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INTRODUÇÃO
EPIDEMIOLOGIA DO TOC
Prevalência
Foi a partir de estudos epidemiológicos mais bem desenhados que se
passou a ter uma ideia mais exata da incidência e prevalência do TOC em
diferentes populações. Um destes estudos de grande impacto ficou
conhecido como ECA - EpidemiologicCatchmentArea, e foi publicado em
1988.
Karno et al. (1988), durante 4 anos, avaliaram a prevalência do TOC em mais
de 18500 pessoas em cinco diferentes regiões dos Estados Unidos. Foi
verificada uma prevalência para toda a vida em média de 2,5% (1,9% a 3,3%)
e uma prevalência em 6 meses em média de 1,6% (0,7% a 2,2%) sem
considerar os critérios de exclusão do DSM III. Considerando-se estes
critérios a prevalência para toda a vida foi estimada em 1,7% (1,2% a 2,4%).
Essas taxas eram cerca de 30 a 60 vezes maiores do que o que se calculava
até então. Uma entrevista estruturada baseada nos critérios diagnósticos do
DSM III foi utilizada para avaliar os participantes, o DIS - Diagnostic Interview
Schedule.
Entretanto, muitas críticas foram feitas a este estudo, colocando em dúvida
sua validade. Ele falhou em avaliar cuidadosamente o grau de prejuízo
devido a sintomas psiquiátricos, desta forma possivelmente superestimando
a real prevalência de muitas doenças. Os entrevistadores não eram médicos
especialistas, mas leigos treinados, o que permitiu a ocorrência de
discrepâncias significativas no diagnóstico de TOC (Nelson e Rice, 1997;
Stein et al, 1997). De acordo com Nelson e Rice, menos de 20% (56 de 291
casos) dos casos identificados como indivíduos com TOC preencheram
critérios diagnósticos quando entrevistados um ano depois. Na reavaliação foi
verificado que em torno de 0.6% tinham TOC clínico e 0.6% sub-clínico
(prevalência para um mês).
Um estudo posterior multicêntrico, envolvendo mais de 40.000 indivíduos
em 7 países diferentes, verificou índices de prevalência bastante
homogêneos, com exceção de Taiwan. Abstraindo-se esta exceção, a
prevalência para o período de um ano nos demais países variou de 1.1% a
1.8%, e para toda vida de 1.9 a 2.5% (Weissmann et al., 1994). Estudo mais
recente desenvolvido nos Estados Unidos com 9282 adultos obteve
prevalência estimada similar, com 1.2% no último ano e 2.3% ao longo da
vida (Ruscio et al., 2010). Em 1992, foi realizado um estudo epidemiológico
sobre morbidade psiquiátrica em três grandes cidades do Brasil: Brasília, São
Paulo e Porto Alegre. Neste trabalho, foi verificada uma prevalência para o
TOC de 0,7 a 2,1% (Almeida Filho et al, 1992). O DSM-IV estima a
prevalência para toda a vida. ao redor de 2.5% e entre 1.5 a 2.1% a
prevalência para o período de um ano. As taxas apresentadas diferem
conforme a idade, com prevalências mais altas a partir da adolescência e
idade adulta.
Prevalência e gênero
Quanto à diferença de prevalência entre os sexos, na idade adulta o TOC
costuma aparecer em igualdade entre homens e mulheres, no entanto, em
relação ao início dos sintomas, ele ocorre mais precocemente nos homens.
Desta forma, a prevalência em crianças e adolescentes pode apresentar
números superiores em meninos (Del-Porto, 2001).
Outro problema é a demora dos pacientes em buscar ajuda.Um estudo
constatou uma demora de 17 anos entre o início dos sintomas e o início do
tratamento (Hollander, 1997). Em nosso meio um estudo verificou uma
demora de 23 anos em média (Cordioli 2003) e um outro, de mais de 18
anos (Miguel,2008). Esse atraso se deve em grande parte ao
desconhecimento da doença, à dificuldade por parte do próprio paciente, dos
seus familiares e inclusive dos profissionais da saúde em reconhecer os
sintomas do TOC.
Além disso, segundo a Organização Mundial da Saúde, o TOC é o quarto
transtorno psiquiátrico mais comum, precedido apenas pela depressão, fobia
social e abuso de substâncias. Nos casos mais graves da doença, esta
interferência pode levar à incapacitação. Em um estudo de Sobrecarga
Global das Doenças, o TOC aparece entre as dez maiores causas de
incapacitação no mundo, sendo responsável por 2.2% da incapacitação por
doenças em geral (Murray & Lopez, 1996).
Incidência
Curso e Prognóstico
Estudos sobre o TOC têm demonstrado que, para os adultos em tratamento,
o curso tende a ser crônico, com flutuações na intensidade dos sintomas, que
aparecem e desaparecem ao longo do tempo, sem sinais claros de remissão
ou deterioração (Rasmussen e Eisen,1992). Com 560 pacientes, o estudo de
Rasmussen e Eisen, 1988, identificou 85% de seus pacientes com curso
crônico e sintomas flutuantes, 10% apresentavam deterioração e apenas 2%
com curso episódico, consistindo de um curso com remissões que duravam
no mínimo 6 meses. Já Lensi et al.(1996) verificaram que 63.9% dos
pacientes tinham um curso crônico; 25.9% tinham um curso episódico e 9.1%
evoluíam para deterioração.
Mesmo com novos tratamentos disponíveis, a cronicidade e o alto índice de
refratariedade deste transtorno têm sido observados em diversos trabalhos e
(Leonard et al, 1993; Rasmussen e Eisen, 1997).
Num estudo prospectivo, 213 pacientes com TOC foram acompanhados
durante 5 anos, com avaliações anuais. Dentre os participantes, 22,1%
obtiveram remissão parcial dos sintomas, e 16,9% remissão completa. Menor
intensidade dos sintomas obsessivo-compulsivos e menor duração da
doença apareceram como preditores para a remissão (Eisen et al., 2013).
Outro estudo realizado com 100 pacientes apresentou números superiores,
atingindo 50% de remissão parcial e aproximadamente 20% de remissão
completa. Preditores significativos de remissão parcial foram o fato de ser
casado e ter uma severidade de sintomas menor no início. O uso adequado
de medicação serotonérgica esteve associado com um prognóstico pior,
assim como a presença de depressão, mas os autores consideram estes dois
achados espúrios (Steketee et al., 1999). Possivelmente os pacientes que
usavam medicamentos também fossem os mais graves.
O prognóstico de crianças e adolescentes em tratamento parece ser melhor.
Leonard et al. (1993) avaliaram 54 crianças e adolescentes depois de 2 a 7
anos após o início do tratamento com clomipramina e terapia
comportamental. Verificaram que apenas 10% destes permaneciam
inalterados ou em pior estado. Apenas 6 pacientes (11%) ficaram livres dos
sintomas, contudo 3 destes não estavam tomando nenhuma medicação.
Assim como outras doenças crônicas, os pacientes com TOC têm seu
sofrimento decorrente de mais do que apenas seus sintomas, pois sua
qualidade de vida é afetada. Apesar de não haver uma definição única de
"qualidade de vida" universalmente aceita, a qualidade de vida relacionada à
saúde é considerada como decorrente do funcionamento físico, do
desempenho de um papel social, das relações interpessoais, do bem-estar
mental, da compreensão da própria saúde e do grau de dor física.
Pesquisas desenvolvidas com indivíduos com TOC tem demonstrado que
estes apresentam escores de qualidade de vida mais baixo quando
comparados com outros grupos. Em relação a controles da comunidade, o
prejuízo costuma ser evidenciado em todos os domínios (Stengler-Wenzke et
al., 2006; Bobes et al., 2001; Eisen et al., 2006). Estudos comparando
pacientes com TOC a outros pacientes, como depressivos, dependentes de
heroína, esquizofrênicos e pacientes com doenças físicas, também apontam
prejuízo no grupo com TOC, no entanto isto nem sempre se reflete em todas
as dimensões da qualidade de vida (Stengler-Wenzke et al., 2006, Bobes et
al., 2001).
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