe, dependerão do tipo de semantismo qïe nele se invista. para "conversar". segundo o regime da program"ião, 'tor'o.rsar',
de registros tão diversos consiste
tentamos mostrar recorrendo e*emplos tirados no fundo.em praticar uma formã a. ioi. (ou a vários): tem-se
" tanto -o.rotolo
quanro possível, um modelo semelhante pode servir- para dar conta "
aí a modalidade mínima da interrocução, re{uudar.j"ì
rro.* de'opiniões
å. p.r.,i*os individuais quanto de proceiros interativos em grand:..t:4" convencionais, como no caso da "conversação de
saráo", seja a um jägo de
da história
f" g".rr" e a paz). pode-så inclusive projetar nele uma.,filosofia definir e Perguntas e resposras delimitadas por um quadro e objetivos pr.cisoi, ão-o
àrr,".olo.".rdo-r. ,r,rrn nível de g.n.riid"de extrema, uttlizâ-lo para na "consuhd' médica ou jurídica. ö"d" q,ri reproduz
;;; espécie d.e texto
diferenciar umas de ourras as cãndições de emergência de conceptualizaçóes previamente escriro, série de enunciadoJ r.q,r.iido, "i
pela situaçao,
e de práticas ranro do tipo religioso (em lugar^do fatuTn cego, instalar
um línøy mesma. ou qualquer ouúa codificação do dizer funcionassemcomo se a
sozinhas
destinador motivado . ac.ssírrelf quanto científico (em lugar do destinador, pela boca dos locuto¡es,Nesse quadro, quanro
mais programada pero .orrr.rã
(em lugar da
buscar descobrir a lei de um" ,.grrl"ridade) ou estético parece cada intervenção, mais szu sentidà se
presra r., áirrirrhado de anremão
regularidade repeririva, inrenrar apreender a dinâmica plástica
e vivente e mais a interlocução tende à insignificâncii. "
das formas sensíveis que fazem ,..r,ido e tentar ajustar-se a ela por meio da
(em lugarde todas
O regime de ajustamento, por conrraste, corresponde a uma
o:inçaode obras d. ou, ainda, propriamente filosófico interlocutória onde o sentido é criaåo, e criado em
prática
"rà) aro. n'r.lii"çao programada
for-", e além de todos seus efeitos de sentido, entrever a imanência Purâ e de enunciados relativos a esre ou àquele fato é substituída
",
apostar pela descontinuidade heraclitiana)' pelo gesto
enunciativo de endereçarnentg recípràco enrre um
Eu e um "gor"
lir. o discîrso,
Dar conta concretamente da maneira como essas grandes classes nesse caso, faz sentido gradativamente, e cadenciadamente, ..entre
linhas,,
de enfoques, de alcance universal, se constituem e evoluem em contextos ou 'transversalmenre", através de um jogo de
trabalhos de alusões, de antecipações e atrasos q,r. i.[0.-, "rdi;;;;;Jior,
d. elipses e
específicås correspond eria a uma semiótica da cultura e exigiria rl
J por parre dos interlocurores,
gårrd. fôlego. Ni", o mesmo modelo permite também' por exemplo' mais .1

uma rítmica comum da palavra trócada.^É o q,r.


¡ ,.-o. chamado em ourro
im.di"ta-e.rte e muito mais modert"-.t t., analisar e comparar entre si as lugar de "dança da interloìu
Ção,,g.
se escondem sob certas
frári."r, com frequência muito heterogêneas, -que culturas e que as línguas 9op o regime do acidente,
ao conrrário, o sentido aparece de novo
ionfigurações inteiacionais reconhecidas por todas as como dado, mas de uma maneira diferente com
como se relação q,.r.'r. observava na
se [rãitam quase semPre a designar por meio de noções genéricas' conversação programada. se ele se deixa apreeend.r, "o
formassem um bloco monolíticã. Já ãvocamos a esse respeito a configuração $r aqui tåmbé-, à -"rg.-*
da d.ança, e após, com um pot.ã mais de detalhe, a da guena' tentando
J.ri-i."r'. qrr. dif.r.ncia as ìnaneiras respectivas de dançar ou de combater lì. "Echange de propos", diz Le petit Robr.rr. (NdT)
característic", da .r- "programador" oll de um "manipulador" em
relaçáo com

L
9. Cl, "Le temps intersubj ectif',, passions sans nom, op. cit., pp. 170-176.
Sob o Risco do Sentido
Interaçóes Arriscadas

dito' é dessa Yez da' dirigir-me à secretária, cujo papel não é o de servir cafe, e que cerrarnenre
de qualquer relação de tipo dialógico Propriamente Vislumbre no limite tem nesse momento outra coisa mais urgente afazer, será necessário usar de
do relâmpago.
maneira repenrna,,;;."tã.i;fã-.t; no fio do discurso do um pouco de diplomacia. Porque não é abolutamenre seguro que "fazer-um-
o t'e
do inefável e do sem-sentido que "'¡t'to ""pt"I -fa¡o1a-um-colega-preparando-lhe-um-cafezinho" seja a sé,rs olËos um projeto
orrtroounafeiçáodealgumasdesuasexpressóes..náo-velbais(fisionômicas prioritário em relaçáo àquele que consiste em "não-perder-um-minutã-para-
o-,sentido se impóe tão unilateralmente
ou gestuais, por,,""i'"oJ"p'o-*ãmit"t)' terminar-um-trabalho-urgenre". Ao contrário, tudo indica que ela tenãeria,
einopinadamentequeoúnicogestodiscursivopossívelparaaquelequese "fechar as antes, a privilegiar o ualor trabalho em relação ao ualor conuiuência. Em outros
por sua apatiçáo - " pot'to de
encontra d. ,.p.n..';át't'-u'"ã;' termos, é porque aquilo que eu gostaria de lhe fazer fazer não corresponde de
p,ílp.br"r"to -Z ¿"ordem da exclamação' antemão àquilo que ela pensa que deve fazer ou àquilo que rem vontade de
práticas qt interlocuçáo
Em oposição, o qt9 caracreriza as é, um. gesto fundamental de
fu.t, q.t. é necessário que eu a convençe a respeitodo inieresse que ela teria
correspond.n,., "o-";,,.;' i".-""ip''i"fáo ^.or,,r.rr".ionais
preestabelecidos nem
emfazer o que eu gostaria que fizesse, emvezde continua, afuei o que faria
interrogação. Nem fi;;ä" por
rituais se eu não interferisse em suas ocupações.
entáo'
com o inefável' o sentido aParece'
impostos p.lo .rr.o"ì'o ""ì¿t"t¡ De modo mais geral, toda manipulação consisre do mesmo modo
não mais por efeito de um ajustamento
uma vez *"i., .o*ã construído - contratual em fazer outrem desviar-se de sua trajetória para orientâ-lo a um projeto
mas por -tio dt uma relaçáo
direto, em ato' entre os locutores' questionada' de atividade que para ele esrá "fora do programa". Isso equivale a dizer que,
nem semPr. pr.'t i""""" tst"btlt"id" "
itlno" suscetível de ser
vontades entre qualquer que seja, num nível superficial, a tâtica manipulatória que se julgue
De fato, antes de ;ã;i;; a um fazer p"ti'o' o acordo das
signifi cação adequada (o charme, a autoridade, a renração, erc.), a operação åq.tirrj., ã-
a nËgociaçáo,1^'^::.î:i'l de
manipulado, . rn"ffiãá i-pf i'" deontologia última instância, a renrar persuadir o ourro do valor do valor (neìs. caso, a
e de um sistema dJ ""lo"" ""it
to*o a aceitaçio de uma convivência, por oposição ao trabalho) que, ao menos implicitamente, lhe é
da troca "ctnversacional") que lhes
da troca (inclusive, ou primeiralnenter ProPosto privilegiar ao solicitar-lhe fazer isso antes daquilo. Procurar assim
seiam, ao menos em Parte' comuns
t q; ''Possam.desempenhar o papel de fazer o outro colaborar com o próprio projeto, é portanto convidáJo aaceitar
uma instância hierarquicamente "'pt'io'
pu de arbitrar suas relaçóes:
de seøido uma maneira determinada de hie¡arquizar os valo¡es. Em pequena escala, é, em
,,Reconhece s o ualor d.os ualoresque re ãr.r.çoi Aceitas o cunffa'tT
a significação antropológica outras palavras, contribLir para construir intersubjetivamente uma axiologia
que te proponho?'i Ntt" questionamtt"o "'idt pressuPosta comum, uma comunidade de julgamento. Mas anres disso, é obrigar ott, pèlo
o'i toda, uma,fi losofia''oti1'-'t""to
profunda d.rr. ";"' menos, incitar o ourro a dirigir um olhar crítico sobre os programas que o
ä;r. -;;;di" "g;t;por nossas estrategias uma de persuasáo cotidianas' mesmo as
guiam, a questioná-los ou pelo menos - se insiste .-
ä; il;;;. È"' þot"o talvez mt'èç" explic açio' -"nt.i-se nelei - a
devolver-lhes um sentido que talvez tenham perdido por força da repetição:
Quando ,. di"
(to* rnío)que a manipulação equivale atmfazer querer int¡omissão perturbadora sem a menor dúvida, mas que pode também ser
evidenteme"tt q'"- o qtt'l o manipulador se
fazer, pressupõe-se "ìititå "o interpretada positivamente, como uma contribuiçãã à r.rr.-"rtizaçio
de antemáo fazet oq"t qttá' qttt ele faça' Senáo' encontrar-
dirige não quer " das práticas individuais ou coletivas tornadas rorineiras, isto é, reduzidas a
pr;;;;"çåo.. S,rporrhamos que, estando
_se_ia em uma ourra configuraçáo, cstereótipos de comportamento. Nesses diversos aspectos, por mais trivial,
no escritório, -. ,,io" l "ã"t"ät
dt" tlnã' t"ft' -"' qot náo me disponha mo.lesto ou egoistamenre inreressado que porr" r.i o objeìivo visado pelo
"-
ir tomá-lo num bar ao lado' ou perguntar
do necessári" P"'";;;"'¿-to' Posso rnanipulador, toda manipulação constitui um passo rumo a uma re-fund)ção
à secretária se ela leria a gentileza
d. ;; fizet urm, sabendo q"t tl"-1i:l-:: d.o enquanro universo de sentido e de valores assumidos e paitilhados.
da p.rimeira^soluçáo é que eu náo
terta
'läl.social
do necessário para isso. Àrr"nragem a cafeteira' já quc é, parece-nos, a significação última desse regime.
que manipular o dono do
bar pã'" q"t ålt f"ç" funcionar
ofício' Ao contrário' se decidtr No inverso, a impossibilidade de alcançar enrre os interlocutores um
é esse o Prograrnamesmo em
que to"'l*
"t' ¡rível de acordo sobre os valores faz surgir uma brecha que põe em questão a
nirtureza de suas relações e cria as condições de passagem ã u- o.rtro regime de
i.teração. A ponto de que, num contexto de confronto, .r- agressor pðtencial
imPerfeiçã0, oP' cit', P' 99 '
10. Expressóes extraídas de Da
Sob o Risco do Seqtido

Interações Arriscadas
passando pela conversação, os quatro regimes que descrevemos supõem
(ou as Pretensas reticências) todos, por definição, um face aface entre no mínimo dois atores ., entrå el.s,
a suPosta incapacidade
possa tomar como Pretexto
o d"';"d;t;
valor que lhe são ProPostos a fim o desenvolvimento de processos muito diversos por intermédio dos quais ao
de seu adversário Para iulgar em
ustifi car tt-t-":::- à violência' menos um dos dois "age" sobre o outro. Na conversação programada, o que
de desqualifi cá-lo'ry#äìitJ":Ït":e.j "
um diz dita ao ourro a réplica prescrita pelo uso. No regime do acidentå a
vez danegociação' d"'",i"o' o me11 lais eervello ::li::ï:ti,1t','.'trii: irrupção do sentido, ou do sem sentido, é táo perturbãdorâ que o sujeito
*åiif,åä:'"'*i:;*:X¡åtr'.!:"fi:iil:.ii.3i.'i,'i:ä;äi;
tïä;;; ptt"" at t"" i"""'"tt' ou de sua mávontade
se encontra estupefato ou extasiado e, em todo caso, desampárado. Sob o
regime do_ ajustamenro, cada impulso de um constitui um ionvite para o
adversário ilustração
"p",."t'a
p.ñ;;"i"..r*ii."al recente forneceu uma boa outro amoldar-se âo seu movimento. E na manipulaçáo, o fazer p.rr.r"rì,ro, ,.
de princípi". A iraniano?
pode+e negociar com o governo alcança seus fins, rransforma o núcleo da competência modal do interlocutor,
desse sofism", é P.;;j]ö;;, & líderes de Teerã são acessíveis
A resposta d.p..,d.ä;;".""- áJr"O-.r,tJ isro é, se são manipuhiuezs' ou se
seu querer, e consequentemente, seu poder-fazer. Assim, portanto, trata-se
mesmo de regimes de sentido e de "interação".
ou náo à lógica ¿o .i...år" de dissuasão"ll, seus interesses e sua
seja a distância que separa
admite que eles, d;;;ì;; Ocidentais' partilham
No entanto, a maneira como uma das partes age sobre a outra varia táo
.n.rrrão . ¿* i"i.t.tr., dä,
visáo de mundo ¿",riåo d. tornar fortemente de uma configuração à ourra, qrè ,t- único rermo genérico para
ao menos alguns de julgamento elementares, suficientes Para designáJas todas pode ser julgado insuficientemenre discriminante. De rnodo
"rir*io,tal é'o ponto át da "troiþa" europeia' Ou se intuitivo, adverte-se, com efeito, que o tipo de interação que consiste em agir
possível uma discussáo: "itt" "regime
oostula ao conrrarro, como em
\fashinso.r, qr: as decisóes de um sobre o outro manipulando seu querer ou ajustando-se a sua sensibilidaäe
dos
senso å*"* de modo que os esforços
islâmico' fogem Por natureza ao f'"t""o' Mãs na aposta de uns - como ocorre pelo lado dos dois regimes d.o "fot fazeÍ" - supõe entre as
europeus .r.uo to"dt""áã' "o do partes,uma imbricação esrreira que não tem razáo de ser pelo outrã hdo, o das
"ttt"ï'i"*tl"
,obrå razáo dos dirigentes iranianos
. ;;;;t.s sobre a loucura perversa duas formas de "fazer ser", isto é, quando um programa fixa adiantadamente
dos iranianos
"
..fundamenr"tir-o-iria*ico,,, o qrr. .r,á em jogo é uma,dlcisáo o que deverá advir ou quando apenas o azaÍ determina o que poderá sobrevir
como se finge
da bomba atômica t' Jl;;'oot*o'
util\zâ-la'
dispor num dado momento. Em outros termos, há ao menos duas rnacro-formas de
- a de
de saber qual é a opçáo iusta'
entre
crer - cuja nature;;-;;^l"t ".q"t"áo ser verificada a náo ser
"interação". Para precisar o que as diferencia, necessitamos de uma análise
as duas adotadas ptlo' otiitntais' ameaça "náo P:A:t mais aprofundada de dois desses regimes, o da programação e, sobretudo, o do
df-::::'"sobre o grau de
com um i"'p"'ät;' b;;;" *odo'ill ""'ã'i'1"
a.opçáo americana é
"legitimadd' acidente. Nessa perspectiva, consideremos pela úlìima vez o que pode haver
irracionalidad.,,,, îîrit,,íl" ;; "Jrr.rr¿rio,
",o de menos programável e de mais acidental: os rerremoros . o.rtrô, desasrres
considerada como mal-
de antemáo' Face a uma p""t ""\nogá*mt"*
t
naturais. Embora tenhamos conseguido integráJos ao modelo, por acaso
_intencionada e declarada de uma vez. pä
r"a^ impermeávelà tazáo' náo é' I
!
não tínhamos razáo ao dizer num primeiro momenro que não perìenciam à
lsraeliano programar' preventivamente'
mais sábio mesmo deixar o governo
:
"interação propriamente dita"? onde se inscrevem, entãó? Diremos que, mais
¿oti*d" " dt'"tñtá-la e' por que náo'
de 'I

uma "pequ rti' que da interação propriamente falando, eles dependem da coincidência.
para "evitar" a guerra?
ö;"gil eliminå-la,"påifi''-ir?åtapenas nos remetem à questáo de fronteiras
Essas consideraçóes não
eîtfe operã, ("J;-:;*, bom;"rd;-)
; rnanipular (conversar, discutir'
do
Aquém da interação, a co¡nc¡dência
negociar). Elas desembocam
t- "oä *J¿ti referentes aos limites ponto está
que finalm."tt ltt"*"' at;i"ìtoçáo"'-ljm' primeiro o próprio de uma catástrofe, notadamenre por oposição a uma maldade,
'îtîïiã-
claro: qualqu" q;tì;;;;;'f;d'
atividade ctnsiderada' da dança
à guerra'
cique, quando dela se é vítima, isso se deve apenas ao fato de ter-se enconffado
llí, no mau lugar e no mau momento. Ninguém estave ressentido conosco.
llastava passar por ouüo caminho para não receber na cabeça a telha que
13 de janeiro de2005'p'21 cairia do teto... Não tínhamos de forma alguma um compromisso
11. R. Halevi, "Face à l'inconnue
nucléaire iranienne"' Le Mond¿' .o- J"!
12.Ibid.
Sob o Risco do Sentido
Interações Arriscadas

é mais que o efeito do cruzarnento que na programação (mesmo quando se rrara de programações fundadas
Dizendo de outro modo, um acidente náo
os resPectivos percursos dos socialmente, e não causalmente), os parceiros implicados no processo
inintencional - aleatorø - ¿. duas trajetórias.
acranres não tinham-;id. ; entáo
nada a ver entre ii, t "pttt"t o azar çez interativo têm, como no acidente, o estatuto de simples co-incidentes mais do
se ignoravam a
;;; q". convergissem num Ponto.Preciso' os interessados que de verdadeiros inter-actantes.
meio de alguma programação' Não ocorre o mesmo sob o regime da manipulação. A figura espacial da
tal ponto que sequer,r"r",""'^dt eviiar-se Por
manipulaçáo o,, Colisáo' þo' totttguinte' sem nenhuma relaçáo enrre manipulador e manipulado é a de uma confluêniia. De bom ou
";r',,t"*t"to' mal grado, um dos parceiros, o sujeito manipulado, concãrda com o querer do
colusáo,doque,noentanto,derivam-st"go'"efeitosparaumeoutro'Pois'
também Paraatelha, a coincidência com o p""""tt
uma calamidade:
constitui outro, do manipulador - querer que lhe concerne propriamente e também o
sua caída e faz fracassar a
a presença irropirr"d"ã oi"¿tt'lo " dt"'à'
atrasa interpela, e que faráseu se deixar-se persuadir para"..it", o contrato que lhe
o efeito estético de
;."#;;ä;råJã. r.,, programa, arrurnando num golpemesma do acidente
é proposto. Depois do qual, se o aceita e, consequentemente, se compromete,

uma curva pura no õ;ä lä, .rád" "l¿-


da ocorrência cumprirá para o outro, e talvez em seu lugar, o programa, a manipulaçáo, o
ocorrido, jamais se
fig" * ¿"ir'acidentadãs; ,. o ".orrtecimento náo
tivesse ajustamento ou o aro puramente arriscado que lhe será indicado. A tal ponto
aspecro' em
;î"_ conhecido. Enfim, nenhum dos dois agiu, sob qualquer que, frequentemente (por exemplo, na política ou nos negócios), o q.r. ,.
estabelece enûe os acranres é quase uma relação de identidãder
funçáo da existência do outro' olhàr do
terceiro, o mandatário "representa" o destinador-manipulador "o que o tem
Issovaletambémparaasrelaçõesentreoselementosenvolvidos_maisO
em uma programação' empoderado e em nome do qual, ou po¡ cuja conra,
precisamente' entre as Lnidade' piog'"-"das -
M"r a rcleçào que une
é substituído' nesse caso' Por 'ma os interactantes não é menos estreita no quadro no "g..
ajustamento. Ela pode ser
cruzamento ponrual e fortuito deìrajetos
um terceiro' o "programador" representada pelo entrelaçarnento, motivo que figurativiza bem precisamente o
conjunçãoespacial p., ttçJ"tt pl"t'é;"d" Por
exemplo' no laboratório' tipo de coordenaçáo dinâmica que articula nesse caso o
(e náo devida ao Puro n^ù' É'ã qt" "dt'érn' por fazer junto, ao mesmo
ìubstâncias, ou quando, na tempo concomirante e recíproco, de dois parceiros (ou de dois adversários)
quando um químico mistura du"s ou mais
uma autoridatle (ou simplesmente em movimento, em que cada um sente o sentir do outro graças a uma relaçáo
estrada, no tribunal ou na vida em gFral,
o curso d", dfr."o e anônimo) coloca frente a frente direta, corpo a corpo, e se amolda (por contágio) a suas emoçóes, a seu rirmo,
"oir"rl;;ñ;"Jo'
ârores sociais i""*,iåår ã. ;õuit predefinidos.
Duas ilustrações desse tipo de asua ltexis mesma.
cheia de ácido sulfúrico, despeje
conjunçóes e de seus efeitoi: ã-,r-" pipeta Assim, sob dois desses regimes, é uma instância exrerior ao ecranre que
a reação química tem lugar:
uma gota ¿. .irr.rrri dá'o"t"ttott i-tdi"t"-tnte' dá conta de seu agir. De uma parre (primeiro regime), se o policial sanciona,
diante de um guarda colérico, coloque um
ñJ; liquido p"å. vermelho; se desencadeia: passa o
é, como se compraz em dizer, 'þorque é a lei" (subentendendo-se que talvez,
malandro: inrt"rrt".tt"mente, o reflexo profissional se fosse por ele...); e para ele, o que faz precisamente, dessa lei que .1. irrrro.",
com relação ao ácido corrosivo uma "lei", é que_ela fixa esquemas de comportamento progt"-"dos que deve
rosto do guarda para o escarlate. No .nt"nto'
entretinham até então
ou ao policial ior.i',tt, o tornassol ou o malandro que a 1do1ar,
sem que lhe caiba discutir. Ele náo é fonte dessès .iq,r.-"r, esres não

¡;;J;;;rrd. f.li.id"de) exatamenre o mesmo gênero de não-relação lhe 'þertencem" - como não perrence à água definir os programas aos quais
(e reciprocamente). Ademais, supondo-se que se conforma.quando ferve, obedecendo igualmente l.i. por ourra p"rr.,
"ã f"r."*.
telha com relação
visto sob um certo ".,t"programada para cair,
;ñt.t"i r. ¿if.r.*i" de um ácido ia medida em que, quanto.à telha.(segundo regime), além de não ter sido
ângulo, ,. poa.ri" i".^Joitr.".t ".f. üaços
distintivos de uma "pessoa" - de não é ela que decide por cair quando caminha o passanre: é o "acasoi quem o
pessoa mas enquãnto
urí sujeito _, náo é (ao menos em princípio) enquanro e (em princípio) se "quis"; e o acaso_ que, na circunstância, é, por hipótese, o único ele-erito que
-
policialque, no .;;;á de suas fu.tçOËr, vai castigar; justifica sua caída lhe é táo exrerior quanro o são, com relação aos policiais e a
-
ele decide impor uma multa , náo seri
intuitu personae - corltÍa o malandro- fortiori às coisas inanimadas, as leis de diferente natuÍezaq,r. ,.rp.-.rivamente
reduz a seus
-;;;;"; .årrh...*os - mas apenas conrra ó i.rft".ot ao que se governam uns e ourras. No oposto, para que haja manipulaçáo ou ajustamento,
dele e anre o qual tem a obrigação
olhos o indivíduo lue ,. .rr.orr.ra diante é necessário que se encontrem, que se rocem uma na outra e, por assim dize¡
em caso de infrãção. Isso quer dizer
de execurar o progrä";*iai"o previsto
Å
Sob o Risco d¡, \rnr¡.1,,
Interaçõcs Arriscadas

sensibilidades' determinações na operaçáor3. E, às vezes, é o momento no qual se descobre que essc vrrl,,r
se inrerpenetrem duas intencionalidades ou duas era inestimável, ou, ao contrário, praticamente nulo... ainda que a amplirrrtlc
que, dessa vez' Pertencem ProPriamente aos
actantet:-1-:Tt- mesmo sua
dependia dos danos adjacentes possa ser considerável (assim, não é a perda do assrrtl,,
"interioridade" de .*Ëi;;' Ñt'lt sentido' à açáo' que anteriormente queimado que se deplora, mas o fato de que à força de assá-lo, o forno acal'¡r,r¡
de um ;.j;;¿ r.f"çO.t de exterioridadi
fazendo advir o necessário
'nicamenre merece aqui plenamente por desencadear um incêndio). Inversamente, no caso de submissáo ao aca.s(),
d;;t"ñ"cao) ooiÃ""i' o po"ível (come ooâcaso)' âjustam:nto' e somente nesses o custo do risco é fixado a priori. Porque, embora seja então ilimitado o risc<r
o nåme"de inter-ação. Com a manipulação de perder (não há ganntiaalguma frente ao puro azar), elerecai somenre sobrc
dois calculistas capazes
á;i;;;"r, há ,r.rdai.iramenre dois s.'rfeitos - sejam
dáis totpos suscedveis de se o que o próprio sujeito põe em jogo (e que pode ser de importância irrisória
de negociar seus resPectivos interesses' sejam ou vital), razão pela qual qualificaremos esse tipo de risco de autorreferencial.
harmonizarem entre - si e o que p""" se Passa enfim' verdadeiramente'
" Nos dois outros casos - manipulação e ajustamenro -, onde se trata de
entre eles, enquanto tais'
interações em sentido estrito, o que é posto em jogo - I'enjeu, a "aposta" náo
Err"r.rp..ificidadesincidemsobreanaturezadosriscosquesecorrem -
em cada um dos contextos' apresenta mais o carâter objetivável, a posteriori ou a priori, que se podia
no caso de fracasso i;;tt mais, agora' de sucesso) reconhecer nos precedentes. Situa-se diretamenre no plano das relações com
é absolutamente
De fato, a apostã,.,n f"tiit"r"' 'oi seu asPecto lesativo'-11o o outro e consigo mesmo. O que um manipulador se expõe a comprometer,
'n"s co-incidências e nas inter-ações. A diferença náo
da mesma n rurr" no caso de fracasso, é em primeiro lugar de ordem rekcional. É r.," própria
corridos aqui ou lá, pois se pode
consiste no grau de gravidade dos. riscos imagem frente ao outro que está em perigo, assim como a qualidade mesma da
configu-rações' Por exemplo' a
perder igualmente .ri."¿" uma das quatro
vida (a própria, . ;;.;; *tpo a då próximo)' cgiy,.frágil que é' úo fâctl relaçáo fiduciária que os une: um provocador que não impressiona ninguém,
um sedutor ao qual se resisre, um charlatão no qual ninguém crê, um fanfarráo
de colocar.- p.rigo, ;;i;p;.";åndo
coincidências infelizes - quer se devam
ass'Z que náo chega a assustar, todos eles caem no ridículo. Basta escutar o que diz
f"lr", -anobr"s i"'.*á.rrçao de programas (Tchernobyl) ou a aPostas a língua para saber a que se expõem: a perder seu "crédito", sua "autoridade"
"audaciosas (a roleta russa) -, seja comPrometendo-se em interações-demasiado
mal controlados (a derrapagem ou seu 'þrestígio", a 'þerder a confiança", a 'þerder a honra", ou, em uma
incertas, quer se .r",""t dt ";"¡t"t"entos (a expressão que resume tudo, a "quebrar a cari' . Obviamente, isso não impede
descontrolad" n.v"d") ou de manip-ulações mal calculadas
""-;;ir;"
chantagem que se ,rol,å' to"t'" o chantagista) '
A diferença concerne à- naíueza de fracassar também, uma vez mais, no que diz respeito ao resultado almejado
no plano pragmático. Por exemplo, numa estratégia fundada na dissuasão,
mesma dos riscos que se correm' perder sua credibilidade face ao adversário é também perder de antemão a
Em
No quadro da programaÇáo' s.1 há risco' é de ordem func-ional' própria batalha. E no ajustamenro, se o risco é a cada instante de "errar o
é a primeira de todas as instruções,
princípio, åb .rr. ÇiL.ã"aeìprudência passo", de derrapaç de perder o ritmo (do outro), além de tudo isso, aquilo a
ris.os de fracasso: por definiçáo'
tudo é feito para ,.Jrrri, o mais possível os que se expõe finalmente o sujeito - como se norou a respeito do toureiro, do
aí apenas se age ,oUr.l U*" dt ågt'l"ridades
qtt: p9t si mesmas constituem
comediante e do homem político - é ao risco existencial deperder a si mesmo, na
se po"" dtit;"r;.mas' se apesar disso'
a mais efrcaz garantia de segurança que e pela relação. No extremo oposro dafal:a manobraprogramática (que permite
por causa ¿. ,r-'.lro-üld.; o'd.r.r*olrrime.rio de um programa for ainda dizer que "tudo está perdido, menos a honra") - e pior que o vexame ou
no mais, em náo se
i.rt.rro-pido, a perda diietamente resulrante consistiria, o Passo emfalso na manipulação, ou ainda que, face ao acaso, a aposta no caualo
alcançaroresultadopretendido'Em.termosdecusto'issopodeseranódino errado -, a forma exemplar de fracasso no ajustamento, ofasco, deixa o sujeito
ou' ao contrário' dc
(em lugar de ser .ãåttti*t, o assado está queimado) tão perturbado quanto a aposra positiva do enconrro, aquilo que se pretendia
mata o doente; em vez dc
uma gravid"d. .*.-" (em vez de curar' o
'*dito alcançar na e pela relação com o outro, consistia precisamente na mais alta
produzir energia, ;;;i;"clear explod.). M"t.o que determina a "gravidade" fòrma de realizaçáo múrua.
atribui ao resultado îPtt"1:: d.:
do fracasso nao é nadaalém do pr.ço qrr. se
semelhantes' o de náo consegulr
modo que o risco é essencialm.,',., .,Ir."sos
o valor do que estavâ em jog<r
um ganho porrí,r.l, o f'"t""o revela a posteriuri I ]. C[ p.42-43.
J.-P. Sartre, L'Etre et I¿ néant, op. cit.,
Interaçóe s Arriscadas Sob o Risco do Sentido

Essas observações permirem completar o diagrama inicial, razendo nele se manter? Mas escolhemos? Nossas escolhas não são elas mesmas
apostas
aparecer os ripos d. iir.or .tos quais se pode incorrer e a natureza das programadas? Nossas preferências estrategicamente condicionadas?
Nossos
próprias a cada regime. estilos de vida resultantes de aþstamerrto, .ipontâneos ou o produto
aleatório
das circunstâncias? Na realidade, essas pergunras põem em quìstão
o esraruro e
afinalidade de um modelo desse tipo. umã coisa em todo caso é cerra: se
Zonas das coincidências somos
capazes de formular os princípios gerais de uma gramática das
relações entre
os regimes, de dar
Tnra a posteriori de itinerárioi atestados, nem por isso se
pode fixar uma escala de valores ou estabelecer leis para um devenir. Longe
de
uma tal normatividade, se um espaço teórico d.ss" natur ezatemutilidade]é
ao
contrário apenas na medida em que resulta num reque de soluções tão aberto
APROGRAMAÇAO OACIDENTE quanto possível, ranro em rermos de opções axiológìcas q.r"rrrå de princípios
Figura espacial Figura espacial
:
o cruzamento.
de explicação relativos eo rraçado d. p.ìi.rrso, q.r. ä.re ,Ë irr..r.rr.-.
a conjurqão.
De faro, essemodelo não roma partido. A questão é, anres, saber em
Riscofuncional: Risco ø)to-referencial :
que- medida permite_dar conra das opçoes filosóficas, políticas
a falsa manobra. a aposta errada. e científicas
Aposta objetiva a Priori : subjacentes à dive¡sidade dos discursoì explicarivos ou äas visões de
Aposta obj etiv a a P o ster ior i mundo
"Perder o contole" '?erder o apostado"
apostando no cavalo equivocado
- das ontologias - gubjacentes às práticas efetivas que se podem romar
e frusta¡ o resrftado. como objetos de análise. Deveria também, no plano å" ."p.iiêrrcia vivida,
auxiliar-nos a melhor apreender em que s. funãam .r.olh", existenciais
que fazemos, querendo e sabendo o., ì-rão, quando opramos", por tal ou qual
1 1 regime de interação em função dos contexto.. porq.r.,ie somos ,,condenados,,
OAJUSTAMENTO a consffuir um sentido "da vida" é em primeiro lugar de dentro
AMANIPULAÇÃ.O que podemos
Figura espacial Figura espacial : alcançá-lo, vivendo-a antes de pensáJa ou de proär", assujeitá-îa ,,åe
:
o entrclace.
cima,'.
a contluência. Nesse sentido, a semiótica permanece ,t-" da significação e não se
transforma nem em uma moral, nem em uma"rr"rítica
filosofia. Håao se dedica mais
Risco relaciona| : Risco exislencial : que a_registrar e a compreender a diversidade das condições de emergên
cia do
agafe. o fiasco. sentido, sob o ¡isco de admitir como uma das soruçõe,
Aposta intersomática -"i, pl".rrírrå, para a
Aposta intersubjetiva : questão última do sentido do sentido o fato d. que náo hqa em defiìitivo
"Pødero credito" '?erder o pé"
e destruir a relaçäo com o outo e perder a si mesmo nenhum. Pode-se ver nisso um limite da presente á,r, conffário,
na relação. o que constitui seu interesse mesmo. "Lordag.m "o

Zonas das interações

Diagrama 3

Frente a essas diferentes fórmulas, "saber viver" consistiria em saber


escolher, em saber privilegiar um dos regimes sobre os outros e a Procurar
CAPITULO VII
TEoRrAs DA TNTERAçÃo r TNTER-AçÕrs
TEO R I CAS

Para concluir, parece-nos que algumas questões de ordem acadêmica


devem ser postas. Nem elas estão de modo algum isentas de riscos.
Modéstia à parte, será que convém inicialmente explicitar o que há
de novo na presente.refexáo em comparação com a problemática clássica da
interaçáo que serve ainda hoje de referência corrente enrre semioticistas, a
formulada no Dicioná.rio de Greimas e Courtés? Procuramos aprofundar a
significação das principais configurações já instaladas e dar a conhecer algumas
outras, até o presente inéditas. Novidade relativa, está claro, especialmente
sabendo que às proposições do Dicionário sucederam prolongamentos diversos
que tocam de perto ou de longe nosso objeto - semióticas "subjetal", "tensiva",
e até da "morfogênese", inspirada na teoria matemática das catástrofes.
É, bem possível que a construçáo que apresenramos pareça em alguns
aspectos constituir ume recuperaéo parcial de alguns remas já rratados nos
anos 1980, quando se esboçou, justamente, o projeto de uma reformulação
da semiótica de Greimas em termos "catastrofistas". Não é, contudo, essa a
nosse perspectiva. A idéia de uma "ftsica do sentido", muito em voga na época
e que paulatinamente devia interessar a todos os níveis da teoria, inclusive
aquele referente à modelização da "inreraçáo", repousava numa concepção
ontologizante dificilmenre compatível com os postulados anrropológicos
que fundam a abordagem da semiótica esrrurural no seu conjunto, incluindo
evidentemente a presenre renrariva de ampliação. Além disso, o debate
que entáo se estabeleceu tinha provavelmente chance de desembocar em
proposições analiticamente utilizáveis unicamenre em relação a uma parre
Teo¡ias da Intcraçáo e Interaç<-rcs lcritir¡.
Interaçócs Arriscadas

suPerior diagramas capítulo à parte, nem mesmo uma discussão em boa e devida forma. A raz.it<r
limitada do campo de reflexão: a saber' a -parte .dos
da necessidade causal ou é que, a nosso ver, esse termo, paixão, não designa, a respeito da teoria' uma
a das coincid.ências procedentes
apresentados acima,
nãilreza a mais facilmente formalizável unidade do mesmo nível que os termos aos quais temos dado atenção. Embora
da probabilidade estatística, regiáo Por
esse termo refr,raaum campo de pesquisa sobre cujo interesse náo cabe dúvida,
ãoï.¿ao. E, hoje mais do que nunca, é difícil imaginar como os processos
ou por paradoxal que seja, ele não remete, ao que nos Parece, aum objeto semiótico
ir";;".i;""i, fmá"dor ,r" irrtårr"ionalidade ou na sensibilidade Poderiam'
de formalizaçáo da matemáticâ propriamente dito.
reriam podido, ,., ,.rUÃ.,idos aos princíoios
na Possibilidade de dar conta de Longe de prestar-se a uma conceitualização semiótica unificada, desde
Dro'osta. Por essa Íazáo,preferimoi "po""'
objeto, o,r r.;", do dos resimes de sentido o momento em que se empreende sua análise, a. "paixã.o", com efeito, se
iää.ä;."o,ï;;r;J "or,;,r'to rermos de um
iguma forma de interaçáo ou de coincidência, em
^"f,;;.o'Z.it,rrl
Ë;;; dissolve e dá lugar ao menos a duas problemáticas distintas. De um lado, há
" t dt t'-""^etalinguagem homogênea' a da semiótica
ú;i.; excelentes razóes para considerar que a sintaxe das paixões corresponde a uma
simples-ente "greimasiani'' problemática da competência rnodal dos sujeitos - o que equivale a-integrar a
tenhamos chegado a gramá,ticado passional no quadro geral do regime de manipulaçio.É'a solução
Será, em sentido inverso, surpreendente que
que ãpo'-o-ttos em nada aos adotada em Semiótica das Paixões, onde a avareza e o ciúme, tomados como
resultados em parte inovadores sem ter tido
fundadores de nossa exemplos, sáo analisados em termos de sintaxe actancial clássica, a despeito
princípios .piste-olãgicos, teóricos e metodôlOgi-t
que proPomo' ltáo pretende' com efeito' de que os aurores tenham proposto (na parte teórica inicial) acrescentar uma
disciplina? O
"p"r",o""onceitual "sobredete¡minaçáo aspectual", um coeficiente de intensidade, um "excedente
demodoalgumconstinrirumanova,.*ió.i."cujosprincípiostornariam modal" que, ao "patemizar a competência modal", permitiria dar conta do
os äod.los "sthnda.rds". Em particular
náo quesdonamos nem as
""¿".", à manipulaÇáo nem as persPecdvas lado "impulsivo" (ou compulsivo) característico do sujeito "passional"l'. Mas,
conquistas da gramática narrativa relativas
propósito da programação' por outro lado, há boas razões para postular que as paixões (especialmente
.rUoç"a", porî.riorr.,."tt, "" mesma linha' a
sáo de uma idade canônica aquelas as quais a lfngua náo dá verdadeiramente um nome, talvez Porque
Contudo, talvezr. f.rr" "Ujetar que tais modelol
O que' por. exemplo' da semiótica sejam demasiado tênues), e em geral tudo o que concerne aos afetos "da alma e
e que existem agora outros mais recentes!
das pøixões? Náo se pode negar
que constituä tÁþ1-Ïia abordagem da do corpo", correspondem a uma problemática das relações sensíveis entretidas
contribuído para com o entorno por sujeitos dotados de uma comPetência náo mais modal, mas
i"..í"ia" e que, há uns vinte cinco anos, tem notoriamenteaqui enquanto tal' estésica- o que levaafazer da semiótica das paixões (isto é, dos estados de alma
se tratou dela
renovaf os modelos existentes. Porém, não
que as recusamos? Se náo é o caso' e, indissociavelmente, dos estados do corpo) um subcapítulo, entre outros, da
Seria por qrr. igrror"-o, Propostas? Ou
"'"' na presente construçáo? semiótica do øjustamento.
podemos rer a prere;sáo de hà,re-l"r integraJo
Essas duas perspectivas náo sáo contraditórias ent¡e si15, mas cada qual
Voltemosummomentoatrás:doreenfado,horrordocaos'histeria
da organ\zaçáo, seirtimento de conforto dá conta de um aspecro determinado desse vivido polivalente que se denomina
nrosramárica da ordem e frenesi
como o passional, o emocional, o afetivo ou ainda o experimentado (l'éprouué).
ä,ääätt," h;td- evazio.r" rl-à-.rrgendrados pela rotina' angústia'
geral de segurança ou Devemos todavia ir mais longe. Como aaçáo ou a interaçáo, apatxio não é um
.orrn".rç" ou excitaçáo îace ao,aleatório' sentimento "em si" que poderia ser pensado independentemente das condições e situações
entusiasmo
i;g;;ç", fervor åu tibieza da oraçáo, "espera do inesperado"'
nas quais se articula. A paixão constitui uma dimensão da experiência que
do manipul"do, ,roáo, morosid"dl io piogr"rrr"do
r- bl'asé, tranquilidade
do conformirr", ,oig"ação do executant¿' ñ"o' "*""o'
raiva diante do ganha sentido de modo diferenciado em funçáo da diversidade dos regimes de
do policial: esse senrido no quadro dos quais ela é suscetível de ser vivida. Esses regimes não sáo
;;-;;."d"r, .,rfori"""a manobra bem controlada'vercólera
que, longe de esquecer senão aqueles que temos repertoriado. E não mais que a açãLo ou a interação,
;;;áå;. em desordem náo é exaustivo mas permite
,,paixões,,, náo_remos deìx"do de enc-ontrá-las no fio desse
ou negligenciar as
r.¿"i;;r;.þ de.humores, senrimenros, emoções e afetos.
ö;i;:;"- em momento algum um
E, no entan.o, ¿ åi"¿t q"t îa" lhes consagramos
l4.Cf.A.J.G¡eimaseJ.Fontanille, Semióticadaspaixões,op.cit.,cap.l,"Aepistemologiadaspaixões"
15. Para uma confronuéo mais detalhada dessas duas óticas, cf. Passions sans nom> oP. cit., pp.41-49.
Teorias da Inte raçáo e Interaçõcs Te óric:¡s
Interaçóe s Árriscadas

um ou outro deles. Interessa em igual recentes, que, por seu turno, tornaram-se quase como tais. Nesse quadro, o
a paixão náo pertence exclusivamente a
passional da essencial do trabalho desenvolvido durante décadas concentrou-se não, agora,
,*¿i¿"
"o, {.r"tro. Há paixões, ou melhor há uma dimensão sobre a metade superior dos diagramas apresentados acima (aquela que uma vez
vida que s, ån na iirtencionalidade dos sujeitos: é dessa dimensáo que
^í"
dá conta adequadam ente Semiótica døs Paixões. E há outras dimensões, ou
foi pensada como "matematizâvel"), mas sobre objetos que pertencem a sua
metade esquerda - a da "dêixis positiva" -, €Ír outras palavras, à constelação da
ourras experiêïcias de ordem não menos passional que, procedentes mais
prudência, virtude cara tanto aos manipuladores quanto aos programadores,
especificamente da sensibilidade e do contato intersomático, não podem ser
qualquer que seja seu campo de atividade, inclusive o da pesquisa científica. De
descritas sem recorrer a uma problemática da estesia, da união, do contágio
e,
modo diferente, o que aqui, como em diversos trabalhos anteriores, tentemos
+'
finalmente, do ajustamento. Iiso não é rudo. Por que razáo^asobredeterminação
evidenciar e analisar, é o que contém a outra dêixis, a constelação complementar,
aspectual e intensiva que, como dizel os autores de Serniótica das Paixões,
,,patemiza a competê;cia modal" dos actantes cognitivos, náo poderia ao mesmo tempo mais desafiadora e mais arriscada, da øuentura: diferentes
"i,atemizar" também o exercício da competência estésica dos corpos sensíveis, formas de sensibilidade próprias a interactântes que não somente têm uma
inteligência e um querer mas também uma competência de ordem estésica
.o-o as relações que os sujeitos entretêm com os papéis temáticos e
"tri-
os papéis catasmóficos em torno dos quais se articulam resPectivamente. os
que lhes permite se ajustarem reciprocamente uns aos outros; diversos tipos
de co-incidentes que não são todos regidos por programas deterministas mas
,.gi*., da program açãto e do acidente? De fato, ao longo de nosso caminho,
que podem também encarnar diferentes formas de acaso; e, correlativarnente,
.rr".orr,r.-o s p;ixões-da regutaridal¿ - obsessão pela ordem e pela segurança
(ou fobia p.lá, -.r-os) -*e, no polo oposto, paixões do tisco p-uro, do jogo, estilos de comportamento ao mesmo tempo empiricamente muito familiares
e teoricamente quase inexplorados, embora previsíveis no quadro de regimes
à" da aposta e do "tudo por tudo": em suma' paixões do acaso'
"rr.rrrrri", de sentido e de interação que, se enriquecem o sentido da vida, não o fazem
Não somente o patêmico é, por conseguinte, redutível aos outros no final das contas senão distanciando-se do que abrangem as problemáticas
conceitos descritivos que temos construído na PersPectiva sociossemiótica, tradicionais da programaçáo e da manipulação.
mas não é sequer apreensível, nem pensável e analisável, a náo ser através deles'
Em outras pal"rrr"s, se a reoria da significaçáo alicerçada na problemática da Já que construídos para descreveÍ a outra face do mesmo objeto, a saber,
e do ajustamento, quanto as condições de emergência ou de esvanecimento do sentido em formas
interação necessita tanto de uma semiótica do acidente
de uma semiótica da manipulaçio e da programação, em contraPartida, n1 de interação estruturalmente correlacionadas àquelas já exploradas pela
"semiótica das paixões" semiótica standard, os conceitos e os metatermos novos que introduzimos
nossa perspecrive, náo há justificativa teórica Para uma
náo nos vêm de fora da teo¡ia. Eles não dependem de qualquer perspectiva
.rrqn"nro'modelização autônoma. Isso náo reduz o interesse das numerosas
ad hoc, de qualquer obsessáo pessoal, e nem mesmo de uma epistemologia
empíricas já, realizadas nesse rerreno, mas permite enriquecê-las e
"rråir.,
desenvolvê-Lt ttn- novo quadro teórico16' inédita. Isso quer dizer que os regimes do øjastamento e do acidente náo se
constituem como adições mais ou menos decorativas que viriam a "enriquecer"
Longe de ignorar ou rejeitar as aquisiçóes prévias, Procuramos integrâ-
as problemáticas da manipulação e da programação, consideradas nesse
-1", ,r.r-""perrp.l.tiv" mais englobanre que, ao drar partido delas, situa seu caso como mais fundamentais por natureza. Nem tampouco constituem
alcance . pr."ir" sua signific"çao. corn isso, ajuntamos a seus elementos os
apêndices fortuitos aos quais ad libitum poderiam ser associados outros
comple-àtos que o aprofundamenro de sua própria lógica requer. Porque, novos regimes para adornar ainda o modelo ou ultrapassar seus "limites"
até ó presenre, rem-se trabalhado somente sobre uma das metades de uma recorrendo a outras perspectivas que não teriam sido até agora imaginadas.
totalidade mais complexa do que se acreditava ou, em todo caso, mais Não, por razóes de ordem estrutural, e salvo engano, a lista está fechada!
diversificada do que ie considerava enquanto se Permanecia, Por segurança Todos os termos e os conceitos aqui introduzidos, antigos e aceitos ou
ou comodidade, àentro dos velhos moãelos "canônicos" ou daqueles, mais novos e ainda a precisar se interdefinem dentro de uma perspectiva comum
e se implicam uns e outros num único e mesmo nível. Formam sistema e
16. Cf. principalmente P Fabbri e I. Pezzini (eds.), Affetiuitá e sistemi semiotici' Le passioni nel discorso' estão, em princípio, estritamente em condição de igualdade em termos de
Wrsas, 47-48, 1987; I. Penini e F. Marsciani, Stmiotica dclle passioni, Milan, Bompiani, 1999; I' pertinência semiótica.
Fontanille, Semiótica do discarso, op. cit. (cap.5,"Ação, paixão, cognição").
Interações Arriscadas

O fato de que as problemáticas da manipula$.o e da programação


tenham táo exclusivamente e por tanto tempo monopolizado a atenção se
deve somente à tradição na qual a disciplina se desenvolveu e às Posições
acadêmicas dos que a praticam ou a difundem. E, se a decisáo de voltar o olhar POS FÁCIO
para o lado do acaso e pior, do ajustamento, pârece ainda hoje a alguns como
uma audácia, umâ impeninência ou uma provocaçáo, isso depende tanto, ou
mais, dos riscos do oftcio como campo de interações - fenômeno desde muito
tempo familiar à sociologia das ciências -, quanto das falhas inevitáveis da
própria teoria enquanto universo de sentido. Aliás, o presente modelo ajuda a
entender, semioticamente, por que nzÁo seja assim.

o leitor acaba de partilhar um .rexto importante. Importante pela


extensão, sem dúvida
_alguma, mas sobretudo pela ambição qrr. n.lå ,.
expr€ssa. Eric Landowski propõe aqui, sem polêmica supérflua, á..m efeito
de 'territorializaçã.o" tática demasiadamentã marcada, ìrma notável síntese
de sua teoria das interações. Essa síntese se apresenta aparentemente como
uma consequência e uma extrapolação de seu último livro (passions sans nom),
e especialmente da reoria da união e do ajustamenro estrarégico. Mas, na
realidade, ela funciona de modo completamenre ourro e dá, aãntender uma
concepção de conjunto da semiótica das interações chegada hoje a sua plena
maturidade.
vinte anos de pesquisas pacientes, de tateamenros
.
todos consagrados, de livro
e avanços progressivos,
em livro, às interações sociais, inspìraà'os todos
pela. mesma porenre hipótese: a reflexão sobre as interações pode e deve
fundar uma semiótica geral, uma concepção do "esrar nå m,indo" e uma
moral do sentido.
Essa moral é aqui indissociável da reflexão epistemológru, pois, como
lembra o ar.rtor, seguindo Merleau-Porry ro-or seres huiranos e sociais
'tondenados ao sentido" ou, mais precisarnente, 'tondenados a construir o
sentido" em nossas interações com as coisas e com os outros. Condenados,
isto é, em equilíbrio instável enrre a insignificância da pura repetição e o sem
sentido do caos sensorial e repentino. Essa moral é umã
-otal. do-risco aceito,
do risco de oscilar a todo momento de um lado ou outro dessa alternativa
semiótica entre Caribdis e Escila. Mas é ta.mbém uma moral (ou melhor, uma
Interações Arriscadas Porf.¡, i,,

ética) da interaçáo, uma vez que toda a argumentação tem por horizonte de da qual se originou; pode agora "recobrar seu posro" e se difundir sem se fix:rr
referência o respeito ao outro como sujeito e, de um ponto de vista sintagmático, como tal, dentro de um campo teórico redefinido e ampliado. eue mais quc
se pode esperar, com efeito, de um movimenro teórico desenvolvido em viilr.
a " rea)izaçío mútua" (l'acco rnp liss ement) dos suj eitos na interação.
anos, senão de integrar-se a longo pruzo a uma perspectiva mais ampla? É,,
Essa ética é ainda uma resPosta técnica a algumas velhas críticas
todo caso, o que se pode desejar igualmente para a sèmiótica das intãrações. "n.,
sofridas pela teoria greimasiana da manipulaçáo: solução simplista, descrições
excessivamente mecãnicas, teoria insuficientemente explicativa. O horizonte Náo se compreende tão bem por que o autor pode afirmar que as paixõcs
ético-epistemológico da realização mútua e do risco semiótico assumido não podem consriruir um "objeto semiótico propriamente dito'l mas apenas
permit¿m ao autor fesolver essas dificuldades, e responder a essas antigas um "campo de pesquisa". o argumento segundo o qual o pseudo-objeto seria
iríticas: com efeito, esse horizonte axiológico obriga-o a suPerar a teoria da partilhado entre duas semióticas diferentes, "duas problemáticas disiintas", é
manipulação e a englobáJa numa teoria das interações ao mesmo temPo perfeitamente contraditório com o objeto mesmo desse texto de síntese. As
mais àdequada (vistoi os fatos analisados) e mais geral (a respeito das figuras duas problemáticas, na realidade, de uma parre, a tradicional, da programação-
consideradas). regularidade, e, de ourra, landowskiana, do ajustamento-r.tr.ßiliã"de e do
acidente-acaso, somente sáo heterogêneas na perspectiva
Resumindo: o modelo final articula quatro regimes de interaçáo, a - que esse texto
mesmo supera - de uma territorializaçio táticadas opções teóriias.
progrørnação, a manipulação, o ajustamento e o acidente, cada qual_apoiando-
-r.-.- uma "lógica; semiótica específica, Llma espécie de estilo do sentido, ora, l parrir do momento quando o conjunto desses regimes semióticos
respectivam.rr.., regularidade, a intencionalidade, a sensibilidade e a são interdefinidos, integrados a uma teoria geral, que se declara a si mesma,
"
aleatoriedade. Esse resumo conciso Permite compreender em que essa síntese em conclusão, completa e exaustiva, o domínio está unificado, e a questão das
é tão fortemente integradora: de um lado, abre o campo plfe' a semiótica paixões, pelo mesmo fato, igualmente. como assinalado pelo próprià autor, há
narrativa clássica, . -ãr-o a semiótica das paixões; de outro, situa os demais
tanto paixões do acaso quanto da regularidade, paixões do ajustamenro quanro
regimes semióticos, aqueles que sáo inspirados pelo horizonte ético e a exigência da intencionalidade; è seria um bom ptogm-" de investigação, sobie um
epìstemológica, a sabãr, o da união e o do ajustamento (cf. Passions sans nom), objeto perfeitamente constituído, que se retome com novo esforço, baseado
nessa teoria ampliada, a busca da dimensão passional da significaçáo em aro.
inspirado pela preocupaçáo da"rcalizaçáo mútua", e o, totalmente novo, do
e-do ac"ro, nova versão de uma semiótica das catástrofes, inspirada Não há, portanto, por que se ofusca5 mas se pode, no entanto,
".iãerrte
pelo princípio do "risco assumido". relativizar: o horizonte da realização mútua e do ajustamento estratégico é um
E é justamenre esse caráter integrador que permite abranger as ponto de vista inspirado por uma posição ideológica fortemente assumida (ao
"irregularidádes", a incerteza e a imprevisibilidade, que são, em geral, menos como imperativo axiológico); o da paixão e das tensões enrre valências
.onsiderad"s como sem sentido: essa moral semiótica náo admite complacência, perceptivas, como princípio da dinâmica discursiva, é ourro, inspirado por
e somos condenados a construir inclusive o sentido das irregularidades e dos uma outra posição ideológica, e isso desde os primeiros seminários de Greimas
acasos, mesmo se for necessário deslocaf sem cessar o foco de análise. sobre essas questões. Seria necessário, numa perspectiva mais histórica,
reexaminar as condições nas quais a semiótica das paixões se desenvolveu, há
fu tribos acadêmicas arnarn, em geral, o espetáculo de conflitos teóricos
vinte anos, para compreender por que e como, em reação ao irenismo das
e o leitor não deixará de surpreender-se pelo fato de que o coarrtor de Semùitica
pragmáticas americanas (que fazem da cooperaçio e dacaridade náo se falava
das Paixões não se sinta ofuscado ao ler no texto de Landowski que "embora -
na época de realização mútua e de respeito ao ourro como sujeito a fonte
haja lugar pafa uma semiótica da manipulaçáo e da programaçio e Para uma -
das interações), para compreender, porranro, por que Greimas foi levado a
semiótiia áo acidente e do ajustamento, em contraPartida, náo hâ, na nossa
pôr as estruturas polêmicas, as rensões e os conflitos no coração da experiência
perspectiva, justificativa teórica Para uma semiótica das paixões enquanto
passional e da elaboração do sentido em aro; seria necessário, em seguida,
modelizaçáo eutônomd'. Não há, de fato, por que ofuscar-se, uma vez que a
para melhor compreender como essa posição de princípio deu nascimãnto à
semiótica das paixões cumPriu sua tarefa, contribuindo para abrir novos camPos
semiótica tensiva, examinar também arenramenre como ela tem sido declinada
de investigaçãã e provocar remanejamentos profundos na semiótica narrativa
Interações A¡riscadas t,(,ìl.i( i¡,

na ordem da percepçáo e da apreensão do sentido na nossa relação com o são, no fim das contas, o que podemos apreender como "expressão"
dos
mundo sensível. ajustamentos ou dos acidentes.
O verdadeiro aporte da semiótica das interações reside na implantaçáo o pelotão é um corpo coletivo, cujas formas e esüururas d.iversas
do outro, e da interação com o outro, no coraçáo na consüução do sentido, lá exprimem os estados e as üansformações internas das interações
em curso.
onde, justamente, a semiótica tensiva encontra-se em falta, pois ela - como, Em outras- palavras (esse exemplo improvisado é puram.rr,.
e não
aIiás, â maior parte das semióticas dessa mesma época, especialmente a de "rr"lógico
pretende de forma alguma t...t"lid"á. d.monstråtiva), inclusive
a semiórica
Coquet . d. Eco - náo vai além da relação sensível e cognitiva com o mundo das interações, compreendendo- ajustamenro e acidente,
necessita de um plano
"
em geral. Resta, em suma, implantar o outro no coração da semiose mesma, da expressão e, para tal, ela pode conta! entre outras, com
uma semiótica dos
na rãlação enrre um plano da èxpressão e um plano do conteúdo, isto é, onde corPos-actantes.
se situam as outras semióticas evocadas. Evidentemenre, o. nível de perrinência dos "corpos" não
é o único
Justamente, há um ponto sobre o qual as duas correntes semióticas em. questão. Mas permite ilustrar uma dificuldade recårrenre
se
na semiótica
..r.orrrr"- com toda evidência: é o da "encarnação" (ou "ernbodimen/') do greimasiana pós-greimasiana: a dificurdade de identificar as expressões
.e
sentido. Náo mais que a semiótica das paixões, a semiótica do corpo não é uma pertinenres das articulações semântico-sintáxicas que ela
elabora. E ,. porso
nova teoria geral da-signifrcaçio. Mas ela é também uma Passagem obrigatória, formular um voro para o fururo, esre seria que, ¡ diferença
da semiótica
na perspectirra de umã semiótica do sensível (e mesmo do sensível "reativo", narrativa standard, a semiótica das interaçõ., rão considere.o-o
adquirida e
.oÅo o precisa Landowski) , Pàra uma renovaçáo do aPareto descritivo da implícita a questão do plano da expressão.
semiótica geral.
Expliquemo-nos e exemplifiquemos. Eric Landowski ilustra seu modelo Jacques Fontanille
de interações, aqui mesmo, pela cena familiar e recorrente do policial que fala
com o a,rtomobilista; eu evocarei como contraPonto o do pelotão de ciclistas
que se alarga, se segmenta e se reconstitui na corrida de uma mesma etapa do
Tou, de Fmnce. A ãndise narrativa standard náo veria nessas modificações do
pelotão mais que variaçóes figurativas superficiais, um "revestimento" mais ou
rn.rro, codificado, sem relação com as etaPâs sucessivas de uma programaçáo
ou de uma estrutura polêmica subjacente. A análise Proposta por Landowski
poderia descobrir movimenros de ajustamento permanente e alguns âcasos aos
quais teria que dar sentido e exploráJos em tempo real.
Mas o mais surpreendente, nesse negócio, é que todos esses ajustamentos
interativos têm uma forma reconhecível, e mesmo, mais precisamente, que a
todo momento da corrida, a programaçáo, amanipulaçáo, o ajustamento e o
acidente interferem uns nos outros, dando lugar ao que Aristóteles chamava
de ',peripécias". o mais surpreendenre, enráo, é que essas peripécias que
.onjug"m entre si regimes heterogêneos, e até problemáticas declaradas
incompatíveis, sáo, no entanto, identificáveis, enquanto peripécias' como
"momãntos" de iconizaçio através de algumas morfologias figurativas
reconhecíveis. E, de fato, mesmo os entrelâçamentos e entrechoques entre
regimes semióticos - e portanto, afortiori, no interior de regimes homogêneos
- ãao lugar, sob cerr;s condições, a formas perceptivas estabilizadas, que

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