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CRIMES DE TRÂNSITO: A APLICABILIDADE DO DOLO

Jefferson Bissat Amim1


Marco Aurélio Guilherme Flores2

RESUMO

Este artigo traz uma breve discussão sobre a importância da aplicabilidade da figura do dolo
eventual ao longo dos delitos que envolvem homicídio no trânsito em razão de existir uma
expressiva forma de configuração de ameaça a um dos principais bem jurídicos tutelados
pelo ordenamento jurídico brasileiro, o qual apresenta previsão estabelecida ao longo do
artigo 5º, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que é a “vida”,
dessa forma há apresentação da justificativa de que a ausência da realização de uma
punição com maior grau de severidade aqueles agentes que tenham agido de forma
irregular no ambiente correspondente ao Trânsito acaba por ocasionar uma situação de
impunidade, o que gera uma maior situação de mortes em tal meio, em razão de a
sociedade não esteja desfrutando de uma situação de seguridade.

Palavras-chaves: Dolo. Culpa. Crimes de Trânsito.

ABSTRACT

This article presents a brief discussion about the importance of the applicability of the figure
of eventual deceit throughout the crimes involving traffic homicide due to the existence of an
expressive form of threat configuration to one of the main legal assets protected by the
Brazilian legal system, which presents a prediction established during article 5, caput, of the
Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, that is the "life", in this way there is
presentation of the justification that the absence of the accomplishment of a punishment with
a greater degree of severity those agents who have acted in an irregular manner in the
environment corresponding to the Traffic, end up causing a situation of impunity, which
generates a greater situation of deaths in that environment, because the society is not
enjoying a security situation.

Keywords: Fraud. Guilt. Traffic Crimes.

INTRODUÇÃO

O objetivo do presente artigo é esclarecer sobre as discussões acerca da


aplicabilidade da figura do dolo eventual ao longo dos delitos que envolvem homicídio no
trânsito em razão de existir uma expressiva forma de configuração de ameaça a um dos
principais bem jurídicos tutelados pelo ordenamento jurídico brasileiro, o qual apresenta
previsão estabelecida ao longo do artigo 5º, caput, da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, que é a “vida.

1 Servidor Público Federal, Graduado em Administração com ênfase em Comércio Exterior e graduando em
Direito, ambas pela Faculdade da Amazônia Ocidental – FAAO, atuou como Diretor de Secretaria do 2º
Juizado Especial Cível da Comarca de Rio Branco, bem como atuou na Coordenação de Gestão da Qualidade
da Diretoria de Organizações em Centrais de Atendimento, da Secretaria de Estado da Gestão Administrativa
do Acre, exerceu ainda a Diretoria de Transportes da Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito -
RBTRANS e atualmente é Chefe do Gabinete Institucional do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Acre - Ifac. E-mail: amim.jefferson@gmail.com. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9826495032889144.
2 Possui graduação em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2002). Possui pós-graduação em

MBA/Direito Ambiental. Pós-graduando em MBA/Direito Civil e Processo Civil. Pós-graduado em MBA/Didática


e Docência no Ensino Superior. Pós-graduando em Direito Tributário. Instrutor/Consultor jurídico do
SEBRAE/AC. Docente na Faculdade da Amazônia Ocidental – FAAO. E-mail:
profmarcoaurelio.bef@gmail.com. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7663225736388273.
A possibilidade de ser aplicada a figura do dolo eventual ao longo dos homicídios
praticados no trânsito de modo a abordar a respeito dos crimes de trânsito e sua relação
com a dolosidade, discorrendo sobre os crimes de trânsito, sua configuração e possibilidade
de ser gerada uma punição aos sujeitos que tenham transgredido a lei e tenham cometido
tais modalidades de delitos e efetuando a abordagem a respeito do tema em análise
específica que trata sobre o reconhecimento de dolo eventual ao longo da prática do
homicídio no trânsito.
Este estudo é importante para a exploração do instituto cada vez mais recorrente que
é o dolo eventual, notadamente, à sua aplicabilidade nos crimes de trânsito como forma de
enrijecimento da penalidade a ser imputada aos transgressores da norma jurídica que,
consciente do risco, tomam a decisão de praticar ações que venham atentar contra a vida.
A obtenção de informações se deu através do levantamento bibliográfico em livros,
revistas, periódicas e internet, que foram usados como ferramentas teóricas de investigação,
elaboração dos instrumentos necessários à coleta de dados e aplicação dos instrumentos,
posteriormente, foi realizada a tabulação dos dados coletados e sistematização das
informações coletadas na elaboração do relatório, onde foram constituídas as análises
pertinentes à problemática de investigação, bem como houve o emprego do método de
análise indutiva, ocorrendo através de levantamento doutrinário, sendo apresentado vários
posicionamentos sobre o tema em apreço, inclusive leituras de artigos e apresentação de
jurisprudências específicas sobre o caso.
Para atingirmos as metas pretendidas neste artigo, foi dividido em três tópicos: o
primeiro aborda os crimes de trânsito e a questão da dolosidade, o segundo trata sobre os
crimes de trânsito, concluindo a pesquisa com o terceiro, que expõe sobre o homicídio no
trânsito e o dolo eventual.

1. CRIMES DE TRÂNSITO E A QUESTÃO DA DOLOSIDADE

O novo Código Brasileiro de Trânsito surgiu como sendo uma medida inovadora na
tipificação de condutas antes consideradas como meras contravenções penais. A Lei
9.503/97, que dispõe sobre as infrações, penalidade e crimes de trânsito, tem sido motivo de
muitas críticas doutrinárias e controvérsias tanto no que se refere à elaboração das normas
e às penas aplicadas como no tocante à excessiva preocupação na tipificação de condutas
e aplicação das penas em detrimento do rigor nas medidas de prevenção nas infrações de
trânsito.
Apesar de tais controvérsias, não se pode negar o mérito da nova lei como
importante instrumento regulador de prevenção e combate aos abusos praticados no
trânsito. A discussão em torno de sua eficácia traduz a real preocupação dos doutrinadores
no sentido de que esta possa vir a ser cada vez mais aperfeiçoada, tornando-se verdadeiro
instrumento de segurança no confuso trânsito das cidades brasileiras.
O deslocamento da competência para julgar determinados tipos de delitos de
trânsito, envolvendo as classificações entre a culpa e o dolo afirma-se como a maior das
controvérsias, razão pela qual tentaremos discorrer sobre essa situação neste artigo
científico.
A figura do Dolo apresenta sua previsão ao longo do artigo 18, inciso I, do Código
Penal Brasileiro e teve sua origem no Direito Romano, que tinha por conceito, a conduta ou
ação intencional, consciente e delituosa que feria a moral e as leis estabelecidas pelo
Estado.
A maior parte dos crimes denominados na Codificação Brasileira são dolosos, de
acordo com o disposto citado anteriormente do Código Penal, o preceito é que todo crime é
doloso, somente sendo possível a punição pela prática culposa, quando expressamente
previsto em lei. Ou seja, o dolo é a regra e a culpa é a exceção. O dolo nada mais é que, a
vontade consciente de fazer os elementos entendidos e constituídos em um tipo penal.
Nucci (2010, p. 109) em comentário acerca do Código Penal brasileiro traz a
definição de culpa em seu artigo 18, inciso II, consoante se extrai in verbis: “Art. 18, II, diz-se
o crime: culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou
imperícia”.
Assim, para caracterizar um crime como culposo é necessário que o agente, sem a
intenção de praticar o crime, não tenha agido com o cuidado necessário diante de
determinada conduta e o seu ato involuntário tenha gerado efeitos antijurídicos.
É essencial para configuração do crime culposo a violação do dever de cautela, que
embora apesar de se anteceder a regras implícitas da sociedade, necessita ponderar as
características particulares de cada indivíduo ao agir, a conjuntura por ocasião da situação
vivenciada, enfim, de acordo com o contexto jurídico e social de cada sujeito, em
consonância com o critério do homem-médio, caracterizará a configuração, ou não, de culpa
no caso em exame.
No tipo de injusto culposo este não se configura pela tão somente ação de resultado,
mas com o deslinde em que a ação se realiza, e da inobservância do dever de cautela.
A quebra do dever de cuidado constitui-se, portanto, na inobservância de regras
moralmente ou legalmente impostas ao indivíduo, ao realizar determinadas atividades que
envolvem certo grau de risco.
Obviamente que as circunstâncias em que ocorreu o fato deverão ser levadas em
consideração, bem como as características pessoais de cada sujeito, a fim de estabelecer a
culpa.
Damásio Evangelista de Jesus (2010, p. 68) conceitua que o Dolo Direto, também
denominado dolo determinado, é aquele onde a vontade do agente é voltada a um
determinado resultado.
Ainda segundo Damásio (2010, p. 70) há fases de realização da ação:
a) representa e antecipa mentalmente o resultado por ele pretendido;
b) escolhe os meios necessários a fim de alcançar o resultado e;
c) reflete sobre os efeitos concomitantes, que dizem respeito à utilização dos meios
por ele escolhidos, a fim de consumar a infração penal, já representada mentalmente.
Com relação ao tema ora expresso, bem como a respeito da questão do
reconhecimento da figura jurídica do Dolo Eventual na aplicabilidade da lei penal ao caso
em concreto, tem-se entendimento firmado em jurisprudência do STF (HC 107.801, min. rel.
Luiz Fux, julgado em 06.09.2011, STF), veja-se que:

PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO


QUALIFICADO A TÍTULO DE DOLO EVENTUAL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA
HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBRIAGUEZ
ALCOÓLICA. ACTIO LIBERA IN CAUSA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO
ELEMENTO VOLITIVO. REVALORAÇÃO DOS FATOS QUE NÃO SE CONFUNDE
COM REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ORDEM
CONCEDIDA.
1. A classificação do delito como doloso, implicando pena sobremodo onerosa e
influindo na liberdade de ir e vir, mercê de alterar o procedimento da persecução
penal em lesão à cláusula do due processo flaw, é reformável pela via do habeas
corpus.
2. O homicídio na forma culposa na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do
CTB) prevalece se a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso decorre de
mera presunção ante a embriaguez alcoólica eventual.
3. A embriaguez alcoólica que conduz à responsabilização a título doloso é apenas a
preordenada, comprovando-se que o agente se embebedou para praticar o ilícito ou
assumir o risco de produzi-lo.
[...]
8. Concessão da ordem para desclassificar a conduta imputada ao paciente para
homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB),
determinando a remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Guariba/SP. (HC
107.801, min. rel. Luiz Fux, julgado em 06.09.2011, STF). (STF, 2018a).

Observa-se que o Supremo Tribunal Federal na efetuação do julgamento do HC


107.801 buscou estabelecer o enquadramento do dolo eventual e da culpa consciente em
suas devidas posições, justamente no intuito de gerar um precedente de aplicação para que
não haja objeção na utilização devida dos referidos institutos jurídicos.
O conceito e a caracterização do dolo eventual não evoluíram tanto com o passar de
mais de um século a ponto de acabar com esse “fantasma” descrito pelo referido jurista,
permanecendo, ainda, o dolo eventual como uma figura jurídica indefinida, já que não há
consenso doutrinário acerca do tema, que ainda não é efetivamente posto em prática de
forma uniforme nos tribunais.
Conforme foi observado a decisão tomada pela Primeira Turma do STF efetuou a
desclassificação da conduta atribuída ao acusado de ter praticado homicídio doloso para a
de homicídio culposo na direção de veículo automotor, justamente por compreender que a
responsabilidade de maneira dolosa tem de ser necessária para o sujeito que esteja em
situação de embriaguez para que possa praticar o crime.

2. CRIMES DE TRÂNSITO

É importante destacar que ao longo dos últimos tempos os acidentes no trânsito


brasileiro vêm ganhando destaque, principalmente em razão de terem sido provocados por
conta do uso de drogas, na maioria dos casos as lícitas, como vem a ser o caso do uso de
bebidas alcoólicas, havendo com isso um grande número de pessoas mortas em
decorrência de acidentes automobilísticos (JORNAL DA USP, 2018).
Nesse contexto fático a sociedade clama por maior segurança e por uma melhor
aplicação da lei pelos agentes do Estado Juiz, assim diversos Tribunais brasileiros no
sentido de satisfazer a vontade popular buscam efetivar decisões voltadas a trazer a
punibilidade dos indiciados.
Conforme entendimento estabelecido pelo Código de Trânsito Brasileiro, o delito de
trânsito contra a vida, o qual é estipulado no art. 302 do CTB só virá a ser desta forma
considerado caso ocorra na modalidade culposa, em acordo com o expresso no dispositivo
legal. Caso venha a ser apurado o dolo eventual no decorrer da fase do inquérito policial ou
na fase de instrução processual, o delito em tela passará a ser o art. 121 do CTB, ou seja, o
delito de homicídio na modalidade dolosa.
O Código de Trânsito Brasileiro teve a sua finalidade voltada a trazer a
regulamentação de todas as formas de direção de veículo automotor nas vias terrestres,
dessa forma através da imposição de medidas desde as administrativas até penais,
conforme a conduta efetuada pelo agente seja alguma modalidade de infração ou alguma
modalidade de crime.
Em razão de efetuar a formação do presente trabalho de grau objetivo será tratado
sobre as três principais ações delituosas praticadas com veículo automotor, sendo que os
números de acidentes de trânsito são elevados nelas, são:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:


Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
§ 1º No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é
aumentada de um terço à metade, se o agente:
I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;
II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;
III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do
acidente;
IV - no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de
transporte de passageiros.
§ 3º Se o agente conduz veículo automotor sob a influência de álcool ou de qualquer
outra substância psicoativa que determine dependência:
Penas - reclusão, de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se
obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
[...]
Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em
razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine
dependência:
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se
obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
§ 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por:
I - Concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou
igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou
II - Sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo CONTRAN, alteração da
capacidade psicomotora.
§ 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de
alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de
prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova.
§ 3º O CONTRAN disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de
alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo.
[...]
Art. 308. Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida,
disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de
perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade
competente, gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada:
Penas - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e suspensão ou proibição
de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. (CTB, 2018,
grifo nosso).

Observa-se que a denominação “culposo” foi especificamente destacado no artigo


302 do Código de Trânsito Brasileiro supramencionado, haja vista que na culpabilidade
existe um empecilho oriundo de divergências existentes ao longo de decisões formadas em
tribunais brasileiros. Observando que tal divergência influi diretamente no que se refere à
competência de processar e julgar determinados casos que envolvem delitos de trânsito,
pois caso verifique que ocorre dolo eventual e o crime seja doloso em casos de homicídio
praticado sobre direção automotora, o foro competente de julgo é o Tribunal do Júri, todavia
se for considerado culposo o foro competente será a vara de delitos e acidentes de
trânsitos, caso existentes no Estado.
Importante destacar que a culpa de forma básica ocorre no momento em que o
indivíduo tem a sua ação com ausência de cautela necessária a um homem médio, ou
quando tem a sua ação efetuada de maneira errônea na forma como a sociedade espera.
A legislação pátria brasileira, em especial a cível no artigo 186 traz a definição
“aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Todavia a Legislação Penal Brasileira define o Crime culposo, conforme o art. 33,
como sendo:

Art. 33. Diz-se o crime:


[...]
II - Culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção, ou
diligência ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias,
não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que
não se realizaria ou que poderia evitá-lo (CTB, 2018).

A legislação busca efetuar abordagem de forma cautelosa com relação ao tema em


apreço, uma vez que trata essencialmente da questão do dever de agir do indivíduo, nessa
perspectiva, Nucci (2010, p. 210) efetua a definição de culpa como sendo “o comportamento
desatencioso do agente, voltado a determinado objetivo seja lícito ou ilícito, produzindo um
resultado ilícito, embora não desejado, porém previsível, que podia ter sido evitado”.
Nota-se que em razão da motivação das decisões judiciais está alicerçada na
aplicação de dispositivos, os quais coadunam com o entendimento judicial aferido na
sentença. Essa motivação é a comunhão entre a expressão da lei e a forma de pensamento
subjetiva do magistrado sobre o seu entendimento em cada caso concreto.
Nesse sentido, Marcelo Almeida (2010, p. 18), Afirma:

A questão tem inegável relevância no âmbito jurídico, porque o enquadramento legal


utilizado pelo magistrado para amparar uma condenação não encontra amparo na
boa doutrina, tão somente em seu desejo pessoal de que seja feita “justiça”
(entenda)-se como “justiça”, neste caso, a condenação do réu a uma pena severa,
porém maior do que a prevista na legislação para a conduta praticada pelo autor,
entretanto a necessidade não está na criação de leis menos severas ou mais
brandas e sim em uma proporção educacional quanto ao trânsito em sua essência,
almejando a aplicação sábia e necessária a toda sociedade.

O clamor social por justiça apresenta direta influência na formação de um magistrado


e em geral dos entendedores e demais aplicadores da lei, o que perfaz certa tendência de
pensamento a estender a conceituação do dolo eventual, formando assim o entendimento
do juízo e de sua aplicabilidade ao caso em espécie.
Ocorre que a aplicação sábia da lei consiste melhor forma possível de efetivar a
justiça, bem como de dirimir os problemas decorrentes da prática delituosa na formação
social. Importante asseverar que com relação ao clamor social na aplicação da lei e punição,
tem-se jurisprudência a seguir:

DOLO EVENTUAL - ACIDENTE DE TRÂNSITO. Para atender reclamos sociais


contra aquilo que denominam de impunidade pelas penas brandas em acidente de
veículo, a jurisprudência tem aceitado a tese do dolo eventual em que o agente,
depois de beber grande quantidade de cerveja, em casa noturna, sai em velocidade
elevada e abalroa outro veículo estacionado, ferindo várias pessoas. Apelo
improvido. Condenação mantida. (Apelação Crime nº 694035692, 4ª Câmara
Criminal do TJRS, Carazinho, Rel. Des. Érico Barone Pires, 23.06.94). (TJ/RS,
2018).

Assim podemos constatar o enrijecimento do Poder Judiciário no sentido de admitir a


aplicabilidade do instituto do dolo eventual para quem assume o risco de ingerir grande
quantidade de álcool e, em velocidade elevada, fere outras pessoas, de modo a afastar a
sensação de impunidade em relação aos crimes de trânsito e, por conseguinte, garantindo a
tutela e a proteção do bem jurídico da vida.
Nesse sentido, destaca-se pensamento doutrinário formulado por Nelson Hungria
(1958, p. 544):

[...] principalmente na justiça de primeira instância, há uma tendência para dar


elasticidade ao conceito do dolo eventual. Dentre alguns casos, a cujo respeito
fomos chamados a opinar, pode ser citado o seguinte: três rapazes apostaram e
empreenderam uma corrida de automóveis pela estrada que liga as cidades
gaúchas de Rio Grande e Pelotas. A certa altura, um dos competidores não pôde
evitar que o seu carro abalroasse violentamente com outro que vinha em sentido
contrário, resultando a morte do casal que nele viajava, enquanto o automobilista era
levado em estado gravíssimo, para um hospital, onde só várias semanas depois
conseguiu recuperar-se. Denunciados os três rapazes, vieram a ser pronunciados
como co-autores de homicídio doloso, pois teriam assumido ex ante o risco das
mortes ocorridas. Evidente o excesso de rigor: se estes houvessem previamente
anuído a tal evento, teriam, necessariamente, consentido de antemão na eventual
eliminação de suas próprias vidas, o que é inadmissível. Admita-se que tivessem
previsto a possibilidade do acidente, mas, evidentemente, confiariam em sua boa
fortuna, afastando de todo a hipótese de que ocorresse efetivamente. De outro
modo, estariam competindo, in mente, estupidamente, para o próprio suicídio.

Em acordo com a posição supracitada a extensão da aplicação do dolo eventual está


vinculada a noção de risco, desta forma o aumento de precipitação traz em si um
conhecimento de eventualidade, o que vem a ser abrangido pela teoria penal do Dolo
Eventual, o qual atribui à prática de dolo na conduta perpetrada.
A Lei Federal nº 13.546/2017, publicada em 20.12.2017, adveio com algumas
inovações aos artigos 291, 302, 303 e 308, do Código de Trânsito – CTB, que desde a
edição da Lei Federal nº 11.705 /2008, passou por várias alterações quase que na
totalidade no que diz respeito à combinação entre direção de veículo automotor com álcool e
drogas.
O objetivo primordial é mitigar os índices elevados de acidentes de trânsito,
positivando norma rígida em relação a imprudência atinente ao uso de bebidas alcóolicas e
similares e a condução de veículos automotores.
Foi acrescido no artigo 291, o § 4º, que traz em seu bojo a disciplina do artigo 59 do
CP: “§ 4º. O juiz fixará a pena-base segundo as diretrizes previstas no art. 59, do Decreto-
Lei no 2848, de 7/12/1940 (Código Penal Brasileiro), dando especial atenção à culpabilidade
do agente e às circunstâncias e consequências do crime”. (CPB, 2018).
As inovações trazidas em relação aos artigos 302 e 303, do Código de Trânsito
Brasileiro, foram no tocante às margens penais de atos realizados por sujeito sob efeito de
álcool ou qualquer outra sustância psicoativa (drogas), conferindo-lhe a tipificação de
homicídio culposo e lesão corporal culposa.
Assim o homicídio culposo no trânsito, realizado nestes termos passa a ter a pena de
reclusão de cinco a oito anos, sem prejuízo da medida restritiva prevista n § 3º, artigo 302
do Código de Trânsito Brasileiro.
Importante destacar que a majoração da margem penal se refere quando o homicídio
culposo é cometido por pessoa sob efeito de álcool ou drogas.
Por fim, o artigo o artigo 308 do Código de Trânsito Brasileiro, passou a observar a
tipificação das manobras de “exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo
automotor, não autorizada pela autoridade competente, gerando situação de risco à
incolumidade pública ou privada”. (CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO, 2018).
Anteriormente ao advento da Lei Federal nº 13.546/2017, só havia previsão para
corridas, disputas ou competições automobilísticas nas mesmas condições, de outra, as
penas para suas formas simples e qualificadas continuam as mesmas.
Por derradeiro, impende ressaltar que o delito de embriaguez sob direção de veículo
automotor, previsto no bojo do artigo 306 do Código de Trânsito, não sofreu alterações de
modo que a penalidade consiste na detenção de seis meses a três anos, além das medidas
restritivas previstas.

3. O HOMICÍDIO NO TRÂNSITO E O DOLO EVENTUAL

É preciso, inicialmente destacar que a proteção à vida vem a ser a base dos Direitos
e Garantias fundamentais estabelecidos à figura da pessoa humana, dessa forma, este vem
a ser o mais fundamental dos direitos, uma vez que todos giram em torno dele, devendo ter
uma imposição absoluta por parte do Direito, mesmo que a sociedade apresente um
desvalor perante determinado indivíduo, entretanto a figura Estatal deverá ver de forma
objetiva.
O crime de homicídio vem a ser considerado um delito comum, haja vista o referido
tipo penal poder ser executado por qualquer pessoa, tanto de forma individual quanto em
concurso de agentes, não necessitando para ser configurado alguma qualidade especial
quanto ao agente ativo, inclusive este pode vir a agir tanto por ação individual quanto por
meio da utilização de materiais diversos na busca pela execução do delito.
A diferenciação entre o dolo eventual e culpa consciente, exigem elevada
capacidade de percepção, pois, em ambas as situações o sujeito tem a capacidade de
antever o risco do resultado de sua atitude, muito embora a culpa consciente não o admita
como possível e, no dolo eventual, admita a possibilidade de se concretizar, sendo-lhe
indiferente.

Embora o dolo eventual guarde certa similitude com a culpa consciente há pontos de
dissemelhança importantes. "Em ambos há a previsão do resultado antijurídico. Só
que enquanto no dolo eventual o agente empresta anuência à realização do
resultado, preferindo prosseguir na ação, embora arriscando-se a produzi-lo, na
culpa consciente o agente não aceita a realização do evento: repele mentalmente o
resultado previsto, agindo na esperança ou na persuasão de que o evento não irá
verificar-se. Na culpa consciente há uma previsão negativa. O evento não se
verificará. No dolo eventual, uma previsão positiva: é possível que se verifique o
evento". (SCHECAIRA apud JUNIOR, 2002, p. 47).

Face a esta complexidade, em exame de casos concretos, a defesa busca junto aos
tribunais, descaracterizar o crime doloso para culposo, conforme a jurisprudência a seguir:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO


PENAL. HOMICÍDIO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. DENÚNCIA NA
MODALIDADE DOLOSA. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. PRETENSÃO DE
DESCLASSIFICAÇÃO PARA DELITO CULPOSO. EXAME DO ELEMENTO
SUBJETIVO. ANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICOPROBATÓRIA. INVIABILIDADE DA
VIA. NECESSIDADE DE ENFRENTAMENTO INICIAL PELO JUÍZO COMPETENTE.
TRIBUNAL DO JÚRI. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. I - Não se admite habeas
corpus substitutivo de recurso extraordinário, sob pena de ofensa ao regramento do
sistema recursal previsto na Constituição Federal. II - Apresentada denúncia por
homicídio na condução de veículo automotor, na modalidade de dolo eventual,
havendo indícios mínimos que apontem para o elemento subjetivo descrito, tal qual
a embriaguez ao volante, não há que se falar em imediata desclassificação para
crime culposo antes da análise a ser perquirida pelo Conselho de Sentença do
Tribunal do Júri. III - O enfrentamento acerca do elemento subjetivo do delito de
homicídio demanda profunda análise fático-probatória, o que, nessa medida, é
inalcançável pela via do habeas corpus. IV - Writ não conhecido. (STF. HABEAS
CORPUS 131.029 – RJ. Relator Ministro Luiz Fux). (STF, 2018b).

O caso em epígrafe traz uma denúncia sobre um homicídio com veículo automotor,
na modalidade do dolo eventual, que resultou na morte da vítima.
No entanto, não foi aceita a desclassificação do crime doloso para o culposo, tendo a
Turma não conhecido pela sua maioria de composição pela impetração do HC, entendendo
o Ministro Luiz Fux, pela existência de indícios comprobatórios mínimos acerca da denúncia,
não sendo possível a sua desclassificação para crime culposo, sem a ocorrência da análise
prévia do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri.
Em Brasília, no Distrito Federal, um motorista foi sentenciado por homicídio doloso,
na modalidade de dolo eventual, por ceifar a vida uma idosa, pois estava em direção de
veículo automotor e em alta velocidade e, não bastasse, sob efeito de álcool. A sua defesa
requereu a nulidade da condenação, contudo, o STF negou o HC demandado, conforme a
seguinte jurisprudência:

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE HOMICÍCIO PRATICADO NA CONDUÇÃO


DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO
PREVISTO NO ARTIGO 302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. DEBATE
ACERCA DO ELEMENTO VOLITIVO DO AGENTE. CULPA CONSCIENTE X DOLO
EVENTUAL. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. CIRCUNSTÂNCIA QUE
OBSTA O ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO. REEXAME DE PROVA. ORDEM
DENEGADA. I - O órgão constitucionalmente competente para julgar os crimes
contra a vida e, portanto, apreciar as questões atinentes ao elemento subjetivo da
conduta do agente aqui suscitadas – o Tribunal do Júri - concluiu pela prática do
crime de homicídio com dolo eventual, de modo que não cabe a este Tribunal, na via
estreita do habeas corpus, decidir de modo diverso. II - A jurisprudência desta Corte
está assentada no sentido de que o pleito de desclassificação de crime não tem
lugar na estreita via do habeas corpus por demandar aprofundado exame do
conjunto fático-probatório da causa. Precedentes. III – Não tem aplicação o
precedente invocado pela defesa, qual seja, o HC 107.801/SP, por se tratar de
situação diversa da ora apreciada. Naquela hipótese, a Primeira Turma entendeu
que o crime de homicídio praticado na condução de veículo sob a influência de
álcool somente poderia ser considerado doloso se comprovado que a embriaguez foi
preordenada. No caso sob exame, o paciente foi condenado pela prática de
homicídio doloso por imprimir velocidade excessiva ao veículo que dirigia, e, ainda,
por estar sob influência do álcool, circunstância apta a demonstrar que o réu aceitou
a ocorrência do resultado e agiu, portanto, com dolo eventual. IV - Habeas Corpus
denegado. (STF, 2018c).

Neste caso ficou claro o posicionamento da Suprema Corte no sentido de que é


aplicável o dolo eventual em razão da conduta de dirigir veículo automotor com velocidade
excessiva e sob influência de álcool, circunstância a corroborar com a tese de que o réu
aceitou a ocorrência do resultado e agiu, assim, com dolo eventual.
Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça manifestou o entendimento, no que diz
respeito à aplicação do instituto do dolo eventual ou culpa consciente, que é necessário
ponderar os elementos e circunstâncias quanto a conduta:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. HOMICÍDIO SIMPLES. DESCLASSIFICAÇÃO.


HOMICÍDIO CULPOSO. CRIME DE TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL.
CIRCUNSTÂNCIAS QUE REVELAM A OCORRÊNCIA DE DOLO EVENTUAL.
IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DO JÚRI.
DILAÇÃO PROBATÓRIA. JULGAMENTO REALIZADO. SOBERANIA DOS
VEREDICTOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. HABEAS
CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. É admissível, em crimes de homicídio na direção
de veículo automotor, o reconhecimento do dolo eventual, a depender das
circunstâncias concretas da conduta. 2. Na espécie, as instâncias de origem
concluíram que o fato de o réu dirigir embriagado veículo automotor em via pública,
fazendo ziguezague na pista e, ao atingir a vítima, não prestar socorro, são
circunstâncias que indicam que o paciente agiu com dolo eventual. 3. Infirmar a
conclusão alcançada pela Corte de origem demandaria necessária dilação
probatória, iniciativa inviável no âmbito desta ação constitucional. 4. Na hipótese em
apreço, submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, o paciente foi condenado pela
prática de homicídio doloso simples, o que impede esta Corte Superior de Justiça de
desclassificar a sua conduta para a modalidade culposa, em respeito à soberania
dos veredictos. 5. Habeas Corpus não conhecido. (STJ. HC 226338 SC
2011/0284099-4, Relator Ministro Rogerio Schietti Cruz). (STJ, 2018).

Observamos que foi sustentado o entendimento pela aplicação do dolo eventual,


pelo qual o condenado pelo crime de homicídio simples, encontrava-se conduzindo veículo
automotor em via pública, sob efeito de álcool, e acabou por atingir uma pessoa, ceifando-
lhe a vida.
Com vistas a mitigar estes conflitos quanto à aplicação do instituto do dolo eventual
ou culpa consciente, são utilizadas as máximas do “in dubio pro reo 3 ” e “in dubio pro
societate4”, princípios gerais do Direito Penal.
As decisões baseadas no princípio “in dubio pro reo” têm como interpretação o fato
que, teoricamente é impossível ser provado à vontade do agente delitivo no momento do
crime, e, neste caso, deve-se aplicar a conduta como sendo culpa consciente, pela qual é
mais favorável ao réu.
Porém, conforme a jurisprudência acima colacionada, verificamos decisões, em que
é utilizado o princípio “in dúbio pro societate”, notadamente nos casos de crimes de trânsito
por embriaguez, pelos quais a sociedade se sente indignada em saber que algumas
pessoas, parecem não se importar com o perigo de dirigir, tendo ingerido bebida alcoólica.
A figura jurídica penal do Dolo Eventual está vinculada a questão de previsibilidade
do resultado operado em face de uma conduta perpetrada pelo agente delituoso, uma vez
que ele assumiu o risco de produção de um resultado negativo ao plano externo.
A previsão do resultado surge em razão da natureza formativa do delito, bem como
sobre a ação do agente que prevê a possibilidade de ocorrência de um certo resultado, seja
este positivo seja negativo, em decorrência da ação efetuada por aquele.
É importante analisar que ao utilizar substância que perfaça embriaguez alcoólica,
seja estando relacionada a questão da ingestão de álcool propriamente dito ou substância
com efeitos análogos, deve ser levada em conta a questão da embriaguez completa ou
incompleta, e da ocorrência de caso fortuito ou de força maior, entretanto a embriaguez
proveniente de forma dolosa, também conhecida como preordenada não afasta a
culpabilidade, haja vista está expresso claramente ao longo da teoria da “actio libera in
causa”5. Devendo o acusado responder por crime doloso.
A embriaguez completa ou incompleta quando efetuada na busca por levar o agente
a prática de um delito, ela é apenas uma causa de levar o agente a ser majorada a sua

3 In dubio pro reo é um princípio fundamental em direito penal que prevê o benefício da dúvida em favor do réu,
isto é, em caso de dúvida razoável quanto à culpabilidade do acusado, nasce em favor deste, a presunção de
inocência. (BADARÓ, 2008, p. 17).
4 In dubio pro societate é um princípio do direito penal que, em determinadas fases do processo penal – como no

oferecimento da denúncia e na prolação da decisão de pronúncia – inverte-se a lógica: a dúvida não favorece o
réu, e sim a sociedade. (BADARÓ, 2008, p. 17).
5 Actio libera in causa ocorre todas as vezes em que em um segundo momento um crime fosse praticado em

estado de incapacidade, que teria sido gerado em um primeiro momento como consequência de alguma
atitude do agente que o privasse parcial ou completamente de seus sentidos. (BETTIOL, 1969, p. 65).
pena, pois ele utiliza do meio para concretizar sua ação criminosa, o que seria diferente se a
embriaguez fosse proveniente de um caso fortuito ou de forma maior, dessa maneira se ela
fosse completa eximiria o agente de pena, pois seria uma excludente de culpabilidade, haja
vista o agente não ter a possibilidade de ser punido.
A partir do instante em que o agente age compelido por uma embriaguez, mas esta é
proposital ao cometimento de um dado delito no trânsito, como vem a ser o caso de
atropelamento proposital de um pedestre e/ou ciclista, o que faz com que o agente venha a
responder ao processo por crime doloso e na Vara do Tribunal do Júri, diferentemente de
caso ele tenha cometido um delito por embriaguez acidental completa ou parcial,
ressaltando que quando a embriaguez ocorre de forma acidental, ela faz por gerar uma
diminuição da pena aplicada ao caso concreto em razão de estar devidamente expressa em
lei.
Com relação a possibilidade de ocorrência da configuração de Dolo Eventual na
direção de veículo automotor, o que afasta a aplicação do art. 302, uma vez que a partir da
existência de tal modalidade dolosa, não há que se falar em forma culposa do delito em tela,
assim ao ser afastada a culpa, não pode o agente delituoso ser condenado como se tenha
cometido a conduta de forma dolosa, dessa maneira, não há intenção por parte do agente
em cometer determinada conduta, muito menos a intenção em assumir a produção de um
dado resultado na esfera jurídica existente.
Quando há caso em que o agente imprime velocidade incompatível com a definida
na via de tráfego terrestre, segundo as normas legais, o motorista acaba por assumir a
produção de um dado resultado, mesmo que este seja imprevisível a quem esteja agindo.

CONCLUSÃO

Ao ser compreendido que a figura do dolo está fundamentada com base na


existência de uma vontade do agente em realizar a execução de um determinado delito, o
dolo eventual, vem a ser uma das modalidades de configuração da ocorrência de dolo,
dessa forma ocorre a partir do momento em que o agente vem a assumir o risco de
produção de um resultado em razão de dar continuidade a sua ação já desenvolvida na
prática concreta. Todavia, com relação a culpa consciente, o condutor encontra-se
consciente da prática de sua ação, entretanto acredita que em razão de motivos diversos
pode o resultado vir a ser por outro lado, na culpa consciente, o condutor também é ciente
do resultado que poderá causar com sua ação, mas acredita fielmente que conseguirá evitá-
la.
Com relação aos crimes ocorridos no ambiente de trânsito, vale enfatizar que a figura
do dolo eventual tem ocasionado uma série de polemicas a nível doutrinário e
jurisprudencial, conforme já mencionado durante a introdução do presente trabalho, tal
discussão vem a ser oriunda do aspecto de classificação, haja vista, em regra, o conteúdo
disposto durante o artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro apresentar a determinação de
que os crimes que estejam envolvendo situações de configuração de homicídio no trânsito
sejam considerados como sendo culposos.
Fato é que os campos jurisprudencial e doutrinário, vêm apresentando o
reconhecimento da ocorrência da prática de dolo eventual durante os crimes que envolvem
homicídio no trânsito, haja vista ocorrer o entendimento de que aquele que esteja
responsável pela condução de seu veículo esteja dirigindo sob influência do uso de álcool
ou de substâncias entorpecentes, dessa forma vem a praticar a disputa conhecida como
“racha”, ou outras formas de direção perigosa, as quais perfazem por imprimir uma
velocidade considerada como sendo incompatível com a segurança do trânsito, assim,
através de sua ação vem a assumir completamente o risco de produção de um dado
resultado ao bem jurídico posto sobre proteção na situação fática em concreto.
Assim, o objetivo que vem a ser almejado através de tal classificação, é apresentar
um trato baseado na maior severidade a serem aplicadas nas penas que levem a ocorrência
da prática de homicídio no ambiente de trânsito, especialmente com relação as situações
anteriormente mencionadas ao longo do presente trabalho, haja vista o maior objetivo seja o
de levar ao resguardo da vida e da integridade pessoal da coletividade.
Por fim, compreende-se que não obstante houver uma regra estabelecida ao longo
do artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro para que ocorra a determinação de que o
crime de homicídio no trânsito seja considerado como sendo de natureza jurídica culposa,
tanto a doutrina como a jurisprudência apresentam sinalização para a possibilidade de
ocorrerem delitos de homicídio no trânsito que sejam categorizados como dolo eventual, o
que faz com que seja influenciado no seu processamento e julgamento, para que seja o
condutor processado e julgado perante uma vara pertencente ao Tribunal do Júri, de forma
a ser afastado tal regra disposta ao longo do artigo 302 do CTB.

REFERÊNCIAS

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