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Ansiedade no Paciente com Câncer

Incluído em 09/02/2005
Na trajetória do câncer, a ansiedade se manifesta precocemente, mesmo durante os diversos momentos
do diagnóstico. Depois, continua durante o tratamento e pós-tratamento. E, ao contrário do que possam
pensar clínicos menos sensíveis, não se trata de um "problema do paciente" se ele estiver
demasiadamente ansioso. Isso porque a ansiedade pode comprometer significativamente o sucesso do
tratamento e, conseqüentemente, comprometer o sucesso do médico.
Portanto, atender às questões emocionais do paciente corresponde a melhorar substancialmente o
tratamento clínico (1,2,3,4).
Os pacientes podem começar a experimentar ansiedade moderada ou severa enquanto esperam os
resultados dos exames de diagnóstico (Jenkins, 1991). Para os pacientes que estão recebendo o
tratamento, a ansiedade também pode aumentar a possibilidade de sofrer mais dor (6,7,8), bem como
uma série de outros sintomas, desde a angústia e depressão, até as incoercíveis náusea e vômitos
agravados pelas emoções.
Tem-se demonstrado que a ansiedade, independentemente de seu grau, pode reduzir substancialmente a
qualidade de vida dos pacientes e de suas famílias, podendo ainda favorecer a morte prematura do
paciente. Assim sendo, a atenção terapêutica da ansiedade é uma das medidas fundamentais durante o
tratamento do câncer (9,10,11,12).

Câncer e Ansiedade
É extremamente variável o grau de ansiedade em pacientes com câncer, podendo aumentar segundo a
evolução da doença ou conforme a agressividade do tratamento oncológico (Breitbart, 1995). Os
investigadores têm descoberto que 44% desses pacientes têm declarado experimentar alguma
ansiedade. Deles, 23% experimentam um grau de ansiedade mais significativo (Schag, 1989).
A ansiedade, como atitude psico-fisiológica, pode ser parte da adaptação normal da pessoa à sua doença.
Na maioria dos casos, as reações de ansiedade mais intensas são limitadas no tempo (circunstanciais) e
acabam sendo até benéficas, no sentido de motivar pacientes e familiares a procurar medidas de alívio,
como por exemplo, obter mais informação sobre os benefícios do tratamento, novas atitudes diante da
vida, etc. Entretanto, as reações de ansiedade que se prolongam por muito tempo ou são muito intensas
podem comprometer a adaptação. Nesses casos elas se classificam como Transtornos de Ajustamento.
Estes transtornos podem comprometer a qualidade de vida e dificultar a capacidade de funcionamento
social e emocional do paciente com câncer. Nessa fase a ansiedade requer intervenção terapêutica
(Razavi, 1994). Outros transtornos específicos da ansiedade, tais como a Ansiedade Generalizada, a
Fobia e o Transtorno do Pânico, podem ser comuns entre estes pacientes e costumam preceder o
diagnóstico da doença. O estresse causado por um diagnóstico de câncer e seu tratamento pode
precipitar a recaída de um Transtorno de Ansiedade preexistente. Estes transtornos podem incapacitar e
dificultar até o tratamento, motivo pelo qual requerem um diagnóstico imediato e um controle eficaz
(Maguire, 1993).
Alguns outros fatores podem aumentar a probabilidade de Transtornos de Ansiedade durante o
tratamento de câncer. Entre eles se incluem os antecedentes pessoais de Transtornos de Ansiedade,
concomitância de quadros dolorosos intensos, concomitância de limitações funcionais ou de carência de
apoio social e consciência do avanço da doença (Breitbart, 1995).
Observa-se que certos fatores demográficos e sociais também parecem influir no grau da ansiedade do
paciente oncológico, como por exemplo, ser mulher, desenvolver câncer em idade precoce, pacientes
com problemas de relacionamento com suas famílias, pacientes problemas de relacionamento com
amigos e médicos (Friedman, 1994).

Descrição
Os pacientes da oncologia costumam apresentar ansiedade patológica tanto na época do diagnóstico
quanto (e principalmente) durante o tratamento. Outros, já possuidores de Transtorno Específico da
Ansiedade antes de adoeceram, muito possivelmente terão recorrência do quadro. Os sintomas somáticos
da ansiedade podem incluir dispnéia, transpiração, enjôo e palpitações.
Dentro do espectro da ansiedade os pacientes com câncer podem manifestar qualquer um dos seguintes
Transtornos da Ansiedade:
Transtornos de Ajustamento,
Transtorno de Pânico,
Transtorno Fóbico-Ansioso,
Transtorno Obsessivo-Compulsivo,
Transtornos por Estresse Pós-Traumático,
Transtornos da Ansiedade Generalizada e;
Transtornos da Ansiedade Causados por Outras Afecções Médicas Gerais.
Podemos usar um roteiro de sintomas para considerar a possibilidade da ansiedade nos pacientes com
câncer:
Tem tido algum dos sintomas abaixo desde o diagnóstico de câncer ou desde o começo do tratamento? É
importante saber, também, quando ocorrem estes sintomas, quantos dias antes da quimioterapia, e
quanto tempo duram?
Sente-se com medo ou "nervoso"?
Tem se sentido tenso ou apreensivo?
Tem tido que evitar certos lugares ou atividades devido ao medo?
Tem sentido seu coração batendo forte ou acelerado?
Tem tido desânimo quando está nervoso?
Tem tido transpiração excessiva e injustificada ou tremores?
Tem sentido um nó ou bolo no estômago?
Tem sentido um nó ou bolo na garganta?
Tem se percebido alguma vez de que caminha como se estivesse medindo seus passos?
Tem medo de dormir ou pensa em morrer enquanto dorme?
Preocupa-se por seu próximo exame médico, pelos resultados dos exames com semanas de
antecedência?
Tem sentido repentinamente medo de perder o controle ou de tornar-se louco?
Tem sentido de repente medo de morrer mais do que o normal?
Tem preocupações fortes de quando voltará a ter dor?
Tem preocupações fortes se conseguir tomar medicação contra a dor a tempo?
Passa mais tempo que o normal na cama por medo a que alguma dor se intensifique?
Tem se sentido confuso ou desorientado ultimamente?
Vamos descrever brevemente alguns dos quadros do espectro da Ansiedade possivelmente encontrados
nos pacientes da oncologia.

1 . Transtornos de Ajustamento
Os Transtornos de Ajustamento se diagnosticam em pacientes que manifestam comportamentos mal
adaptados e/ou mudanças no estado de ânimo como resposta a um estresse identificado. Os
comportamentos mal adaptados ou mudanças no estado de ânimo incluem nervosismo intenso,
preocupação, medo e deficiência no funcionamento ocupacional, escolar, social ou familiar normais. Estes
sintomas são adicionais às reações normais ao câncer e ocorrem nos 6 meses depois do estresse inicial
do diagnóstico.
Em geral esses pacientes diagnosticados com Transtorno de Ajustamento não têm antecedentes de
outros transtornos psiquiátricos, entretanto, os pacientes com outros transtornos crônicos têm maior
probabilidade de ter tido outros problemas de ajustamento antes do câncer, problemas esses que
reaparecem na doença atual. Os transtornos de ajustamento são prevalentes entre os pacientes com
câncer, em particular em momentos críticos como em um exame de diagnóstico, um diagnóstico o uma
recaída. A maioria dos pacientes com transtornos de ajustamento responde às técnicas de relaxamento e
doses baixas de ansiolíticos (20,21). Veja Transtornos de Ajustamento pelo DSM.IV (mais completo) e no
CID.10.

2. Transtornos do Pânico
Nos transtornos relacionados com o pânico, ansiedade intensa é também o sintoma predominante, ainda
que possam surgir sintomas somáticos muito expressivos. Estes sintomas incluem dispnéia, enjôo,
palpitações, tremores, náusea, coceiras, sensação de medo de descontrolar-se, desmaiar, passar mal ou
morrer. Os ataques de Pânico podem durar vários minutos ou horas. Os pacientes com ataques de Pânico
apresentam, inicialmente, sofrimento com sintomas que podem ser difíceis de diferenciar de outros
transtornos clínicos orgânicos. Nesses casos, o conhecimento de antecedentes de Transtorno de Pânico
pode ajudar esclarecer o diagnóstico. O pânico em pacientes com câncer se controla com maior
freqüência com antidepressivos (Razavi, Stiefel – 1994). Veja Ataque de Pânico pelo DSM.IV, Transtornos
de Pânico em PsiqWeb (mais completo) e na CID.10

3. Fobias
As fobias são medos persistentes e absurdos à objetos ou situações específicas que fazem com que a
pessoa os evite. As pessoas com fobias experimentam geralmente ansiedade intensa e evitam as
situações que potencialmente possam desencadear a crise fóbica, a qual é sempre acompanhada de
sintomas autossômicos (dos Sistema Nervos Autônomo). As fobias se apresentam nos pacientes com
câncer de varias maneiras; na forma de medo em ver sangre ou lesiones nos tecidos (também conhecido
como fobia à agulhas), medo fóbico médicos e dos procedimentos médicos, claustrofobia (por exemplo,
durante uma ressonância ou tomografia). Essas fobias podem complicar gravemente os procedimentos
médicos (Razavi, Stiefel – 1994). Veja Fobias pelo DSM.IV (mais completo) e na CID.10.

4. Transtornos Obsessivo-Compulsivos
Os Transtornos Obsessivo-Compulsivos se caracterizam por pensamentos, idéias ou imagens persistentes
(obsessões) e por ações repetitivas, com bons propósitos e intencionais (compulsões), realizadas pela
pessoa para controlar sua intensa ansiedade. Para satisfazer os requisitos de transtorno obsessivo-
compulsivo, os pensamentos obsessivos e comportamentos compulsivos devem tomar tanto tempo e
criar tal distração que dificultam o funcionamento ocupacional, escolar, social ou familiar normais. Os
pacientes com câncer que têm antecedentes de Transtornos Obsessivo-Compulsivos podem começar a
desenvolver comportamentos compulsivos como lavar as mãos, revisar todo várias vezes, contar e
recontar, a tal ponto que fica difícil até manejar seu tratamento médico.
Os pacientes normalmente são favorecidos a ter essa forma de ansiedade pelos traços de sua
personalidade prévia, normalmente do tipo anancástico ou obsessivo. Nesse caso, a preocupação acerca
do diagnóstico de câncer e seu prognóstico são os estressores necessários para o surgimento de
sintomas totalmente obsessivo-compulsivos. Os transtornos obsessivo-compulsivos com maior freqüência
se controlam com medicamentos antidepressivos serotonérgicos e com a clomipramina (tricíclico), além
da psicoterapia cognitivo-comportamental. Felizmente este transtorno é pouco comum em pacientes com
câncer que não tenham antecedentes pré-mórbidos. Veja Transtornos Obsessivo-Compulsivos pelo
DSM.IV, PsiqWeb (mais completo) e na CID.10.

5. Transtorno de Estresse Pós-Traumático


O Transtorno de Estresse Pós-Traumático se diagnostica quando uma pessoa volta a experimentar uma
emoção traumática com evocações, lembranças, sonhos, cenas retrospectivas, ou até alucinações
perturbadoras e intrusivas tempos depois da ocorrência de um acontecimento estressor.
Ainda que as definições de vivência traumática se centralizam nas experiências humanas, fora da gama
do normal (por exemplo, combates militares, torturas e desastres naturais), o diagnóstico de uma doença
potencialmente mortal tem agora um papel suficiente para ser considerada um importante agente
estressante traumático (DSM-IV). Além disso, a experiência da hospitalização e/ou do tratamento sofrível
também pode reativar memórias traumáticas.
Os pacientes com câncer que têm Transtorno de Estresse Pós-Traumático podem tornar-se muito
ansiosos antes de alguma cirurgia, antes da quimioterapia e dos procedimentos médicos. Os
medicamentos ansiolíticos favorecer o ajuste e reduzir angustia, entretanto, não existem medicamentos
que tenham demonstrado ser os mais eficazes sistematicamente para esse fim. A psicoterapia pode ser
um tratamento bastante eficaz. Veja Transtorno de Estresse Pós-Traumático pelo DSM.IV e na CID.10.

6. Transtornos de Ansiedade Generalizada


Os Transtornos da Ansiedade Generalizada se caracterizam por ansiedade contínua, pouco realista e
excessiva, há também uma preocupação excessiva acerca de diversas circunstâncias da vida. Alguns
pacientes acreditam que nada os curará nem ninguém os ajudará, mesmo estando recebendo adequado
apoio social.
Manifestam grande preocupação e medo de faltar dinheiro e não conseguirem nem custear as despesas
do tratamento, mesmo que tenham planos de saúde adequados e/ou cobertura financeira. Com
freqüência os Transtornos da Ansiedade Generalizada vêm precedidos por episódios de depressão grave.
Os Transtornos da Ansiedade Generalizada se caracterizam por tensão motora, excitação, tensão
muscular e fatiga fácil, hiperatividade autonômica do tipo dispnéia, palpitações, transpiração e enjôo,
sentimentos de nervosismo, irritabilidade e sobressaltos exagerados.
Veja Ataque de Pânico pelo DSM.IV, Transtornos de Pânico em PsiqWeb (mais completo) e na CID.10.

Transtornos da Ansiedade Causados por Outras Afecções Médicas Gerais


As causas de ansiedade em pacientes com câncer podem incluir outros fatores médicos, como por
exemplo a dor incontrolável, estados metabólicos anormais (por exemplo, hipercalcemia o hipoglicemia)
e tumores produtores de hormônios. Os pacientes com dor forte estão ansiosos e inquietos, e ansiedade
pode potenciar o dor. Para controlar adequadamente a dor, é fundamental tratar antes a ansiedade do
paciente (21,22).
Um ataque agudo de ansiedade pode ser precursor de alterações no estado metabólico ou de outra
ocorrência médica iminente, como é o caso do infarto do miocárdio, uma pneumonia, etc. A septicemia e
as anormalidades dos eletrólitos também podem causar sintomas da ansiedade. A ansiedade súbita com
dor no peito ou dificuldade respiratória pode indicar uma embolia pulmonar. Os pacientes hipóxicos
podem experimentar ansiedade, ou medo de que estão se asfixiando.

Quadro 1: Possíveis causas da ansiedade *


Problema médico Exemplos
Dor mal controlada Medicamentos para dor insuficientes ou prescrito só quando necessário
Estados metabólicos Hipóxia, embolia pulmonar, sépsis, delírio, hipoglicemia, hemorragia, oclusão
anormais coronária ou insuficiência cardíaca.
Tumores secretores de Feocromocitoma, adenoma o carcinoma tireóideo, adenoma paratireóideo, tumores
hormônios que produzem ACTH e insulinoma.
Medicamentos Corticoesteróides, neurolépticos usados como antieméticos, tiroxina,
produtores de broncodilatadores, estimulantes beta-adrenérgicos, antihistamínicos e
ansiedade benzodiazepínicos quando apresentam reações paradoxais em idosos.
Doenças produtoras de Síndrome de abstinência de sustâncias do tipo; álcool, analgésicos, narcóticos,
ansiedade sedativos e hipnóticos.
*Adaptado de: Massie MJ: Anxiety, panic and phobias. In Holland JC,
Rowland JH, eds., Handbook of Psychooncology: psychological care of the
patient with cancer. New York: Oxford University Press, 1989, pp. 300-309.

Muitos medicamentos também podem precipitar ansiedade. Os corticóides, por exemplo, podem produzir
excitação motora, nervosismo ou até euforia, assim como depressão e idéias de suicídio. Os
broncodilatadores e estimulantes dos receptores beta-adrenérgicos empregados para tratar doenças
respiratórias crônicas podem causar grande ansiedade, irritabilidade e tremores.
A acatisia, que é uma excitação motora acompanhada de sentimentos subjetivos de angústia, é um efeito
secundário relativamente comum dos neurolépticos. Na oncologia alguns neurolépticos (amplictil...)
costumam ser usados para controlar o vômito dos pacientes em quimioterapia.
Os tumores localizados em certos locais podem produzir sintomas que se assemelham aos transtornos da
ansiedade. É o caso, por exemplo, do feocromocitoma e dos microadenomas pituitários (Wilcox – 1991).
Os cânceres pancreáticos que não secretam hormônios podem causar sintomas da ansiedade. Os
tumores primários do pulmão e as metástases do pulmão podem causar dispnéia, a qual pode produzir à
ansiedade.

Ballone GJ - Ansiedade no Paciente com Câncer - in. PsiqWeb, Internet, disponível em


http://www.psiqweb.med.br/, revisto em 2005

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