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X Seminário Nacional Sociologia & Política

América Latina hoje: rupturas e continuidades


GT 13 - Sociologia e Políticas Sociais

POLÍTICA SOCIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO PENSAMENTO SOCIAL


BRASILEIRO PARA PENSAR O SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL.

Angela Elizabeth Ferreira de Assis1


Liduina Farias Almeida da Costa2

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual do Ceará


(UECE), Fundação Cearense de Apoio e Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP), E-mail:
angelappgs@gmail.com.

2Doutora em Sociologia, com Pós - Doutorado também em Sociologia pela Universidade Federal do
Ceará (UFC), Professora Associada da Universidade Estadual do Ceará (UECE), com inserção docente
no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e no Programa de Pós-Graduação em Políticas
Públicas, E-mail: liduinafariasac@gmail.com.
POLÍTICA SOCIAL NO BRASIL: AS CONTRIBUIÇÕES DO PENSAMENTO SOCIAL
BRASILEIRO PARA PENSAR O SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL.

RESUMO: No atual contexto, marcado por grandes transformações socioculturais,


econômicas e políticas, o Brasil representa ainda um desafio para aqueles que se
debruçam sobre os processos que deram origem ao sistema de proteção social
brasileiro e ao longo dos anos, moldaram as concepções acerca da seguridade e os
direitos sociais da população. Nessa perspectiva, embora seja comum caracterizar as
políticas sociais como ações e programas estabelecidos e executados pelo aparato
estatal, regendo diferentes instâncias da vida a fim de garantir as condições básicas
para subsistência dos seus cidadãos, na busca por promover o bem estar da
população, essas políticas se constituem através de processos diferenciados e
dependem das condições estruturais presentes no contexto em que elas se
desenvolvem, sendo necessária uma maior compreensão sobre a formação da
sociedade em que estão inseridas. Objetivando identificar as contribuições teóricas e
metodológicas do pensamento social brasileiro para compreender o surgimento e
desenvolvimento do sistema brasileiro de proteção social, o presente trabalho resulta
da pesquisa bibliográfica que dará suporte à dissertação de mestrado em elaboração
no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual do Ceará.
Destacando as principais tentativas de interpretação da formação sociocultural,
econômica e política do Brasil nos séculos XIX e XX, é possível identificar os pilares
sobre os quais a proteção social se desenvolve no Brasil, na medida em que há a
emergência de novas estruturas sociais durante os processos de colonização, o
período escravocrata e a modernização do país. Como resultado, destacamos que os
quadros políticos e administrativos construídos sobre esses momentos históricos,
perpetuaram relações de poder que até hoje são exercidas na forma de dominação
política sob uma perspectiva patrimonialista, como ferramenta de barganha eleitoral
ou tendo caráter de favor. Em outras palavras, a proteção social no Brasil se consolida
sobre a ótica de interesses privados, tendo a gestão estatal como instrumento de
interesses particulares e nem sempre tendo como prioridade atender às demandas e
garantir os direitos sociais em sua totalidade.

Palavras-chave: Pensamento Social, Política Social, Proteção Social.


INTRODUÇÃO

Embora seja comum conceituar as políticas sociais como ações e programas


estabelecidos e executados pelo aparato estatal, regendo diferentes instâncias da
vida a fim de garantir as condições básicas para subsistência dos seus cidadãos,
promovendo o bem estar da sua população, essas políticas se constituem através de
processos diferenciados e dependem das condições estruturais presentes no contexto
em que elas se desenvolvem, sendo necessária uma maior compreensão sobre a
formação da sociedade em que estão inseridas.

Entendendo o “social” como um conjunto de mediações que se estabelecem


entre as dimensões econômica, política e cultural, as perspectivas que vamos
apresentar a seguir nos permite compreender as políticas sociais como um processo
em curso, e que a sua definição no sentido prático depende do contexto cultural e
histórico específico em que elas se inserem.

Souza (2007) pontua que o processo de formulação de política pública ocorre


a partir dos governos traduzindo seus propósitos em programas e ações, que
produzirão resultados ou as mudanças desejadas no mundo real, ou seja, o espaço
de atuação que cabe aos governos, concebendo que estes possuem uma relativa
autonomia. Porém, é necessário destacar que a autora chama atenção para outros
segmentos além dos governos, que estão envolvidos na formulação e implementação
de políticas públicas, tais como os movimentos sociais, por exemplo.

Para ela, a análise de políticas públicas,

[...} embora seja um processo complexo que requer compreensão abrangente


e capacidade teórico-empírica, não só do tema que será objeto da análise,
mas também dos seus processos e dos conflitos envolvidos desde o seu
início, é ferramenta crucial para o melhor entendimento sobre por que e como
o governo enfrenta ou deixa de enfrentar determinado problema. (SOUZA,
2007, p. 14)

Nessa perspectiva, Cortes (2011) apoia-se na teoria sociológica em busca de


contribuições para pensar esses segmentos que envolvem a relação entre Estado e
Sociedade. Para a autora, a sociologia proporciona uma visão que nas análises de
políticas públicas se volta para o polo societal, entendendo as relações políticas entre
grupos e instituições sociais. Por meio dessa abordagem é possível pensar as várias
dimensões e atores presentes numa sociedade e que constituem as políticas como
um sistema, sendo eles coletivos, movimentos sociais ou simplesmente atores sociais
ou de mercado.

A partir dessas postulações, percebemos que há um consenso com relação ao


fato de não haver uma definição única para o que sejam as políticas públicas sociais
e o sistema de proteção social como um todo, mas em muitas dessas definições
apresentadas chamam atenção para a função de “solucionar problemas” que é
atribuída às políticas públicas. Além disso, devemos pontuar que há também uma
certa dificuldade em definir e diferenciar as políticas públicas das políticas sociais.

Souza (2007) nos dá um panorama acerca das principais definições que


permeiam essa discussão. Para uma melhor compreensão, em seu trabalho, a autora
sistematiza aqueles denominados os pais fundadores da área de políticas públicas e
as suas contribuições para o que hoje compreendemos como políticas públicas.

Dentre eles, são destacados H. Laswell, H. Simon, C. Lindblom e D. Easton,


autores que, segundo ela, contribuíram para: conciliar conhecimento
científico/acadêmico com a produção empírica dos governos; compreender as
limitações dos decisores públicos; a incorporação de outras variáveis à formulação e
análise de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração entre as
diferentes fases do processo decisório; compreender as políticas sociais como um
sistema numa relação entre formulação, resultados e o ambiente; respectivamente.

Para Leite (2004), nesse sistema a dimensão pública da vida cotidiana


relacionada a processos interacionais no espaço urbano da cidade como “resultado
convergente de distintas influências formais e cotidianas” são aspectos que também
dão origem e fazem parte do desenvolvimento das políticas públicas sociais.
Trazendo para essa discussão a noção de espaço público urbano é destacada,
sendo este entendido e representado como “uma vida que se passa fora da vida da
família e dos amigos íntimo; na região pública, grupos sociais complexos e díspares
teriam que entrar em contato inelutavelmente” (SENNETT, 1999), podemos dizer que
é a partir das interações no espaço público que há o reconhecimento da alteridade e
que são construídos os dispositivos que regulam e mediam a vida social. Sendo assim,
a construção dos direitos e a sua garantia por meio das políticas dependem desses
processos.

Em outras palavras,

[...] isso está a depender da constituição de espaços públicos nos quais as


diferenças podem se expressar e se representar em uma negociação
possível; espaços nos quais valores circulam, argumentos se articulam e
opiniões se formam; e nos quais, sobretudo, a dimensão ética da vida social
pode se constituir em uma moralidade pública através da convivência
democrática com as diferenças e os conflitos que elas carregam [...]
(TELLES, 1994, p. 92).

Castro (2012), a necessidade de compreender melhor o que são as políticas


sociais e como elas se constituem fica ainda mais evidente quando percebemos que
a política social de um determinado país está diretamente relacionada com o seu
processo de formação enquanto sociedade e é uma fonte significativa de sustentação
do seu desenvolvimento.

Para ele,

De acordo, portanto, com as condições históricas estruturais de cada país e


sua situação e contexto presente, o formato e a amplitude da implementação
dos elementos geradores da seguridade social e igualdade de oportunidade
e de resultado vão ter influência direta na direção tomada pela política social,
trazendo como resultante a ampliação da justiça social e a coesão social
possíveis no país, o que pode representar maior equidade. (CASTRO, 2011,
p. 1015).

Assim, o desenvolvimento de um Estado Nação, numa perspectiva mais


abrangente, envolve muito mais do que apenas o campo econômico, e inclui também
elementos da política, do social e ambiental, ele argumenta que a política social,
principalmente quanto à ampliação das habilidades, seria um elemento central para o
aumento da inovação e produtividade do trabalho e para o crescimento econômico. É
nesse sentido que a formação da sociedade brasileira é crucial para compreender
sobre o que queremos dizer quando falamos de políticas sociais como parte do
sistema de proteção social, para isso, o pensamento social brasileiro nos fornece
formas de interpretação da sociedade que nos dizem muito sobre a forma como esse
sistema se desenvolve.

Objetivando identificar essas contribuições teóricas e metodológicas do


pensamento social brasileiro para compreender o surgimento e desenvolvimento do
sistema brasileiro de proteção social, o presente trabalho resulta da pesquisa
bibliográfica que dará suporte à dissertação de mestrado do Programa de Pós-
Graduação em Sociologia da Universidade Estadual do Ceará.

A discussão apresentada destaca as principais tentativas de interpretação da


formação sociocultural, econômica e política do Brasil nos séculos XIX e XX,
pontuando os pilares sobre os quais a proteção social se desenvolve no Brasil, na
medida em que há a emergência de novas estruturas sociais durante os processos de
colonização, o período escravocrata e a modernização do país.

AS CONTRIBUIÇÕES DO PENSAMENTO SOCIAL BRASILEIRO

Tendo como plano de fundo um contexto marcado por grandes transformações


socioculturais, econômicas e políticas, o sistema brasileiro de proteção social
representa ainda um grande desafio para aqueles que se debruçam sobre os
processos envolvidos na sua formação e desenvolvimento. A multiplicidade de
processos que constituíram a sociedade brasileira corresponde à riqueza de
abordagens que buscaram interpretar esses fenômenos em torno das políticas
sociais.
Buscando sintetizar e sistematizar as contribuições de alguns dos principais
autores clássicos da sociologia brasileira através das suas matrizes teóricas e
métodos para uma interpretação da sociedade, suas raízes socioculturais e políticas;
passando pelo processo de colonização, o período escravocrata e a modernização do
país, nos focaremos em constituir um plano geral sobre as principais tentativas de
interpretação dessa formação que nos ajudam a compreender como se constituíram
as políticas sociais no Brasil e de que forma elas se expressam atualmente.

Dando início a essa discussão, devemos ressaltar que aspectos socioculturais


herdados pelo processo de colonização e tradição escravocrata são cruciais para
compreendermos as posturas distintas dos autores que veremos a seguir,
considerando que a interpretação da sociedade brasileira em sua formação perpassa
desde as condições geradas pela colonização portuguesa até o processo de
modernização do Brasil e os dias atuais.

Partindo do processo de colonização, tomamos como base Sérgio Buarque de


Holanda (2014) que apresenta uma forma de interpretação da sociedade brasileira em
sua formação através dos modos de expressão da vida social dos brasileiros,
demonstrando como se constituí a vida política dos brasileiros por meio das condições
que foram geradas justamente pela colonização portuguesa.

Através da sua obra, a exploração dos trópicos é concebida numa perspectiva


em que esta teria se dado de maneira “desleixada” e que o processo de colonização
teria se dado de forma indisciplinada. A partir daí, as heranças desse processo
recebem uma atenção maior na tentativa de desvendar o “problema” do Brasil.

Apesar de Sérgio Buarque de Holanda constituir sua obra sob a ótica


weberiana, não podemos negar que a sociologia brasileira se constitui ainda sob
influência dos moldes europeus, especificamente da França, numa perspectiva
positivista em que comparava as leis que dominam o mundo físico-químico e o mundo
social: a lei do progresso. Assim, cabia ao sociólogo o papel de interpretar os aspectos
da vida social a ponto de perceber o sentido para qual a sociedade evolui. Restava
aos sociólogos brasileiros desvendar os problemas dessa sociedade e indicar o
caminho ao qual essa nação estaria direcionada.

O autor nos fornece uma interpretação sobre a formação da sociedade


tradicional brasileira e da identidade nacional a partir da emergência de novas
estruturas políticas e econômicas, demonstrando que somos uma sociedade que
desde a sua formação apresenta pouca organização social com uma estrutura política,
econômica e social completamente instável e constituída por famílias patriarcais e
escravagistas, fazendo com que esta recorra ao uso da violência e ao domínio
personalista.

Essa concepção remete às postulações de Oliveira Vianna (2005) sobre o


Estado brasileiro, sendo este formado por diversas sociedades, seria mais vantajosa
uma forma de organização com mais autonomia para esses grupos, já que a
sociedade brasileira não criou um vínculo coletivo capaz de constituí-la como nação,
em que o poder privado predomina e impede a formação de uma sociedade brasileira
homogênea, a sociedade tem sua formação independente do estado não reconhece
a autoridade do estado, com o individualismo anárquico na base do seu
comportamento.

Nesse sentido, podemos destacar ainda o pensamento de Caio Prado Junior


(1961), compreendendo a realidade nitidamente marcada por uma transformação
permanente, introduzindo ainda a discussão sobre a história no método sociológico,
tem como base a transição entre a Colônia e a Nação, assim como da relação que
existe entre esses dois momentos históricos para a constituição da sociedade
brasileira. Para ele, os elementos que constituíram esse processo histórico e que
perduram até hoje, no caso: a presença do passado colonial em todas as dimensões
(geográfica, econômica, social e política) do Brasil de sua época, se voltando para os
primórdios do processo de colonização, as motivações e condições que tornaram esse
processo possível.
Dialogando com a obra de Raymundo Faoro (2001), percebemos que há uma
preocupação em demonstrar as forças que impuseram ao nosso país algumas de suas
características com relação a sua formação social e política atual, tomando como
ponto de partida as guerras de reconquista e de ordenação do reino de Portugal para
demonstrar as origens do patrimonialismo brasileiro.

Nessa perspectiva, o Estado brasileiro sempre esteve a serviço do que


podemos chamar de os “donos do poder”. Sendo inicialmente os próprios reis
portugueses, depois os imperadores, posteriormente os militares positivistas da
República Velha e assim sucessivamente ao longo toda a sua história.

Podemos destacar ainda que os quadros políticos e administrativos, do ponto


de vista de Raymundo Faoro, historicamente se perpetuaram no poder exercendo
uma forma de dominação política sob uma perspectiva patrimonialista, ou seja,
exercendo administração pública conforme os seus interesses privados, o que de
certa forma retoma à discussão proposta na obra de Sérgio Buarque de Holanda a
respeito da gestão política que apresentava-se como assunto de interesse particular
e a forma como as esferas pública e privada eram separadas por uma linha tênue e
por vezes confundidas.

Além disso, devemos destacar ainda a segregação racial como um elemento


essencial para a formação da sociedade brasileira, o longo período escravocrata tem
suas implicações no modo como se deu a inserção do negro nessa sociedade, além
dos papeis sociais que lhe foram destinados.

Joaquim Nabuco (1999) nos mostra como a escravidão como um sentido de


grande amplitude, que não se restringe à relação entre escravo e senhor. Sua
concepção a respeito da escravidão como uma instituição total se refere aos diversos
aspectos que constituem esta relação, como a influência, o capital, o feudalismo
instituído no interior, a religião e tudo aquilo que está sujeito ao poder da minoria
aristocrática da época.
Florestan Fernandes (1978) fazendo uma crítica a ideia de democracia racial,
coloca essa ideia de democracia como uma falsa ideologia sobre a realidade social
do negro que, através do regime escravista, não foi preparado para agir como um
trabalhador livre e é integrado à nova ordem como uma figura subalterna.

Deste modo, o autor nos fala desse processo de integração principalmente a


partir da figura da mulher negra. Para ele, a mão de obra não qualificada do homem
negro não tinha como competir com a mão de obra europeia que chegava cada vez
mais no país, assim, a figura da mulher, ainda sob os moldes escravistas, é quem tem
maior “sucesso” nesse novo mercado de trabalho, prestando serviços domésticos.

Aqui, destacamos ainda a obra de Nísia Floresta (1989) para compreender


como são apresentados os papeis sociais destinados aos homens e as mulheres e as
representações que são construídas a respeito desses papeis. No caso das mulheres,
o valor que é atribuído não corresponde à importância da sua função e assim acabam
recebendo pouco reconhecimento e respeito pelos serviços que prestam. Esse pouco
reconhecimento se daria também pelo fato de que as mulheres seriam mais
capacitadas para as funções que desempenham como “educadoras” e assim são
colocadas como seres que foram criados única e exclusivamente para desempenhar
esse papel, seus talentos são restritos à obediência bem como à servidão.

Trazendo para as últimas décadas, destacando o período de transição


democrática situado entre as décadas de 80 e 90, no contexto de ajustes estruturais,
é possível notar diversas mudanças no que se referem às relações entre o Estado e
a sociedade na América Latina como um todo, principalmente em países ditos
periféricos, na tentativa de se adequar às demandas do mercado globalizado e,
consequentemente, repercutindo sobre a ação coletiva do Estado frente às demandas
sociais e as políticas empregadas para satisfazer aquelas que são consideradas as
necessidades básicas da população.
Nos países latino-americanos esse momento é caracterizado, principalmente,
pela ampliação do espaço público que se dá por meio da crescente mobilização e
participação da sociedade e também pela integração das economias nacionais, a
chamada globalização, que somados, esses dois aspectos dentre outros contribuem
para o que IVO (2001) chama de crise de governabilidade.

Segundo a autora, em meio ao ritmo acelerado das transformações, o Estado


encontra dificuldades em processar os interesses sociais que emergem desse
processo, não atendendo às expectativas de conseguir conciliar o desenvolvimento
econômico com o bem-estar social da população, criando tensões e fazendo com que
o Estado perca progressivamente sua legitimidade pelo polo societário.

Dito de outra forma, há um esgotamento do que seria o pacto corporativo que


legitima o poder político do Estado, trazendo novas configurações de forças sociais
tanto internas como externas, além de novos atores sociais que através das suas
reivindicações evidenciam a incapacidade de respostas às demandas políticas e
sociais.

Trazendo para o contexto brasileiro nitidamente marcado por desigualdades, a


autora destacada que os dilemas da governabilidade seriam “manter a ordem jurídica
e política baseada no princípio da igualdade básica entre cidadãos num contexto de
ampliação dos direitos políticos” (IVO, 2001, p.44).

Para isso, o sistema de proteção social no Brasil teria passado por um processo
de reconversão para acompanhar as mudanças resultantes da reestruturação
produtiva e da globalização, resultando no tratamento da questão social em termos
de “medidas mitigadoras setorializadas e focalizadas da pobreza, dentro de um
modelo excludente” (IVO, 2001, p.44), em outras palavras, a centralidade da política
com caráter redistributivo teria sido deslocado para tratar a miséria de modo a
compensar os seus efeitos, aderindo até mesmo às soluções coercitivas e autoritárias.
Daligno (2004), explica que o processo de construção democrática no Brasil
enfrenta hoje no Brasil um dilema, por um lado, ocorre o processo de alargamento da
democracia, que se expressa na criação de espaços públicos e na crescente
participação da sociedade civil nos processos de discussão e de tomada de decisão
relacionados com as questões e políticas públicas, por outro lado, haveria a
emergência de um projeto de Estado mínimo que se isenta progressivamente de seu
papel de garantidor de direitos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As obras e autores destacados nesse trabalho fornecem uma interpretação


sobre a formação da sociedade brasileira e da identidade nacional a partir da
emergência de novas estruturas políticas e econômicas, sendo a partir de heranças
coloniais, escravagistas ou indígenas, buscamos apresentar aqui as origens dos
problemas nacionais segundo os clássicos. Para cada um desses problemas são
apresentadas também formas de superação que não foram mencionadas neste
trabalho, seja por meio da revolução ou de reforma das instituições, os autores
propõem meios de romper com o passado colonial e escravocrata do país rumo a uma
modernidade.

No esforço em demonstrar o percurso do sistema de proteção social se


constituindo e consolidando no Brasil, temos ainda o esforço em compreender o
percurso da nossa própria formação enquanto sociedade.

Como resultado, destacamos que os quadros políticos e administrativos


construídos sobre esses momentos históricos, perpetuaram relações de poder que
até hoje são exercidas na forma de dominação política sob uma perspectiva
patrimonialista, como ferramenta de barganha eleitoral ou tendo caráter de favor. Em
outras palavras, a proteção social no Brasil se consolida sobre a ótica de interesses
privados, tendo a gestão estatal como instrumento de interesses particulares e nem
sempre tendo como prioridade atender às demandas e garantir os direitos sociais em
sua totalidade.

Mesmo com avanços nas legislações e políticas, elas ainda estão longe de
assegurar de fato os direitos sociais da população, até porque as políticas neoliberais
assumem um caráter precarizado e privatizado que, de certa forma, também
interferem nessas dinâmicas. Além disso, outro aspecto que devemos destacar é que
nas grandes cidades atuais há pouca oportunidade espacial para a convivência de
modo a permitir o exercício efetivo das relações sociais na construção dessas
políticas.

Apesar de termos deixado de lado muitos dos autores, reconhecendo a


superficialidade com abordamos as suas contribuições, acreditamos que o objetivo
principal de apresentar os principais pressupostos teóricos e metodológicos e
conceitos chave que nortearam as discussões sobre as políticas sociais foi cumprido.
Com isso, admitimos que ainda há um longo caminho a ser percorrido para
compreendermos a multiplicidade de fenômenos que constituíram a sociedade
brasileira e este trabalho apresenta apenas uma perspectiva inicial de como podemos
compreender esses processos.

Com isso, deixamos como aprendizado a necessidade de um maior


aprofundamento sobre a construção de um espaço público urbano que permita a
participação efetiva dos indivíduos nesse espaço e que garanta a efetivação dos seus
direitos, dada a construção teórica dessas categorias a partir da literatura explorada
pela disciplina, é inegável o papel significativo desse espaço na constituição de uma
sociedade mais igualitária e democrática.

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