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Revista Serviço Social em Perspectiva

Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. www.periodicos.unimontes.br/sesoperspectiva


Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social

O CORPO FEMININO: erotização e objetificação

Romilda Sérgia de Oliveira1

RESUMO

O artigo busca analisar o poder sobre o corpo feminino, por meio da erotização e
objetificação. A discussão está fundamentada na concepção de poder e saber de
Michael Foucault. Neste sentido, aborda a questão da sociedade patriarcal como
perpetuação e manutenção do controle sobre o feminino e enfatiza a erotização e
objetificação do corpo da mulher como instrumentos utilizados para controlar
seuscorpos.

Palavras-chave: Corpo; Sexualidade; Gênero; Poder; Objetificação.

ABSTRACT

The article seeks to analyze power over the female body through eroticization and
objectification. The discussion is grounded in Michael Foucault's conception of power
and wisdom. In this sense, it addresses the question of patriarchal society as a
perpetuation and maintenance of control over the feminine and emphasizes the
eroticization and objectification of the woman's body as instruments used to control
their bodies.

Keywords: Body; Sexuality; Genre; Power; Objectification.

1
Psicóloga e Mestra em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Docente do
Departamento de Política e Ciências Sociais da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). E-
mail:romildasergia.oliveira@gmail.com.
OLIVEIRA, R.S.
O corpo feminino: erotização e objetificação

INTRODUÇÃO

A reflexão sobre tema do corpo da mulher a partir da erotização e


objetificação feminina, a qual se propõe este texto, não é nova. Contudo, tal temática
ainda assume significativa importância para a reflexão sobre a questão do controle
dos corpos a partir da sexualidade. A discussão sobre o patriarcado, por
exemplo,contribui para o controle do corpo da mulher. Neste sentido, o estudo
proposto possibilita a interlocução entre os conceitos, para a compreensão e análise
da relação de poder através da erotização e objetificação feminina. O objetivo não é
exaurir o tema, mas contribuir na compreensão dos mecanismos de poder exercidos
sobre o corpo das mulheres.
O método utilizado para elaboração deste trabalho é a revisão bibliográfica,
pautada em estudos de Foucault (1984,1985, 1988), e de estudiosos que abordam o
tema. O texto se divide em três partes. A primeira trata da concepção de controle do
corpo a partir do pensamento de Foucault (1984,1985, 1988), levando em
consideração seus estudos sobre sistemas de punição e sobre a sexualidade. A
segunda parte consiste na compreensão da sociedade patriarcal a partir de Saffioti
(2015), Del Priore (1993), Friedman (1993), entre outros autores, que problematiza o
lugar da mulher e sua relação de poder na família e na sociedade. Na terceira parte,
privilegia-se a análise da erotização e objetificação feminina como mecanismo de
controle e suas possibilidades de ruptura e emancipação feminina utilizando com
referências os autores Beauvoir (2016), Heldman (2012), Morin (2002) e Segundo
Silva e Araújo (2017)
O texto não se propõe a enunciar verdades únicas, muitos menos exaurir a
temática, mas busca descrever o fundo comum no qual se desenvolve o controle
sobre os corpos femininos.

CONTROLE DO CORPO

Michel Foucault desenvolveu vários estudos sobre a questão do controle do


corpo. Em ordem cronológica têm-se o livro “A História da Loucura”, publicado em

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1961 e reeditado em 1972. O livro aborda a transformação da loucura em doença


mental ao longo da história, perpassando pelo encarceramento dos corpos em
asilos. Em 1975/1977 o autor lança “Vigiar e Punir”, no qual realizou um estudo
científico sobre a história, a legislação penal e seus métodos coercitivos de
diferentes sistemas punitivos, da Idade Média até à Idade Moderna.
Neste livro, Foucault (1996) evidencia em seus estudos importantes
interrogações sobre o poder e sobre o saber, que encontra no corpo sua forma de
manifestação, portanto ele busca compreender como o corpo foi percebido,
valorizado e dominado ao longo da história. O autor afirma:

Mas o corpo também está diretamente mergulhado num campo político; as


relações de poder têm alcance imediato sobre ele; elas o investem, o
marcam, o dirigem, o supliciam, sujeitam-no a trabalhos, obrigam-no a
cerimônias, exigem-lhe sinais. Este investimento político do corpo está
ligado, segundo relações complexas e recíprocas, à sua utilização
econômica; é, numa boa proporção, como força de produção que o corpo é
investido por relações de poder e de dominação; mas em compensação sua
constituição como força de trabalho só é possível se ele está preso num
sistema de sujeição (onde a necessidade é também um instrumento político
cuidadosamente organizado, calculado e utilizado); o corpo só se torna
força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo submisso. Essa
sujeição não é obtida só pelos instrumentos da violência ou da ideologia;
pode muito bem ser direta, física, usar a força contra a força, agir sobre
elementos materiais sem no entanto ser violenta; pode ser calculada,
organizada, tecnicamente pensada, pode ser sutil, não fazer uso de armas
nem do terror, e no entanto continuar a ser de ordem física
(FOUCAULT,1999, p. 28-19).

O saber do corpo, proposto por Foucault (1999), não perpassa pelo seu
funcionamento biológico, mas por um controle denominado de tecnologia política do
corpo, que é difusa e muitas vezes uma instrumentação multiforme. O poder,
portanto, são mecanismos e práticas, que atuam a partir de discursos, que possuem
propósitos específicos de controle dos corpos. Segundo o autor, o Estado utiliza-se
desta tecnologia política do corpo valorizando-a ou impondo algumas formas de agir.
É uma maneira denominada como microfísica de poder que se perpetua nos corpos
como uma estratégia ligada a manobras e táticas, pois o poder de exerce, muito
mais do que se possui.
No livro “A história da Sexualidade”, volume 1, a vontade do saber publicado
em 1976, é possível perceber uma análise de Foucault (1988) a partir de uma

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abordagem histórica, sobre o saber de controle dos corpos, “saber sob que formas,
através de que canais, fluindo através de que discursos o poder consegue chegar às
mais tênues e mais individuais das condutas” (FOUCAULT, 1988, p. 16).Contudo, é
nos livros “A História da Sexualidade – O uso dos prazeres”, volume 2 e “A História
da Sexualidade – O cuidado de si”, volume 3, ambos publicados em 1984, que o
corpo aparece através de amplas investigações e se estabelece a relação saber-
poder. Ao analisar os “Uso dos prazeres” o autor estabelece que a moral dos gregos
não estavam relacionadas com o ato sexual em si, mas na forma de obter prazer
dentro de uma cultura. A questão estabelecida por Foucault (1984) consiste em
compreender como a atividade sexual passa a ser constituída no campo moral.

A reflexão moral dos gregos sobre o comportamento sexual não procurou


justificar interdições, mas estilizar uma liberdade: aquela que o homem
"livre" exerce em sua atividade. Dai o que pode passar a primeira vista, por
paradoxo: os gregos praticaram, aceitaram e valorizaram as relações entre
homens e rapazes: e contudo, seus filósofos conceberam e edificaram, a
esse respeito, uma moral da abstenção. Eles admitiram perfeitamente que
um homem casado pudesse procurar seus prazeres sexuais fora do
casamento e no entanto, seus moralistas conceberam o princípio de uma
vida matrimonial em que o marido só teria relação com a própria esposa.
Eles jamais conceberam o prazer sexual como um mal em si mesmo ou
podendo fazer parte dos estigmas naturais de um pecado; e, contudo, seus
médicos se inquietaram com as relações entre a atividade sexual e a saúde,
e desenvolveram toda uma reflexão sobre os perigos de sua prática
(FOUCAULT, 1984, p. 87).

No livro “O Cuidado de Si”, volume 3, Foucault (1985) estabelece um estudo


histórico sobre a relação do indivíduo com próprio corpo, que demarca o espaço da
medicina como um campo de saber que estabelece o saber e regras, bem como
uma estrutura de condutas, que aborda as relações com o sexo, alimentação, sono
e maneira de viver. Em relação ao ato sexual e o cuidado com o corpo surge uma
ambivalência em relação à seus efeitos. Foucault (1985) conclui que:

Toda uma reflexão moral sobre a atividade sexual e seus prazeres, parece
marcar nos primeiros séculos de nossa era, um certo esforço dos temas de
austeridade. Médicos se inquietam-se com os efeitos da prática sexual,
recomendam de bom grado a abstenção, e declaram preferir a virgindade
ao uso dos prazeres. Filósofos condenam qualquer relação que poderia
ocorrer fora do casamento, e prescrevem entre os esposos uma fidelidade
rigorosa e sem exceção. (FOUCAULT, 1985, p. 231)

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Através da análise histórica de Foucault (1995), nota-se que atividade sexual


fica, cada vez mais, marcada a partir de uma inquietação que a leva para termos
patológicos e morais, que comunga com a tradição desde o Renascimento do
catolicismo e do protestantismo.

SOCIEDADE PATRIARCAL

O Patriarcado é um conceito utilizado pela ciência política e pela sociologia.


Para Weber (1991), o patriarcado refere-se a uma forma originária de dominação,
que consiste na “possibilidade de impor ao comportamento de terceiros a vontade
própria” (WEBER, 1991, p. 187). Neste caso a autoridade do chefe (pai) sobrepõe-
se aos demais membros da família, que é compreendida como pai, mãe e filhos.
Segundo AGUIAR (2015), a sociologia destaca que na sociedade brasileira, a
história do patriarcado colonial, traz a predominância da autoridade do pai de família
sobre os demais membros, que era responsável por impor a autoridade
estabelecendo comportamentos e punições em caso de transgressões, incluindo as
penalidades que poderiam chegar à morte. O poder patriarcal aferia ao homem o
direito de uso sobre o corpo das mulheres.
Vale ressaltar que a mulher que pertencia á elite, retratada na sociedade
Patriarcal no período colonial, era vista com a obrigação de manter-se pura e casta,
para o casamento e após o mesmo, ser um modelo de virtude e submissão. Para as
mulheres consideradas de classe populares era comum encontrarem mães solteiras,
vítimas de exploração sexual (concubinas) e domésticas. Del Priore (1993) afirma
que a imagem da mulher de elite opunha-se a imagem de promiscuidade e lasciva
imposta à da mulher de classe subalterna, que era geralmente mulata ou índia.
Sabe-se que, por exemplo, no Brasil Colônia, os portugueses, mantinham relações
com as mulheres negras e índias, que eram consideradas como objetos sexuais.
O patriarcado tem como um de seus elementos centrais o controle da
sexualidade feminina (SAFFIOTI, 2015). No contexto da sexualidade, cabe refletir
que a sociedade brasileira mantém estreita relação entre o patriarcado e o controle
dos corpos femininos. As mulheres veem-se, mesmo nos dias atuais, obrigadas a
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manterem relações sexuais com seus parceiros, mediante o pensamento do dever


conjugal. Outra forma de controle sobre os corpos das mulheres está relacionada ao
feminicídio2, crime que coloca o Brasil em 5º lugar no ranking entre os países que
mais cometem feminicídio no mundo. Alguns exemplos que repercutiram no país são
o da Margot Proença em 1970, Ângela Maria Fernandes Diniz em 1976, Sandra
Gomide em 2000, Eloá Pimentel em 2008, Eliza Samudio em 2010 e tantas outras
mulheres que anônimas na história, mas presente na vida cotidiana de muitas
pessoas tiveram suas vidas ceifadas pelo fato de serem mulheres, objetos de
dominação dos homens.
Saffioti (2015) retrata que a dominação e exploração, no sistema patriarcal,
referem-se ao âmbito familiar e a esfera política. Para a autora, a legitimidade dada
ao sistema patriarcal, naturaliza as ações perpetuando a desigualdade entre homens
e mulheres. Tal naturalização acaba por legitimar o controle dos corpos femininos
expressa, muitas vezes, através da violência física, patrimonial, sexual, psicológica e
simbólica.
Anzaldúa (1987) relata que os paradigmas dominantes são transmitidos
através da cultura, que estabelece o poder para os homens, que fazem as regras
ficando para a mulher a incumbência de transmiti-las. Espera-se, culturalmente, que
as mulheres aceitem e se comprometam com sistema de valores estabelecidos, ou
seja, que estejam submetidas aos homens.
No contexto contemporâneo é perceptível a conquista das mulheres seja no
aspecto pessoal como no profissional. Apesar desse avanço, as mulheres mesmo
que tenham escolaridade superior aos homens, elas ainda recebem rendimentos
inferiores, ocupando atividades equivalentes. Outro fator importante a ser analisado
é a invisibilidade do trabalho doméstico como o cuidado da casa e das crianças, que
fica a cargo da mulher. Todos esses fatores, segundo Aguiar (2015), são indicações
da vigência do patriarcado na sociedade contemporânea.
Segundo Dimen (1997), o patriarcado é em si, um sistema de dominação,
mas difere dos demais sistemas de dominação, pois está diretamente relacionado

2
O termo feminicídio foi utilizado pela primeira vez, através da Marcela Lagarde, feminista e deputada federal mexicana, que o
caracteriza como um conjunto de delitos, que ocorrem em um contexto de impunidade e conivência do Estado, que
contemplam crimes e desaparecimentos de mulheres. (PASSINATO, 2011)
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ao desejo, reduzindo-o ao sexo e depois definindo-o como nos termos politizados de


gênero, tornando-o uma esfera privada.
A feminista Betty Friedman, em 1993, trouxe a luz de seus estudos, a
situação de um silencioso sofrimento vivido pelas mulheres, no qual ela denominou
de “problema que não tem nome”, que está caracterizado a um sentimento de
ausência, onde as mulheres relatam que vivem projetos de outras pessoas. Não
conseguindo situar-se em suas próprias histórias. Este sofrimento pode ser
nomeado como patriarcado, que traz uma lógica entre o público e o privado, que
confina a mulher à sua própria “natureza”, o que perpetua a diferença entre homens
e mulheres, marcando a mulher em um contexto de submissão, desqualificação e
desvalorização.

EROTIZAÇÃO E OBJETIFICAÇÃO FEMININA

Simone de Beauvoir (2016, p. 11) quando afirmou, em 1949, que “ninguém


nasce mulher: torna-se mulher” oferece uma pista para compreender a erotização e
objetificação feminina enquanto dispositivos para reforçar o controle dos corpos
femininos. Segundo a autora ser mulher não é uma prerrogativa biológica, mas uma
construção social, que diz o lugar que a mulher deve ocupar na sociedade, bem
como se vestir, se comportar, dentre outras normativas consideradas na sociedade
patriarcal.
Para Heldman (2012), o conceito de objetificação sexual surgiu na década de
1970 e consiste em um processo no qual uma pessoa é tratada como objeto sexual.
As consequências impostas pela objetificação dos corpos femininos é que as
mulheres tendem a ver a si mesmas como objetos.

É no fluxo da cultura de massa que se desfecha o erotismo: não só os


filmes, os comics, as revistas, os espetáculos estão cada vez mais
apimentados com imagens eróticas, mas quotidianamente pernas
levantadas, peitos estofados, cabeleiras escorridas, lábios entreabertos nos
convidam a consumir cigarros, dentifrícios, sabões, bebidas gasosas, toda
uma gama de mercadorias cuja finalidade não é, propriamente falando,
erótica. (MORIN, 2002, p. 119)

O corpo feminino está em constante escrutínio perante a sociedade. As


meninas aprendem desde cedo a fugir dos olhares masculinos, a cobrir seus corpos,
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a não sentar no colo de homens, ou seja, são submetidas a uma série de regras,
para preservar-lhes a inocência. Contudo, estas mesmas meninas estão diante de
uma cultura que lhes apresentam um modelo estético de mulher, que para ser bela é
preciso ter um corpo magro, curvilíneo, que tenham seios definidos, bumbum
avantajado, barriga lisa (atualmente considerada barriga negativa), pernas longas e
definidas. Os padrões de corpos apresentados são constantemente mostrados pela
mídia através das novelas, campanhas publicitárias, mídia impressa e são
consideradas como modelo de saúde. Padrões considerados inalcançáveis pela
maioria das mulheres, o que as coloca em constante insatisfação com o próprio
corpo. São corpos que estão constantemente expostos, oferecidos com e/ou como
produtos pela publicidade. Imagens de corpos que reforçam as exigências estéticas,
consideradas como ideal a ser alcançado pelas mulheres.

Figura 1 – Imagens extraídas de propagandas de cerveja

Fonte: http://www.allbeers.com.br/2010/08/cerveja-mulheres-essa-combinacao.html

Na figura 1 é possível perceber que a imagem da mulher utilizada para a


venda de cervejas, consiste em um apelo de exposição e sensualidade do corpo
feminino. A mídia, neste caso, explora o erotismo e a sedução corporal para
despertar o desejo e consequentemente, o consumo do produto. Faz-se uma alusão
de que se você consumir a cerveja você poderá ter acesso a este modelo de mulher
erotizada.
Segundo Silva e Araújo (2017, p. 61):

As marcas de cerveja reforçam a ideia de que a mulher se coloca no espaço


masculino para servi-lo. No geral, os homens em seus grupos de amigos
são os protagonistas das propagandas, e a mulher, no geral, magra, com
corpo bem definido, belas curvas, seios grandes, olhar fascinante, aparece
para seduzir e servir aos desejos do homem.

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As propagandas de cerveja contribuem, portanto, para a manutenção e


perpetuação da imagem feminina como objeto sexual.

Figura 2 – Propaganda de uma revendedora de motos de Maceió-AL

Fonte: http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2015/02/guest-post-reclamar-de-propaganda-nao-
e.html

O mesmo conceito estabelecido de objetificação do feminino utilizado pelas


propagandas de cerveja, também é utilizado na venda de carros e motos. No caso
da Figura 2, uma agência de motos de Maceió, no estado de Alagoas decidiu
oferecer o emplacamento de graça, para as pessoas que adquirissem uma moto.
Contudo, o conteúdo proposto no outdoor caracteriza uma mensagem sexista,
machista e explicita o pensamento da sociedade patriarcal em colocar a mulher
como objeto de troca.

Figura 3 – Imagens de site de busca com o tema: “revistas femininas”

Fonte: www.google.com.br/search?q=revistas+femininas&rlz=1C1NHXL_pt-

Figura 4 – Imagens em site de busca “revista masculinas”

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Fonte: www.google.com.br/search?rlz=1C1NHXL_pt-BRBR779BR779&tbm=isch&sa=1&ei=1d2jWrn-
Lob8wQS_9ofYBg&q=revistas+masculinas&oq=revistas+masculinas&gs

Ao fazer uma rápida consulta em sites de busca sobre “revistas femininas” e


“revistas masculinas”, percebe-se uma semelhança entre as capas das revistas
apresentadas pelas figuras 3 e 4. As mulheres são aparecem de forma sensual e
com o corpo, ou parte dele, à mostra. As revistas femininas, normalmente,
apresentam a imagem feminina associada às questões estéticas. Já as revistas
masculinas, apresentam a imagem feminina associada à sexualidade e sedução. Em
ambos os casos há uma erotização e objetificação da mulher. No primeiro ela deve
atender uma demanda de corpo perfeito, no segundo este corpo deve estar a
serviço do homem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após essa exposição, compreende-se que o corpo, no decorrer da história,


sempre foi alvo de controle. E, o corpo da mulher fica duplamente marcado no lugar
de submissão, pois recai sobre ele a moral de uma sociedade patriarcal, que coloca
o feminino em uma condição de subalterna ao masculino. Portanto, o corpo feminino
fica aprisionado na relação Foucaultiana de saber/poder, que o erotiza, desqualifica
sua sexualidade e o estigmatiza na condição de objeto de prazer do homem.
Há um discurso hegemônico, misógino e ideológico em relação aos corpos
femininos, que perpetua a divisão entre homens e mulheres, representando sempre
o feminino na sua condição de “natureza”.

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A experiência feminina é posta de uma forma em que “a mente e corpo, a


mente e a matéria, são associadas, e, juntos são explorados” (DIMEN, 1987, p. 45).
Na perspectiva da erotização, ela não ocorre ao acaso, ao contrário ela enfatiza e
atende a uma sociedade patriarcal, que objetifica a mulher através das mensagens
expressas em seus veículos de comunicação. É buscando compreender os
mecanismos de controle sobre os copos femininos que as mulheres buscam resistir
e enfrentar o sistema de dominação do patriarcado.

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