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ARTIGO
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a professora não simplificava, pois é dessa ma- Assim, os diários reflexivos produzidos pela
neira que o vocabulário das crianças se amplia. professora/especialista foram também anali-
A atividade terminava com a abertura de sados em categorias de conteúdo, sendo neles
espaço para que todos os alunos se manifes- registradas observações da sua prática docente
tassem sobre o que tinha sido lido, como, por e da prática de leitura em questão.
exemplo, quais eram os trechos preferidos, que Para ambos os instrumentos foram realiza-
parte(s) cada um achou mais engraçada. Enfim, das a classificação das unidades delimitadas e
a professora fazia um levantamento de possíveis identificadas, assim, duas categorias para cada
dúvidas sobre o texto e sugeria uma (re)apre- manuscrito.
sentação de cada um para os colegas. Assim, Diários de campo:
apareciam diferentes impressões sobre a trama. • relatos sobre o que o professor fez ou
disse;
Processamento e Análise dos dados • informações de qualquer natureza
O diário de campo da professora/especialista sobre a aluna-alvo.
descrevia as atitudes, dúvidas e dificuldades Diários reflexivos:
na construção, em parceria com a professora/ • descrições sobre o desempenho dos
participante, do processo formativo e, particular- alunos nas atividades de leitura;
mente, do processo interativo (prática da leitura). • sobre si – havendo referências a própria
Registraram-se neste diário as impressões da prática, impressões, sentimentos e ex-
mesma sobre o modelo colaborativo e o papel pectativas sobre o ensino colaborativo.
de colaboração e parceria, bem como os limites
e possibilidades de sua ação mediadora no pro- RESULTADOS
cesso de aprendizagem de todos os alunos. Os No primeiro momento de interação entre
registros que foram desenvolvidos no diário de a professora/especialista e professora/partici-
campo mesclaram informações descritivas com pante, foi aportado o conhecimento científico
reflexões pessoais. Durante as observações, a acerca da leitura e suas práticas diferenciadas,
professora/especialista fazia anotações rápidas buscando compreender o processo de sua aqui-
num bloco de notas, a fim de não perder os as- sição, estudando e discutindo também as suas
pectos mais importantes dos encontros. Depois diferentes concepções e caracterizações. Isso
que saía do campo, a mesma elaborava registros deu margem para o desenvolvimento de pos-
ampliados, procurando reproduzir em detalhes o síveis estratégias práticas de intervenção com
que havia observado. Foram realizadas leituras os alunos. As reflexões realizadas durante os
pormenorizadas dos registros – diários de campo. planejamentos estavam sempre sustentadas na
Em seguida, os conteúdos dos diários foram des- experiência da prática cotidiana e no referencial
membrados em unidades de conteúdo, ou seja, teórico utilizado pela professora regular:
passagens dotadas de informações completas a “O primeiro encontro de ensino colabo-
respeito de episódios vivenciados na sala de aula. rativo me permitiu refletir sobre o meu
No diário reflexivo da professora/participan- compromisso com segurança e tranqui-
te, foi descrita a trajetória das aulas, envolvendo lidade no processo de ensino. Assim, as
a prática escolhida, nele também a professo- minhas observações diante das ativida-
ra apresentou uma interpretação pessoal do des dos alunos foram intensificadas e
elemento trabalhado, ou seja, enriqueceu a detectei que o alfabeto foi reconhecido
descrição com comentários que expressavam pela aluna-alvo.”
sua maneira de compreender o elemento em Então, em um segundo momento, buscou-se
questão, a prática de leitura. aprofundar a análise do material estudado. Foi a
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partir dessa etapa que a professora mostrou-se No entanto, o modelo colaborativo realizado
completamente imersa na proposta de ensino. neste trabalho não se trata apenas de um conhe-
Ela destacou que, durante o processo, a maior cimento implícito na atividade prática. Trata-se
transformação em sua prática havia sido a de um diálogo entre a prática vivida e as cons-
construção do diário reflexivo, pois quando uma truções teóricas formuladas em parceria reflexiva
pessoa relata os fatos vividos por ela mesma, por ambas – professora regular e professora de
percebe-se que reconstrói a trajetória percorrida educação especial. Essa ação mostrou o impacto
dando-lhe novos significados: positivo do ensino colaborativo quando trabalha-
“O trabalho enfatizou a oralidade, es- do de forma efetiva e comprometido.
timulando a reflexão dos alunos, a difi- A estratégia escolhida para a intervenção
culdade de Beatriz (nome fictício) está da professora – roda da leitura – mostrou-se
evidente, o que exige meu auxílio, bem positiva tanto para o aluno com necessidade
como dos colegas de sala.” especial, bem como para todos os demais, ou
“A reflexão girou em torno da neces- seja, toda a classe foi beneficiada.
sidade de realizar atividades claras e Foi possível pontuar uma avaliação e caráter
concretas relacionadas ao cotidiano de prático sobre o ensino colaborativo do ponto de
Beatriz, por isso a cada dia a minha vista dos envolvidos, pois além desse trabalho
responsabilidade está em fiscalizar o possibilitar a reflexão da prática pedagógica,
alcance de cada um para atingir suas pela professora/participante, torna-se importan-
habilidades e potenciais. Observa-se que te considerar a implementação de estratégias
o avanço é gradativo.” colaborativas em futuras pesquisas, as quais po-
Assim, a reflexão perante a própria prática derão, por sua vez, subsidiar Políticas Públicas.
provoca mudanças na forma como as pessoas A partir das práticas de leitura pôde-se ob-
compreendem a si mesmas e aos outros12. O servar a satisfação dos alunos em construir nar-
estabelecimento de uma relação amigável tam- rativas, e em perceber suas reais capacidades,
bém contribuiu para o processo colaborativo. bem como a contribuição efetiva para sociali-
O trabalho em colaboração proporcionou zação da ideias emergidas durante as leituras,
à professora um olhar mais crítico em relação como demonstrado na reflexão da professora
a sua prática e possibilitou o aprofundamento em seu diário:
sobre a prática desenvolvida. Como demonstra “Considerei a atividade produtiva, pois
o relato no diário de campo da pesquisadora: ao longo do processo os alunos falaram
“Relatou os acontecimentos e reflexões de forma espontânea sobre o tema para
particulares no diário reflexivo com maior o grupo.”
frequência.” Esse processo (experiência) mostrou que,
“A professora estava mais flexível às com a motivação dos alunos e comprometimento
sugestões e criou estratégias voltadas à da professora e da escola, muitos problemas
leitura e escrita, além do que foi sugerido podem ser amenizados, ou mesmo sanados.
nas reuniões semanais.”
“Dialogou com maior segurança, relatou DISCUSSÃO
suas atitudes em sala e refletiu sobre suas É amplamente sabido que as aprendizagens
atitudes.” da leitura e da escrita são eventos importantes
A atuação da pesquisadora nesse processo na vida de uma criança. Contudo, há dados ne-
se revelou, algumas vezes, difícil, porém lhe gativos em relação ao seu desenvolvimento. Da-
permitiu olhar para a realidade profissional com dos do 5º Indicador de analfabetismo funcional
maior segurança e autonomia. (Inaf), realizado pelo Instituto Paulo Monteiro,
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em 2005, demonstraram que 74% dos brasilei- mais pesquisas sobre as possibilidades de cola-
ros adultos não conseguem ler textos longos, boração entre educação regular e especial nas
relacionar informações e comparar diferentes escolas, bem como trabalhar a importância da
materiais escritos15. formação de professores para atuarem no ensino
Atividades realizadas por meio da leitura colaborativo.
tornam-se um rico meio de promover o aper-
feiçoamento da mesma, bem como fortalecer a CONSIDERAÇÕES FINAIS
socialização, ainda mais se essas práticas forem O desenvolvimento do professor com pla-
construídas por meio de colaboração entre pro- nejamento, (re)planejamento aplicando e ava-
fessor e professor de educação especial. liando estratégias, parece auxiliá-lo a pensar
Essa afirmação corrobora os achados da lite- na possibilidade de utilização de um espaço
ratura, como é o exemplo da pesquisa13, na qual realmente colaborativo e reflexivo, criando
foi observado que todos os seis alunos benefi- assim um lugar diferenciado dentro da escola8.
ciados nas atividades desenvolvidas durante o A apresentação do presente relato envolven-
ensino colaborativo tiveram evolução no desem- do o ensino colaborativo indicou que a estraté-
penho tanto acadêmico como de socialização. gia desenvolvida conjuntamente tem potencial
No entanto, também é preciso ressaltar que para melhorar a qualidade do ensino regular.
nem todos os trabalhos envolvendo colabora- Assim, a proposta baseada no ensino cola-
ção (modelo aqui já descrito) são passíveis de borativo parece também ter promovido o de-
sucesso, muitos ainda encontram dificuldades, senvolvimento de habilidades na professora,
foi o caso encontrado no estudo12 onde a inter- pois, de forma geral, por meio das análises
venção esteve restrita ao planejamento. Essa dos diários de campo e diários reflexivos,
dificuldade pode dar-se pelo fato de que o notou-se que o ensino colaborativo pode
ensino colaborativo é um processo e, portanto, gerar efeitos convenientes, principalmente
depende muito da relação entre os envolvidos, com relação às práticas do educador de sala
o que demanda verdadeiramente um relacio- regular que contém alunos com necessidades
namento colaborativo4. especiais.
Por outro lado, o ensino colaborativo entre Quanto às perspectivas de atuação em sala
a professora/participante e a professora/espe- de aula, os resultados apontaram que é preciso
cialista, descrito neste relato de experiência, difundir nos contextos escolares a real contri-
vem ao encontro dos elementos pontuados buição do ensino colaborativo, garantindo que
nos Indicadores de Qualidade na Educação os momentos vivenciados entre a professora/
proposto pelo Ministério da Educação e nas participante do ensino comum auxiliada pela
pesquisas realizadas na área de Educação e professora/especialista possam ser refletidos
Educação Especial. em práticas futuras.
Os resultados indicaram que a mediação Portanto, a contribuição do ensino colabora-
exercida pela professora/especialista no pro- tivo caminha rumo ao pensamento pedagógico
cesso colaborativo, na prática explicitada nesse da inclusão escolar, pois permeia questões do
texto, é fundamental para auxiliar nas reflexões cotidiano, do desempenho do professor regu-
das práticas pedagógicas de professores. Nesse lar e resgata atitudes que permitem a parce-
processo de colaboração e construção, a profes- ria e a colaboração conjunta. Dessa forma, a
sora/especialista criou novas condições para proposta de tal ensino é um caminho viável
que o professor/participante realizasse as suas e gratificante, tornando todos os envolvidos
atividades de forma mais lúdica. construtores do seu próprio processo de ensino
Diante disso, há a necessidade de produzir e aprendizagem.
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SUMMARY
Partnership in the school environment: a collaborative teaching expe-
rience for inclusive education
Objective: The aim of this work was to evaluate the effects of reading
practice relative in collaborative teaching in the students in a regular
classroom. Methods: Twenty-two students from the 4th grade of regular
school participated in this study, one of which was a student with special
educational needs. Through observational-descriptive approach, the results
of this study were collected during classroom process. Results: It was found
that the strategy chosen by the teacher for the intervention – the reading
wheel – was positive for both the student with special needs and the others.
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