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DOCUMENTO Nº 3 – Acórdão paradigma – Recurso

Especial nº 1.989.089/MT
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.989.089 - MT (2021/0344755-3)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI


RECORRENTE : ENCO ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS : CARLOS REZENDE JÚNIOR - MT009059
JACKSON NICOLA MAIOLINO - MT017147
DANIELE IZAURA DA SILVA CAVALARI REZENDE - MT006057
RECORRIDO : MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
RECORRIDO : MARCELO MALDONADO RODRIGUES
RECORRIDO : ERIKA CAMARGO GERHARDT
RECORRIDO : FLAVIO BRUNO AMANCIO VALE FONTENELE
RECORRIDO : JOÃO CLOSS JÚNIOR
ADVOGADOS : GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER - SP350031
MICHAEL RODRIGO DA SILVA GRAÇA - MT018970O
RODRIGO TERRA CYRINEU - MT016169
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. HONORÁRIOS


ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. NÃO
OCORRÊNCIA. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE PEDIDO.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. CONFIGURAÇÃO.
1. Ação de cobrança ajuizada em 10/05/2017, da qual foi extraído o
presente recurso especial interposto em 05/07/2021 e concluso ao gabinete
em 14/12/2021.
2. O propósito recursal consiste em dizer se a) o acórdão recorrido violou a
coisa julgada; b) o arbitramento de honorários pelo juiz, em ação de
cobrança de honorários advocatícios contratuais, configura julgamento extra
petita e c) houve inovação recursal, violação ao duplo grau de jurisdição e
ao princípio da não surpresa.
3. A coisa julgada verifica-se quando se reproduz ação anteriormente
ajuizada (art. 337, § 1º, do CPC/2015). Isto é, quando presente a tríplice
identidade: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido. Assim,
sendo distintos a causa de pedir e os pedidos, inexiste em violação à coisa
julgada.
4. O princípio da congruência ou adstrição está previsto no art. 141 do
CPC/2015 e impõe ao julgador a observância do pedido. Por sua vez, o art.
492 do mesmo diploma legal estabelece que “é vedado ao juiz proferir
decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em
quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.
Portanto, caso o juiz ultrapasse os limites do pedido e não se trate de
hipótese excepcionada pela lei, a decisão será proferida com error in
procedendo, caracterizando-se como ultra ou extra petita.
5. Enquanto a ação de cobrança de honorários funda-se na existência de
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acordo prévio acerca dos honorários advocatícios, a ação de arbitramento
de honorários está prevista no art. 22, § 2º, do Estatuto da OAB para a
hipótese de ausência de estipulação quanto aos honorários. Desse modo,
ajuizada ação de cobrança de honorários com base na existência de
convenção a respeito do seu valor, não é dado ao juiz proceder ao
arbitramento dos honorários, sob pena de proferir decisão extra petita.
6. Na espécie, os recorridos ajuizaram ação de cobrança de honorários
advocatícios contratuais, fundada na existência de contratos verbais e
escritos, postulando a condenação da recorrente ao pagamento do
montante avençado em razão da revogação do mandato. Não houve pedido
de arbitramento de honorários. Destarte, embora o Tribunal tenha
reconhecido a nulidade das avenças, procedeu ao arbitramento dos
honorários, proferindo acórdão extra petita.
7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira


Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso
especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram
com a Sra. Ministra Relatora.
Dr. JACKSON NICOLA MAIOLINO, pela parte RECORRENTE: ENCO
ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA
Dr. GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER, pela parte RECORRIDA:
MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
Dr. RODRIGO TERRA CYRINEU, pela parte RECORRIDA: ERIKA CAMARGO
GERHARDT

Brasília (DF), 26 de abril de 2022(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI


Relatora

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2021/0344755-3 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.989.089 / MT

Números Origem: 1014296-11.2017.8.11.0041 10142961120178110041

PAUTA: 05/04/2022 JULGADO: 05/04/2022

Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EDUARDO KURTZ LORENZONI
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : ENCO ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS : CARLOS REZENDE JÚNIOR - MT009059
JACKSON NICOLA MAIOLINO - MT017147
DANIELE IZAURA DA SILVA CAVALARI REZENDE - MT006057
RECORRIDO : MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
RECORRIDO : MARCELO MALDONADO RODRIGUES
RECORRIDO : ERIKA CAMARGO GERHARDT
RECORRIDO : FLAVIO BRUNO AMANCIO VALE FONTENELE
RECORRIDO : JOÃO CLOSS JÚNIOR
ADVOGADOS : GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER - SP350031
MICHAEL RODRIGO DA SILVA GRAÇA - MT018970O
RODRIGO TERRA CYRINEU - MT016169

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Prestação de Serviços

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"Adiado por indicação do Sr. Ministro Presidente para a Sessão do dia 26/04/2022."

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RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ENCO ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS : CARLOS REZENDE JÚNIOR - MT009059
JACKSON NICOLA MAIOLINO - MT017147
DANIELE IZAURA DA SILVA CAVALARI REZENDE - MT006057
RECORRIDO : MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
RECORRIDO : MARCELO MALDONADO RODRIGUES
RECORRIDO : ERIKA CAMARGO GERHARDT
RECORRIDO : FLAVIO BRUNO AMANCIO VALE FONTENELE
RECORRIDO : JOÃO CLOSS JÚNIOR
ADVOGADOS : GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER - SP350031
MICHAEL RODRIGO DA SILVA GRAÇA - MT018970O
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RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):


Cuida-se de recurso especial interposto por ENCO ENGENHARIA E
COMÉRCIO LTDA ME, com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo
constitucional, contra acórdão do TJ/MT.
Recurso especial interposto em: 05/07/2021.
Concluso ao gabinete em: 14/12/2021.
Ação: de cobrança de honorários advocatícios ajuizada por JOÃO
CLOSS JUNIOR, MARCELO MALDONADO RODRIGUES, MANOEL RIBEIRO DE
MATOS JUNIOR, ERIKA CAMARGO GERHARDT e FLÁVIO BRUNO A. VALE
FONTENELE em desfavor da recorrente.
Segundo narra a inicial, os autores foram contratados, em 2006, pela
ré, para representá-la em duas ações judiciais, tendo sido convencionado
verbalmente os honorários advocatícios contratuais em 5% do valor bruto apurado
em sede de liquidação. Com o falecimento sócio gerente da requerida, em 2013, a
sua esposa, a qual alega ter ficado responsável pela administração da sociedade,
assinou os instrumentos contratuais.

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Todavia, em 2014, os autores foram notificados extrajudicialmente
acerca da revogação dos poderes que lhe haviam sido outorgados pela ré.
Sentença: julgou improcedente o pedido, com base no fundamento
segundo o qual o contrato é nulo, já que celebrado por quem não detinha poderes
para tanto, e não ficou comprovado o efetivo valor dos honorários contratuais
convencionados.
Acórdão: deu provimento à apelação interposta pelos recorridos, nos
termos da seguinte ementa:

SERVIÇOS INCONTROVERSA – ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS – POSSIBILIDADE


–VALOR FIXADO DE ACORDO COM O TRABALHO DESEMPENHADO PELO CAUSÍDICO
–SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. No caso, ainda que a formalização
do contrato de honorários advocatícios seja nula, o certo é que houve, de forma
incontroversa, a efetiva prestação dos serviços pelos causídicos, fazendo jus a
remuneração contratada ou, inexistindo contratação, àquela que vier a ser
arbitrada. É plenamente possível o arbitramento de honorários advocatícios, sob o
fundamento dos princípios da razoabilidade, boa-fé contratual, função social do
contrato e da vedação do locupletamento sem causa, em razão do trabalho
desempenhado pelo causídico, até o momento de sua destituição, nos casos em
que o contrato de remuneração por êxito, ainda que verbal, é rescindido
unilateralmente sem justa causa pelo contratante. O valor arbitrado a título de
honorários advocatícios deve estar de acordo com o trabalho desempenhado pelo
patrono, respeitando o grau de zelo do profissional; o lugar da prestação do serviço;
a natureza e importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado, bem como
o tempo exigido para o seu serviço. No caso de ação de arbitramento de honorários
advocatícios, os juros de mora incidem a partir da citação e a correção monetária a
contar do arbitramento.

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram


rejeitados pelo Tribunal a quo.
Recurso especial: alega violação aos arts. 9º, 10, 141, 329, II, 492,
502, 503, 505, 506, 507 e 1.014 do CPC/2015, além de dissídio jurisprudencial.
Sustenta que o julgamento é extra petita, porquanto os recorridos não postularam,
na inicial, o arbitramento de honorários advocatícios, mas apenas a condenação
dos recorrentes ao pagamento do valor contratado. Nesse sentido, aduz que o
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acórdão recorrido também violou o princípio da não surpresa, já que não foi
oportunizado às partes se manifestar sobre o tema, e o duplo grau de jurisdição.
Defende que o pedido de arbitramento de honorários configura inovação recursal.
Argumenta que, inexistindo contrato escrito, deveria ter sido comprovado o
quantum postulado na exordial, o que não ocorreu. Sustenta, ademais, que o
acórdão recorrido ofendeu a coisa julgada ao decidir sobre matéria já julgada na
apelação n° 80000/2017.
Juízo prévio de admissibilidade: o Tribunal de origem inadmitiu o
recurso especial, ensejando a interposição do recurso cabível, o qual foi reautuado
para melhor exame da matéria.
É o relatório.

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EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. HONORÁRIOS


ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. NÃO
OCORRÊNCIA. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE PEDIDO.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. CONFIGURAÇÃO.
1. Ação de cobrança ajuizada em 10/05/2017, da qual foi extraído o
presente recurso especial interposto em 05/07/2021 e concluso ao gabinete
em 14/12/2021.
2. O propósito recursal consiste em dizer se a) o acórdão recorrido violou a
coisa julgada; b) o arbitramento de honorários pelo juiz, em ação de
cobrança de honorários advocatícios contratuais, configura julgamento extra
petita e c) houve inovação recursal, violação ao duplo grau de jurisdição e
ao princípio da não surpresa.
3. A coisa julgada verifica-se quando se reproduz ação anteriormente
ajuizada (art. 337, § 1º, do CPC/2015). Isto é, quando presente a tríplice
identidade: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido. Assim,
sendo distintos a causa de pedir e os pedidos, inexiste em violação à coisa
julgada.
4. O princípio da congruência ou adstrição está previsto no art. 141 do
CPC/2015 e impõe ao julgador a observância do pedido. Por sua vez, o art.
492 do mesmo diploma legal estabelece que “é vedado ao juiz proferir
decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em
quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.
Portanto, caso o juiz ultrapasse os limites do pedido e não se trate de
hipótese excepcionada pela lei, a decisão será proferida com error in
procedendo, caracterizando-se como ultra ou extra petita.
5. Enquanto a ação de cobrança de honorários funda-se na existência de
acordo prévio acerca dos honorários advocatícios, a ação de arbitramento
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de honorários está prevista no art. 22, § 2º, do Estatuto da OAB para a
hipótese de ausência de estipulação quanto aos honorários. Desse modo,
ajuizada ação de cobrança de honorários com base na existência de
convenção a respeito do seu valor, não é dado ao juiz proceder ao
arbitramento dos honorários, sob pena de proferir decisão extra petita.
6. Na espécie, os recorridos ajuizaram ação de cobrança de honorários
advocatícios contratuais, fundada na existência de contratos verbais e
escritos, postulando a condenação da recorrente ao pagamento do
montante avençado em razão da revogação do mandato. Não houve pedido
de arbitramento de honorários. Destarte, embora o Tribunal tenha
reconhecido a nulidade das avenças, procedeu ao arbitramento dos
honorários, proferindo acórdão extra petita.
7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.

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RECORRENTE : ENCO ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS : CARLOS REZENDE JÚNIOR - MT009059
JACKSON NICOLA MAIOLINO - MT017147
DANIELE IZAURA DA SILVA CAVALARI REZENDE - MT006057
RECORRIDO : MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
RECORRIDO : MARCELO MALDONADO RODRIGUES
RECORRIDO : ERIKA CAMARGO GERHARDT
RECORRIDO : FLAVIO BRUNO AMANCIO VALE FONTENELE
RECORRIDO : JOÃO CLOSS JÚNIOR
ADVOGADOS : GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER - SP350031
MICHAEL RODRIGO DA SILVA GRAÇA - MT018970O
RODRIGO TERRA CYRINEU - MT016169

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):


O propósito recursal consiste em dizer se a) o acórdão recorrido
violou a coisa julgada; b) o arbitramento de honorários pelo juiz, em ação de
cobrança de honorários advocatícios contratuais, configura julgamento extra
petita; d) houve inovação recursal, violação ao duplo grau de jurisdição e ao
princípio da não surpresa.

I. Da violação à coisa julgada


I. A coisa julgada material consiste na “autoridade que torna
imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso” (art. 502 do
CPC/2015). Trata-se, assim, de “qualidade dela representada pela 'imutabilidade'
do julgado e de seus efeitos, depois que não seja mais possível impugná-los por
meio de recurso” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual
Civil. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1337).
II. A coisa julgada verifica-se quando se reproduz ação
anteriormente ajuizada (art. 337, § 1º, do CPC/2015). Isto é, quando presente a

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tríplice identidade: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido.
III. Na espécie, a recorrente argumenta que a questão debatida
nestes autos já foi solucionada em outro processo em que figuravam as mesmas
partes, cujo acórdão transitou em julgado.
IV. Conforme colhe-se dos autos, houve mesmo outra ação de
cobrança de honorários advocatícios envolvendo as mesmas partes, na qual o
Tribunal local decidiu não ser cabível o arbitramento de honorários, porque
caracterizava alteração extemporânea do pedido.
V. Todavia, como sublinhado no acórdão recorrido, “apesar de
possuir as mesmas partes, tem objeto completamente distinto do quanto discutido
nesse feito, haja vista que naqueles autos o autor [ora recorrido] buscava o
recebimento de honorários advocatícios por ter laborado em demandas na
Comarca de Várzea Grande/MT, enquanto no presente feito defende o labor
prestado em demandas na Comarca de Cáceres/MT e Rio Branco/MT” (e-STJ, fl.
3313).
VI. Dessa forma, ausente a tríplice identidade, não há que se falar
em violação aos arts. 502, 503, 505, 506 e 507 do CPC/2015.

II. Do princípio da congruência ou adstrição e do julgamento


extra petita
VII. Um dos mais importantes princípios que instruem o Direito
Processual Civil é o dispositivo, ou da inércia da jurisdição, segundo o qual o direito
de ação pertence às partes ou interessados, sendo o processo instaurado somente
mediante sua provocação (art. 2º do CPC/15).
VIII. O princípio da congruência ou adstrição entre o pedido e a
sentença é, por sua vez, manifestação necessária do princípio dispositivo, “daí por

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que, sendo o objeto da causa o pedido do autor, não pode o juiz decidir fora dele”
(THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. I, 55ª ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 2014, pág. 559). É, também, consequência do direito ao
contraditório, já que deve ser assegurada à parte a oportunidade de manifestar-se
sobre todas as questões capazes de influir na decisão.
IX. Tal princípio está consagrado no art. 141 do CPC/15, e pode ser
decomposto em pelo menos duas regras: a) “o conflito de interesses que surgir
entre duas pessoas será decidido pelo juiz não totalmente, mas apenas nos limites
que elas o levarem ao processo” (BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de
Processo Civil. Vol. 1. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, pág. 403); e b) o juiz
não pode “conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exige
iniciativa das partes” (Idem, ibidem, pág. 404). O art. 492 do mesmo diploma legal
serve de complementação ao estabelecer que “é vedado ao juiz proferir decisão de
natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior
ou em objeto diverso do que lhe foi demandado”.
X. As ressalvas a essas duas regras, que correspondem à atuação
de ofício do magistrado, são excepcionais e estão previstas de forma expressa no
texto legal. Assim, caso o juiz ultrapasse os limites do pedido e não se trate de
hipótese excepcionada pela lei, a decisão será proferida com error in procedendo,
caracterizando-se como ultra ou extra petita.
XI. Conforme elucida a doutrina, na decisão extra petita “o
magistrado deixa de analisar algo que deveria ser apreciado e examina outra coisa
em seu lugar” (DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. 11. ed.
Salvador: JusPodivm, 2016, p. 368). Ou seja, o julgador se afasta da pretensão
deduzida pelo autor, “caracterizada como expressão de uma aspiração ou desejo e
acompanhada do pedido de um ato jurisdicional que a satisfaça” (DINAMARCO,
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Cândido Range. Instituições de Direito Processual Civil. Vol I. Malheiros: São Paulo,
2001, p. 214).
XII. Acerca do tema, a jurisprudência desta Corte Superior é no
sentido de que não há que se falar em julgamento extra petita quando o
provimento jurisdicional é decorrência lógica do pedido, compreendido como
corolário da interpretação lógico-sistemática das alegações constantes da petição
inicial (REsp 1.255.398/SP, Terceira Turma, DJe de 30/05/2014; AgInt no AREsp
1.697.837/SP, Quarta Turma, DJe 13/04/2021; AR 3.751/PR, Segunda Seção, DJe
08/04/2019).
XIII. Nesse contexto, é imprescindível delimitar a natureza jurídica
da presente ação, a fim de avaliar se o acórdão impugnado vulnerou os arts. 141 e
492 do CPC/2015.
XIV. Consabidamente, “os honorários convencionais são aqueles
estabelecidos por meio de contrato entre o advogado e o seu cliente. Os
honorários arbitrados decorrem de pronunciamento judicial, que é necessário na
hipótese de inexistência de avença escrita entre o advogado e o seu cliente (art. 22,
§ 2º, do EOAB)” (GONÇALVES, Sandra Krieger. A ação de arbitramento de
honorários advocatícios no Novo Código de Processo Civil. In: DIDIDER JR., Fredir
[et. al.]. Honorários Advocatícios. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 950).
XV. Dito de outro modo, enquanto a ação de cobrança de
honorários funda-se na existência de acordo prévio acerca dos honorários
advocatícios, “a ação de arbitramento de honorários é prevista no art. 22, § 2º, do
Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94), para a hipótese de 'falta de estipulação ou
de acordo' quanto aos honorários, uma norma supletiva, portanto” (REsp
1541031/RJ, Terceira Turma, DJe 05/09/2016, p. 67).
XVI. Na hipótese em julgamento, os recorridos fundamentaram sua
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pretensão na existência de contrato verbal pactuado com a recorrente, por meio
do qual “fora estabelecido que pelos serviços prestados pagaria a título de
honorários a importância correspondente a 5% (cinco por cento) do valor bruto
apurado quando da respectiva liquidação das verbas pretéritas” (petição inicial, e-
STJ, fl. 13). Argumentaram, ademais, que, no curso da relação negocial, a viúva e
inventariante do espólio do ex-sócio gerente da sociedade recorrente assinou os
instrumentos contratuais, formalizando a relação contratual.
XVII. Destacou-se, na inicial, que “nos contratos firmados entre
REQUERENTES e REQUERIDA, resta estabelecido que (ver docs. 1649 a 1655):

CLÁUSULA SÉTIMA: “O total dos honorários poderá ser exigidos


imediatamente, se houver composição amigável realizada por qualquer das
partes litigantes ou no caso do não prosseguimento da causa por circunstâncias
não determinadas pelos CONTRATADOS, ou ainda, se lhe for cassado o mandato
sem culpa do mesmo”. (e-STJ, fl. 19)

XVIII. Assim, os recorridos aduziram que “a revogação dos poderes


outorgados aos REQUERENTES para o patrocínio das demandas (...) gera a estes o
direito de perceber os honorários contratuais devidos pela REQUERIDA” (e-STJ, fl.
18).
XIX. Inclusive, os recorridos destacaram que, embora a ação
monitória proposta anteriormente contra os recorrentes tenha sido extinta sem
resolução do mérito, “diante do reconhecimento da validade dos contratos, por
sentença transitada em julgado, é necessária a observância da Cláusula Sétima
dos referidos contratos:
CLÁUSULA TERCEIRA: Em remuneração por tais serviços, as partes
CONTRATANTES, pagará aos CONTRATADOS, a título de Honorários Advocatícios
a importância correspondente a 5% (cinco por cento) do valor bruto apurado,
quando da respectiva liquidação, correspondentes as verbas pretéritas.
(...)
CLÁUSULA SÉTIMA: O total dos honorários poderá ser exigidos
imediatamente, se houver composição amigável realizada por qualquer das
partes litigantes ou no caso do não prosseguimento da causa por circunstâncias
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não determinadas pelos CONTRATADOS, ou ainda, se lhe for cassado o mandato
sem culpa do mesmo”. (e-STJ, fl. 21)

XX. Verifica-se, assim, que a causa de pedir próxima consiste na


resilição unilateral dos contratos pela recorrente (ré) e na existência de
estipulação acerca dos honorários contratuais por ela devidos aos recorridos
(autores).
XXI. A reforçar essa conclusão, ao final da petição inicial, os
recorridos asseveraram que:

Urge destacar que os créditos dos REQUERENTES, até o


momento do ajuizamento da presente ação, estão ilíquidos, somente
adquirindo a condição de liquidez após o trânsito em julgado das referidas ações,
o que não impede este augusto Juízo de declarar o direito sobre eles, ex vi do
artigo 19, inciso I, do Código de Processo Civil. (e-STJ, fls. 21-22)

XXII. Por sua vez, o pedido foi formulado nos seguintes termos:

10.1. Posto isso, requer à Vossa Excelência:


(...)
d) Julgar procedente o feito, para condenar a REQUERIDA a
pagar o valor pretendido pelos REQUERENTES a título de honorários
na forma que foram contratados, que serão apurados após trânsito em
julgado em execução de sentença dos autos nº 508.89.2009.811.0052 Código
11180 Comarca de Rio Branco-MT e nº 71-51.1993.811.0006 Código 3333 na
Comarca de Cárceres-MT, após apresentação da nova perícia contábil; (e-STJ, fl.
22) (grifou-se)

XXIII. Em sede de apelação, os recorridos reiteraram a linha


argumentativa deduzida na petição inicial, requerendo o provimento do recurso, “a
fim de que, reformada a r. sentença, sejam integralmente acolhidos os pedidos
inaugurais, determinando-se o pagamento de honorários advocatícios contratuais
aos Apelantes no importe de 5% (cinco por cento) do resultado das ações nas quais
atuaram em favor da Apelada” (e-STJ, fl. 3173).

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XXIV. Diante de tais delineamentos, é evidente que a pretensão
nunca foi de arbitramento judicial de verba honorária, mas sim de cobrança de
honorários alegadamente convencionados. É dizer, está-se diante de ação
ordinária de cobrança e não de ação de arbitramento de honorários.
XXV. Nesse sentido foi a conclusão adotada pelo juízo de primeiro
grau, in verbis:

Frise-se que, a despeito dessa indefinição na fundamentação


do pedido, a pretensão final dos autores não é a de arbitramento dos
honorários advocatícios, como também se depreende do nome
dado à ação, mas de condenação ao pagamento na forma em que
contratados, o que pressupõe a prova cabal de uma avença, escrita ou não,
acerca dos serviços profissionais e que, diante da divergência entre as partes e da
ausência de prova oral, torna vital para o desenlace do feito a análise do contrato
escrito supostamente pactuado entre os litigantes. (e-STJ, fl. 3147) (grifou-se)

XXVI. Sem se atentar às peculiaridades anotadas, o Tribunal a quo, ao


julgar o recurso de apelação dos recorridos, nada obstante tenha sublinhado que
“não há provas do valor da contratação, e nem contrato escrito, já que a nulidade
do contrato apresentado, de fato se mostra correta, pelas razões postas na r.
sentença”, asseverou que “nada impede o arbitramento dos honorários na
presente demanda, já que, reafirmo, os advogados não podem ficar sem
remuneração, sob pena de legalização de calote por parte do Judiciário” (e-STJ, fl.
3241). Na sequência, realizou o arbitramento dos honorários advocatícios, na
forma do art. 22, § 2º, do Estatuto da OAB, fixando-os em R$ 1.000.000,00 (um
milhão de reais).
XXVII. Entretanto, ante a ausência de pedido de arbitramento de
honorários, ao assim proceder, a Corte estadual proferiu acórdão extra petita.
XXVIII. Acolhido o argumento de violação aos arts. 141 e 492 do CPC,
ficam prejudicadas as demais teses recursais.

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III. Conclusão
XXIX. Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e DOU-LHE
PARCIAL PROVIMENTO, para restabelecer a sentença, inclusive no que concerne à
distribuição dos ônus sucumbenciais.
XXX. Ante o resultado do julgamento, deixo de aplicar o disposto no
art. 85, § 11, do CPC/2015.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2021/0344755-3 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.989.089 / MT

Números Origem: 1014296-11.2017.8.11.0041 10142961120178110041

PAUTA: 05/04/2022 JULGADO: 26/04/2022

Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ROGÉRIO DE PAIVA NAVARRO
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : ENCO ENGENHARIA COMÉRCIO LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS : CARLOS REZENDE JÚNIOR - MT009059
JACKSON NICOLA MAIOLINO - MT017147
DANIELE IZAURA DA SILVA CAVALARI REZENDE - MT006057
RECORRIDO : MANOEL RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
RECORRIDO : MARCELO MALDONADO RODRIGUES
RECORRIDO : ERIKA CAMARGO GERHARDT
RECORRIDO : FLAVIO BRUNO AMANCIO VALE FONTENELE
RECORRIDO : JOÃO CLOSS JÚNIOR
ADVOGADOS : GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER - SP350031
MICHAEL RODRIGO DA SILVA GRAÇA - MT018970O
RODRIGO TERRA CYRINEU - MT016169

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Prestação de Serviços

SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr. JACKSON NICOLA MAIOLINO, pela parte RECORRENTE: ENCO ENGENHARIA
COMÉRCIO LTDA
Dr. GUSTAVO HENRIQUE CARVALHO SCHIEFLER, pela parte RECORRIDA: MANOEL
RIBEIRO DE MATOS JUNIOR
Dr. RODRIGO TERRA CYRINEU, pela parte RECORRIDA: ERIKA CAMARGO GERHARDT

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial, nos
termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
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Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente),
Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.

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