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o DESAFIO
DO CONHECIMENTO
PESQ UISA QUALITATIVA EM SAÚD E
14.“ EDIÇÃO
HUCITEC EDITORA
sta obra, a partir da nona edição, constitui
E uma revisão ampliada e aprimorada do livro
O Desafio do Conhecimento. Nele, Cecília Minayo,
uma das autoras brasileiras mais importantes no
campo das ciências sociais em saúde, introduz o
leitor nas abordagens desse ramo do conhecimen
to e, em especial, da pesquisa qualitativa aplicada
à saúde. O livro faz uma releitura das edições an
teriores, colocando-se em dia com as mudanças
no campo das ciências em geral, no campo das
ciências sociais e no campo metodológico. E, por
isso, um texto aprofundado e complexo que evi
dencia os anos de experiência pessoal e de tra
balho em equipe da autora.
Embora ofereça elementos para elaboração de
investigações sociais de qualquer tipo, o forte deste
livro é a construção de pesquisas empíricas. Para
isso, a autora trata da metodologia como um cam
po de conhecimento específico e ao mesmo tempo
articulado com as teorias sociais, com a filosofia da
ciência e com os influxos das mudanças no mundo
da vida. Esta obra está composta por cinco partes,
além da introdução e da conclusão.
Na primeira parte, são analisados os conceitos
principais que dão consistência ao tema da meto
dologia e das abordagens qualitativas. Na segunda
parte, são abordadas as principais teorias sociais
com seu acervo de métodos, pois a autora entende
que teoria e método caminham juntos. Na tercei
ra parte, são apresentados e problematizados to
dos os passos para construção de um projeto de
pesquisa qualitativa e para o processo explorató
rio que qualquer investigação requer. Na quarta
parte, são tratadas as bases teóricas, as estratégias e
as técnicas de trabalho de campo. Na quinta pat-
te, estão abordadas várias técnicas de análise, além
de uma teflexão específica sobre validação e fide-
dignidade em investigação qualitativa e uma pro
posta para triangulação de métodos quantitativos
e qualitativos.
Pela abrangência e profundidade que contém,
este livro, além de propor instrumentos efetivos
de abordagem qualitativa é também uma fonte de
reflexão sobre o lugar do social no campo da
.saúde.
Saúde em Debate 46
direção de
Gastão Wagner de Sousa Campos
Maria Cecília de Souza Minayo
José Rubem de Alcântara Bonfim
Marco Akerman
Marcos Drumond Júnior
Yafa Maria de CarvaJho
ex-diretores
David Capistrano Filho
Emerson Elias Merhy
. Atenção em Saúde M en tal p ara Crianças e Adolescentes no SUS, Edith Lauridsen-Ribeiro ôc Oswaldo Yoshimi
Tanaka (orgs.)
Dilerttas e Desafios da Gestão Municipal do SUS: Avaliação da Implantação do Sistema Municipal de Saúde em Vitó
ria da Conquista (Bahia) 1997-2008, Jorge José Santos Pereira Solla
Semiótica, Afecção e o Trabalho em Saúde, Túlio Batista Franco 8c Valéria do Carmo Ramos
Adoecimento Crônico Infantil: um estudo das narrativas familiares, Marcelo Castellanos
Poder, Autonomia e Responsabilização: Promoção da Saúde em Espaços Soáais da Vida Cotidiana, Kênia Lara Silva
8c Roseli Rosângela de Sena
Política e Gestão Pública em Saúde, Nelson Ibanez, Paulo Eduardo Mangeon Elias 8c Paulo Henrique D ’Angelo
Seixas (orgs.)
Educação Popular na Formação Universitária: Reflexões com Base em uma Experiência, Eymard Mourão Vascon
celos 6c Pedro José Santos Carneiro Cmz (orgs.)
O Ensino das Práticas In ter a tiv a s e Complementares: Experiências e Percepções, Nelson Filice de Barros, Pamela
Siegel 6cM árcia Aparecida Padovan Otani (orgs.)
Saúde Suplementar, Biopolíticae Promoção da Saúde, Carlos Dimas Martins Ribeiro, Túlio Batista Franco, Aluisio
Gomes da Silva Júnior, Rita de Cássia Duarte Lima, Cristina Setenta Andrade (orgs.)
Promoção da Saúde: Práticas Grupais na Estratégia Saúde da Família, João Leite Ferreira Neto 8c Luciana Kind
Capitalismo e Saúde no Brasil nos anos 90: as Propostas do Banco M undiale o Desmonte do S US, Maria Lucia Frizon
Kizzotto
Masculino c Fem inino: a Prim eira Vez. A Análise de Gênero sobre a Sexualidade na Adolescência, Silmara Conchão
Educação Médica: Gestão, Cuidado, A valiação,]o^ o]osé Neves Marins ôc Sérgio Rego (orgs.)
Retratos da Formação M édica nos Novos Cenários de Prática, Maria Inês Nogueira
Saúde da Mulher na Diversidade do Cuidado na Atenção Básica, Raimunda Magalhães da Silva, Luiza Jane Eyre de
Souza Vieira, Patrícia Moreira Costa CoUares (orgs.)
Cuidados da Doença Crônica na Atenção Prim ária de Saúde, Nelson Filice de Barros (org.)
Tempos Turbulentos na Saúde Pública Brasileira: Impasses do Financiamento no Capitalismo Financeirizado, Áquilas
Mendes
A Melhoria R ápida da Qualidade nas Organizações de Saúde, Georges Maguerez
Saúde, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação, Ana Luiza d’Avila Viana, Aylene Bousquat ôcNelson
Ibanez
Tecendo Redes: os Planos de Educação, Cuidado e Gestão na Construção do SUS. A Experiência de Volta Redonda (RJ).
Suely Pinto, Túlio Batista Franco, Marta Gama de Magalhães, Paulo Eduardo Xavier Mendonça, Angela
Guidoreni, Kathleen Tereza da Cruz ôc Emerson Elias Merhy (orgs.)
Coquetel. A Incrível H istória dosAntirretrovirais e do Tratamento daA ids no Brasil, Mário SchefFer
Psicanálise e Saúde Coletiva: Interfaces, Rosana Onocko Canmos
A M edicina da A lm a: Artes do Viver e Discursos Terapêuticos, Paulo Henrique Fernandes Silveira
Clínica Comum: Itinerários de uma Formação em Saúde, Angela Aparecida Capozzolo, Sidnei José Casetto ôc
Alexandre de Oliveira Henz (orgs.)
Práxis e Formação Paideia: Apoio e Cogestão em Saúde, Gastão Wagner de Sousa Campos, GustavoTenório Cunha
ôcMariana Dorsa Figueiredo (orgs.)
Intercâmbio Solidário de Saberes em Saúde: Raáonalidades Médicas e Práticas Integrativas e Complementares, Marilene
Cabral do Nascimento ôcMaria Inês Nogueira (orgs.)
Depois da Reforma. Contribuição p ara a Crítica da Saúde Coletiva, Giovanni Gurgel Aciole
Diálogos sobre a Boca, Carlos Botazzo
Violência e Saúde na diversidade dos escritos acadêmicos, Luiza Jane Eyre de Souza Vieira, Raimunda Magalhães
da Silva ôc Samira Valentim Gama Lira (orgs.)
Trabalho, Produção do Cuidado e Subjetividade em Saúde: Textos Reunid»s,T\iIxo Batista Franco ôc Emerson Elias
Merhy
Adoecimentos e Sofrimentos de Longa Duração, Ana Maria Canesqui (org.)
Os Hospitais no Brasil, Ivan Coelho
As Bases do Raciocínio Médico, Fernando Queiroz M onte
A Saúde entre os Negócios e a Questão Social: Privatização, M odernização e Segregação na D itadura C ivil-M ilitar
(1964-1985), Fdipe M onte Cardoso
Descentralização e Política de Saúde: Origens, Contexto e Alcance da Descentralização, Ana Luiza d 'Ávila Viana
Análise Institucionale Saúde Coletiva no Brasil, Solange L ’Ábbate, Lucia Cardoso Mourão ôc Luciane Maria
Pezzato (orgs.)
Por uma Crítica da Promoção da Saúde: Contradições e Potencialidades no Contexto do SUS, Kathleen Elane Leal
Vasconcelos ÔcMaria Dalva Horácio da Costa (orgs.)
Fisioterapia e Saúde Coletiva: Reflexões, Fundamentos e Desafios, José Patrício Bispo Júnior (org.)
Educação Popular na Universidade: reflexões e vivências da Articulação N acional de Extensão Popular (Anepop),
Pedro José Santos Carneiro Cruz, Marcos Oliveira Dias Vasconcelos, Fernanda Isabela Gondim Sarmento,
Murilo Leandro Marcos ôc Eymard Mourão Vasconcelos (orgs.)
Regiões de Saúde: Diversidade e Processo de Regionalização cm M ato Crosso,]ol.Q Henrique Scatena, RutliTerezinha
Rehrig ÔcMaria Angélica dos Santos Spinelli (orgs.)
o DESAFIO D O C O N H EC IM EN T O
Pesqu isa Q u alitativa em Saúde
DE MARIA CECÍ LI A DE S OUZA MI NAYO, NA E DI TORA HUCI T E C
O DESAFIO DO CONHECIMENTO
Pesquisa Qualitativa em Saúde
HUCITEC EDITORA
São Paulo, 2014
® 2004, de Maria Cecília de Souza Minayo.
® 2014, desta edição de
Hucitec Editora Ltda.,
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02532-000 São Paulo, SP.
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"Em memória d e‘Veboraíi, filíia querida que nos assiste com sua luz e
seu amor.
PÁG.
APRESENTAÇÃO 11
Capítulo 1
IN T R O D U Ç Ã O AO D E SA F IO DO C O N H E C IM E N T O 21
Parte I
C O N C E IT O S B Á S IC O S SO BRE M E T O D O L O G IA E SO BRE
A BO DA GEN S Q U A LITA TIV A S 35
Capítulo 2
METODOLOGIA DE PESQUISA SOCIAL E EM SAÚDE 39
Capítulo 3
CONTRADIÇÕES E CONSENSOS NA COMBINAÇÃO DE
MÉTODOS QUAN riTATIVOS E QUALITATIVOS 54
Parte II
TEORIA, EPISTEMOLOGIA E M ÉTO D O S: CAMINHOS DO PENSA
MENTO 77
Capítulo 4
CORRENTES DE PENSAMENTO 81
Capítulo 5
MODALIDADES DE ABORDAGENS COMPREENSIVAS
Parte III
C O N S T R U Ç Ã O D O P R O J E T O D E P E S Q U I S A I FASE E X P L O R A T Ó R I A 171
Capítulo 6
CONCEITOS PARA OPERACIONALIZAÇÃO DA PESQUISA 175
Capítulo 7
PROJETO DE INVESTIGAÇÃO 182
Capítulo 8
CONSTRUÇÃO DOS INSTRUMENTOS E EXPLORAÇÃO DE
ÇAMPO 189
Parte IV
TRABALHO DE CA M PO ! T EO R IA , ESTRATÉGIAS E TÉCN ICAS 201
Capítulo 9
PALAVRA, INTERAÇÕES E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS 204
Capítulo 10
TÉCNICAS DE PESQUISA 261
Parte V 299
FASE D E A N Á L I S E D O M A T E R I A L Q U A L I T A T I V O
Capítulo 11
TÉCNICAS DE ANÃLISE DE MATERIAL QUALITATIVO 303
Capítulo 12
TRIANGULAÇÃO DE MÉTODOS QUANTITATIVOS E QUALI
TATIVOS 361
Capítulo 13
SOBRE VALIDADE E VERIFICAÇÃO EM PESQUISÃ QUALITÃ-
TIVA 373
CONCLUSÃO 385
REFERÊNCIAS 393
APRESENTAÇÃO
Conceito de Metodologia
Discussão crítica
sobre métodos quantitativo e qualitativo
L
Esse tipo de método que tem fundamento teórico, além
de permitir desvelar processos sociais ainda pouco conheci-
dos referentes a grupos particulares, propicia a constmcão de
novas abordagens, revisão e criação de novos conceitos e ca-
tegorias durante a investigação. Caracteriza-se pela empiria e
pela sistematização progressiva de conhecimento até a com
preensão da lógica interna do gmpo ou do processo em estu
do. Por isso, é também utilizado para a elaboração de novas
hipóteses, constmção de indicadores qualitativos, variáveis e
tipologias.
Na comparação com as abordagens quantitativas, enten
do que cada um dos dois tipos de método tem seu papel, seu
lugar e sua adequação. No entanto, ambos podem conduzir
a resultados importantes sobre a realidade social, não haven
do sentido de atribuir prioridade de um sobre o outro.
Para falar filosoficamente sobre o tema, é importante tra
zer a tona a reflexão de Granger em seu artigo sobre "Modèles
Qualitatifs, Modèles Quantitatifs dans la Connaissance Scien-
tifique" (1982). O autor chama atenção para o que parece
Óbvio: os acontecimentos são percebidos primeiramente como
qualidade, em dois níveis: em primeiro lugar, como o vivido
absoluto e único; em segundo lugar, a experiência é vivida no
nível da forma, de modo que ela pode ser compreendida por
contraste (é um recorte do campo perceptivo) e por continuida
de (expressa-se na unidade e na indivisibilidade). No entan
to, o mesmo autor assinala o risco de "uma redução simplista
do qualitativo", quando o observador se contenta com a per
cepção de alguma parte do fenômeno que observa e esta é
apenas é um predicado contingente e relativo do objeto, pro
duzindo percepções incompletas.
Granger distingue "qualidade objetiva" e "qualidade do
objeto psíquico" e considera ser um esforço necessário da epis-
temologia das ciências humanas atuais, estabelecer relações
entre "qualidade do objeto psíquico" e estruturação científi
ca (1967, p. 197).
Positivismo sociológico
l
pensamento, livrando as ciências do social dos interesses e
paixões das classes feudais, das doutrinas teológicas, dos ar
gumentos de autoridade da Igreja e de todos os dogmas fos
silizados.
Lowy inclui entre os discípulos de Condorcet e defensor
de suas idéias, o socialista utópico Saint-Simon (Lowy, 1986),
para quem a ciência da sociedade consistia numa "fisiologia
social", cuja dinâmica tem dois movimentos históricos: as épo
cas críticas que conseguem eliminar as fossilizações sociais; e
as épocas orgânicas que se caracterizam pela estabilidade e
reprodução das estruturas. Saint-Simon ressaltava que, em sua
época, havia duas classes parasitas do organismo social: o cle
ro e a aristocracia. E, portanto, seria preciso que essas fossili
zações dessem lugar a uma nova forma de organização do
corpo social. Para isso apresentava um projeto novo de socie
dade, baseado não na igualdade, mas numa pirâmide de clas
ses, visando a elevar a capacidade produtiva das pessoas a um
grau máximo de desenvolvimento. Segundo Saint-Simon, a
moral e as idéias têm de ser distintas para as distintas classes
fundamentais, a fim de que a sociedade seja livre e dedicada à
produção. Propunha que a igreja fosse substituída pela fábri
ca (Saint-Simon, in: Mora, 1982).
Tanto a proposta da matemática social de Condorcet, como
as teorias fisiológicas da sociedade" de Saint-Simon faziam
uma dura crítica social de seu tempo. Nomeavam quais eram
as classes dominantes e opressoras e propunham mudanças
condizentes com a nova sociedade industrial que se agiganta
va. Até o início do século XIX, o positivismo desenhado por
esses precursores constituiu uma visão social-utópica-crítica
do mundo de seu tempo.’ O mesmo não se poderia dizer das
^ Na concepção deste trabalho, não se aceita a idéia de que um dado seja "puro"
e sem contaminação subjetiva, pois quem escolhe a pergunta por meio da qual se
obtém um dado é um ser humano marcado por sua história e por seus interesses. E
mais, a rigor, não existe nada "dado" em pesquisa: tudo é constmfdo e construído por
alguém que é sujeito, tem interesses e ideologia.
A força do positivismo associa-se a sua funcionalidade para
o poder, sobrevalorizando-se a tendência de usar instmmen-
tos de análise como se eles falassem por si mesmos, na ilusão
de que nada há além deles. A inspiração desse comportamen
to vem de Durkheim, no Prefácio à primeira edição das Regras
do Método Sociológico:
Teorias Compreensivas
í
histórico-concretos". Sintetizam e evidenciam os traços típi
cos e originais de determinado fenômeno, tornando-o inteli
gível. Weber sugere aos estudiosos esse artefato que ele pró
prio utiliza, indicando que existe um sistema de "tipos-ideais",
entre os quais os de lei, de autoridade e de legitimidade, de
democracia, de capitalismo, de feudalismo, de sociedade, de
burocracia e de patrimonialismo.
A intenção de Weber, ao propor o tipo-ideal como instm-
mento metodológico de compreensão da realidade é tornar
as Ciências Sociais rigorosas e fidedignas, mas a partir de uma
perspectiva diferente da abordagem positivista:
J
COS e originais desse determinado fenômeno, tornando-o inte
ligível. A realização de uma avaliação a partir do modelo áe
tipos-ideais, (a) funda-se numa investigação empírica que per
mita confrontar os dados da realidade com o modelo (tipo-
ideal); (b) seus dados devem sempre derivar do modo de vida,
das relações e das representações dos atores; (c) orientar-se
para captação e compreensão dos vários e diferentes signifi
cados dos sujeitos sobre os processos que estão vivendo e (d)
e apoiar-se na crença de que os atores envolvidos em inter
venções sociais são capazes de descrever, explicar e justificar
suas ações e relações com argumentos afetivos, tradicionais e
racionais.
Os que apontam controvérsias nas abordagens sociais por
meio de tipos-ideais consideram que Weber, na tentativa de
fugir ao positivismo que tanto criticou e, ao mesmo tempo,
visando a produzir investigações objetivas, fez de seu dese
nho metodológico um artifício rígido que não se conforma às
realidades concretas e dinâmicas. Porém, não é bem assim.
No seu embate teórico contra o positivismo, Weber reconhe
ce que os valores têm papel destacado na seleção do objeto
de investigação, na escolha da problemática e nas questões
que o pesquisador se propõe. Porém, cabe ao investigador
buscar formas de garantir a isenção máxima possível da intro
missão ideológica nos estudos sociais, pelo método e pela
técnica. Sua busca de "objetividade" coincide com o que, nes
te livro, se denomina "objetivação", que visa a assegurar, no
campo da pesquisa, um processo que tenha fundamentos teó
ricos e, ao mesmo tempo, padrões universais e específicos, na
prática de investigação. A partir dos conceitos gerais que di
zem respeito ao comportamento do fenômeno social, Weber
sugere que o investigador formule conceitos mediadores, ade-
r|uados e peculiares, visando a se aproximar cada vez mais das
características concretas dos acontecimentos históricos e das
interações.
A
Abordagens compreensivas nas pescjuisas em saúde
1
Em seus textos filosóficos Lênin comenta que, ao refletir a
realidade, o conhecimento oferece uma imagem mais grossei
ra que o real, tanto no plano do pensamento como do senti
mento. Por isso, "seria ridículo negar o papel da imaginação
mesmo na ciência mais rigorosa" (1965, p. 218).
(d) entre a base material e a consciência, considerando-se que
existe uma correlação dos modos de produção, das estmturas
de classe e dàs maneiras de pensar. Embora o pensamento
marxista defenda a tese de que as bases econômicas sejam de
terminantes nas transformações sociais, também faz parte de
sua melhor tradição a idéia da influência mútua entre as ins
tâncias que conformam a realidade. Do ponto de vista da pes
quisa, essa concepção dialética das relações entre idéias e fa
tos socioeconômicos traz algumas conseqüências práticas,
sobre as quais existem propostas específicas de Goldmann.
Segundo esse autor, basta estudar seriamente a realidade hu
mana para sempre se encontrar o pensamento, caso se tenha
partido de seu aspecto material; e para se encontrar os fatos
sociais econômicos, caso se tenha começado pela história das
itléias ou pela análise das representações:
i
à constituição da sociedade civil como contraponto aos apara
tos do Estado, constituindo uma força social com capacidade
de intervir no jogo de interesses que, tradicional mente aliam
os governos e os políticos. Marx, cujo pensamento exposto a
seguir merece realce, desenvolve pouco esse tema que vai ser
tratado em profundidade por Gramsci (1981).
JÀ
Goldmann, 1980) não admitem os exageros da supremacia
da razão, assim como dos subjetivismos, pois atuam com a
mútua relação de interconexões entre fatores objetivos e sub
jetivos e entre instância material e espiritual em sua unidade
dialética. Lukács lembra que os conhecimentos produzidos
são apenas aproximações da dinâmica do mundo social e, por
isso mesmo, são sempre relativos. Na medida em que repre
sentam úma aproximação efetiva da realidade objetiva que
existe independentemente da consciência, porém, são sem
pre absolutos:
J
dade intelectual, transformaram o processo de conhecimento
em mera procura de fatos e situações empíricas capazes de
provar as verdades contidas nos esquemas abstratos de deter
minações gerais. Portanto, a aplicação do método dialético
não depende apenas de conhecimento técnico, mas de uma
postura intelectual e de uma visão social da realidade.
J
ter industrial) vem demandando mudanças conceituais e de
abrangência de objetos para dar conta dos problemas trazi
dos pela globalização, pelas novas formas de produção e por
uma série de outros fatores. Dentre eles, é fundamental des
tacar a predominância contemporânea dos trabalhadores do
setor de serviços e seus problemas específicos, em detrimen
to do setor industrial a partir do qual foi construído o pa
radigma marxista de saúde e trabalho (Minayo-Gomez & La-
caz, 2005).
As contribuições das correntes marxistas mais complexas,
que incorporam o sujeito, avançaram muito nos anos atuais,
deixando para trás os referenciais estmturalistas e mecanicis-
(as (Minayo, 1998). Os primeiros serviram muito para infor
mar as análises políticas e os segundos, foram suplantados
jrela obsolescência das análises que produzia, fúndamenta-
das, preferencialmente, nos pressupostos althusserianos. Em
Altluisser o sujeito era considerado apenas como "efeito ilu
sório das estmturas ideológicas" (Anderson, 1984, p. 44) como
pode ser constatado no trecho de uma de suas obras:
Pensamento sistêmico
íá
entre disciplinas e propiciar uma comunicação transdiscipli-
nar entre cientistas das mais diversas áreas.
(3) O terceiro pressuposto do pensamento sistêmico é o
da intersubjetividade na constmção da realidade e do saber, o
que se opõe à idéia da possibilidade de existir um conheci
mento objetivo externo aos sujeitos. De tal ponto de vista,
sujeito e objeto só existem relacionalmente e nas interações
que estabelecem entre si. Ambos, em suas interações, se in
fluenciam e promovem mudanças: no organismo (a estmtu-
ra) e no ambiente. Assim, é difícil determinar de fora o que
um sistema fará nas interações que mantém com o ambiente,
uma vez que, a cada momento, a estrutura de um organismo
incorpora as transformações conseqüentes de suas experiên
cias, de suas interações e modifica suas possibilidades poten
ciais, apresentando novas interações.
As premissas do pensamento sistêmico sugerem aos pro
fissionais que atuam de forma transdisciplinar as seguintes
posturas metodológicas:
♦ Ampliação do foco: contextualizando o fenômeno em
estudo, entendendo-o em suas interações e retroalimentações
(as coisas são causadas e causadoras) e tratando-o como par
te de um sistema interconectado com outros sistemas;
* Aposta nos processos de auto-organização: observan-
ilo o dinamismo das mudanças e as forças de resistências, os
estudiosos admitem que nem tudo é só positivo ou só nega
tivo, que existem muitos caminhos e que é impossível con
trolar a direção dos processos;
• Adoção do caminho da objetividade entre parênteses: o es
tudioso se reconhece parte do sistema e entende que só há
sentido na co-constmção das soluções. Dentro desse tipo de
visão, do ponto de vista ético, não cabe pensar que a solução
p.ii a os problemas está na existência de códigos exteriores aos
sujeitos, a serem aplicados por autoridades competentes.
Do ponto de vista operacional, o pensamento sistêmico
11,10 está propondo técnicas. Na verdade, ele se configura como
uma visão epistemológica que permite o uso dos recursos
desenvolvidos dentro dos paradigmas da ciência tradicional.
Mas esse uso exige algo muito novo, o exercício de um olhar e
uma abordagem diferente: que ilumina aquele ponto cego da
visão unidimensional, fazendo-o enxergar as interações; sub
verte a mente compartimentalizada, buscando fazer as dife
renças e as oposições se comunicarem; e modifica a prática
antiga que só valoriza regularidades e normas. Ao contrário,
mostra as coisas que permanecem e ressalta "o que" muda e
"como" as coisas se transformam, auto-organizando-se.
L
dividem Canadá e Estados Unidos e contêm 21% das reservas
de água doce do mundo. Pois bem, as margens desses Gran
des Lagos foram invadidas por projetos agrícolas e industriais,
que floresceram acompanhando a época do acelerado pro
gresso econômico americano do norte pós-Segunda Guerra
Mundial, quando ainda era hegemônica no mundo a idéia de
que o ecossistema seria capaz de assimilar todos os processos
de dominarão humana sobre a natureza.
A partir da ampliação e aprofundamento da consciência am
biental da década de 1970, ofidalmente, estudos começaram
a ser realizados por uma comissão criada pelos governos dos
dois países, denominada International Joint Comission of Great
I,akes (1978), diagnosticando a intensa exploração econômi
ca do espaço sócio-político-cultural-ambiental e o processo de
deterioração ecológica e de ameaça à saúde das populações que
aí habitavam. Esses estudos evidenciaram, com grande clare
za, a insuficiência teórica unidisciplinar para a compreensão
tias dimensões dos problemas gerados pelo uso descontrola-
tlo da água e do solo e das propostas de solução, levando a
(|ue o gmpo passasse a integrar análises geradas individual
mente e a chamar a sociedade civil para as discussões das so
luções. Criaram-se, assim, estratégias transdisciplinares e par
ticipativas de abordagem da problemática que afetava toda
essa privilegiada região e que hoje se denomina abordagem
l•( Ossistêmica. Seu desenvolvimento passa por conhecimentos
específicos e integração de atores e de abordagens; de discipli
nas e de setores; de cientistas, de autoridades reguladoras, de
políticos e gestores; de todos eles com o público, em geral, e
( om a sociedade civil organizada.
O llnfocfue de Ecossistemas em Saúde Humana está funda-
iMfMiado na construção de nexos que vinculam estratégias de
gi stao integral do meio ambiente (ecossistemas saudáveis)
I o m uma abordagem da promoção da saúde humana dentro
Fenomenologia sociológica
Etnometodologia
Interacionismo Simbólico
Estudo de Caso
Hermenêutica-dialética
i
sensos que se convertem em estruturas, vivências, significa
dos compartilhados e símbolos.jO mundo da cotidianidade
é o horizonte e o parâmetro do processo de entendimento
(Gadamer, 1999); (b) por outro lado, pem tudo na vida social
é transparente e inteligível e nem a linguagem é uma estrutura
completa da vida social. Por isso é importante apoiar-se nas
análises de contexto e da práxis (Habermas, 1987).
Do ponto de vista metodológico, a abordagem herme
nêutica se encaminha dentro dos parâmetros seguintes: (a)
busca esclarecer o contexto dos diferentes atores e das pro-
postas que produzem; (b) acredita que existe um teor de ra-
( ionalidade e de responsabilidade nas diferentes linguagens
servem como veículo de comunicação; (c) coloca os fa-
los, os relatos e as observações no contexto dos atores; (ã)
.issiime seu papel de julgar e tomar posição sobre o que ouve,
observa e compartilha; e (e) produz um relato dos fatos em
t|iie os diferentes atores se sintam contemplados.
AAialética é a ciência e a arte do diálogo, da pergunta e da
loMimvérsia. Diferentemente da hermenêutica, ela busca nos
l.iios, na linguagem, nos símbolos e na cultura, os núcleos
ol)S( nms e contraditórios para realizar uma crítica informada
Noliic des. Ao falar da articulação promissora entre dialética e
lifinienêutica, Habermas diz que "a mesma razão que com-
l'if.-nde, esclarece e reúne, também contesta, dissocia e criti-
•.1 (1987, p. 20), pois há tanta intransparência na linguagem
iiiiiii) na vida real, na qual poder e relações de produção
• contraditoriamente pessoas, grupos e classes. Lembra
II .111(01, a prõpria linguagem é um instmmento de domina-
(.aii, nece.ssitando, por isso, ser desmitificada e tornar-se obje-
(ii ilr idlexão: tanto a que é comunicada pelos informantes
(iiimi a t|ue é utilizada pelos investigadores.
1 *n iiQiUo de vista m etod ológico, a abordagem dialética
I '" •l’i.i I l iar instrum entos de crítica e de apreensão das con-
Mititli.iii s na linguagem ; com p reen d er que a_análise dos s i ^ i -
lliiiilo.. ,1 partir do ch ão das práticas sociais; vãTõrizar os p ro
cessos e as dinâmicas de criação de consensos e contradições
no interior dos quais a própria oposição entre o pesquisador
e seus interlocutores se colocam, e ressaltar o condicionamento
histórico das falas, relações e ações (Minayo, 2002).
Na sua articulação, a hermenêutica-dialética constitui um
importante caminho do pensamento para fundamentar pes
quisas qualitativas, cobrindo também uma quase ausência de
pesquisas de fundamentação marxista que levem em conta a
subjetividade. Essa combinação de estratégias não cria nenhu
ma técnica específica, pois o que Habermas (1987) deseja va
lorizar são os elementos teóricos que possam dar parâmetros
aos investigadores. Do ponto de vista da operacionalização,
esse autor, ao mesmo tempo, valoriza a fenomenologia, o in-
teracionismo simbólico e a etnometodologia como caminhos
importantes para o trabalho de campo de cunho compreensi
vo (Habermas, 1987), mas diferencia o que propõe com a
hermenêutica-dialética em relação a essas teorias e abordagens,
consideradas por ele como descontextualizadas e extremamen
te presas à produção da linguagem em si.
Daí que a proposta de Habermas passa pela construção
de um movimento interativo entre a hermenêutica e a dialéti
ca, valorizando as complementaridades e oposições entre as
duas: (a) ambas trazem em seu núcleo a idéia fecunda dos
condicionamentos históricos da linguagem, das relações e das
práticas; (b) ambas partem do pressuposto de que não há
observador imparcial; (c) ambas questionam o tecnicismo em
favor do processo intersubjetivo de compreensão e de crítica;
(d) ambas ultrapassam as tarefas de serem simples ferramen
tas para o pensamento e (e) ambas estão referidas à práxis
estruturada pela tradição, pela linguagem, pelo poder e pelo
trabalho. No entanto, enquanto a hermenêutica enfatiza o
significado do que é consensual, da mediação, do acordo e
da unidade de sentido, a dialética se orienta para a diferença,
o contraste, o dissenso, a mptura de sentido e, portanto, para
a crítica (Minayo, 2002).
Encerrando a discussão sobre correntes de pensamento e
vários tipos de abordagem compreensiva, repito que minha
postura neste trabalho é de olhar a ciência com seus paradig
mas, suas teorias, métodos e técnicas como constmções so
ciais, com todas as ousadias, resistências, tentativas e erros
próprios das instituições humanas. Por considerar que não
há ciência em geral, entendo que existem práticas científicas
diferenciadas, desigualmente desenvolvidas e todas tendo,
como substrato, movimentos que envolvem sociedades e vi
sões sociais de mundo diversas.
Tento, portanto, uma aproximação dos marcos referen
ciais que dentro das Ciências Sociais ou de fora delas vêm
influenciando com maior vigor as produções teóricas e as prá
ticas no campo da saúde. O pensamento sistêmico complexo
aqui foi posto ainda como desafio. Seria reiterativo dizer que
a forma esquemática como foram abordadas as várias pos
sibilidades de apreender a realidade se deve ao escopo do li
vro. Qualquer estudioso tem, na bibliografia, ao final, vasto
material de consulta capaz de guiá-lo em busca de aprofun
damento.
L
Parte III
CONSTRUÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA:
FASE EXPLORATÓRIA
Teoria
Conceitos
Noções
G e r a l m e n t e , q u a n d o o i n v e s t i g a d o r se propõe a
iniciar sua atividade de pesquisa, situa-se num quadro de in
dagações teóricas e operacionais.
Área de interesse
Objeto de Investigação
Revisão bibliográfica
Exploração de Campo
O Q U E T OR NA O TRABAL HO I N T E RA C I O N A L um instrumen
to privilegiado de coleta de informações para as Ciências So
ciais é a possibilidade que tem a fala de ser reveladora de con
dições estmturais, de sistemas de valores, normas e símbolos
(sendo ela mesma um deles) e, ao mesmo tempo, ter a magia
de transmitir, por meio de um porta-voz, as representações
gmpais, em condições históricas, socioeconômicas e culturais
específicas.
Vários estudiosos apontam a fala como a forma de comu
nicação mais privilegiada para a sociedade humana, pela pos
sibilidade de ela conter a experiência, permitir o entendimen
to intersubjetivo e social e, por sua densidade, constituir-se
em si, em fato social: "no princípio era o verbo" diz a Bíblia,
evidenciando que a humanidade nasce com a fala que, ao
mesmo tempo, cria a comunidade e reflete sobre suas condi
ções, possibilidades, sonhos e desejos. Diz Bakhtin, um dos
mais importantes estudiosos da linguagem no século XX: "a
palavra é o modo mais puro e sensível de relação social":
Existe uma parte muito importante da comunicação
ideológica que não pode ser vinculada a uma esfera ideo
lógica particular: trata-se da comunicação da vida cotidia
na. O material privilegiado de comunicação na vida coti
diana é a palavra (1986, p. 36).
i
I pei iiliares em relação à totalidade social em análise.
Interação entre pesquisador
e atores sociais no campo
Ü
boradas pela reflexão de Berreman (1975) a respeito das difi
culdades de acesso a informação em sua pesquisa etnográfica
numa comunidade himalaia. O título de seu estudo é muito
sugestivo- Por Detrás de Muitas Máscaras. Berreman escreveu so
bre o assunto, partindo do princípio de que sua experiência
de tentar entender uma comunidade fechada e segmentada
em castas, dona de códigos culturais rígidos e herméticos, guar
dadas as devidas peculiaridades, podería ser universalizada e
partilhada com outros pesquisadores em situação de traba
lho de campo.
Berreman (1975) socializa sua experiência, descrevendo-a
em imagens. Chama de "região interior" à parte íntima da vi
vência de uma comunidade. Essa região pode ser mais ampla
ou mais restrita, diz ele, mas qualquer grupo guarda seus se
gredos, seu lado oficial e tem sua estratégia comportamental
no dia-a-dia. Tal coesão interna ocorre porque, ainda que in
ternamente um grupo vivencie muitas diferenças e conflitos,
sua existência depende de um certo grau de consenso, fami
liaridade e solidariedade que implica partilha de significa
dos, de segredos, de zonas proibidas e do que pode ou não
pode ser dito. No mesmo sentido de Berreman, é elucidativa
a fala de Goffman, quando afirma que há poucas atividades
ou relações cotidianas nas quais os atores não se envolvam
em práticas ocultas e incompatíveis com as impressões que
buscam causar.
Por causa dessa contingência da região interior, em qual
quer situação de trabalho de campo existirá sempre um jogo
de cena entre o pesquisador que entra em contato e a fala e os
comportamentos de seus interlocutores. Esses últimos sem
pre pretendem manter em sigilo sua "região interior" (expres
são usada por Berreman, 1975) ou ter "controle de impres
sões" (expressão usada por Goffman, 1959) que provoca. Esse
controle é um aspecto básico e inerente à interação. Por isso,
é importante que todo investigador social saiba que nenhum
gmpo falará totalmente a verdade sobre sua realidade social.
Sempre haverá o "controle das impressões" e a guarda da "re
gião interior".
Berreman (1975) insiste em que ambos os atores da pes-
(|iiisa (entrevistador/entrevistado), numa situação de intera
ção, ainda que breve, atuam julgando os motivos e atributos
ims dos outros, definindo a situação circundante e a imagem
(|iie lhes convém projetar. Dessa forma, cada um dos dois
atores sabe o que deve revelar e o que deseja ocultar: "Cada
um tenta dar ao outro a impressão de que melhor serve a seus
interesses, tal como os vê" (Berreman, 1975, p. 141).
Enquanto, academicamente, o pesquisador é avaliado en-
tle seus pares pela sua capacidade de penetrar na "região inte
rior" dos seus interlocutores ou observados, os entrevistados
são avaliados pela argúcia de preservar, de olhos e ouvidos
estranhos, os bastidores do grupo. Os informantes julgam
positivamente os investigadores que assumem atitude de res
peito em relação aos segredos de seu grupo. Nenhum ator,
nesse jogo de oposições entre pesquisador/pesquisado con-
si‘gue sucesso absoluto, uma vez que nem tudo fica oculto e
nem tudo é desvendado. Lembra Goffman:
Representações sociais
J
Aqui se tratou do fato e da direção em apenas um, se
bem que importante, ponto de seus motivos. Seria im
portante investigar mais adiante, a maneira pela qual a as-
cese protestante foi por sua vez influenciada em seu de
senvolvimento e caráter pela totalidade das condições
sociais, especialmente pelas econômicas. Isto porque, se
bem que o homem moderno seja incapaz de avaliar o sig
nificado do quanto as idéias religiosas influenciaram a
cultura e os caracteres nacionais, não se pode pensar em
substituir uma interpretação materialista unilateral por uma
igualmente bitolada interpretação causai da cultura e da
história (Weber, 1985, p. 132).
4
ricano (nova visão de mundo) teve de propor concepções
abrangentes e alternativas no modo de encarar as relações entre
Deus e os homens, o tempo, o espaço, o trabalho, a divisão
do trabalho, a riqueza, o sexo e os papéis sociais.
Em síntese, Weber, junto com Durkheim, remete à impor
tância da compreensão das idéias e de sua eficácia na configu
ração da sociedade, e ambos chamam a atenção para o estudo
empírico dos desenvolvimentos históricos. Porém, Weber avan
ça em relação ao que Durkheim (1978) propôs, introduzindo
a história como constmtora de especificidades e de determi
nações. Por isso, sua contribuição sobre a eficácia das idéias é
ímpar e fundamental.
Na mesma trilha da sociologia compreensiva, a fenome-
nologia sociológica de Schutz (1964; 1971; 1979; 1982; 1987)
também traz grande contribuição para se pensarem as Repre
sentações Sociais, sobretudo para a operacionalização desse
conceito na pesquisa social qualitativa.
A sociologia de Schutz tem por objeto o mundo do dia-a-
dia, oferecendo elementos para compreensão dos pressupos
tos das estruturas significativas da cotidianidade. Para ele, a
compreensão do mundo se dá a partir de um estoque de expe
riências pessoais e de outros, isto é, de companheiros, prede-
cessores, contemporâneos, consorciados e sucessores. Schutz
(1982) usa a noção de "senso comum" para falar das repre
sentações sociais. Para o autor o senscr comum é constmído
por meio da interpretação dos fatos do dia-a-dia. Portanto, a
existência cotidiana, segundo Schutz, é dotada de significa
dos e portadora de estruturas de relevância para os grupos
sociais que vivem, pensam e agem em determinado contexto
social. Esses significados, que podem ser objeto de estudo
dos cientistas sociais, são selecionados pelos gmpos e coleti
vidades por meio de constmções mentais, de "representações
do senso comum" (Schutz & Luckmann, 1973). Assim o mun
do do dia-a-dia é entendido como um tecido de significados,
constituído pelas ações humanas. O teorema clássico de Tho-
mas & Znaniecki, segundo os quais "se os homens definem
situações como reais, elas são reais em suas conseqüências"
resumem o pensamento fenomenológico:
Lj.
(i.imGramsci (1981) eSchutz (1964; 1971; 1979; 1982; 1987).
I IIIIto da vivência das contradições que permeiam o dia-a-
tli.i tias classes sociais, e sua expressão marca o entendimento
delas com seus pares, seus contrários e com as instituições. Com
o senso comum, os atores sociais se movem, constroem sua
vitla e explicam-na mediante seu estoque de conhecimentos.
Mas, além dos aspectos mencionados, o senso comum
possui núcleos positivos de transformação e de resistência na
(orma de conceber a realidade, assim, tanto o "senso comum"
(omo o "bom senso", para usar expressões de Gramsci, são
sistemas empíricos de representações sociais observáveis, ca
pazes de revelar a natureza contraditória da organização em
(|iie os atores sociais estão inseridos.
Algumas Representações Sociais são mais abrangentes, pois
ifvelam a visão de mundo de determinada época. Mas essas
mesmas idéias abrangentes possuem elementos de conforma-
ç.io, de transformação, de inconformismo e de projeção para
0 fu tu ro.
As Representações Sociais não são necessariamente cons-
t ieiiles, porque elas constituem a naturalização de modos de
lazer, pensar e sentir habituais que se reproduzem e se modifi-
(am a partir das estmturas e das relações coletivas e de grupos.
Mesmo no caso das elaborações filosóficas, seu conteúdo re-
llele idéias, ao mesmo tempo das elites e das grandes massas,
expressando contradições vividas no plano das relações so-
<iais de produção. Por isso mesmo, qualquer esquema ideo-
logico contém elementos de dominação de classes e de resis
tências sociais, de contradições e conflitos e de conformismo.
Ainda que algumas formas de pensar a sociedade sejam
.ihrangentes e resistentes como cimento que mantém estru-
niias e statu quo, cada gmpo social faz da visão abrangente
lima representação particular, de acordo com a sua posição
no conjunto da sociedade. Essa representação é portadora tam
bém dos interesses e do dinamismo específicos dos gmpos e
1lasses sociais.
. Por serem ao mesmo tempo ilusórias, contraditórias e ver
dadeiras (nos vários sentidos aqui evocados), as representa
ções podem ser consideradas matéria-prima para a análise do
social e também para a ação pedagógica e política de transfor
mação, pois retratam e refratam a realidade. Porém, é impor
tante observar que as Representações Sociais não conformam a
realidade e seria outra ilusão tomá-las como verdades científi
cas, reduzindo a análise de um processo ou fenômeno social
à concepção que os atores sociais fazem dele.
Para terminar, vale reforçar a idéia de que a mediação pri
vilegiada para a compreensão das representações sociais é a
linguagem do senso comum, tomado como forma de conheci
mento e de interação social embora qualquer outro tipo de
manifestação simbólica deva ser considerada uma forma de
representação da realidade (por exemplo, a forma tradicional
de disposição das carteiras na sala de aula, o desenho arquite
tônico de um hospital, o organograma de uma instituição).
Segundo Bakhtin, "a palavra é o fenômeno ideológico por
excelência. A palavra é o modo mais puro e sensível de relação
social" (1986, p. 36). Particularmente quando se trata da co
municação da vida cotidiana as palavras são fundamentais.
Elas são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e
servem de trama para as relações sociais em todos os domínios.
Bakhtin chama atenção para o fato de que cada época e cada
gmpo social têm seu repertório de formas de discurso, deter
minado pelas relações de produção e pela estmtura sociopo-
lítica. Portanto, a palavra é, ao mesmo tempo, uma produção
histórica e arena onde se confrontam interesses contraditó
rios, servindo ao mesmo tempo como instrumento e como
material de compreensão da realidade.
• líntrevista semi-estruturada
♦ Técnica Delphi
A técnica Delphi (Varela, 1991; Jones & Hunter, 1995) é mii
tipo de entrevista que visa ao consenso, por meio da utiliza
ção da comunicação por escrito. Mediante o envio de uma
série de questionários ou roteiros pelo correio, o investigadoi
busca conhecer a opinião de um gmpo de pessoas que po.s
suem informações sobre determinado problema em relaçau
à: sua dimensão, à definição de objetivos e prioridades em
sua solução, assim como sobre a abordagem teórica do tema
Numa primeira fase, o pesquisador envia o instmmento (ciiies
J
tionário ou roteiro) a um conjunto de especialistas. A partir
de suas repostas, é feito outro instmmento que leva em conta
as contribuições dos especialistas e, outra vez, lhes é endere
çado para que se pronunciem sobre seu grau de acordo com
cada afirmação conseguida. E assim se procede sucessivamen
te, até que se alcance consenso. É importante estratégia para
avaliação de decisões sobre instmmentos que exigem conhe
cimentos especializados. Essa técnica é usada também para
subsidiar a constmção de instmmentos fechados ou semi-es-
(mturados de uma investigação que vai ser feita numa escala
ampliada, por exemplo, no caso dos estudos multicêntricos
oii em rede.
* Pesquisa em grupo
As técnicas de gmpo mais comuns para a atividade de pes
quisa são as de grupo focal e as de brainstorming ou de chuva áe
Kleias. Ambas são largamente utilizadas em pesquisa qualita
tiva, seja de forma combinada com entrevistas, seja como es-
iiatégias exclusivas.
O grupo focal se constitui num tipo de entrevista ou con-
' . isa em gmpos pequenos e homogêneos. Para serem bem-
iii.edidos, precisam ser planejados, pois visam a obter infor
mações, aprofundando a interação entre os participantes, seja
paia gerar consenso, seja para explicitar divergências. A técnica
ili ve ser aplicada mediante um roteiro que vai do geral ao
•••ipec ifico, em ambiente não diretivo, sob a coordenação de
imi moderador capaz de conseguir a participação e o ponto
ile vista de todos e de cada um. O valor principal dessa técnica
((m.lamenta-se na capacidade humana de formar opiniões e
rttliiides na interação com outros indivíduos (Kmeger, 1988)
Nesse sentido, o uso dos gmpos focais contrasta com a apli-
Mç.iii de questionários fechados e de entrevistas em que cada
lim e ( liamado a emitir opiniões individualmente.
S. Iiiades (1987) comenta que, no âmbito de determina-
giiipos sociais atingidos coletivamente por fatos ou si-
tuações específicas, desenvolvem-se opiniões informais abran
gentes, de modo que, sempre que entre os membros de tais
gmpos, haja intercomunicação sobre tais fatos, esses se im
põem, influindo normativamente na consciência e no com
portamento dos indivíduos.
A natureza dessa técnica difere também da observação em
campo, onde se focalizam comportamentos, relações e im
ponderáveis da vida social. Os grupos focais podem ter uma
função complementar à observação participante e às entrevis
tas individuais ou, ao contrário, ser a modalidade específica
de abordagem qualitativa. Por isso são usados para: (a) foca
lizar a pesquisa e formular questões mais precisas; (b) com
plementar informações sobre conhecimentos peculiares a um
gmpo em relação a crenças, atitudes e percepções; (c) desen
volver hipóteses para estudos complementares; (ã) ou, cada
vez mais, como técnica exclusiva.
Do ponto de vista operacional, a discussão nos grupos fo
cais se faz em reuniões com um pequeno número de infor
mantes (seis a doze). A técnica exige a presença de um anima
dor e de um relator. O primeiro tem o papel de focalizar o
tema, promover a participação de todos, inibir os monopoli
zadores da palavra e aprofundar a discussão. Scrimshaw dii
Hurtado (1987) assim resumem o papel do animador: (a) in
troduzir a discussão e a mantê-la acesa; (b) enfatizar para o
gmpo que não há respostas certas ou erradas; (c) observar os
participantes, encorajando a palavra de cada um; (d) buscar
as deixas para propor aprofundamentos; (e) constmir relações
com os participantes para aprofundar, individualmente, res
postas e comentários considerados relevantes para a pesqui
sa; (f) observar as comunicações não verbais e (g) monitorar o
ritmo do gmpo visando a finalizar o debate no tempo previs
to. Geralmente o tempo de duração de uma reunião não deve
ultrapassar uma hora e meia.
É preciso reforçar o papel complementar dos gmpos focais,
além da sua importância específica e única. Junto com o iisu
das histórias de vida, das entrevistas abertas ou semi-estrutura-
das e da observação participante, o pesquisador constrói uma
série de possibilidades de informações que lhe permitem trian
gular olhares e obter mais informações sobre a realidade.
Brainstorming ou, em português, chuva de idéias, é uma téc
nica de gmpo voltada para gerar novas informações sobre te
mas específicos e promover o pensamento criativo (March et
al., 2003). Seu criador, Osborn, em 1941 (1953), concluiu que
iim processo interativo de gmpo não estmturado gerava mais
i’ melhores idéias do que quando os indivíduos trabalhavam
individualmente. A utilidade dessa técnica é múltipla. No cam
po da pesquisa social é muito proveitosa para ajudar a definir
mn tema ou um projeto; para diagnosticar um problema; para
discutir conceitos novos; para dar um novo mmo a um proje
to buscando identificar obstáculos e soluções.
Nos gmpos de brainstorming há três papéis a serem de-
M-mpenhados e alguns pré-requisitos: coordenador, relator e
membros, cada um com funções específicas. Ao coordenador
I .ibe jireparar a reunião, escolher os participantes, garantir um
.imbiente calmo e relaxado. Em seguida, (1) deve nomear o
pmblema ou o tema em discussão ou colocá-lo em um porta-
Inlio ou em exposição por multimídia; (2) explicar as regras
dii iiabalho, cuja essência consiste na maior liberdade possí
vel de expressão; (3) fixar os objetivos e recordá-los durante a
iitmiência da sessão; (4) conduzir o processo de chuva de
Idei.is e, ao final, orientar o aprofundamento do tema.
() relator, além de auxiliar o coordenador nos aspectos
iiqi.mizacionais, deve estar atento para nada deixar de anotar
»ii|iie o processo criativo e interativo, registrando-o. A esco-
llu dos membros pelo coordenador é cmcial para o êxito do
(m Im IIio, buscando-se que todos sejam compatíveis com o
nli|i iivo proposto. Pela finalidade que pretendem alcançar,
giiiiios não devem ter mais que cinco a seis pessoas.
< tiino pré-requisitos para o êxito dos gmpos de trabalho
lli' hhiinstortning, (a) é preciso que o ambiente esteja tranqüi-
lo e relaxado: (b) todas as idéias são bem-vindas e não se deve
emitir julgamento sobre elas; (c) é preciso investir na criativi
dade das contribuições; (ã) deve-se dosar a discussão das idéias
e buscar o seu aprofundamento, no tempo previsto para o
trabalho de grupo.
As etapas a seguir para o bom uso da técnica têm muitas
variantes, mas oferecem-se aqui duas propostas como exem
plo. A primeira tem como característica um grupo de falantes:
♦ a sessão se inicia com cada membro do grupo escreven
do sua idéia com o menor número possível de palavras e ex
pondo-a para o gmpo;
•* o coordenador acolhe e o relator lista as idéias sem tirar
conclusões e sem interpretações;
♦ o exercício de expressão termina quando não há mais
idéias propostas;
♦ juntos, todos analisam, avaliam e organizam a produ
ção coletiva, visando ao objetivo proposto inicialmente.
Uma segunda modalidade é a chuva de idéias silenciosa: Os
participantes pensam e expressam suas idéias em muito breves
palavras numa folha de papel, em silêncio. O que foi escrito e
colocado sobre a mesa. A seguir todos trocam, agregando no
vas idéias ao do companheiro ou companheira, sucessivameii
te. Esse processo pode continuar num tempo médio de trinl.i
minutos, permitindo aos participantes constmir uns sobre as
idéias dos outros, valorizando todas as contribuições e evitaii
do-se intimidações dos membros mais dominantes do grupo
Vale ressaltar ainda que, como todas as outras formas df
abordagem, também os gmpos focais ou chuva de idéias es
tão condicionados pela interação social e devem ser usados a
partir da consciência de suas vantagens e seus limites.
Observação participante
l•' nl.,, "bola de neve" consiste em, por meio de um interlocutor, ir somando
...... sucesstvamente, minimizando-se efeitos de "poder de pessoas e
.......... "«sionalm ente existentes na entrada do pesquisador em campo.
relação aos grupos que elege, o pesquisador é menos olhado
pela base lógica dos seus estudos e mais pela sua personalida
de e comportamento. As pessoas que o introduzem no cam
po e seus interlocutores querem saber se ele é "uma boa pes
soa" e se não vai "fazer mal ao grupo", não vai trair "seus
segredos" e suas estratégias de resolver os problemas da vida.
Há múltiplas situações de pesquisa, mas, como norma ge
ral, a figura do pesquisador é construída com a sua colabora
ção apenas parcial, pois a imagem que projeta reverbera no
gmpo a partir das referências que este possui, dentro de seus
padrões culturais específicos. Da mesma forma, a visão que o
investigador constrói sobre o grupo depende das pessoas com
quem travar relações. Dessa forma a visão das duas partes ser.i
sempre incompleta e imprecisa.
Essa construção mútua do pesquisador e dos pesquisa
dos por meio da interação é analisada por Berreman (1973)
valendo-se da imagem do teatro. Berreman (1975) afirma, com
base em sua experiência e usando reflexões de Goffman (1959)
sobre a A Construção do Eu na Vida Cotidiana, que pesquisadoi
e pesquisado são ambos atores representando papéis, mti
diante do outro. Assim como no teatro há os bastidores, "ir
gião interior", e o palco, "região exterior" (como já foi dito) r
as pessoas tendem a se expressar através do palco, isto é, d.ii
regras oficiais e formais. No entanto, com relação à coinpic
ensão da realidade, Berreman enfatiza que 4anto o conlin i
mento das regiões interiores (os segredos dos bastidores) d,i
vida de um grupo, como o da encenação exterior, isto é, d.i vl
são oficial, são componentes essenciais. As ponderações dn
Berreman se encontram com as Malinowski (1975a; I9/Mtj
1978), quando este antropólogo ressalta a necessidade de
investigar tanto o arcabouço estrutural como os "impondi ní
veis da vida real" e os "aspectos íntimos das relações soi i.d»*, i
Se a entrada em campo tem que ver com os problem.in il|J
identificação, obtenção e sustentação de contatos, a said.i
também um momento crucial. As relações interpessoais i||||
se desenvolvem durante a pesquisa não se desfazem automa
ticamente com a conclusão das atividades previstas. Há um
contato informal de favores e de lealdade que não dá para
ser rompido bruscamente sob pena de decepção: os investiga
dores trabalham com pessoas logo com relações e com afeto.
Não há receitas para esse momento, mas algumas questões
que podem ser formuladas e respondidas pelo pesquisador;
l',m que pé ficam as relações posteriores ao trabalho de cam
po? Qual o compromisso do pesquisador com o grupo, no
t|ue concerne aos dados primários recolhidos, ao seu uso cien
tifico e às formas de retorno? Em resumo, a saída do campo
envolve problemas éticos e de prática teõrica. A relação inter-
Mibjetiva que se cria pode contribuir para definição do tipo e
do momento do corte necessário nas relações mais intensas e
iim plano de continuidade possível ou desejada.
Concluo evidenciando que as dificuldades de inserção do
l>t'sc|uisador no campo não podem ser pensadas apenas como
•|iK‘stão que o tempo de contato resolverá. Há as dificulda
des prõprias desse período da pesquisa que devem ser objeto
•l*' reflexão e de planejamento como parte das estratégias de
tiinstrução do conhecimento.
J
[Lugar] de estrangeiro que, preocupado em interpre
tar as práticas de outro grupo, tende a importar para o
objeto os princípios de suas relações com esse objeto, in-
cluindo-se aqui suas relevâncias (1973, p. 160).
* Diário de campo
A observação participante, em qualquer nível de profun
didade em que for realizada ou em que teoria se baseie, tra-
tli( ionalmente utiliza um instrumento denominado diário de
I limpo. O diário de campo nada mais é do que um caderni-
nho de notas, em que o investigador, dia por dia, vai anotan
do o que observa e que não é objeto de nenhuma modali-
tlade de entrevista. Nele devem ser escritas impressões pessoais
(|iif vão se modificando com o tempo, resultados de conver-
«i.is informais, observações de comportamentos contraditó-
iios com as falas, manifestações dos interlocutores quanto aos
v.nios pontos investigados, dentre outros aspectos. Uma per-
jinnia freqüentemente levantada pelos pesquisadores é se de-
M-m ou não devem usar dados de seu diário de campo para a
.niidise de seu objeto de investigação. A resposta tem de ser
iilliinativa. De outra forma não teria necessidade de tanto in-
vtMimento na observação. É exatamente esse acervo de im-
pn ssões e notas sobre as diferenciações entre falas, compor-
l.imnitos e relações que podem tornar mais verdadeira a
pt -Hini.sa de campo. Como lembra Denzin (1973), toda trian
gulação de métodos e técnicas favorece a qualidade e a pro
fundidade das análises.
L
Parte V
FASE DE ANÁLISE
DO MATERIAL QUALITATIVO
Análise de conteúdo
J
técnica de Análise de Conteúdo. A Retórica estuda as modali
dades de expressão própria de uma fala persuasiva. A lógica
analisa os enunciados de um texto, seu encadeamento, e as
regras formais que validam o raciocínio.
Análise de Conteúdo é uma expressão recente. Surgiu nos
Estados Unidos na época da Primeira Guerra Mundial, dentro
tio campo jornalístico na Universidade de Colúmbia. Dentre
os nomes que ilustram a história do desenvolvimento dessa
técnica destacam-se Lasswell (1952), que fazia análise de ma
terial de imprensa e de propaganda desde 1915. Sua obra prin
cipal, Propaganda Tecnique in the World War foi publicada em
1927. O trabalho de Lasswell teve como contexto um mo
mento histórico de fascínio pelo rigor matemático como me
dida e como parâmetro científico. Dessa forma, a Análise de
Conteúdo, em sua origem, é vítima da pretensa objetividade
t|Lie os números e as medidas oferecem.
A partir da década de 1940, os departamentos de Ciências
1’olíticas das universidades americanas tornaram-se o locus de
desenvolvimento das técnicas de Análise de Conteúdo, tendo
como material privilegiado as comunicações provenientes da
Segunda Guerra Mundial. Os investigadores visavam, dentre
outros objetivos, a desmascarar os jornais e periódicos sus
peitos de propaganda considerada subversiva ou de caráter
nazista. Lasswell continuava seus trabalhos sobre análise de
símbolos. A ele juntaram-se estudiosos das mais diferentes
áreas: sociólogos, psicólogos, cientistas políticos. Os marcos
distintivos da técnica desenvolvida nessa época foram as aná
lises estatísticas de valores, fins, normais, objetivos e símbo
los. A preocupação da objetividade e da sistematicidade so-
liilificou-se tendo como foco o rigor quantitativo, para se
(ontrapor ao que os cientistas denominavam "apreensão im
pressionista", numa crítica permanente ãs escolas etnometo-
d( ilógicas e interacionistas. Do ponto de vista metodológico,
Iterelson & Lazarsfeld (1952) sintetizaram e sistematizaram as
preocupações epistemológicas da época. Em The Analysis o f
Communications Content (Berelson & Lazarsfeld,1948), os cri
térios fundamentais então exigidos para testificar o rigor cien
tífico foram assim resumidos: (a) trabalhar com amostras reu
nidas de maneira sistemática; (b) interrogar-se sobre a validade
dos procedimentos de coleta e dos resultados; (c) trabalhar
com codificadores que permitam verificação de fidelidade; (d)
enfatizar a análise de freqüência como critério de objetivida
de e cientificidade; (e) ter possibilidade de medir a produtivi
dade da análise.
Berelson (1952), Lazarsfeld (1952) e Lasswell (1952) são
portanto importantes teóricos e criadores das técnicas de aná
lise de conteúdo. Neles, a obsessão pela objetividade e o rigor
se confundem com os pressupostos do positivismo. Seus no
mes, seus trabalhos e influência continuam marcantes e ainda
atuais em relação ãs propostas de tratamento dos dados.
No período posterior à Segunda Guerra, a utilização das
técnicas quantitativas para análise de conteúdo entrataram em
decadência. Seus próprios criadores refluíram o ânimo e se
desencantaram em relação aos resultados e às repercussões de
seus trabalhos. É de Berelson a seguinte frase citada por Bardin:
♦ Análise lexical
Uma análise lexical inicia-se sempre pela contagem das
palavras, avançando sistematicamente na direção da identifi
cação e dimensão do texto em estudo. No caso das entrevis
tas abertas, são feitos gmpamentos de palavras afins, deleta-
das palavras que apresentam pouco interesse, até se conseguir
(jiie representem o sentido do texto. As freqüências permi-
icm consolidar a aplicação de um tema ou locução, possibili-
i.uUo situar no contexto as idéias trazidas pelas palavras.
Operacionalmente, a análise léxica se faz da seguinte for
ma. O pesquisador faz o tratamento do conteúdo de um tex
to mediante a identificação do número total de ocorrências
ile cada palavra, do número total de palavras, do número de
(li(crentes palavras, vendo a riqueza de vocabulário utilizada
para produzir uma resposta ou um discurso. A seguir, ele clas
sifica as palavras, de acordo com sua ordem na produção de
significados: verbos, substantivos e adjetivos e, a seguir, os
vocábulos instmmentais como artigos e preposições. A partir
ilc então, o analista reduz o número de vocábulos significati
vos, fazendo uma análise controlada, eliminando os artigos,
picposições e as palavras que julga sem importância para o
objetivo a que se propõe. O aprofundamento do estudo pode
dar-se com a análise bi ou multivariada dos dados textuais, e
depois (o que já consiste um procedimento mais aprimora
do), integrando-os no contexto de produção da linguagem.
♦ Análise da Expressão
Designa um conjunto de técnicas que trabalham indica
dores para atingir a inferência formal. A hipótese da técnica de
análise de expressão é que existe uma correspondência entre
o tipo de discurso e as características do locutor e de seu meio.
A ênfase é dada à necessidade de conhecer os traços pessoais
do autor da fala, sua situação social e os dados culturais de
seu contexto. No entanto, esse tipo de técnica também utiliza
indicadores lexicais, como a repetição e a incidência das pala
vras. Mas a eles acrescenta a análise do estilo das falas, do
encadeamento lógico das idéias, dos arranjos seqüenciais e
da estmtura da narrativa. Sua aplicação mais freqüente ocorre
na investigação da autenticidade de documentos, na psicolo
gia clínica, na análise de discursos políticos e persuasivos (lí.ii
din, 1979; Unmg, 1974).
♦ Análise de Relações
Designa técnicas que, em vez da análise da mera freqüen
cia de vocábulos num texto, abordam relações entre os vái ios
elementos do discurso dentro de um texto. São duas as piiii
cipais modalidades de análise das relações: (a) a de co-o(oi
rências e a (b) estmtural.
A análise de co-ocorrências procura extrair de um texio .it
relações entre as partes de uma mensagem e assinala a presni
ça simultânea (co-ocorrência) de dois ou mais elementos ii.i
mesma unidade de contexto. Por exemplo, no estudo do dis
curso de uma doente mental, o analista observa que cada vi /
que ela define sua situação, a doença aparece vinculada a sl
tuação financeira. No caso, existe correlação entre esses <le
mentos. Osgood (1959) propõe a seguinte seqüência de pm
cedimentos para a análise de co-ocorrências: (a) escolha da
unidade de registro (essa pode ser uma palavra-chave ou uma
expresssão) e sua categorização por temas a que diz respeito;
(h) escolha das unidades de contexto (podem ser, por exem
plo, parágrafos ou até um texto inteiro) e o seu recorte em
Iragmentos; (c) busca da presença ou ausência de cada unida-
ilc de registro nas unidades de contexto; (d) cálculo de co-ocor-
lencias; (e) representação e interpretação de resultados.
A análise de co-ocorrência tem sido utilizada para esclare-
I imento de estruturas da personalidade; para o levantamento
de relevâncias que permanecem latentes tanto nas falas dos
indivíduos como nos textos referentes ã coletividade; para
esindo de estereótipos e de representações sociais (Bardin,
Osgood, 1959; Unmg, 1974).
A análise estmtural passou a ser bastante exercitada a par-
in tia década de 1960 e tem, como pressuposto fundamental,
.1 nença na existência de estmturas universais, ocultas sob a
.1 parente diversidade dos fenômenos. Filia-se às correntes es-
iininralistas na sociologia e na antropologia (Lévi-Strauss,
l'i(>7) e na lingüística (Sapir, 1967; Barthes, 1967). Os estm-
nnalislas buscam o imutável e permanente sob a heteroge-
iMiíLHle aparente. Por trás dessa busca está a noção de siste-
m.i Analisar significará, nesse tipo de estudo, reencontrar as
nii Sinas engrenagens, quaisquer sejam as formas dos meca
nismos em que se apresentem. A significação, no caso, fica
inhoulinada à estmturação da linguagem.
A análise estmtural não se aplica ao vocabulário, à semân-
tli .1 o n ao temário da mensagem em si. Ela se dirige à organi-
#iii,.in subjacente, ao sistema de relações, às regras de enca-
ili .nnrnio, de associação, de exclusão e de equivalência. Isto
•' t Ia liabalha com todas as interações que estmturam os ele-
♦ Mt IIIos (signos e significações), mas de maneira invariante e
Htil. prudente deles (Bardin, 1979; Lévi-Strauss, 1964, 1967;
Ifnilirs, 1967).
♦ Análise de Avaliação ou Representacional
Proposta por Osgood (1959), a análise representacional
tem por finalidade medir as atitudes do locutor quanto aos
objetos de que fala (pessoas, coisas, acontecimentos). Seu
pressuposto é de que a linguagem representa e reflete quem a
utiliza. Portanto, o estudo de seu conteúdo explícito permite
fazer inferências sobre o emissor, seu contexto e sua ambien
te. O conceito central para o processo de análise avaliativa ou
representacional é o termo atitude. Uma atitude seria, na visão
de Osgood, a predisposição relativamente estável e organiza
da para reagir sob a forma de opiniões ou de atos em presen
ça de objetos (pessoas, idéias, coisas, acontecimentos), de
maneira determinada.
Sendo o conceito de atitude o núcleo ou matriz que pro
duz e traduz um conjunto de juízos de valor, uma análise
representacioanl ou avaliativa consistiría em encontrar as ba
ses das atitudes dos entrevistados, por trás da dispersão das
manifestações verbais. Seu objetivo é específico: atém-se so
mente à carga avaliativa das unidades de significação, buscan
do nelas a direção e a intensidade dos juízos selecionados (Bar-
din, 1979; Osgood, 1959).
♦ Análise da Enunciação
Apóia-se numa concepção de comunicação como proces
so (e não como um dado estático) e do discurso como pala
vra em ato. A análise da enunciação considera que na produ
ção da palavra elabora-se, ao mesmo tempo, um sentido e
operam-se transformações. O discurso não seria um produto
acabado, mas um momento de criação de significados com
tudo o que isso comporta de contradições, incoerências e
imperfeições. Esse tipo de estudo parte da idéia de que, nas
entrevistas, a produção da fala é, ao mesmo tempo, espontã
nea e constrangida pela situação. Levando em conta essa dii
pia perspectiva na produção do texto, a análise da enunciação
irabalha com: (a) as condições de produção da palavra. Parte
do princípio que a estmtura de qualquer comunicação se dá
numa triangulação entre o locutor, seu objeto de discurso e o
interlocutor. Ao se expressar, o locutor projeta seus conflitos
liásicos por meio de palavras, silêncios e lacunas indicando
processos, na sua maioria, inconscientes de expressão; (b) o
continente do discurso e suas modalidades. Neste segundo tem
po, se realiza (1) uma aproximação por meio de análise sintáti
ca e paralingüística das estmturas gramaticais; (2) uma análise
lógica que mostra os arranjos do discurso; (3) uma análise dos
elementos formais atípicos: silêncios, omissões, ilogismos; (4)
nm realce das figuras de retórica.
A entrevista aberta é o material privilegiado da análise da
iMuinciação, no sentido de que ela evidencia um discurso di-
nâmico em que espontaneidade e constrangimento são simul-
t.ineos e em que o trabalho de elaboração se configura, ao
mesmo tempo, como emergência do inconsciente.
hm termos operacionais, a análise da enunciação segue o
seguinte roteiro:
♦ Estabelecimento do Corpus ou Corpi: delimitação do
mimero de entrevistas a serem trabalhadas. A qualidade da
iiiiálise substitui a quantidade do material. O pesquisador leva
em conta a questão central e objetiva da pesquisa para deli
near as dimensões do Corpus e dos desdobramentos para, se
lor necessário, fazer divisões em subconjuntos que se inte-
gi.\m no conjunto (Corpus).
* Preparação do Material: cada texto (entrevista) é uma
unidade básica. Começa-se pela transcrição exaustiva de cada
nina delas, deixando-se uma margem (à direita ou à esquer
da) para anotações ou utilizando-se algum artifício no com-
piKador. A transcrição conserva tanto o registro da palavra (sig-
m(icantes) como dos silêncios, risos, repetições, lapsos, sons
t outros.
• Etapas da Análise: na análise de enunciação cada entre-
MMa é submetida a tratamento como uma totalidade organi-
zada e singular. São observados em cada uma delas os seguin
tes aspectos: (1) alinhamento ao coletivo e à dinâmica pró
pria do discurso do indivíduo, para se encontrar a lógica que
estmtura cada uma delas; (2) o estilo; (3) os elementos atípi
cos e as figuras de retórica.
Na análise da enunciação de uma entrevista, primeiramente
é preciso observar o encadeamento das proposições^ e fazer-
se uma análise lógica. Separam-se por barra ou recopiam-se
todas as orações, observando-se as relações que ressaltam a
forma de raciocínio. A seguir, realiza-se a análise seqüencial,
pondo atenção sobre a maneira de constmção do texto, seu
ritmo, sua progressão e as mpturas do discurso.
Na análise de enunciação, o estilo é um revelador do lo
cutor, de seu contexto e de seus interlocutores, no sentido de
que a expressão e o pensamento caminham lado a lado: é
preciso tê-lo em conta. Igualmente, os chamados elementos
atípicos e as figuras de retórica são relevantes neste tipo de
prática teórica, devendo-se prestar especial atenção a: (a) repe
tições de um mesmo tema ou de uma mesma palavra dentro
de um texto. A repetição pode ser indicador da importância
do assunto que a palavra enuncia, mas também da sua ambi
valência e da denegação; (b) lapsos que podem significar a in
sistência numa idéia recusada. Segundo a psicanálise, a erup
ção irracional de um termo num contexto da racionalidade
significa uma quebra de defesa do locutor; (c) ilogismos, isto
é, os emperramentos nos raciocínios demonstrativos. Costu
mam ser indicativos de uma necessidade de justificação ou de
um juízo contraditório com a situação real; (d) lugares-comuns.
Esses podem ter um papel justificador. Costumam também
apelar para a cumplicidade do interlocutor (frases feitas, pro
vérbios culturalmente partilhados) ou para desviar a atenção
do entrevistador ou, ainda, para a recusa de aprofundar de-
J
terminados assuntos; (e) jogos de palavras: os chistes podem
indicar descontração mas também costumam ser usados para
ludibriar o entrevistador, visando a provocar o distanciamen
to de uma questão que o interlocutor não quer enfrentar; (f)
figuras de retórica. Elas jogam com o sentido das palavras. As
mais comuns são: o paradoxo (reunião de duas idéias apa
rentemente irreconciliáveis); a hipérbole (o aumento ou a di
minuição excessiva das coisas); a metonímia (uso da parte pelo
todo, do abstrato pelo concreto e vice-versa); a metáfora (de
signa uma coisa por outra).
Em síntese, a proposta da Análise de Enunciação, bem mais
complexa e contextualizada que as abordagens quantitativas
das falas, é conseguir, através do confronto entre a análise ló
gica, a análise seqüencial e a análise do estilo e dos elementos
atípicos de um texto, a compreensão do seu significado. A
conexão entre os temas abordados, o processo de produção
da linguagem e seu contexto, acabam por evidenciar os con
flitos e as contradições que permeiam e estmturam um dis
curso. Essa técnica é bastante utilizada e com grande produti
vidade na área de jornalismo investigativo e reflexivo.
♦ Análise Temática
À.
quantitativos. Em terceiro lugar, ele realiza a classificação e a
agregação dos dados, escolhendo as categorias teóricas ou
empíricas, responsáveis pela especificação dos temas.
♦ Terceira etapa: Tratamento dos Resultados Obtidos e Interpre
tação
Os resultados brutos são submetidos (tradicionalmente)
a operações estatísticas simples (porcentagens) ou complexas
(análise fatorial) que permitem colocar em relevo as informa
ções obtidas. A partir daí, o analista propõe inferências e rea
liza interpretações, inter-relacionando-as com o quadro teóri
co desenhado inicialmente ou abre outras pistas em torno de
novas dimensões teóricas e interpretativas, sugeridas pela lei
tura do material.
Como se pode perceber, a análise temática é bastante for
mal e mantém sua crença na significação da regularidade. Como
técnica ela transpira as raízes positivistas da análise de conteú
do tradicional. Porém há variantes desse tipo de abordagem
que trabalham com significados em lugar investir em inferên
cias estatísticas. Entre tais variantes, a que mais valoriza os sig
nificados é a modalidade de análise da enunciação.
Análise de discurso
L
i sse tema como objeto teórico: (a) pressupõe a lingüística,
____________________________________________________________
mas se destaca dela: não é nem uma teoria descritiva, nem
uma teoria explicativa. É uma teoria crítica que trata da deter
minação histórica dos processos de significação; (b) considera
como foco central de análise a relação entre a linguagem e seu
contexto de produção, tendo como marco teórico a teoria das
formações sociais e as teorias da sintaxe e da enumeração; (c)
pela sua especificidade, ela é cisionista em dois sentidos: (1)
procura problematizar as evidências e explicitar o caráter ideo
lógico da fala, revelando que não há discurso sem sujeito e
nem sujeito sem ideologia; (2) ressalta o encobrimento das
formas de dominação política que se manifestam na razão
disciplinar, instmmental e reducionista.
A Análise do Discurso situa-se, portanto e ao mesmo tem
po, numa apropriação da lingüística tradicional e da análise
de conteúdo, e numa crítica dessas abordagens, evidenciando
que são práticas-teóricas historicamente definidas. Orlandi diz
que a análise de discurso cria um ponto de vista próprio de
olhar a linguagem como espaço social de debate e de conflito.
Nela, o texto é considerado como uma unidade significativa,
pragmática e portadora do contexto situacional dos falantes.
Comenta Orlandi que neste tipo de proposta, as palavras, as
sentenças e os períodos são valorizados também em suas pe
culiaridades lexicais, morfológicas, sintáticas e semânticas, p( >
rém, o que cria a análise do discurso, "é o ponto de vista das
condições de produção do texto" (Orlandi, 1987, p. 130).
Em relação à Análise de Conteúdo, tanto Pêcheux como
Orlandi insistem em marcar uma linha divisória. Sua crítica
fundamental é de que esse tipo de abordagem toma o lexio
como pretexto e o atravessa só para demonstrar o que já lol
definido a priori pela situação dos atores em campo, ou coinu
ilustração de uma situação. Enquanto isso, a Análise de Disaii
so considera o texto como um monumento e sua exterioridadf
como parte constitutiva da historicidade inscrita nele. ness.i
forma, entende que a situação em estudo está atestada no
texto e é preciso buscar a compreensão do seu processo produtivo,
muito mais do que realizar uma interpretação exteriorizada do
objeto de pesquisa.
A teoria de Análise do Discurso trouxe uma contribuição
fundamental para a análise do material qualitativo, sobretu
do numa situação em que a hegemonia sempre coube às aná
lises positivistas dos conteúdos das falas. Atualmente nichos
específicos de seu desenvolvimento teórico e técnico são, prin
cipalmente, as áreas de informação e comunicação. A análise
dos diversos fenômenos informacionais e comunicacionais
(Sodré, 1992; Champagne, 1997) tem em comum a concep
ção de que eles fazem parte de um sistema que se articula à
lógica da vida social. E que, nas sociedades modernas, esses
meios ocupam um lugar privilegiado de produção e reprodu
ção do real, tornando-se poderosos "interferentes" na orga
nização do espaço relacionai (Hobsbawm, 1995; Ramonet,
1996; Martín-Barbero, 2001).
É importante definir alguns conceitos desenvolvidos a
partir da perspectiva dos teóricos da técnica de análise de dis
curso.
fexto — Na técnica de análise de discurso, o termo texto é
loiiiado como unidade de análise: unidade complexa de sig
nificações. Um texto pode ser uma simples palavra, um con-
iniito de frases ou um documento completo. Texto distingue-
s<' de discurso. Enquanto este último vocábulo designa um
miiceito teórico-metodológico, o primeiro é utilizado como
miiceito analítico. O discurso é a linguagem em interação,
tnm seus efeitos de superfície e representando relações esta-
hi lcí idas. O texto consiste no discurso acabado para fins de
.iii.ilise. Todo texto, enquanto corpus, é um objeto completo.
A partir dele são realizados possíveis recortes. Como objeto
ini lico, porém, o texto é infmitamente inacabado: a análise
llir devolve sua incompletude, acenado para um jogo de múl-
llplas possibilidades interpretativas, para o contexto que o
|ii mii, para a ideologia nele impregnada e para as relações dos
tilMies (|ue o tornam possível.
Do ponto de vista analítico, o texto é o espaço mais ade
quado para se observar o fenômeno da linguagem: ele contém
a totalidade. Essa totalidade revela-se em três dimensões de ar
gumentação: (a) relações de força em que se demarcam lugares
sociais e posição relativa do locutor e do interlocutor; (b) rela
ção de sentido, constituindo a interligação existente entre este e
vários outros discursos como num "coro de vozes" que se es
conde em seu interior; (c) relação de antecipação, que diz respei
to ao movimento do falante, prevendo a reação de seu interlo
cutor: qualquer fala tem em mente um ouvinte e sua reação.
Segundo Orlandi (1987), o movimento que acontece no
interior do discurso é ao mesmo tempo, o processo, o produ
to e o centro nevrálgico da significação a ser compreendido na
análise do texto. Portanto, todo texto exala ideologia e pode
determinar a relação entre o enunciador e o ouvinte, caracteri
zando sua inserção em determinada formação discursiva.^
Qualquer discurso é referidor e referido: dialoga com outros
discursos e se produz no interior de instituições e gmpos que
determinam quem fala, o que e como fala e em que momento.
Leitura e Silêncio — Qualquer texto admite múltiplas pos
sibilidades de interpretação. O jogo de relações e de intera
ções sociais permite tanto o nível de leituras parafrásticas, ou
seja, possuem o sentido dado por seus autores, como o nível
polissêmico em que à fala se atribuem múltiplos sentidos.
Tanto a leitura como a significação são'produzidas pelos in
terlocutores e leitores. A possibilidade de múltiplas interpre
tações apóia-se no fato de que o processo discursivo não tem
um início preciso: ele acumula sentidos de discursos prévios e
parte deles, sendo reinterpretados pela experiência concreta
do leitor, do interlocutor ou do analista.
A Hermenêutica Dialética
I
por seu conteúdo, mas por fazer uma mediação comunica-
cional, por existir como um "documento" e "uma senha" que
permitem aos membros de determinada comunidade se iden
tificarem. A importância de um símbolo está em sua função re
presentativa de algo visível e invisível, refletindo, ao mesmo
tempo, uma idéia do real e sua expressão fenomênica. Ou seja,
símbolo é a íntima unidade da imagem e do significado que não
anula a tensão entre o mundo das idéias e o mundo dos senti
dos. A compreensão simbólica deve ser entendida como parte
da ocorrência, da formulação e do sentido de todo enunciado.
Com Husserl (1980), a hermenêutica aproxima-se da fe-
nomenologia. Essa corrente de pensamento afasta-se da idéia
de investigação do "ser" numa abordagem filosófica essencia-
lista para ir à busca de compreensão de como as coisas se apre
sentam e acontecem nos modos subjetivos de viver. O "mun
do da vida", tal como pensado por Husserl é, ao mesmo
tempo, um mundo pessoal (no qual se juntam tradição e pro
jeto de futuro) e um mundo comunitário que contém a co-
presença dos outros com os quais se vive em intersubjetivida-
de. São dois os termos centrais do pensamento de Husserl:
intencionalidade e significado. O primeiro quer dizer dirigir-se
para, visar alguma coisa: "a consciência é intencionalidade" o
que significa: "toda consciência é consciência de [. . .] e todo
objeto é apreendido em sua relação com a consciência" (1980,
p. 56). O segundo pode ser traduzido como a concepção de
que os objetos são compreendidos de uma certa maneira sul)
jetiva pela consciência que lhes dão maior ou menor relevân
cia. Dessa forma, a fenomenologia não concebe a subjetivid.i
de em oposição à objetividade, porque esses dois termos est.io
em correlação: o sujeito que realiza, objetiva-se em sua ação,
e seu produto é sua própria subjetivação.
L-
gregos, o debate iniciava-se pela definição do tema. Seguiam-
se perguntas, respostas e outras indagações, até que os deba-
tedores chegassem à idéia mais clara sobre o assunto em pau
ta. Os historiadores de Sócrates comentam que ele costumava
usar essa estratégia para obter a confissão de ignorância de
seus interlocutores, com base nas contradições que manifes
tavam na apresentação de idéias. Em Platão, a dialética é o
método de passagem de um conhecimento sensível para o
conhecimento racional. Em Aristóteles, significa a dedução que
parte de premissas formuladas sobre opiniões prováveis. No
pensamento estóico, dialética é sinônimo de lógica formal.
No Ocidente, ao longo de toda a história da filosofia, o
conceito de dialética assumiu muitos significados, freqüente-
mente não relacionados ao seu sentido original. No século
XI, o filósofo Abelardo retomou o sentido grego da noção de
dialética como o método adequado para formular dúvidas e
críticas. Mas em Descartes, que viveu do final do século XVI
até a metade do século XVII e é considerado o filósofo dos
fundamentos da ciência moderna e pai do racionalismo, pelo
mérito do conjunto de toda a sua obra, mas sobretudo pelo
Discurso do Método, escrito em 1636 (Descartes, 1980), a dialé
tica só aparece referida como lógica falsa e inadequada ao cor
reto uso da razão.
Mais tarde, Kant mostrou, em Crítica da Razão Pura (1980),
que as idéias e os princípios da razão levam a contradições
quando são usados como transcendentes. Schleiermacher
(2000), um dos filósofos da hermenêutica, recupera a condi
ção da dialética como método de conhecimento, retoman
do seu sentido na filosofia de Platão. Para Schleiermacher, a
dialética é uma regra que serve a todo entendimento, uma vez
que se constitui como uma arte de conduzir o discurso para
produzir uma representação verdadeira de um assunto em
pauta.
Foi com Hegel em A Fenomenologia do Espírito escrita em
1813 (1980) que a dialética recebeu tratamento mais amplo e
aprofundado em três dimensões: ontológica, lógica e meto
dológica. A partir de então, o conceito passou a dominar a
teoria filosófica, sendo abordado em vários sentidos e com as
mais diferentes conotações; (a) a dialética do ser: o ser e o
nada é um e o mesmo; (b) a dialética da essência: a essência é
o ser enquanto aparência de si mesmo; (c) a dialética do con
ceito; o conceito é a unidade de ser e essência; (d) a dialética
do ser, da essência, e do conceito: tiansformar-se em outro é
o processo dialético na esfera do próprio ser.
Para Engels, a dialética está presente na realidade, como
forma de articulação das partes num todo e como processo
de desenvolvimento dessas partes. Ela manifesta-se no conhe
cimento como forma de pensar a história da natureza e da
natureza humana das quais são abstraídas as leis da dialética:
"a morte como momento essencial da vida, a negação da vida
como contida na própria negação da morte, de forma que a
vida seja sempre pensada com relação a seu resultado neces
sário, o qual está sempre contido nela, em germe, em forma
da morte" (Engels, 1952, p. 37). Por isso, a dialética é a forma
mesma como a realidade se desenvolve, pois no universo tudo
é movimento e transformação e nada permanece como é. Hegel
é considerado um filósofo idealista, pois coloca a primazia
das idéias na construção da realidade. Segundo sua filosofia,
na origem o universo seria a idéia materializada e, antes de
qualquer coisa, um espírito pensou o mundo. Mas o espírito
e o universo se encontram em movimento dialético.
No marxismo, a dialética transformou-se numa maneira
tlinâmica de interpretar o mundo, os fatos históricos e eco
nômicos, assim como as próprias idéias, sob a égide do mate-
riídismo histórico. Marx apoiou-se nas idéias de Hegel relativas
ao perene movimento universal e ao constante processo de
transformação, mas o fez invertendo os termos da reflexão
(lesse autor. Em Marx, a dialética está presente como método
de transformação do real que por sua vez modifica a mente
( Iiando as idéias. Todos os grandes pensadores marxistas de
senvolveram uma reflexão sobre a dialética. Mencionarei ape
nas alguns, buscando compor as idéia teóricas que vieram a
se tornar a espinha dorsal do método do materialismo dialé
tico, e remeto o leitor ao capítulo onde trato especificamente
do marxismo.
Para o marxismo, a realidade é um todo dinâmico, em
permanente desenvolvimento, em unidade de contrários, cujo
conhecimento é um processo de conquistas de verdades rela
tivas, como parte de uma verdade única e absoluta. A dialética
é o estudo da oposição das coisas entre si. Metodologicamen-
te, ela se traduziría numa forma de abordagem: desvendar as
relações múltiplas e diversificadas das coisas entre si; explicar
o desenvolvimento do fenômeno dentro de sua própria lógi
ca; evidenciar a contradição interna no interior do fenômeno;
compreender o movimento de unidade dos contrários; traba
lhar com a unidade da análise e da síntese numa totalização
das partes; co-relacionar as atividades e as relações.
Assim, do ponto de vista marxista, a dialética se constitui
num processo infinito de revelação de novos aspectos e cor
relações; processo incessante de busca de aprofundamento
do conhecimento humano; movimento de encontro da coe
xistência da causalidade com formas mais complexas de inter
dependência, de reprodução e de passagem da quantidade
para a qualidade.
Em síntese, a grande contribuição marxista à dialética é,
primeiro, inverter, teoricamente e na sua aplicação prática, a
visão hegeliana de primazia do pensamento sobre a ação na
constmção da realidade, valorizando a historicidade, e a rela
ção entre a base material e as representações da realidade. Na
prática de análise dos materiais qualitativos, essa abordagem
colabora para o entendimento de que não existe ponto de
vista fora da história, nada é eterno, fixo e absoluto, portan
to, não há nem idéias, nem instituições nem categorias estáti
cas. São os seguintes os princípios com os quais o método
dialético trabalha:
f
♦ Cada coisa é um processo, isto é, uma marcha, um tor
nar-se. Cada ser (pessoa, gmpo, instituição, animais, plantas)
está submetido à lei interna do movimento, contém em si o
passado, mas está em plena realização. As coisas, as relações e
as idéias transformam-se em virtude das leis internas de seu
autodinamismo.
♦ Há um encadeamento nos processos. Por exemplo, a
flor se transformou numa goiaba que se transformará em árvo
re e que um dia morrerá, recompondo o ciclo dos outros mo
mentos vitais de mudanças. Mas nunca será a mesma goiaba,
nem a mesma árvore, pois os processos se dão em espiral e não
de forma linear nem circular. O que vem é uma promessa, po
derá ou não acontecer, mas nunca será uma mera repetição.
♦ Cada coisa traz em si sua contradição, sendo levada a
transformar-se em seu contrário. O vivo marcha para a morte
porque vive; a felicidade contém a dor que virá e assim por
diante. Segundo a concepção de Hegel, uma coisa é ao mes
mo tempo ela própria e seu contrário. Qualquer coisa que se
concretiza é apenas um momento, uma síntese de sua afirma
ção e de sua negação.
A quantidade se transforma em qualidade. Nos processos
de transformação, as mudanças são quantitativas e conco-
mitamente qualitativas. A superação do dualismo entre quan
tidade e qualidade expressa-se no fato de que toda qualidade
comporta sempre certos limites quantitativos e vice-versa. Ou
seja, sob o ângulo da dialética, as qualidades perdem a natu
reza fixa e estável que lhes são atribuídas nas concepções clás
sicas da física e da lógica. São estados ou situações momentâ
neas, em transformação incessante motivada por mudanças
interiores. Assim, a oposição entre ambas é dialética e com-
ifiementar: a quantidade se apresenta sempre como uma dis
tinção no interior da qualidade. E a qualidade está sempre
presente nas quantidades, sendo a quantidade em si mesma
lima qualidade do objeto ou da realidade. Essa forma de com
preender a realidade em processo de transformação qualitati
va, sendo gerada no seio da mudança cjuantitativa, permite
superar, no plano do pensamento, a falsa polêmica que aco
meteu a prática científica moderna, na qual o quantitavismo
se estabeleceu de forma hegemônica, colocando todas as qua
lidades no mesmo plano (portanto não as distinguindo e di
ferenciando) e considerando que a realidade se esgota na sua
expressão matemática. Mas também busca ultrapassar a posi
ção contrária, que se restringe a compreender a realidade ape
nas nas suas expressões qualitativas.
J
♦ explorar as definições de situação do autor, que o texto
ou a linguagem em análise permite. Essa definição de situação
não se apresenta de forma explícita muitas vezes, cabendo ao
pesquisador desvendá-la e compreendê-la. Para os hermeneu-
tas, o mundo da cotidianidade onde se produz o discurso é o
parâmetro da análise, pois é o único mundo possível do con
senso, da compreensão ou do estranhamento da comunica
ção intersubjetiva, por isso, é também 0 mundo objetivo;
♦ supor o compartilhamento entre o mundo observado
e os sujeitos da pesquisa com o mundo da vida do investiga
dor [porque compreender é sempre compreender-se). E a partir de
tal postura, perguntar "por que" e "sob que condições" o su
jeito da linguagem que busca entender cria determinadas si
tuações, valoriza determinadas coisas, atribui determinadas
responsabilidades a certos atores sociais e, em síntese, expres
sa-se e se posiciona de tal maneira e não de outra;
♦ buscar entender as coisas e os textos "neles mesmos",
distinguindo o processo hermenêutico do saber técnico que
elabora um conjunto de normas para analisar um discurso;
da lingüística, cujo objetivo é a reconstmção do conjunto de
regras que subjazem à linguagem natural; da fenomenologia,
<uja linguagem é tomada como sujeito da forma de vida e da
iradição, como se a consciência lingüística determinasse o ser
material da práxis vital; e do objetivismo positivista que estabe
lece uma conexão ingênua entre os enunciados teóricos e os
il.idos factuais, como se fosse possível haver verdade fora da
práxis;
♦ apoiar toda a reflexão sobre determinada realidade so
bre o contexto histórico, partindo do pressuposto de que o
iiivestigador-intérprete e seu "sujeito" de observação e pes-
t|iiisa são expressões de seu tempo e de seu espaço cultural.
I.m relação à dialética, assinalarei com base em Habermas
( 1987) e Stein (1987) as aproximações e as diferenciações que
pninitem às duas abordagens se complementarem, buscando
ilf antemão, ressaltar suas potencialidades complementares:
♦ em primeiro lugar, enquanto a hermenêutica busca es
sencialmente a compreensão, a dialética estabelece uma atitu
de crítica. Habermas expressa essa diferenciação, afirmando
que a razão humana pode mais que simplesmente compre
ender e interpretar. Ela possui uma força transcendental que
lhe permite exercer crítica e superar prejuízos: "A mesma razão
que compreende, esclarece e reúne, também contesta e disso
cia" (Habermas, 1987, p. 20). A estmtura do significado pre
sente na linguagem, na qual a hermenêutica põe maior ênfa
se, para a lógica dialética é apenas um dos fatores na totalidade
do mundo real. Habermas (1987) realiza uma crítica extensi
va do campo compreensivista, que vai da hermenêutica à feno-
menologia e à etnometodologia, dizendo que esses tipos de
abordagem ignoram a totalidade da vida social. Pois essas abor
dagens se movem num espaço de comunicação restrita da vida
cotidiana como se esse universo contivesse a totalidade do
processo sócio-histórico e cultural. Habermas (1987) critica
Gadamer, dizendo que ele se esquece de que o contexto da
tradição não é apenas o espaço da verdade, mas também da
falsidade fática, pois é atravessado por interesses e pela vio
lência. Argumenta que, a seu ver, o mundo se compõe de tra
balho, poder e linguagem, portanto, a linguagem que reflete
esse mundo está marcada e limitada pelo caráter ideológico
das relações de trabalho e poder:
à
quem voltar a ler a história da tribo [dos esquimós] daqui
a 50 ou 100 anos, não só achará que essa história é velha,
porque nesse meio tempo ele sabe mais ou interpreta me
lhor as fontes mais corretamente, mas ele pode admitir
também que no ano de 1960 liam-se as fontes de modo
diverso, porque as pessoas estavam motivadas por outras
questóes, por outros pressupostos e por outros interes
ses" (1999, p. 138).
i
do conflito e da contradição como algo permanente e que se
explica na transformação.
♦ Uma vez que nada se constrói fora da história, qualquer
texto (em sentido amplo) necessita estar referido ao contexto
no qual foi produzido, porque só poderá ser entendido na
totalidade dinâmica das relações sociais de produção e repro
dução nas quais se insere. Mais que isso, o cientista que analisa
as questões sociais nunca poderá se esquecer de que os seres
humanos não são só objeto de investigação, são também su
jeitos de relações: na defesa dessa posição, a hermenêutica de
Gadamer se aproxima da dialética marxista. Diz Goldmann:
Diz Gadamer:
Proposta operativa
A
micas e políticas, de sua participação e inserção nas totalida-
des maiores como bairro, cidade, país; (b) do mapeamento
do sistema de saúde local e próximo (hospitais, centros de
saúde, farmácias, outras facilidades e alternativas terapêuticas,
mesmo populares) dos profissionais, da acessibilidade aos ser
viços; (c) do perfil de morbimortalidade da população resi
dente e objeto da investigação. Esse primeiro nível é o plano
da totalidade (sempre totalidade parcial) ou do contexto, que
significa, segundo Lukács:
J
As concepções de saúde e doença são frutos e manifestações
de condicionamentos sócio-históricos que se vinculam a aces
so a serviços, tradições culturais, concepções dominantes so
bre o assunto e da inter-relação de tudo isso. Portanto, saúde
e doença são fenômenos sociais não apenas porque expres
sam certo nível de vida ou porque correspondem a certas pro
fissões e práticas. Mas porque são manifestações da vida mate
rial, das carências, dos limites sociais e do imaginário coletivo.
O segundo momento interpretativo é o ponto de partida
e o ponto de chegada de qualquer investigação: é o encontro
com os fatos empíricos, no caso, com um conjunto de con
cepções sobre saúde e doença. É preciso encontrar nos relatos
dos informantes o sentido, a lógica interna, as projeções e as
interpretações. Isto é, nesses textos existe, ao mesmo tempo,
uma específica significação cultural própria do grupo e uma
vinculação muito mais abrangente que junta esse gmpo a cír
culos cada vez mais abrangentes e intercomunicáveis da reali
dade, tratados no primeiro item.
Na busca da significação específica, é preciso que a análise
contemple: (a) as comunicações individuais (entrevistas, his
tórias de vida, resultados de discussões de gmpo); (b) as ob
servações de condutas, costumes e relações relativas ao tema
saúde e doença; (c) a análise das falas sobre instituições ofi-
( iais (e outras informações sobre elas) e sobre outras entida-
iles ou organizações alternativas que oferecem serviços no lo
cal; (d) observação de cerimônias e ritos atinentes ao tema.
A interpretação exige elaboração de Categorias Analíticas
(geralmente trabalhadas desde o início da investigação) capa
zes de desvendar as relações mais abstratas e mediadoras para
a parte contextual e de Categorias Empíricas e Operacionais, cria
das a partir do material de campo, contendo e expressando
lelações e representações típicas e específicas do gmpo em
(|iiestão. A partir dos dados colhidos e acumulados, o investi
gador se volta para os fundamentos das teorias que fizeram
parte da elaboração dos conceitos iniciais na fase explorató
ria, para pôr em dúvida idéias evidentes anteriormente e para
verificar em que medida o momento pós-trabalho de campo
lhe exige aprofundamento de outros temas. Assim, o pesqui
sador constrói uma nova aproximação do objeto: o pensa
mento antigo (proveniente da fase exploratória) que é nega
do, mas não excluído, encontra outros limites e se ilumina na
elaboração do momento presente. O novo contém o antigo,
incluindo-o numa nova perspectiva.
Como operacionalizar esse segundo momento que, na
verdade, constitui o maior desafio da fase de análise? Por meio
de três fases, cujos passos sugiro que sejam os seguintes:
J
desenvolvidas no "Sistema dos Princípios do Entendimento"
em sua obra sobre a Crítica da Razão Pura. Kant ensina que "a
possibilidade da experiência é oferecida pela realidade objeti
va a todos os nossos conhecimentos a priori" (1980, p. 115).
Ora, a experiência se constrói na unidade sintética dos fenô
menos, numa síntese de conceitos sem o qual a ação não che
garia a se transformar em conhecimento. Logo, à atuação con
creta subjazem princípios e regras universais relativos à unidade na
síntese dos fenômenos, cuja realidade objetiva pode ser mos
trada pela experiência: "é no objeto que a unidade sintética
dos conceitos evidencia uma realidade objetiva" (1980, p. 116).
Para Kant, o entendimento da realidade fundamenta-se
em quatro princípios básicos: os axiomas da intuição; as anteci
pações da percepção; as analogias da experiência e os postulados do
pensamento empírico em geral. Nesta introdução apenas se co
mentam os dois iniciais. O primeiro fundamenta-se no fato
de que as intuições são quantidades extensivas no tempo e
no espaço que só podem ser apreendidas pela composição
de homogêneos múltiplos e pela consciência da unidade sin
tética deste múltiplo. Os fenômenos, de acordo com Kant,
são quantidades, mas quantidades extensivas representadas
por partes homogêneas e sucessivas e que formam um todo.
O segundo princípio diz respeito à existência de uma quan-
(idade intensiva que ocorre como um grau de percepção dos
fenômenos. Essa percepção, segundo Kant, é a consciência
empírica simultânea da intuição e da sensação. Ela é compre
ensão de que os objetos fenomênicos não são apenas quan-
litlades extensivas ou intuições externas. Eles contêm, tam
bém, sensações sob forma de representação subjetiva. Dizendo
(om outras palavras, o sujeito é afetado e experimenta exis-
lencialmente o fenômeno que vivência: isso constitui uma
imidade do sistema de entendimento. Esta unidade é um grau,
rntre o qual e sua negação ocorre uma seqüência infinita de
gi.uis sempre menores. Daí se conclui que há diferentes graus
de observação de uma experiência que contém, simultanea-
iiuaite, quantidades extensivas e quantidades intensivas.
Kant chamou a quantidade intensiva de "qualidade" das
sensações, assinalando que a vivência dessa qualidade é sem
pre empírica, não podendo, de modo algum, ser representada
a priori. Portanto, as "percepções", as "sensações", são verda
des reconhecidas apenas posteriormente, porém a propriedade
de possuir um grau pode ser conhecida por antecipação. Da
mesma forma, nas quantidades só se pode conhecer, a priori,
uma qualidade: sua continuidade. E, na qualidade, só uma
quantidade extensiva, ou seja, a de possuir um grau: "Cha
marei matemáticos, os dois princípios precedentes, sendo am
bos constitutivos dos fenômenos" (Kant, 1980, p. 123).
As idéias filosóficas de Kant podem ser consideradas bási
cas para a triangulação, pois fundamentam a possibilidade de
articulação de estudos de magnitude e de compreensão de
forma complementar. A realização metodológica da proposta
não exige grande teorização, uma vez que busca apenas inte
grar as vantagens da avaliação tradicional com a abordagem
qualitativa e os elementos dos processos participativos. O pon
to cmcial do processo reflexivo é o que aponta ser possível
exercer uma superação dialética sobre o objetivismo puro, em
função da riqueza de conhecimento que pode ser agregada
com a valorização do significado e da intencionalidade dos
atos, das relações e das estruturas sociais. A postura dialética
leva a compreender que dados subjetivos (significados, inten
cionalidade, interação, participação) e dados objetivos (indica
dores, distribuição de freqüência e outros) são inseparáveis e
interdependentes. Ela permite criar um processo de dissolução
de dicotomias: entre quantitativo e qualitativo; entre macro e
micro; entre interior e exterior; entre sujeito e objeto.
J
♦ A análise das informações recolhidas recebe os influxos
do êxito ou dos problemas das etapas anteriores. Por isso, a
experiência em pesquisa recomenda que cada passo do pro
cesso seja cuidadosamente preparado e realizado. Do ponto
de vista operacional, esta etapa consiste na ordenação dos
dados, na sua classiflcação e na análise propriamente dita con
forme já tratado no capítulo anterior. O pesquisador precisa
comparar os objetivos gerais e específlcos e os resultados, ana
lisar o uso dos recursos metodológicos, dimensionar as me
tas estabelecidas para cada etapa do processo e as relevâncias
de seus dados quantitativos e qualitativos.
Trabalhando-se com triangulação de métodos, está pre
visto que as operações já mencionadas sejam realizadas, pri
meiro separadamente. Os que utilizam questionários, de acor
do com o desenho e o modelo adotados, passam a tabular, a
digitar, a categorizar, a produzir estatísticas simples e cmza-
mentos, chegando, aos poucos, a análises capazes de trans
formar em números, indicadores trabalhados na pesquisa.
Quem faz análise qualitativa, passa a separar as diferentes
modalidades dos instmmentos aplicados e dos materiais his
tóricos e institucionais recolhidos. Numa dinâmica de leitura
que vai do campo para as categorias analíticas, que cria e res
salta categorias empíricas, estabelece as bases compreensivas
da unidade reflexiva que é seu objeto ou pergunta inicial.
Depois dos trabalhos analíticos específlcos, são necessá
rios vários encontros da equipe multidisciplinar, visando à
compatibilização entre informações quantitativas e qualitati
vas, e análises de todo o material primário e secundário. A
Imsca de diálogo entre disciplinas e abordagens tem a finali
dade de produzir um informe único que deve refletir, não
informações justapostas, mas o intercâmbio de teorias e mé-
lodos em favor do esclarecimento e do aprofundamento dos
vários aspectos da realidade.
♦ A elaboração do informe final merece atenção especial.
I'.le deve conter sucintamente: o objeto de estudo; os objeti
vos; uma síntese teórica dos conceitos principais que infor
mam as análises; as metodologias de abordagem; a contex-
tualização; a descrição dos vários processos estudados sob a
perspectiva de todos os atores; a síntese contendo o concreto
pensado em forma de resultados e as conclusões.
O informe ou relatório não é e nunca será, na concepção da
triangulação, um somatório de resultados disciplinares. É uma
constmção do coletivo de pesquisa, em forma de síntese. Nele
poderão existir capítulos mais históricos, outros de base mais
estatística, outros que dão ênfase à elaboração de significados,
mas cada um vem iluminado pela contribuição dos outros.
Avanços importantes na área de conhecimento podem
ocorrer por meio da triangulação de métodos quando uma equi
pe de pesquisadores aceita o desafio de um trabalho coope
rativo. Do ponto de vista teórico-prático, o sucesso desse pro
cesso reside em três posturas opostas e complementares: (1)
profundo respeito aos campos disciplinares; (2) relativização
da visão fragmentada de cada um deles; (3) capacidade dialó-
gica dos pesquisadores ante propostas teóricas e metodológi
cas diferentes e com os sujeitos que atuam no mundo da vida.
A triangulação não inviabiliza o desenvolvimento de teo
rias, análises e publicações próprias ao campo de conhecimen
to de cada pesquisador. O que se sabe por experiência é que a
produção disciplinar, resultante da experiência de triangula
ção, que compartilha as reflexões de outras áreas, nunca será
igual ao fmto do esforço monológico do investigador indivi
dual e solitário. Nessa proposta, independentemente da área
específica de cada um, todos recebem o influxo da interfertili-
zação de saberes que, em certa medida, durante o processo de
produção do conhecimento, rompem barreiras epistemológi-
cas, teóricas e práticas.
J
Capítulo 13
SOBRE VALIDADE E VERIFICAÇÃO
EM PESQUISA QUALITATIVA
Neste estudo o termo tr ia n g u la ç ã o está sendo utilizado para designar não apenas
várias perspectivas de abordagem e de crítica como também, da combinação en
tre métodos quantitativos e qualitativos, o que vem descrito no Capítulo 12 desle
livro.
A resolução da antítese teórica só é possível de uma
forma prática, em virtude da energia prática do homem.
Sua resolução não é, portanto, apenas um problema de
compreensão, mas um problema real da vida que a filo
sofia não poderia resolver, precisamente porque consi
dera tal problema simplesmente teórico (Marx, 1973, p.
141).
á. j
Nas teses n.° 3 e n.° 11, Marx rechaça o papel apenas con
templativo da teoria e chama atenção para o dinamismo do
conhecimento que só tem sentido como possibilidade de
transformação da realidade, não devendo, pois, ser tratado
nem somente como teoria e nem somente como prática,
mas como união indissolúvel de ambas na práxis. A tese n." 3,
sobretudo, reafirma o caráter complexo e interativo do que
deve ser conhecido e transformado em objeto de ação pe
dagógica:
J
Saúde Sexual e Reprodutiva no Brasil, Loren Galvão & Juan Díaz (orgs.)
A Educação dos Profissionais de Saúde da América Latina (Teoria e Prática de um Movimento de
Mudança) — Tomo 1 “Um Olhar Analítico" — Tomo 2 "As Vozes dos Protagonistas", Mareio Almeida,
Laura Feuerwerker Manuel UanosC. (orgs.)
Vigilância Sanitária: Proteção e Defesa da Saúde, Ediná Alves Costa
Sobre a Sociologia da Saúde. Origens e Desenvolvimento, Everardo Duarte Nunes
Ciências Sociais e Saúde para o Ensino Médico, Ana Maria Canesqui (org.)
Educação Popular e a Atenção à Saúde da Família, Eymard Mourão Vasconcelos
Um Método Para Análise e Co-Gestão de Coletivos, Castâo Wagner de Sousa Campos
A Ciência da Saúde, Naomar de Almeida Filho
A Voz do Dono e o Dono da Voz: Saúde e Cidadania no Cotidiano Fabril, José Carlos "Cacau" Lopes
Da Arte Dentária, Carlos Botazzo
Saúde e Humanização: a Experiência de Chapecó, Aparecida Linhares Pimenta (org.)
Consumo de Drogas: Desafios e Perspectivas, Fábio Mesquita & Sérgio Seibel
SaúdeLoucura 7, Antonio Lancetti (org.)
Ampliar o Possível: a Política de Saúde do Brasil, José Serra
SUS Passo a Passo: Normas, Gestão e Financiamento, Luiz Odorico Monteiro de Andrade
A Saúde nas Palavras e nos Gestos: Reflexões da Rede Educação Popular e Saúde, Eymard Mourão
Vasconcelos (org.)
Municipalização da Saúde e Poder Local: Sujeitos, Atores e Políticas, Silvio Fernandes da Silva
A Cor-Agem do PSF, Maria Fátima de Souza
Agentes Comunitários de Saúde: Choque de Povo, Maria Fátima de Souza
A Reforma Psiquiátrica no Cotidiano, Angelina Harari & Willians Valentini (orgs.)
Saúde: Cartografia do Trabalho Vivo, Emerson Elias Merhy
Além do Discurso de Mudança na Educação Médica: Processos e Resultados, Laura Feuerwerker
Tendências de Mudanças na Formação Médica no Brasil: Tipologia das Escolas, Jadete Barbosa Lampert
Os Sinais Vermelhos do PSF, Maria Fátima de Sousa (org.)
O Planejamento no Labirinto: Uma Viagem Hermenêutica, Rosana Onocko Campos
Saúde Paidéia, Castão Wagner de Sousa Campos
Biomedicina, Saber & Ciência: Uma Abordagem Crítica, Kenneth R. de Camargo Jr.
Epidemiologia nos Municípios: Muito Além dM Normas, Marcos Drumond Júnior
A Psicoterapia Institucional e o Clube dos Saberes, Arthur Hyppólito de Moura
Epidemiologia Social: Compreensão e Crítica, Djalma Agripino de Melo Filho
O Trabalho em Saúde: Olhando e Experienciando o SUS no Cotidiano, Emerson Elias Merhy et al
Natural, Racional Social: Razão Médica e Racionalidade Cientifica, Madel T. Luz
Acolher Chapecó: Uma Experiência de Mudança do Modelo Assistencial, com Base no Processo de Trabalho,
Túlio Batista Franco et al.
Educação Médica em Transformação: Instrumentos para a Construção de Novas Realidades, João José
Neves Marins
Proteção Social. Dilemas e Desafios, Ana Luiza d'Ávila Viana, Paulo Eduardo M. Elias & Nelson Ibanez (orgs.)
O Público e 0 Privado na Saúde, Luiza Sterman Heimann, Lauro Cesar Ibanhes & Renato Barbosa (orgs.)
O Currículo Integrado do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual de Londrina: do Sonho à
Realidade, Maria Solange Comes Dellaroza & MarliTerezinha Oliveira Vanucchi (orgs.)
A Construção da Clínica Ampliada na Atenção Básica, Custavo Tenório Cunha
Saúde Coletiva e Promoção da Saúde: Sujeito e Mudança, Sérgio Resende Carvalho
Saúde e Desenvolvimento Local, Marco Akerman
Saúde do Trabalhador no SUS: Aprender com o Passado, Trabalhar o Presente e Construir o Futuro, Maria
Maeno & José Carlos do Carmo
A Espiritualidade do Trabalho em Saúde, Eymard Mourão Vasconcelos (org.)
Saúde Todo Dia: Uma Construção Coletiva, Rogério Carvalho Santos
As Duas Faces da Montanha: Estudos sobre Medicina Chinesa e Acupuntura, Marilene Cabral do Nascimento
Perplexidade na Universidade: Vivências nos Cursos de Saúde, Eymard Mourão Vasconcelos, Lia Haikal Frota
& Eduardo Simon
Tratado de Saúde Coletiva, Castão Wagner de Sousa Campos, Maria Cecília de Souza Minayo, Marco
Akerman, Marcos Drumond Jr. & Yara Maria de Carvalho (orgs.)
Entre Arte e Ciência: Fundamentos Hermenêuticos da Medicina Homeopática, Paulo Rosenbaiim
A Saúde e o Dilema da Intersetorialidade, Luiz Odorico Monteiro de Andrade
Olhares Socioantropológicos Sobre os Adoecidos Crônicos, Ana Maria Canesqui (org.)
Na Boca do Rádio: o Radialista e as Políticas Públicas, Ana Luísa Zaniboni Comes
SUS: Ressignificando a Promoção da Saúde, Adriana Castro & Miguel Maio (orgs.)
SUS: Pacto Federativo e Gestão Pública, Vânia Barbosa do Nascimento
Memórias de um Médico Sanitarista que Virou Professor Enquanto Escrevia Sobre. . . , Castão Wagner de
Sousa Campos
Saúde da Família, Saúde da Criança: a Resposta de Sobral, Anamaria Cavalcante Silva
A Construção da Medicina Integrativa: um Desafio para o Campo da Saúde, Nelson Filice de Barros
O Projeto Terapêutico e a Mudança nos Modos de Produzir Saúde, Custavo Nunes de Oliveira
As Dimensões da Saúde: Inquérito Populacional em Campinas, SP, Marilisa Berti de Azevedo Barros, Chester
Luiz Galvão César, Luana Carandina & Moisés Goldbaum (orgs.)
Avaliar para Compreender: Uma Experiência na Gestão de Programa Social com Jovens em Osasco, SP, Juan
Carlos Aneiros Femandez, Mansa Campos & Dulce Helena Cazzuni (orgs.)
O Médico e Suas Interações: Confiança em Crise, Lília Blima Schraiber
Ética nas Pescjuisas em Ciências Humanas e Sociais na Saúde, Iara Coelho Zito Guerriero, Maria Luisa
Sandoval Schmidt & Fabio Zicker (orgs.)
Homeopatia, Universidade e SUS: Resistências e Aproximações, Sandra Abrahão Chaim Salles
Manual de Práticas de Atenção Básica: Saúde Ampliada e Compartilhada, Gastào Wagner de Sousa Campos
& André Vinícius Pires Guerrero (orgs.)
Saúde Comunitária: Pensar e Fazer, Cezar Wagner de Lima Góis
Pescfuisa Avaliativa em Saúde Mental: Desenho Participativo e Efeitos da Narratividade, Rosana Onocko
Campos, Juarez Pereira Furtado, Eduardo Passos & Regina Benevides
Saúde, Desenvolvimento e Território, Ana Luiza d'Ávila Viana, Nelson Ibanez & Paulo Eduardo Mangeon
Elias (orgs.)
Educação e Saúde, Ana Luiza d'Ávila Viana & Célia Regina Pierantoni (orgs.)
Direito à Saúde: Discursos e Práticas na Construção do SUS, Solange L'Abbate
Infância e Saúde: Perspectivas Históricas, André Mota e Lilia Blima Sduaibei (orgs.)
Conexões: Saúde Coletiva e Políticas de Subjetividade, Sérgio Resende Carvalho, Sabrina Ferigato, Maria
Elisabeth Barros (orgs.)
Medicina e Sociedade, Cecília Donnangelo
Sujeitos, Saberes e Estruturas: uma Introdução ao Enfoque Relacionai no Estudo da Saúde Coletiva, Eduardo
L Menéndez
Saúde e Sociedade: o Médico e seu Mercado de Trabalho, Cecília Donnangelo & Luiz Pereira
A Produção Subjetiva do Cuidado: Cartografias da Estratégia Saúde da Família, Tulio Batista Franco,
Cristina Setenta Andrade & Vitória Solange Coelho Ferreira (orgs.)
Medicalização Social e Atenção à Saúde no SUS, Charles D. Tesser (org.)
Saúde e História, Luiz Antonio de Castro Santos & Lina Faria
Violência e Juventude, Mareia Faria Wesiphal & Cynthia Rachid Bydlowski
Walter Sidney Pereira Leser: das Análises Clínicas à Medicina Preventiva e à Saúde Pública, José Ruben de
Alcântara Bonfim & Silvia Bastos (orgs.)
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