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UM CEGO VENTUROSO

João 9.1-41

Nos últimos e agitados meses do seu abençoado ministério, Jesus resolveu ir à Festa
dos Tabernáculos, em Jerusalém, com os apóstolos. Num sábado, após os serviços
do Templo, passava Ele com os companheiros junto à Fonte de Siloé (Jo 9.7), que era
uma nascente de água, provavelmente de efeitos termais minerais, saída de perto do
declive do monte de Sião.

Dessa fonte corriam dois regos que formavam, perto do Templo, dois grandes tanques
cobertos, com torres, e onde havia vários pórticos para uso de enfermos (Jo 5.1-4; Lc
13.4), que sempre aí esperavam restabelecimento.

Passando, viu Jesus entre os doentes um cego de nascença, que era emancipado (v.
21,23), provavelmente com mais de trinta anos de idade, época em que os judeus
ficavam livres e cidadãos, bastante conhecido no Tanque e no bairro onde morava (v.
8,9); religioso, membro de alguma sinagoga da cidade (v. 13,28,34^ e homem de
profunda fé em Deus (v. 29-33,38).

Como fosse cego desde o nascimento, perguntaram os apóstolos a Jesus a causa do


seu infortúnio, e adiantaram a sua opinião de que era devido ao pecado dele ou de
seus pais. Jesus, porém, respondeu que aquele homem nascera cego para que por
ele se revelasse a glória e o poder de Deus; e ungindo-lhe os olhos com lodo feito com
sua saliva, mandou-o lavar-se no Tanque de Siloé.

O mendigo obedeceu imediatamente, e voltou com os olhos curados. Apesar da


dúvida dos vizinhos, dos vacilantes pais e dos críticos eclesiásticos, rendeu ele a
Jesus a glória devida, aceitando-o finalmente como seu Salvador e Amigo.

1 - O CEGO E SEU PROBLEMA


"Jesus viu, ao passar, um cego de nascença." Havia sempre ao redor das portas do
Templo multidões de mendigos pedindo esmolas aos que entravam aí, cujos corações
deviam se enternecer pelas influências benéficas do lugar santo.

Dos seis milagres feitos por Jesus a cegos, registrados nos Evangelhos, este é o único
caso de cegueira congênita, que ainda é incurável por meios conhecidos à medicina.
Jesus se ocupava em procurar a quem pudesse ajudar, e assim "viu" logo esse pobre
necessitado. O cego não podia "ver" nada; mas havia, naquele dia, perto dele, UM que
podia "ver" por ele e fazê-lo "ver por si próprio”. Que felicidade é encontrar a Cristo na
estrada deste mundo!

2 - O CEGO E O PROBLEMA DO SOFRIMENTO


Diante daquele caso doloroso e incurável, os Discípulos de Jesus, completamente
incapazes de remover a cegueira do pobre homem, logo começaram a discutir o
problema que os perturbava, como ainda perturba a muitos: "Que pecado cometeu
este ou cometeram seus pais para nascer cego?"

O pecado, como Jesus em mais de uma ocasião reconheceu, é a causa dos


sofrimentos do homem (I Jo 5.14; Mc 2.5). Por isso, os discípulos inferiam
erradamente que qualquer padecimento era sempre o resultado de um pecado. Daí o
seu raciocínio.

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Podia haver só duas causas deste sofrimento, e duas fontes do pecado, para eles, os
judeus, na sua época: ou os pecados próprios do padecente, trazendo o castigo, ou os
pecados próprios de seus progenitores, como já a própria Lei do Decálogo o declarava
(Ex 20.5).

Assim raciocinaram os amigos do paciente Jó: "Se tu sofres é porque pecaste, e


sofres com justiça!" Assim pensavam os judeus a respeito das calamidades, como se
vê do registro em Lucas, 14.1-6.

Mas, o caso do cego era mais difícil para os discípulos explicarem, pois nascera já
doente. Daí a indagação: "Quem é o culpado aqui, Mestre, ele ou os pais?"

A pergunta dos apóstolos, se o cego pecara, tinha base provavelmente na crença


supersticiosa da época, não de uma vida anterior renovada, como na antigüidade já os
brâmanes ensinavam, pela transmigração das almas por vários corpos (o que hoje se
denomina, com ligeiras diferenças, reencarnação espírita), sim, tinha base a pergunta
na crença de que as criancinhas podiam pecar no seio materno, como o evidenciou
em obra notável o sábio comentador da Escritura, Dr. Lightfoot, alinhando dezenas de
citações de autores judeus, idéia que haviam inferido erroneamente do que diz Davi no
Salmo 51.5: "Eu nasci na iniqüidade..." Os judeus não criam em reencarnações, e,
sim, na ressurreição.

Nicodemos ignora aquela teoria, embora fosse mestre em Israel (Jo 3.1,4,9,10). A
idéia também de que uma pessoa podia sofrer pelos pecados dos pais era muito
comum (e é certa, entendida como deve ser também baseada em Ex 20.5,6; Lv 20.18
e SI 51.5,4).

Por isso, os apóstolos colocaram o caso do cego nesta alternativa também: "Ou foram
os pais os culpados?" Este problema do sofrimento continua até hoje a intranqüilizar a
pobres e aflitos corações. Há muita gente que acredita que "todo sofrimento é castigo".

Se alguém sofre, está pagando" — é teoria espírita. Ora, isso é absurdo. Há


sofrimentos que não são castigos nem são por culpa de ninguém, e, sim, acidentes e
calamidades naturais.

3 - O CEGO E JESUS
Realmente, Cristo explicou de modo cabal a dificuldade: "Nem este cego pecou nem
seus pais, para nascer cego; mas isto se deu para que nele fossem manifestas as
obras de Deus."

Esta afirmativa divina, que era e é lei certa, mostra que nem toda dor é castigo de
pecados particulares. Há dores que são bênçãos (Hb 12.4-13).

Com esta resposta, não queria Cristo ensinar que tanto o cego como seus pais fossem
justos, perfeitos e impecáveis, porque Ele ensinou a Paulo o contrário (Rm 3.9-
18,22,23).

Queria dizer apenas que a cegueira do pobre doente ali junto ao Tanque não era
castigo de um pecado especifico dele ou dos pais. Nascera cego por uma soberana
determinação da Providência, para que nele fossem evidenciadas as obras de Deus.

Há, portanto, dores que vêm do céu, como fruto da vontade sábia, boa e de grandes
benefícios da escolha divina, quer mediante planos diretos, quer mediante permissão
indireta. Nem sempre podemos compreender estas providências celestes, mas um dia
talvez as entenderemos.

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Mesmo agora, com a nossa frágil visão, já muitas vezes vislumbramos acima de
nossas dores e sofrimentos a mão de nosso Pai; sentimos nas aflições manifestações
da graça e do poder de Deus. A quantas almas tristonhas não pode Jesus enviar a
mensagem consoladora: "Esta enfermidade não é para a morte, mas para a gloria de
Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela" (Jo 11.1-6). "As obras de
Deus."

Que obras? Sem dúvida as obras da humildade, da paciência, da mansidão que o


Espírito de Cristo infunde na alma, a glória do espírito e disposição que a presença da
graça produz.

A obra da cura que Cristo efetuou ali. Importa, todavia, que nós, em quem hão de ser
manifestas as obras de Deus, saibamos ser bons instrumentos. E quando houver
ensejo de glorificar a Cristo, devemos apressar-nos a aproveitá-lo. "A noite vem,
quando ninguém pode trabalhar." A vida mais dilatada é como um dia para Deus.

Passamos os nossos anos como um conto que se conta. Os dias vão indo, e importa
que não percamos as preciosas horas. Há muito que fazer. Há corações tristes que
podemos consolar; há pobres e desvalidos cujas necessidades podemos aliviar; há
almas que estão nas trevas do pecado, sofrendo uma cegueira pior do que a do
homem a quem Jesus abriu os olhos; e a esta podemos levar a mensagem de paz e
perdão.

Jesus não ficou apenas no setor árido da mera teoria. Não basta filosofar, é preciso
agir. Passou a aliviar o cego sofredor, curando-o de modo cabal e eficaz. Diz o texto
que nosso Senhor, salivando num pouco de terra, fez lodo e ungiu os olhos do cego.

Foi um ato simbólico, para despertar a fé no coração daquele que nada podia ver. A
saliva era remédio usual, no Oriente, para doenças dos olhos e da pele, embora não
curasse a cegueira. Jesus, em seguida, exigiu do cego um ato de fé expressa na
obediência: "Vai ao Tanque, lava-te..." O cego, já tocado pela graça, não discutiu a
ordem. Obedeceu. Creu. Ficou ração que sofre não discutir as ordens divinas!

4 - O CEGO E A IGREJA
Nos v. 13-34 registra João o processo a que foi submetido o cego, por ter sido curado
num dia de sábado. As características da ação das autoridades da Igreja, no caso, são
as mais tristes possíveis.

Mostraram intolerância, ódio, arrogância, impertinência, superstição, juízo temerário


(vv. 16,26-29), falta de caridade, insulto (v. 28,34), e finalmente fizeram a eliminação
do cego da comunhão de Israel, sem motivo justificável. O homem quando não pode
realizar as obras de Deus, realiza as do Diabo.

E não é verdade que ainda há, hoje, nos falsos sacerdotes do Cristianismo, os
mesmos sentimentos malignos? A raça dessa gente não acabou. Pelo contrário,
cresceu...

5 - O CEGO E A SALVAÇÃO
Nos v. 35-41 temos o final da história do cego. Ele, procurado pelo seu melhor Amigo,
recebeu-o com fé e amor como sua única Esperança redentora no mundo. Bem falara
o Mestre: "... nele se vão manifestar as obras de Deus..." (v.3). E a maior obra teve-a o
cego na sua salvação.

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Curado ficou do corpo e da alma. Eliminaram-no da sinagoga, mas ele ganhou o


diploma de membresia da Igreja celestial e de Cristo.

Que linda atitude a do cego: "Ele creu e adorou." Crer e adorar! Eis a síntese da
conversão. O capítulo 40 história de uma vida atormentada pela dor e pela pobreza,
mas encerra-a de maneira linda, cheia de luzes e de alegrias. E assim é o nosso
Senhor.

Quem o encontra se transfigura. Você já encontrou Jesus no seu caminho, caro leitor?

6 - LIÇÕES PRÁTICAS

 A dor nem sempre é castigo. Há dores que são bênçãos e privilégios.

 Jesus cura e salva. E Ele "vê" a quantos, com resignação e fé, recebem da
Providência divina a parte de sua dor neste mundo. "Ele vê" e resolve bem
essas dores.

 Nada adianta discutir as causas dos males humanos. O que adianta é agir no
sentido de evitá-los ou eliminá-los.

 "Quando Deus quer, água fria e lodo são remédios..."

 A intolerância religiosa é uma trágica calamidade, porque gera muitos males: o


ódio, a
 mentira, o mau juízo, a falta de serenidade, a perversão dos sentimentos, o
abuso da autoridade.

 É digno de lástima aquele que tem horror às responsabilidades, que não tem a
coragem de ser verdadeiro e justo! (Jo 9.18-21).

 O verdadeiro convertido não teme a intolerância; fala a verdade com singeleza,


dá testemunho de seu Salvador, crê publicamente e tem o discernimento são e
fiel da verdade.

AUTOR: REV. GALDINO MOREIRA

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