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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFG

INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR (IES) DO GRUPO ÂNIMA EDUCAÇÃO

DIREITO

PARECER JURÍDICO N° 12345/2023

EMENTA

DA RELAÇÃO DE CAUSALIDADE (ART. 13,


§2º); DO CONCURSO DE PESSOAS (ART. 29,
§1º); DA APLICAÇÃO DA PENA (ART. 68 E ART.
70) - CÓDIGO PENAL; DA EXTRAÇÃO
MINERAL - LEI 9.605/1998 (ART. 55). TEORIA
DO DOMÍNIO DE FATO. AUXÍLIO. GERENTE.
EMPREGADO. CONDUTA. NEXO CAUSAL.
DIREITOS. CRIME. AÇÕES NEUTRAS.

REQUERENTES: Professor Júlio César Boa Sorte Gama e o Professor João Paulo Soares
e Silva.
ASSUNTO: Análise das qualificações das condutas de ― G‖ e ―E‖ a partir do caso concreto
indicado pela Professora Paula Rocha Gouvea Brener .
Sumário

RELATÓRIO........................................................................................................................................... 3
FUNDAMENTAÇÃO ............................................................................................................................. 3
CONCLUSÃO ...................................................................................................................................... 12
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICA .................................................................................................... 13

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RELATÓRIO

O presente parecer visa a resolução do caso proposto pela Professora Paula Rocha Gouvea
Brener, sob o pedido do Professor Júlio César Boa Sorte Gama, o qual, juntamente com o
Professor João Paulo Soares e Silva, orientaram e estabeleceram as diretrizes do estudo. O
caso estabelecido foi o seguinte: ― O Gerente G de uma Fornecedora, especializada em
maquinário para extração mineral firmou contrato de locação de maquinário com o Gerente da
Mineradora M, autorizada a explorar carvão mineral. Após algum tempo, G recebe uma
notificação lhe informando que M estaria explorando também argila, sem a autorização e em
área de vizinhos, com o material alugado. O Entregador E, que passava pelo corredor naquele
momento, escuta ao Gerente G discutindo o problema com seu secretário. G decide manter o
contrato firmado com o Gerente de M e E, apesar da conversa que ouvira, decide seguir com o
seu trabalho normalmente, entregando semanalmente o maquinário em M.‖ A respeito desse
caso, foi questionado se o Gerente G responderia pelo crime de lavra clandestina, presente no
artigo 55 da Lei de Crimes Ambientais ( Lei n° 9.605/ 88) , assim como o Entregador E.
Nesse sentido, por unanimidade do grupo, foi então concluído que ―M‖ responderia pelo
crime de Lavra Clandestina, enquanto ―G‖ e ―E‖ não concorreram para o crime praticando
uma ação neutra, não sendo puníveis com base na lei n° 9.605/88, além das diversas menções
do concurso de pessoas na Parte Geral do Código Penal, do mesmo jeito que foi proposto, no
arquivo disponibilizado pela Professora Paula Brener, no slide intitulado para ir além,
apresentados em anexo (anexo 1).

FUNDAMENTAÇÃO

No ambito do Direito Penal foi possível compreender que existem infrações penais que, para
sua prática, exigem a participação de mais de um sujeito ativo. Desse modo, iremos fazer uma
análise geral para assim concluir o desfecho do presente caso.

Segundo Cezar Roberto Bitencourt (2019, p. 1142), quanto a classificação doutrinaria, crime
plurissubjetivo é aquele que ―necessariamente deve ser praticado por mais de uma pessoa —
também é conhecido como crime de concurso necessário‖. Além do mais, para que haja a
efetiva caracterização do concurso de pessoas, precisamos reconhecer a presença de alguns
requisitos cumulativos, consistindo na pluralidade de agentes, sendo este

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[...] o requisito básico do concurso eventual de pessoas: a concorrência de
mais de uma pessoa na execução de uma infração penal. A participação de
cada um e de todos contribui para o desdobramento causal do evento, e
respondem todos pelo fato típico em razão da norma de extensão do
concurso (BITENCOURT, 2019, p. 128)

Para mais, a existência de relevância causal, que consoante Bitencourt (2019, p. 129), seria ―a
conduta típica ou atípica de cada participante deve integrar-se à corrente causal determinante
do resultado‖. Além disso, analisar a existência do vínculo subjetivo entre os agentes, que
segundo Bitencourt (2019, p. 129), seria ―um liame psicológico entre os vários participantes,
ou seja, a consciência de que participam de uma obra comum‖, de modo que esse liame seja
anterior ou concomitante com a prática do crime. Ademais, de acordo Bitencourt (2019, p.
129), ―para que o resultado da ação de vários participantes possa ser atribuído a todos, ―tem
que consistir em algo juridicamente unitário‖. Como afirma Damásio, não é propriamente um
requisito, mas consequência jurídica diante das outras condições.‖

Quanto ao conceito de autoria, ele não se limita somente àqueles que pratica diretamente a
figura delituosa. Para além disso, segundo Bitencourt (2019, p. 129), ele se abrange aos
sujeitos que de forma ―consciente e voluntariamente, coopere na ação de outrem, quer
praticando atos de execução(coautoria), quer instigando, induzindo ou auxiliando
(participação) na realização de uma conduta punível.‖

Várias são as teorias que visam definir o conceito de autor. Entre elas, temos a teoria do
domínio do fato que foi acolhida no Brasil, onde Bitencourt apresenta sua definição em seu
código comentado.

[...] A teoria do domínio do fato, partindo do conceito restritivo de autor, tem


a pretensão de sintetizar os aspectos objetivos e subjetivos, impondo-se
como teoria objetivo-subjetiva. Embora o domínio do fato suponha um
controle final, ―aspecto subjetivo‖, não requer somente a finalidade, mas
também uma posição objetiva que determine o efetivo domínio do fato.
Autor, segundo esta teoria, é quem tem o poder de decisão sobre a realização
do fato. É não só o que executa a ação típica, como também aquele que se
utiliza de outrem, como instrumento, para a execução da infração penal
(autoria mediata) (BITENCOURT, 2019, p. 130).

Outrossim, a regra adotada de forma moderada pelo nosso Código Penal sobre a punibilidade
no concurso de pessoas é a teoria unitária, sendo a mesma definida por Bitencourt, como uma
teoria que

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[...] não faz qualquer distinção entre autor e partícipe, instigação e
cumplicidade. Todo aquele que concorre para o crime causa-o em sua
totalidade e por ele responde integralmente. Embora o crime seja praticado
por diversas pessoas, permanece único e indivisível. O crime é o resultado
da conduta de cada um e de todos, indistintamente. Essa concepção parte da
teoria da equivalência das condições necessárias à produção do resultado
(BITENCOURT, Cezar R. Código penal comentado, 2019, p.128).

Sendo a pena de cada um, adequada a sua culpabilidade, segundo disposto no artigo 29 do
CP:

Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a
este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

§ 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída


de um sexto a um terço.

Feito esse apanhado, agora é hora de analisar os estudos pautados sobre as ações neutras,
onde Paula Brener em sua dissertação sobre ações neutras e limites da intervenção punível, a
conceitua: ações neutras ou ―condutas cotidianas‖ nada mais é que um grupo de casos
compostos por comportamentos que, de uma perspectiva causal, possibilitam ou favorecem a
realização de um fato ilícito por um terceiro autorresponsável (BRENER, 2021, p.17).

De outro modo, Paula Brener também apresenta o conceito desenvolvido por Luís Greco
sobre ações neutras, como sendo

[...] aquelas ―contribuições a fato ilícito alheio que, à primeira vista, pareçam
completamente normais‖ ou ―todas as contribuições a fato ilícito alheio não
manifestamente puníveis‖. Tratando-se de um conceito desprendido da
punibilidade ou não das condutas (BRENER, 2021, p.19).

Feita essas analises, adianto que o gerente G não responderá pelo crime. Sendo somente M o
responsabilizado pelo crime de lavra clandestina previsto no artigo 55 da Lei 9.605/1998.

Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a


competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo
com a obtida:

Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.

Sob essa óptica, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 15), trata da importância de reconhecer o
sentido delitivo da participação, estando o mesmo ―presente quando a intervenção do agente
se integrar com o injusto, conformando uma relação de sentido de concurso para o crime (art.
29 do CP), precisamente de auxílio ou ajuda (art. 31 do CP).
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Para mais, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 15), indica que somente haverá participação
―quando a conduta apresentar uma utilidade unicamente delitiva, de modo a ser compreendida
como auxílio para o injusto. Contrario sensu, será neutra a conduta que apresentar uma
utilidade legal, sendo apenas convertida delitivamente por um terceiro‖.

Feita análise, a ação de G se encaixa como neutra, uma vez que alugar os maquinários não é
ato ilícito, tendo por objetivo um fato unicamente profissional, com finalidade somente
econômica, ou seja, não tinha por desígnio uma utilidade delitiva, sendo convertida
delitivamente apenas por M.

Luís Greco em sua obra, cumplicidade através de ações neutras: A imputação objetiva na
participação, (2004, p. 116), traz a existência de alguns elementos presentes nas totalidades de
casos que envolve ações neutras, sendo esses a ―ação (entregar o machado, prestar a
consultoria jurídica, conduzir o autor no táxi, vender o remédio abortivo), há um resultado (o
cometimento do fato principal), e há um nexo causal entre os dois‖. Dessa forma, devemos
analisar por partes esses elementos.

Para Greco (2004, p. 117), ―só se consideram proibidas aquelas ações tidas por perigosas‖.
Desse modo, para analisar se a ação era perigosa, foi preciso recorrer ao conceito de risco
trazido por Greco.

[...] uma ação é arriscada quando, segundo o juízo de um homem prudente,


situado no momento da prática da ação (ex ante) e dotado de eventuais
conhecimentos superiores do autor (chamados conhecimentos especiais),
traz ela consigo uma possibilidade de dano (GRECO, Luís. 2004, p. 117)

Para mais, ainda nessa lógica, Paula Brener diz que

[...] para verificar se determinada ação representa a criação de um risco,


analisa-se se um observador, na mesma posição em que o agente se
encontrava antes do fato, o consideraria arriscado. É nesse ponto da
imputação objetiva que os conhecimentos especiais, como anteriormente
mencionado, ganham relevância. (BRENER, 2021, p. 106)

Além disso, de acordo Paula Brener,

[...] a prognose póstuma objetiva requer a previsibilidade objetiva do risco


no caso concreto, a partir de uma perspectiva anterior à ação. Consiste em
analisar se um homem prudente, dotado de conhecimentos especiais, em um
momento anterior à ação, consideraria ela perigosa, identificando a
possibilidade de uma lesão ao bem jurídico. (BRENER, 2021, p. 107)

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Ao analisar a conduta de G, que fechou contrato de locação de maquinário com a mineradora
M, onde a mesma estaria autorizada a explorar carvão mineral. Entende-se que G não possuía
conhecimentos superiores, pois M não havia revelado nada sobre a exploração ilegal da argila.
Assim, nesse momento anterior, não seria possível identificar como arriscada a conduta de
alugar os maquinários, leva-se em consideração o princípio da confiança, pois um homem
prudente não vislumbraria uma possibilidade de dano a um bem jurídico nesse caso, mas sim
uma extração somente do carvão, ao qual a mineradora estava permitida explorar.

Ainda nesse contexto, após notificado, mesmo havendo a criação de risco na ação realizada
por G, onde ele, sabendo do ilícito que estava sendo cometido por M, decide continuar
fornecendo o maquinário, tornando sua ação favorecedora do fato principal. Sob essa
perspectiva, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 107), evidencia que ―a análise da prognose
póstuma objetiva irá encontrar uma resposta positiva para o questionamento sobre a criação
de um risco‖.

Para além disso, feita a análise dos elementos presentes nas totalidades dos casos de ações
neutras, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 108), evidencia que ―nem todo aquele cujo
comportamento cria um risco relevante que se realiza no resultado deve ser responsabilizado‖.
Desse modo, não basta que a contribuição de G para o fato principal crie somente risco ao
bem jurídico, para além disso, é preciso que o risco criado seja juridicamente desaprovado.

A proposta de tipicidade objetiva prevista nos art 13 do CP, segundo Brener, respalda a falta
de culpabilidade de G, sobretudo, porque de acordo com o §2º, alínea a, b, c, se houve
omissão por parte da empresa de G, devido a sua natureza comercial, alugar maquinários não
gerou o risco proibido já que sua empresa lucra com aluguel de equipamentos especializados
para outras empresas interessadas em seu serviço. Em seus contratos não cabe a G fiscalizar
seus clientes, tão pouco ―assumiu a responsabilidade de impedir o resultado‖ de extrair lavras
ilícitas, não gerando com seu fornecimento de equipamentos risco para a ocorrencia do
resultado praticado por sua cliente M.

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é


imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem
a qual o resultado não teria ocorrido.

Relevância da omissão
§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia
agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

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a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Sob esse viés, Greco (2004, p. 119), expõe que ―se há criação de risco, para que o tipo
objetivo esteja realizado basta somente que este risco seja declarado proibido, juridicamente
desaprovado e que ele se realize no resultado‖. Paula Brener (BRENER, 2021, p. 108),
evidencia que ―superada a verificação sobre a criação de um risco pelo comportamento do
agente que possibilita ou favorece o injusto de terceiro, passa-se à valoração do risco criado,
afinal, nem toda conduta arriscada conforme a tipicidade objetiva‖.

Assim, (BRENER, 2021, p. 111), ―somente são consideradas idôneas as proibições que
proporcionem uma significativa melhora para a condição do bem jurídico‖. Nesse sentido,
entende-se que o maquinário fornecido por G, é especializado, não se encontrando de maneira
rápida à disposição no mercado. Sob essa perspectiva, se G tivesse feito a quebra do contrato,
M não encontraria de imediato à sua disposição os maquinários necessários para a exploração.
Assim, a proibição de fornecer o maquinário proporcionaria uma melhora para as condições
do bem jurídico, sendo, portanto, idônea.

Ainda nessa lógica, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 111), evidencia que ―da perspectiva do
tipo objetivo, ―haverá risco juridicamente desaprovado se a não-prática da ação proibida
representar uma melhora relevante na situação do bem jurídico concreto‖.‖

Paula Brener traz em sua obra a ideia de que


[...] Claus Roxin divide a sua teoria sobre as ações neutras em dois eixos.
Nas hipóteses em que o agente possui conhecimentos especiais, a solução se
encontra no critério da relação semântica delitiva, enquanto nas situações em
que o agente não possui conhecimentos especiais, mas conta com intenções
delitivas do autor, deve-se solucionar o problema pela aplicação do princípio
da confiança (BRENER, 2021, p. 121).

Sendo assim, a contribuição de G se direciona a uma ação licita, visto que alugar os
maquinários não é ato criminoso. Destarte, essa contribuição por si só é útil ao autor, onde o
mesmo por meio de uma resolução autônoma transforma a condição em um comportamento
delitivo, sendo independente de G.

Consoante Paula Brener (BRENER, 2021, p. 127), ―entende-se por participação punível o
comportamento que possibilita ou favorece o injusto, violando uma proibição proporcional,

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adequada e idônea para a proteção de bens jurídicos, o qual apresente inequívoco sentido
delitivo‖. Por esse ângulo,

[...] a ausência de quaisquer dos requisitos, seja no primeiro ou segundo


plano de imputação, acarreta a atipicidade do comportamento, devendo-se
reconhecê-lo como neutro. Assim, faltando à proibição proporcionalidade,
ou ao comportamento do partícipe inequívoco sentido delitivo, não haveria
participação no injusto, mas apenas um comportamento normal da vida
cotidiana (BRENER, 2021, p. 127).

Assim, o negócio jurídico firmado por G, que é o fornecimento dos maquinários, possui
inúmeras utilidades legais, uso legitimo e consequentemente, benefícios para o
desenvolvimento econômico das atividades de mineração com maior precisão e segurança.
Por esse ponto de vista, a decisão de desviar essas utilidades para fins de proveitos delitivos é
exclusivamente autônoma e posterior à contribuição de G.

Tratando de um uso que ultrapassa as competências de G, ao qual não se vincula o fato como
obra sua. Desse modo, não concorre ao ilícito, mantendo-se nos limites da liberdade no
exercício de suas atividades econômicas.

Conclui-se então que G não cria um risco juridicamente desaprovado, sendo atípico o seu
comportamento. À vista disso, G não responde por participação no crime de lavra clandestina,
sua ação é tida como neutra. Entretanto, o agente G pode concorrer a uma responsabilização
por outros crimes.

Outrossim, quando tratamos de responsabilização criminal, devemos falar sobre a dosimetria


da pena como sendo o procedimento no qual utilizando-se do sistema trifásico de cálculo,
define-se a condenação com base nas próprias convicções e nos critérios previstos pelo
legislador. Para mais, o Ministério Público Federal (MPF), traz em seu roteiro de atuação da
dosimetria da pena (2016, p. 116), que na etapa do cálculo da pena-base ―o processo de
individualização da pena se compõe de até três fases, a legislativa, a judiciária (em um
processo de conhecimento) e a executória ou administrativa‖.

Sob essa perspectiva, segundo MPF (2016, p.116), a fase legislativa deve ―fixar, para cada
tipo, os parâmetros, uma moldura, com o máximo e o mínimo de pena aplicáveis. Vedam-se
as penas fixas e penas sem um limite legalmente fixado‖.

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Na segunda fase da individualização da pena, de acordo MPF (2016, p. 116), ―o juiz, à vista
do caso concreto, fixa a espécie, a quantidade e o regime inicial de cumprimento da pena. No
Brasil, essa etapa de individualização da pena se dá, na dicção do art. 68 do Código Penal‖.

Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste


Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e
agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição


previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma
só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.

Para mais, conforme MPF (2016, p. 117), ―nessa segunda etapa, mostram-se relevantes
regras jurídicas escritas e não escritas, elementos normativos e descritivos, atos cognitivos e
puras valorações‖.

Na última fase, consoante o Ministério Público Federal (MPF):

[...] Já se viram os fatores a se considerar na primeira fase da aplicação


judicial da pena, regida pelo art. 59 do Código Penal. Agora, a questão passa
a ser como esses fatores influem concretamente na pena prevista em abstrato
no tipo penal. Os temas a serem tratados são de onde se deve partir dentro
dos limites máximo e mínimo de cada crime e quanto cada circunstância
judicial deve influir na pena (MPF, roteiro de atuação, dosimetria da pena,
2016, p. 117).

Na segunda etapa, segundo o MPF, o Código Penal estabelece em seu artigo 68 que, após a
determinação da pena-base, deve-se analisar a incidência de circunstâncias agravantes e
atenuantes, fixando-se a denominada pena provisória, para, somente então passar-se à fixação
da pena definitiva, na terceira fase de cálculo da pena. (MPF, roteiro de atuação, dosimetria
da pena, 2016, p. 125)

Ainda nessa lógica, o MPF apresenta o critério de cálculo nessa etapa.

[...] para fixação do quanto de aumento ou diminuição de pena em razão das


circunstâncias agravantes e atenuantes deixou o Código Penal a sua
determinação para valoração a ser efetivada pelo julgador. Essa definição
pelo julgador, contudo, deve estar de acordo com os elementos presentes no
processo, devendo ocorrer fundamentação adequada para a compreensão dos
elementos que levaram à determinação do quantum de elevação ou de
diminuição (MPF, roteiro de atuação, dosimetria da pena, 2016, p. 127).

A terceira etapa, se dá com a aplicação das causas de aumento ou de diminuição. De acordo o


Ministério Público Federal,

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[...] a primeira modificação incidirá sobre o quantum de pena provisória,
obtendo-se um novo quantitativo de pena, diminuída ou aumentada,
aplicando-se da mesma forma as demais causas de diminuição ou causa de
aumento, sucessivamente, até fazer incidir todas as causas de aumento ou
diminuição presentes para o caso específico (excetuando-se a situação
previsão do parágrafo único do art. 68) (MPF, roteiro de atuação, dosimetria
da pena, 2016, p. 132).

Além disso, conforme o Ministério Público Federal (MPF, roteiro de atuação, dosimetria da
pena, 2016, p. 132), ―nessa fase de fixação da sanção criminal, a pena final obtida pode
resultar em valor inferior ao mínimo legal estabelecido para o crime, ou ainda, em
quantitativo superior ao máximo legal também estabelecido‖.

Por fim,

[...] não se permite nesta fase, contudo, a aplicação do critério de


compensação (admitido quando da análise de incidência das circunstâncias
agravantes e atenuantes), devendo incidir nessa fase, sucessivamente, todas
as causas de aumento ou diminuição previstas na parte geral do Código
Penal e aquelas previstas na parte especial ou em leis especiais (MPF, roteiro
de atuação, dosimetria da pena (2016, p. 132).

Sob esse viés, entende-se que cada crime possui sua própria dosimetria (cálculo da pena), se
G for responsabilizado por outros crimes, seu cálculo pode chegar a uma pena alta com a
soma de cada um dos crimes cometidos mediante somente uma ação ou omissão segundo
disposto no artigo 70 do Código Penal.

Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois


ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas
cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer
caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto,
cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes
resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.

Já o entregador E, será isento de pena, pois Luís Greco traz em sua obra que

[...] a proibição de uma ação neutra, de uma ação não dotada de sentido
delitivo, seria uma medida inidônea para proteger bens jurídicos, vez que
quem quer se valer dela poderia recorrer a qualquer outra pessoa não dotada
de conhecimento, através da qual poderia obter idêntica contribuição.
(GRECO, Luís. 2004, p. 134).

Desse modo, entende-se que se E se omitisse a fazer a entrega dos maquinários a M, G


poderia facilmente encontrar outra pessoa para fazer essas entregas. Sob essa lógica, se essa

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ação fosse omitida, ela não seria relevante para a proteção do bem jurídico tutelado, fazendo
com que o praticante da ação neutra não responda pela pratica do crime.

Além disso, Paula Brener (BRENER, 2021, p. 49), traz em sua obra um exemplo
extremamente esclarecedor em relação a essa não responsabilização do entregador E. Onde

[...] um trabalhador encarregado por anos do transporte e despejo de material


em um rio. Eventualmente, escuta uma conversa entre os engenheiros da
empresa e vem a saber que o conteúdo do tanque possuía produtos poluentes
das águas. Embora tenha adquirido esse conhecimento eventual, sua
responsabilidade não se ampliou em relação aos demais encarregados pelo
despejo de materiais. Sua responsabilidade permanece restrita ao âmbito de
seu papel, não podendo ser imputado pelo crime de poluição hídrica, artigo
54 da Lei nº 9.605/1998, em adaptação à legislação brasileira. Embora
possua uma evitabilidade pontual, a ele não incumbe esse dever, mas sim aos
engenheiros para quem a redução do perigo está abarcada pelo papel que
exercem (BRENER, 2021, p. 49).

Assim, embora o entregador E tenha adquiro o conhecimento eventual quando ao ilícito que
estava sendo praticado pela mineradora M, sua responsabilidade não se amplia em relação aos
outros entregadores pelo fato dele ter ouvido sobre o ilícito.

Nessa perspectiva, sua responsabilização permanecera restrita ao seu papel, não respondendo
pelo crime de lavra clandestina, artigo 55 da Lei 9.605/1998, pois exclusivamente dentro
desse artigo, embora possua uma evitabilidade quanto a conduta principal, ao entregador E
não incumbe esse dever, sendo facultativo o poder denunciar.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, é compreendido que a imputação quanto ao crime estabelecido na Lei


9.605° 88, Crime de Lavra Clandestina, recai sob M. uma vez que ele foi o autor da ação e a
pessoa de ―G‖ e ―E‖ não são puníveis, pois ambas as condutas de G e E são tidas como
neutras.

Atinentes a esse entendimento, temos as seguintes considerações:


a) G não reponde pelo crime de lavra clandestina, pois a ação dele não é punível, uma
vez que o contrato estabelecido entre ele e M era lícito ( locação de maquinário para a
exploração de carvão mineral), e com base no princípio da confiança, G não teria a
possibilidade de saber que M iria praticar a conduta ilícita após a celebração do pacto.

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Similarmente, a utilização da máquinas alugadas poderia ser substituídas sem grande
esforços,
b) O Entregador E não responde pelo crime de lavra clandestina porque sua contribuição
poderia facilmente ser substituída por outro funcionário, não gerando nenhum prejuízo
ao autor principal, além de entregar maquinário para a exploração de carvão mineral
ser uma conduta lícita e sua reponsabilidade manter restrita ao âmbito do seu trabalho,
não gerando imputação criminal por lavra clandestina.
É o parecer.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICA

BITENCOURT, Cezar Roberto. Codigo Penal comentado. Saraiva: 10 edição, 2019, 1744 p.

BRASIL. Ministério Público Federal. Câmara de Coordenação e Revisão. Roteiro de atuação:


dosimetria da pena / 2. Câmara de Coordenação e Revisão. – Brasília: MPF, 2016

BRENER, Paula Rocha Gouvêa. Ações neutras e limites da intervenção punível: sentido
delitivo e desvalor do comportamento típico do cúmplice / Paula Rocha Gouvêa Brener. –
2021.

CODIGO PENAL. Disponivel em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-


lei/del2848compilado.htm. Acesso em maio de 2023.

GRECO, Luís. Cumplicidade através de ações neutras: a imputação objetiva na participação.


Rio de Janeiro: Renovar, 2004, 206 p.

________. As razões do direito penal. Quatro estudos / Luís Greco; tradução e organização:
Eduardo Viana; Lucas Montenegro; Orlandino Gleizer. - 1. ed. - São Paulo: Marcial Pons,
2019.

Guanambi-BA, 01 de Junho de 2023

Bel. Ana Emília Magrinelli Lisboa Ataíde


OAB XX.SSS/ BA
Bel. Flávia Damascena Roriz
OAB YYYY/BA
Bel. Hiviny Kelly Farias de Oliveira
OAB ZZZZ/BA
Bel. Isadora Nunes Paes
OAB AAAA/BA

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Bel. Jackeline Santos Marques
OAB BBBB/BA
Bel. Karina Lima Da Silva
OAB AB.ABAB/ BA
Bel. Maylle Dos Santos Souza
OAB CGCGC/BA
Bel. Raquel da Cruz Reis
OAB BABHHH/ BA
Bel. Renata Cristina De Oliveira Silva
OAB BAJAM/ BA
Bel. Stenia Souza Dos Santos
OAB IIIIII/BA

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