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GESTÃO DO CONHECIMENTO

NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Prof. Neri dos Santos, Dr. Ing.
GESTÃO DO CONHECIMENTO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

AS LIÇÕES

Lição 1: Fundamentos Conceituais da Gestão do Conhecimento


Organizacional
Lição 2: Fundamentos Teórico-Metodológicos da Gestão do
Conhecimento Organizacional
Lição 3: Fundamentos Organizacionais da Gestão do Conhecimento
Lição 4: Fundamentos de um Programa de Gestão do Conhecimento
Organizacional
Lição 5: Implementação de um Programa de Gestão do Conhecimento
Organizacional
APRESENTAÇÃO

Este módulo tem como principal objetivo introduzir as bases conceituais-


metodológicas para a implantação de uma gestão pública baseada no
conhecimento. Para uma melhor compreensão, inicia-se o módulo com um
capítulo introdutório sobre os fundamentos da gestão do conhecimento,
apresentando as suas perspectivas no contexto de uma nova economia. Esta
introdução serve de base para os conceitos que serão ministrados nas duas
aulas seguintes, relativas ao conhecimento organizacional e à economia,
organização e trabalhador do conhecimento. Esses conceitos permitem a
compreensão da importância de três pontos fundamentais: as transformações
que estão ocorrendo na sociedade atual e que estão levando a humanidade da
era industrial para a era do conhecimento; os fatores decisivos que estão
provocando essas transformações e a evolução para a era do conhecimento.
Na sequência, discute-se como o conhecimento e seus ativos estão contidos
nos produtos de nosso dia a dia, o que são os ativos intangíveis de uma
determinada organização e como se processam os desdobramentos de sua
valorização no mercado. Na Aula 4, são apresentados os fundamentos
metodológicos que permitem a implementação de um processo de gestão
orientado pelo conhecimento.

Introduzidas as bases conceituais-metodológicas da gestão do


conhecimento, apresentam-se, na Aula 5, os processos gerenciais que
permitem a transformação do conhecimento tácito em conhecimento explícito,
e que são necessários para o crescimento individual e organizacional.

Espero que todos os alunos tenham um excelente aproveitamento deste


módulo e que levem para as suas vidas, pessoal e profissional, tudo o que for
possível compartilhar em termos de conhecimento, pois, diferentemente do
capital, o conhecimento cresce quando compartilhado.
AULA 1 - FUNDAMENTOS CONCEITUAIS DA GESTÃO DO
CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL

Objetivos

Ao final deste capítulo, os alunos deverão ser capazes de compreender os


seguintes pontos:

1. As transformações que estão levando a humanidade à era do


conhecimento;
2. Os fatores decisivos que estão provocando essas transformações;
3. O que é gestão do conhecimento;
4. As perspectivas da gestão do conhecimento.

1.1 AS TRANSFORMAÇÕES NA DIREÇÃO DA ERA DO CONHECIMENTO

O mundo atual passa por uma série de transformações. O momento


presente é um ponto de inflexão entre a era da certeza e do raciocínio lógico
(era industrial) e uma nova era caracterizada pela imprecisão, pelo futuro
desconhecido e pelo número infinito de possibilidades objetivas que se
apresentam (era do conhecimento). O que mais caracteriza este momento é a
sua complexidade dinâmica. Para Mariotti (1999), complexidade quer dizer
diversidade, convivência com o aleatório, com mudanças constantes e com
conflitos. É ter de lidar com tudo isso, mobilizando potenciais criadores e
transformadores. Este passa a ser então o novo papel das organizações:
mobilizar potenciais criadores e transformadores para sobreviverem a essa
complexidade e à imprevisibilidade do futuro.

Para que as organizações possam se preparar para enfrentar essa nova


realidade, é preciso, num primeiro momento, compreender melhor o que está
acontecendo. A compreensão do funcionamento do mundo dos negócios, em
todos os seus aspectos, é necessária para a tomada de decisões bem-
sucedidas. Os fatores ambientais, como as forças competitivas, regulamentos,
legislação e tendências socioeconômicas, constituem um ponto de partida para
decidir como organizar e gerenciar os fatores internos da organização, a
exemplo dos recursos humanos, infraestrutura, estrutura organizacional e
definição de estratégias.

Essas mudanças no mundo dos negócios vêm ocorrendo, de maneira


mais visível, desde o final da década de 1980 e, hoje, pode-se perceber uma
série de evidências empíricas irrefutáveis. A globalização, por exemplo, trouxe
para o dia a dia das empresas a abertura de mercados e a dura realidade da
concorrência global. As inovações tecnológicas revolucionaram todas as áreas,
mas, sem dúvida, os maiores avanços se deram na área das
telecomunicações, principalmente no que diz respeito às tecnologias de
informação e de comunicação. Os avanços nesta área imprimiram mudanças
consideráveis ao mundo dos negócios. A noção tradicional de tempo e espaço
foi ultrapassada de maneira tal que hoje, em segundos, grandes distâncias
podem ser eliminadas.

Segundo Hesselbein et al. (1997), essas transformações são tão


profundas que é possível afirmar que está havendo uma terceira revolução
industrial. Na verdade, pode-se chamá-la de revolução da informação. Esta era
pós-industrial passa de uma sociedade baseada na manufatura, para outra cujo
valor da informação, serviços, assistência e distribuição aumentou de maneira
inimaginável. Stewart (1998, p.11) lembra que até o Papa João Paulo II
reconheceu a crescente importância do know-how, da tecnologia e da
habilidade em sua encíclica Centesimus Annus, de 1991, ao escrever: “Se
antes a terra, e depois o capital, eram os fatores decisivos da produção [...]
hoje o fator decisivo é cada vez mais o homem em si, ou seja, seu
conhecimento”. O autor ressalta que o poder da força muscular, o poder das
máquinas e até o poder da eletricidade estão sendo constantemente
substituídos pelo poder do cérebro. Para Oliveira (1992), esta é a era da
economia do saber: ganha a guerra quem sabe mais, quem sabe aprender, e
quem aprende mais depressa. Isto se aplica aos indivíduos, às organizações e
aos países.
1.2 OS FATORES DECISIVOS DAS TRANSFORMAÇÕES

A era do conhecimento pode ser caracterizada por três fatores decisivos,


que são o conhecimento e os relacionamentos, internos e externos, à
organização, e não mais o capital, os recursos naturais ou mão de obra.
Stewart (1998, p.XIII), em seu livro Capital Intelectual, já em seu prefácio afirma
que o capital intelectual, baseado sobretudo no conhecimento, é hoje mais
importante que os ativos aos quais as empresas se habituaram. Segundo ele,

[...] ao contrário dos ativos tangíveis, com os quais empresários e


contadores estão familiarizados (propriedade, fábricas, equipamento,
dinheiro...), o capital intelectual é intangível. É o conhecimento da
força de trabalho: a competência e a intuição de uma equipe, [...] ou
o know-how dos trabalhadores [...]. É a rede eletrônica que
transporta a informação na empresa à velocidade da luz, permitindo
reagir ao mercado mais rápido que seus rivais. É a cooperação – o
aprendizado compartilhado – entre uma empresa e seus clientes que
forja uma ligação entre eles, trazendo com muita frequência o cliente
de volta.

O autor resume tudo isso em uma frase: “O capital intelectual constitui a


matéria intelectual – conhecimento, informação, propriedade intelectual,
experiência – que pode ser utilizada para gerar riqueza”.

Hoje em dia, empresas baseadas no conhecimento valem muito mais


do que seus ativos podem representar. Algumas empresas valem de três a
quatro vezes mais. Este gap entre os ativos da empresa e seu valor real só
pode ser explicado pelos ativos intelectuais. Um exemplo bem representativo
dessa realidade é a Microsoft, cujo maior patrimônio sem dúvida nenhuma é
o conhecimento armazenado e o potencial de seus funcionários. É interessante
que, quando uma empresa tem um histórico de sucesso, ela vale tanto pelo
que já conquistou como pelo que seus funcionários ainda poderão produzir.
Sem dúvida, a gestão desse potencial não é um processo simples, mas é um
dos desafios com os quais as empresas deste novo século terão que aprender
a lidar.

As organizações vencedoras neste século XXI serão aquelas que


conseguirem acúmulo de saber, ou seja, a participação de muitos, o empenho
coletivo, a capacidade das pessoas envolvidas de se relacionarem umas com
as outras, dentro de uma linguagem comum, de esforço conjunto (DRUCKER
apud HOWARD, 2000). Este novo “ativo” tem uma particularidade muito
interessante: se antes o capital era guardado para aumentar a riqueza de seu
proprietário, hoje ele deve ser compartilhado, porque o conhecimento
compartilhado cresce, enquanto o conhecimento não utilizado torna-se
obsoleto e perde seu valor.

Isso não significa que o objetivo das organizações tenha mudado. A


obtenção de lucros e a maximização do capital continuam sendo a razão de
existir das organizações, ou, pelo menos, da sua maioria. Arie de Geus (1998)
concorda e afirma que isso justifica o interesse pelo aprendizado
organizacional que tem emergido nos últimos anos. O autor argumenta que, a
menos que as empresas consigam acelerar o ritmo em que aprendem, seu
principal ativo ficará estagnado e seus concorrentes passarão a sua frente. O
aprendizado, a informação e o conhecimento são “bens” muito mais
democráticos, embora sejam hoje fatores de diferenciação estratégicos entre
as empresas. Oliveira (1992) lembra que a maior dificuldade encontrada pelas
empresas para negociar com o capital do saber é ter de expor seus problemas
e compartilhar a própria ignorância, inclusive com concorrentes, clientes e
fornecedores. Isso pode ser uma barreira ao aprendizado para muitas
empresas, mas é preciso definir estratégias para superar qualquer dificuldade
que possa existir e fomentar o processo de aprendizado contínuo.

Levy (1998) afirma que a força das nações, regiões, empresas e


indivíduos para prosperar é conferida pela ótima gestão do conhecimento, seja
técnico, científico, da ordem de comunicação ou derive da relação ética com o
outro. “Quanto melhor os grupos humanos conseguem se constituir em
coletivos inteligentes, em sujeitos cognitivos, abertos, capazes de iniciativa, de
imaginação e de reação rápida, melhor asseguram seu sucesso no ambiente
altamente competitivo que é o nosso.” (LEVY, 1988, p.19).

Neste sentido, é importante que as organizações desenvolvam uma


postura voltada para o aprendizado, desenvolvendo seus princípios, filosofia,
perfil de seus funcionários, infraestrutura e estrutura organizacional de modo a
maximizar seu processo de aprendizagem. O foco deve estar na aquisição,
armazenagem, processamento e, sobretudo, na disseminação e uso da
informação e do conhecimento.

1.3 O QUE É GESTÃO DO CONHECIMENTO: TENTATIVAS DE


DEFINIÇÃO

Gestão do Conhecimento é um conceito difícil de ser definido com


precisão e simplicidade. Todavia, procuraremos mostrar a seguir uma série de
tentativas de definição, formuladas por diversos autores.

Segundo Ann Macintosh (1997), ativos de conhecimento são o


conhecimento de mercados, produtos, tecnologias e organizações que uma
empresa tem ou precisa ter e que possibilita a seus processos de negócio
gerar lucros, conquistar clientes, agregar valor etc... Gestão do conhecimento
não trata apenas de gerir ativos de conhecimento, mas também de gerir os
processos que atuam sobre estes ativos. Tais processos incluem: desenvolver,
preservar, utilizar e compartilhar conhecimento. Por isso, gestão do
conhecimento envolve identificação e análise dos ativos de conhecimento
disponíveis, e desejáveis, além dos processos com eles relacionados. Também
envolve o planejamento e o controle das ações para desenvolvê-los (os ativos
e os processos), com o intuito de atingir os objetivos da organização.

Para Rebbecca Barclay e Philip Murray (1997), gestão do conhecimento


é uma atividade de negócios com dois aspectos básicos:

 tratar o componente de conhecimento das atividades de negócios


explicitamente como um fator de negócios refletido na estratégia,
política e prática em todos os níveis da empresa;

 estabelecer uma ligação direta entre as bases intelectuais da


empresa – explícitas (codificada) e tácitas (know-how pessoal) – e
os resultados alcançados.

Na prática, gestão do conhecimento engloba as seguintes etapas:

 identificar e mapear os ativos intelectuais ligadas à empresa;


 gerar novos conhecimentos para oferecer vantagens competitivas
no mercado;

 tornar acessíveis grandes quantidades de informação corporativa,


compartilhando as melhores práticas e a tecnologia que torna
possível tudo isso – incluindo groupwares e intranets. Isto engloba
muita coisa e deveria tornar-se parte integrante da maioria dos
negócios.

Segundo Denhan Grey (1997), gestão do conhecimento inclui a auditoria


dos “ativos intelectuais” que focaliza fontes, funções críticas e potenciais
gargalos que possam impedir o fluxo normal do conhecimento. Também está
incluído o desenvolvimento da cultura e dos sistemas de apoio que protegem
os ativos intelectuais da deterioração e procuram oportunidades para aprimorar
decisões, serviços e produtos através da inteligência e da agregação de valor e
de flexibilidade. Ela vem complementar e realçar outras iniciativas na empresa
(como a TQM - Total Quality Management e BPR - Business Process
Reengineering) e está no centro do aprendizado de uma organização,
suprindo-a de ideias que avancem e a sustentem numa posição competitiva.

A definição de gestão do conhecimento pode ser melhor entendida se


reexaminarmos os conceitos de ativos intangíveis, introduzidos por Karl Erik
Sveiby (1995). Segundo este autor, todos os ativos e estruturas
organizacionais, sejam elas tangíveis ou intangíveis, são resultantes da
atividade humana. De fato, o resultado das ações das pessoas, no meio
ambiente, pode ser tangível (cultivar jardins, conduzir um carro etc...) ou
intangível (ter ideias, estabelecer relacionamentos com outras pessoas etc...).
Neste sentido, pode-se dizer que as pessoas criam estruturas externas e
internas para se expressarem no meio ambiente em que estão inseridas. Por
outro lado, assim como as pessoas, as empresas também criam estruturas
externas e internas. Além disso, como as pessoas têm capacidade de agir
numa grande variedade de situações, quando estão desenvolvendo uma
atividade de trabalho, dentro de uma organização, elas aumentam o seu valor.
Por isso, a competência humana é, também, um ativo intangível.
Pode-se dizer, então, que são três as famílias de ativos intangíveis que
deveriam ser incluídas na folha de balanço de uma empresa: estruturas
externas, estruturas internas e a competência dos funcionários.

 Estrutura externa: diz respeito ao cliente, relações com os


fornecedores e imagem da empresa;

 Estrutura interna: inclui patentes, conceitos, modelos, programas


de computadores e sistemas de administração que são parte da
empresa;

 A competência dos funcionários refere-se a sua capacidade de


ação em situações distintas.

A partir dos trabalhos de Sveiby e seus colaboradores, Edvinsson &


Malone (1997) elaboraram uma teoria para tratar os ativos intangíveis,
classificados em três categorias: capital do cliente, capital estrutural e capital
humano. No início dos anos 1990, a teoria tornou-se conhecida pelo trabalho
da companhia de seguros sueca SKANDIA.

Já que capital é um termo da era industrial e o mundo está entrando na


era do conhecimento, utilizaremos, neste curso, a designação
relacionamentos externos no lugar de capital do cliente; relacionamentos
internos em vez de capital estrutural; e competência individual no lugar de
capital humano. Deixaremos as outras designações para a literatura de
aeroporto, que não tem maiores compromissos acadêmicos. A razão para esta
nova terminologia advém do fato de que o conhecimento, em alguns aspectos,
é o oposto do capital, porque o conhecimento compartilhado cresce, enquanto
o conhecimento não utilizado se deteriora.

De fato, o conhecimento cresce ao ser compartilhado e utilizado. Quando


doamos um dólar a alguém, este alguém ganha o dólar, mas nós o perdemos.
Quando transferimos conhecimento a alguém, este alguém ganha, mas nós
continuamos com ele também e, neste caso, há uma ampliação do
conhecimento. Na verdade, o conhecimento é duplicado. Estamos
acostumados com a depreciação dos ativos tangíveis, como carros,
computadores e eletrodomésticos, à medida que eles são utilizados. Ao
contrário, se um ativo intangível não é utilizado (como, por exemplo, a
habilidade de falar um outro idioma) ele se deteriora. De fato, o conhecimento
perde seu valor quando não é utilizado. Se as empresas são constituídas de
mais ativos intangíveis do que tangíveis, então os intangíveis constituem um
fator determinante para a economia das empresas.

Conforme Sveiby (1985), gestão do conhecimento é a arte de criar valor


alavancando os ativos intangíveis. Para conseguir isso, é preciso que os
gerentes consigam visualizar as organizações apenas em termos de
conhecimento e fluxos de conhecimento.

Essa é uma concepção bem diferente do paradigma da era industrial,


porque a fábrica da era industrial criava valor a partir de bens materiais,
movimentando-os dos fornecedores para a fábrica e desta para os clientes. A
agregação de valor se dava pela adição de recursos como energia e mão de
obra.

As empresas que vemos hoje, incluindo companhias como a INTEL,


criam valor não a partir de recursos físicos, mas da inteligência e da
competência das pessoas, assim como dos relacionamentos entre elas e seus
clientes. Por isso, esta era clama por uma reformatação na gestão que focalize
mais as relações e os fluxos desses ativos intangíveis.

Segundo a empresa de consultoria Ernst & Young (1998), a gestão do


conhecimento baseia-se nos seguintes pontos:

1) na premissa de que o conhecimento é a capacidade para criar


laços mais estreitos com os clientes;

2) na capacidade para analisar informações corporativas e atribuir-


lhes novos usos;

3) na capacidade para criar processos que habilitem seus


funcionários, em qualquer local, a acessar e utilizar informações
para conquistar novos mercados;

4) finalmente, na capacidade para desenvolver e distribuir produtos e


serviços para esses novos mercados de forma mais rápida e
eficiente do que os concorrentes.
Aliado aos processos de gestão do conhecimento e suas ferramentas, é
importante que haja transformações culturais e iniciativas gerenciais com o
intuito de obter, cultivar, transferir e renovar o conhecimento que as
organizações precisam para tomar melhores decisões e com maior rapidez.
Sem esta base não haverá incentivo, em todos os níveis da organização, para
as pessoas compartilharem e capitalizarem seus ativos de conhecimento.

1.4 AS PERSPECTIVAS DA GESTÃO DO CONHECIMENTO

Neste início de século XXI uma nova era está surgindo para a
humanidade, uma era baseada no conhecimento e nos relacionamentos das
pessoas, a qual irá afetar todos os aspectos da nossa vida, tanto do ponto de
vista individual como organizacional. No aspecto organizacional, antigas
verdades e crenças não são mais aplicáveis nesta nova realidade. A ênfase
agora é na gestão dos ativos intangíveis, que são os que mais agregam valor à
organização. Por outro lado, o desenvolvimento das novas tecnologias de
informação e de comunicação, o aparecimento de uma geração de novos
produtos inteligentes e de trabalhadores do conhecimento, estão fazendo com
que a gestão do conhecimento seja um imperativo integrante de qualquer
negócio.

Atualmente, um número significativo de iniciativas de sucesso está


surgindo em gestão do conhecimento, algumas enfatizando as estratégias e
aspectos culturais, outras ressaltando a tecnologia de apoio, e outras, ainda,
tentando combinar as duas ênfases em uma única abordagem, mais
sistemática. Do ponto de vista da implementação, muitas começaram com
projetos-piloto ou iniciativas confinadas e apenas algumas procuraram
implementar soluções completas para toda a organização. O real poder da
gestão do conhecimento está apenas começando a se manifestar e, sem
dúvida, muito mais está para ser visto nos próximos anos.

A gestão do conhecimento está surgindo como uma nova disciplina e,


seguramente, vai levar algum tempo até que tenhamos uma disciplina científica
totalmente estruturada, em termos conceituais e metodológicos. Da mesma
forma, levará algum tempo até que tenhamos a aceitação geral para acessar e
avaliar, objetivamente, como essa disciplina e seus processos contribuirão para
a competitividade organizacional.
AULA 2 - FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA GESTÃO DO
CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL

Objetivos

Ao final deste capítulo os alunos deverão ser capazes de compreender os


seguintes pontos:

1. As bases epistemológicas do conhecimento organizacional;


2. As bases teóricas do conhecimento organizacional;
3. O que é uma organização do conhecimento e quais são os seus principais
ativos;
4. As diferenças fundamentais entre dados, informações, conhecimento e
competência;
5. A classificação da competência;
6. As competências organizacionais;
7. A identificação das competências.

2.1 AS BASES EPISTEMOLÓGICAS DO CONHECIMENTO


ORGANIZACIONAL

Segundo Nonaka e Takeuchi (1997), conhecimento organizacional é a


capacidade de uma empresa de criar um novo conhecimento, difundi-lo na
organização como um todo e incorporá-lo a produtos, serviços e sistemas.

O estudo dos fundamentos filosóficos do conhecimento é conhecido


como epistemologia. Assim, iniciaremos este capítulo apresentando uma breve
fundamentação sobre as bases epistemológicas do conhecimento
organizacional.

Primeiramente, daremos uma definição prévia de conhecimento e


informação, com base no conceito exposto pelo dicionário Webster.

Conhecimento é definido como “fatos, verdades ou princípios adquiridos


a partir de estudo ou investigação; aprendizado prático de uma arte ou
habilidade; a soma do que já é conhecido com o que ainda pode ser
aprendido”.

Informação, que é sempre confundida com conhecimento, é definida


como “notícia ou inteligência transmitidas por palavras ou na forma escrita;
fatos ou dados”.
A partir dessas definições, pode-se dizer que, da mesma forma que
chapas de aço são insumos para a fabricação de automóveis na indústria
automobilística, informação é a matéria-prima para a criação do conhecimento
na organização do conhecimento. Por exemplo, um conjunto de coordenadas
da posição de um avião é uma informação. A habilidade para utilizar essas
coordenadas e o mapa de navegação na definição de uma rota é um
conhecimento. Assim, as coordenadas e o mapa são as “matérias-primas” para
se planejar a rota do avião.

Quando se diferencia informação de conhecimento é importante


ressaltar que a informação pode ser encontrada em uma variedade de objetos
inanimados, desde um livro até um disquete de computador, enquanto o
conhecimento só é encontrado em seres humanos. De acordo com Richard
Crawford (1994), conhecimento é entendimento e expertise.

Nesse sentido, pode-se afirmar que conhecimento é a capacidade de


aplicar a informação a uma atividade de trabalho ou a um resultado específico.
A informação torna-se inútil sem o conhecimento do ser humano para aplicá-la
de forma produtiva.

Da mesma forma, pode-se considerar conhecimento como uma forma de


ativo. O Webster define ativo como “qualquer forma de riqueza empregada com
o objetivo de se produzir mais riqueza”. Por exemplo, a habilidade de um
engenheiro e sua formação, em nível de graduação ou pós-graduação, gera
riqueza na forma de elevados rendimentos, de tal forma que o conhecimento
em engenharia, também, pode ser tomado como um ativo intelectual. Assim, a
competência de um engenheiro pode ser considerada um ativo na forma
humana, daí a designação equivocada que alguns autores utilizam como
capital humano.

O Webster define tecnologia como “a aplicação do conhecimento no


trabalho”. O desenvolvimento do conhecimento é um pré-requisito para o
desenvolvimento de tecnologia. Uma taxa mais elevada de desenvolvimento de
novos conhecimentos é a base para uma taxa mais elevada de
desenvolvimento de novas tecnologias.
Richard Crawford (1994) apresenta quatro características do
conhecimento e da informação que fazem desses recursos únicos e criam uma
nova economia:

1) O conhecimento é difundível e se autorreproduz: As matérias-


primas de uma economia industrial são recursos finitos. Por exemplo, o
minério de ferro vai chegar ao fim à medida que se produz o aço. Ao
contrário do minério de ferro, o conhecimento expande-se e aumenta à
medida que é utilizado. Quando utilizamos nossos conhecimentos para
desempenhar uma tarefa, aprimoramos nossos conhecimentos,
entendemos mais profundamente a tarefa. A título de exemplo, um cirurgião
plástico que há cinco anos realiza os sonhos de centenas de mulheres é
mais experiente e especializado neste tipo de operação do que um cirurgião
que só a realizou duas vezes. Dessa forma, em uma economia do
conhecimento a escassez de recursos é substituída pela expansão dos
mesmos;

2) O conhecimento é substituível: Ele pode substituir os fatores


tradicionais de produção como a terra, trabalho e capital. Por exemplo, um
fazendeiro que consegue uma melhor colheita em uma mesma gleba de
terra, utilizando apenas novas técnicas agrícolas de plantio, pode aumentar
sua produção sem aumentar a área plantada, sem mais trabalho braçal e
sem gastar mais capital;

3) O conhecimento é transportável: Na sociedade digital atual, o


conhecimento move-se na velocidade da luz. Em poucos segundos,
podemos enviar para o Canadá, via fax ou e-mail, um esquema para um
novo serviço de investimentos futuros que representa meses de um
intensivo trabalho de economia financeira;

4) O conhecimento é compartilhável: A transferência de


conhecimento para outras pessoas não impede o uso deste mesmo
conhecimento por seu original detentor. Dividir conhecimento sobre serviços
com outros bancos internacionais não irá comprometer o fornecimento
deste mesmo serviço no mercado interno.
Nesse sentido, salienta-se como se cria um diferencial competitivo a
partir do talento das pessoas. De fato, sendo o conhecimento (relação entre o
conceito e a realidade prática) gerado a partir da informação, por meio da
aplicação de modelos mentais e processos de aprendizagem das pessoas, e a
tecnologia o resultado da ação da imaginação, intuição e criatividade dessas
mesmas pessoas, associados às ferramentas das ciências e das engenharias,
sobre esse mesmo conhecimento, pode-se, em um determinado mercado,
transformar tecnologia (aplicação sistemática da ciência e de todos os
conhecimentos organizados a tarefas práticas) em inovação diretamente
associada ao que conhecemos como competitividade.

Atuando na viabilização dos efeitos benéficos da construção dessa


competitividade no mercado, ou na tarefa primária de assimilação da
informação, o capital intelectual das organizações representa os dois maiores
fatores de competitividade contemporânea: conhecimento e inovação.

Sendo o conhecimento o elo que compõe a cadeia de valor


indispensável à inovação tecnológica, esta disciplina se propõe a iniciar um
processo de formação de profissionais aptos a desenvolverem atividades de
gestão do conhecimento em suas organizações, visto que hoje é exigida a
multiplicidade de conhecimentos quanto aos cenários e tendências globais, em
termos de tecnologias de gestão.

2.2 AS BASES TEÓRICO-METODOLÓGICAS DA GESTÃO DO


CONHECIMENTO

A Gestão do Conhecimento tem bases teórico-metodológicas em várias


disciplinas. Contudo, os conjuntos de conhecimentos atualmente disponíveis
ainda não são suficientes para sustentar uma disciplina científica bem
estruturada e consistente sobre este assunto. Neste sentido, é fundamental
conhecermos quais disciplinas e suas respectivas contribuições estão
formando o arcabouço teórico-metodológico desta nova área de conhecimento.
2.2.1 Gestão do Conhecimento: uma Área Interdisciplinar

A gestão do conhecimento utiliza conceitos, modelos, métodos e


técnicas, desenvolvidos por várias disciplinas, compondo um crescente corpo
de conhecimentos que, passo a passo, estão formando as bases teórico-
metodológicas de uma disciplina científica. Dentre essas disciplinas, podemos
citar: as ciências cognitivas, da educação, da informação, da administração e
organizacionais, assim como as tecnologias de gestão, informação e de
comunicação.

As ciências cognitivas, particularmente a psicologia, a ergonomia e a


engenharia cognitiva, são disciplinas em plena emergência, cujo objetivo geral
é melhorar a performance global dos sistemas humanos-máquinas que
encontramos, por exemplo, em salas de controle (de centrais de produção
elétrica, de refinarias de petróleo, de navios, de trens, de metrô etc...) e em
cabines de pilotagem (aviões, helicópteros). Neste sentido, os estudos e
pesquisas realizadas nessas áreas trabalham com a essência do conhecimento
e da aprendizagem, permitindo um melhor entendimento e compreensão sobre
o comportamento humano, sobretudo em situações de risco. Os resultados
dessas pesquisas têm sido rapidamente incorporados pela gestão do
conhecimento. Da mesma forma, as ciências organizacionais e da
administração vêm desenvolvendo estudos e pesquisas sobre aprendizagem
organizacional, gestão de mudanças, melhores práticas, reengenharia de
processos, gestão de gerenciamento de riscos, benchmarking, gestão de times
e gestão por competências. Os resultados dessas pesquisas também têm
contribuído, de forma significativa, para o avanço da gestão do conhecimento.

Enfim, a informação é a matéria-prima para a criação do conhecimento


e, como tal, as ciências da educação e da informação suprem o referencial
teórico para lidar com os aspectos pedagógicos de sua coleta, tratamento e
transmissão, dentro de um ambiente organizacional, assim como com a mídia
da gestão do conhecimento. As tecnologias de informação e de comunicação
viabilizam a implantação de sistemas de gestão do conhecimento, baseados
em métodos e técnicas da engenharia de sistemas. Uma rápida leitura sobre
sistemas comerciais ou proprietários de apoio à gestão do conhecimento
mostra que grande parte dos componentes baseia-se em tecnologias ligadas à
inteligência artificial, trabalho em equipes apoiado por computador, bibliotecas
digitais, sistemas de apoio a decisão, redes semânticas, bases de dados
relacionais orientados a objetos e a eventos, intranets, portais corporativos,
dentre outras.

2.2.2 Relação da Gestão do Conhecimento com Outras Disciplinas

À medida que lemos mais sobre gestão do conhecimento e suas


aplicações, constatamos relações evidentes com outras disciplinas de gestão
mais conhecidas, como, por exemplo: aprendizagem organizacional, gestão de
mudanças, melhores práticas, reengenharia de processos, gestão de
gerenciamento de riscos, benchmarking, gestão de times e gestão por
competências.

A linha comum entre essas disciplinas e a gestão do conhecimento é o


reconhecimento de que informação e conhecimento são ativos corporativos
que exigem ferramentas apropriadas para gerenciá-los, pois não é possível
gerenciar o novo com as ferramentas do velho. De fato, as ferramentas
gerenciais da economia industrial, baseadas na lógica taylorista-fordista da
produção, não são compatíveis com as exigências da economia do
conhecimento.

2.2.3 Classificação das Abordagens da Gestão do Conhecimento

Na tentativa de categorizar as diferentes abordagens metodológicas


sobre gestão do conhecimento, Rebecca Barclay & Philip Murray (1997)
adotaram uma classificação em três grupos:

1. Abordagens mecanicistas ou tecnocêntricas

São abordagens centradas na aplicação de tecnologias e de recursos


computacionais, com o objetivo de se fazer mais e melhor o que já se fazia
antes. As principais hipóteses desta abordagem, que devem ser relacionadas
aos sintomas do problema, são as seguintes:
- deve-se focalizar na melhor acessibilidade da informação, sustentada por
melhores métodos de acesso e nas facilidades para
reciclagem/reutilização de documentos (hipertexto, bancos de dados etc.);

- deve-se investir na utilização de tecnologia da rede, pois as intranets e


groupwares são prováveis soluções-chave.

Em geral, supõe-se que a tecnologia e a disponibilização de grandes


volumes de informação serão suficientes para garantir o sucesso da
implantação de um sistema de gestão do conhecimento. Tais abordagens são
relativamente fáceis de ser implementadas porque muitas das tecnologias e
técnicas são familiares e de fácil compreensão para a maioria das pessoas da
organização. Como o acesso de ativos intelectuais corporativos é vital, em
princípio, esta abordagem deve gerar alguma melhoria.

Todavia, é importante salientar que apenas a disponibilização de


montanhas de informação não garante um impacto substancial no desempenho
dos negócios. Neste caso, a menos que a abordagem de gestão do
conhecimento incorpore métodos de alavancagem da experiência acumulada
na organização, o resultado final pode não ser o esperado. De fato, a
tecnologia deve ser considerada como um meio para facilitar o relacionamento
das pessoas e não o contrário.

2. Abordagens culturais/comportamentais ou sociológicas

Tais abordagens, com raízes profundas na psicossociologia das


organizações, enfatiza, sobretudo, a reengenharia de processos, a gestão de
mudanças e a aprendizagem organizacional, tendendo para uma visão
gerencial de “problema do conhecimento”. De fato, elas tendem a se concentrar
mais na inovação e na criatividade (a “organização que aprende”) do que na
alavancagem dos recursos existentes ou na explicitação do conhecimento
implícito. As principais hipóteses destas abordagens são as seguintes:

 Comportamento e cultura organizacionais precisam ser modificados


porque, em ambientes intensivos em informação, as organizações
desenvolvem disfuncionalidades em relação a seus objetivos de
negócio;
 Tecnologia e métodos tradicionais são considerados incapazes de
resolver o “problema do conhecimento” e uma visão holística é
trazida à tona (são frequentemente invocadas teorias do
comportamento de grandes sistemas);
 O que importa é o processo, não a tecnologia;
 Nada acontece ou muda a menos que os gerentes o façam
acontecer.

É quase certo que fatores culturais que afetam as transformações


organizacionais têm sido subavaliados e as abordagens culturais/
comportamentais têm mostrado alguns benefícios.

Entretanto, a relação causa-efeito entre estratégia cultural e os


benefícios para a empresa não é clara porque ainda não se pode fazer
previsões confiáveis a respeito dos sistemas, tão complexos quanto as
empresas que fazem uso intensivo do conhecimento. Os resultados positivos
alcançados por esta estratégia podem não ser sustentáveis, mensuráveis,
cumulativos ou reaplicáveis e, também, pode haver alto nível de resistência por
parte dos funcionários.

3. Abordagens sistemáticas ou antropocêntricas

As abordagens sistemáticas para a gestão do conhecimento retêm a


tradicional fé na análise racional do problema do conhecimento: o problema
pode ser resolvido, mas são necessárias novas maneiras de pensar. As
hipóteses básicas destas abordagens são as seguintes:

 O que importa são os resultados sustentáveis, não o processo ou a


tecnologia, nem mesmo a sua definição de conhecimento;
 Um recurso não pode ser utilizado se não for devidamente modelado.
Contudo, pode-se evidenciar que muitos aspectos do conhecimento
corporativo são passíveis de ser modelados como um recurso
explícito;
 As soluções podem ser encontradas em diversas tecnologias e
disciplinas, e os métodos tradicionais de análise podem ser utilizados
para reexaminar a natureza do trabalho do conhecimento e para
resolver o problema do conhecimento;
 Questões culturais são importantes, mas também devem ser
avaliadas de forma sistemática. As pessoas podem ou não ter que se
“transformar”, mas, com certeza, a política e as práticas de trabalho
devem mudar, e pode-se aplicar tecnologia aos próprios problemas
de gestão do conhecimento com bastante sucesso;
 Gestão do conhecimento contém uma componente importante de
gerenciamento, mas não é uma atividade ou disciplina que pertença
exclusivamente aos gerentes.

Salientamos que, dentre as abordagens apresentadas, optaremos pelas


abordagens sistemáticas da gestão do conhecimento, porque elas representam
as vertentes mais promissoras para obtenção de impacto cumulativo,
sustentabilidade e possibilidades de mensuração e avaliação de desempenho
organizacional.

2.3 DADOS, INFORMAÇÃO, CONHECIMENTO E COMPETÊNCIA

Frequentemente, os termos ‘dados’, ‘informações’, ‘conhecimento’ e


‘inteligência’ são utilizados como sinônimos. Todavia, é fundamental
estabelecer uma diferenciação clara a respeito dos mesmos, a partir da
definição formalizada por diversos autores, utilizada como referência nesta
disciplina.

2.3.1 Dos Dados ao Conhecimento

Segundo Davenport (1996), dado é um conjunto de fatos distintos e


objetivos, relativos a eventos. Em um contexto organizacional, dados são
descritos apenas como registros estruturados de transações. Em contrapartida,
segundo o mesmo autor, informações são dados que fazem a diferença. Isto é,
informar é dar forma aos dados.

Drucker (199?) salienta que informações são dados dotados de


relevância e propósito. Esta definição sugere que dados, por si sós, têm pouca
relevância e importância no contexto organizacional. De fato, a matéria-prima
para apoiar a tomada de decisão do ser humano, em qualquer atividade de
trabalho, é a informação. Neste sentido, toda organização deve aprender a
transformar os dados disponíveis em informações dotadas de significado e
importância.

Ainda, segundo Davenport (1996), existem cinco maneiras de


transformar dados em informação:

1) Contextualização: saber qual é a finalidade dos dados coletados,


inseri-los em um contexto;

2) Categorização: conhecer as unidades de análise ou os


componentes essenciais dos dados, fazer uma classificação;

3) Cálculo: alguns dados podem ser analisados matemática ou


estatisticamente; desta forma, é importante utilizar ferramentas
para descrevê-los e explorá-los no sentido de se concluir algum
significado;

4) Correção: os erros devem ser eliminados dos dados;

5) Condensação: os dados podem ser resumidos para uma forma


mais concisa, fazendo-se esquemas para mostrar também a
existência de relacionamentos entre eles.

Sintetizando, pode-se dizer que o processo de transformação de dados


em informação é um processo de entendimento de relações, isto é, de
correlação de dados.

Por outro lado, salienta-se também que as informações têm uma


importância limitada. Hesselbein et al. (1997) reforçam que a informação, por si
só, não leva a organização a novas conquistas. Eles lembram que o aumento
do número de informações disponíveis não leva, necessariamente, a melhores
decisões. Deve-se observar que, assim como a falta de informação é
prejudicial ao processo de tomada de decisão, o excesso de informação é um
fator complicador. A diversidade e a complexidade das informações exigem da
organização e, sobretudo, de seus recursos humanos um potencial e um
esforço ainda maiores para acertarem em sua utilização.
Finalmente, para Davenport (1996), conhecimento é uma mistura fluída
de experiência condensada, valores, informação contextualizada e insight
experimentado, a qual proporciona uma estrutura para avaliação e
incorporação de novas experiências e informações. Ele tem origem e é
aplicado na mente dos conhecedores. Nas organizações, costuma estar
embutido não só em documentos ou repositórios, mas também em rotinas,
processos, práticas e normas organizacionais.

De fato, o conhecimento é resultado do potencial humano, com todas as


suas nuances e diversidades. O conhecimento implica experiências, valores,
criatividade, e só existe nas pessoas. Afinal, por que o conhecimento tem
recebido tanta importância? A resposta é simples: porque é o conhecimento
das pessoas que as leva a resolver problemas, tomar decisões, definir
estratégias, melhorar tarefas e processos, desenvolver novos produtos,
desenvolver coisas inovadoras e criativas etc...

Conforme Richard Crawford (1994, p.21),

quando você diferencia informação de conhecimento é muito


importante ressaltar que informação pode ser encontrada em uma
variedade de objetos inanimados, desde um livro até um disquete
de computador, enquanto o conhecimento só é encontrado com os
seres humanos [...]. Conhecimento é a capacidade de aplicar a
informação a um trabalho ou a um resultado específico. Somente
os seres humanos são capazes de aplicar desta forma a
informação através de seu cérebro ou de suas habilidosas mãos.

Da mesma forma, Nonaka & Takeuchi (1997) salientam que o


conhecimento é algo realmente intrínseco ao ser humano. Segundo esses
autores, o conhecimento diz respeito a crenças e compromissos, está
relacionado à ação (tem finalidade) e seu significado é específico ao contexto.
Concluem que é um processo humano dinâmico de justificar a crença pessoal
com relação à verdade.

2.3.2 Na Direção da Competência Individual

Sveiby (1998) considera que a competência de um indivíduo está


baseada em cinco elementos mutuamente dependentes:
1) Conhecimento explícito: o conhecimento explícito envolve
conhecimento de fatos e é adquirido principalmente pelo texto, quase
sempre pela educação formal;

2) Habilidade: a arte de saber fazer é a habilidade que envolve uma


proficiência prática – física e mental – e é adquirida sobretudo por
treinamento e condicionamento. Inclui o conhecimento de regras de
procedimento e habilidades de comunicação. Os tipos de habilidades
utilizadas pelos gerentes em suas ações no âmbito das atividades de
administração estratégica são: técnicas, humanas e conceituais
(LEITÃO, 1995). Mais à frente, quando focalizarmos as habilidades
organizacionais, será possível perceber a interdependência entre essas
habilidades;

3) Experiência: a experiência é adquirida principalmente pela


reflexão sobre erros e sucessos passados;

4) Julgamento de valor: os julgamentos de valor são percepções do


que o indivíduo acredita estar certo. Eles agem como filtros conscientes
e inconscientes para o processo de saber de cada indivíduo;

5) Relacionamento social: a rede social é formada pelas relações do


indivíduo com outros seres humanos dentro de um ambiente e uma
cultura transmitidos pela tradição.

Ao percorrermos a direção entre a competência e a perícia, observamos


que na medida em que, além da capacidade de enumerar e aplicar regras, o
profissional possui a segurança de quebrá-las e substituí-las por regras
melhores, estamos diante de um especialista. Entretanto, esse caminho passa
pelo aprendizado de toda a estrutura de regras, pela revisão de regras
pessoais de procedimento com base nas realizações de outras pessoas,
tornando-se, então, capaz de modificá-las.

Segundo Sveiby (1998), a transferência de capacidades entre pessoas é


difícil, mas não impossível. Todavia, é praticamente impossível transferir
perícia. Esta deve ser edificada pelo próprio indivíduo. Assim, como a
competência constitui a base de cada um dos três ativos intangíveis que vimos,
os multiespecialistas são os principais participantes da organização do
conhecimento, uma vez que competitividade e competência são indispensáveis
na nova economia.

Segundo Richard (1990), “o ser humano pode ser comparado a um


manipulador de símbolos, inteligente e flexível, que busca informações e trata
de assimilá-las ativamente, de modo a ajustá-las às suas estruturas cognitivas”.
Para este autor, existem basicamente duas formas de aquisição de
conhecimentos:

a) A aprendizagem pela descoberta: diz respeito às aquisições


feitas no decurso da realização de tarefas, não somente de
execução, mas também de resolução de problemas, produzindo
principalmente conhecimentos procedurais, do tipo tácito (saber-
fazer);

b) A aprendizagem pelo texto: diz respeito à aquisição de


conhecimentos a partir de informações simbólicas vinculadas aos
textos, produzindo sobretudo conhecimentos declarativos, do tipo
explícito (saber).

2.3.3 Da Competência Individual à Competência Organizacional

Competência é utilizada na língua portuguesa para designar aptidão,


habilidade, saber, conhecimento e idoneidade. Na língua inglesa, o uso é
semelhante. Segundo o dicionário Webster (1981), competência é a “qualidade
ou estado de ser funcionalmente adequado ou ter suficiente conhecimento,
julgamento, habilidades ou força para determinada atividade”.

McLagan (2000) destaca que, nas organizações, a palavra ‘competência’


expressa vários sentidos, alguns característicos dos indivíduos, ou seja,
conhecimentos, habilidades e atitudes, e outros das tarefas, resultados.

O que concede personalidade ao conceito forte e moderno de


competência é a ideia subjacente de resultado. São as ideias claras de saber
fazer, saber aplicar, saber agir, saber resolver, em suma, um saber
operacionalizado que implica resultados. Portanto, competência é a
transformação de conhecimentos, aptidões, habilidades, interesse, vontade,
obtendo-se resultados práticos (RESENDE, 2000, p.32).

A fórmula mais corrente para se definir as capacidades – saber-ser,


saberes-sociais, capacidades de se comunicar, representações – consiste em
justapor a palavra “saber” a uma ação ou a um verbo de ação (STROOBANTS
apud ROPÉ e TAUGUY, 2001, p.141).

Henri Pestalozzi, um pedagogo suíço, idealizou a educação como o


desenvolvimento natural, espontâneo e harmônico de todas as capacidades
(inteligências) humanas, que se revelam nas atividades da cabeça, das mãos e
do coração (head, hand e heart), isto é, na vida intelectual, psicomotora e moral
do indivíduo.

Bloom et al. (1973 e 1979) desenvolveram uma classificação de


objetivos educacionais baseada em três domínios:

1) Cognitivo (objetivos vinculados à memória e ao desenvolvimento


de capacidades intelectuais);

2) Afetivo (objetivos que descrevem mudanças de interesses,


atitudes e valores);

3) Psicomotor (objetivos relacionados ao desenvolvimento de


habilidades manipulativas ou motoras).

Por outro lado, Gagné et al. (1988) classificaram os objetivos


educacionais em cinco categorias, de acordo com as capacidades humanas a
serem desenvolvidas:

 Habilidades intelectuais;

 Estratégias cognitivas;

 Conhecimento ou informação verbal;

 Habilidades motoras;

 Atitudes.

Durand (1998 e 1999), usando das prerrogativas de Pestalozzi, construiu


o conceito de competência com base em três dimensões: conhecimento,
habilidade e atitude. Estas dimensões englobam questões técnicas, bem
como a cognição e a atitude relacionadas ao trabalho. Desse modo, a
competência relaciona-se ao conjunto de conhecimentos, habilidades e
atitudes interdependentes e necessárias à consecução de determinado
propósito.

Este autor acrescenta, ainda, que o desenvolvimento de competências


ocorre por meio da aprendizagem individual e coletiva, envolvendo as três
dimensões do modelo, ou seja, pela assimilação de conhecimentos, pela
integração de habilidades e pela adoção de atitudes relevantes para um
contexto organizacional específico ou para a obtenção de alto desempenho
num ambiente acadêmico ou empresarial.

A figura 1 elucida o conceito de competência postulado por Durand,


enfocando o caráter de interdependência e complementaridade entre as
dimensões do modelo (conhecimentos, habilidades e atitudes), além da
necessidade de aplicação conjunta dessas dimensões no âmbito de um
objetivo qualquer.

Figura 1 - As Três Dimensões da Competência, segundo Durand (1999)

Informação
CONHECIMENTOS :
Saber o que e por
que fazer

COMPETÊNCI
A

HABILIDADES:
Atitudes:
Técnica

Destreza Interesse

Saber como fazer Determinação

Querer fazer
Conforme Durand (1999), a dimensão conhecimento corresponde a
uma série de informações assimiladas e estruturadas pelo indivíduo, que lhe
permitem “entender o mundo”, ou seja, saber o que a pessoa acumulou ao
longo da vida. Essa dimensão do modelo proposto por Durand faz parte do que
Bloom et al. (1979), em sua taxonomia de objetivos educacionais,
denominaram de domínio cognitivo. Para esses autores, conhecimento é algo
relacionado à lembrança de ideias ou fenômenos, alguma coisa registrada ou
acumulada na mente da pessoa. Da mesma forma, Gagné et al. (1988), ao
classificarem, também, objetivos instrucionais, fazem referência ao
conhecimento como estruturas de informações ou proposições armazenadas
na memória do indivíduo.

A dimensão habilidade está relacionada ao saber como fazer algo


(GAGNÉ et al., 1988) ou à capacidade de aplicar e fazer uso produtivo do
conhecimento adquirido, ou seja, de instaurar informações e utilizá-las em uma
ação, visando atingir um propósito específico (DURAND, 1999).

Segundo Bloom et al. (1979), a definição operacional mais comum sobre


habilidade é a de que o indivíduo pode buscar em suas experiências anteriores
informações, sejam elas de fatos ou princípios, e técnicas apropriadas para
examinar e solucionar um problema qualquer. As habilidades podem ser
classificadas como intelectuais, quando abrangem essencialmente processos
mentais de organização e reorganização de informações – por exemplo, em
uma conversação ou na realização de uma operação matemática –, e como
motoras ou manipulativas, quando pressupuserem uma coordenação
neuromuscular, como na realização de um desenho ou na escrita a lápis, por
exemplo (BLOOM et al., 1979; GAGNÉ et al., 1988).

A atitude, terceira dimensão da competência, diz respeito a aspectos


sociais e afetivos relacionados às atividades de trabalho. Gagné et al. (1988)
comentam que atitudes são estados complexos do ser humano que afetam o
comportamento, em relação às pessoas, coisas e eventos, determinando a
escolha de um curso de ação pessoal. Segundo esses autores, as pessoas têm
preferência por alguns tipos de atividades e mostram interesse por certos
eventos mais que por outros. O efeito da atitude é justamente ampliar a reação
positiva ou negativa de uma pessoa, ou seja, sua predisposição em relação à
adoção de uma ação específica. Esta última dimensão do conceito de
competência sugerido por Durand (1999) faz parte do que Bloom et al. (1973),
em sua taxonomia de objetivos educacionais, denominaram domínio afetivo, ou
seja, aquele relacionado a um sentimento, uma emoção ou a um grau de
aceitação ou rejeição da pessoa em relação aos outros, a objetos ou a
situações.

2.4 A CLASSIFICAÇÃO DE COMPETÊNCIA

A pluralidade de definições e de aplicações e o desenvolvimento muito


rápido do tema sugerem uma classificação para diferentes conceitos e tipos de
competências, proporcionando um aprendizado mais ágil e organizado. A
classificação proposta por Resende (2000, p.57-61), ainda que muito
abrangente, não deve ser considerada como completa, porém nela estão todos
os atributos, requisitos e fatores que podem ser incluídos no conceito mais
amplo de competência.

2.4.1 Classificação quanto ao Domínio e Aplicação

1) Pessoas potencialmente competentes: desenvolveram e possuem


características, atributos e requisitos tais como conhecimentos,
habilidades, habilitações, mas não conseguem aplicá-los objetivamente
na prática, ou não tiveram a oportunidade de mostrar resultados nas
ações e em seus trabalhos. Por exemplo: uma pessoa que aprende o
idioma estrangeiro, mas não consegue trabalho que demande aplicação
desse conhecimento;

2) Pessoas efetivamente competentes: são as que aplicam essas


características, atributos e requisitos e mostram claramente resultados
satisfatórios. Exemplo: um mecânico de automóvel que identifica e
resolve rapidamente os problemas apresentados no veículo.
2.4.2 As Diversas Categorias de Competência

1) Competências técnicas: de domínio de alguns especialistas. Exemplo:


saber como dirigir carretas conforme o tipo de carga – competência
específica de motoristas de transporte de carga;

2) Competências intelectuais: competências relacionadas com aplicação


de aptidões mentais. Exemplos: ter presença de espírito; ter capacidade
de percepção e discernimento das situações;

3) Competências cognitivas: competência que é um nicho de capacidade


intelectual com domínio de conhecimento. Exemplos: saber lidar com
conceitos e teorias; saber generalizações; saber aplicar terminologia e
elaborar classificações;

4) Competências relacionais: competências que envolvem


habilidades práticas de relações e interações. Exemplos: saber
relacionar-se em diversos níveis; saber interagir com diferentes
áreas;

5) Competências sociais e políticas: competências que envolvem


simultaneamente relações e participações em sociedade. Exemplos:
saber manter relações e convivências com pessoas, grupos,
associações; saber exercer influência em grupos sociais para
objetivos de interesses de associações, comunidades e
regiões;

6) Competências didático-pedagógicas: competências voltadas para


educação e ensino. Exemplos: saber ensinar e treinar obtendo resultado
de aprendizagem; saber tornar interessantes as apresentações; saber
planejar aulas de acordo com preceitos pedagógicos;

7) Competências metodológicas: competências na aplicação de


técnicas e meios de organização de atividades e trabalhos.
Exemplos: saber organizar o trabalho da equipe; saber definir
roteiros e fluxos de serviços; saber elaborar normas de
procedimentos;
8) Competências de lideranças: são competências que reúnem
habilidades pessoais e conhecimentos de técnicas de influenciar e
conduzir pessoas para diversos fins ou objetivos na vida profissional ou
social. Exemplos: saber obter adesão para causas filantrópicas; saber
organizar e conduzir grupos comunitários;

9) Competências empresariais e organizacionais: são as competências


aplicadas a diferentes objetivos e formas de organização e gestão
empresarial. Pode-se classificá-las das seguintes maneiras:

a) Core competencies ou competências essenciais: são


competências de gestão empresarial, comuns a todas as áreas ou a
um conjunto delas. Exemplos: competência estratégica, competência
logística;

b) Competências de gestão: são competências específicas do nível


gerencial, de áreas ou atividades-fins e de apoio das empresas.
Exemplos: competência de gestão de pessoas; competência de
gestão da qualidade;

c) Competências gerenciais: são capacitações mais específicas da


competência de gestão, compreendendo habilidades pessoais e
conhecimentos de técnicas de administração ou gerenciamento, de
aplicação em situações de direção, coordenação ou supervisão.
Exemplos: capacidade de conduzir reuniões produtivas de trabalho,
saber administrar, convergir ações para resultados comuns;

d) Competências requeridas pelos cargos: são as competências


gerais e específicas requeridas aos ocupantes dos diversos cargos
da empresa. Exemplos: saber dimensionar peças (inspetores,
técnicos ou mecânicos de manutenção), saber classificar
documentos contábeis (auxiliar de tesouraria).
2.5 AS COMPETÊNCIAS ORGANIZACIONAIS

A introdução de medidas de gestão por competência nas organizações


agrega ingredientes de melhoria de desempenho e resultados a outros
programas. Focar as competências é dar consistência às qualificações e
capacitações das pessoas e áreas e conferir mais sentido de resultados aos
planos e às ações (RESENDE, 2000, p.151). As competências organizacionais
são formadas pelo conjunto de conhecimentos, habilidades, tecnologias e
comportamentos que uma organização possui e consegue manifestar de forma
integrada na sua atuação, provocando impacto no seu desempenho e
contribuindo para os resultados (NISEMBAUM, 2000, p.35). Segundo este
autor, tais competências podem ser classificadas em:

1) Básicas - são os pré-requisitos que a empresa precisa ter para


administrar com eficácia. Representam as condições necessárias,
porém insuficientes, para que a organização atinja a liderança e a
vantagem competitiva no mercado;

2) Essenciais - são aquelas que possuem valor percebido pelos clientes,


não podem ser facilmente imitadas pela concorrência e contribuem para
a capacidade de expansão da organização.

Zarafian (1999) sustenta que não se pode desprezar a dimensão de toda


a equipe no processo produtivo. Em função disso, propõe cinco diferentes
competências numa organização, conforme quadro 1.

Quadro 1 - As Cinco Diferentes Competências na Organização, segundo


Zarifian (2000)

1) Competências sobre processos: os conhecimentos sobre o processo de


trabalho;
2) Competências técnicas: conhecimentos específicos sobre o trabalho que
deve ser realizado;
3) Competências sobre a organização: saber organizar os fluxos de
trabalho;
4) Competências de serviço: aliar a competência técnica à seguinte
pergunta: qual o impacto que este produto ou serviço terá sobre o
consumidor final?;
5) Competências sociais: saber ser, incluindo atitudes que sustentem o
comportamento das pessoas. O autor identifica três domínios dessas
competências: autonomia, responsabilização e comunicação.

NOTA: Adaptado pelo autor.

2.6 A IDENTIFICAÇÃO DAS COMPETÊNCIAS

Para Nisembaum (2000, p.38), realizar benchmarking de uma empresa


em relação aos seus concorrentes é importante, pois fornece elementos
objetivos para avaliar o seu posicionamento e não superestimar/subestimar as
capacidades da empresa. O autor sugere que uma competência essencial só
pode ser entendida como um conceito dinâmico e em permanente mudança.

Na mesma linha de orientação, Sparrow e Bognanno (1994)


estabelecem a classificação das competências sob a forma dinâmica, conforme
a sua relevância e a influência das inovações tecnológicas. Assim, as
competências estão inseridas num ciclo de relevância ao longo do tempo,
classificadas conforme segue:

1) Emergentes: competências que não eram relevantes até então, mas


que a orientação estratégica da organização ou o desenvolvimento
tecnológico enfatizarão em um futuro próximo. Exemplos: domínio de
idiomas estrangeiros, capacidade de navegar na internet e
autogerenciamento da carreira profissional;

2) Declinantes: competências que constituíram parte da empresa num


passado recente, mas que se tornarão cada vez menos importantes,
devido a mudanças na estratégia ou na tecnologia. Exemplos:
capacidade de datilografar e de exercer controle burocrático;

3) Estáveis ou essenciais: competências fundamentais para o


funcionamento da organização, que permanecem relevantes ao longo do
tempo. Exemplos: raciocínio lógico e capacitações ligadas ao negócio da
empresa;
4) Transitórias: competências que, embora essenciais em momentos
críticos de transição, não estão diretamente relacionadas ao negócio da
organização. Exemplos: capacidade de conviver com a incerteza,
administrar o estresse e trabalhar sob pressão.

Nisembaum (2000, p.39) afirma que é importante poder diferenciar as


competências essenciais das não essenciais. Identificando as essenciais, a
empresa consegue focar a atenção nos elementos que contribuem para o
seu sucesso competitivo em longo prazo.

Como as competências são instrumentos fundamentais para o


desenvolvimento de uma organização, Nisembaum (2000, p.101) sugere
diferentes meios para sua identificação. Pode ser através de um modelo de
questionário para auxiliar as chefias na definição de seu momento atual e
nas competências em que terão de se aprofundar, ou, ainda, na
estruturação de cada competência por níveis de atuação. Todavia, destaca
o autor, os fatores mais importantes dizem respeito a como tais
competências são identificadas, atentando-se para que não surjam de uma
lista genérica, mas sim das contribuições esperadas nas posições
avaliadas. Seguindo tais premissas, Nisembaum (2000, p.104-105) propõe
um modelo flexível de competências com foco estratégico:

1) analisar toda informação pertinente ao trabalho, a ser revista à luz do


Modelo de Performance definido;
2) desenvolver as premissas para o presente e o futuro dos trabalhos
em análise com relação à aspiração estratégica da empresa e às
competências essenciais definidas anteriormente;
3) juntar toda a informação disponível em relação aos trabalhos a
definir;
4) desenvolver o conjunto de resultados dos trabalhos, podendo incluir
os critérios de qualidade (indicadores) para cada resultado;
5) construir o conjunto de competências individuais/específicas
relacionadas com os trabalhos analisados, que, por sua vez, dão
sustentação às competências essenciais, e estabelecer indicadores
de desempenho para cada competência;
6) determinar o conjunto de papéis relacionados aos trabalhos em
análise através de uma avaliação dos resultados obtidos;
7) construir um ou mais modelos genéricos de competências de
trabalho;
8) apresentar os resultados do projeto, verificando sua integração aos
demais sistemas de recursos humanos.

Ienaga (1998) sugere um modelo que tem como etapa inicial o


mapeamento da lacuna (gap) de competências da empresa, ou seja, a
identificação, a partir da intenção estratégica da organização, da discrepância
entre as competências necessárias à consecução de seus objetivos e as
competências internas disponíveis na organização. A figura 2 ilustra este
processo, onde a linha ascendente representa as competências necessárias à
consecução dos objetivos organizacionais (definidas a partir da intenção
estratégica da empresa), enquanto a linha descendente representa as
competências internas disponíveis na organização. À diferença ou discrepância
entre as duas linhas Ienaga denominou de lacuna de competências. O autor
explica que, na ausência de ações que minimizem eventual lacuna de
competências, há uma tendência natural de crescimento da lacuna, ao longo
do tempo, seja em razão da obsolescência das competências que a empresa
possui, seja como decorrência de um aumento da complexidade do ambiente
externo, que exige da organização a detenção de novas competências.

Figura 2 - Identificação da Lacuna (gap) de Competências, segundo


Ienaga (1998)

Visão Dinâmica

Competências
Necessárias

Gap1
Competências
Atuais

Tempo

Para concluir, Resende (2000, p.154) aponta que a identificação e


definição de competências essenciais deve levar em conta os fatores de
sucesso com relação aos seguintes aspectos:

1) diferencial e renovação da tecnologia;

2) características e dificuldades da manutenção de clientes;

3) importância, para o negócio, das relações com os fornecedores;

4) adaptabilidade às condições de mercado;

5) logística de distribuição;

6) eficiência ou precisão operacional;

7) importância da função do marketing;

8) importância estratégica do fator humano.


AULA 3 - FUNDAMENTOS ORGANIZACIONAIS DA GESTÃO DO
CONHECIMENTO

Objetivos
Ao concluir este capítulo o aluno deverá ser capaz de compreender os
seguintes pontos:

1. A mudança dos paradigmas na transição da era industrial para a era do


conhecimento;
2. O que é focalizado na comercialização de bens por uma empresa do
conhecimento;
3. As mudanças no gerenciamento de profissionais do conhecimento: mais
cérebro e menos mão de obra;
4. Os elementos que compõem a competência profissional.

3.1 A ECONOMIA DO CONHECIMENTO

A economia da era do conhecimento estabelece por premissa as novas


fontes de riqueza que são o conhecimento e os relacionamentos, e não mais os
recursos naturais, o trabalho físico ou o capital. Essa nova era está surgindo
em meio a uma grande revolução, fruto de forças poderosas e incontornáveis:
as forças da globalização e do desenvolvimento tecnológico. A abertura de
mercado trouxe atrelado um aumento significativo de concorrentes que, ao lado
da disseminação das tecnologias de informação e de comunicação, têm
contribuído para a destruição de parcela significativa do emprego, tal como o
conhecemos na era industrial. Não se trata mais apenas de máquinas que
fazem o trabalho de dezenas ou mesmo centenas de seres humanos; trata-se
dos ativos intangíveis – um software, por exemplo –, que geram produtos e
serviços que podem não ter realidade física, mas cujo conteúdo é o mais
refinado dos produtos: o conhecimento.

Segundo Stewart (1998), a globalização, a informatização, a


desintermediação econômica e a intangibilização estão relacionadas e
profundamente associadas às mudanças pelas quais a sociedade e as
empresas estão passando, cuja escala e consequências são comparáveis à
Revolução Industrial. Naquela ocasião, há 150 anos, viveu-se um movimento
que em muitos aspectos é contrário ao que hoje estamos submetidos. De
forma oposta ao que se deu naquela época, hoje o trabalho vem rapidamente
abandonando os grandes contingentes, com tarefas no mesmo lugar e ao
mesmo tempo para gerar bens ou serviços. O número de “operários”
provavelmente aumentou. Entretanto, estão espalhados pelo mundo, muitos
trabalhando em horários opostos, às vezes até sem sair de casa. O abandono
da maneira industrial de ver o mundo significará em breve apenas a lembrança
de conceitos fortemente impostos pela era industrial: o apito da fábrica, o
chefe, o gerente, o trabalho das 8 às 18h...

A criatividade, palavra-chave do ano 2000 (ORTIZ, 1998), certamente


será a responsável pela consolidação de um nicho de mercado no qual
especialmente as mulheres1, por privilegiarem os relacionamentos em
detrimento do poder, tão almejados pelos homens, e por entenderem a gestão
do conhecimento como uma disciplina que mescla importantes áreas como a
psicologia, a pedagogia, a ciência da informação e a administração, construirão
os avançados modelos mentais responsáveis pela geração de conhecimento,
a partir da informação.

Mesmo na Revolução Industrial, ideias e conhecimentos foram


importantes no seu desenvolvimento, tanto que inventores e invenções são
citados com frequência como atores dessa época. Entretanto, a ideia mais
importante foi o acúmulo de capital e, em consequência, de exclusão social. O
investimento em expansão se deu paralelamente ao realizado em transporte,
fazendo com que clientes cada vez mais distantes se tornassem consumidores
de seus produtos.

As guerras que no passado eram ganhas nas fábricas de uma economia


de produção em massa (1940/50) passaram a ser perdidas por falta de
competitividade industrial (1970/75). O início do fim da era industrial começou a
partir da inteligente apropriação da tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e
engenharia, por parte de empresas que acordavam enquanto dormíamos – o
capital se deprecia com o uso, mas o conhecimento se valoriza (SVEIBY,
1998).

1
Ver Frankenberg (1998).
O exemplo que vem dos Estados Unidos é uma sinalização da realidade
mundial a ser constatada em breve: a força de trabalho na indústria, que era
em 1950 de 34% dos empregos, caiu para 16% hoje; destes, 1/3 trabalha com
informação, como mostra a figura 3.

Figura 3 - Emprego como Porcentagem da Força Total de Mão de Obra


nos Estados Unidos (segundo Quinn, 1996)

A realidade de nossos dias nos obriga a reinventar, com criatividade, os


negócios, a vida econômica, uma nova sociedade. Tal como há 150 anos, a
revolução da informação irá transfigurar e desfigurar tudo o que e como
conhecemos hoje. A economia do conhecimento já nasceu e está crescendo.

O conhecimento é, portanto, o principal ingrediente que produzimos,


fazemos, compramos e vendemos. Administrá-lo e gerenciá-lo tornaram-se
atividades econômicas de extrema importância para indivíduos, empresas e
países. A obstinação em encontrar, estimular, armazenar, vender e
compartilhar o conhecimento não é mais algo incomum. A capacidade mental
está em toda parte, com intensidade e proximidade nunca vistas antes. Ao
contrário da terra, do petróleo e do ferro, a informação e o conhecimento, além
de não serem produtos intrinsecamente escassos, crescem quando são
compartilhados. Uma economia baseada no conhecimento e na informação
possui recursos ilimitados (SVEIBY, 1998).

Segundo Quinn (1996), a causa básica desta grande transformação


econômica é a emergência do intelecto e da tecnologia – sobretudo em
serviços – como bens altamente alavancáveis. Eles estão contribuindo na
germinação de conceitos novos de estratégia e organização, tanto no setor de
serviços como na indústria.

As máquinas são um bom exemplo de como o “conteúdo em


conhecimento” vem sendo incorporado aos bens e serviços de nosso dia a dia.
O peso do primeiro computador pessoal lançado no mercado em 1981
totalizava 20 kg. Hoje um notebook pesa menos que o teclado desse
computador (1 kg) e possui um “cérebro” cerca de 500 vezes maior. Ao
estender esta constatação às máquinas operatrizes, constata-se que a
incorporação dos microprocessadores tornou-as tão ágeis, versáteis e
compactas como conhecemos. Assim, a comparação entre um torno
convencional e um torno de controle numérico representa bem o potencial que
o conhecimento é capaz de produzir. Outro exemplo está na calça jeans – 4 de
cada 5 dólares gastos na sua produção vão para a informação, considerando
os processos totalmente automatizados. Esta mesma informação já responde
por ¾ do valor agregado nas indústrias têxteis. O moderno Boeing 777 possui
mais computadores (três) do que motores (dois). A componente informação no
custo da exploração e extração de petróleo responde por mais de 50%. A parte
eletrônica de um carro custa mais do que o aço que compõe sua carroceria.
Este mesmo aço, o principal produto manufaturado do século passado,
necessitava de três a quatro horas/homem de trabalho para gerar uma
tonelada de produto. Hoje, a sofisticação computacional reduziu este tempo
para 45 minutos. De forma espantosa, o ser humano vem substituindo seu
esforço físico por conhecimento.

Estamos assistindo à desmaterialização da era industrial, que impõe


uma profunda revisão dos conceitos em termos de tecnologia de produto e
processo. A introdução, cada vez maior, de conhecimento nos serviços é
também uma realidade, cuja convivência deve possibilitar a todos agregar valor
às atividades executadas.

O crescimento do tráfego via internet vem aumentando acima de 30% ao


ano, o que representa o incremento da quantidade de dados transmitida. A
atividade de transporte realizada pelas empresas aéreas é pouco lucrativa. São
seus setores de informação sobre voos que geram os maiores lucros. Um
exemplo está sendo dado pela companhia aérea GOL. Os negócios diários no
mundo movimentam diariamente cerca de US$ 1,300,000,000,000.00, cada
vez menos como moeda – ativo fixo, tangível –, cada vez mais como uma
imagem – intangível.

Se atentarmos para os alimentos, muitos exemplos poderiam ser


traduzidos em abordagem semelhante. As atividades de PD&E da EMBRAPA,
por exemplo, promoveram um aumento de produtividade na cultura de milho
por hectare, em relação aos anos 20, de cerca de cinco vezes – 80% de uma
espiga de milho hoje é conhecimento.

A redução da importância da velha economia é inevitável. Entretanto, ela


não morrerá. As latas de cerveja serão ainda, por algum tempo, necessárias.
Mas esta revolução nos trará novas formas de trabalho e prosperidade.

Nossa única certeza, como em toda revolução, será a surpresa. Novas


habilidades, novos tipos de organizações e de gerenciamento serão
indispensáveis para a sobrevivência na economia do conhecimento.

3.2 ORGANIZAÇÃO DO CONHECIMENTO E SEUS PRINCIPAIS ATIVOS

Segundo Sveiby (1998), para enxergar uma organização do


conhecimento os executivos devem procurar ver as organizações como se elas
fossem constituídas de estruturas de conhecimento e não de capital.

De fato, analise uma lata de cerveja. Avalie o que ela simboliza. É


certamente uma representação do trabalho industrial, uma evolução
tecnológica magnífica da substituição do aço pelo alumínio. Mas é só isso?
Com toda a certeza, não. Segundo Stewart (1998), uma lata de cerveja é muito
mais: ela simboliza uma nova economia baseada no conhecimento, um
indicativo de como o conhecimento tornou-se o componente mais importante
da atividade de negócios. Se nos detivermos a observar como esse evento
acontece, começaremos a entender uma extraordinária transformação de uma
estrutura que ocorre radical e violentamente — uma revolução.

O aço era a matéria-prima dessa lata há quarenta anos. A sua


substituição pelo alumínio é, desde 1855, uma missão dos seus fabricantes. A
partir da década de 1950, produzir latas de alumínio transformou-se num nicho
de mercado óbvio, apesar das dificuldades técnicas. Mesmo com uma redução
no custo da energia, insumo indispensável à sua produção, seu refinamento
era ainda extremamente dispendioso, tornando-o mais caro que o aço. O
diferencial competitivo que se constituiu na base da vitória do alumínio sobre o
aço foi sua maior maleabilidade, permitindo a fabricação de latas utilizando
menos metal. No final dos anos 1960, a Coca-Cola e a Pepsi-Cola começaram
a usar latas de alumínio – o triunfo do know-how sobre a natureza. Metade do
peso da lata de aço (matéria-prima) foi substituída por conhecimento.

Na realidade, 35 anos após a primeira lata ter sido fabricada, os


investimentos em capacidade intelectual conseguiram fazer com que uma lata
de cerveja vazia pesasse apenas 14 gramas, cerca de ¾ do peso original —
menos material e mais ciência, 25% dela é conhecimento. A elevada proporção
do alumínio que é reciclado, outro ponto de ação do conhecimento (ao menos 3
em cada 4 latas de alumínio são recicladas no Brasil), deve-se a uma
tecnologia que consome apenas 5% da energia necessária à produção de uma
folha laminada, se comparada ao processamento de matérias-primas virgens.
Com mais cérebros têm-se a mesma quantidade de cerveja com menos
material e energia. O fato de podermos amassá-la com a mão, quando vazia,
contrasta com sua autossustentabilidade quando cheia e empilhada até alturas
de 2 metros, além de poder ir a quase 0C ou aguentar sol de 40C. Sua
rigidez e autossustentação no empilhamento são produzidas pelo gás do seu
interior – dióxido de carbono ou nitrogênio. Menor quantidade de metal, menor
consumo de energia, sua rigidez mantida por algo que não vemos: “o talismã
do operário da era industrial tornou-se um ícone da era do conhecimento, a
economia do intangível” (STEWART, 1988).
Agora, cerca de um século e meio após a aparição pública do metal
alumínio, surgem os primeiros exemplares de latas de papel. Em quanto tempo
estarão substituindo, com vantagem, as latas de alumínio? Dez anos
transcorreram entre a concepção da primeira lata de alumínio e sua
industrialização em massa. Caso o diferencial competitivo da lata de papel se
configure como real – custo, biodegradabilidade, incombustibilidade,
reciclabilidade, resistência etc. –, bem menos que uma década terá
transcorrido quando a industrialização das latas de papel for uma realidade,
considerando-se que muito mais conhecimento está disponível hoje do que há
meio século.

Da mesma forma, observa-se hoje o crescimento fantástico da internet


em todo o mundo e, particularmente, no Brasil. A figura 4 evidencia o sucesso
meteórico desta tecnologia em relação a outras, desenvolvidas pelo ser
humano do final do século XIX ao final do século XX.

O potencial da competência, que representa o homo sapiens do século


XXI, em gerar conhecimento, a partir de informação, é de tal ordem que
podemos considerar que tudo aquilo que funciona está obsoleto. De fato, ao
final do século XV, com a descoberta da impressão por Gutenberg, o que era
informação manuscrita passou, gradativamente, a ser informação impressa, e a
humanidade evoluiu do obscurantismo da Idade Média para o Renascimento.
Da mesma forma, ao final do século XX, com a descoberta da tecnologia digital
capaz de armazenar milhares de páginas de textos e imagens, seguramente o
que hoje ainda é informação impressa rapidamente se transformará em
informação digital, permitindo que a humanidade evolua de uma sociedade
capitalista industrial para uma sociedade neo-socialista do conhecimento.

Figura 4 - O Sucesso Meteórico da Internet


Fonte: Revista Veja (29 jul.1998)

Portanto, o conhecimento é, atualmente, mais importante do que


qualquer outro fator de produção da era industrial, sejam recursos naturais,
trabalho humano, mão de obra ou mesmo capital. Entretanto, antes de
abordarmos a avaliação, o gerenciamento e a transferência do conhecimento
em uma organização, devemos nos dedicar a visualizar como o conhecimento
e seus ativos operam e se manifestam, de forma a entendermos a relação
entre dado, informação, conhecimento e competência.

É cada vez mais claro que a criação do conhecimento e de


competências é uma prioridade organizacional. Estes recursos influenciarão o
futuro das empresas por meio da inovação tecnológica, novos produtos,
buscando a abertura de novos mercados. Algumas dessas competências estão
entranhadas na cultura organizacional. Muitas dessas competências são
baseadas, como veremos, no conhecimento tácito que compõe parte
significativa dos ativos intangíveis de uma organização. O sucesso de uma
empresa decorre de sua capacidade e especialização na criação do
conhecimento organizacional, entendida como a capacidade de criação de um
conhecimento novo, de sua difusão na organização como um todo e de sua
incorporação a produtos, serviços e sistemas (NONAKA & TAKEUCHI, 1997).

A função primeira do pessoal de nível gerencial é ver a empresa como


uma organização do conhecimento. A identificação da essência de uma
organização do conhecimento passa pela necessidade de separar o intangível
do tangível.
Tem sido frequente testemunharmos a venda de empresas por valores
significativamente maiores do que seus valores contábeis registrados – o
mercado pagou US$ 9.00 a mais por cada US$ 1.00 do balanço patrimonial da
Microsoft (SVEIBY, 1998). Da mesma forma, na compra da Lotus pela IBM por
um valor 50 vezes maior que seu valor contábil, os executivos da IBM foram
indagados sobre o que estavam comprando. A resposta foi imediata: a
imaginação dos funcionários da Lotus (LUDWIG, 1998). O que faz a diferença,
qual a natureza desse valor para o mercado e por que a relação valor
mercado/valor contábil pode ser tão alta e variável? Qual o ativo secreto e de
elevado valor agregado que cria esse diferencial comparativamente a indústrias
automotivas ou siderúrgicas em geral, conforme pode ser observado na figura
5?

Em geral, pode-se dizer que empresas de base tecnológica apresentam


proporções de ativos intangíveis acima do seu valor contábil. Da mesma forma,
é possível afirmar que as empresas de serviços (bancos, financeiras,
telecomunicações, energia, engenharia consultiva e imobiliárias) são, também,
avaliadas acima de seu valor contábil. De fato, essas empresas trabalham,
sobretudo, com ativos intangíveis.

Figura 5 - Gráfico Comparativo dos Valores (%) de Ativos Intangíveis de


Empresas de Vários Ramos da Atividade Econômica
FONTE: Sveiby (1998)

Por outro lado, empresas integrantes de uma mesma cadeia produtiva,


com encadeamento semelhante nos seus sistemas de produção, apesar de
apresentarem valores contábeis equivalentes podem registrar valorizações
acionárias bem diferentes. Essa ocorrência pode ser exemplificada para um
setor tradicional da economia mundial: o siderúrgico. As empresas desse setor
que adotaram a concepção e as práticas operacionais de unidades estratégicas
de negócios, baseadas no sistema Toyota de produção, geraram uma
rentabilidade significativamente maior do que aquelas que mantiveram uma
organização taylorista-fordista de produção. Portanto, esses ativos invisíveis
são intangíveis por não serem concretos, palpáveis. Todos, entretanto, têm
origem nos recursos humanos de uma organização e podem ser classificados
em três tipos que, juntos, formam um balanço patrimonial de ativos intangíveis
– competência dos indivíduos e os seus relacionamentos, internos e externos à
organização.
O desenvolvimento de ativos de uma organização é um dos maiores
objetivos da gestão empresarial. Esta tarefa é entendida como de grau
complexo, na medida em que os ativos mais valiosos de uma organização são
bens intangíveis e não bens de capital, como máquinas, imóveis e fábricas. O
valor dos relacionamentos com um cliente, ou com um fornecedor, não é
menos importante do que o valor de uma fábrica.

Assim, se um gerente direciona sua atenção para o pessoal de dentro da


empresa, serão criados relacionamentos internos intangíveis – processos
otimizados, inovações em projetos de produtos. Direcionando os esforços para
fora, além de produtos (bens tangíveis) serão criados relacionamentos externos
intangíveis, tais como as relações com clientes.

Um dos objetivos desta disciplina é contribuir para que as pessoas


superem suas dificuldades de visualização e de classificação de ativos
intangíveis e, portanto, das estruturas de conhecimento.

Sveiby (1988) apresenta uma síntese dos ativos intangíveis, conforme


mostra o quadro 2.

Quadro 2 - A Síntese dos Ativos Intangíveis

Valor Contábil Ativos Intangíveis


(Ágio sobre o preço das ações)
Patrimônio Estrutura Estrutura Competência
Líquido = Ativos Externa Interna (a Individual
tangíveis menos (marcas, organização -
(nível de escolaridade
as dívidas a imagem, gerência,
e experiência
pagar relações com estrutura legal, profissional)
clientes e sistemas
fornecedores) administrativos
informatizados,
manuais, cultura
organizacional,
P&D, patentes)
FONTE: Sveiby (1998)
Observa-se que os relacionamentos, internos e externos, são
apresentados já na forma de estruturas (externa e interna) de conhecimentos,
devido aos aspectos salientados.

O resultado do trabalho com clientes é a construção de uma “imagem”


no mercado – um exemplo do relacionamento externo – que pertence em parte
à empresa e em parte aos indivíduos que a criaram. Os esforços direcionados
para dentro geram o que conhecemos como organização. Tanto a construção
da imagem como da organização compõem, juntamente com a competência
dos indivíduos, as estruturas de conhecimento da empresa.

A razão da inclusão da competência individual no balanço de ativos


intangíveis se justifica por ser impossível conceber uma organização sem
pessoas, admitindo-se, entretanto, que elas sejam membros voluntários, uma
vez caracterizados um tratamento justo e uma responsabilidade social
compartilhada. Uma organização do conhecimento é caracterizada por uma
elevada relação pessoas/sociedade.

Modelos gerenciais, sistemas administrativos informatizados, pesquisa,


desenvolvimento & engenharia, patentes e cultura organizacional integram a
estrutura interna (os relacionamentos internos), que, associados às pessoas,
constituem o que chamamos de organização.

O grau de satisfação dos clientes define o valor dos ativos intangíveis


que integram a estrutura externa (os relacionamentos externos), constituída por
marcas, reputação, imagem, relações com clientes e fornecedores.

Um típico balanço patrimonial de ativos intangíveis e visíveis ressalta


que esses ativos intangíveis têm implicações no desempenho de uma
organização do conhecimento. Assim, é comum determinar o valor desses
ativos pela diferença entre o valor contábil e o de mercado.

É importante frisar que os ativos intangíveis de uma organização, se mal


gerenciados, seguramente irão comprometer o desempenho da organização,
podendo por vezes contribuir para o fracasso do negócio. A violação da lógica
empresarial das organizações do conhecimento e, em consequência, a perda
do potencial criativo que constitui a sua essência, se traduzem invariavelmente
numa estratégia autopredatória.

De fato, neste tipo de organização, a gestão de ativos intangíveis gera


lucros tangíveis. A evasão de talentos está associada, em uma organização do
conhecimento, não só à perda de capacidade de atendimento às demandas,
mas também, e pior ainda, à perspectiva de redução de suas competências
distintivas perante o mercado.

O conhecimento é o diferencial competitivo que, cada vez mais, será


responsável pela atração de consumidores e clientes pelas empresas nos mais
diferentes ramos de atividade econômica. Assim sendo, como conhecer melhor
o que significa ser uma organização baseada no conhecimento?

Os computadores são uma espécie de símbolo nessas organizações,


uma vez que seu potencial para mudar o perfil dos negócios é imenso. Uma
empresa de importação e comércio, em fase de crescimento num mundo
globalizado, triplica seus postos de trabalho, aumenta suas vendas em oito
vezes e, necessariamente, eleva o número de megabytes do computador cerca
de trinta vezes. Contada de forma pragmática essa história, é como se nos
anos 1970 essa empresa fosse ao correio buscar novos pedidos; de um
número para discagem gratuita no início dos anos 1980 passaram a usar um
fax no final da década; de um sistema de intercâmbio de dados implementado
no início dos anos 1990 à chegada direta de pedidos no computador, via
modem. O acompanhamento de vendas por produto, cor, cliente, região etc.
permite que os investimentos em pesquisa e inovação sejam extremamente
seletivos para a construção das bases de amanhã.

É importante, a essa altura, estabelecer uma distinção entre


organizações que vendem conhecimento como um derivativo e aquelas que
vendem conhecimento como um processo. Mesmo considerando-se sua
dependência por ativos intangíveis, uma é gerenciada pela informação e outra
pelo conhecimento (SVEIBY, 1998).

As empresas fazem basicamente dois tipos de investimento: os


investimentos em bens de capital, tradicionalmente conhecidos (propriedades,
equipamentos etc.), e os investimentos de longo prazo, bem representados por
PD&I, formação de pessoal etc.

A partir de levantamentos feitos por organismos norte-americanos, pôde-


se constatar que os gastos do setor privado na aquisição de bens de capital da
era industrial pouco oscilaram ao longo dos últimos anos (em torno de US$ 110
bilhões). Entretanto, os investimentos em equipamentos de informática
praticamente dobraram de 82 (US$ 49 bilhões) a 87 (US$ 86,2 bilhões). O ano
de 1991 é tido como o Ano I da era do conhecimento nos EUA, uma vez que os
investimentos em geração e transmissão de conhecimento ultrapassaram os
investimentos em bens de capital. A esta constatação deve-se agregar outra,
relativa à geração de conhecimento por meio de PD&E por parte de algumas
empresas americanas e japonesas, envolvendo investimentos maiores do que
em bens de capital. Nonaka & Takeuchi (1997) afirmam que “se os
investimentos em PD&E começarem a ultrapassar os investimentos em bens
de capital, pode-se dizer que a empresa está começando a deixar de ser um
local onde se produz para se transformar num local onde se pensa”.

Quando isso ocorre, a primeira dificuldade é o entendimento do que foi


incorporado ao patrimônio da empresa. A otimização do que já existe é de
percepção clara. As tarefas são feitas mais rapidamente e melhor, os produtos
tornam-se mais baratos ou são produzidos em quantidades maiores. Alguns
autores consideram esses efeitos como eventos técnicos previstos. Contudo,
os resultados efetivos de segunda ordem são tão ou mais importantes que os
ganhos de eficiência. A invenção do carro é um bom exemplo: as fronteiras das
cidades foram ampliadas, criando empregos na construção de casas e
estradas, vendas de lâmpadas para iluminação de ruas...

Também, percebe-se que uma empresa está voltada para o


conhecimento quando ela se vê envolvida em novos domínios de atividade,
como, por exemplo, a preocupação com detalhes valiosos dos clientes, a
realização de simulações para avaliação de cenários prospectivos do seu
ambiente de negócio, até a geração de negócios a partir do conhecimento em
si. Hoje, está claro que o retorno dos investimentos feitos em computadores é,
seguramente, dez vezes maior do que o equivalente em equipamentos da
chamada era industrial. Nesta mesma direção, a recompensa para o
investimento em geração e transmissão de conhecimento equivale ao retorno
sobre o investimento em outra forma de ativo intangível, como em PD&E. Cada
dólar gasto em PD&E gera oito vezes mais do que cada dólar investido em um
novo equipamento (STEWART, 1998). PD&E leva à inovação, gera produtos e
serviços novos, com maior valor agregado. O novo equipamento permite
apenas fazer melhor o que já era feito.

Um exemplo recente de triunfo do conhecimento em relação aos bens


de capital é a indústria automobilística japonesa. A escassez de recursos e
espaço fez com que as empresas japonesas investissem no uso intensivo do
conhecimento em vez de capital, diferentemente do modelo norte-americano.
Resultado: fábricas com pequenos estoques em processo, peças, partes e
componentes solicitados à medida da necessidade, informada em tempo real.
O uso intensivo de informação associado à inventividade da produção resultou
no conhecido sistema kanban, o precursor, para nós, do sistema just-in-time de
uso corrente hoje entre clientes e fornecedores, em vários ramos da atividade
econômica.

As empresas do conhecimento, quando usam de forma correta a


informação, contribuem significativamente para a eliminação de gastos inúteis
de tempo e dinheiro que, consequentemente, contribuem para a redução
drástica do capital de giro. A empresa e a economia do conhecimento são
extremamente sutis e não menos interessantes, considerando que nelas a
informação assume realidade própria, separada dos bens tangíveis que
conhecemos, impelindo-nos ao aprendizado da competição com conhecimento.
Essa competição se dá por meio da venda de produtos e serviços. A venda de
bens, por parte de uma empresa, na velha e na nova economia, é diferenciada
em vários aspectos.

Compra de bens em uma empresa da velha economia:

 Escolha, venda, pagamento, crédito/contabilidade, entrega: a mercadoria e


informação no mesmo lugar, fluxo físico e de informação convergentes;
 A fabricação do bem: cada máquina e cada especialista incorpora todo o
conhecimento necessário no mesmo lugar.

Compra de bens em uma empresa da nova economia:

 Escolha, venda, pagamento, crédito/contabilidade, entrega: locais diferentes


conectados por redes, fluxo físico e de informação divergentes;

 A fabricação do bem: máquina e conhecimento de como realizar a tarefa


não são sinônimos.

Ao analisarmos essas constatações frente aos tipos de ativos intangíveis


de uma empresa – o conhecimento nas organizações –, percebe-se que os
relacionamentos externos estão baseados mais em fluxos de conhecimento
gerados pelos ativos intangíveis do que em fluxos financeiros.

Stewart (1998) consolida com clareza esses conceitos:

Um fato definitivo sobre as organizações da era do conhecimento é que o


conhecimento e a informação assumem sua própria realidade, que pode ser
dissociada do movimento físico dos bens e serviços. Essa divergência gera
pelo menos duas implicações: primeiro – o conhecimento e os ativos que o
criam e distribuem podem ser administrados, da mesma forma que os ativos
físicos e financeiros. Na verdade, os ativos intelectuais e físico-financeiros
podem ser gerenciados separadamente, juntos ou um em relação ao outro.
Segundo – se o conhecimento é a maior fonte de riqueza, os indivíduos, as
empresas e os países devem investir nos ativos que produzem e processam
o conhecimento. [...] Entender que poder gerenciar o fluxo de informações
pode ser uma enorme fonte de eficiência e lucros. [...] O insight que conferiu
à reengenharia sua principal fonte de valor foi que os fluxos de informação,
quando dissociados do movimento de produtos e serviços, podem ser
gerenciados de forma muito mais eficiente do que quando estão
associados.

Uma empresa tradicional é formada por um conjunto de ativos físicos,


diferentemente da empresa baseada no conhecimento, na qual os principais
ativos são intangíveis. Como a substituição do capital de giro por informação é
uma realidade, os ativos intelectuais frequentemente substituem os ativos
físicos nas empresas baseadas no conhecimento. Mesmo no setor industrial,
incluindo mineração, de 1982 a 1993, a economia norte-americana registrou
uma queda significativa do percentual representado pelos ativos tangíveis no
valor de mercado dessas empresas – de 62,3% para 37,9% (STEWART,
1998).

Outra realidade é que o dispêndio de uma empresa do conhecimento com


informação é tão significativo que superou percentualmente o equivalente à
economia industrial baseada no capital. Entretanto, em setores que não podem
deixar de possuir ativos, pode-se dizer que quanto mais diferenciado e próprio
for o trabalho maior será a possibilidade de se possuir ativos. Também, é
verdade que empresas dos setores imobiliário, químico, siderúrgico, por
possuírem bens de capital muito elevados, terão que fazer uso intensivo de
informação e conhecimento para gerar lucros representativos.

O quadro 3 compara, de forma sintética, a diferença entre o paradigma


da era industrial e o paradigma da era do conhecimento.

Quadro 3 - Comparação entre o Ponto de Vista do Paradigma da Era


Industrial e o Paradigma da Era do Conhecimento

Paradigma do
Tópicos Paradigma Industrial
Conhecimento
Pessoas Geradoras de custo ou Geradoras de receita
recursos
Base de poder dos Nível relativo na hierarquia Nível relativo de
gerentes organizacional conhecimento
Luta de poder Trabalhadores físicos X Trabalhadores do
capitalistas conhecimento X gerentes
Principal tarefa da Supervisão de Apoio aos colegas
gerência subordinados
Informação Instrumento de controle Ferramenta para o recurso da
comunicação
Produção Trabalhadores físicos Trabalhadores do
processando recursos conhecimento convertendo
físicos para criar produtos conhecimento em estruturas
tangíveis intangíveis
Fluxo de informações Via hierarquia Via redes colegiadas
organizacional
Forma básica de Tangível (dinheiro) Intangível (aprendizado,
receita novas ideias, novos clientes,
P&D)
Estrangulamentos da Capital financeiro e Tempo e conhecimento
produção habilidades humanas
Manifestação da Produtos tangíveis Estruturas intangíveis
produção (hardware) (conceitos e software)
Fluxo de produção Regido pela máquina, Regido pelas ideias, caótico
sequencial
Efeito do porte Economia de escala no Economia de escopo das
processo de produção redes
Relacionamento com o Unilateral pelos mercados Interativo pelas redes
cliente pessoais
Conhecimento Uma ferramenta ou um O foco empresarial
recurso entre outros
Finalidade do Aplicação de novas Criação de novos ativos
aprendizado ferramentas
Valores do mercado Regidos pelos ativos Regidos pelos ativos
acionário tangíveis intangíveis
Economia De redução de lucros De aumento e redução de
lucros

Como vimos, os ganhos primários e imediatos com a utilização do


conhecimento para aumentar a produtividade traduzem-se em: “fazer a mesma
coisa com menos”. A competitividade necessária ao futuro das empresas
exigirá que se faça mais em novos negócios, por meio do gerenciamento eficaz
dos ativos mais valiosos: informação, conhecimento e ativos intangíveis.

3.3 O TRABALHADOR DO CONHECIMENTO

Os negócios da era do conhecimento, considerando a caracterização da


economia e da organização do conhecimento, anteriormente apresentada,
exigem dos profissionais uma intimidade tanto com os produtos dessa
organização como com o seu gerenciamento.

À medida que identificamos e localizamos os trabalhadores do


conhecimento, observamos que as organizações que os possuem em grande
número são bastante horizontalizadas e, nelas, o trabalho do conhecimento
engloba planejar, supervisionar, programar e gerenciar as atividades, ou seja,
transformar mão de obra em cérebro de obra. A atividade a ser desenvolvida
pelo trabalhador do conhecimento consiste em converter informação em
conhecimento, utilizando suas próprias competências, contando com o auxílio
de fornecedores de informações ou de conhecimento especializado. Esta
concepção traz no seu contexto uma outra: uma remuneração relacionada com
sua habilidade, conhecimento e desempenho do negócio.

3.3.1 O Cérebro Funcionando como as Mãos

O que se faz hoje é bem diferente do que se fazia nesses mesmos


cargos, se é que eles existiam, há dez anos. Infelizmente, num primeiro
momento e, principalmente, para aqueles que não reconhecem a sociedade do
conhecimento, essa revolução deixou de fora pessoas que executam trabalhos
de rotina. Cada vez mais cresce o número de profissionais que trabalham no
reino da informação e das ideias. Em 20 anos (2001/2020) a força de trabalho
do setor secundário no mundo deverá estar reduzida à metade, contrariamente
aos postos de trabalho que lidam com informação, que deverão triplicar. A
constatação de que existe um percentual crescente de “trabalhadores do
conhecimento” é nítida: informação = matéria-prima; conhecimento = produto.

Diferentemente do que vem sendo propalado quanto ao estabelecimento


de um caos gerado pelo desemprego na nova sociedade do conhecimento, há
uma explosão de empregos para os trabalhadores do conhecimento. Os cargos
executivos, administrativos e gerenciais têm crescido em proporção inversa aos
cargos de apoio. A responsabilidade por 43% do aumento da oferta de
emprego nos Estados Unidos, nos últimos cinco anos, é das empresas do
conhecimento, que são responsáveis por apenas 28% dos postos de trabalho,
conforme mostra o quadro 4.

Quadro 4 - Evolução da Força de Trabalho nos Estados Unidos

Ano Operários de Serviço Trabalho de Técnicos ou


Produção Pessoal Gerência ou Profissionais
Administração Liberais
1900 73,4% 9,0% 13,3% 4,3%
1940 57,2% 11,7% 23,6% 7,5%
1980 34,2% 13,3% 36,1% 16,1%
Trabalhadores Agrícolas, Profissionais Liberais, Técnicos,
Operadores, Operários e Artesãos Burocráticos e cargos de Vendas,
e Prestadores de Serviço não Gerência e Administração.
Profissionais.
1900 83 % 17 %
1999 41 % 59 %
Fonte: Stewart (1998)
Classificação da força de trabalho dos EUA adotada por Dennis Swyt, do
Departamento Nacional de Padrões.
Classificação da força de trabalho dos EUA adotada por Stephen R. Barley, da
Stanford University.

Numericamente, não são apenas mais pessoas trabalhando com


conhecimento. O conteúdo do conhecimento de todo o trabalho tem crescido
exponencialmente em todos os ramos de atividade, mesmo nas atividades
agropecuárias. A habilidade do trabalhador deixou de ser apenas manual e
passou a ser intelectual. O componente intelectual responde por boa parte das
soluções de problemas e do trabalho gerencial, reduzindo significativamente os
supervisores de linha de produção.

3.3.2 O Valor do Trabalho Cognitivo

A recompensa dada pelo mercado à criação de valor é incontestável. Da


mesma forma que a movimentação dos mercados de trabalho tem sido feita
reconhecendo o conhecimento como a maior força de valor econômico, o
exemplo que vem dos Estados Unidos é sempre uma boa oportunidade para
reflexão: a expectativa não poderia ser outra que não a recompensa das
pessoas que trabalham com o cérebro. Há uma real e crescente desigualdade
de renda que tenderá a se agravar em curto prazo, de forma idêntica ao que
ocorreu no início da revolução industrial. O início da estruturação desta nova
sociedade do conhecimento será, da mesma forma, turbulento.

O que deve ser considerado é que a economia mundial não é mais


industrial, mas, por outro lado, os novos mercados de trabalho não estão
suficientemente mapeados, sendo claras, no entanto, as forças que vêm
reduzindo as recompensas pelo trabalho físico e concedendo maiores
recompensas ao trabalho baseado no conhecimento. O diferencial salarial
prova o crescente papel do conhecimento na criação do valor e da riqueza.
Universidades norte-americanas mostram que cada ano de educação adicional
na força de trabalho de uma cidade, região ou país eleva sua produtividade em
3%, responsabilizando, em parte, uma eficiência maior bem como um maior
conteúdo em conhecimento.

3.3.3 A Transformação da Gerência

A natureza do trabalho do gerente vem se modificando completamente


com a ascensão do trabalhador do conhecimento. Com uma função de
proteção e cuidado com os ativos da empresa, à medida que a participação
dos ativos intelectuais cresce, o trabalho do gerente sofre alterações
profundas. O trabalho baseado no conhecimento não pode ter sua gerência
fundamentada majoritariamente em números, como o trabalho mão de obra. Ao
contrário, a atividade do trabalhador do conhecimento tem semelhanças com a
atividade do profissional liberal: a avaliação é pelo resultado alcançado e não
pela atividade realizada. A expertise à qual o trabalhador do conhecimento
estará submetido será a de outro membro de sua profissão, não de um chefe:
não há chefes, mas sim clientes.

Conforme Stewart (1998),

a explosão do conhecimento científico, a rápida difusão da informação e o


poder crescente e veloz da tecnologia da informação, a participação cada
vez maior do conhecimento no valor agregado da empresa, a ascensão do
trabalhador do conhecimento – todos esses fatores trabalham juntos, cada
um deles sendo simultaneamente o ovo e a galinha, causa e efeito, a fim de
impor novos tipos de modelo organizacional e novos métodos gerenciais.

A gerência do tipo comando e controle vem se tornando desnecessária,


principalmente admitindo-se o progressivo abandono de linhas de produção de
bens em massa e a implementação crescente do trabalho baseado no
conhecimento. Saber mais do que os chefes, ter mais sensibilidade para o
mercado e estar mais próximo dos clientes são características comuns aos
gerentes das organizações do conhecimento. Estes possuem alto grau de
escolaridade. A focalização, nas publicações direcionadas aos gerentes, do
tema liderança, e não administração, comprova a mudança da forma de
atuação dos profissionais que exercem essa função. A constatação de que os
gerentes vêm se agrupando em torno de uma linguagem que engloba termos
como ‘valores’, ‘visão’, ‘trabalho em equipe’, ‘facilitador’ e ‘empowerment’
reflete a busca de meios de gerenciamento do conhecimento, do trabalho
baseado no conhecimento e de empresas que usam intensivamente o
conhecimento.

Na economia da era industrial, o ser humano trabalhava para a máquina.


Pouco ou nenhum impacto era sentido pela produção quando da troca de
funcionários. Hoje, no entanto, as partes mais valiosas das atividades que
exercemos na era do conhecimento são, essencialmente, humanas – sentir,
julgar, criar, desenvolver relacionamentos. As ferramentas e o produto de seu
trabalho, o trabalhador do conhecimento leva consigo: o seu cérebro.
(STEWART, 1998).

A trajetória que nos levará a uma mudança de paradigma da maneira


industrial de ver o mundo, para vê-lo do ponto de vista do conhecimento, exige
que se tenha bem claro o conjunto de tópicos que diferenciam essas duas
óticas.
AULA 4 - FUNDAMENTOS DE UM PROGRAMA DE GESTÃO DO
CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL

Objetivos
Este capítulo apresenta os fundamentos de um programa de gestão do
conhecimento organizacional. Neste sentido, após concluir esta aula, o aluno
deverá ser capaz de compreender os seguintes pontos:

1. Enfoque do conhecimento no passado e sua focalização no futuro;


2. Os modos de conversão do conhecimento e sua vinculação com a criação
do conhecimento organizacional;
3. As condições organizacionais que favorecem a criação do conhecimento e
as fases do processo criativo.

4.1 OS FUNDAMENTOS DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO


ORGANIZACIONAL

Criar conhecimento em uma organização significa harmonizar o trabalho


de criação com a disseminação e incorporação nos produtos, serviços e
sistemas da empresa. Toda e qualquer organização não só processa
conhecimento como também o cria. De acordo com Nonaka & Takeuchi (1997),
a criação de conhecimento constitui a principal fonte de competitividade
internacional das empresas japonesas, o que se contrapõe aos estudos de
administração que negligenciam a criação de conhecimento pelas
organizações.

No processo de criação, as formas tácitas e explícitas do conhecimento


são tomadas como unidades estruturais básicas que se complementam. A
dinâmica da criação do conhecimento na organização exige a interação entre
essas duas formas de modo repetido, num processo de evolução espiral, que
se desenvolve em três níveis: do indivíduo, do grupo e da organização. O
desenvolvimento da perícia em fomentar a inovação de forma contínua,
incremental e em espiral representa a chave do sucesso da grande maioria das
empresas japonesas. Neste sentido, destaca-se que a saída encontrada por
empresas para períodos longos de crise, muitas vezes, é voltar-se para a
criação de conhecimento organizacional, como forma de romper com o
passado, ingressando em novos territórios de oportunidades.

A compreensão das formas de conhecimento – tácito e explícito – e a


distinção entre as maneiras sob as quais eles podem ser transmitidos,
processados e armazenados, são as forças motrizes da criação de
conhecimento de uma organização. Isso se deve ao fato de que, para que o
conhecimento tácito seja compartilhado, ele deve ser convertido para a forma
explícita, de modo a possibilitar sua compreensão e, novamente, em tácito,
quando é absorvido por outros membros da equipe, gerando mais
conhecimento.

A responsabilidade pela criação do conhecimento não deve recair em


setor, departamento ou grupo específico de profissionais. Criar conhecimento
significa o resultado de uma interação dinâmica entre todos numa organização.
Entretanto, todos numa organização recebem e interpretam o conhecimento de
forma ativa, adaptando-o às suas próprias situações e perspectivas. Cabe aos
consultores empresariais direcionar essa "salutar confusão" na criação do
conhecimento. Esse senso de direção, associado à criação de conceitos gerais
de identificação de características comuns, permite associar atividades ou
negócios aparentemente bem diferentes.

Neste sentido, a gerência intermediária desempenha um papel de


extrema importância na criação de conhecimento, uma vez que está a seu
cargo o resumo do conhecimento tácito da linha de produção e dos altos
executivos, de forma a torná-lo explícito e incorporá-lo a novos produtos e
tecnologias. Esse nível específico de gerentes é o verdadeiro responsável pela
transformação das crises econômicas em oportunidades competitivas, por meio
da criação do conhecimento e geração de inovações.

Uma forma de a alta gerência viabilizar a geração de conhecimento é


fornecer ao "time" apenas instruções básicas, as linhas norteadoras,
possibilitando, assim, uma intensa troca de ideias e o surgimento de propostas
que certamente agregarão valor ao produto resultante.
4.2 AS CARACTERÍSTICAS-CHAVE DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO

Aliada ao processo de geração de conhecimento, a transformação de


sua forma tácita em explícita está associada a três características básicas: a
confiança na linguagem figurada e no simbolismo, o compartilhamento do
conhecimento pessoal, e a ambiguidade e redundância como geradores de
conhecimento.

O uso de metáforas ou analogias faz com que a compreensão por meio


do uso da imaginação e dos símbolos seja possível aos indivíduos em
contextos diferentes e com diferentes experiências. Expressar o que se sabe,
mas que ainda não se é capaz de dizer, pode ser feito por meio de metáforas.
Já uma analogia faz a distinção entre duas ideias ou objetos, esclarecendo as
semelhanças e diferenças.

A iniciativa do indivíduo e a interação que ocorre dentro do grupo são os


responsáveis pela amplificação e cristalização do conhecimento por meio de
discussões, compartilhamento de experiências e observação. A criação de
novas perspectivas por meio do diálogo e do debate constitui uma interação
dinâmica que executa a transformação do conhecimento pessoal em
organizacional.

A utilização da ambiguidade pelos consultores, se bem aplicada, resulta


não só num senso de direção para a equipe, mas também numa fonte de
novos significados e numa forma diferente de pensar. Do mesmo modo, a
geração de uma organização redundante contribui significativamente no
processo de criação do conhecimento. Compartilhando informações
superpostas, os integrantes das equipes sentem o que outros estão tentando
articular.

4.3 MODOS DE CRIAÇÃO E CONVERSÃO DO CONHECIMENTO

Ao inovar, as organizações, além de processarem informações de fora


para dentro, buscando resolver problemas existentes e se adaptar ao ambiente
em transformação, criam novos conhecimentos e informações, de dentro para
fora.

Antes de cuidarmos dos processos de criação do conhecimento, do


ambiente propício ao seu surgimento e das fases que consolidam o modo com
que o conhecimento organizacional é produzido, é importante caracterizar que
toda a conceituação a ser proposta baseia-se na distinção entre o
conhecimento tácito e o explícito, bem como nas formas como os convertemos
bidirecionalmente.

A figura 6 apresenta as duas dimensões sobre as quais construiremos a


espiral da criação do conhecimento, a partir da interação entre conhecimento
tácito e explícito. Como veremos, os modos pelos quais essa interação ocorre
– socialização, explicitação, combinação e internalização – constituem o motor
do processo de criação do conhecimento.

Na sequência, abordaremos as cinco condições que possibilitam


promover o desenvolvimento da espiral do conhecimento organizacional,
seguidas da descrição do processo em cinco fases por meio das quais o
conhecimento é criado. Como no processo de criação do conhecimento
lidamos com informação, faz-se necessário abordarmos suas semelhanças e
diferenças.

Figura 6 - Dimensões da Criação do Conhecimento


Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

Assim, a informação é um meio ou material necessário para extrair e


construir o conhecimento, alterando-o por meio do acréscimo de algo ou
reestruturando-o. Ela constitui um produto capaz de gerar conhecimento. Vista
de duas perspectivas: sintática (volume de informações) ou semântica
(significado), esta última é mais importante para a criação do conhecimento,
pois envolve o significado transmitido, uma vez que o conhecimento está
essencialmente relacionado com a ação humana. Criando e organizando
ativamente suas próprias experiências, o homem adquire conhecimento, fruto
em grande parte de nosso esforço voluntário de lidar com o mundo.

Em termos organizacionais, não é possível criar conhecimento sem as


pessoas. A empresa voltada à geração de conhecimento deve não só apoiá-
las, como também lhes proporcionar contextos apropriados à criação do
conhecimento organizacional. A base na distinção dos conhecimentos tácito e
explícito é também indispensável à compreensão das dimensões de
desenvolvimento da espiral da criação do conhecimento:

1) Conhecimento tácito: conhecimento procedural, pessoal,


específico ao contexto, difícil de ser formulado e comunicado.
Envolve modelos mentais que estabelecem e manipulam
analogias. Seus elementos técnicos podem ser exemplificados
como o know-how concreto, técnicas e habilidades que permitem
ao indivíduo o saber-fazer, dirigido à ação.

2) Conhecimento explícito: conhecimento declarativo,


transmissível em linguagem formal e sistemática que permite ao
indivíduo o saber (entender e compreender) sobre determinados
fatos e eventos, mas não lhe permite agir.

Polanyi, citado por Nonaka & Takeuchi (1997), diz que "podemos saber
mais do que podemos dizer". O quadro 5 apresenta algumas distinções entre
os conceitos tácito e explícito.

Quadro 5 - Conhecimento Tácito X Conhecimento Explícito

Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

A tendência do mundo ocidental em enfatizar o conhecimento explícito é


contrária à registrada pelos orientais, que buscam a ênfase no conhecimento
tácito.

Essas duas formas são não só complementares, como interagem entre


si. O conhecimento é criado e expandido por meio da interação social –
chamada de conversão do conhecimento – entre essas modalidades. É
importante observar que essa conversão é um processo social entre indivíduos,
não estando confinada em um indivíduo.

São quatro os modos de conversão do conhecimento, conforme figura 7:

1) de conhecimento tácito em conhecimento tácito (socialização);

2) de conhecimento tácito em conhecimento explícito (explicitação);


3) de conhecimento explícito em conhecimento explícito
(combinação);

4) de conhecimento explícito em conhecimento tácito


(internalização).

Figura 7 - Modos de Conversão do Conhecimento

Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

Socialização: processo de compartilhamento de experiências, tais como


modelos mentais ou habilidades técnicas compartilhadas. O aprendizado dos
alunos, não por meio da linguagem de seus mestres, mas sim por meio da
observação, imitação e prática, é uma forma de socialização. O segredo para a
aquisição do conhecimento tácito é a experiência. Nas reuniões formais para
discussões detalhadas de problemas – brainstorming – esse processo está
bastante presente. A recomendação é que o status dos participantes não seja
questionado, havendo, entretanto, um entendimento de que as críticas sem
sugestões sejam impedidas: é dez vezes mais fácil criticar do que sugerir uma
alternativa construtiva. Essas reuniões servem para reorientar os modelos
mentais dos indivíduos, não de forma forçada, mas sim representando um
mecanismo por meio do qual se busca a harmonia pelo envolvimento em
experiências físicas e mentais. A habilidade técnica tácita também pode ser
socializada por meio da observação, imitação e prática. O compartilhamento
das experiências e os diálogos constantes entre responsáveis pelo
desenvolvimento de produtos e os clientes representam também um processo
infinito de compartilhamento do conhecimento tácito e criação de ideias para
aperfeiçoamento.

Explicitação (Externalização): processo de articulação do conhecimento


tácito em conceitos explícitos. É tido como processo de criação do
conhecimento perfeito, considerando que a forma explícita é expressa por
metáforas, analogias, conceitos, hipóteses ou modelos. A escrita é uma forma
de converter o conhecimento tácito em conhecimento articulável. A tentativa de
conceituar uma imagem por meio da linguagem deixa uma lacuna que,
entretanto, ajuda a promover uma reflexão e interação entre os indivíduos. A
explicitação da conversão do conhecimento é provocada pelo diálogo ou pela
reflexão coletiva. É também frequente a criação de conceitos por meio da
combinação de dedução e indução. As "clínicas de conceito" são também
bastante utilizadas como modo de explicitação, mostrando-se úteis na criação
e elaboração de um conceito. A metáfora/analogia tem lugar quando se torna
difícil encontrar uma expressão adequada para uma imagem, sendo usada com
eficácia no desenvolvimento de produtos. A explicitação é a chave para a
criação do conhecimento, tendo em vista que cria conceitos novos e explícitos,
a partir do conhecimento tácito. Fazer essa conversão de modo eficiente e
eficaz reside no uso sequencial de metáforas, analogias e modelos. É possível
relacionar continuamente conceitos bastante distantes, e também conceitos
abstratos, com vistas à criação de conceitos concretos, por meio de metáforas
(OLIVARES, 1998). Isto decorre do fato de que uma metáfora, segundo a
literatura, consiste em dois pensamentos de coisas diferentes apoiados por
uma única palavra, ou expressão, cujo significado é resultado de sua interação.
Já a associação por meio de analogias concentra-se nas semelhanças
estruturais/funcionais entre duas coisas, esclarecendo suas diferenças. Uma
analogia nos ajuda a entender o desconhecido por meio do conhecido,
eliminando a lacuna entre imagem e modelo lógico.

Combinação: processo de sistematização de conceitos em um sistema de


conhecimento. A troca e combinação de conhecimentos por meio de
documentos, reuniões, conversas telefônicas ou redes de comunicação
computadorizadas caracteriza esse modo de conversão. A criação do
conhecimento realizada por meio da educação e do treinamento formal nas
escolas, normalmente, assume essa forma. Quando a gerência de nível médio,
no contexto dos negócios, desmembra e operacionaliza visões empresariais,
conceitos de negócios e de produtos, a conversão do conhecimento por meio
da combinação se faz presente. Já na alta gerência da organização, a
combinação é realizada quando há a integração dos conceitos intermediários
(conceito de produtos) aos conceitos principais (visão da empresa), agregando-
lhes um novo significado.

Incorporação (Internalização): processo de incorporação do conhecimento


explícito em tácito – aprender fazendo. A internalização das bases de
conhecimento tácito dos indivíduos por meio de modelos mentais ou know-how
técnico compartilhado, somado às experiências de socialização, explicitação e
combinação, tornam-se ativos valiosos. A viabilização da criação do
conhecimento organizacional necessita que haja a socialização do
conhecimento tácito acumulado com outros membros da organização, dando
início à espiral de criação do conhecimento. A verbalização e a diagramação do
conhecimento sob a forma de documentos, manuais ou histórias orais são
fundamentais para que o conhecimento explícito se torne tácito. A
documentação tem importante papel na internalização das experiências nos
indivíduos. A re-experimentação das vivências de outros indivíduos não é
indispensável para a internalização. Ler ou ouvir histórias de sucesso leva
alguns membros da organização a sentir o realismo do âmago das questões,
tornando possível que experiências passadas se transformem em modelo
mental tácito. É sem dúvida um consenso que todo esse processo busca a
inovação e o desenvolvimento da criatividade individual, assegurando a
expansão do escopo da experiência prática como essencial para a
internalização.

4.4 A ESPIRAL DO CONHECIMENTO

Compartilhar o conhecimento tácito é o objetivo da socialização que,


isoladamente, constitui uma forma limitada de criação do conhecimento. A
facilidade com que uma organização alavanca o conhecimento está na razão
direta da eficiência da conversão do conhecimento tácito em explícito. A
simples combinação das informações explícitas não amplia a base de
conhecimentos existente na empresa. A interação, contínua e dinâmica, entre
conhecimento explícito e tácito é que gera inovação.

A base da criação do conhecimento organizacional está aí. Uma


organização não cria conhecimento por si só. O conhecimento tácito criado e
acumulado em nível individual deve ser mobilizado e ampliado
organizacionalmente pelos quatro modos de conversão, compondo a chamada
espiral do conhecimento (NONAKA & TAKEUCHI, 1997), conforme
representado na figura 8.

Figura 8 - A Espiral do Conhecimento

Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

Criar conhecimento em uma organização envolve a criação do


conhecimento individual, que se amplia em comunidades de interação que
transpassam seções, departamentos, divisões e organizações. Um bom
exemplo é o desenvolvimento de produtos, iniciado com a criação de um
conceito e envolvendo uma comunidade interativa de indivíduos com históricos
e modelos mentais diferentes, capazes de assegurar a socialização e a
explicitação necessárias à associação do conhecimento tácito e explícito dos
indivíduos.

A socialização gera o conhecimento compartilhado; a explicitação gera


conhecimento conceitual; a combinação dá origem ao conhecimento sistêmico
e a internalização produz o conhecimento operacional, conforme evidencia a
figura 9.

Figura 9 - Os Conhecimentos Gerados

Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

4.5 CONTEXTO APROPRIADO À GERAÇÃO DO CONHECIMENTO

4.5.1 Intenção

No desenvolvimento da capacidade organizacional de adquirir, criar,


acumular e explorar o conhecimento está a essência da criação do
conhecimento organizacional – a estratégia. Conceituar uma visão e relacioná-
la ao tipo de conhecimento que deve ser desenvolvido e sua efetiva
implementação é o ponto crítico da estratégia da empresa que quer associar
tecnologias essenciais e atividades de negócios.

O critério mais importante para julgar a veracidade de um determinado


conhecimento é a intenção organizacional. Sua clareza assegura o julgamento
do valor da informação ou do conhecimento percebido ou criado. A intenção é
necessariamente carregada de valor.

4.5.2 Autonomia

Em nível individual, a promoção da espiral do conhecimento em uma


empresa depende enormemente da autonomia dos indivíduos, que, por sua
vez, contempla a chance de introdução de oportunidades inesperadas. A
postura empresarial que assegura a autonomia está mais propensa a manter
maior flexibilidade ao adquirir, interpretar e relacionar informações.

Usar a analogia com os sistemas orgânicos vivos – perfeição otimizada:


órgãos e células – mostra que, para seu funcionamento, não é necessário um
relacionamento dominador-subordinado. A necessidade, como no corpo
humano, é de uma equipe multifuncional que contemple elementos numa
ampla gama de diferentes atividades organizacionais. Nos projetos recentes de
inovação, segundo Nonaka & Takeuchi (1997), são comuns equipes de 10 a 30
membros com históricos funcionais diversos – P&D, planejamento, produção,
controle de qualidade, vendas, marketing e serviço ao cliente.

Amplificar e sublimar as perspectivas individuais em níveis mais elevados


representam reais potenciais de equipes autônomas. Chegar ao gol como um
grupo unido (tipo C na figura 10). Trabalhar em grupo como numa prova de
revezamento 4 X 100m de natação estará sempre dependendo de um só (tipo
A na figura), pois, como evidencia a teoria das filas, a velocidade média de uma
fila de carros em uma autoestrada é, exatamente, igual à velocidade do carro
que anda mais devagar. A sinergia, abordada por Fonseca (1994), focaliza
esse aspecto: a busca da "performance ótima" indispensável à criação do
conhecimento organizacional, por meio da soma de várias inteligências
individuais. A forma de aprender a trabalhar em time é começar a interagir
como em uma corrida de bastão (tipo B na figura), como em uma competição
de remo tipo "três com”, evoluir para o vôlei, depois para o basquete, até atingir
o futebol (tipo C).

Figura 10 - Geração de Conhecimento

Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

4.5.3 Flutuação e Caos Criativo

O estímulo à interação entre a organização e o ambiente externo é


significativamente favorecido pela flutuação e o caos criativo. A introdução da
flutuação em uma empresa se dá por meio de colapsos de rotinas, hábitos ou
estruturas cognitivas. Um processo contínuo de questionamento e
reconsideração de premissas existentes estimula a criação do conhecimento.

O enfrentamento de uma crise real gera naturalmente o caos, como, por


exemplo, na queda de desempenho em razão de mudanças nas necessidades
de mercado ou pelo crescimento de concorrentes (é interessante notar como
Porter, 1986 e 1990, focaliza esses dois aspectos como forças da rentabilidade
da indústria). A proposta de metas desafiadoras por parte dos líderes da
organização pode evocar um sentido de crise associado a um ideal grandioso.
É importante frisar que os benefícios da intenção de geração do caos criativo
só serão sentidos caso os membros da equipe possuam a habilidade de refletir
sobre suas ações. A reflexão seguida à ação gera pesquisadores no sentido
prático.

Por outro lado, deixamos consignado para reflexão o pensamento que


orienta uma corrente da administração de negócios: “…Extrai-se a sabedoria
de quem está à beira de um abismo, lutando para sobreviver…”.

4.5.4 Redundância

A redundância de informações acelera o processo de criação do


conhecimento, visto que a disseminação de informações redundantes estimula
o compartilhamento do conhecimento tácito – os indivíduos conseguem captar
(sentir) o que os outros estão tentando expressar. O princípio da redundância
de comando potencial apresentado por McCulloch em 1965 – cada parte de um
sistema inteiro tem o mesmo grau de importância e o mesmo potencial de se
tornar líder do sistema – possui como pré-requisito a redundância de
informações, facilitando o intercâmbio entre hierarquia e não hierarquia.

O compartilhamento de informações adicionais ajuda na associação livre


de indivíduos, possibilitando que assumam importantes posições no contexto
organizacional. São várias as formas de desenvolvimento da redundância em
uma organização. Um exemplo é a divisão das equipes de desenvolvimento de
produto em grupos concorrentes – a discussão das vantagens e desvantagens
das diferentes propostas é extremamente rica. Desenvolver a redundância
organizacional incentivando um rodízio estratégico de pessoal representa uma
outra forma de implementá-la – entre áreas diferentes de tecnologia ou PD&E,
e marketing.

Considerando que a redundância eleva o volume de informações a ser


processado, deve-se buscar o equilíbrio entre criação e processamento de
informações.
4.5.5 Variedade de Requisitos

O enfrentamento dos desafios impostos por um ambiente de extrema


complexidade é enormemente facilitado pela diversidade interna de uma
organização. Esse ambiente de negócios requer o desenvolvimento de uma
estrutura horizontal e flexível na qual as diferentes unidades são interligadas
por uma rede de informações.

A necessidade do atendimento a uma grande variedade de requisitos


impõe o rodízio frequente de pessoal, que irá permitir aos indivíduos a
aquisição de conhecimento multifuncional, indispensável na solução de
problemas multifacetados e na eleição de alternativas para enfrentar flutuações
ambientais inesperadas.

Lucca Neto (1998) menciona que o impacto das mudanças requisita


profissional com amplitude de conhecimentos e com percepção para captar as
novidades, filtrá-las e repassá-las às chefias, gerência e diretoria.

4.6 FASES DO PROCESSO DE CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO

Incorporando a dimensão tempo nessa abordagem, passamos a analisar


as cinco fases do processo de criação do conhecimento, conforme
esquematizado na figura 11: compartilhamento do conhecimento tácito, criação
de conceitos, justificação desses conceitos, construção de um arquétipo e
difusão interativa do conhecimento.

Figura 11 - Fases do Processo de Criação do Conhecimento


Fonte: Nonaka & Takeuchi (1987)

4.6.1 Compartilhando o Conhecimento Tácito

Esta é sem dúvida uma etapa crítica do processo. Isto porque o


conhecimento tácito não pode ser comunicado ou transmitido aos outros de
maneira simples, pois é adquirido sobretudo por meio da experiência, não
sendo facilmente transmitido em palavras. Uma equipe auto-organizada, na
qual membros de vários departamentos funcionais trabalham juntos para
alcançar uma meta comum, é a "célula" de interação típica nesta fase. Há uma
plena correspondência entre esta fase e a socialização no processo de criação
do conhecimento organizacional.

São condições organizacionais de interferência construtiva nesta fase:

 diálogos pessoais;

 variedade de requisitos dos membros da equipe;

 redundância de informações;

 intenção organizacional;

 caos criativo;

 metas desafiadoras;
 alto grau de autonomia;

 interação com o ambiente externo.

4.6.2 Criação de Conceitos

Uma segunda fase intensa na interação entre conhecimento tácito e


explícito diz respeito à criação de conceitos. A equipe auto-organizada
expressa esse modelo por meio do diálogo contínuo sob a forma de reflexão
coletiva, característica de explicitação. O uso de múltiplos métodos de
raciocínio – dedução, indução, comparação, suposição e outros – facilita o
processo de conversão de conhecimento tácito em explícito. Metáforas e
analogias são intensamente utilizadas nesta fase.

São condições organizacionais de interferência construtiva nesta fase:

 reflexão coletiva;

 autonomia;

 intenção como ferramenta;

 variedade de requisitos;

 flutuação e caos internos e externos;

 redundância de informações.

4.6.3 Justificação dos Conceitos

Em algum momento do processo, os novos conceitos criados por


indivíduos/equipe precisam ser justificados. A condução do processo de
justificação deve ser explícita, de forma a possibilitar uma avaliação contínua
quanto à integridade da intenção organizacional frente ao novo conceito,
atendendo simultaneamente às necessidades da sociedade. Focalizando as
organizações de negócio, os critérios normais de justificação incluem custo,
margem de lucro, contribuição de produtos para o crescimento da empresa, por
exemplo. Uma das principais funções da alta gerência é formular os critérios de
justificação de acordo com a intenção organizacional. A gerência de nível
médio ajuda na formulação dos critérios em nível intermediário.

São condições organizacionais de interferência construtiva nesta fase:

 intenção organizacional;

 autonomia;

 redundância de informações.

4.6.4 Construção de um Arquétipo

O conceito justificado é transformado em algo concreto ou tangível nesta


fase – um arquétipo (protótipo, mecanismo operacional, modelo). O arquétipo é
construído por meio da combinação do conhecimento explícito recém-criado e
o existente. A reunião de pessoas com habilidades técnicas diferentes, o
desenvolvimento de especificações e a "fabricação" do primeiro modelo são
etapas desta fase do processo.

São condições organizacionais de interferência construtiva nesta fase:

 cooperação dinâmica entre departamentos;

 variedade de requisitos;

 redundância de informações;

 intenção organizacional como ferramenta.

4.6.5 Difusão Interativa do Conhecimento

Os novos conceitos criados, justificados e transformados em modelo são


submetidos a um novo ciclo de criação de conhecimento. Seja dentro de uma
única organização ou entre organizações, a difusão interativa do conhecimento
constitui um processo interativo e em espiral. Frequentemente ele se expande
horizontal e verticalmente por toda a organização por meio de um novo ciclo de
criação do conhecimento. A mobilização de empresas afiliadas, clientes,
fornecedores, concorrentes e outras organizações externas à empresa é
resultado do conhecimento criado, tendo em vista a interação dinâmica
desenvolvida.

São condições organizacionais de interferência construtiva nesta fase:

 autonomia de unidades organizacionais;

 flutuação interna;

 redundância de informações;

 variedade de requisitos;

 intenção organizacional.
AULA 5 - IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROGRAMA DE GESTÃO DO
CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL

Objetivos
Ao final deste capítulo os alunos deverão ser capazes de determinar:

1. As características dos processos gerenciais adotadas nas organizações do


conhecimento;
2. Os tipos de habilidades organizacionais;
3. A classificação da força de trabalho quanto à agregação de valor aos ativos
intangíveis das organizações;
4. As ações destinadas a otimizar o desempenho de uma organização do
conhecimento.

Segundo Nonaka & Takeuchi (1997), o melhor modelo de gestão para a


implementação de um programa de gestão do conhecimento em uma
organização é o middle-up-down (do-meio-para-cima-e-para-baixo). Este
modelo é superior aos modelos tradicionais adotados, top-down e bottom-up,
porque ele redefine o papel da alta gerência e dos funcionários da linha de
frente, colocando o gerente de nível médio no centro da gestão do
conhecimento. Neste capítulo, focalizaremos os processos gerenciais segundo
esta perspectiva. Contudo, preliminarmente, faremos um breve comentário
sobre as principais características dos modelos top-down e bottom-up.

5.1 MODELOS DE GESTÃO TOP-DOWN E BOTTOM-UP

No modelo gerencial top-down, tipo taylorista-fordista, a organização é


estruturada nos moldes de uma pirâmide, principalmente se visualizarmos as
relações entre os altos gerentes e os gerentes médios e, destes, com os
operários do chão de fábrica. Neste modelo, uma premissa implícita é a de que
apenas os altos gerentes são capazes de criar conhecimento. A isenção de
qualquer ambiguidade ou equívoco caracteriza a criação de conceitos pela alta
gerência. Assim, as características estritamente funcionais e pragmáticas
desses conceitos limitam a capacidade de processamento de informações dos
operários, permitindo-lhes apenas lidar com elas. O conhecimento criado pela
alta gerência só serve para ser processado ou implementado.

No processo gerencial bottom-up, tipo pré-taylorista, em lugar da


hierarquia e da divisão do trabalho há autonomia. Neste modelo, o
conhecimento é criado e frequentemente controlado pelo próprio indivíduo. Os
artesãos empreendedores são patrocinados pela alta gerência. Esses agentes
independentes e isolados, responsáveis pela criação do conhecimento, são
regidos por um princípio operacional chave – a autonomia – em vez da
interação. O conhecimento é criado, portanto, por determinados indivíduos e
não por um grupo de indivíduos que interagem.

Para controlar a criação do conhecimento a partir do topo, o modelo top-


down negligencia o desenvolvimento do conhecimento tácito, cuja geração é
comum à linha de frente das organizações. Entretanto, sua adequação para
lidar com o conhecimento explícito é bem reconhecida, ao contrário do modelo
bottom-up, que se utiliza do conhecimento tácito. A autonomia excessiva dos
funcionários da linha de frente torna difícil disseminar e compartilhar o
conhecimento dentro da organização.

Tanto o modelo top-down como o bottom-up são eficazes na conversão


do conhecimento, porém de forma parcial: combinação e internalização
focalizadas no top-down, e socialização e explicitação focalizadas no bottom-
up. De fato, o processo essencial de criação do conhecimento organizacional é
intensivo em nível de grupo. Todavia, pode-se constatar que, tanto no modelo
hierárquico quanto no modelo individual, não existe a ocorrência dessa intensa
interação. Uma outra limitação apontada por Nonaka & Takeuchi (1997) refere-
se à falta de reconhecimento e relevância concedidos aos gerentes de nível
médio. É bem provável que estes apenas processem significativa quantidade
de informações no modelo top-down, não lhes sendo assegurado um lugar no
modelo bottom-up.

5.2 O MODELO DE GESTÃO MIDDLE-UP-DOWN

Este modelo transmite de uma melhor forma o processo interativo por


meio do qual o conhecimento é criado. A criação de conhecimento pelos
gerentes de nível médio decorre da frequente liderança de equipes, por meio
de um processo em espiral de conversão que envolve tanto a alta gerência
quanto os funcionários da linha de frente. A média gerência encontra-se na
interseção dos fluxos vertical e horizontal de informações dentro da empresa.
Esta gerência é a chave da inovação contínua e desempenha um papel-chave
na facilitação do processo de criação do conhecimento organizacional,
constituindo-se na interface que liga a alta gerência ao pessoal de nível
operacional. É o elo entre os ideais visionários do topo e a realidade quase
caótica do negócio enfrentada na linha de frente. A gerência de nível médio é
hoje chamada de “engenheiros do conhecimento”. Embora detenham uma
quantidade enorme de informações, constituindo-se em verdadeiros
especialistas na realidade dos negócios da organização, é difícil para o pessoal
de nível operacional transformar o que sabem em conhecimento útil, uma vez
que os sinais de mercado são vagos ou ambíguos. Isso decorre também do
fato de que as pessoas não recebem passivamente o conhecimento. Há uma
interpretação ativa que produz a adequação à sua própria situação e às suas
perspectivas. Orientar essa situação caótica em direção à criação proveitosa
do conhecimento é a principal tarefa da gerência de nível médio no modelo
middle-up-down.

A figura 12 ilustra este modelo. A gerência de nível médio desenvolve


conceitos mais concretos a partir de uma visão ou ideal da alta gerência, de
forma que os funcionários da linha de frente possam compreender e
implementar. A contradição que existe entre o que a alta gerência espera criar
e o que realmente existe, no mundo real, é resolvida pela gerência de nível
médio.

Figura 12 - Modelo Middle-up-Down


Fonte: Nonaka & Takeuchi (1997)

O quadro 6 traz as características relevantes dos três processos


comentados. Ao atentarmos detalhadamente para seu conteúdo, é fácil
percebermos que o modelo gerencial middle-up-down é mais abrangente
(quem), mais completo (qual), mais flexível (como), mais amplo (onde).

Quadro 6 - Características Relevantes dos Três Processos


5.3 A EQUIPE PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROGRAMA DE
GESTÃO DO CONHECIMENTO

Em uma organização intensiva em conhecimento, como as organizações


públicas, todos os elementos são fontes geradoras de conhecimento: pessoal
de nível operacional, gerentes de nível médio e altos gerentes. Assim, a
criação de novo conhecimento é produto da interação dinâmica entre
“profissionais do conhecimento” (profissionais de nível operacional),
“engenheiros do conhecimento” (gerentes de nível médio) e “altos gerentes”
(gerentes do conhecimento).

Os profissionais do conhecimento, operadores e especialistas do


conhecimento respondem pela geração de conhecimento tanto tácito como
explícito. A conversão tácito-explícito-tácito é função dos engenheiros do
conhecimento, cabendo a eles a responsabilidade pela gestão do processo
total no nível empresarial.

Nonaka & Takeuchi (1997) citam Peter Drucker: “da mesma forma que
os capitalistas eram proprietários dos meios de produção (capital, terra,
trabalho), na sociedade do conhecimento os trabalhadores do conhecimento
são proprietários de seus conhecimentos, levando-os consigo para onde
forem”.

5.3.1 O Pessoal de Nível Operacional: Profissionais da Linha de Frente

A função principal desses profissionais é incorporar o conhecimento.


Realizam a acumulação, geração e atualização, tanto do conhecimento tácito
como do conhecimento explícito. São arquivos vivos do dia a dia. Seu trabalho
na linha de frente possibilita acesso direto às informações mais atualizadas –
tecnologia, desenvolvimento de mercado, concorrência. A qualidade de suas
experiências na linha de frente do negócio determina a qualidade do
conhecimento acumulado e gerado. Neste sentido, é imprescindível que os
gerentes e engenheiros do conhecimento lhes solicitem tarefas as mais
desafiadoras e exploratórias possíveis.
Os operadores do conhecimento acumulam e geram conhecimento rico
na forma de habilidades incorporadas, baseadas na experiência –
conhecimento tácito. São funcionários da linha de frente ou gerentes de linha
posicionados mais próximos das realidades dos negócios. Os especialistas do
conhecimento acumulam, geram e atualizam o conhecimento explícito, bem
estruturado – dados passíveis de transmissão e armazenamento por
computador, por exemplo.

5.3.2 Engenheiros do Conhecimento

Os gerentes de nível médio servem como ponte entre os ideais


visionários do topo da empresa e a realidade do mercado. Na criação de
conceitos em nível intermediário de negócio e produto, equilibram a realidade e
a visão: refazem a realidade segundo a visão da empresa.

Esses gerentes, engenheiros do conhecimento, assumem a liderança da


conversão do conhecimento. A conversão de imagens e perspectivas tácitas
em conceitos explícitos – internalização – configura a ação de síntese do
conhecimento tácito tanto dos funcionários da linha de frente quanto dos
executivos, incorporando esse conhecimento a novas tecnologias, produtos e
sistemas.

5.3.3 Gerentes do Conhecimento

A função básica dos gerentes seniores e altos gerentes é a gestão do


processo total de criação de conhecimento organizacional. Estes profissionais
dão senso de direção às atividades de criação do conhecimento por meio da:

 expressão dos conceitos principais do que a empresa deve ser;


 visão da empresa/declaração de políticas como visão do
conhecimento;
 padrões que justifiquem o conhecimento que está sendo criado.

Na ótica de Nonaka & Takeuchi (1997), aos profissionais do


conhecimento cabe saber “o que é”; aos gerentes do conhecimento cabe saber
“o que deve ser”. A expressão do conceito guarda-chuva da empresa, que
associa atividades ou negócios em um todo coerente, cabe aos gerentes do
conhecimento. A determinação da qualidade do conhecimento criado pela
empresa é feita pela definição do sistema de valor, que também o avalia e
justifica.

Fomentar o estímulo nos outros membros da equipe é também função


da gerência do conhecimento que tem consciência de suas aspirações e ideais,
tornando possível o desenvolvimento de um alto grau de compromisso pessoal.
Uma visão aberta e ambígua, que possibilite uma série de interpretações, é
preferível. Isto gera uma equipe auto-organizada, com liberdade e autonomia
para a construção de metas próprias.

A decisão estratégica quanto a que esforços apoiar e desenvolver é,


também, responsabilidade desses gerentes, que acumulam a tarefa de
justificação do valor do conhecimento constantemente desenvolvido pela
equipe. Neste particular, não basta possuir um planejamento estratégico. É
necessário o alinhamento estratégico da organização como um todo, no qual
os referenciais estratégicos se transformam em planos de ação.

O modelo middle-up-down representa a síntese dos aspectos positivos


dos modelos tradicionais aplicados para a gestão da criação do conhecimento.
Sua otimização exige que o papel de seus principais participantes seja
repensado. Assim, toda equipe deve ser composta por profissionais –
operadores e especialistas – engenheiros e gerentes do conhecimento que, por
meio do desenvolvimento das condições capacitadoras da criação do
conhecimento organizacional (intenção, autonomia, flutuação e caos criativo,
redundância e variedade de requisitos), tornam possível a ocorrência dos
quatro modos de conversão do conhecimento organizacional: socialização,
explicitação, combinação e internalização.

5.4 CHAVES PARA O DESENVOLVIMENTO E UTILIZAÇÃO DA


COMPETÊNCIA PROFISSIONAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM
PROGRAMA DE GESTÃO DO CONHECIMENTO

Ativos intangíveis de uma organização do conhecimento – talento de


servidores, eficácia de sistemas gerenciais, caráter do relacionamento com
clientes – contribuem mais para o valor dos produtos ou serviços do que seus
ativos fixos. O investimento em uma empresa está na “aquisição” de um
conjunto de talentos, capacidades, habilidades e ideias.

Hoje, um grupo de pessoas inteligentes trabalhando de forma inteligente


representa o cerne do que se chama inteligência organizacional: uma
característica das sociedades em que o conhecimento tornou-se a principal
matéria-prima e resultado da atividade econômica. Segundo Stewart (1998),
identificar e gerenciar os ativos baseados no conhecimento equivale a pescar
com as mãos: não é impossível, mas é extremamente difícil capturar o peixe.

A sociedade industrial está habituada a gerenciar as formas e não a


substância: prestar mais atenção à garrafa do que ao vinho. Na velha
economia, contabilizar formas (material e mão de obra) representava a maior
parte do valor do produto. Na nova economia, o conhecimento é a maior fonte
de valor e vantagem competitiva. A gestão dos ativos intangíveis de uma
organização do conhecimento equivale a um oceano recém-descoberto, que
ainda não consta do mapa. Entender suas dimensões e navegá-lo é uma
exigência para os gerentes e executivos neste novo século.

Os componentes do custo de um produto são hoje, em grande parte,


P&D, ativos intelectuais e serviços. O custo da produção do conhecimento está
muito menos relacionado a seu valor ou preço do que o custo da produção, por
exemplo, de uma tonelada de aço. Assim, os dados sobre custo têm um valor
limitado quando produtos intangíveis podem ser vendidos de formas diferentes,
levando alguns a ignorar, equivocadamente, as medidas de ativos intangíveis
na contabilidade das empresas. De fato, as discussões quanto à forma de
incluí-los devem ser levadas a efeito.

Estender o trabalho de gestão do conhecimento a áreas menos definidas


e mais valiosas dos ativos intangíveis – “arte e know-how”, habilidade técnica,
segredos comerciais – deve ser um objetivo de longo prazo.

5.4.1 Geração de Riqueza pelos Ativos Intangíveis

Há uma diferença abissal entre afirmar que a inteligência é o ativo mais


importante da organização e transformar esse insight em planos e estratégias
que levem a um melhor desempenho.
Definido por David Klein e Laurence Prusak e citado por Stewart (1998),
o seguinte enunciado sobre ativos intangíveis nos permite distinguir entre uma
pilha de tijolos e uma fábrica: “Ativos intangíveis - material intelectual que foi
formalizado, capturado e alavancado a fim de produzir um ativo de maior valor”.

Na abordagem sobre inteligência proposta por Klein e Prusak, a


inteligência torna-se um ativo quando se cria uma ordem útil a partir da
capacidade intelectual geral, ou seja, quando assume uma forma coerente
(banco de dados, descrição de um processo); quando capturada de uma forma
que permite que seja descrita, compartilhada e explorada; e quando pode ser
aplicada a algo que não poderia ser realizado se continuasse fragmentado
como moedas em um bueiro. Os ativos intangíveis são os conhecimentos
úteis em nova embalagem.

5.4.2 Reconhecimento, Busca e Formalização do Conhecimento

Segundo a visão construtivista, é falsa a ideia de que podemos


hierarquizar, de forma generalizada, o conhecimento: de dados à sabedoria. O
que é conhecimento para uma pessoa são dados para outra, até que se
processe a sua socialização, explicitação, combinação e internalização. O
contexto da estratégia é o que justifica o cultivo dos ativos do conhecimento.

Em uma era de mudanças espantosamente rápidas, é importante


separar informações triviais e transitórias dos importantes ativos intelectuais. A
citação comumente encontrada de que metade do que um calouro de
engenharia aprende ao entrar na faculdade estará obsoleta quando ele se
formar é falsa. Há uma confusão entre dados e conhecimentos, o que
equivaleria a dizer, na era industrial, que matéria-prima e estoque são ativos de
capital.

Os ativos intangíveis assumem apenas duas formas:

1. Arcabouço semipermanente de conhecimento (expertise) que


cresce em torno de uma tarefa, pessoa ou organização –
conhecimento do funcionamento do corpo humano, por exemplo;
2. As ferramentas que aumentam o arcabouço de conhecimento –
dados, fatos, informações.
A dificuldade de identificar o conhecimento tácito não deve ser uma
barreira, já que parte significativa da vantagem competitiva de uma
organização recai sobre ele. Uma organização que esteja envolvida na
avaliação de ideias de novos produtos necessitará investir pouco tempo e
recursos em pesquisa de mercado, tendo em vista a facilidade interna quanto
ao reconhecimento instintivo das necessidades do cliente e de como gerá-las.
Esse tipo de conhecimento, como vimos, só se dissemina quando as pessoas
se encontram ou empreendem esforço sistemático para descobri-lo e torná-lo
explícito. O exemplo dado por Stewart (1998) aplica-se no entendimento
desses aspectos: o e-mail e a telecomunicação servem para lidar com o
conhecimento explícito, mas não podem transmitir o conhecimento tácito. Se
você estiver no piloto automático e o mundo mudar, você está “frito”.

Este é um ciclo – a espiral do conhecimento – que nunca termina:


identificar o conhecimento tácito; explicá-lo permitindo que seja formalizado,
capturado e alavancado; estimulá-lo para que o novo conhecimento tome
impulso e torne-se tácito.

Assim, o investimento em pessoas inteligentes ou o seu gerenciamento


deve priorizar as ações de identificação e, em seguida, as ações de conversão:

1. Ativos intangíveis só existem se houver propósito e ponto de vista


– estratégia;
2. Grande parte dos ativos intangíveis é tácita, só formalizada,
capturada e alavancada por meio dos processos de conversão.

A localização dos ativos intangíveis de uma organização está nas


pessoas e nos seus relacionamentos, internos e externos. Distinguir
competência individual de competência organizacional é fundamental para a
gestão do conhecimento. A importância da competência está na fonte de
inovação e renovação. Entretanto, organizações como as universidades –
repletas de pessoas competentes – não são um exemplo de brilho coletivo,
pois o fluxo de conhecimento é pequeno. A rede de lanchonetes McDonald’s
possui um fluxo intenso de conhecimento capaz de oferecer a mesma
qualidade de seus hambúrgueres em diversas culturas.
Os relacionamentos internos são fundamentais para que se consiga
compartilhar e transmitir o conhecimento. Alguns exemplos são: sistemas de
informação, laboratórios, inteligência competitiva e de negócios, conhecimento
dos canais de mercado, e outros, que compõem a propriedade de um grupo a
partir da transformação do know-how individual. Tanto quanto a competência
individual, os relacionamentos internos exigem uma estratégia, um propósito.
Assim, a capacidade organizacional de suprir as exigências de mercado são os
ativos intangíveis da organização. Os relacionamentos internos funcionam
como uma espécie de amplificador, impulsionam a competência das pessoas e
permitem seu uso repetido para a criação de valor. O valor dos
relacionamentos de uma empresa com as pessoas com as quais faz negócios
constitui o que a literatura de aeroporto designa de capital do cliente. A
combinação de definições citadas por Stewart (1998) resulta em: profundidade
(penetração), amplitude (cobertura) e devoção (lealdade), que aumentam a
probabilidade de que nossos clientes continuem fazendo negócios com a
organização. A forma máxima do capital do cliente é o conhecimento
compartilhado. Assegurar que o relacionamento com os clientes seja o melhor
possível torna viável que vendedor e comprador, clientes e fornecedores
(PORTER, 1990) compartilhem planos e expertises.

O intercâmbio entre essas três modalidades – competência das pessoas


e seus relacionamentos internos e externos – é que forma os ativos intangíveis
de uma organização. Stewart (1998) menciona que se começa pelas pessoas.
Todavia, de nada vale um sábio isolado em uma sala: é preciso
relacionamento.

5.4.3 Pessoas: um Ativo Fundamental na Criação do Conhecimento

Provar o valor da competência das pessoas é desnecessário. Entretanto,


descobrir quem é quem é fundamental: algumas pessoas são ativos muito
valiosos, outras só representam custos. Separar sentimento de objetividade,
planejar o aumento dessa forma de ativos intangíveis, e entender que a
organização nunca terá propriedade sobre ele são ações que devem ser
perfeitamente entendidas pela gerência.
Segundo Stewart (1998), ter ideias é uma característica nata do ser
humano, que não requer treinamento nem educação especiais. De fato, o ser
humano, aos dois anos de idade, tem e coloca em prática muitas ideias quando
está sozinho. O desafio da gerência está no desenvolvimento organizado de
ideias construtivas.

Segundo o autor, pesquisas mostram que, ao incrementarmos a


instrução da força de trabalho em 10%, induzimos um aumento no fator de
produtividade em cerca de 9% em média. Se o mesmo incremento de 10%
residir nas ações representativas do capital (equipamentos, por exemplo), a
elevação da produtividade não chegará a 4%. Frases como “o dinheiro tem
poder, mas não pensa” e “as máquinas operam muitas vezes melhor do que
qualquer ser humano, mas não inventam“ compõem uma imagem pragmática
dessas constatações.

Em termos organizacionais, a questão é: “Como adquirir volume


suficiente de competência humana a ser utilizada para gerar lucro?”. Se a meta
é inovar – novos produtos/serviços ou melhoria nos processos de negócios –,
exige-se crescimento da competência individual. Este crescimento se dá
quando a empresa utiliza mais o que as pessoas sabem ou quando um número
maior de pessoas sabe mais coisas úteis para a organização. Esse processo
se inicia por meio da eliminação das tarefas irracionais, inúteis e burocráticas
bem como das competições internas.

A literatura ilustra que a “taylorização” do ambiente de trabalho


promoveu a destruição de equipes inteiras de profissionais. Usar a inteligência
de forma ineficiente representa a condenação da empresa na era do
conhecimento. Impor à chefia a tomada de posições claras quanto às ideias
desenvolvidas pela equipe, no âmbito das mudanças nos processos de
trabalho, é uma forma de começar a otimizar a competência de que dispomos.
Criar um “lugar” onde essas ideias possam ser trocadas sem hierarquia é um
bom começo. Esse procedimento significa tornar público o conhecimento
privado.

Por meio de contratação ou da capacitação do pessoal existente, os


gerentes do conhecimento precisam focalizar e acumular talento onde
necessário, a partir do planejamento estratégico da organização.
Adicionalmente, a inteligência organizacional deve ser cultivada no âmbito das
ações. Só doutor não resolve. Para que façam diferença, é preciso que estejam
associados ao contexto integral dos ativos intangíveis, ou seja: +
relacionamentos internos e + relacionamentos externos.

Encontrar e ampliar os talentos que de fato constituam habilidades


começa pela diferenciação existente entre elas (STEWART, 1998):

 habilidades commodity - não são específicas de um negócio e


podem ser prontamente adquiridas (digitação, manutenção de ar
condicionado e outras);
 habilidades alavancadas - conhecimento que, embora não
específico a uma determinada empresa (setor), é mais valioso
para ela do que para outras (programadores de empresas de
informática são mais importantes para elas do que para bancos
ou outras empresas; um advogado para uma empresa de
advocacia etc.);
 habilidades proprietárias - talentos específicos à empresa em
torno dos quais uma organização constrói seu negócio (patentes,
direitos, expertise em geral).

Já Leitão (1995) classifica as habilidades de uma outra forma, no âmbito


do processo de administração estratégica: técnicas, humanas e conceituais:

1) Habilidades técnicas:

 refere-se à competência do gerente em usar tecnologias para


desenvolver as tarefas da empresa;
 através dessas habilidades, o gerente trabalha com coisas;
 ele se preocupa com o que é feito.

2) Habilidades humanas:

 refere-se à competência em trabalhar com pessoas para alcançarem


objetivos;
 através dessas habilidades o gerente trabalha com pessoas;
 ele se preocupa com o como alguma coisa é feita.
3) Habilidades conceituais:

 refere-se à competência para entender as complexidades da


empresa, à medida que ela afeta e é afetada pelo meio ambiente;
 através dessas habilidades, o gerente trabalha com a empresa como
um todo;
 ele se preocupa com o porquê alguma coisa é feita.

5.4.4 Classificação da Força de Trabalho quanto à Criação do Conhecimento

Fácil de substituir, pouco valor agregado: mão de obra especializada


ou semiespecializada; o sucesso da organização não depende desses
indivíduos.

Difícil de substituir, pouco valor agregado: pessoas que aprenderam


um conjunto de operações difíceis, mas que não dão as cartas; algo
difícil de substituir, mas não são com as atividades delas que os clientes
estão preocupados.

Fácil de substituir, muito valor agregado: realizam tarefas que os


clientes valorizam muito; muitos são descartáveis.

Difícil de substituir, muito valor agregado: pessoas que


desempenham papéis insubstituíveis na organização. Como esses
indivíduos são praticamente insubstituíveis, a maioria deles não ocupa
cargos altos na hierarquia da organização.

A gerência de uma organização do conhecimento deve focalizar as


seguintes ações, de forma a otimizar o desempenho de cada um desses
grupos ou do negócio, conforme representado no quadro 7:

a) automatizar o trabalho que os clientes não valorizam e cujas


habilidades sejam de fácil substituição;

b) informar o trabalho, isto é, modificá-lo de forma a agregar mais valor de


informação, que se traduzirá em benefício para os clientes;

c) terceirizar o trabalho relacionado a uma expertise não prioritária;


d) diferenciar é encontrar formas de transformar o conhecimento genérico
em algo que diferencie a empresa das outras;

e) capitalizar investindo para sair na frente, não para correr atrás; tornar-
se menos vulnerável aos concorrentes, incentivando habilidades
específicas; pessoas que sabem como proporcionar vantagem
competitiva.

Quadro 7 - Classificação da Força de Trabalho quanto à


Criação do Conhecimento

A gerência que cuida do desenvolvimento do capital humano – interesse


das organizações do conhecimento – deve reconhecer o erro mais comum e
caro em termos de negócios, a correlação aprendizado: treinamento e
educação. Num ambiente de rápidas mudanças, é obrigatória a implantação
dos modelos de competência, que, na verdade, descrevem as capacidades
que os clientes esperam das pessoas com as quais operam. A
responsabilidade por aperfeiçoar o que já sabem e aprender o que ainda não
sabem deve ser de cada um. A empresa deve medir os efeitos, não a
participação; medir um resultado, não um custo; medir uma habilidade
aprendida, não uma cadeira ocupada.

Quinn (1998) aborda com propriedade a interface serviços-indústria,


focalizando a alavancagem de estratégias baseadas em conhecimento e em
serviços por meio da terceirização. O autor ilustra as interações serviços-
manufatura a partir da fundamentação nos próprios produtos, considerada
incorporações físicas do conhecimento e do serviço que prestam: “As pessoas
que compram brocas não querem brocas, querem furos” (Teodore Levitt).

Relacionar aprendizado individual e capital humano, atentando para sua


capacidade de inovar, revela que esse aprendizado é uma atividade social e,
portanto, só ocorre em grupos. A distorção dessa constatação foi discutida em
estudos recentes. Segundo Stewart (1998), não se pode pegar uma dezena de
pessoas aleatoriamente, dar-lhes uma xícara de café e alguns bolinhos e
esperar que aprendam alguma coisa. A estruturação das chamadas
comunidades de prática tem que ocorrer por consenso, e não por decreto.
Grupos de pessoas que cooperam de forma direta sondam-se mutuamente,
ensinam umas às outras, exploram juntas um novo assunto. As comunidades
de prática constituem-se em estruturas de significativa importância nas
organizações do conhecimento. Tidas como as oficinas do capital humano e
o lugar onde as coisas acontecem, essas comunidades possuem
características que nos permitem reconhecer sua existência e entender a
oportunidade de “incentivar” seu surgimento, considerando que sua existência
contribui significativamente na formação do capital humano (transferência do
conhecimento e inovação). Entre suas principais características, cabe citar:

1. Têm história - desenvolvem-se ao longo do tempo;


2. Possuem um empreendimento, não uma agenda - tentativa de agregar
valor;
3. O empreendimento envolve aprendizado - desenvolvem-se culturas e
costumes;
4. São voluntárias - ninguém as possui; as fronteiras existem para ser
cruzadas.

É importante notar que, apesar de a gerência de uma organização do


conhecimento não exercer suas funções nas comunidades de prática, a ajuda
ao seu desenvolvimento pode se dar de várias formas:

 reconhecer sua existência e importância;


 facilitar o acesso aos recursos de que necessitam;
 fertilizar o ambiente, sem interferir.
A criação do conhecimento gerada pelo trabalho conjunto de pessoas
resulta em agregação de valor que vale mais do que a soma de seus esforços
individuais. Assim, o estímulo às comunidades de prática por meio do
reconhecimento, da disponibilização de recursos, tais como redes intra e inter-
organizacionais, dentre outras ações, contribui significativamente para a
criação do conhecimento organizacional. Por meio de mecanismos desse tipo,
a gerência estará estimulando o desenvolvimento de comunidades intelectuais
em áreas onde a expansão das vantagens competitivas é fundamental. O brilho
de uma comunidade de prática está na socialização do conhecimento.
Entretanto, frisa Stewart, se a fonte principal de satisfação profissional de sua
empresa for aprender a fazer queijo, dificilmente a organização conseguirá
mantê-las oferecendo-lhes apenas a oportunidade de construir uma ratoeira
melhor.

Na era do conhecimento, a tradicional gestão de recursos humanos tem


pouca influência. É preciso investir em expertise específica à empresa, de alto
valor, em áreas como definição de fronteiras e competências essenciais. O
desenvolvimento de sistemas de remuneração não deve ser esquecido,
incluindo os planos de propriedade acionária. Peter Drucker diz: “[...] o
verdadeiro investimento na sociedade do conhecimento não é em máquinas e
ferramentas, mas no conhecimento do trabalhador do conhecimento […]”.
REFERÊNCIAS

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Administração Pública. Brasília: IPEA, 2012.
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& KRATHWOHL, David R. Taxonomia de objetivos educacionais: domínio
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RESENDE, Enio. O livro das competências: desenvolvimento das
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TAYLOR, Frederick Winslow. Princípios da Administração Científica. São
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ZARIFIAN, Philippe. Objectif compétence: pour une nouvelle logique. Paris:
Editions Liaisons, 1999.

Professor Neri dos Santos, Dr. Ing.

Graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal de Santa


Catarina (1976), Especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho
pela Universidade Federal de Santa Catarina (1977), Mestrado em Ergonomia
pela “Université de Paris XIII (1982)” – França, Doutorado em Ergonomia da
Engenharia pelo “Conservatoire National des Arts et Metiers” (1985) – França e
Pós-doutorado em Engenharia do Conhecimento pela “École Polytechnique de
Montréal – Canadá”. Atualmente é professor honorário do Departamento de
Engenharia do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina e
Diretor Técnico da Knowtec – Inteligência para a Inovação.

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