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CONCAUSAS

CESAR AUGUSTO GOMES CAYRES


Discente do Curso de Direito da UNILAGO

MARINA CALANCA SERVO


Advogada
Especialista em Direito Penal e Processual Penal
Docente do Curso de Direito da UNILAGO

Resumo
O Código Penal Brasileiro aborda em seu artigo 13, o tema Nexo de
Causalidade. Conforme veremos, o Nexo Causal é o elo entre a conduta e
o resultado. Análise que se faz para saber se o resultado foi causado por
determinada conduta praticada. Vale, desde já, observar que o Código
Penal brasileiro adotou a teoria do “sine qua non”, que denominada de
teoria da equivalência dos antedentes causais. De modo que todas as
pessoas que deram causa ao resultado respondem pelo crime. Ocorre
que, em determinadas situações, mais de uma conduta pode ter causadoo
resultado, gerando dúvida a respeito da responsabilidade de cada agente,
o que restará esclarecido nesse artigo.

Palavras-Chave: Direito Penal; Nexo Causal; Concausas.


1. INTRODUÇÃO

Antes de adentrarmos ao tema central deste artigo, se faz


necessária uma explanação geral sobre o tema, ressaltando que são
denominadas de “concausas” a pluralidade de causas que concorrem para
um mesmo evento ou resultado, mas que, nem sempre são diretamente
vinculadas ou, em outras palavras, nem sempre são dependentes da
conduta inicial.
Nota-se que, ao realizar a análise da teoria analítica do crime, na
qual, o conceito de crime resulta da reunião entre os elementos fato típico,
antijurídico (ou ilícito) e culpavél (no que diz respeito a teoria tripartida), o
tema abordado neste artigo se enquadra no “nexo de causalidade”,
elemento do fato típico e, que encontra previsão no artigo 13, do Código
Penal Brasileiro, que trata-se do vínculo entre a conduta praticada pelo
agente e o resultado desencadeado.
Ocorre que nem sempre o resultado será advindo de uma única
conduta, podendo gerar certa confusão quando o mesmo sobrevêm após
uma sequência de acontecimentos, tornando incerta, algumas vezes, a
responsabilidade do agente.
Para melhor visualização, interessante lembrar do exemplo em
que determinado indivíduo recebe um tiro, sendo tão logo socorrido e
encaminhado para o hospital, mas falece, no trajeto, em razão da explosão
da ambulância em que estava sendo transportado.
Nesse caso, veremos que existem duas situações (causas)
diversas: o tiro e a explosão, e através de algumas perguntas que serão
apontadas, encontraremos as respostas corretas para cada caso em que o
resultado foi advindo dessa pluralidade de causas.
2. DO NEXO DE CAUSALIDADE E CONCEITOS BÁSICOS

Na teoria analítica do crime, o Nexo Causal preenche um dos


elementos do fato típico, juntamente com a conduta, resultado e a
tipicidade.
Assim, é simples visualizar que, entre a conduta (ação ou
omissão humana) praticada e o resultado advindo, deve haver nexo
causal, que, nas palavras do doutrinador Ney Moura Teles (2006, p.162),
constitui a “relação de causa e efeito, a fim de que se possa atribuí-lo ao
agente da conduta. (...) É de toda obviedade, pois, que não se pode
atribuir ou imputar a alguém a responsabilidade por algo que não
produziu”.
Dessa forma, o nexo causal trata-se do liame, a ligação entre a
conduta e o resultado naturalístico. Haverá nexo causal quando a conduta
for a causa do resultado.
Outro conceito que será mencionado durante toda a extensão
deste artigo trata-se do termo “causa”, que é conceituada pelo doutrinador
Fernando Capez (2003, p. 150), como “toda condição que atua
paralelamente à conduta, interferindo no processo causal”.
Já “concausa” é a confluência ou, em outras palavras,
concorrência de mais de uma causa na produção do mesmo resultado.
Interessante observação é apontada pelo doutrinador acima, no
sentindo de que, havendo a adoção da teoria dos equivalentes causais,
pelo ordenamento jurídico brasileiro, não há sentido em diferenciar causa
concausa ou condição, vejamos:

Tendo nosso CP adotado a teoria da equivalência dos


antecedentes, não tem o menor sentido tentar
estabelecer qualquer diferença entre causa, ocasião
ou condição. Qualquer conduta que, de algum modo,
ainda que minimamente, tiver contribuído para a
eclosão do resultado deve ser considerada sua causa.
(...) As concausas são, no entanto, aquelas causas
distintas da conduta principal, que atuam ao seu lado,
contribuindo para a produção do resultado (CAPEZ,
2003, p. 150, 151).

Com base em tais noções básicas, foram elaboradas diversas


teorias, com a finalidade de explanar o que constitui causa de um
resultado, mas somente serão abordadas, nesse artigo, a teoria da
equivalência dos antecedentes causais e a teoria da causalidade
adequada.

3. TEORIAS SOBRE O NEXO DE CAUSALIDADE

3.1) Teoria da equivalência dos antecedentes causais

Para essa teoria, toda e qualquer conduta que tiver contribuído


para o resultado, desde que de um modo mínimo, deve ser considerada
como causa.
Dessa forma, podemos afirmar que, tudo aquilo que for excluído
da cadeia de causalidade e ocasionar a não realização do resultado deve
ser tido como causa, em outras palavras, tudo o que contribuiu para o
resultado deve ser considerado como causa do mesmo.
Desse modo, usando essa teoria de Thyrén, deve-se
hipoteticamente eliminar a conduta do curso dos acontecimentos e verificar
se, ainda assim, ocorreria o delito. Se a resposta for negativa, a conduta
terá dado causa ao resultado. Se, ao contrário, for positiva, significa que
não gerou o resultado. Vejamos um exemplo para melhor elucidação:
Guilherme, com ciúmes da namorada, efetua disparos de arma
de fogo em face de Ricardão, que falece. Nota-se que, se suprimidos os
disparos, não haverá morte da vítima. Logo, a conduta de Guilherme foi
causa para o resultado.
Assim, a finalidade é descobrir a causa do crime, se está inserida
na teoria da equivalência dos antecedentes.
Essa foi a teoria adotada pelo ordenamento jurídico, conforme
podemos verificar no artigo 13, do Código Penal Brasileiro: “o resultado, de
que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu
causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não
teria ocorrido”.
O ponto que vale ser destacado é acerca da crítica realizada a
teoria da equivalência dos antecedentes, uma vez que levaria a
possibilidade do regresso causal até o infinito, considerando que todos os
fatos são encadeados, por exemplo:
Ao mencionarmos que Guilherme usou uma arma de fogo, pode-
se dizer que o fabricante e o comerciante dessa arma deram causa física
ao resultado morte, uma vez que, se não fosse por eles, não teria o
resultado morte ocorrido, bem como se não fosse pelas genitoras dos
mesmos que, se não tivessem um filho, não teria ocorrido a venda das
armas.
Nota-se porém, que seria absurdo responsabilizar a genitora do
fabricante de armas ou mesmo do agente criminoso, por ter gerado o
resultado lesivo.
Assim, para evitar a responsabilização das condutas ao infinito, a
legislação e a doutrina apontam certos limites, como a análise de dolo e
culpa, bem como critérios de imputação objetiva.
Entretanto, considerando o tema principal deste artigo, não
adentraremos em tais limitações.

3.2) Teoria da causalidade adequada

Apenas os antecedentes idôneos são capazes de dar causa ao


resultado. Para essa teoria, as concausas (reunião de várias causas)
devem ser idôneas para a produção do resultado.
Com isso, surge a superveniência causal, com as causas e
concausas.
A causa é tida como toda condição que atua paralelamente à
conduta, interferindo no processo causal.
Enquanto isso, concausas, conforme acima mencionado, são
consideradas como reunião de várias causas que paralelamente
concorrem na produção do resultado, o que veremos a seguir.

4. CONCAUSAS

Necessário observar então que, não raras vezes, o resultado é


feito de uma pluralidade de comportamentos, mediante a associação de
fatores, entre os quais a conduta do agente aparece como principal,
entretanto, não o único elemento desencadeante.

4.1. Concausas absolutamente independentes:

Nesse caso, a causa efetiva do resultado não se origina da causa


concorrente. Interessante utilizar parte do conceito apresentado pelo
doutrinador Cleber Masson (2015, p. 254), no sentido de que “por serem
independentes, produzem por si sós o resultado naturalístico. Constituem
a chamada ‘causalidade antecipadora’, pois rompem o nexo causal”, em
outras palavras, são causas sem qualquer relação ao resultado.
Essas causas são divididas em preexistentes (anteriores),
concomitantes (ocorrem ao mesmo tempo) e supervenientes (posteriores).
Para descobrimos qual a causa, devemos realizar perguntas
específicas em cada caso hipotético, sendo: a) qual a causa efetiva que
levou ao resultado? b) qual a causa concorrente? Através dessas
respostas, teremos facilmente desvendada as causas que tenham gerado
o resultado, conforme veremos nos exemplos que serão apresentados.

a. Preexistentes

São causa que existem antes de a conduta ser praticada e


acontecem independentemente do seu cometimento. Assim, se, por
exemplo, às 10 horas Guilherme envenenou José desejando a morte do
mesmo, e, às 14 horas Cesar atirou para matar José. Ocorre que José
morreu às 17 horas por envenenamento.
Nessa situação, a causa efetiva foi o envenenamento, que levou
a morte da vítima.
Já a causa concorrente, consistiu no disparo de arma de fogo,
que ocorreu antes do envenenamento.
Assim, a causa efetiva (envenenamento) não se originou da
causa concorrente (excluindo-se hipoteticamente o disparo, o
envenenamento ocorreria da mesma forma). Logo, o resultado não pode
ser imputado à causa concorrente (disparo de arma de fogo, efetuado por
Cesar). Por essa razão, Guilherme responde por crime consumado (pelo
envenenamento que levou a morte) e Cesar por crime tentando (uma vez
que o tiro não foi causa efetiva).

b. Concomitantes

Nesse caso, a ação praticada não tem relação direta com a


conduta efetiva e produz o resultado independente desta, porém, atua no
mesmo instante em que a ação é realizada.
Nessa situação, se, por exemplo, às 10 horas Guilherme
envenenou José e, às 10 horas, no mesmo momento em que José ingeria
o veneno, foi atingido pelas costas pelo disparo de arma de fogo, realizado
por Cesar. José morreu em face do disparo de arma.
Nota-se que a causa efetiva foi o disparo de arma de fogo,
enquanto a causa concorrente, foi o envenenamento praticado por
Guilherme, no mesmo momento.
Assim sendo, o disparo da arma de fogo não se originou do
envenenamento, de modo que, o resultado não poderá ser imputado à
causa concorrente (envenenamento). Por essa razão, Guilherme
responderá por tentativa de homicídio, uma vez que o envenenamento não
foi causa efetiva do resultado, e sim o disparo efetuado por Cesar, quem
responderá pela forma consumada do crime.

c. Supervenientes

Trata-se da causa efetiva que ocorre após uma conduta já ter


sido praticada. Nota-se que aqui, se às 10 horas Guilherme envenena
José, por exemplo, e,às 15 horas ocorre a queda de um lustre na cabeça
de José. José morre às 19 horas, em razão de traumatismo craniano.
A causa efetiva, nesse caso, trata-se da queda do lustre –
traumatismo craniano, enquanto a causa concorrente, o envenenamento.
Portanto, a causa efetiva (queda do lustre) não se originou e não
tem qualquer vínculo com a causa concorrente (envenenamento), de modo
que são absolutamente independentes.
Nesse caso, Guilherme responderá por tentativa de homicídio,
considerando que o envenenamento, que ocorreu antes, não havia levado
a morte da vítima.
Imprescindível mencionar ainda, as consequências das causas
absolutamente independentes, de modo que a conduta praticada por um
dos agentes, não pode ser considerada como causa efetiva e o mesmo
não responderá pelo resultado, já que ocorre o rompimento total do nexo
causal e, com isso, o agente só pode ser responsabilizado pelos atos até
então praticados.

4.2. Concausas relativamente independentes:

De acordo com o doutrinador Celber Masson (2015, p. 255),


essas causas originam-se da própria conduta efetuada pelo agente, razão
pela qual são chamadas de relativas, considerando que não existiriam sem
a atuação criminosa.
Por outro lado, o doutrinador realiza uma importante ressalva
(MASSON, 2015, p. 256):

Como, entretanto, tais causas são independentes, têm


idoneidade para produzir, por si sós, o resultado, já
que não se situam no normal trâmite do
desenvolvimento causal.
Essas causas também são classificadas em preexistentes
(anteriores), concomitantes (ocorrem ao mesmo tempo) e supervenientes
(posteriores):

a. Preexistentes

Nesse caso, se José é portador de hemofilia e Guilherme aplica


um golpe de faca contra José para mata-lo, que gera apenas um pequeno
ferimento. Apesar da pequena lesão, isso foi suficiente para matar José
que sangrou muito, até a morte, considerando a hemofilia.
Importante verificar que a causa efetiva trata-se da hemofilia -
que levou ao resultado morte, já a causa concorrente é o golpe de faca,
que aplicado por Guilherme gerou um corte na vítima e a fez sangrar.
Assim, se for retirado o golpe de faca (causa concorrente), o
resultado morte por esgotamento de sangue não ocorreria. Assim, torna-se
evidente que o resultado (morte) deve ser imputado à causa concorrente
(golpe de faca que fez sangrar até o esgotamento do sangue). Guilherme
responderá por crime consumado, considerando que a hemofilia (causa
efetiva) era anterior ao golpe de faca.
Entretanto, trata-se de um exemplo que merece maior atenção e
cuidado, já que, apesar da determinação do nosso Código Penal
Brasileiro, a interpretação doutrinária tem se posicionado no sentido de
que o agente somente responderá pela morte se tiver consciência do
estado de hemofilia.
Assim, no exemplo hipotético, Guilherme somente responderia
por crime consumado caso tivesse conhecimento da hemofilia, que levaria
a morte da vítima, ainda que havendo somente um pequeno corte.
b. Concomitantes

Sendo concomitante, em um exemplo elucidativo, Guilherme


desfecha um tiro de arma de fogo contra José, que em razão do susto,
sofre um colapso cardíaco, vindo a morrer.
Como causa efetiva teremos o ataque cardíaco, e como causa
concorrente, o disparo de arma de fogo.
Conclui-se então que o ataque cardíaco (causa efetiva) originou-
se da causa concorrente (disparo de arma de fogo). Logo o resultado pode
ser imputado à causa concorrente, ou seja, ao agente. Por essa razão,
Guilherme responderá por crime consumado.

c. Supervenientes (art. 13, § 1º, Código Penal)

Conforme foi mencionado, a teoria da equivalência das


condições, equipara todos os antecedentes causais, sendo amplo o âmbito
de aplicação.
O doutrinador Ney Moura Teles (2006, p.164) observa então que,
para restringir essa ampla aplicação, o ordenamento jurídico brasileiro traz
no artigo 13, parágrafo primeiro, do Código Penal, uma exceção.
Aqui se faz imprescindível reproduzirmos a redação do texto
legal, do artigo 13, parágrafo primeiro do Código Penal Brasileiro:

§1º. A superveniência de causa relativamente


independente exclui a imputação quando, por si só,
produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto,
imputam-se a quem os praticou.
Explica o doutrinador (TELES, 2006, p. 165) que após a conduta
do agente, pode acontecer outra causa que venha a interpor-se no curso
do processo causal em andamento, alterando o rumo do mesmo e fazendo
com que ocorra o resultado por própria eficiência.
Em razão dessa regra, o professor Cleber Masson (2015, p.
256s) divide as causas relativamente independentes supervenientes em
dois grupos, sendo (1) as que produzem por si sós o resultado; e (2) as
que não produzem por si sós o resultado, senão vejamos:

c.1) Causa Superveniente que por si só não produziu o


resultado

Nesse caso tem-se a incidência da teoria da equivalência dos


antecedentes causais (“conditio sine qua non”), adotada como regra no
artigo 13, “caput”, in fine, do Código Penal.
O agente responderá pelo resultado, uma vez que este não teria
ocorrido como e quando ocorreu. Por exemplo, Guilherme efetua disparo
de arma de fogo em José, dolosamente desejando a morte, mas atingindo
o mesmo nas pernas, em razão da sua péssima pontaria. Nota-se que ao
atingir as pernas da vítima, não oferece risco a vida da mesma. Entretanto,
José é encaminhado para o hospital e, em razão de imperícia médica
falece.
Dessa forma, a causa efetiva trata-se da imperícia médica,
enquanto a causa concorrente, no disparo de arma de fogo que atingiu as
pernas da vítima.
Por essa razão, José não teria morrido, ainda que por imperícia
médica, sem a conduta de Guilherme (que efetuou os disparos que
atingiram as pernas da vítima). Na realidade José somente faleceu por
falta de qualidade do profissional da medicina a que foi submetido,
juntamente com a conduta homicida que redundou no encaminhamento
para o hospital.
Imprescindível aqui transcrever a observação do Mestre Masson
(2015, p. 257): “a imperícia médica, por si só, não é capaz de matar
qualquer pessoa, mas somente aquela que necessita de cuidados
médicos”.
Importante observar então que existem duas situações em que,
de acordo com o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de
Justiça o agente responderá pelo crime consumado, ainda que sejam
causas supervenientes, quais sejam, infecção hospitalar e erro médico:

O fato de a vítima ter falecido no hospital em


decorrência de lesões sofridas, ainda que se alegue
eventual omissão no atendimento médico, encontra-se
inserido no desdobramento físico do ato de atentar
contra a vida da vítima, não caracterizando
constrangimento ilegal a responsabilização criminal
por homicídio consumado, em respeito à teoria da
equivalência dos antecedentes causais adotada no
Código Penal e diante da comprovação do animus
necandi do agente. (HC 42.559-PE, rel. Min. Arnaldo
Esteves Lima, 5ª Turma. j. 04.04.2006).

c.2) Causa Superveniente que por si só produziu o resultado

No parágrafo primeiro, do artigo 13, do Código Penal, como


exceção, foi acolhida a teoria da causalidade adequada, sendo a causa a
conduta idônea a provocar a produção do resultado, entretanto, aqui “não
basta qualquer contribuição. Exige-se uma contribuição adequada”
(MASSON, 2015, p. 257).
Nota-se assim que o resultado sai da linha de desdobramento e
acaba sendo um evento imprevisível, nesse caso, fica evidente que, se
Guilherme atira em José, por exemplo, que é levado para o hospital e o
médico obtem êxito em salvar a vítima dos ferimentos de arma de fogo.
Entretanto o lustre, ou mesmo o teto do hospital, cai na cabeça de José e
ele vem a morrer.
No caso hipotético, a queda do lustre ou do teto, que causou a
morte da vítima, entretanto, de maneira concorrente, ocorreu o disparo de
arma de fogo, que levou a vítima ao hospital.
Por essa razão, a queda do teto é uma causa relativamente
independente (pois se não houvesse o disparo de arma, José não estaria
no hospital) superveniente (posterior) que por si só produziu o resultado,
considerando que a queda do teto levou a vítima a óbito – morte que não
teria acontecido quando e como ocorreu.
Assim, tem-se o rompimento da relação de causalidade, e a
concausa produz o resultado por sua própria força, ou seja, qualquer
pessoa que estivesse naquela área do hospital, poderia morrer em razão
do acontecimento inesperado e imprevisível, e não somente a vítima ferida
pela conduta praticada pelo agente criminoso.
Nesse caso o resultado não pode ser atribuído a causa
concorrente. De modo que, no caso hipotético, Guilherme responde por
homicídio tentado.
Por fim, interessante apontar algumas questões discutíveis
dentro do tema que, de acordo com o doutrinador Fernando Capez (2003,
p. 157), são críticas ao regresso infinito, conforme já mencionamos, mas
também hipóteses “não solucionadas adequadamente pelo emprego da
conditio sine qua non”:
5. QUESTÕES POLÊMICAS

5.1. Dupla causalidade alternativa

Nesse caso, haverá a ocorrência quando duas ou mais condutas


visam o mesmo resultado, sendo cada uma suficiente para a produção do
resultado, ou seja, sem que seja necessária a existência da outra. Por
exemplo:
Guilherme e Cesar, sem que soubessem da conduta um do
outro, ministram veneno contra José, com o dolo de matar a vítima, que
vem a óbito.
Se for aplicada aqui a eliminação hipotética, nenhuma das duas
condutas (ministrar veneno) poderá ser considerada como causa, pois
mesmo suprimida a conduta de Guilherme ou de Cesar, o resultado
ocorreria do mesmo jeito, pois a dose ministrada era suficiente para a
produção do resultado.
Em tal caso hipotético, o doutrinador afirma que o causador do
resultado (homicídio consumado) será considerado aquele que, por uma
razão ou outra, a dose produziu a morte, enquanto o outro agente
responderá pela modalidade tentada (CAPEZ, 2003, p. 158).
Por outro lado, se não restar provado qual das doses foi a que
produziu o resultado, ou seja, acarretou a morte, deve ser aplicado o
princípio in dubio pro reo, de modo que ambos os agentes deverão
responder por crime tentado.
5.2. Dupla causalidade com doses ineficientes

Nesse caso, se no mesmo exemplo, as doses de veneno


ministradas eram insuficientes, cada uma por si só, para levar ao resultado
morte, mas, somadas, atingiriam o nível necessário e produziriam o
resultado desejado, podemos afirmar que, nesse caso, nem a conduta de
Guilherme, nem a de Cesar, levariam ao resultado, sendo eliminada a
conduta de cada, o resultado não aconteceria, pois somente com elas
juntas, a morte ocorreria.
Dessa forma, pela eliminação hipotética, retirando a conduta de
cada, evitaria o resultado, e ambas devem ser consideradas como causa,
ao contrário do que foi apontado no caso anterior.

5.3. O resultado que ocorreria de qualquer modo

Trata-se aqui do exemplo da eutanásia, no qual o médico acelera


a morte de um paciente terminal, desligando o aparelho que o mantinha
vivo.
Tal conduta não poderá ser considerada como homicídio, pelo
critério da eliminação hipotética, uma vez que, mesmo suprimida a conduta
do médico, a morte ocorreria, ainda assim, pela condição da própria vítima.
De acordo com o autor do livro Curso de Direito Penal (CAPEZ,
2003, p. 158), “haverá nessa situação nexo causal, mas por influência de
outras teorias, que entram para socorrer a da equivalência dos
antecedentes (é o caso do princípio da alteração posterior)”.
5.4. Decisões corporativas

Um último caso polêmico e de complicada resolução, trata-se das


decisões coorporativas, em que vários indivíduos pertencentes a um
colegiado ou diretoria de empresa votam a favor de uma decisão que vai
em desacordo com a legislação do país, como, por exemplo, a venda de
um produto extremamente nocivo ao meio ambiente.
Em tal situação hipotética, em que se faz necessária a votação
de determinado número de indivíduos para a decisão, estes poderiam
buscar excluir-se da responsabilidade no resultado, alegando que seu voto
foi irrelevante para o resultado final, considerando que, de uma forma ou
de outra, ocorreria da mesma forma e o produto nocivo seria lançado.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto neste artigo, podemos visualizar que o Código


Penal brasileiro determina em quais situações deve o aplicador da Lei
Penal se valer da regra geral (teoria dos equivalentes dos antecedentes
causais, conhecida também como “conditio sine qua non”) e em quais
situações se valer da exceção (teoria da causalidade adequada).
Vale ressaltar que, dependendo da teoria aplicada no caso
concreto, a imputação e a responsabilização do agente tornam-se
completamente distintas.
Tal diferenciação demostra a importância do tema, muito cobrado
em provas e concursos, e que deve ser tratado com atenção para verificar
qual caracterização mais adequada a modalidade de causa (ou concausa)
e, assim, atribuir o resultado de maneira correta ao agente.
Referências Bibliográficas:

BRASIL. Código Penal Brasileiro - Lei n. 2.848 de 07 de dezembro de


1940. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 29 de outubro de 2015.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. v. 1. 6. ed. rev. e


atual. São Paulo: Saraiva, 2003.

MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. Parte geral. v. 1. 9. ed.


rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral: arts. 1º a 120, volume 1. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 2006.

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