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MATERIAL DE APOIO

Tema: Concurso de pessoas

Professor: Daniel Gondim P. Anunciação

CONCEITO E TEORIAS
O concurso de pessoas ocorre quando duas ou mais pessoas concorrem para sua
efetivação de um crime. É necessário, entretanto, que estejamos diante de um delito
unissubjetivo/monossubjetivo ou de concurso eventual. Ou seja, aquele que, em regra, é
praticado por apenas um sujeito, mas que admite o concurso de agentes, como a coautoria e
a participação.

Existem três teorias principais que tratam do concurso de pessoas: a teoria monista,
dualista e pluralista. Uma dessas teorias é adotada como regra, enquanto as demais são tidas
como exceção.

A teoria monista ou unitária é a adotada como regra pelo Código Penal, no


artigo 29, caput, ao prescrever:

Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide


nas penas a este cominadas, na medida de sua
culpabilidade.

Portanto, todos aqueles que concorrem para um delito, seja como executor, coautor
ou partícipe, são autores dele e responderão pelo mesmo crime.

No que se refere à aplicação da pena, no caso concreto, cada agente responderá na


medida de sua culpabilidade, em um reforço e respeito ao princípio constitucional da
individualização da pena, conforme dispõe a parte final do referido artigo:

[...] na medida de sua culpabilidade.

Logo, embora os agentes respondam pelo mesmo crime, poderão ter pena fixada em
quantia diferenciada.
A exemplo, três agentes que concorrem para um homicídio. O primeiro empresta uma
faca para que o segundo a utilize na execução do crime, enquanto o terceiro dá carona ao
segundo para fugir do local.

Neste caso, conforme a teoria monista, todos responderão pelo homicídio, na medida
de sua culpabilidade, uma vez que o segundo agente que consumou o delito tem culpabilidade
maior que os demais agentes, devendo receber uma pena maior.

A exceção à regra geral adotada pelo Código Penal são a teoria dualista e a teoria
pluralista. Para a teoria dualista, há dois delitos: um para os autores que realizam a atividade
principal e outro para os participes que realizaram atividades secundárias da atividade
principal.

Portanto, existe uma tipificação diferente para o autor e outra para quem participa do
delito. Utilizando do exemplo acima exposto, o executor responderia pelo crime de homicídio
e os outros agentes por um crime de participação no homicídio. Em nosso ordenamento
jurídico, adotamos a teoria dualista, o que refere aos parágrafos § 1º e § 2º do
artigo 29 do Código Penal.

Por fim, para a teoria pluralista a participação é tratada como autoria, onde cada
agente pratica um crime autônomo, com uma tipificação para cada agente que atuou no
concurso de pessoas.

Dessa forma, valendo-se do exemplo acima exposto, o executor responderia pelo


crime de homicídio, haveria um crime diverso para o agente que emprestou a faca e outro
para o agente que deu carona ao assassino, considerando cada partícipe, de forma autônoma.

O nosso ordenamento jurídico adotou, por vezes, a teoria pluralista na Parte Especial
do Código Penal e em leis especiais, a exemplo os crimes de aborto, com uma tipificação para
gestante que autoriza o aborto, conforme dispõe artigo 124 do Código Penal e outra
tipificação para o executor, segundo o artigo 126 do Código Penal.

Conclui-se que nosso ordenamento jurídico penal adotou, como regra, a teoria
unitária/monista e, como exceção, a teoria dualista e a teoria pluralista.
REQUISITOS CARACTERIZADORES

Para que se configure o concurso (eventual) de pessoas é indispensável a existência de


requisitos de natureza objetiva e subjetiva, somados a outros que possam complementar e
aperfeiçoar a prática criminosa.

É possível extrair, pelo menos quatro requisitos básicos para o concurso de pessoas na
prática criminosa, os quais se algum desses inexistentes, não há de se falar em concurso de
pessoas. São eles:

1) Pluralidade de agentes e de condutas

Concorrência de mais de uma pessoa na execução de uma infração penal. No concurso


de pessoas nem todos os participantes, embora assim o desejem, contribuem com sua ação na
infração penal. Alguns praticam o fato material típico, núcleo do tipo; outros praticam atos que,
por si sós, configurariam atos atípicos.

Todos os participantes de um evento criminoso não o fazem necessariamente da


mesma forma, nas mesmas condições e nem com a mesma importância, mesmo que
contribuindo livre e espontaneamente para o seu resultado. Para Esther Ferraz, “enquanto
alguns praticam o fato material típico, representado pelo verbo núcleo do tipo, outros se limitam
a instigar, a induzir, a auxiliar moral ou materialmente o executor ou executores praticando atos
que, em si mesmos, seriam atípicos”. Contudo, como disposto no caput do artigo 29 do Código
Penal, a participação de cada um deve se conjugar, para colaboração causal de obtenção
resultado criminoso, razão pela qual, todos respondem pelo mesmo crime.

Todavia, é necessária a diferenciação de autor do mero partícipe, até pelo primado


maior da culpabilidade, ou seja, da responsabilização das pessoas "na medida de sua
culpabilidade", como dispõe o caput do art. 29 do Código Penal. Por autor entende-se aquele
que executa com suas próprias mãos todos os elementos do tipo penal, em que poderá ainda
utilizar de outra pessoa como instrumento ou aquele que realiza a parte necessária de decisão
criminosa para prática criminosa.

Este é o principal requisito para que se caracterize o concurso de pessoas.


2) Relevância causal das condutas

A conduta de típica ou atípica de cada participante deve se integrar em uma corrente


causal que determina o resultado. Para configurar participação a conduta precisa ter eficácia
causal, provocando, facilitando, estimulando a conduta principal. Portanto, conduta irrelevante
para a produção do crime não possui qualquer eficácia causal.

Não satisfaz a multiplicidade de agentes e condutas para que se configure o concurso


de agentes, é necessário ainda que o crime se faça por meio de condutas nas quais se possa
vislumbrar o nexo de causalidade entre elas e o resultado obtido. Desse modo, cada conduta
deve ser relevante para a contribuição objetiva do crime, no encadeamento causal dos eventos.
Caso a conduta típica ou atípica de cada participante não seja da corrente causal para
determinação do resultado, será ela por si só irrelevante. Obviamente, se conclui que nem todo
comportamento vai caracterizar a participação, pois é necessário que haja, no mínimo,
estimulação, induzimento ou facilitação para prática criminosa. Nesse sentindo, condutas
irrelevantes ou insignificantes para existência do crime serão desprezadas, não constituindo
sequer participação criminosa.

3) Vínculo Subjetivo

Para aperfeiçoamento do concurso de pessoas, devem existir vários agentes que


contribuam para uma ação comum. Não satisfaz o agente atuar com dolo/culpa. É necessário
que haja uma relação subjetiva entre os participantes do crime, pois, do contrário, várias
condutas poderão ser isoladas, autônomas e até mesmo desprezíveis. Deve haver, portanto, um
vínculo psicológico e normativo entre os diversos autores do crime, de forma a se analisar essas
condutas como um todo, e a ser possível a aplicação do art. 29 do Código Penal.

Ensina Cezar Roberto Bittencourt que, todavia, o simples conhecimento da realização


de uma infração penal ou mesmo a concordância psicológica caracterizam, no máximo,
“conivência”, que não é punível, a título de participação, se não constituir, pelo menos, alguma
forma de contribuição causal, ou, então, constituir, por si mesma, uma infração típica.

“Somente a adesão voluntária, objetiva (nexo causal) e


subjetiva (nexo psicológico), à atividade criminosa de outrem, visando
à realização do fim comum, cria o vínculo do concurso de pessoas e
sujeita os agentes à responsabilidade pelas consequências da
ação.” (MIRABETE, Manual, v.1, p.226)

Portanto, deve haver uma participação consciente e voluntária no fato, mas não é
indispensável o acordo prévio de vontade para a existência do concurso de pessoas. A adesão
tem que ser antes ou durante a execução do crime, nunca posterior. No caso de acordo posterior
a execução do crime, esse caracteriza o favorecimento pessoal ou real previsto nos art. 348 e
349 do Código Penal, e não o concurso de pessoas.

Nos crimes dolosos, basta apenas que o agente adira à vontade do outro, em que os
participantes deverão atuar com vontade homogênea, no sentido todos visarem a realização do
mesmo tipo penal. A existência de vínculo subjetivo não significa a necessidade de ajuste prévio
(pactum sceleris) entre os delinquentes. Rogério Greco afirma que se não se conseguir
vislumbrar o liame subjetivo entre os agentes do crime doloso, cada um responderá
isoladamente por sua conduta.

Já nos delitos culposos há divergência doutrinária. Antigamente, se pesava a


possibilidade de concurso de agentes, porém, atualmente tem se admitido, até com certa
tranquilidade que alguém possa conscientemente contribuir para a conduta culposa de terceiro.
Aqui, deve-se verificar o elemento vontade na realização da conduta, mas não na produção do
resultado. Diferentemente do concurso de pessoas no crime doloso, o binômio consciência e
vontade não conectam para um objetivo de prática criminosa, mas sim de realizar a conduta
culposa pela imprudência, negligência, ou imperícia. Sendo assim, é importantíssimo diferenciar
o vínculo subjetivo que existe no concurso de pessoas (crimes dolosos) com o normativo (crimes
culposos).

4) Identidade de fato

O quarto e último requisito para se configurar o concurso de pessoas, as infrações


praticadas pelos concorrentes sejam únicas – Unidade da Infração Penal. É imprescindível que
todos atuem com esforços conjugados a fim do mesmo objetivo criminoso.

Damásio de Jesus considera que se trata de identidade de infração para todos os


participantes, não propriamente de um requisito, mas sim de verdadeira consequência jurídica
diante das outras condições. Desse modo, não há de se falar em concurso de pessoas se a
concorrência entre dois ou mais agentes não se destinar a mesma prática de certa e
determinada infração penal.

Deve-se existir, portanto, uma unidade da infração penal, requisito básico para
concurso de pessoas e produto lógico-necessário em face do concurso de agentes. Essa infração
penal deverá ser ao menos tentada, bem como dispõe o art. 31 do Código Penal, em casos de
impunibilidade de ajuste, determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em
contrário.

Autor é quem pratica o crime, por exemplo, no caso do homicídio, quem apertou o
gatilho. Co-autoria, ocorre quando mais de uma pessoa comete o mesmo crime, no entanto,
podem ter penas distintas, de acordo com o grau de participação e gravidade de seus atos para
o crime. O partícipe é quem ajuda. Por exemplo, quem, sabendo das intenções do autor, o leva
ao local onde a vítima para que ele possa matá-lo, ou quem ajuda o autor a fugir.
BIBLIOGRAFIA

GOMES, Luiz Flávio. Participação de várias pessoas no crime culposo. Jus Navigandi,
Teresina, ano 10, n. 878, 28 nov. 2005.

HUNGRIA, Nelson e LYRA, Roberto. Compêndio de Direito Penal. Rio de Janeiro: Livraria
Jacyntho, 1936.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, Parte Geral. 29 ed. São Paulo: 2012. v. 1.

Manual de Direito Penal, Parte Especial. 29 ed. São Paulo: 2012. v. 2.

MOREIRA FILHO, Guaracy. Código Penal Comentado. 1 ed. São Paulo: Rideel, 2010.

CAPEZ, Fernando. Código Penal Comentado. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

JESUS, Damásio de. Direito Penal, parte geral. 33 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v.1.

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