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Resumo
A partir do conceito de mistanásia (também conhecida como de eutanásia social) para
referência à morte miserável dos excluído, este artigo tem como objetivo alertar sobre
os atos de exclusão/segregação que, ao longo do tempo e ainda hoje, ocasionam a morte
de nossos irmãos menos favorecidos.
Palavras-chave: Mistanásia. Exclusão social. Segregação. Miséria.
Abstract
From the concept of social euthanasia to reference the miserable death of the excluded,
this article aims to warn about the acts of exclusion/segregation that, over time and still
today, cause the death of our less fortunate brethren.
Keywords: Social euthanasia. Social exclusion. Segregation. Misery.
Introdução
Desde que o ser humano percebeu sua capacidade de criar, isso o colocou em
extrema vantagem sobre os demais seres da face da terra, especialmente pela capacidade
racional. Todavia, sempre deixamos que os instintos selvagens fiquem em evidencia, e
muito embora sejamos humanos, falta muito para que sejamos efetivamente
humanizados, no sentido humanista do termo (benévolo, agradável, tolerante).
Impregnado de diversas culturas em que a predominância é a violência, a cada
geração os “seres humanos” assumem novas posturas e moldam-se novas regras sociais
*
Psicopedagogo pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB); atua no setor de Reabilitação Auditiva do
Hospital Militar General Edson Ramalho (HMER/JP-PB); docente na Cooperativa de Ensino Técnico,
Fundamental, Médio e Superior da Paraíba (UNICOOP) e membro da Associação Médico-Espírita da
Paraíba (AME/PB). marcos.paterra@gmail.com
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adequando-se às regiões de seu nascimento. Graças a essas novas regras e aos valores
éticos e morais reprimem sua índole violenta, mas, por outro lado, dão vazão para que a
inteligência torne-se sua arma no combate aos eventuais inimigos.
Analisando o passado, vemos que o Homem sempre com desculpas de “ajudar”
ou de adquirir poder, provoca direta e indiretamente ações violentas; destacamos, como
exemplo, a bomba Atômica, que matou milhares de pessoas para mostrar a potência dos
Estados Unidos contra o Japão, o qual já estava prestes a se render; mas, poucas pessoas
sabem que anos depois, em 1966, dois jatos da Força Aérea americana colidiram e
derrubaram quatro bombas “H” 1 perto do vilarejo de Palomares, no sul da Espanha.
Essas bombas tinham potência suficiente para destruir várias cidades grandes de uma só
vez. Três foram recuperadas, pois caíram em locais de fácil acesso, mas uma delas foi
perdida perto de uma praia, afundando no lodo. Não houve uma explosão nuclear, mas
plutônio foi espalhado em uma área ampla (INFO, 2013).
De acordo com Sérgio Dialetachi (apud FELIX, 2011), esse não é um caso
isolado; oficialmente, há onze casos registrados de ogivas perdidas. Destas onze
bombas, sete foram perdidas nos próprios Estados Unidos. Todavia ambientalistas do
Greenpeace2, em 1989, baseados em reportagens e em documentos sigilosos do Exército
americano, chegaram a uma conta alarmante: existem nada menos que 60 ogivas
nucleares abandonadas no fundo dos oceanos.
Esse perigoso arsenal submarino teria sido uma herança, principalmente de
acidentes com navios ou aviões carregados de armas nucleares, ainda nos tempos da
Guerra Fria. Se essas bombas perdidas existirem de fato, a possibilidade de um desastre
é real:
A alta pressão e a corrosão no fundo do mar podem fazer com que o
urânio ou o plutônio enriquecido vazem para o ambiente. Isso pode
atingir toda a vida marinha do local e, em casos mais graves, poluir a
costa ou dar origem a chuvas radioativas. Para o ser humano,
dependendo do grau de contaminação, os efeitos podem ser mortais.
(DIALETACHI, 2010, apud FELIX, 2011, s/p).
1
Bomba de hidrogênio, designação mais adaptada ao seu significado bomba termonuclear, é uma bomba
que consegue ser até 50 vezes mais forte do que qualquer bomba nuclear a fissão (NUNES, 2015).
2
O Greenpeace é uma organização ambientalista, não governamental com sede em Amsterdã, com
escritórios espalhados em mais de 40 países. Atua internacionalmente em questões relacionadas à
preservação do meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
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1 Mistanásia
Sabemos que o ser humano usa de sua inteligência para se sobrepor e/ou impor
sua condição sobre as demais espécies e sobre muitos de sua própria espécie. Com a
desculpa de uso da razão, comete atrocidades contra seu próprio semelhante. Há pouco
tempo, aqui mesmo no Brasil, tivemos também um fato pouco divulgado, mas que
mostrou o quanto podemos ser desumanos, como veremos a seguir.
Utilizamos o conceito de Mistanásia (também chamada de eutanásia social)
para referência à morte miserável dos excluídos: “Entre as inúmeras vítimas da
mistanásia estão os pobres que, por exclusão social e econômica, não têm acesso ao
essencial para a sobrevivência, aos cuidados de saúde, levam vida sofrida e morrem
prematuramente” (LOPES, 2011, p. 11). Exemplificamos a mistanásia, no Brasil,
remetendo ao período de 1877 a 1879, quando o país sofria muita seca. Foram quase
três anos seguidos sem chuvas, com perda de plantações, mortes de rebanhos e miséria
extrema. A situação foi tão desesperadora que famílias inteiras se viram obrigadas a
mudar para outros estados, promovendo uma onda de migrações, especialmente no
Nordeste (ALBUQUERQUE, 1995; NEVES, 2007).
Segundo Talita Lopes Cavalcante (2015), o cenário era caótico, principalmente
quando os retirantes chegaram a outras cidades e estados. Devido à miséria extrema das
pessoas que chegavam, os moradores locais temiam saques ao comércio e aos armazéns.
Além disso, as cidades para as quais as vítimas da seca se dirigiam começaram a ficar
cada vez mais apinhadas de flagelados. Fortaleza, por exemplo, converteu-se na capital
do desespero. De 21 mil habitantes pelo censo de 1872, passou a ter 130 mil; para
completar o quadro de tragédia, houve um surto de varíola, dizimando milhares de
pessoas.
Anos depois da primeira grande seca no século XIX, em 1915 um novo
episódio assolou o sertão nordestino. Novamente, a seca fez com que diversos
nordestinos migrassem para grandes cidades. Porém, ao contrário do primeiro episódio,
o governo cearense resolveu se precaver de uma maneira desumana. O governo criou os
primeiros currais humanos, campos de concentração3 “em regiões separadas por arames
farpados e vigiadas 24 horas por dia por soldados para confinar as almas nordestinas
3
O campo de concentração foi construído na região alagadiça do atual bairro Otávio Bonfim
da cidade brasileira de Fortaleza.
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retirantes castigadas pela seca” (CAVALCANTE, 2015, s/p).
Ali ficaram confinadas milhares de pessoas com alimentação e água
controladas e vigiadas pelos soldados do Exército. Naquele mesmo ano de 1915, após
incentivos para que os retirantes migrassem para a Amazônia, o curral humano foi
desativado (THEÓPHILO, 1980). Dezessete anos mais tarde, em 1932, foi a vez de
reabrir o campo de concentração e criar novos currais humanos.
Segundo Rios (2006), naquele ano, outra grande seca castigou novamente o
sertão nordestino, fazendo com que, mais uma vez, milhares migrassem para os grandes
centros urbanos. Após dezessete anos, nem o governo federal, nem os governos
estaduais haviam se precavido para diminuir os efeitos da seca e a solução, novamente
desumana, passou a ser a criação e ampliação dos campos de concentração nordestinos.
Esses campos de concentração, também conhecidos como campos da fome
eram regiões cercadas por arames farpados e vigiadas diariamente por soldados para
confinar os nordestinos afetados pela seca:
Corpos magros, de cabeças raspadas e numeradas se apinhavam aos
montes dentro dos cercados de Senador Pompeu, Ipu, Crato (ou Buriti,
por onde passaram mais de 65 mil pessoas) e o já conhecido Otávio
Bonfim, eram currais humanos instalados no Brasil para conter a
massa castigada pela seca dos anos de 1915 e 1932. (CAVALCANTE,
2015, s/p)
Esse episódio deixa evidente a segregação de flagelados pela seca, por meio da
ação descabida do governo, a fim de conter o problema.
Ser humano pode ser uma verdade biopolítica que institui o outro
como um inumano dentro das relações sociais. O ser humano,
enquanto ser, possivelmente, foi aquele que racionalizou seu modo de
viver e por esse motivo passou a existir historicamente. Ele registra
suas memórias e manipula seus registros. (GARCIA, 2010, s/p)
4
Em 1979, Basaglia visitou o Hospital Colônia na cidade de Barbacena, tendo-o comparado aos campos
de concentração nazistas de Adolf Hitler
5
Trecho retirado do livro Holocausto Brasileiro de Daniela Arbex (2013). Fonte: <http://www.sindpen-
se.org.br/ver_noticia.php?id_noticia=662&hash=945720651160974521abdd9d59d68ea9>.
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200 reais cada e isso favorecia a superlotação do local.
Considerações finais
Referências bibliográficas
ALBUQUERQUE Jr. Durval Muniz de. Palavras que calcinam, palavras que dominam:
a invenção da seca do Nordeste. IN: Revista brasileira de História. São Paulo:
ANPHU/Marco Zero, Vol. 15. Nº. 28, 1995.
NEVES, Frederico de Castro. A seca na história do Ceará. IN: SOUZA, Simone de.
(Org). Uma Nova História do Ceará. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2007.
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