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Corazonada
Edição Digital
2015
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Vários autores.
ISBN: 978-85-69083-00-9
14-10784 CDD-302.231
Caminhos Transmídia
Rodolfo Oliveira
Definindo Transmídia
Rodolfo Oliveira
STORYTELLING
ENGAJAMENTO
O Engajamento na EraTransmídia
Solange Uhieda e Dimas Dion
Entendendo o que é engajamento
Rute Elias
Rosalves Sudário
Mariel Lobo de Souza
Dimas Dion
INTERAÇÃO
TECNOLOGIA
Criatividade e inovação
Icaro de Abreu
BIBLIOGRAFIA
CAMINHOS TRANSMÍDIA
Rodolfo Oliveira (organizador)
Caminhos Transmídia
Rodolfo Oliveira
Conclusão
De onde surgiu?
Para a compreensão correta do termo e suas aplicações, é necessário entender
de onde e porque ele surgiu. Desde o surgimento da internet a relação de
consumo de informação vem se alterando. Com o crescimento abundante
recente das redes sociais, isso se tornou ainda mais relevante. O número de
informações que nos atinge por minuto aumentou drasticamente. Por
exemplo, em um minuto são postadas mais de três milhões de atualizações de
status no Facebook, criados mais de 450 mil novos tweets, subidos mais de 120
horas de vídeo no Youtube e consumidos mais de 23 mil horas de vídeo no
Netflix. Apenas com esses exemplos, vemos a complexidade de se comunicar
nos dias atuais. É preciso ser cada vez mais relevante para o
consumidor/audiência, visto que não temos apenas a concorrência de outras
marcas ou produtos de entretenimento. Hoje concorremos, mais do que nunca
pelo tempo de nossa audiência. Sua marca concorre com a foto da festa do
último final de semana postada no Facebook. Seu produto concorre com a
estreia de uma série nova, entre outros.
Não apenas a quantidade de informação que se alterou, a forma como a
consumimos também. Plataformas como Youtube, Twitter, Facebook, Netflix,
entre outras, revolucionaram a maneira de consumo de informação. Além
disso, um fenômeno recente mudou mais uma vez esse panorama: o 2nd
Screen ou segunda tela. Trata-se do comportamento de assistir TV e acessar
internet ao mesmo tempo. Em uma pesquisa realizada em 2013 pelo Google
juntamente com a Ipsos, se identificou que 63% dos consumidores brasileiros
utilizam pelo menos duas telas ao se consumir informações e 30% utilizam três
telas. 31 milhões de brasileiros possuem 3 telas (TV, smartphone e
computador). A pesquisa apontou outro dado muito relevante, em relação à
nossa exposição às mídias, onde 69% acontece por meio de telas. Esse tipo de
informação é primordial no momento de se fazer um planejamento de
comunicação.
Sendo assim, Jenkins(2009) introduziu ao mundo a cultura de convergência.
Uma época de colisão entre novas e antigas mídias, de cruzamento entre mídia
corporativa e mídia alternativa e onde a interação entre o produtor de mídia e
o poder do consumidor acontece de maneira imprevisível.
Nesse mundo, todas as histórias importantes são contadas, assim como todas
as marcas são vendidas, e o consumidor é requisitado por múltiplas
plataformas midiáticas.
Jenkins(2009), em seu conceito de cultura da convergência, visa uma definição
das transformações que aconteceram em diversos âmbitos dos meios de
comunicações, como tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais. Ele
analisa o comportamento migratório visto no público, no que se refere a
múltiplos suportes e mercados midiáticos, assim, oscilando entre diversos
canais, buscando novas experiências.
Como fundamentação dessa nova cultura, o autor utiliza três conceitos-chave:
cultura participativa, inteligência coletiva e convergência midiática.
Entende-se como cultura participativa o comportamento do consumidor em
relação às mídias, contrastando com noções passadas de passividade. Hoje é
possível considerar o consumidor também como participante da produção de
mídia.
A inteligência coletiva, expressão cunhada por Pierre Lévy (2009 apud JENKINS,
p. 30), refere-se ao fato de que o consumo transformou-se em um processo
coletivo, no qual a junção de conhecimento dos consumidores torna-se uma
fonte alternativa de poder midiático.
Já a convergência midiática é entendida pelo autor da seguinte maneira:
A convergência não ocorre por meio de aparelhos,
por mais sofisticados que venham a ser. A
convergência ocorre dentro dos cérebros de
consumidores individuais e em suas interações
sociais com outros. Cada um de nós constrói a
própria mitologia pessoal, a partir de pedaços e
fragmentos de informações extraídos do fluxo
midiático e transformados em recursos através
dos quais compreendemos nossa vida cotidiana.
(JENKINS, 2009, P. 30)
STORYTELLING
ATO 01
Certa vez li uma declaração do Gabo sobre uma página em branco. Toda vez
que a via, ele vomitava. Até que, em um outro momento, leu que o Hemingway
falou sobre isso. É preciso escrever, escrever, escrever, até que, de certa
forma, parece que as coisas saem sozinhas, como se fossem ditadas. Quem sou
eu para questionar esses caras? Mas nem sempre consigo chegar a esse
momento sublime.
Já escrevi muitos livros, contos e poesias nos meus anos de carreira. Pensava
que, conforme o tempo passasse seria mais fácil criar. A experiência agiria a
meu favor, e tudo sairia de forma orgânica de minha cabeça até meus dedos.
O que aconteceu foi exatamente o contrário. Minha experiência me trouxe
mais critério, hoje só publico se tenho certeza absoluta de que é um trabalho
minimamente decente. Afinal, não construí o nome Charles Barbosa para
destruí-lo de forma abrupta e irresponsável.
O ritual permanece, quase sagrado. Pego minha máquina, coloco uma folha
em branco nela e giro a máquina. Esse barulho soa como música em meus
ou idos.à Digitoà euà o eà e à let asà aiús ulasà CHá‘LE“à Bá‘BO“á à eà eà
levanto. Vou à minha estante, pego um vinil da parte mais alta. É lá que guardo
meus tesouros, clássicos que me acompanharam desde que vislumbrava a vida
como escritor. Escolho um: Bach, impressionante como meu trabalho rende
melhor quando o escuto. Abro uma garrafa de vinho e coloco em uma taça
posicionada estrategicamente ao lado da máquina. Abro a terceira gaveta à
minha esquerda e pego uma pequena caixa. Nela estão meus charutosà deà
es e e .àU aà ai aàespe ialà ueà o p eiàe à i haàúlti aà eàú i a à iage à
a Cuba. Corto a ponta, jogo no lixo a minha direita. Lixo esse que em poucas
horas terá diversas folhas amassadas de tentativas frustradas de se iniciar uma
nova história. Acendo, dou uma leve puxada, solto a fumaça para o alto,
respiro fundo, coloco o charuto ao lado da taça de vinho, dou um gole nele e
começo a escrever.
ATO 02
Normalmente é nesse momento que começo a escrever. Mas dessa vez não
consigo. Já tive outros bloqueios criativos, mas esse é diferente. Várias
histórias, situações, problemas inusitados passam por minha cabeça. Em
outros tempos acho que essas histórias seriam excelentes, mas hoje não acho
que tenham tempo para isso. Está todo mundo preocupado com notícias
rápidas e pílulas de informação, quem vai se preocupar com uma história que
eu escrever.
Meu prazo é curto, minha editora quer ler algo até a próxima semana. Preciso
começar. Mas como? Faço uma história de um casal de adolescentes
vampiros? Acho difícil, não conheço adolescentes e os vampiros que conheço
são do tempo do Bram Stroker. O sol já entrou pela minha janela, uma faixa de
luz reflete em minha taça vazia, o charuto já virou cinzas horas atrás e ainda
nada aproveitável no papel. A lixeira já está abarrotada. Abaixo para pegar os
papéis que estão no chão e vejo, no canto de minha mesa, a foto de Douglas,
meu neto. Apenas isso para trazer um sorriso ao meu rosto.
A sabedoria dos anos me trouxe uma consciência melhor. É preciso saber
aceitar quando se perdeu. Preciso parar um pouco, me distrair. Já sei! Vou ligar
para minha filha, quem sabe possa trazer o Douglas para passar o final de
semana comigo.
- Alô, filha!
- Oi, pai, tudo bem?
- Tudo bem sim, minha querida. Escuta, o Douglas está por ai? O que
você acha de deixar ele durante o dia comigo?
- Mas o senhor não está apertado com seu prazo? Ele não vai
atrapalhar?
- É exatamente por isso que estou ligando, preciso dele aqui para me
distrair um pouco.
- Tudo bem, ele sai da escola daqui a uma hora, já posso levá-lo direto.
O senhor faz uma comida para ele por ai?
- Claro! Fico esperando por aqui, obrigado filha. Te amo.
- Tchau, pai, te amo.
Ótimo, acho melhor fazer alguma coisa para comermos. Passei a noite toda
acordado, acho que preciso comer também. E a garrafa de vinho não ajudou
nada ao meu estômago vazio.
Pouco tempo depois, meu neto chega. Com uma mochila mais pesada que ele.
Vejo que, além do celular em sua mão, há ainda um computador e um tablet
na mochila. Mas já começo a melhorar, a primeira coisa que ele faz é me dar
um abraço apertado.
- Não sei como você consegue dar conta de tanta coisa. – digo - É curso
de inglês, natação, violão, escola de futebol, celular, tablet,
computador, TV e sei lá mais o quê. No meu tempo era muito mais
simples. Chegava em casa da escola, fazia meu dever, ia brincar na
rua, via um pouco de televisão com meus pais e dormia.
- Ah, vô, eu não acho muito. É normal, você se acostuma. - enquanto
mexe no celular.
- O que tanto você vê nesse celular? Não consegue ficar longe dele nem
um minuto?
- Consigo, quando estou dormindo. – rindo.
- Estou falando sério, meu filho. Isso não deve fazer bem para você.
Onde mais você fica sem mexer no celular?
- Na escola, minha professora não deixa, mas, no intervalo entre as
aulas, já o pego de novo. Ah! No cinema, só porque se eu o vejo as
pessoas ficam olhando feio para mim. Por isso que eu prefiro o Netflix.
- O que você está fazendo agora aí?
- Estou conversando com meus amigos.
- Vem aqui ao meu lado, me mostre tudo que está fazendo.
Isso que me apavora. Antes tinha que escrever uma história que competia com
muito menos informação. Hoje até as fotos de gatinhos no Facebook são meus
o o e tes .àB igoà oà o outro escritor, tenho que brigar pelo tempo de
minha audiência. É desesperador.
Vamos para a sala, ligo a TV e o celular continua na mão dele. Mas será que a
pessoa consegue prestar atenção nos dois? Faço um teste. Pergunto a ele o
que acabaram de falar na TV e para minha surpresa ouço a resposta certa.
Realmente são outros tempos. Mas será que é uma coisa apenas tecnológica?
Acho que não. Andei pesquisando algumas coisas sobre isso. Um tal de Henry
Jenkins fala da cultura da convergência. Tem uma coisa ueàgostoà uito:à áà
convergência não ocorre por meio de aparelhos, por mais sofisticados que
venham a ser. A convergência ocorre dentro dos cérebros de consumidores
i di iduaisàeà e àsuasài te aç esà so iaisà o àout os. àFazà se tido,àa hoà ueà
não preciso ficar preso a tecnologia. No final acho que uma história bem
contada vale mais do que qualquer outra coisa. Isso sempre funcionou, acho
que não é agora que isso vai acabar.
Pego uma folha de papel em branco e mostro para ele como se coloca. Ele me
assiste impressionado. É a primeira vez no dia que o vejo sem o celular.
- Tente digitar seu nome. Mas tem que apertar forte as teclas.
Com um pouco de receio, ele tenta. Digita letra por letra. D. O.U. G. Quando
vai digitar o L, acaba apertando o K. Procura algo concentrado no teclado,
enquanto eu apenas observo. Procura mais um pouco e desiste.
- Vô, não encontro a tecla de apagar. Qual é?
- Não dá para apagar. – respondo com um sorriso no rosto.
- Como assim? Não dá mesmo? – me pergunta com um olhar de
indignação
- Não.
- Mas o que faz se errar?
- Você tem duas opções. Começa tudo de novo em uma nova folha ou
passa um corretivo. – explico enquanto passo um corretivo na letra K.
- Mas ele vai imprimindo assim enquanto eu digito?
- Não é exatamente uma impressão. Veja aqui mais perto. – levanto e
mostro a máquina em detalhe – Quando você aperta uma tecla sobe
uma peça, ela bate por cima da fita de tinta e encosta no papel. É
assim que a letra aparece.
- Isso é muito difícil. – com uma cara de confuso - Prefiro escrever no
meu tablet. Posso apagar na hora que quiser e posso mandar imprimir
em minha impressora por wi-fi.
Dessa vez, eu que faço cara de confuso. Estamos a gerações de distância. Ele
me mostra como faz para escrever no seu tablet. Acho que tivemos o mesmo
pensamento, para mim o que ele faz é muito difícil, acho muito mais
confortável ficar em minha máquina. Isso me fascina. Começo a pensar na
origem de tudo. Quando as pessoas sentavam em volta de fogueiras para
contar da última caçada. Quando foi isso? Uns 50 ou 100 mil anos atrás? É
muito tempo. E as Lascaux Caves, elas têm 17 mil anos. Há 17 mil anos, alguém
pegou o sangue de um animal e desenhou uma história na parede de uma
caverna. O que será que ele pensou? Como teve essa ideia? Deve ter sido um
momento de inspiração suprema.
Isso evoluiu muito com os anos. Depois das cavernas inventamos a escrita.
Mas, ainda assim, para fazer um livro era preciso fazer tudo a mão. Nisso,
aparece o Gutenberg e traz a imprensa. Depois disso, foi cada vez mais rápido,
o cinema, depois o rádio e a TV, os computadores e agora todas essas mídias
que já nem sei contar. Repito, é desesperador.
Vi um livro, Winning the Story Wars, em que o autor observa que estamos
voltando às nossas raízes. As mídias sociais não são nada diferentes das
fogueiras. Eu cresci em um mundo onde me contavam tudo. Era difícil
compartilhar o que pensávamos. Acho que essa foi uma das razões de eu
escolher ser escritor. Queria que minha voz fosse ouvida. Hoje, é mais fácil,
todo mundo consegue um espaço. Achava que o que vivia era o normal. Os
mais ricos dominavam os canais de comunicação e nos davam as informações
que desejavam goela abaixo. Esses canais não desapareceram, o que
aconteceu, apenas, foi que novas formas surgiram, mais democráticas.
Pensando bem, é muito mais justo. Quem consome tem muito mais poder de
escolha. E acaba valorizando a história. Quanto melhor ela for, maior chance
há de o público consumi-la e compartilhá-la. O Mckee fala uma coisa que
se p eàle oà o igo:à Hist iasàs oàaà o e s oà iati aàdaàp p iaà idaà u aà
poderosa, mais clara e significante experiência. Elas são a moeda de troca do
o tatoàhu a o. àIssoà àou o
Agora distraído com outra coisa, meu neto vê meus livros na estante.
ATO 03
Aquilo fica na minha cabeça. Será que os livros não são suficientes? Posso
contar minha história de outras formas? Meu neto consome conteúdo em
diversos lugares, posso tentar atingi-lo. Por que não contar uma história em
uma rede social, depois continuar no meu livro, passar por um filme e terminar
em um jogo?
Termino o dia brincando com meu neto. Ele pega sua mochila com um
conjunto de LEGO Star Wars. Mas será que ele viu os filmes da primeira
trilogia? Ou gosta apenas por causa dos desenhos? Tanto faz, o importante é
que o garoto tem bom gosto. Não vou mentir, acho que fico mais
entusiasmado que ele quando brincamos juntos. As crianças de hoje têm
muita sorte, há muitos brinquedos divertidos disponíveis. Quando minha filha
era pequena, LEGO era apenas um pedaço de plástico, hoje é muito mais.
Parque temático, desenhos, rede social, revista, jogos, até filme eles fizeram.
Imagine só, pagar para assistir 2 horas de um comercial? Pior que eu gostei do
filme, achei engraçado. Eles foram bem inteligentes, não são apenas um
fabricante de brinquedos, são produtores de conteúdo.
Ligo para minha filha, para buscá-lo. Afinal tenho muito trabalho a fazer, mas
o dia que passei junto com ele me abriu muito a cabeça. Observar o garoto
passear por tantos gadgets me deu um novo horizonte.
Antes de minha filha chegar, Douglas volto a mexer em minha estante. Dessa
vez ele encontra minha coleção de quadrinhos. Ele nunca viu aqueles
personagens assim, está acostumado a vê-los em desenhos animados e filmes.
Fica encantado com os desenhos dos clássicos que possuo. Descobriu uma
nova forma de enxergar os personagens de que tanto gosta. Pede para levar
alguns para ler. Faço uma cuidadosa seleção de revistas para introduzi-lo no
mundo dos quadrinhos. Quem sabe não consiga mais um apaixonado?
- Vô, será que um dia vou conseguir contar histórias igual a você?
- Sem dúvida, meu filho, todo mundo tem uma história para contar. –
respondo com um sorriso de satisfação em meu rosto.
Com suas bases firmadas nesses cards e tipo de produto, a greve no beisebol
quase derrubou a empresa, obrigando-a a vender os direitos cinematográficos
de seus principais personagens para diferentes produtoras de cinema. Assim,
o Homem Aranha ficou com a Sony Pictures e os X-Men e o Quarteto Fantástico
acabaram nas mãos da Fox, que em 2000, mudou a visão do mercado de
entretenimento com o primeiro filme dos mutantes da Marvel, que
ultrapassou os 300 milhões de dólares nas bilheterias. O amigo da vizinhança,
Homem Aranha, também elevou o patamar cinematográfico dos heróis ao
fazer 850 milhões de dólares nas bilheterias ao redor do mundo. Tanto a Fox,
quanto a Sony, provaram que era possível levar os grandes heróis dos
quadrinhos para o cinema e faturar alto nas bilheterias. Mas ainda faltava um
elemento chave para essas e outras produtoras, justamente um dos que fez
com que a Marvel se tornasse uma das principais editoras de quadrinhos nas
últimas décadas. Faltava a continuidade.
Por mais que esses filmes tenham suas continuações e até tenham gerado
filmes paralelos – como é o caso do personagem Wolverine, que ganhou seu
próprio longa-metragem com X-Men Origens: Wolverine –, a continuidade
narrativa desses longas deixam muito a desejar, trazendo inclusive
reclamações de seus fãs mais fervorosos. Além disso, questões contratuais
obrigam os estúdios a produzir um filme por ano com esses personagens, sob
pena de perderem seus direitos caso não cumpram essa cláusula. Isso gera
uma série de longas ruins, produzidos às pressas e sem um planejamento a
longo prazo.
O primeiro longa do Homem de Ferro não trouxe apenas uma boa história dos
quadrinhos para o cinema, mas iniciou todo o planejamento transmídia da
empresa e colocou um elemento essencial na fórmula Marvel dos cinemas, a
cena pós-créditos. Já tradicional em cada um dos filmes da produtora, a cena
após os créditos do filme traz alguns minutos (ou segundos em alguns casos)
de uma história que liga diretamente a algum dos próximos filmes do chamado
Universo Cinematográfico Marvel. Normalmente, essa cena não dá grandes
explicações, deixando os fãs discutirem por meses e levantarem as mais
ousadas especulações. No caso do Homem de Ferro, a cena traz aos
espectadores o personagem Nick Fury, que se apresenta a Tony Stark como
diretor da S.H.I.E.L.D. e fala sobre um projeto chamado Iniciativa Vingadores.
A simples menção dos Vingadores na cena pós-créditos do Homem de Ferro
fez com que os fãs da editora sonhassem alto com as possibilidades dos heróis
do super-grupo nos cinemas. E as expectativas foram aumentadas com a
sequência de filmes que a Marvel trouxe para o cinema e sua inteligente
narrativa interligando cada um deles.
A Marvel ainda trouxe, em 2011, o filme solo do Thor, que apresenta outro
lado do universo ficcional da editora, com personagens mais místicos e
mitológicos de Asgard e Capitão América – O Primeiro Vingador, que prepara
de vez o terreno para a chegada dos Vingadores. O longa do Thor ainda
apresentou ao grande público o vilão Loki, irmão do protagonista, que se
tornaria também o vilão do filme dos Vingadores.
Mas todo esse processo transmídia está longe de terminar. Com tanto sucesso
das produções cinematográficas, o universo Marvel ainda contará com
diversos filmes e produções, previstos até 2018. Entre eles, ainda teremos Os
Vingadores 2: a Era de Ultron, Homem-Formiga, Capitão América 3, Guardiões
da Galáxia 2, Doutor Estranho e um possível filme solo da Viúva-Negra (ainda
não confirmado).
Para fechar com chave de ouro, a Marvel ainda aposta em uma parceria com
a Netflix onde contará com séries exclusivas dos personagens Demolidor, Luke
Cage, Jessica Jones e Punho de Ferro, que juntos levariam a uma minissérie
baseada em outro grupo de super-seres, os Defensores.
Acompanhando todas essas produções, podemos ver que a Marvel não entrou
nesse mercado para brincar. Seus projetos são pensados com muito cuidado e
desenvolvidos sob forte influência transmídia, visando claramente o sucesso a
longo prazo e não apenas com bilheterias pontuais.
1
As primeiras histórias são focadas no grupo – são de caráter sagrado: mitos,
narrativas de origem, historiografias oficiais – retratam as relações culturais e
contam tramas épicas. E no início dos séculos XVII e XVIII as histórias
começam a ser mais e mais introvertidas, o leitor entra em contato com um eu-
lírico mais pessoal e individualista. Encontramos o autor mais envolvido com
as produções biográficas, até com as biografias ficcionais, mas, mesmo assim,
vemos o sujeito na história (livre tradução da autora).
2
Ato de contar histórias.
3
Oralidade, Alfabetização/Escrita, Cartas/Impressão de livros, Filmes,
TV/Rádio, Tecnologia/Computadores, You Tube/ Câmeras em HD e
Smartphones (livre tradução da autora).
4
Aquilo que pertence ao tempo atual, agora, presente.
da comunicação em que ela passa de interativa a participativa. Além de
modificar o mass media e a forma de se contar histórias, a convergência está
nos modificando. Pois o sujeito integra o fenômeno de uma maneira inédita.
Co oà apo taà He à Je ki sà ,à áà o e g iaà ep ese taà u aà
transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a
p o u a à o asài fo aç esàeàfaze à o e esàe à eiosàdeà ídiaàdispe sos à
(p. 30).
Os limites entre produtores e espectadores se confundem, não
sabemos mais qual é o lugar de cada um desses sujeitos dentro do processo
comunicativo. Afinal, a convergência também acontece, depende e parte das
pessoas. Nosso ethos vem sendo transformado e fragmentado diante das
multiplicidades midiáticas presentes no fenômeno. Mais do que nunca, na
contemporaneidade os sujeitos sentem necessidade de imergir e colaborar
com as tramas. Porém, todo o processo e vertentes tais como: transmídia,
cultura participativa e a colaboração ativa do sujeito no produto só foram
possíveis porque temos uma irremediável necessidade de contar e ouvir
histórias. A convergência apresenta uma maneira dinâmica, nunca antes vista,
de potencializar a experiência dos autores e sujeitos midiáticos.
1.1 Transmídia: quando a história é só o começo
Transmedia storytelling ou transmídia é o ato de transmitir
mensagens, temas ou histórias através de diferentes plataformas de mídia, em
que cada uma faz uma contribuição distinta para o universo criativo em
questão. Cada meio – HQ, TV, Cinema etc. – é usado naquilo que faz de melhor,
no seu diferencial. Porém, as camadas devem funcionar de maneira autônoma
para que o sujeito midiático não tenha que consumir cada uma para
compreender a trama por completo. Esse é um dos principais pontos da
transmídia, é preciso que cada plataforma exista de maneira interdependente
à história central (JENKINS, 2008).
Aqueles sujeitos que se sentirem atraídos pelas novas linguagens vão
à busca de informações e assim intensificam a sua experiência. Como afirma
Je ki sà ,à áà o p ee s oào tidaàpo à eioàdeàdi e sasà ídiasàsuste taà
uma profundidade de experiência que moti aà aisà o su o à p.à .à Osà
produtos transmidiáticos criam um universo paralelo à trama, a história deixa,
por exemplo, de ser apenas um filme e passa a ser um jogo de realidade
alternativa (ARG5), um aplicativo, uma websérie. E cada plataforma desperta
novas percepções, ou seja, o sujeito que baixou o aplicativo terá uma
experiência diferente do que assistiu somente o longa-metragem, e assim por
diante.
A narrativa transmídia refere-se a uma nova
estética que surgiu em resposta à convergência
das mídias – uma estética que faz novas exigências
aos consumidores e depende da participação ativa
das comunidades de conhecimento. A narrativa
transmídia é a arte da criação de um universo.
Para viver uma experiência plena num universo
ficcional, os consumidores devem assumir o papel
de caçadores e coletores (...) (JENKINS, 2008, p.
49).
O termo transmídia foi introduzido pela primeira em 1991 por Marsha Kinder
para designar as animações Tartarugas Ninjas e Pokemón - as narrativas
apresentavam uma série de produtos correlacionados (séries de TV, filmes,
HQs, etc.). Porém, o conceito foi difundido e fundamentado no meio
acadêmico por Henry Jenkins, em 2006 6.
5
Sigla para alternate reality game.
6
Data de publicação da edição americana.
Cada vez, mais as narrativas estão se tornando a
arte da construção de universos, à medida que os
artistas criam ambientes atraentes que não
podem ser completamente explorados ou
esgotados em uma única obra, ou mesmo em uma
única mídia. O universo é maior do que o filme,
maior, até, do que a franquia (p.161).
A transmídia representa a junção dos sujeitos dispostos a
participarem das produções midiáticas num novo âmbito do entretenimento
disposto a produzir desde materiais dinâmicos e abertos a experimentações.
Podemos afirmar que o fenômeno funciona como uma materialização do
encontro do ethos contemporâneo, fragmentando e flutuante com a cultura
da convergência e suas caixas pretas.
7
Como por exemplo, o longaSuper8 (2011), o game Assassin'sCreed (2007) e
as séries de TVLost (2004-2010), Castle (2009-2010) e BatesMotel (2012).
8
Meio de temporada.
desenvolvimento das ações transmidiáticas - não só com o objetivo de
enriquecer o universo ficcional, mas manter e alimentar o interesse do público
enquanto à série está fora do ar.
Conforme explica Jason Mittell:
Unlike nearly every other narrative medium,
American commercial television operates on what
might be termed the infinite model of
sto telli g―aàse iesàisàdee edàaàsu essào l àasà
long as it keeps going. While other national
television systems might end a successful series
after a year or two, American series generally keep
running as long as they are generating decent
ratings (2009).9
Enquanto nos Estados Unidos o fenômeno já é delineado há algum
tempo, no Brasil o recurso tem sido aplicado de forma gradativa nas
telenovelas da Rede Globo. Reconhecida mundialmente por suas produções, a
emissora vem expandindo suas atrações desde 2006. A primeira ação
desenvolvida foi para a telenovela das 21 horas, Páginas da Vida (2006-2007),
de Manoel Carlos. A emissora criou seções no site oficial da trama que
ofereciam ao público o acesso a cenas comentadas, envio de vídeo e
conteúdos complementares.
Como pontua Fechine, Figueirôa e Cirne (2011),
No site da teleno ela,à ha iaà aà seç oà e asà
o e tadas ,à es olhe doà te asà pol i osà dosà
episódios para serem comentados pela audiência,
eàaàseç oà u alàdaà ida ,à aà ualà ual ue àpessoaà
9
Ao contrário de quase todos os outros tipos de narrativa, a TV americana segue
uma forma de contar histórias em que uma série só é considerada de sucesso
quando permanece no ar. Enquanto os canais de televisão de outros países
optam por tramas de um ou dois anos, os seriados norte-americanos continuam
sendo exibidos enquanto estiverem gerando receita e audiência para a emissora
(livre tradução da autora).
.
podia dar se depoimento e alguns eram escolhidos
para passar no final de cada capítulo. Como a
novela discutia (...), a Síndrome de Down, foram
criados suplementos virtuais (...), com
informações sobre a doença e com depoimentos
de portadores. Foi criado, já na época, o site
fictício da Casa de Cultura Amália Martins de
Andrade (A.M.A) (...). Por meio desse site fictício,
foram divulgados, por exemplo, informações
complementares sobre os artistas que expunham
seus trabalhos na galeria (p. 46).
Já em outubro de 2007, a telenovela das 21 horas, Duas Caras (2007-2008),
ganhou um blog assinado por Aguinaldo Silva. No espaço, disponível no site
oficial, o autor da trama respondia aos comentários dos internautas e
perguntava a opinião do público sobre os rumos da história.
Mas foi em 2009 que o canal começou de fato a criar ações mais
elaboradas e coerentes ao ecossistema transmidiático. As produções Caminho
das Índias (2009) e Viver a Vida (2009-2010) tiveram seus arcos narrativos
aprofundados e complementados. Para a trama de Glória Perez foram criados
t sàsites:à Faleà o àoàDi eto ,à Co e oàÍ dia ,àfo adoà aà ultu aài dia a,àeà
oà logàdoàI d a,à ueàe aà et oali e tadoàpelaàat aç o.àNoàespaçoàoà jo e à
indiano que morava no Brasil, comentava sobre o seu cotidiano e sobre
acontecimentos da trama, postava algumas receitas de sua mãe e denunciava
o po ta e tosà i egula esà deà alu osà deà suaà tu aà oà ol gio à Fe hi e,à
Figueirôa e Cirne, 2011, p. 50).
A telenovela de Manuel Carlos explorou a circulação de conteúdos
e t eà TVà eà I te età at a sà dosà sites:à Pe gu teà aoà Di eto ,à Po talà daà
“upe aç o , que reunia depoimentos de espectadores que tinham passado
po à o e tosà deà supe aç o,à eà oà “o hosà deà Lu ia a .à Oà di ioà i tualà e aà
assinado por Luciana (Alline Moraes), uma jovem modelo que ficou
tetraplégica e que os momentos de coragem e determinação para superar a
condição foram os grandes fios condutores da narrativa (GLOBO.COM 10). Além
de relatar o seu dia a dia, a personagem usava o blog para falar sobre os
obstáculos e as dificuldades vividos pelos deficientes físicos. Porém, a
contribuição para o universo ficcional da telenovela foi além da
retroalimentação. Segundo Fechine, Figueirôa e Cirne (2011), uma informação
exclusiva foi publicada no diário virtual antes de ir ao ar na televisão – como
uma espécie de spoiler11para quem acompanhava as postagens da modelo.
... àoà logàdeàLu ia aài fo ouàoàseuà oi adoà o àMiguel,à ... ,àa te ipa doà
um dos momentos de grande expectativa na trama antes mesmo que a
i fo aç oàfosseà ei uladaà oà apítuloàdaà o elaà aàTV à p. .à
A partir daí várias produções da Rede Globo tiveram seções voltadas
para a propagação e retroalimentação do enredo de suas telenovelas. Como,
por exemplo, Passione (2010-2011), Insensato Coração (2011), Morde e
Assopra (2011) e o remake de Ti Ti Ti (2010-2011). A adaptação Maria Adelaide
Amaral para a trama de Cassiano Gabus Mendes também usou a transmídia
para aprofundar e estender os seus principais plots12.
Porém, foi na trama das 19 horas, Cheias de Charme (2012), que o
fenômeno cumpriu integralmente o seu papel de oferecer ao espectador uma
camada inédita do universo ficcional. O capítulo 30, que foi ao ar no dia 19 de
aioàdeà ,àgi a aàe àto oàdoà aza e toàdoà lipeà VidaàdeàE p eguete ,à
encenado pelas protagonistas Penha (Taís Araújo), Rosário (Leandra Leal) e
Cida (Isabelle Drummond). Sem que as personagens soubessem Laercio (Luiz
Henrique Nogueira) posta o clipe na internet, o conteúdo se espalha
rapidamente pela rede e é acessado por vários personagens da trama.
Entretanto, apesar do frisson causado pelo clipe, o espectador só pôde conferi-
lo depois do encerramento do capítulo. Antes dos créditos, a Rede Globo
divulgou um link pa aà ueàoàpú li oàpudesseàassisti àoà VidaàdeàE p eguete .àà
10
Disponível
em:<http://viveravida.globo.com/Novela/Viveravida/Personagens/0,,PS2494-
17529,00.html>. Acesso em: 10 out. 2013.
11
Revelações sobre a história.
12
Pedaço do enredo.
Co oàafi aàMau i ioà“t e à ,à Pela primeira vez, um conteúdo original
esse ialàpa aàaàt a aà as eu àfo aàdoàseuàha itatàp i ipal .àQua doàoà lipeà
finalmente foi exibido na TV – no capítulo 31 veiculado no dia 21 de maio de
2012 – já tinha atingido a marca de dois milhões de visualizações. A viralização
do conteúdo foi tão bem sucedida que acabou repercutindo na telenovela.
Nosà apítulosàsegui tes,à ... ,àosàpe so age sà o e ta a àoàassu to,à ita doà
números reais e fazendo com que o público, de certa forma, se tornasse
também participanteàdeàt a a à “TYCE‘,à .à
3. Considerações finais
13
Sob a sua influência, um novo tipo de narrativa está surgindo - um que é
contada através de muitos meios de comunicação ao mesmo tempo de uma
forma que é não-linear, que é participativo e, muitas vezes gamificado, e que é
moldado acima de tudo para ser imersivo (livre tradução da autora).
desenvolver ações voltadas exclusivamente para o formato.
No Brasil temos uma relação única entre a TV e o espectador. Principalmente
com as telenovelas, que pautam os assuntos do dia seguinte, as discussões na
ho aàdoà afezi hoàeài di a àosà o osàpa et osàdaàso iedade.à áà
telenovela é um universo onde circulam, reelaborados, a partir das normas
da ficção, aquilo que está acontecendo na sociedade, os problemas, os
alo esà ... à Ba ega,à ,àp. .Oàespe tado à asilei oàseà o figu aàdia teà
de outro cenário midiático, por isso a transmídia no Brasil inaugura e rompe
limites na participação e na experiência do sujeito midiático com o produto
televisivo.
Piloto de TV.
O conceito como conhecemos, nasceu nos EUA em meados dos anos 50
quando grandes redes americanas (CBS, ABC, NBC) começaram a comprar
produtos de terceiros, muitos indicados por agências de propagandas que
precisavam testar uma audiência muito sensível às inclinações sociais. Dada
às regras sociais estabelecidas à época, uma pessoa de cor surgir como
protagonista em um programa de costumes femininos poderia comprometer
o faturamento da emissora porque anunciantes sentiam-se ligados aos temas
não pertinentes à sua marca.
ássi ,àpilotosàdeàtele is oàe a ,àe àg a deà edida,à estudosàdeà asos àeà
e ita a àu à des ioàdeà o duta ,à asàe a àp i ipal e teàu aà guaà
mensurável onde o investimento publicitário deveria ser colocado no ponto
mais alto.
Figura 1 – ta elaà Osà àpaísesà o à aio ài esti e tosàe à àdoàLi oà
Cesar Bolaño e Valerio Britto [A televisão Brasileira na era digital - pag. 57]
Cenário Brasileiro.
No cenário brasileiro independente o processo de contratação de Piloto de
TV praticamente não existe. A variável fundamental que define isto passa
pelo direito autoral da ideia, e aqui, as emissoras e redes, não podem ser
do os àdoàp ojeto.àIstoàasàdei aàpou oà o fo t eisàpa aàfi a ia àu à
produto que não possuem direitos de autor, e talvez nem venham a ter o de
propriedade.
De fato a legislação brasileira protege a soberania nacional no que se define
o oà p odutoàaudio isualà asilei o ;àeà oàp op eàa i à oàdisto;à asà
isto estabelece um impasse. Os autores brasileiros são os empreendedores
de fato e de risco da ideia, criando e produzindo o escopo inicial da pesquisa
e do desenvolvimento de modo empírico (tentativa e erro); já que a maioria
não dispõe de grandes recursos para fazer de modo eficiente esta etapa.
Por outro lado, os canais exibidores de TV por assinatura (cabo ou satélite)
e à aio iaàest a gei osàeàa e i a osà sa a à e à uad ado à ua doà
apostam na virilidade de uma ideia nacional via Piloto de TV. Eles
simplesmente não investem e esperam que ideias alinhadas às suas grades
de programação; e principalmente as que já venham com uma linha de
financiamento resolvida; caiam no colo e então iniciam longo processo de
contratação que muitas vezes geram expectativas doentias nos produtores.
De fato, na perspectiva destes canais; que historicamente somente
p e isa a à a io aliza à du la àe/ouàlege da àp odutosà i dosàdeàfo aàeà
agora se vem obrigados a adquirir ou a co-produzir conteúdos nacionais;
desembolsar qualquer valor para o desenvolvimento de pilotos-testes sem
serem donos da ideia (e de suas futuras receitas) gera uma dor de cabeça por
financiamento que não pretendem para si. Isto não é de se culpar, vendo
pelo viés do capital.
Mas observando dados da ANCINE- AGÊNCIA NACIONAL do CINEMA, órgão
que regula o audiovisual nacional, percebe-se a evolução quantitativa mensal
de conteúdo brasileiro e nos dá a sensação que tem começado a valer a pena
produzir na nossa língua.
O órgão atento a este gargalo do início do funil, dispôs através do Fundo
Setorial Audiovisual, do dispositivo onde o proponente (cine ou TV) poderá se
beneficiar para desenvolver ideias, pesquisar conceitos, fazer pilotos e testar
formatos respeitando algumas regras de classificação.
No gráfico a seguir, vemos que canais de filmes (Telecine, AXN, TNT)
conseguiram adaptar-se melhor no período, adquirindo longas metragens
brasileiros prontos e aptos a veiculação. Exceção é o canal HBO, que investiu
e à às iesà a io aisà o oà OàNeg io àdeàLu aàPai aàMelloàeà‘od igoà
Castillho, que conta a vida de três prostitutas de luxo que lançam mão de
estratégias de marketing para faturar mais. Os outros canais apenas mantêm-
se na cota ou abaixo dela.
Estrutura.
O mercado profissional brasileiro audiovisual é de risco, e muitas vezes bem
oneroso para quem empreende, e, se este for seu caso, não se furte de
contar com o apoio espontâneo de seus colaboradores (ou parceiros), o que
apesar de não ideal, é modo de viabilizar a ideia gerando oportunidade na
cadeia produtiva.
ápesa àdaàf gilàp o essaàdoà l à aàf e te ,à eioà a i h oàdeàp ojetosà
chegaram à algum lugar; e isto me lembra a retomada do cinema nacional via
Curtas-Metragens que era caminho para fazer algo independente na década
dos prêmios estímulos no final dos 80, meados de 90. Fazer um curta com e
para amigos nesta época era uma curtição inocente, e nos deixava duros
como sempre, mas se pensarmos em perspectiva do passado para hoje,
veremos que o audiovisual do cinema ganhou maturidade e já não é tão mais
inocente assim.
Nesta análise, você não necessariamente precisará de modernos
equipamentos digitais de captação para fazer um bom piloto, mas é
importante; seja ficção ou documentário; que o resultado gráfico tenha
qualidade FullHD pensando que estamos na atrasada transição para TV
Digital e aos poucos frames do 4k. Se não contar com uma câmera RED, há
equipamentos híbridos de captação portáteis (câmeras DSLR) e que resultam
em boa impressão quando bem manuseados. Mas você deve ir além, se
houver condições.
Projetos Transmídia e Animações
Se seu projeto se direcionar a formatos inovadores de engajamento
transmídia, o conhecimento técnico e tecnológico para a demanda vai contar
muito na execução desta empreitada, e então siga a premissa de contar com
profissionais capazes oferecendo parcerias societárias ou compensações
justas. Esta coisa técnica será provavelmente o cérebro da história.
Um case estrangeiro que alinha conteúdo à tecnologia é Time Tremor. Uma
série multiplataforma no formato tvgame oà odeloà Wacht, Collect and
Pla àpa aàpú lico infantil (5 a 8 anos). Aqui, o jovem usuário-telespectador
assiste a curtos episódios ficcionais e depois interage com objetos e
pe so age sàp ese tesàe à useusà aça doàtesou osàes o didos àe ào asà
po à eioàdoà e u soàdeà ealidadeàau e tada .
Esta série cadadense-australiana é exibida pela CBS nos EUA e foi pensada
sobre o know-how em games da produtora Xenophile Media, com o
gerenciamento prático do showrunner Patrick Crowe que fez o piloto receber
fundos da South Australian Film Corporation e se materializasse em uma
série educativa.
No segmento de animações um piloto é essencial porque demonstra a
capacidade técnica e estética, além da sobriedade do conteúdo, além da
capacidade gerencial. Ou seja, tudo. Uma ótima animação infantil nacional
(03-06 anos) vem de uma produtora de Recife, a Mr.Plot com sua animação
Bitaàeàosàá i ais .àU aàa i aç oàpa aà e à a alàYouTube) fruto que um
casal de pais recentes, cansados dos enlatados infantis na TV, dedicou para
materializar no melhor estilo Faça Você Mesmo. O produto de Chaps Melo
(músico) e Ivana (designer), grudou como chiclete e após milhares de views
virou DVD. Agora vende APPs pelo Itunes-Apple, chamou a intenção de
executivos de TV e negocia um transmidiação para a grande mídia televisiva.
Mariana Brasil cita ainda:
Oà oo àte ol gi oà ueà i e os…à oà às àpa aàTVàouà i e aà ueà
podemos produzir, as mídias digitais, o vídeo On Demand (Netflix, Now, etc.)
ampliaram as possibilidades de exibição e formatos de conteúdo. Estamos
realmente num dos melhores o e tosàdoàaudio isualà oàB asil .
INTRODUÇÃO
Desde a década de 1970, quando da efetiva invenção dos computadores
pessoais, a tecnologia digital tem se expandido rapidamente, de modo a
estabelecer modos inovadores de sociabilidade, por meio de novos formatos
e possibilidades de comunicação, assim como de transmissão da informação.
Multimídia, intermídia, hipermídia – e agora, transmídia – compõem um
universo semântico complexo, capaz de explicar as narrativas cotidianas e,
principalmente, emergentes, seus processos e aplicações, inclusive, no
campo da educação.
14
Importante destacar, nesse sentido, a transformação por que passaram os
meios de disseminação de informações: das ferramentas one to one, capazes
de transmitir algo a um só receptor – vide o jornal impresso –, evoluiu-se às de
parâmetro one to many (TV, rádio etc.) ou many to many (internet e mídias
sociais)
adaptáveis ao(s) novo(s) ambiente(s) tecnológico(s) e socialmente
interligado(s) que se instalem no dia a dia de docentes e discentes. Neste
ponto, entrecruzam-se os campos da Educação e da Comunicação. Vivem,
i lusi e,àosà es osàdile as,àpois,à o oà essaltaàVidigalà ,àp.à ,à asà
questões que se materializam na sociedade concernem diretamente à
questão educacional, se se considera que a função da escola é a formação
dos sujeitos, de acordo com expectativas que a própria sociedade faz dessa
fo aç o .
Criado pelo escritor e crítico cultural paulista José Paulo Paes (1926-1998), o
neologismo transleitura é capaz de resumir com propriedade a relação do
referido poeta – como também do ensaísta, do tradutor e do cidadão
participante – com a cultura e a arte de seu tempo. Nas palavras do autor:
15
Para conhecer o projeto, acesse http://www.newmedialiteracies.org.
Imersão x Extração: em termos de imersão, pode-se pensar o
potencial educativo dos mundos virtuais por meio da reprodução de
ambientes geográficos e históricos. Os alunos tanto podem imergir
em universos constituídos quanto construir seus próprios ambientes
virtuais de aprendizagem, justificando suas escolhas e se
posicionando criticamente. Extração diz respeito a uma prática
comum e antiga em sala de aula, de trazer, ao ambiente de
aprendizagem, objetos representativos de outras vivências, como
uma máscara indígena ou uma ferramenta desconhecida adquirida
em viagem a outro país, por exemplo.
16
Para mais informações, acessar http://www.conducttr.com/success-
stories/cosmic-voyage-enterprises.
17
Agência de criatividade com base na Flórida.
A partir deste briefing, os alunos foram divididos em cinco times,
constituindo o grupo de executivos das diversas áreas da empresa que devem
lidar com o acidente. Em paralelo, ao usar as ferramentas virtuais, um grupo
de professores, funcionários do Estúdio contratado e empresários locais
iniciam a construção de cenários e ações de simulação do mundo real frente
ao acidente de grandes proporções.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ENGAJAMENTO
O Engajamento na EraTransmídia
Solange Uhieda e Dimas Dion
© (Rutledge, 2014)
Nosso cérebro está pronto para ler mentes, mas poucas pessoas percebem
isso. Ele usa atalhos rápidos criando associações com a mensagem
transmitida, toma atitudes com as quais está mais familiarizado, assume o
que os seus personagens modelos fazem como regra para si mesmo.
(Rutledge, 2014)
Sendo assim, para despertar o engajamento do público/audiência é preciso,
além de ter uma boa história, conectá-la a personagens, e estes a uma
jornada que faça o público/audiência acompanhá-los nas diversas mídias
propostas.
Projetos relacionados a cultura popular tendem a ter uma adesão
espontânea maior por estar associados ao contexto social e psicológico. Os
projetos autorais necessitam do esforço para identificar membros
influenciadores para, então, viralizar e gerar público/audiência cativa e fã. A
participação do público é mais efetiva quando ocorre por convite dentro da
narrativa, tendo menor adesão quando ocorre por interrupção.
Nuno Bernardo cita, em seu livro The Producer´s Guide to Transmedia, 4
estímulos detectados que despertam o engajamento das pessoas e
recomenda que os CTAs (Call to Actions) do projeto transmídia busquem
atingir todos os 4, sendo eles:
•àu aàCáU“áàe à ueàseàa edite,àsejaàsocial, política ou humanitária;
•àDIVE‘“ÃOàat a sàdoàhu o ,àest at giaàdeàg a deàutilizaç oàeàf ilà
absorção nas mídias;
•àp o oç oàdoà“TáTU“à o àosàf sàju toà à a ati aàeàju toà à edeàf àdoà
projeto transmídia, conferindo importância à pessoa e se aliando ao estilo de
vida;
•àát a sàdeàp iosà ele a tes,àp o o e àu aà‘ECOMPEN“áàpelaà
participação, mantendo a atenção e retorno à mídia alvo da ação.
CAUSA
O uso das Narrativas está intrinsecamente ligado às nossas experiências
sociais, estimulando nossa empatia em relação à causa; a arte de contar
histórias é utilizada desde a época pré-histórica, onde os homens
compartilhavam seu cotidiano, suas aventuras, seus saberes, suas emoções
por meio da narrativa, seja ela oral, gestual (danças) em volta da fogueira,
seja em pinturas rupestres nas paredes das cavernas. É uma das formas mais
fundamentais de comunicação e condução da documentação da
humanidade. Uma boa narrativa conquista os corações e as mentes,
expressando, comunicando, motivando e principalmente engajando o seu
público.
A mente humana processa e arquiva informações de diversas formas e,
quando há histórias, não somente ativa a área de processamento da
linguagem, produção da fala e compreensão – chamada área de broca –, mas
todas as partes do cérebro, em especial a área de Wernicke, que é a região
responsável pelo conhecimento, interpretação e associação das informações,
mais especificamente da compreensão da linguagem.
Uma boa narrativa a e de o cérebro, fazendo com que ele entre em modo
de atenção e associação dos fatos, estabelecendo relações interpessoais,
como se estivéssemos vivenciando o relato, tal sincronização facilita a
compreensão e memorização das histórias.
Para aproximar os clientes, as marcas também se utilizam do poder da
narrativa, divulgando, através de histórias, uma relação emocional, um
encantamento e identificação entre público e produto.
A Coca-Cola é uma das marcas que mais investe nesse quesito. A campanha
Happiness Factory (Fábrica da Felicidade), em sua animação, veiculada nos
canais de mídias tradicionais e complementada nas mídias sociais com uma
narrativa fantástica e lúdica, nos conta toda a trajetória de sua produção,
como o refrigerante é produzido e engarrafado até chegar às mãos do
consumidor.
Segundo Ricardo Fort, diretor de Marketing da Coca-Cola Brasil (Coca-Cola,
2007): Mais do que celebrar bons momentos, a nova campanha visa a
reforçar a presença constante de Coca-Cola na vida das pessoas, convidando-
as a olhar o lado positivo. A campanha busca inspirar os consumidores a
construir e viver efetivamente esse lado positi o.
É gerar uma relação afetiva que transcende o que tem dentro da garrafa. A
preocupação não é só de ter o melhor produto, mas de criar conexões
emocionais com as pessoas. A pessoa recorda os bons momentos da vida e os
relaciona com a marca que proporcionou ou participou da uilo.
DIVERSÃO|HUMOR
A vida fica mais leve sorrindo, o simples ato de rir ajuda a liberar serotonina e
endorfina no cérebro, Sigmund Freud escre euàe àu àe saioàdeà :à “e à
dúvida a essência do humor consiste em que alguém se livre dos efeitos que
a situação teria provocado normalmente, considerando por meio de um
histeàaàpossi ilidadeàdeàse elha teàdese la eàe o io al.
Textos leves e bem-humorados trazem bem estar. Utilizando um bom timing,
criatividade, oportunismo e inovação, sabendo aproveitar com bom senso
das situações, acontecimentos e assuntos do momento, o uso do humor gera
um grande engajamento, vide as comédias, os formatos lúdicos e as ações
interativas que utilizam a diversão e o entretenimento para a comunicação e
que fazem o sucesso junto à audiência.
Ações transmídias estão presentes em grande parte de filmes publicitários de
grande aceitação da audiência – de Pôneis Malditos a Skol, a Porta dos
Fundos (a partir de seus esquetes, o making off, o livro a ser lançado até as
franquias de produtos).
http://www.bluebus.com.br/1-livro-do-porta-dos-fundos-em-agosto-com-
mtas-ilustracoes-e-roteiros-comentados/ (acesso: 06.09.2014)
RECOMPENSAS | STATUS
O conceito de recompensa é uma ação e seu consequente efeito de
recompensar, verbo que, por sua vez, refere-se ao ato de retribuir um
serviço, premiar um mérito, incentivo por mérito dado por realizar
determinada tarefa. A recompensa, na maioria das vezes, remete a
remuneração, porém pode também ser imaterial, como a reputação (vide na
internet a moeda de troca ser o like, o retuíte, os créditos), pois as pessoas
gostam de ser reconhecidas pelo que fizeram e, principalmente, de ser
reconhecidas no meio de que elas fazem parte e pelo que elas realizam
(Status).
Promover tarefas e atividades convidando o público a participar do projeto,
seja através de um concurso de posters de filme, fazendo parte do roteiro –
criação de fan-fiction e tendo nome creditado –, seja utilizando voos de
determinada empresa aérea e consequentemente elevando o status de
f e ue te flyer .
El Cosmonauta – longa metragem espanhol, com um novo modelo de
financiamento, produção e distribuição – proporcionou a cada um dos fãs a
possibilidade de ser um produtor do filme, além de ter seu nome constando
nos créditos (http://es.cosmonautexperience.com/producers).
La escuela de Visual Communication del IED Madrid ya trabajó con el equipo de la película en
Del etraje al Gra aje: El Cos o auta o có o tra sfor ar il i ge es e u a , u taller
dirigido por Boris Rodríguez, de Loop Loop Studio, en el que alumnos de la escuela trabajaron en
el cartel de la película. En la imagen de la izquierda podéis ver el cartel seleccionado, obra
de Fernando Roldán.
Mais dados: http://elcosmonauta.es/the_plan.html (acesso: 29/08/2014)
Desde o seu lançamento, em 2011, a série norte americana Game of Thrones
(baseada na série de livros A Song of Ice and Fire, de George R. R. Martin),
produzida para a TV, sucesso de crítica e audiência, oferta recompensas a
seus fãs em quase todos os fragmentos transmidiáticos. O projeto foi, e cada
vez mais é, um grande estudo – vale citar a campanha de lançamento da
série, em que se explorava os 5 sentidos (visão, olfato, audição, tato, paladar)
em desafios em mídias distintas. O mote era atrair diversos tipos de fãs
(tanto da série como dos livros) para a TV, bem como trazer novos fãs,
mesmo aqueles que não tivessem lido os livros, e a recompensa vinha em
forma de trechos da série contando o que ainda estava por vir.
©Budweiser
©Budweiser
Status: não bastava a marca estar estampada em vários locais dos estádios. A
Budweiser criou um lounge com o nome de Beer Garden, que virou ponto de
encontro de muita gente bonita, com modelos recepcionando os torcedores
e postando suas fotos no álbum do Facebook. Outra ação off-line foram as
festas Budweiser Hotel, Budweiser Mansion – com DJs famosos no comando –
e Budweiser Bar Hero, em que telões foram colocados estrategicamente em
bares badalados nas cidades sede.
©Budweiser
©Budweiser
Entendendo o que é engajamento
Rute Elias
Rosalves Sudário
Mariel Lobo de Souza
Dimas Dion
Definição de Público
Conforme dito anteriormente, identificar o perfil da audiência que se
pretende trabalhar em multiplataforma é fundamental para a formatação do
projeto, antes de transformá-lo em uma ação transmídia. É preciso conhecer
o público para entender como se dá o engajamento em cada caso. A
audiência muda de acordo com o projeto, por isso conhecer as personas é
necessário, para saber o seu alcance. No caso do grupo EraTransmídia,
identificamos as principais personas e as qualificamos nos diferentes perfis
adiante, dentre outros:
Oàg auàdeàe gaja e toàest àdi eta e teà ela io adoà o àoà efo çoà
psi ol gi o à ueàseào t àa partir do reconhecimento de outros por alguma
ideiaàouài fo aç oàdi ulgada.àOàh itoàdeà u ti àalgoàte àsig ifi adosà
disti tosàeà ele a tes:àoà Like à aoàp àdaàlet a,à euàgostei à oà
e essa ia e teàsig ifi aà ueà euà o o do ;àpodeàse àape asàu aài dicação
la aàdeà ueà euàto eià o he i e to à— interessante é destacar que, nos
EstadosàU idos,àpo àe e plo,àaàaç oàdeà u ti àu aài fo aç oàpostadaà oà
te àesseàefeitoàdeà ape asàto a à o he i e to .à“ àpa aàilust a ,à à o u à
e osàpessoasà u ti do à otificações de acidentes ou de falecimentos.
O ia e te,à ue àoàfazà ue àso e teà a isa à ueàto ouà o he i e to .
INTERAÇÃO
A Imersão
Tirar o filme da segura e confinada sala de cinema pode ser hoje em dia o
estopim de algo extremamente excitante e fantástico.
Desde a invenção do cine drive-in, onde o público se acomodava dentro de
seu conhecido veículo com os amigos ou parceiros, até o sucesso do VHS, que
criou verdadeiras salas de cinema em casa, no conforto do sofá com pipoca e
refrigerante, o público experimenta a mais completa forma de
entretenimento, o Cinema, cada vez mais próximo do filme. Hoje, após
sucessivas inovações tecnológicas, somos desafiados a ir além. Podemos
assistir nosso filme favorito em nossos telefones celulares, tablets, óculos de
realidade virtual, interromper quando quiser e saltar cenas ou assistir
pedaços outra vez, livremente. Consumimos todos os produtos derivados do
filme, camisetas, canecas, trilha sonora, game, revista em quadrinhos,
miniaturas. E novamente, somos desafiados a ir além. Qual o próximo passo?
A ideia de recriar o filme em escala real em um ambiente narrativo onde o
público e a performance se mesclem pode ser a resposta. O sonho da criança
em ser o super-herói, o caubói, o astronauta, é realizado com experiências
imersivas como essa.
Dos parques temáticos dos estúdios de cinema norte americanos ao teatro
participativo fortemente produzido na Europa, era questão de tempo de
surgir uma plataforma de entretenimento transmídia que trouxesse todas as
sensações de, verdadeiramente, viver dentro de um filme.
O Entretenimento Imersivo no Brasil
Isso finalmente tomou forma nos últimos anos mundo afora e, em 2013, a
concepção chegou ao Brasil. A ideia dos brasileiros é dar ao público a
aventura que atravessará a barreira do real, onde realmente qualquer um
possa ser qualquer personagem e, por algumas horas, viver dentro de um
filme. Estar nos anos 30, fugir da máfia italiana, explorar lugares secretos,
cumprir missões e salvar a mocinha. Pode parecer um jogo – mas é, caso o
espectador queira, a vida real dentro de um evento imersivo. Atores vivem
personagens que estão dispostos a serem questionados, devem interagir,
pois o público é encorajado a fazê-lo. Os não curiosos ou tímidos podem ficar
apenas observando, fitando as cenas de longe. Cada um terá uma experiência
totalmente diferente. Os que forem além, descobrirão lugares novos,
personagens não explorados no filme original, um prêmio aos desbravadores.
O Negócio Imersão
Sonhar é fácil, todos sonhamos com tudo, mas quando colocamos os
números no papel, a realidade bate à porta e acordamos desse sono
imersivo.
A produção cultural no Brasil é complicada, há editais de fomento por parte
do governo que visam facilitar ao produtor a viabilização de seus projetos.
Nem sempre isso funciona nesse formato – sem entrar em detalhes, são
muitas as variáveis para uma produção inovadora e inédita acontecer no
nosso país.
Na Europa, para citar o mesmo contexto acima, não há o costume de um
evento ser patrocinado, ou seja, a bilheteria é o fator chave para o lucro e a
viabilidade financeira do evento, enquanto aqui as leis de incentivo à cultura
preveem que o patrocinador arque com o custo quase total na produção.
Novamente, sem entrar em detalhes, são mentalidades diferentes, visões
diferentes sobre o mesmo produto.
Nosso desafio como produtores de eventos imersivos no Brasil é mostrar ao
público a grande chance que ele tem em mãos de fazer parte de algo inédito,
único e totalmente diferente. É, da mesma forma, oportunidade para marcas
e produtos estarem atrelados e esses eventos e serem reconhecidos pelo
consumidor como marcas inovadoras e modernas.
O pequeno time que está iniciando no Brasil essa aventura vai, no ano de
2015, dar ao público algumas grandes chances de viver essas experiências e,
então, veremos a inovação chegar finalmente ao nosso país. Ainda no ano de
2014, ocorreram eventos menores que ajudaram a criar esse novo mercado
entre o público, patrocinadores e a imprensa.
Falando em imprensa, ela tem um papel extremamente importante nesse
caso também. Por ser uma linguagem nova, recentemente criada, a imprensa
especializada, de cinema, de teatro, de artes, também terá que entender a
mecânica do evento para, assim, poder analisar, criticar e cobrir os projetos
que virão a seguir. Como formadores de opinião, jornalistas são o grande
termômetro no momento inicial. Sabemos que o teatro experimental, no
Brasil, é bem visto pela mídia e, portanto, não acreditamos haver atrito ou
desconfiança por parte dela a respeito do entretenimento imersivo que os
produtores propõem.
A Experiência e o futuro
Se traçarmos uma linha do tempo que se inicia nos primórdios das arenas
teatrais gregas, passar por experimentações artísticas que mesclavam as
artes nos anos 60 e chegar aos videogames de realidade virtual dos dias de
hoje, vemos a constante necessidade e desejo do público em consumir seus
produtos de maneira cada vez mais íntima, próxima. Essa vontade de tocar e
sentir o herói é observada em qualquer lugar hoje em dia, jovens vestem a
camiseta de seu personagem favorito para ir à estreia de seu filme, e adultos
passam meses criando fantasias dos mesmos heróis para visitarem eventos
gigantescos onde outros milhares de adultos também levam seus sonhos de
criança ao extremo da realidade.
Experiências imersivas, com roteiros pré traçados, atores e figuração
cobrindo cada centímetro da cenografia extremamente detalhada e
totalmente interativa, vêm trazer ao público um novo passo a ser tomado em
direção ao sonho realizado. Poderemos hoje, finalmente, viver dentro dos
filmes que encantaram nossas imaginações quando éramos apenas crianças.
Podemos definir o storytelling interativo presente nos games como "um meio
onde a narrativa e sua evolução podem ser influenciadas, em tempo real pela
sua audiência." Isso significa que não basta interagir com a história, você tem
que participar ativamente. A primeira iniciativa que utilizou esse tipo de
narrativa em um computador se deu em 1975, quando Will Crowther criou
Colossal Cave Adventure. Bem antes, podemos encontrar os War Games, que
emulavam as primeiras narrativas em formato de jogos por volta do começo
do século XX, e o fenômeno Dungeons & Dragons (primeiro RPG de mesa), de
1974, que criou mecânicas incorporadas até hoje na maioria dos games de
maior sucesso.
Isso quer dizer que nem sempre o player vai estar interessado em receber o
conteúdo narrativo, você deve saber alternar entre os estados do jogo, sejam
eles luta, comércio, social ou qualquer um que possa surgir. Se for
necessário, há técnicas que podem inserir conteúdo narrativo de maneira
natural nos games, os chamados cracks:
Imersão tática – a ação é tão rápida que o jogador não tem muito tempo
para planejar.
Acontece em games como Guitar Hero e Space Invaders.
Imersão estratégica – ação em que o jogador precisa pensar sobre algo,
resolver algum enigma ou planejar a sua ação. É mais visível em cardgames,
xadrez e jogos casuais.
A história é o que dá o sentido à ação no jogo, é o que faz valer a pena passar
horas em quests repetitivas sem se frustrar e buscar recompensas passando
por desafios ou se ocupando com esforços (que incluem buscar rastros do
storytelling em outros meios). Para compreender um game na estratégia
transmídia, é necessário criar uma realidade alternativa e desenvolver
mecânicas de jogos que funcionem no mundo real, como portas para essa
realidade. Os jogadores precisam desbravar a narrativa, encontrar pistas e
seguir em frente no fluxo da história/game.
1. As Novas Mídias
Criatividade e inovação
Icaro de Abreu
Antes de mais nada, precisamos deixar claro uma coisa: a criatividade está
para a subjetividade assim como a inovação está para a objetividade. No
geral, a criatividade está nos olhos de quem vê, já a inovação, não
necessariamente.
Fazendo um paralelo com a lógica, que é estudada por duas ciências distintas,
a matemática e a filosofia, podemos perceber que, enquanto uma se prova
perfeitamente dentro de um universo matemático, é impossível alçar novos
caminhos na matemática sem recorrer à vertente filosófica. O mesmo
acontece na contramão, pois sem a estrutura da primeira a segunda jamais se
construiria. É quase paradoxal. Apesar de serem complementares em sua
essência, são distintas e únicas mesmo tempo.
Isso se dá entre os dois tópicos deste texto. Criatividade, por definição, é algo
complexo. Há quem defenda ser a memória RAM da evolução biológica,
Dostoivesky dizia que a necessidade de criar nem sempre coincide com as
possibilidades de criação. Já Antonio Damásio diz que criar consiste não em
fazer combinações inúteis, mas em efetuar aquelas que são úteis. Uma coisa
é fato: criar tem a ver com escolher, pois sem a escolha, a criação nunca saíra
da sua cabeça.
Inovação, por sua vez, está mais ligada a ideia de aperfeiçoamento, de ganhar
eficiência, melhorar algo. É um conceito amplamente trabalhado, e sem
sombra de dúvidas, orientado para resultados mais práticos e sensíveis ao
senso comum. Inovar não é inventar. Saber disso nos afasta da angustia de
ter que criar algo original e pioneiro dentro de nossos estudos e nossas
p ofiss es.àCo oàdi iaàLa oisie ,à"Tudoàseàt a sfo a.àNadaàseà ia ,àouàseja,à
em tudo, de alguma forma, sempre haverá um referencial.
Ser o primeiro não é necessariamente uma vantagem, a não ser que você
esteja correndo os cem metros rasos. Tiro para cima, explosão e acabou.
Temos aí Benjamin Franklin, Google, Facebook e um milhão de outros
exemplos que foram frutos do aperfeiçoamento, principalmente por ter
concorrentes lado a lado. O mercado está mais para uma maratona, e isso só
faz sentido quando seu intuito é dizer que pensou primeiro, o que não
funciona para o mercado em geral. Só funciona na publicidade.
Transmídia
Outra coisa importante de deixar claro é o conceito de Transmídia. Henry
Jenkins diz que se trata de uma narrativa que percorre diversas mídias. Visto
pela perspectiva dos publicitários, isso não passa de uma campanha
integrada, 360º, onde o mesmo discurso é comunicado de forma igual em
todos os meios. O ponto central de diferenciação é o fato de que em cada
meio a história é contada de uma forma diferente e que, se possível, seja
interativa, na qual o público possa de alguma forma participar.
Na publicidade, ainda é muito comum ouvir gente dizendo que uma ideia é
online ouà offline .àEuàe te doà o oàse doà on àa uilo que é transmídia /
i te ati o;àeàa uiloà ueà à off à o oàse doà ídiaà/à oài te ati o.
Qual é mais criativa? De verdade, não existe melhor, são diferentes. Posso
afirmar que uma ideia transmídia é inovadora, mas não mais criativa.
Sinceramente, como afirmar que Laranja Mecânica, do Kubrick, é melhor que
o filme Labirinto, dos estudantes da Unesp? O que é inovador, não é
necessariamente melhor.
Esta história me lembra o famoso caso de quando apareceu a fotografia, e
grande parte das pessoas anunciaram o fim da pintura. Com o aparecimento
do cinema, o mesmo aconteceu com a fotografia. Hoje vemos o mesmo isso
se repetir em relação às estratégias transmídias e à indústria gráfica.
Ninguém vai parar de imprimir nem de fazer conteúdos que não sejam
interativos. O que fica claro é a reacomodação dos setores. Esta visão
apocalíptica sobre a extinção serve apenas como publicidade.
Quando pensamos em Transmídia, o ponto está muito mais ligado ao como
fazer do que necessariamente a o que fazer. O roteiro colaborativo, com
participação da audiência, é algo bem antigo – me desculpem os religiosos,
mas, na minha opinião, o exemplo mais criativo, inovador e bem sucedido
disso é a Bíblia.
O livro dos livros é, sem dúvida, um dos melhores exemplos para falar sobre
engajamento. Ele é construído a partir de ótimas histórias que, de alguma
forma, se conectam com o inconsciente da gente. Nenhuma ideia funciona
sem uma boa história, sem um grande mito. É aí que as pessoas se
reconhecem, onde faz sentido. Inovar é melhorar, aperfeiçoar, superar e,
quando superação é o tema, nenhum mito explica isso melhor que Daniel
San. Estamos falando do mito do herói, aquele que, desde a Grécia, tem um
lugarzinho de destaque no imaginário coletivo.
É aí que a história da inovação se desdobra. Um caminho que remete ao mar
de espinhos antes das rosas e onde faz sentido sofrer, passar por um mar de
pizzas, chefes assírios e ônibus lotados para se chegar ao objetivo.
BIBLIOGRAFIA
LEAL, Bruno. Saber das narrativas: narrar. In: GUIMARÃES, C.; FRANÇA,
V. (orgs.). Na mídia, na rua: narrativas do cotidiano. Belo Horizonte:
Autêntica, 2006.
Mittell, Jason. Previously On: Prime Time Serials and the Mechanics of
Memory. Disponível em:
http://justtv.wordpress.com/2009/07/03/previously-on-prime-time-
serials-and-the-mechanics-of-memory/