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A razoabilidade na reparação dos danos

extrapatrimoniais

A RAZOABILIDADE NA REPARAÇÃO DOS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS


Reasonableness in the reparation of extrapatrimonial damages
Revista dos Tribunais | vol. 1054/2023 | p. 19 - 36 | Ago / 2023
DTR\2023\7605

Thiago do Amaral Santos


Doutorando e Mestre em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC-SP. Professor de direito dos contratos nos cursos pós-graduação latu sensu da Fundação
Getulio Vargas – FGVLAW e do Instituto de Ensino e Pesquisa – INSPER. Advogado.
tsantos@btlaw.com.br

Área do Direito: Civil; Processual


Resumo: O presente artigo pretende analisar os paradigmas atuais da responsabilidade civil, diante
do reconhecimento de novas categorias de danos que devem ser tutelados, na busca da aplicação
da responsabilidade integral. Serão apresentadas discussões jurídicas relevantes sobre alguns tipos
de danos extrapatrimoniais atualmente considerados, como o dano estético, o dano existencial e a
perda de uma chance. Busca-se, assim, inclusive mediante a análise das decisões do Superior
Tribunal de Justiça, investigar se a aplicação das indenizações, no atual contexto social, está
norteada pelo critério da razoabilidade.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil – Dano Estético – Dano Existencial – Perda de uma


Chance – Razoabilidade
Abstract: This paper intends to analyze the current paradigms of civil liability, in light of the
recognition of new categories of damage that must be protected, in the search for the application of
full liability. Relevant legal discussions will be presented on some types of extrapatrimonial damage
currently considered, such as aesthetic damage, existential damage and loss of a chance. The aim is
to investigate whether the application of compensation, in the current social context, is guided by the
criterion of reasonableness, including through the analysis of the decisions of the Superior Court of
Justice.

Keywords: Civil Liability – Aesthetic Damage – Existential Damage – Loss of a Chance –


Reasonableness
Para citar este artigo: Santos, Thiago do Amaral . A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais. Revista dos Tribunais. vol. 1054. ano 112. p. 19-36. São Paulo: Ed. RT, agosto
2023. Disponível em: inserir link consultado. Acesso em: DD.MM.AAAA.

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Sumário:

1. Introdução - 2. Paradigmas atuais da responsabilidade civil - 3. Danos extrapatrimoniais - 4.


Conclusão - 5. Referências bibliográficas

1. Introdução

De acordo com o raciovitalismo, o homem interage com a natureza circundante e, por consequência,
os fatos da vida humana devem ser compreendidos em razão dos fins e dos valores decorrentes da
convivência social.

Por consequência, a norma jurídica “não pode ser uma norma abstrata de moral, de ética, desligada
dos fatos concretos”, pois se trata de “um enunciado para a solução de um problema humano”, que
se aplica “como um meio para a consecução de valores concretos, tais como o bem-estar social, a
dignidade, a liberdade e a igualdade”, com a finalidade de permitir a realização da justiça1.

Diante da lógica do razoável, a interpretação e aplicação da norma devem levar em consideração os


valores sociais, de acordo com determinado momento histórico.

No campo da responsabilidade civil não é diferente, posto que, conforme salienta Georges Ripert, a
evolução do instituto tornou “a regra civil tão perfeita como a regra moral, em sancionar tão
completamente quanto possível o dever de não prejudicar os outros”2.
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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

objetivo Neste artigo propomos a investigação sobre a razoabilidade que deve nortear a fixação do quantum
indenizatório, diante do reconhecimento de novas categorias de danos extrapatrimoniais.

Para a análise do tema, primeiramente apresentamos a posição da doutrina sobre os aspectos atuais
que norteiam a responsabilidade civil, diante do reconhecimento da necessidade de reparação
integral do dano.

A fim de delimitar o problema a ser investigado, passamos à análise dos danos extrapatrimoniais e
de suas diferentes categorias, mediante o estudo das questões jurídicas relevantes sobre o dano
estético, o dano existencial e a perda de uma chance.

Também será apresentado o posicionamento da jurisprudência atual, por meio da análise de


algumas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, no intuito de se identificar o valor das
indenizações aplicadas até o momento3.

Por fim, será apresentada a conclusão decorrente da aplicação da teoria raciovitalista do direito, com
a finalidade de verificar se as indenizações decorrentes destes novos tipos de danos se encontram
pautadas no critério de razoabilidade.

Entendemos que o tema a ser enfrentado possui relevância teoria, por se tratar de assunto ainda não
suficientemente explorado na doutrina e jurisprudência, e grande repercussão prática para aqueles
que se interessam pelo estudo dos aspectos contemporâneos do instituto da responsabilidade civil.

2. Paradigmas atuais da responsabilidade civil

No Brasil, após a edição da Constituição Federal de 1988, os tradicionais filtros da responsabilidade


aquiliana – pautada na conduta por dolo ou culpa, no dano material e moral, e no nexo de
causalidade direto e imediato – ganharam novos contornos em razão do paradigma solidarista
fundado na dignidade da pessoa humana, fazendo com que a preocupação passasse para a
reparação da vítima, e não mais na condenação do culpado.

Com o advento do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil de 2002, houve a positivação
da responsabilidade objetiva, cuja finalidade é de proteger a vítima e solucionar o problema da
necessidade de comprovação da culpa do causador do dano4.

A responsabilidade objetiva, além de algumas hipóteses específicas existentes em nosso


ordenamento jurídico5, também se baseia na teoria do risco, pela qual “toda pessoa que exerce
alguma atividade cria um risco de dano para terceiros”, devendo repará-lo “ainda que sua conduta
seja isenta de culpa”6.

De um lado, há a responsabilidade objetiva típica ou fechada, as quais são expressamente definidas


em lei; e, de outro, uma disposição genérica e aberta fundada no risco da atividade (conforme o
parágrafo único do artigo 927 do Código Civil (LGL\2002\400)7).

A responsabilidade objetiva prescinde de culpa, pois se satisfaz apenas com o nexo de causalidade
e o dano, impondo a inversão do ônus da prova aquele que praticou a conduta.

Verifica-se, assim, que a teoria da culpa passou para um novo patamar, “para amoldá-la às novas
tendências do próprio modelo ‘civil-constitucional’ da responsabilidade, calcada na ‘solidariedade
social’, na ‘dignidade da pessoa humana’.”8

Por sua vez, o nexo de causalidade, apesar de ser positivado no artigo 403 do Código Civil
(LGL\2002\400)9 por meio causalidade direta e imediata (ou seja, que considera apenas o evento
diretamente relacionado ao dano), foi flexibilizado pela doutrina e jurisprudência diante de seu
caráter restritivo, que passaram a aplicar a subteoria da necessariedade10 para admitir o
ressarcimento de danos indiretos, isto é, aqueles causados aos parentes da vítima11 .

Ainda, houve a relativização das excludentes de responsabilidade, com a aplicação do conceito de


fortuito interno12 – pelo qual haverá a responsabilidade por determinados eventos abrangidos pelo
risco da atividade13 – e pela flexibilização da culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.

Quanto aos danos passíveis de reparação, durante muito tempo nosso ordenamento jurídico se
limitou à admissão de danos materiais, subdividindo-os em dano emergente (consistente na perda
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efetivamente experimentada) e nos lucros cessantes (em razão da probabilidade objetiva de ganho;
o que se deixou de lucrar), conforme prescreve o artigo 402 do Código Civil (LGL\2002\400)14 . Após
a atual Constituição Federal, o dano moral passou a ser amplamente admitido (artigo 5º, X15 ),
inclusive em razão de sua positivação na legislação infraconstitucional.

No entanto, diante da evolução social, o comportamento dos indivíduos fez surgir novas formas de
danos que não se enquadravam na classificação tradicional.

Em determinadas situações, o dano não podia ser classificado como material, pois inexistiam perdas
materiais efetivas (como ocorre com o dano emergente), ou não havia condições de se comprovar as
perdas futuras (uma vez que os lucros cessantes não podem ser aleatórios ou presumidos).
Ademais, a caracterização do dano moral e a fixação do quantum indenizatório sempre se mostram
tormentosas.

Inexistindo critérios normativos específicos para que se pudesse mensurar determinadas espécies
de danos, o dano moral passou a ser aplicado de forma sui generis, como um “conceito-passaporte”
que permite “ao juiz ajustar e reajustar as soluções conforme entenda necessário, oportuno, ou
conveniente, inclusive de forma divorciada do ordenamento legal”16 .

No mesmo sentido, como observa Carlos Giovani Pinto Portugal, “parece que o direito brasileiro
adotar a categoria dos danos morais, em sentido largo, como suficientemente precisa para
considerar as mais variadas espécies danos extrapatrimoniais sofríveis pela pessoa humana.”17

Porém, esse critério, além da ausência de rigor técnico, dava margem para a fixação de
indenizações em patamares módicos e não condizentes com a gravidade do dano, notadamente em
razão dos valores usualmente arbitrados pelos Tribunais na intenção de coibir a denominada
indústria do dano moral (que buscam evitar a indenização em quantia desproporcional à ofensa).

Surge, assim, a necessidade de reconhecimento de outras categorias de danos, para que, em


prestígio à dignidade da pessoa humana e aos novos valores sociais, o indivíduo possa obter
reparação justa e condizente com a gravidade da ofensa.

Com efeito, o Brasil possui um sistema jurídico aberto, que utiliza de uma cláusula geral de
responsabilidade civil (prevista nos artigos 18618 , 18719 , 402 e 927, caput20 , do Código Civil
(LGL\2002\400)), sem que haja a taxatividade quanto aos bens jurídicos tutelados. Há, portanto,
liberdade para a flexibilização das normas existentes, com a possibilidade de reconhecimento de
novas categorias de danos no âmbito extrapatrimonial.

Os atuais paradigmas da responsabilidade civil decorrem do reconhecimento das mudanças sociais,


econômicas e políticas, posto que o julgador não deve, diante da complexidade das questões
surgidas na atualidade, se limitar a mera subsunção do fato à norma, em um procedimento
estritamente lógico, dedutível e cartesiano21 .

Assim sendo, a definição do dano passa a ser mais ampla, como lesão a um interesse tutelado,
sendo que, quando o lesado necessita da tutela em abstrato, torna possível a criação de novas
modalidades de dano passíveis de reparação22 .

Esta é a solução propagada pelo raciovitalismo, pois, quando prega que o Direito deve se pautar no
indivíduo, em suas liberdades fundamentais e na dignidade da pessoa humana, não pode excluir
uma nova modalidade de dano surgida em razão do contexto social.

A criação de novas categorias de danos permite que o lesado por danos relevantes possa ser
compensado de acordo com a extensão da gravidade, abandonando-se a necessidade
de comprovação dos danos materiais ou a generalização dos danos morais.

Outrossim, a admissão de outros danos prestigia o princípio da reparação integral, porquanto todo o
dano deve ser reparado (na debeatur) em sua integralidade (quantum debeatur), de modo que “o
ofendido deve ter reposto o seu estado anterior ao dano injusto, arcando o ofensor com tudo o que
for necessário para esse desiderato”23 .

Desse modo, tendo em vista a necessidade de reparação da violação de todos os bens jurídicos
tutelados pelo Direito, mostra-se necessária a admissão de novas categorias de danos, além
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daquelas tradicionalmente reconhecidas.

3. Danos extrapatrimoniais

O dano extrapatrimonial é aquele que difere do material, por não corresponder à composição de
perdas financeiras. Ele visa tutelar os direitos de personalidade; como vida, saúde, integridade física,
imagem, entre outros inerentes à dignidade da pessoa humana.

As categorias24 de danos extrapatrimoniais, além do dano moral, não encontram consenso na


doutrina e jurisprudência, que empregam nomenclaturas distintas para os mesmos tipos de danos25 .

Considerando que o sistema jurídico brasileiro é aberto e sensível à evolução dos tempos, cedendo
lugar a formas mais abertas de compreensão jurídica26 , o aplicador do direito não pode ignorar a
realidade social e deixar de tutelar a integralidade dos danos causados, independentemente de sua
natureza.

Assim, na busca de uma reparação justa e adequada, ao invés de “simplesmente analisar


expressões amplas que dificultam o real entendimento do evento danoso”, foi “preciso construir
subcategorias ou subdivisões” para que haja a correta aplicação da responsabilidade integral do
dano27 .

De toda feita, partindo-se do gênero de dano extrapatrimonial, a doutrina e a jurisprudência


reconhecem o dano estético e o dano existencial, aos quais não se confundem com o dano moral,
haja vista se tratar de indenizações de natureza distinta, sendo, inclusive, passíveis de cumulação.
Há, ainda, a perda de uma chance, como o “dano material futuro”, como aquele “que será gerado no
futuro, como consequência da prolongação do estado atual das coisas ou de seu agravamento”28 .

3.1. Dano estético

O dano estético tutela a honra, imagem e integridade física do indivíduo, como direitos da
personalidade derivados da dignidade da pessoa humana.

No tradicional conceito de Tereza Ancona Lopez, é definido como “qualquer modificação duradoura
ou permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação esta que lhe acarreta um
‘enfeamento’ e lhe cause humilhações e desgostos, dando origem, portanto a uma dor moral.”29

Essa definição, contudo, deve ser complementada, posto que não é apenas a beleza física que é
tutelada. De acordo com Maria Helena Diniz, deve ser considerada “toda a alteração morfológica do
indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos”, tais
como mutilações, cicatrizes e feridas, que tenham ou não influência sobre a capacidade laborativa da
vítima30 .

Logo, o dano estético não se limita à aparência externa, também podendo ocorrer no caso de
alterações físicas em partes não visíveis do corpo31 .

Outrossim, tendo em vista que o dano estético causa inegável sofrimento ao lesado, também enseja
em reparação decorrente do abalo moral; tendo o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula
387, consolidado o entendimento de que “é lícita a cumulação dos danos moral e estético”.

Há quem entenda pela inexistência de autonomia dos danos estéticos, por entender que eles
integram o dano moral32 .

No entanto, entendemos que a possibilidade de cumulação dos danos ressalta a ideia da autonomia
do dano estético, de modo que existem dois direitos distintos a serem tutelados em razão do mesmo
evento: o dano moral decorrente do abalo psicológico e o dano estético em razão da ofensa à
integridade física do ofendido.

Ademais, essa dupla reparação em nada afetará a possibilidade de ressarcimento dos danos
materiais, tanto por danos emergentes (despesas com tratamento médico, por exemplo), quanto por
lucros cessantes (como pode ocorrer com a perda da capacidade laborativa).

Numa breve pesquisa na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que, apesar dos
óbices processuais para revisão do quantum indenizatório, o valor das indenizações, além dos danos
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materiais, tem sido arbitrado:

(a) para o caso de pessoa que ficou paraplégica em razão de disparo com arma de fogo, em
R$ 150.000,00 para os danos morais e R$ 200.000,00 para os danos estéticos33 ;

(b) em lesão grave causada no rosto de menor pela queda de ferramenta, em R$ 120.000,00 para os
danos morais e o mesmo valor para danos estéticos34 ; e

(c) em atropelamento por caminhão que resultou em amputação da perna, em R$ 50.000,00 para
cada espécie de dano (estético e morais)35 ; e

(d) em situação em que houve a amputação do braço em virtude da má prestação do serviço de


saúde, em R$ 100.000,00 por dano estético e R$ 50.000,00 a título de danos morais36 .

Diante da análise dos julgados acima indicados, verifica-se que não há patamares bem definidos
para a fixação do dano estético, havendo variação de valores mesmo em casos de lesões graves.

3.2. Dano existencial

O dano existencial igualmente tutela a dignidade da pessoa humana, servindo de instrumento para
coibir a transgressão dos direitos sociais, diante da ruptura de seu projeto de vida.

Essa categoria de dano surgiu na Itália, quando os juristas se dedicaram a analisar formas para
assegurar que lesões corporais e psíquicas pudessem ser compensadas como um dano imaterial,
apesar de a legislação restringir a aplicação da reparação apenas para lesões decorrentes de ações
penais. Por consequência, surgiu a indenização por dano biológico, que se diferencia do dano moral
subjetivo, diante dos danos à saúde do indivíduo. Em seguida, houve o reconhecimento do dano
existencial pela Suprema Corte Italiana, baseada na tutela da pessoa prevista na constituição
italiana, para condenar um pai pelo abandono de seu filho, enquanto deixou de prover seu sustento
por determinado período37 .

Trata-se do mesmo caminho seguido no Brasil, onde a jurisprudência se encarregou de ampliar a


noção genérica de dano moral e passou a adotar o conceito de dano extrapatrimonial para
reconhecer a existência de um dano autônomo38 .

O dano existencial pode ser entendido como uma lesão ao projeto de vida da pessoa, diante da
mudança de seus hábitos cotidianos em razão da lesão. Como indica Flaviana Rampazzo Soares,
consiste numa ofensa “negativa, total ou parcial, permanente ou temporária”, com relação a uma ou
mais atividades que “a vítima do dano, normalmente, tinha incorporado ao seu cotidiano, e que, em
razão do efeito lesivo, precisou modificar em sua forma de realização, ou mesmo suprimir da sua
rotina”39 .

A alteração nos hábitos da vítima enseja na “mudança no rumo da vida e perda de sua qualidade”,
diante do “sofrimento na prática de atos desagradáveis que antes inexistiam, tais como cirurgias,
reabilitações, internações etc.”40 .

Também há reflexos no direito do trabalho, em razão da jornada de trabalho excessiva41 ou da


ausência de férias por longo período42 ; posto que também ensejam na frustração do projeto de vida.

Não se trata, pois, de um dano corriqueiro, mas que pressupõe três ocorrências: (i) a frustração total
do projeto de vida, acarretando num vazio existencial à vítima; (ii) um dano que impossibilite o
prosseguimento do projeto de vida por completo; e (iii) um retardamento dos planos de vida, com o
diferimento de sua concretização43 .

Oportuno consignar, ademais, que o dano existencial se difere do dano estético, porquanto a ruptura
do projeto de vida pode ocorrer sem que haja a ofensa à integridade física; do mesmo modo que um
dano estético existe – geralmente nos casos de menor gravidade –, sem a alteração no rumo da vida
do indivíduo.

Desse modo, reconhecendo as diferentes categorias do gênero de dano extrapatrimonial, nada


impede que o dano estético e o dano existencial sejam cumulados em razão de uma única lesão (e
sem prejuízo da indenização por danos materiais e morais44 , como exposto anteriormente).

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Ao analisar os julgados do Superior Tribunal de Justiça sobre dano existencial, verificou-se situações
em que:

a) não se reconheceu a indenização para pessoa presa durante o regime militar, e que sofreu tortura
e maus-tratos45 ; e

b) manter a indenização em favor de servidor público que acumulou mais de 7.000 horas extras em
sua jornada de trabalho46 .

Pelo que se depreende dos acórdãos consultados, ainda há poucos casos que discutem a existência
de dano existencial, apesar de a doutrina reconhecer a autonomia dessa categoria de dano e de sua
importância no campo da responsabilidade civil.

3.3. Perda de uma chance

A perda de uma chance é outra categoria de dano indenizável que surge em razão da necessidade
de se garantir a reparação integral do lesado pelos danos causados, notadamente nos casos em que
há dificuldade de se demonstrar o nexo de causalidade entre a conduta e o dano.

A teoria surgiu na França, em 1889, quando foi conferida indenização a um indivíduo diante da
atuação culposa de um oficial ministerial que, por negligência, impediu o trâmite regular do processo
47
.

Após, passou a ser admitida em outros países da Europa, tendo sido aplicada: (i) na Itália para
situações relacionadas com direito do trabalho (para indenizar candidatos que foram impedidos por
uma empresa de concluir o processo seletivo): (ii) na Espanha, para alguns casos em que havia
dificuldade na comprovação do nexo causal para a responsabilização de profissionais liberais; (iii) na
Inglaterra, num caso em que uma mulher perdeu a possibilidade de participar da entrevista final num
concurso de beleza, por não ter sido notificada; e (iv) em Portugal, numa demanda que discutia a
responsabilidade do advogado pela interposição de um recurso deserto48 .

Ela pode ser definida como “a possibilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda” em
razão de determinada conduta ilícita49 .

Trata-se, assim, de um dano causado pela frustração decorrente da perda de uma vantagem, ainda
que esta vantagem seja incerta ou aleatória (mas com probabilidade real de que pudesse ocorrer),
pois “o que é indenizado é justamente a chance de não alcançar determinado resultado, ou de auferir
certo benefício, chance que foi perdida pela vítima em razão de ato culposo do lesante”50 .

Ou seja, havia chance de o indivíduo obter ganho ou mitigar um prejuízo, mas esta chance foi
interrompida em razão de um ato ilícito, frustrando a expectativa do ofendido.

No que tange à sua natureza jurídica, esta espécie de dano não pode ser considerada como dano
emergente, pois não houve uma perda patrimonial que possa ser valorada, mas apenas a frustração
de que a vantagem pudesse ser auferida. Também não se confunde como o lucro cessante, em que
não se admite o ressarcimento de danos hipotéticos, sendo necessário, neste caso, a comprovação
do resultado. Ainda, não pode ser entendida com o dano moral, pelo qual se tutela a violação dos
direitos de personalidade.

A perda de uma chance deve ser entendida como uma categoria autônoma, no qual o dano decorre
da perda da oportunidade de auferir uma vantagem ou de evitar um prejuízo em razão de um evento
futuro. E, seus reflexos podem ser tanto patrimoniais como extrapatrimoniais.

No entanto, para que seja indenizável, as chances devem ser sérias e reais, não apenas “uma
simples esperança subjetiva” 51 , caracterizada como uma chance meramente hipotética, sem que
haja reais condições de se auferir a vantagem ou reduzir um prejuízo.

Como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, a “teoria da perda de uma chance não se presta a
reparar danos fantasiosos, não servindo ao acolhimento de meras expectativas, que pertencem tão
somente ao campo do íntimo desejo”, mas apenas quando existe um “dano concreto (perda de
probabilidade)”, quando for “constatada a privação real e séria de chances, quando detectado que,
sem a conduta do réu, a vítima teria obtido o resultado desejado”52 .
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Para Sergio Savi, apenas será considerada como chance séria e real aquela em que se puder
comprovar a probabilidade de pelo menos 50% de obtenção do resultado esperado53 . Contudo, não
nos parece correta a necessidade de quantificação da probabilidade, diante da dificuldade de realizar
esta mensuração e para que não sejam cometidas injustiças com relação aos casos em que havia
consideráveis chances de se obter o resultado, mesmo que em menor proporção.

A constatação de que se determinada chance é séria e real deve ser feita casuisticamente, diante da
aplicação do princípio da razoabilidade, não se podendo estabelecer uma regra geral para tanto.

Ademais, é necessária a demonstração do nexo causal, tal como ocorre nas demais hipóteses de
responsabilidade civil, mesmo que, nesse caso, haja a constatação de uma causalidade parcial entre
a conduta e o dano.

No que tange à quantificação do dano, diante da impossibilidade de reestabelecimento do status quo


ou de uma reparação equivalente ao dano sofrido, deverá haver uma indenização de natureza
indenizatória, em valor a ser definido em cada caso concreto.

O quantum indenizatório deve ser inferior ao valor integral da vantagem que poderia ser auferida,
diante da incerteza quanto à obtenção desta vantagem, mas o dano final “será o grande referencial
para a quantificação das chances perdidas”54 .

Portanto, o valor da indenização deve ser equivalente ao percentual de se obter a vantagem, ou seja,
o “grau de probabilidade, que havia de ser alcançada a vantagem que era esperada, ou
inversamente, o grau de probabilidade de o prejuízo ser evitado”55 .

O Superior Tribunal de Justiça já analisou alguns casos sobre a perda de uma chance, tendo
decidido:

a) num caso em que o participante de um reality show televisivo foi indevidamente eliminado por erro
na contagem dos pontos, pela indenização em danos materiais no valor de R$ 125.000,00
(considerando que ele teria 25% de chance de ser vitorioso na competição e receber o prêmio de
R$ 500.000,00, uma vez que ele foi desclassificado na semifinal), além de danos morais no valor de
R$ 25.000,0056 ;

b) em ação proposta por estudante de curso superior, em que houve a extinção do turno matutino,
pela inexistência de danos a serem indenizados, uma vez que a universidade não estava obrigada a
manter curso com apenas um aluno57 ;

c) pelo descabimento de indenização por danos materiais no caso em que uma aluna teve negado o
pedido de renovação da matrícula, por entender que era incerta a possibilidade de obtenção de
emprego remunerado logo após a conclusão do curso58 ;

d) em demanda proposta contra advogado que interpôs recurso especial intempestivo, pela
inexistência de dano, uma vez que o recurso estava fadado ao insucesso e inexistia chances reais
de provimento59 ; e

e) em caso em que houve a venda de ações em bolsa de valores sem autorização do titular, pela
indenização a ser apurada de acordo com a diferença entre o valor obtido na venda indevida e a
média da cotação nos dois dias subsequentes, observando o perfil de investimento do autor60 .

4. Conclusão

A norma jurídica pode ser interpretada de diversas formas. Para a teoria Kantiana o Direito deve ser
separado da Moral, pautado no racionalismo lógico dedutivo. Contrariamente, Del Vecchio sustenta
que tanto a Moral quanto o Direito consistem no princípio ético que regula a conduta humana. Já,
para o Empirismo, basta o silogismo dedutivo para a aplicação da lei.

Entre as diversas concepções hermenêuticas, a teoria raciovitalista avançou ao postular que o


homem sobre influência de diversos fatores culturais, históricos e religiosos, de modo que a
interpretação da lei deve considerar tais fatores para a consecução dos valores vitais de justiça,
bem-estar, dignidade, liberdade e igualdade.

Assim, o intérprete deve se pautar na lógica do razoável para a aplicação do Direito, não podendo
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ignorar a existência dos valores sociais pautados na dignidade da pessoa humana.

A evolução da responsabilidade civil acompanhou esse pensamento, abandonando a autotutela,


para estabelecer a sanção econômica do ofensor com a finalidade de reparar economicamente o
ofendido. Buscou, desse modo, estabelecer um conceito de reparação justa, de forma proporcional à
ofensa.

No Brasil, o instituto, que inicialmente se pautava exclusivamente na culpa, evoluiu para prever a
responsabilidade objetiva pautada na teoria do risco. E, a função meramente compensatória deu
lugar à função punitiva (prestigiando a reparação integral do lesado) e à função precaucional
(revelando o fundamento pedagógico da sanção).

Os novos paradigmas da responsabilidade civil eliminaram os filtros tradicionais, fazendo com que a
reparação do dano passasse a ser e principal preocupação dos operadores do direito, em prestígio
da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais.

Assim, diante da necessidade de se tutelar novos danos emanados do contexto social, houve a
interpretação de uma norma aberta, possibilitando à doutrina e à jurisprudência reconhecer outras
categorias de danos (estético, existencial e perda da chance), além daquelas já existentes (material
e moral), como forma de aplicar indenizações mais justas, proporcionais à gravidade da ofensa.

Portanto, verifica-se que a razoabilidade, na forma prescrita pelo raciovitalismo jurídico, também se
aplica ao instituto da responsabilidade civil, no ponto em que considera as circunstâncias fáticas e
jurídicas envolvidas, para, diante da necessidade de reparação integral, reconhecer novas espécies
ou categorias de danos extrapatrimoniais, com a finalidade buscar uma indenização justa àquele que
foi ofendido.

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SOARES, Ricardo Maurício Freire. Hermenêutica e interpretação jurídica. São Paulo: Saraiva, 2013,
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STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 10. ed. São Paulo: Ed. RT,
2015.

1 .SOARES, Ricardo Maurício Freire. Hermenêutica e interpretação jurídica. São Paulo: Saraiva,
2013. p. 75.

2 .RIPERT, Georges. A regra moral nas obrigações civis. Trad. Osório de Oliveira. Campinas:
Bookseller, 2000. p. 236.

3 .Diante dos limites necessários para elaboração deste artigo, a pesquisa se limitou à jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça, mediante a análise de decisões consideradas relevantes e atuais,
sem a utilização de critérios qualitativos ou quantitativos. A busca foi realizada, nas ementas, das
expressões “dano estético”, “dano existencial” e “perda de uma chance”.

4 .STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 10. ed. São Paulo: Ed.
RT, 2015. p. 237.

5 .Entre outras disposições legais, pode-se citar: a responsabilidade do operador de instalação


nuclear existente na Lei 6.453/77 (LGL\1977\7); a responsabilidade do dono do prédio prevista nos
artigos 937 e 938 do Código Civil (LGL\2002\400); a responsabilidade do pais, tutores, curadores e
empregadores disciplinada no artigo 933 do mesmo Código; a responsabilidade do Estado
estabelecida no artigo 37, § 6º da Constituição Federal; e a responsabilidade do fornecedor de
produtos ou serviços existente no Código de Defesa do Consumidor.

6 .GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11.
p. 29.

7 .Art. 927 (...)


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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar,
por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

8 .MELO, Diogo L. Machado de. Culpa extracontratual. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 48.

9 .Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os
prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na
lei processual.

10 .SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Atlas,
2009. p. 58-60.

11 .Entre outras situações, o dano indireto ocorre pela morte da vítima, em que os “parentes, cônjuge
e amigos do falecido é que padecem de dano moral” (SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral
indenizável. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2003. p. 218).

12 .Conforme a lição de Agostinho Alvim, há no “caso fortuito um impedimento relacionado com a


pessoa do devedor ou com sua empresa”, de modo que se a responsabilidade for decorrente do
risco da atividade, haverá o fortuito interno, com o consequente dever de indenizar (ALVIM,
Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.
p. 330).

13 .Nesse sentido, reza o Enunciado 443 da V Jornada de Direito Civil: “Arts. 393 e 927: O caso
fortuito e a força maior somente serão considerados como excludentes da responsabilidade civil
quando o fato gerador do dano não for conexo à atividade desenvolvida”.

14 .Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao
credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

15 .Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o
direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

16 .MARTINS-COSTA, Judith. Dano moral à brasileira. Revista do Instituto do Direito Brasileiro,


Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, ano 3, 9, 2014. p. 7077.

17 .PORTUGAL, Carlos Giovani Pinto. Responsabilidade civil por dano ao projeto de vida: direito civil
contemporâneo e os danos imateriais. Curitiba: Juruá, 2016. p. 135.

18 .Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

19 .Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes.

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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

20 .Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.

21 .DONNINI, Rogério. Responsabilidade civil na pós-modernidade. Porto Alegre: Sérgio Antônio


Fabris Editor, 2015. p. 36-37.

22 .SCHREIBER, Anderson. Op. cit., p. 105.

23 .CATUZZO JUNIOR, Dante. O direito à felicidade como norteador da responsabilidade civil na


sociedade do século XXI. In: DONNINI, Rogério (Coord.). ZANETTI, Andrea Cristina (Org.). Risco,
dano e responsabilidade civil. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 98.

24 .Rogério Donnini entende que não se trata de categorias de danos extrapatrimoniais, “mas de
expressões linguísticas utilizadas com síntese descritiva dos vários aspectos que pode assumir a
categoria de dano não patrimonial” (DONNINI, Rogério. Op. cit., p. 101).

25 .Nesse aspecto, Anderson Schreiber pondera que: “Não é, de fato, animadora a anárquica
variedade de entendimentos e interpretações que permeiam o tratamento judicial do instituto,
gerando, não raro, soluções díspares para hipóteses idênticas. Ao contrário das regras estáveis e
seguras que viriam sugeridas pela importância e utilidade da responsabilidade civil, o que se tem é
um terreno movediço, caracterizado pela incerteza e pela mutabilidade” (SCHREIBER, Anderson.
Op. cit., p. 3).

26 .REALE, Miguel. Estudos de Filosofia e Ciência do Direito. São Paulo: Saraiva, 1978. p. 78.

27 .DAUD, Fuad José. Restitutio in integrum nos danos materiais: dano moral subjetivo, dano
biológico e dano existencial. In: DONNINI, Rogério (Coord.). ZANETTI, Andrea Cristina (Org.). Risco,
dano e responsabilidade civil. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 175.

28 .SANTOS, Antonio Jeová. Op. cit., p. 106.

29 .LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2004.
p. 46.

30 .DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, 26. ed., São Paulo:
Saraiva, 2012. p. 98.

31 .É o que entende o Superior Tribunal de Justiça: “As sequelas físicas decorrentes do ato ilícito,
mesmo que não sejam visíveis de ordinário e, por isso, não causem repercussão negativa na
aparência da vítima, certamente provocam intenso sofrimento. Desta forma, as lesões não precisam
estar expostas a terceiros para que sejam indenizáveis, pois o que se considera para os danos
estéticos é a degradação da integridade física da vítima, decorrente do ato ilícito”
(REsp 899.869/MG, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., DJ 26.03.2007).

32 .SANTOS, Antonio Jeová. Op. cit., p. 346.

33 .“Administrativo e processual civil. Agravo interno nos embargos de declaração no recurso


especial. Revisão do valor da indenização. Impossibilidade. Valor fixado em observância aos
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

1. O Tribunal de origem fixou o valor da indenização do dano moral e dos danos estéticos sofridos
pelo autor – que ficou paraplégico em virtude de ato de presidiário (que cumpria pena em regime
semiaberto e foi liberado sem autorização judicial) que desferiu tiros em um recinto na cidade de
Catolé da Rocha/PB atingindo o agravado – no montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) e
R$ 100.000,00 (cem mil reais), respectivamente.

2. Esta Corte Superior entende que a revisão do valor da indenização somente é possível em casos
excepcionais, quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada em flagrante violação dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que se verifica na presente hipótese.

3. Na esteira da jurisprudência desta Corte e considerando a situação no caso concreto, o valor da


condenação a título de danos morais e danos estéticos foi majorado para R$ 150.000,00 (cento e
cinquenta mil reais) e R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), em atendimento aos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade. (...)

4. Agravo interno a que se nega provimento” (STJ, REsp 1.641.086/PB, rel. Min. OG Fernandes, DJe
05.04.2017).

34 .“agravo interno no agravo em recurso especial. Responsabilidade civil objetiva. 1. Revisão do


quantum Fixado na decisão agravada para danos morais e estéticos. Não acolhimento. Valores que
foram reduzidos a fim de se adequarem aos patamares de razoabilidade e proporcionalidade desta
corte. 2. Agravo interno improvido.
1. Analisando os valores fixados na origem tanto para os danos morais como para os danos
estéticos, ficou constatada a exorbitância do quantum indenizatório, razão pela qual, após afastada a
aplicabilidade da Súmula 7/STJ, o montante foi reduzido de R$ 248.800,00 (duzentos e quarenta e
oito mil e oitocentos reais) para R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) para cada dano, a fim de se
adequar aos patamares de razoabilidade e proporcionalidade desta Corte.

2. Agravo interno improvido” (STJ, AgInt no AREsp 704.466/RJ, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
3ª T., DJe 27.03.2018).

35 .“Agravo interno no recurso especial. Ação de indenização. Atropelamento por caminhão a serviço
de empresa prestadora de serviço público. Responsabilidade objetiva. Culpa exclusiva da vítima não
demonstrada. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Amputação do membro inferior
esquerdo. Danos estéticos. Majoração. Decisão mantida. Recurso desprovido.
1. O Tribunal de origem examinou motivadamente a suposta culpa exclusiva da vítima, bem como a
responsabilidade objetiva da agravante, expondo com clareza os fundamentos pelos quais entendeu
descaracterizada a causa excludente da responsabilidade objetiva.

2. A responsabilidade objetiva da ré, na qualidade de prestadora de serviço público, só poderia ser


elidida pela comprovação da culpa exclusiva da vítima, o que não ocorreu.

3. A reforma do acórdão recorrido demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo


fático-probatório dos autos, providência vedada na instância especial, a teor da Súmula 7 desta
Corte.

4. Registra-se que ‘a errônea valoração da prova que enseja a incursão desta Corte na questão é a
de direito, ou seja, quando decorre de má aplicação de regra ou princípio no campo probatório e não
para que se colham novas conclusões sobre os elementos informativos do processo’ (AgInt no
AREsp 970.049/RO, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., j. 04.05.2017, DJe 09.05.2017).

5. É pacífico o entendimento desta Corte de que o valor fixado a título de indenização por danos
estéticos e danos morais estabelecido pelas instâncias ordinárias pode ser revisto nas hipóteses em
que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade.

6. No caso, o valor fixado a título de danos estéticos em R$ 10.000, 00 (dez mil reais) foi majorado
para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), tendo em vista que o autor sofreu, em razão do
atropelamento, danos físicos que resultaram na amputação de sua perna esquerda, submetendo-o a
dores físicas e traumas psicológicos, com intenso sofrimento durante toda sua vida.

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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

7. Agravo interno não provido” (STJ, AgInt no REsp 1.406.744/RJ, rel. Min. Lázaro Guimarães, 4ª T.,
DJe 16.03.2018.

36 .“Administrativo. Responsabilidade civil. Indenização. Dano moral e estético. Amputação de


membro superior. Quantum não desproporcional. Súmula 7/STJ.
1. Trata-se, na origem, de ação de indenização por responsabilidade civil com pedido de danos
morais e estéticos decorrentes de omissão da prestação de serviço público de assistência à saúde,
que resultou na amputação do membro superior esquerdo da autora.

2. A revisão dos valores fixados na instância ordinária a título de danos morais (R$ 50.000,00) e
estéticos (R$ 100.000,00) só é admitida quando irrisórios ou exorbitantes (precedentes do STJ), o
que não se afigura no caso dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ.

3. Agravo Regimental não provido” (STJ, AgRg no AREsp 197.285/SE, rel. Min. Herman Benjamin,
2ª T., DJe 24.09.2012).

37 .SOARES, Flaviana Rampazzo. Do caminho percorrido pelo dano existencial para ser
reconhecido como espécie autônoma do gênero: danos imateriais. In: Revista da AJURIS, v. 39,
p. 199-204, n. 127, set. 2012.

38 .A necessidade de reconhecimento como dano autônomo é ressaltada por Carlos Giovani Pinto
Portugal em sua monografia sobre o tema: “A adoção do dano ao projeto de vida como dano
antônomo em relação ao genérico ‘dano moral’ indica uma necessária reconstrução do pensamento
jurídico dominante no Direito de Danos. Impõe-se, também, uma compreensão de uma sistemática
(aberta) que se importa em efetivo com a ocorrência danosa e a repercussão negativa dela na esfera
integral do sujeito lesado” (PORTUGAL, Carlos Giovani Pinto. Op. cit., p. 143).

39 .SOARES, Flaviana Rampazzo. Op. cit., p. 44.

40 .DONNINI, Rogério. Op. cit., p. 106.

41 .TRT/PR, 28161-2012-028-09-00-6-ACO-40650-2013, rel. Ana Carolina Zaina, 2ª T., DEJT


11.10.2013.

42 .RR 727-76.2011.5.24.0002, rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, 1ª T., DEJT 28.06.2013.

43 .PORTUGAL, Carlos Giovani Pinto. Op. cit., p. 98.

44 .Os danos existenciais se diferenciam dos impactos psicológicos cotidianos, uma que estes
“causam dor e desconforto que tendem a diminuir ao longo do tempo” (PORTUGAL, Carlos Giovani
Pinto. Op. cit., p. 101).

45 .STJ, AREsp 723.188, rel. Min. Herman Benjamin, DJe 26.06.2015.

46 .STJ, REsp 1.811.018 – RS, rel. Min. Francisco Falcão, DJe 04.10.2019.

47 .ROCHA, Nuno Santos. A “perda de chance” como uma nova espécie de dano. Coimbra:
Almedina, 2017. p. 24.

48 .ROCHA, Nuno Santos. A “perda de chance” como uma nova espécie de dano. Coimbra:
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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

Almedina, 2017. p. 25, 26 e 80.

49 .CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
p. 75.

50 .MARTINS-COSTA, Judith. Comentários ao novo código civil: do inadimplemento das obrigações.


Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 360.

51 .SILVA, Rafael Peteffi da. Responsabilidade civil pela perda de uma chance: uma análise do
direito comparado e brasileiro. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 138.

52 .STJ, REsp 1.540.153/RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 06.06.2018.

53 .SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil pela perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006. p. 85.

54 .SILVA, Rafael Peteffi da. Op. cit., p. 144.

55 .NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações,


introdução à responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 671.

56 .“Recurso especial. Responsabilidade civil. Ação de indenização por danos. Reality show. Fase
semifinal. Contagem dos pontos. Erro. Eliminação. Ato ilícito. Indenização. Dano material. Perda de
uma chance. Cabimento. Danos morais demonstrados.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de
2015 (Enunciados Administrativos 2 e 3/STJ).

2. Cinge-se a controvérsia a discutir o cabimento de indenização por perda de uma chance na


hipótese em que participante de reality show é eliminado da competição por equívoco cometido pelos
organizadores na contagem de pontos.

3. A teoria da perda de uma chance tem por objetivo reparar o dano decorrente da lesão de uma
legítima expectativa que não se concretizou porque determinado fato interrompeu o curso normal dos
eventos e impediu a realização do resultado final esperado pelo indivíduo.

4. A reparação das chances perdidas tem fundamento nos artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002
e é reforçada pelo princípio da reparação integral dos danos, consagrado no art. 944 do CC/2002
(LGL\2002\400).

5. Deve ficar demonstrado que a chance perdida é séria e real, não sendo suficiente a mera
esperança ou expectativa da ocorrência do resultado para que o dano seja indenizado.

6. Na presente hipótese, o Tribunal de origem demonstrou que ficaram configurados os requisitos


para reparação por perda de uma chance, tendo em vista (i) a comprovação de erro na contagem de
pontos na rodada semifinal da competição, o que tornou a eliminação do autor indevida, e (ii) a
violação das regras da competição que asseguravam a oportunidade de disputar rodada de
desempate.

7. O acolhimento da pretensão recursal, no sentido de afastar a indenização por danos morais ou de


reduzir o valor arbitrado, demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos (Súmula
7/STJ).

8. O montante arbitrado a título de indenização por danos morais (R$ 25.000,00 – vinte e cinco mil
reais) encontra-se em conformidade com os parâmetros adotados por esta Corte, não se mostrando
excessivo diante das particularidades do caso concreto.
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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

9. Recursos especiais não providos” (STJ, REsp 1.757.936/SP, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
3ª T., DJe 28.08.2019.

57 .“Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos materiais e
morais. Prestação de serviços educacionais. Curso superior. Alteração do horário das disciplinas.
Extinção do turno matutino. Indenização por danos materiais. Lucros cessantes. Não ocorrência.
Revisão. Impossibilidade. Incidência da súmula 7/STJ. Agravo interno não provido.
1. Embora reconhecido o direito ao ressarcimento dos valores de matrícula e mensalidades à aluna
que desistiu de curso superior devido à alteração de horário das disciplinas, o Tribunal de origem
negou o pedido de indenização por lucros cessantes, em razão da perda de uma chance, pelo
ingresso tardio no mercado de trabalho, porque existia mera possibilidade de futura contratação, não
estando caracterizada uma efetiva probabilidade de que a requerente viesse a auferir as quantias
postuladas na petição inicial, logo após a conclusão do curso.

2. No caso, rever o entendimento do acórdão recorrido quanto à não ocorrência de prejuízos


decorrentes da perda de uma chance demandaria, necessariamente, o reexame dos elementos
fático-probatórios dos autos, providência vedada no recurso especial, a teor do disposto na Súmula 7
do STJ.

3. Agravo interno a que se nega provimento” (STJ, AgInt no AREsp 593.195/SP, rel. Min. Raul
Araújo, 4ª T., DJe 13.06.2019).

58 .“agravo interno no recurso especial. Ação de indenização. Dano material e moral. Teoria da
perda de uma chance. Inaplicabilidade. Agravo não provido.
1. Hipótese em que a parte autora pleiteia indenização por danos materiais com fundamento na
perda de uma chance, sob o argumento de que a recusa da agravada em renovar sua matrícula
atrasou em um ano a conclusão do curso de enfermagem, retirando-lhe a oportunidade de obter
situação futura melhor, como conseguir um emprego e progredir no trabalho.

2. A chamada teoria da perda da chance, de inspiração francesa e citada em matéria de


responsabilidade civil, aplica-se aos casos em que o dano seja real, atual e certo, dentro de um juízo
de probabilidade, e não de mera possibilidade, porquanto o dano potencial ou incerto, no âmbito da
responsabilidade civil, em regra, não é indenizável (REsp 1.104.665/RS, Rel. Ministro Massami
Uyeda, Terceira Turma, DJe de 04.08.2009).

3. O direito à indenização, nessas circunstâncias, somente existiria diante de situação de real e séria
possibilidade de êxito, o que não é o caso dos autos, tendo em vista que o pedido, consoante
observado pelas instâncias ordinárias, está baseado em conjecturas, uma vez que o emprego da
autora, logo que saísse da faculdade, era evento futuro e incerto.

4. Agravo interno não provido” (STJ, AgInt no REsp 1.364.526/MS, rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe
05.06.2019).

59 .“Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos
morais. Perda de uma chance. Inexistência. Reexame do conjunto fático-probatório dos autos.
Inadmissibilidade. Súmula n. 7 do STJ. Decisão mantida.
1. ‘Em caso de responsabilidade de profissionais da advocacia por condutas apontadas como
negligentes, e diante do aspecto relativo à incerteza da vantagem não experimentada, as demandas
que invocam a teoria da ‘perda de uma chance’ devem ser solucionadas a partir de detida análise
acerca das reais possibilidades de êxito do postulante, eventualmente perdidas em razão da desídia
do causídico’. Assim, ‘o fato de o advogado ter perdido o prazo para contestar ou interpor recurso –
como no caso em apreço –, não enseja sua automática responsabilização civil com base na teoria da
perda de uma chance, fazendo-se absolutamente necessária a ponderação acerca da
probabilidade – que se supõe real – que a parte teria de se sagrar vitoriosa ou de ter a sua pretensão
atendida’ (REsp n. 993.936/RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 27.03.2012, DJe 23.04.2012).

2. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto
fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula n. 7 do STJ.
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A razoabilidade na reparação dos danos
extrapatrimoniais

3. No caso concreto, o Tribunal de origem examinou os elementos fáticos dos autos para concluir
que inexistiam chances concretas de êxito do recurso apresentado intempestivamente. Dessa forma,
a alteração do acórdão recorrido exigiria reexame da prova dos autos, inviável em recurso especial,
nos termos da súmula mencionada.

4. Agravo interno a que se nega provimento” (STJ, AgInt no AREsp 878.524/SP, rel. Min. Antonio
Carlos Ferreira, 4ª T., DJe 23.05.2019).

60 .“Recurso especial. Ações em bolsa de valores. Venda promovida sem autorização do titular.
Responsabilidade civil. Perda de uma chance.
Dano consistente na impossibilidade de negociação das ações com melhor valor, em momento
futuro. Indenização pela perda da oportunidade.

1. ‘A perda de uma chance é técnica decisória, criada pela jurisprudência francesa, para superar as
insuficiências da responsabilidade civil diante das lesões a interesses aleatórios. Essa técnica
trabalha com o deslocamento da reparação: a responsabilidade retira sua mira da vantagem
aleatória e, naturalmente, intangível, e elege a chance como objeto a ser reparado’ (CARNAÚBA,
Daniel Amaral. A responsabilidade civil pela perda de uma chance: a técnica na jurisprudência
francesa. In: Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 922, ago, 2012).

2. Na configuração da responsabilidade pela perda de uma chance não se vislumbrará o dano efetivo
mencionado, sequer se responsabilizará o agente causador por um dano emergente, ou por
eventuais lucros cessantes, mas por algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da
possibilidade de se buscar posição mais vantajosa, que muito provavelmente se alcançaria, não
fosse o ato ilícito praticado.

3. No lugar de reparar aquilo que teria sido (providência impossível), a reparação de chances se
volta ao passado, buscando a reposição do que foi. É nesse momento pretérito que se verifica se a
vítima possuía uma chance. É essa chance, portanto, que lhe será devolvida sob a forma de
reparação.

4. A teoria da perda de uma chance não se presta a reparar danos fantasiosos, não servindo ao
acolhimento de meras expectativas, que pertencem tão somente ao campo do íntimo desejo, cuja
indenização é vedada pelo ordenamento jurídico, mas sim um dano concreto (perda de
probabilidade). A indenização será devida, quando constatada a privação real e séria de chances,
quando detectado que, sem a conduta do réu, a vítima teria obtido o resultado desejado.

5. No caso concreto, houve venda de ações sem a autorização do titular, configurando o ato ilícito. O
dano suportado consistiu exatamente na perda da chance de obter uma vantagem, qual seja a venda
daquelas ações por melhor valor. Presente, também, o nexo de causalidade entre o ato ilícito (venda
antecipada não autorizada) e o dano (perda da chance de venda valorizada), já que a venda pelo
titular das ações, em momento futuro, por melhor preço, não pode ocorrer justamente porque os
papéis já não estavam disponíveis para serem colocados em negociação.

6. Recurso especial a que se nega provimento” (STJ, REsp 1.540.153/RS, rel. Min. Luis Felipe
Salomão, 4ª T., DJe 06.06.2018).

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