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RESPONSABILIDADE

CIVIL

Marjorie de
Almeida
Araújo
Nexo de causalidade
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Explorar as teorias explicativas do nexo de causalidade.


 Analisar as concausas, ou causas concorrentes.
 Relacionar a teoria da imputação objetiva com a responsabilidade civil.

Introdução
O nexo de causalidade é um importante pressuposto inerente ao instituto
da responsabilidade civil. Devido à sua importância, existem diversas
teorias que tratam do tema. No tocante à relação de causalidade, também
podemos verificar a possibilidade de causas concorrentes que colaboram
entre si para um mesmo resultado.
Neste capítulo, você entenderá como as teorias do nexo de causa-
lidade analisam esse pressuposto, compreendendo a importância e a
aplicação das principais teorias no Direito brasileiro. Você compreenderá,
ainda, como se apresentam as causas concorrentes, bem como a possi-
bilidade de aplicação da imputação objetiva na responsabilidade civil.

Teorias do nexo de causalidade


O nexo de causalidade, que também pode ser chamado de nexo etiológico ou
relação de causalidade, é um dos pressupostos necessários para a possibilidade
de responsabilização civil.
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Figura 1. Relação entre autor, conduta e resultado.


Fonte: Adaptado de Vado Aju (2012).

Tratando desse tema, temos algumas teorias, que veremos a seguir.

Teoria da causalidade direta e imediata


Essa teoria só admite como causa aquele ato que tiver gerado imediatamente e
diretamente o dano. Ela é também conhecida como teoria da interrupção do
nexo causal, por levar em conta a análise da possível interrupção de ligação
entre a conduta e o resultado. Percebemos que a teoria é adotada pelo Código
Civil no art. 403 que diz: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor,
as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por
efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”
(NEGRÃO; GOUVÊA, 2004, p. 123).
Essa teoria é adotada também pela maior parte da doutrina e da jurispru-
dência brasileira no que diz respeito à área cível. É aplicada, na maioria das
vezes, essa regra mais criteriosa por entender que, pelo fato de existir um lapso
temporal entre fato e dano, podem ocorrer circunstâncias que interrompam
essa causalidade, ou seja, esse vínculo entre conduta e resultado.
Com isso, entendemos que só existe nexo causal se o ato praticado produz
diretamente o dano. Assim, responsabilizamos o sujeito apenas quando, de
fato, percebemos a ligação direta da sua conduta com o dano efetivado. A
causa tem que ter sido possível e suficiente para efetivar o dano, significando
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que, sem ela, não haveria o resultado. Portanto, nem todas as ações verificadas
no evento são necessariamente consideradas causas do dano.

Conduta = dano

Determinada pessoa entra em uma loja para comprar uma mercadoria. Em seguida,
um rapaz chega à porta e lhe disfere um tiro. A causa adequada da morte foi o tiro, que
tem ligação direta com o dano causado, devendo o assaltante ser responsabilizado — e
não o dono da loja, o Estado ou a Polícia Militar.

Teoria da causalidade adequada


Obedece a um critério de razoabilidade para determinar a relação entre a
conduta do agente e o dano. Essa teoria é mais extensiva se comparada à
primeira, pois, segundo ela, consideramos causa o ato antecedente ao dano
que seja apto a ocasionar o resultado. Por vezes, percebemos a jurisprudência
brasileira utilizando essa teoria menos criteriosa a fim de que alguém seja
obrigado a reparar os danos causados à vítima do fato, diante da dificuldade
que muitas vezes se apresenta de uma verificação exata da conduta que efe-
tivamente produziu o resultado ou do seu autor.

Alguns doutrinadores, como Paulo Nader, adotam ainda a existência da causa virtual,
que vem a ser aquela causa que teria todas as condições para criar o resultado — mas,
na verdade, foi outra causa, chamada de causa real, que produziu o dano.

Teoria da imputação objetiva


A teoria da imputação objetiva não analisa o nexo de causalidade de forma
tão simples, em uma linha reta entre causa e efeito, pois tal exatidão só seria
possível em ralações exatas ou nos eventos naturais. No universo jurídico,
onde tudo é dinâmico, a situação é bem mais complexa. Essa teoria questiona
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se determinada conduta realmente levará àquele resultado, pois considera que,


no percurso entre ação/omissão e efeito, existem vários acontecimentos que
podem interromper essa relação de causalidade.
Na teoria da imputação objetiva apenas há nexo de causalidade quando a
causa é considerada jurídica e não natural. Assim, apenas os crimes ou atos
ilícitos podem ser causa de um dano, não um evento natural. Então, ainda que
verifiquemos uma relação de causa e efeito, se essa relação não for jurídica,
mas apenas natural, não estaremos diante da causa para o dano, mesmo que
seja considerada como causa em outros campos científicos.
Levamos em consideração a lógica de que se a causalidade não é jurídica,
não pode gerar efeitos jurídicos (obrigação de reparar o dano). Essa teoria se
baseia no risco, ou seja, só será considerada causa do dano aquela conduta
jurídica que diretamente e imediatamente criou ou aumentou o risco do acon-
tecimento do dano.
A única dificuldade que encontramos nessa teoria é que ela restringe a
possibilidade de reparação do dano causado à vítima, já que dificulta a res-
ponsabilização do agente, seguindo na contramão da legislação atual — que
tem tentado abrir o leque da responsabilização garantindo a reparação do
dano às vítimas.
Percebemos que, diante do caso concreto e utilizando o bom senso, os
julgadores optarão pela teoria que melhor solucionar a questão, buscando a
reparação do dano, mas na proporcionalidade razoável de punição do agente.
Na busca por esse equilíbrio, a tendência tem sido o surgimento de novas
teorias. A esse movimento damos o nome de flexibilização do nexo causal.
Para Claus Roxin (2006, p. 104), “[...] somente pode ser imputado objetivamente
ao agente quando tiver incrementado, indevidamente, um risco para um bem
jurídico tutelado pelo tipo penal”.
A teoria da imputação objetiva tem sido uma novidade no Brasil, principal-
mente no que diz respeito à sua possibilidade de aplicação na responsabilização
civil. Observamos mais comumente a sua aplicação na área criminal, para
a qual foi, a princípio, formulada. Contudo, já firmamos o entendimento de
que se ela pode ser aplicada a atos ilícitos penais, por que não a atos ilícitos
civis? Afinal, geram danos indenizáveis.

Concausa, ou causa concorrente


Utilizamos o termo concausa, ou causa concorrente, quando estamos diante
de mais de uma conduta responsável pelo acontecimento do dano, existindo,
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assim, uma causa principal e outras causas auxiliares relacionadas ao evento.


Significa dizer que existem múltiplas causas que provocaram o resultado,
podendo levar à responsabilização de vários sujeitos.
Elucidativos são os ensinamentos de Annelise Monteiro Steigleder (2003,
p. 90-91) ao expor que:

A fim de resolver estas perplexidades, a teoria do risco integral supõe


que a mera existência do risco gerado pela atividade, intrínseco ou não
a ela, deverá conduzir à responsabilização. Havendo mais de uma causa
provável do dano, todas serão reputadas eficientes para produzi-lo, não
se distinguindo entre causa principal e causas secundárias, pelo que a
própria existência da atividade é reputada causa do evento lesivo danoso.
Cuida-se aqui da aplicação, em matéria de nexo de causalidade, da teoria
da conditio sine qua non, cujo mérito é a potencialidade de atenuar o rigo-
rismo do nexo de causalidade, substituindo-se o liame entre uma atividade
adequada e o seu resultado lesivo pelo liame entre a existência de riscos
inerentes à determinada atividade e o dano ambiental, fundado em juízos
de probabilidade. Portanto, diferentemente do que ocorre na teoria do risco
criado, que resolve os problemas causais a partir da teoria da causalidade
adequada, em que se seleciona “entre as diversas causas que podem ter
condicionado a verificação daquele dano, aquela que, numa perspectiva
de normalidade e adequação sociais, apresente sérias probabilidades de
ter criado um risco socialmente inaceitável, risco esse concretizado no
resultado danoso”, na teoria da equivalência das condições basta que o
dano possa estar vinculado à existência do fator risco, o qual é reputado
“causa” do dano, pelo que qualquer evento condicionante é equiparado
à causa do prejuízo, sem a exigência de que este seja uma consequência
necessária, direta e imediata do evento. Fundamentam a adoção do mero
fator risco, em substituição ao requisito de uma causa adequada perfeita-
mente identificada, vinculada a uma atividade perigosa, a percepção de
que a atividade é realizada no interesse da pessoa ou empresa e o princípio
da alterum neminem laedere.

A teoria da equivalência dos antecedentes, adotada pelo Direito Penal, explicitada


pelo art. 13 do Código Penal, estabelece como causa a ação ou a omissão sem a qual
o resultado não teria ocorrido. Por essa teoria, toda circunstância que colabora para o
acontecimento do dano é considerada uma causa deste. Podemos observar que, no
Direito Penal, a causalidade é mais ampla e extensiva, por se tratarem, na maioria das
vezes, de bens maiores, ligados à vida e à integridade física e moral.
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As causas concorrentes se dividem em:

 Concausalidade comum, conjunta ou ordinária — quando a causa


depende de vários agentes, com condutas que são coordenadas entre
si. Como podemos observar no exemplo do art. 942 do Código Civil,
que diz o seguinte:

Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam


sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor,
todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São soli-
dariamente responsáveis com os autores os coautores e as pessoas designadas
no art. 932 (NEGRÂO; GOUVÊA, 2004, p. 214).

 Concausalidade acumulativa — quando existe a conduta de dois ou


mais agentes de forma independente.
 Concausalidade alternativa — quando existe mais de uma conduta, mas
apenas uma delas foi essencial para a ocorrência do dano.

Também podemos classificar da seguinte forma:

 Causas absolutamente independentes:


■ preexistentes — são aquelas que já existiam antes da conduta do
agente, não tendo relação entre si, pois o resultado aconteceria mesmo
sem a ação/omissão do agente;
■ concomitantes — ocorrem ao mesmo tempo, sem relação entre si,
mas não provocam nem criam meios para o resultado;
■ supervenientes — são aquelas que ocorrem após a conduta que de fato
gerou o dano, não sendo capazes de provocar ou agravar o resultado.
 Causas relativamente independentes:
■ preexistentes — são aquelas anteriores à conduta causadora do resul-
tado, mas que criaram meios para o acontecimento ou o agravamento
do dano;
■ concomitantes — são aquelas que ocorrem ao mesmo tempo e co-
laboram entre si para que o resultado aconteça;
■ supervenientes — são aquelas que ocorrem após a conduta principal,
mas colaboram para o resultado, podendo agravar o dano ou causar
um resultado pior.
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Acesse o link ou código a seguir e assista a uma aula sobre


nexo de causalidade ministrada por Fernando Capez:

https://goo.gl/j9yjp8

NEGRÃO, T.; GOUVÊA, J. R. F. Código Civil e legislação civil em vigor. 23. ed. São Paulo:
Saraiva, 2004.
ROXIN, C. Estudos de Direito Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
STEIGLEDER, A. M. Considerações sobre o nexo de causalidade na responsabilidade
civil por dano ao meio ambiente. Revista de Direito Ambiental, n. 32, out./dez. 2003.
VADO AJU. Teoria do crime: nexo causal. 2012. Disponível em: <http://vadoaju.blo-
gspot.com.br/2012/05/penal-i-2-modulo-06-23042012-teoria-do.html>. Acesso em:
26 abr. 2018.

Leituras recomendadas
CAPEZ, F. Curso de Direito Penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
LEITE, G. Apontamentos sobre o nexo causal. Disponível em: <http://www.ambito-
-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2353>.
Acesso em: 26 abr. 2018.
NADER, P. Curso de Direito Civil: responsabilidade civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016. v. 7.
C08_Dano.indd 14 17/04/2018 13:45:49
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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