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E O PENSAMENTO PRÉ-SOCRÁTICO¹1
O modo como Friedrich Nietzsche entendeu a filosofia é algo que gera uma pluralidade de mal
entendidos neste nosso tempo pós-moderno. Enquanto filólogo, o autor pôde analisar os textos
antigos dos pensadores gregos pré-socráticos e por isso submergir na cultura helênica. Esta,
permeada pelo heroísmo mitológico, produziu os chamados phisiologoi, sábios que ousaram
produzir definições para a phisis. Tudo isto é deveras distinto da tradição filosófica iniciada após
Platão e a sua Academia. Deixemos que ele mesmo, Nietzsche, nos dê a sua descrição sobre aquelas
pessoas:
Há uma necessidade do pensamento, conforme pode ser percebido na citação, que coloca o
foco do leitor desses primeiros filósofos no seu ato de filosofar. Este é inerente ao modo de vida
daqueles gregos. Sobre o pensamento pré socrático, Leão afirma que “o destino histórico de seu
pensamento não provém da objetividade dos conhecimentos, mas do vigor do pensamento. Por isso
o caminho a seguir é o caminho de um diálogo a partir da própria coisa do pensamento” (LEÃO,
2017, P. 11). O filosofar nascente, portanto, que se espalha desde Tales, em Mileto, na atual Turquia,
até a Itália, é como que uma desinência da própria idiossincrasia daqueles pensadores. Conforme o
jovem Nietzsche escreve em um de seus primeiros livros:
O juízo desses filósofos acerca da vida e da existência em geral diz muito mais do que um
juízo moderno, pois tinham a vida em opulento acabamento diante de si, e porque entre eles
os sentimentos do pensador não se confundiam, como entre nós, na dicotomia entre o
desejo por liberdade, beleza e grandeza de vida e o impulso para a verdade, que pergunta
apenas: qual é, afinal, o valor da vida? (NIETZSCHE, 2011, p. 33).
Hoje, qualquer um se permite expressar seu desejo e seus mais diletos pensamentos: então,
também quero dizer o que hoje desejo de mim mesmo e qual o pensamento que este ano
passou primeiro pelo meu coração – qual o pensamento que deve ser, para mim, razão,
garantia e doçura de toda a vida que me resta! Quero aprender cada vez mais, ver o
necessário das coisas como sendo o belo – então, serei um daqueles que tornam das coisas
belas. Amor fati: daqui em diante será esse será o meu amor! Não quero travar uma guerra
contra o feio. Não quero reclamar, não quero nem mesmo reclamar dos que reclamam.
Desviar o olhar deles, será minha única negação! E, abrangendo tudo, em algum momento
ainda quero ser apenas alguém que sempre diz sim! (NIETZSCHE, 2016, p. 270).
A vida não é digna de avaliação, como disse Sócrates. A vida deve ser um critério de avaliação
a partir do qual é inescapável afirmá-la se se considera digno da grande saúde! Assim como na
Grécia dos pré-socráticos, a opulência da vida só pode ser afirmada em toda a sua assombrosidade
dos fenômenos, inclusive do eterno retorno. Ao invés de querer o nada como o cristianismo e a
racionalidade moderna treinam o homem para se manter conservado, a embriaguez vital e a vontade
de potência como superação da décadence ocidental.
BIBLIOGRAFIA
LEÃO, Emmanuel Carneiro. Os Pensadores Originários. Petrópolis: Vozes de Bolso, 2017.
NIETZSCHE, Friedrich. A Filosofia na Era Trágica dos Gregos. Porto Alegre: L&PM Editores,
2011.
NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Martin Claret, 2016.