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UNA

Roberson C D Gracas

RESENHA DO FILME
PRECISAMOS FALAR SOBRE KEVIN

Resenha do filme Precisamos falar sobre


Kevin solicitado pelo professor Doutor em
psicologia do desenvolvimento Alexandre
Ferreira Campos

BELO HORIZONTE
2020/02
Resenha do filme Precisamos falar sobre Kevin solicitado pelo professor Doutor em
psicologia do desenvolvimento e mestre em ciências da saúde Alexandre Ferreira
Campos
Precisamos falar sobre Kevin (We Need to Talk About Kevin​1​) é um filme do gênero
drama de 2011 dirigido por Lynne Ramsay e estrelado por Tilda Swinton (Eva), Ezra
Miller (Kevin), John C. Reilly (Franklin) e Ashley Gerasimovich (Celia). Baseado no
livro de mesmo nome escrito por Lionel Shriver.

Preparando o ambiente
O filme inicia com uma cortina azul balançando ao vento, alguns raios de luz passam
por ela. As cortinas balançando em janelas tem muito significado na cinematologia,
para este caso, em especial, a diretora Lynne quer passar uma ideia de um espírito,
a saída de um espírito de um corpo, podemos notar isso pelas rajadas de luz que
transpassam a cortina. A câmera não vai adiante, pois, essa cena é um recorte de
uma cena final da película, se fosse adiante revelaria toda a trama neste instante.

Na sequência vemos o festival de luta de Tomatina na Espanha, neste evento


milhares de pessoas lançam umas nas outras centenas de tomates. Este evento
acontece anualmente na Espanha na cidade de Bunol e assim como no carnaval,
todas as pessoas que participam deste evento estão sujeitas a todos os tipos de
situações. Vemos então a protagonista, jovem, carregada nos braços de alguns
foliões, eles a colocam sobre uma quantidade enorme de caldo de tomate e a cor
vermelha não contrasta com nada, ela é a única coisa que a diretora quer que você
veja neste momento.
Ao fundo ouvem-se gritos de algo que ocorrerá no futuro.

Eva acorda, está vestida com uma camisa que pertencia ao seu ex-marido, a casa
está uma bagunça. É importante compreender que a história é contada nos três
tempos, presente, passado e futuro,neste instante estamos no presente.
Ao se levantar ela tropeça em uma mesa e dela caem muitos comprimidos. Sua
aparência remete a alguém completamente cansado. A casa está caindo aos
pedaços assim como Eva.

A cena seguinte é uma tomada mostrando a fachada da casa, ela abre a porta com
a intenção de sair, nota que alguém pichou de vermelho toda sua casa e também o
1
"We Need to Talk About Kevin (2011) - IMDb." ​https://www.imdb.com/title/tt1242460/​. Acessado em
29 set.. 2020.
seu carro que está estacionado logo à frente. A diretora vai usar este artifício com
muita frequência daqui para frente.
Pensando que o espectador não teria visto o filme ainda é importante pensar que o
espectador não estaria sabendo até então o porquê dessas referências vermelhas,
porém, isso se explica perfeitamente à frente.

Um flashback do passado mostra uma casa muito bonita, um completo contraste de


onde ela vive agora, no passado também veremos uma típica família nuclear
formada por um pai, uma mãe e um casal de filhos.

Em alguns momentos a diretora insiste em nos mostrar uma correlação entre o filho,
Kevin, e a mãe, Eva, isso pode ser visto numa das cenas iniciais onde a mãe coloca
o rosto imerso em água e gelo e o filho faz o mesmo mostrando uma repetição do
comportamento da mãe para o filho. Esse comportamento era feito em seus
momentos de tensão e da mesma forma, Kevin.

A diretora mostra também um amoroso pai, já de idade avançada interpretado pelo


ator veterano John C. Reilly.
Eva mostra-se feliz diversas vezes que vê o pai brincando com seus filhos.

No presente é quando a vida de Eva já se tornou um inferno total, ao que tudo


indica, ela estava desempregada, por isso se levanta e vai até uma empresa onde
estão contratando, ela tem um belo currículo e é contratada. Na saída ela mostra um
sorriso, conseguiu o emprego, mas, duas mulheres, uma vítima do filho de Eva a
agride. Em todo o percurso a diretora com muita tranquilidade vai mostrar flashbacks
de algo terrível que aconteceu no passado do qual Eva e a cidade fazem parte ao
passo que em algum momento chegaremos ao que de fato ocorreu.

Eva é uma mulher perturbada entre o que queria ter sido e o que se tornou.
Em uma determinada cena somos levados novamente ao passado, aquele distante
da festa dos tomates, uma voz ecoa e essa clama pela volta de Eva, essa voz
pertence à Franklin.
A concepção de Kevin
É importante saber que os pais de Kevin não tinham tenra idade quando geraram ele
e ao que parece também não tinham hábitos saudáveis. Os dois estão em um
quarto, uma atmosfera vermelha é usada, o coadjuvante ali, Franklin, pergunta à
protagonista, Eva: É seguro? Ao passo que ela responde: Não, como se previsse o
futuro, ao fundo desta cena, que deveria ser a cena de amor da concepção de uma
criança ouvimos uma perturbação com uma mistura de sirenes e trilha de suspense
que quase agoniza, ainda ao fim cliques como o som de uma bomba relógio.

No período de pré-natal a diretora nos mostra uma mulher completamente apática,


não demonstra amor nenhum por nada.

A questão Psicanalítica de liberar as fezes


Quando Eva vai dar a Luz ela segura a criança dentro de si, o profissional de
medicina pede com parcimônia para que ela não resista, porém, ouvimos berros, os
gritos são ensurdecedores, essa cena remete à psicanálise naqueles casos onde
crianças que prendem as fezes, em alguns casos, por vários dias, mostrando sua
incapacidade de se separar delas.
Na sequência temos um pai satisfeito segurando uma criança e uma mãe
completamente apática. Os gritos da mãe agora se transformam no choro da
criança.

Primeira interação na prisão


No minuto 18 somos apresentados ao co-protagonista, Kevin, dentro de uma prisão,
já mais velho. Essa é a primeira interação entre ele e a mãe que é apresentada pela
diretora, isso é, após a prisão dele, nesta cena observamos a falta de comunicação
falada, a comunicação se dá por meio de provocações que partem do personagem
de Ezra para o personagem de Tilda, neste caso, ele tira da boca um material
transparente como se fossem lascas de unha e coloca sobre a mesa.

Essa passagem remete a uma cena onde Eva está em um hipermercado e ela tem
muito cuidado ao escolher uma caixa de ovos, ela vê alguém e com medo de ser
agredida se esconde, quando volta para pegar o carrinho esse alguém já saiu, ao
passar no caixa a atendente nota que todos os ovos estão quebrados, ela vê aquela
pessoa novamente e assustada leva a caixa de ovos como está. Em sua casa faz
ovos mexidos e tira as cascas da boca da mesma forma que o filho tirava aqueles
materiais transparentes.

Primeiros cuidados
Nos primeiros dias de vida da criança Eva se mostra completamente incopetente na
função de mãe. A criança nas mãos dela está constantemente chorando e as
medidas que ela toma para fazer a criança parar são as mais incabíveis possíveis,
medidas como gerar barulho mais alto ou levar a criança até locais de construção
civil onde as britadeiras não permitem que nada além delas seja audível. A criança
chora incessantemente, porém, quando Franklin chega do serviço e vai ter com ela,
ela se acalma, a criança está sempre disposta e então parece uma criança
completamente normal. Isso vai gerar alguns conflitos entre Franklin e Eva no futuro.

Quando se torna um menino com seus 6-8 anos, Kevin se mostra muito inteligente,
mas, não desenvolve linguagem como sua mãe desejaria, por este motivo ela o leva
num profissional, esse faz alguns exames e é questionado sobre o Espectro Autista,
mas, o profissional não encontra nenhum dos critérios. Neste ponto aqui ela deveria
ter procurado outro profissional para ter uma segunda opinião, Kevin poderia talvez
ser acometido da Síndrome de Asperger que é um Autismo de alto-funcionamento,
porém, ela parou neste profissional.

Para com a mãe, a criança mostra uma postura desafiante. Nesta parte devemos
destacar o diálogo entre ela e a criança onde ela diz: Mamãe era feliz antes de o
pequeno Kevin nascer, sabia? Agora a mamãe acorda todas as manhãs querendo
estar na França.

Nova casa
Quando eles saem de Nova Iorque e se mudam para uma casa grande as coisas
continuam ruins para Eva, porém, são mais suportáveis, visto que agora nós vemos
uma maior aparição do personagem de John C. Reilly, no entanto, é nesta casa que
os maiores acontecimentos vão ocorrer.
Existe uma cena onde Kevin pinta de vermelho todo um quarto onde Eva fazia
colagens de mapas e de coisa que aparentemente eram das viagens que ela já
fizera, ele fez isso após ela dizer que um dia ela faria um lugar especial para ele,
aqui nós temos dois caminhos para tentar entender o comportamento de Kevin: ele
estava tentando fazer daquele quarto um lugar especial também para ele ou ele
estava tentando destruir algo especial para Eva.
Nesta situação, ela não bate nele, ela somente destrói o brinquedo que ele usa para
pintar o quarto.

É importante notar que Kevin é um menino grande e ainda usa fraldas.

Na sequência, a cena dos números, uma cena que ele conta até 50 para desafiá-la,
depois, para provocá-la ele defeca em sua fralda, ela o troca e de propósito ele faz
novamente, então ela o arremessa e ao cair ele quebra o braço. Esse braço
quebrado gera uma cicatriz que mais tarde na prisão ele mostra para ela e insinua
que se tivesse mais daquilo talvez ele teria se corrigido.
Quando criança, ele vai usar esse evento para manipular a mãe no caso dela não
fazer suas vontades contando para o pai a verdade sobre seu braço a respeito de
uma mentira que ele mesmo elabora para esconder a agressão da mãe.

Kevin doente
Existe um pequeno momento de harmonia entre os dois que acontece quando Kevin
adoece. O pai chega a procurar o filho que está deitado no colo da mãe, mas, esse
prefere ficar com a mãe e descarta o pai, ele está sempre criando esse hiato entre
os pais. A mãe está lendo um livro do jovem Robin Hood.
Quando ele melhora, tudo volta ao que era antes.

O arco e flecha
No aniversário de Kevin, Franklin dá a ele um arco e flecha de brinquedo, tudo
remetendo ao Robin Hood. A evolução desse instrumento de caça será usado por
ele para cometer seu delito. Depois desse arco de plástico o pai o dá um semi
profissional e por fim um profissional à medida que ele também vai se tornando cada
vez mais habilidoso com o instrumento.
Segunda gravidêz
Quando Eva engravida novamente ela esconde do marido o fato, não é possível ver
na película o motivo, mas, é possível imaginar que talvez ela quisesse abortar.
Celia nasce e a relação entre ela e Kevin é uma relação monovalente, Kevin não
demonstra ou não tem amor nenhum por ela.

Quando Celia perde a visão muitas variáveis apontam para dizer que Kevin tem
algum envolvimento, nesta parte, inicia-se o processo de separação do casal
Franklin e Eva. Franklin não acredita nas versões de Eva e chega a sugerir que ela
procure ajuda, mas, é mesmo uma incógnita o envolvimento do adolescente com a
perda da visão da irmã, os únicos indícios que temos é a palavra de Eva e seu
comportamento bizarro ao ouvir o pedido de desculpas forçado pelo marido, Kevin
expõe a polpa de uma fruta como se removesse do globo ocular o olho de alguém.
Eva pode ter criado uma lente onde só se vê Kevin e por este motivo o culpa de tudo
ao seu redor.

Três dias para dezesseis anos


Antes de completar dezesseis anos de idade Kevin vai para a escola armado de seu
arco e flecha, tranca todas as saídas e assassina nove alunos, em sua casa, seu pai
e sua irmã também são vítimas dele. Antes disso, ele teria gravado um vídeo
dizendo que na TV se veem pessoas como ele.

Ao final do longa uma cortina brilha com uma luz azulada, quando a câmera passa
por ela podemos ver Celia e Franklin mortos, alvejados por flechas.

Dois anos depois 


Dois anos se passaram, Eva está como visitante novamente, a aparência do garoto
já é outra, um pouco machucado, algumas cicatrizes, cabelo raspado. Eva diz que
logo ele vai sair da prisão. O enquadramento o posiciona de lado, a iluminação de
frente vai deixar à vista somente o que a diretora quer que vejamos. O fundo escuro
mostra a obscuridade do próprio personagem, sem ela não seria possível entender a
melancolia pela qual ele passa neste momento. Eva então diz: “Quero que você me
diga porque?” No que ele responde: “Eu costumava achar que sabia, agora já não
estou tão certo.”
O tempo da visita acaba e o olhar de Kevin convida Eva para abraça-lo.

Ainda no diálogo entre os dois na prisão ele diz que nunca tinha sido feliz, isso
remete a quando ela disse que tornou-se infeliz após o nascimento dele.

Conclusão
Alguém não pode dizer que Kevin nascera ruim, as pessoas se tornam ruins ou se
tornam boas de acordo com o ambiente onde se desenvolvem, seja este ambiente
de trabalho, familiar ou outro. O Homem é transformador de seu meio e este mesmo
meio o transforma.
Referências 
PRECISAMOS falar sobre Kevin. Direção de Lynne Ramsay. Reino Unido: Oscilloscope
Pictures, 2011. Cor (112 min.).

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