Você está na página 1de 40

X <L> &

Clclo de Exposicöes Memörias do Oriente

Os Con^rtitores do
Oriente Portu^iies
X

Indice

'S Jörge Manuel Flores


Um Imperio de Objectot

53 Luis Filipe Thomaz


C&trutura Politica e Administrativ a
do £&tado da India no Seculo XVI

8t Catarina Madeira Santos


Goa: Corte e Cerimonial

97 Teresa Leonor M. Vale


£xoti&mo e Poder Politico
AA Repref>entacöei> de £leftante& na Tumuläria Reqia
de Santa Maria de Beiem

111 Luis Filipe Barreto


A Ä&ia na Cultura Portugue&a (c. 1485-0. 1630)

131 Sanjay Subrahmanyam


A Crönica dot> Rei6 de Bidnaga e a Crönica do Guzerate:
Doi<5 TextC6 /ndo-Portugueäe* do Secuio XVI

'SS Ines G. Zupanov


Do Sinai da Cruz ä ConfrtMäo em Tämul
Gramäticaa, Cateciamoa e Manuaw de Confwaäo
Mi<5iiondrio<5 na India Meridional
(SeculoA XVI-XVII)

167 Fernando Antonio Baptista Pereira


Arquitectura "Chd" e Ornamentacäo Interior
na<5 /grejai Portugueia^ do Oriente
(Seculo6 XVII-XVIII)

195 Annemarie Jordan Gschwend


0 Faöcmio de Cipango:
Artet, Decorativa.6 e Laca* da Ä6la Ocidental
em Portugal, £6panha e Äuatria

229 CATÄLOGO

455 PROJECTO DA EXPOSI^ÄO

460 BlBLIOGRAFIA
_-.

tfcM

=?:
0 Fascinio
de Cipan^b
Afles Decorälivas
*

eLacas da A£ia Orieiilal


em Portugal, Espanha
a (1511-1598)
A corte portuguesa
e a rota do Extremo Oriente Annemarie Jordan Gschwend Este estudo näo teria sido
possi'vel sem o impulso da
falecida Elisabeth Scheicher.
Alfred Auer e Veronika
-Ox tomada de Malaca em 1511 pelos Portugueses foi um que esta cidade era o terminal usado Sandbichler (Schloss Ambras),
Rudolf Distelberger
acontecimento particularmente fortuito, tendo aberto uma pelos Chineses para o comercio com (Kunsthistoriches Museum),
Ana Garcia Sanz (Convento
passagem para o Extremo Oriente que nem em sonhos fora o Sueste asiätico, a India e o Medio de las Descalzas Reales), Oliver
Impey (Ashmolean Museum),
imaginada. Os miticos e longinquos reinos de Marco Polo Oriente 2 . Um opulento e näo explorado Nuno Vassallo e Silva (Museu
de Säo Roque) e Ann Yonemura
de Catai e Cipango, "a terra do ouro", tinham perseguido mercado para o comercio entre a China,
(Freer Gallery of Art)- Estou-lhes
extremameme reconhecida
a imaginacäo dos principes e aventureiros do Renascimento o Japäo e o imperio ultramarino portu-
pelos conselhos especiaiizados

desde a Idade Media. Apös a viagem histörica de Vasco da gues acabava de ser descoberto, e lacos que me proporcionaram, pelo
encorajamento que me deram
Gama, em 1498, e a conquista da India, a corte de Lisboa comerciais foram rapidamente estabele- para trilhar novas äreas
de investigacäo e, tambem,
procurou diligentemente estabelecer relapöes comerciais cidos entre a Europa, a Äfrica, a India e pela sua valiosa assistencia
na obtenclo de material
com a China. Os Portugueses encontraram em Malaca, um o Extremo Oriente. Um detalhe de uma fotogräfico.

porto frequentado por juncos de Cantäo, oportunidades iluminura do manuscrito Padshahnamah, encomendado
comerciais ilimitadas nunca antes imaginadas. Duarte em 1639, sublinha quäo alargada era a rede estabelecida
Barbosa descreveu o seu assombro ao ver embarcacöes pelos Portugueses. Representa emissärios portugueses e
chinesas carregadas da "melhor das sedas, de grandes europeus ä corte indiana de Shah Jahan (1628-1658), tra-
quantidades de porcelana, damasco, brocados, faixas mul- zendo presentes do Oriente: caixas de laca, bandejas, pero-
ticolores, salitre, perolas, prata, arcas douradas lacadas, las e jöias; mercadorias exöticas muito apreciadas pelo
leques e jöias, que os Chineses trocavam pelas drogas, imperador mogol em troca de privilegios comerciais.
especiarias e tecidos de algodäo que os Portugueses tra- 0 monopölio portugues na Äsia permaneceu incontestado
ziam da India, Bengala e Cambaia [Guzerate]"'. ate inicios do seculo XVII. Como Diffie e Winius observa-
Numa carta dirigida ao rei D. Manuel l em Abril de 1512, ram, "no Atläntico, eles [os Portugueses] eram explorado-
Afonso de Albuquerque, governador do Estado da India de res, no Oceano Indico eram conquistadores, e no Extremo
1509 a 1515, justificou a conquista de Malaca, afirmando Oriente eram homens de negöcios"3.

195
Malaca, datadas de 1516 e 1518 respectivamente, referem

näo apenas a riqueza e a grandeza da China, mas tambem

a curiosidade do imperador chines, interessado em saber

mais acerca dos usos e costumes do rei de Portugal 8 .

As trocas iniciais com a China näo se saldaram pela arran-

cada auspiciosa que D. Manuel imaginara, e a embaixada

de Tome Pires em 1521 terminou com resultados desastro-

sos. Apesar de todo o comercio luso-chines ter cessado

pouco depois e de os contactos entre Portugueses e comer-

ciantes continentais chineses em Cantäo terem sido proi-

bidos, os governantes portugueses näo perderam äs espe-

rancas. 0 filho de D. Manuel, D. Joäo III (1521-1557), teimou

no seu interesse em manter os lacos sino-portugueses.

Martim Afonso de Melo, capitäo de Ormuz, informou-o


Pormenor de Padiliahumah, 1639
Windsor, The Royal Collection Enterprises (cortesia) sobre a sua viagem de Malaca ä China em 1523, mas esta

viagem näo correu da melhor maneira, tendo-se registado

Os primeiros indicios do desejo da corte portuguesa de conflitos9. Em 1527, um comercio chines näo autorizado era

formalizar relacöes comerciais com a China surgem em assegurado por juncos chineses vindos de Fukien, uma

documentos do reinado de D. Manuel I (1495-1521). 0 pri- provincia que näo dava tanta importäncia ä rigorosa vigi-

meiro desses indicios e um regimento que autoriza Diogo läncia do imperador chines e dos seus burocratas imperiais

Lopes de Sequeira, capitäo-mor da armada real, a coligir em Pequim. Jörge Cabral, capitäo de Malaca, tentou uma

informacöes sobre a China e os seus habitantes em 1508". missäo de paz em 1528, enviando um junco a Cantäo, mas

0 segundo e um recibo redigido em Cochim, relativo a um sem resultados favoräveis. Um considerävel comercio de

subsidio de 1500 reais para a viagem de um sübdito chi- contrabando entre äs provincias do Sul da China e Malaca

nes ä corte de D. Manuel em 1512, mas näo existe nenhum comecou depois de o porto de Cantäo ter sido fechado aos

registo da chegada desde cidadäo chines a Lisboa5. Em 1514, Portugueses (ainda que em 1530 tivesse sido reaberto) e

Rui de Brito informou Afonso de Albuquerque da alegria persistiu ate ao estabelecimento formal de Macau como

com que os comerciantes chineses receberam a tomada posto comercial oficial dos Portugueses em 1557.

de Malaca pelos Portugueses6. Tome Pires, escrevendo de Cartas enviadas do Oriente para a corte de Lisboa entre

Cochim em 1516, informa D. Manuel acerca do aljöfar e do 1527 e 1528 incitavam D. Joäo III a intervir uma vez mais

öpio disponiveis no mercado chines7, e outras cartas escri- no mär da China. Em 1531, D. Joäo III enviou tres navios,

tas por Martim de Melo e Simäo de Andrade, de Cochim e comandados por Manuel Botelho, de Lisboa ä China, e outras

(96
partes da india, com a missäo de comerciar em nome da japones, executado em 1563, mostra äs värias ilhas
rainha portuguesa, D. Catarina de Äustria (1507-1578)'°. Näo Lequios, designadas pelo cartögrafo como Lequo pequeno
deixa de ser extraordinärio que esta empresa regia tenha e Lequo grande, um arquipelago a sul da ilha em forma

sido assegurada e paga pela Coroa ünica e exclusivamente de crescente do Japäo. As ilhas Ryukyu, actualmente a
no Interesse da rainha - trata-se de uma das primeiras prefeitura de Okinawa, säo uma fiada de trinta e seis
referencias ao verdadeiro "vicio" por produtos orientais ilhas do Pacifico, unindo numa curva a ponta sul de

que D. Catarina tinha. Ja em 1528, depois de o contrabando Kyushu ao litoral nordeste de Taiwan12. Desde o seculo XV,

com a China ter recomecado, o inventärio de D. Catarina e ate ä sua anexacäo formal pelo Japäo em 1879, estas

incluia cinquenta e tres cövados da melhor seda chinesa". ilhas formaram um reino independente, com a sua prö-
Ao longo do seu reinado, D. Catarina cultivou um gosto pria monarquia e com a capital sediada na ilha princi-
apurado por produtos chineses e japoneses e tornou-se
Läzaro Luis, Llvro de Todo ho Univeno, 1563 (representafao do Japäo
uma verdadeira especialista enquanto coleccionadora de e das ilhas Ryukyu)
Lisboa, Academia das Ciencias
mobiliärio, artes decorativas, lacas e texteis do Oriente.

Este ensaio explorarä o modo como a corte portuguesa e


os seus monarcas desempenharam um papel essencial

enquanto intermediärios entre a Europa do Renascimento,


a Äsia e o Extremo Oriente, difundindo um gosto por pro-
dutos e costumes exöticos, ao mesmo tempo que os mer-

cadores portugueses satisfaziam a procura de consumos


luxuosos na sua e noutras cortes. As carracas portugue-
sas regressavam carregadas de povos estrangeiros, pro-

dutos exöticos, jöias e modas que eram adoptadas na corte


de Lisboa, decadas antes de o seu uso se espalhar pela
Europa ao longo do seculo XVI.

A descoberta portuguesa
das ilhas Ryukyu e do Japäo
Os Portugueses ficaram a saber da existencia de um grupo
de värias ilhas ao largo da costa da China, Lequias (ou
Lequeos), Liuqiu ou Liu-ch'iu em Chines, gracas ao comer-

cio com habitantes das ilhas Ryukyu em Malaca. Um dos


mais antigos mapas do mär da China e do arquipelago

'97
pal, Okinawa. Os Ryukyuanos cultivavam uma cultura e D. Manuel foi o primeiro monarca portugues a receber
tradicöes artisticas pröprias, frequentemente sujeitas a informacöes sobre äs Ryukyu. Num regimento, instruiu
influencias do Sueste asiätico, designadamente da Coreia, Fernäo Peres de Andrade para que äs achasse, devido

do Sul da China e do Japäo. Uma das maiores realiza- äs "estimulantes notfcias que tivemos de Malaca sobre
cöes artisticas destas ilhas eram äs suas obras em laca, os juncos de um povo chamado Lequios, que fazem comer-
e, durante o äuge da sua "idade de ouro", do seculo XV cio de ouro e de outras mercadorias de grande valor"'6.

ao seculo XVII, äs Ryukyu produziram laca de alta qua- D. Manuel sabia forcosamente alguma coisa acerca das

lidade que rivalizava com os melhores produtos da China Ryukyu, visto que Simäo de Andrade Ihe lembra, em
e do Japäo. Agosto de 1518, äs minas de ouro e äs mercadorias, como
Devido a uma posicäo geogräfica favorävel, estas ilhas ser- äs da China, disponiveis nas Lequeos'1. 0 rei enviou

viam de ponte para o comercio entre a China e o Japäo, mesmo um navio para descobrir äs Ryukyu, onde "äs pes-
especialmente entre 1433 e 1549, perfodo em que äs rela- soas säo brancas como Alemäes", mas esse navio regres-

cöes entre estas duas nacöes estiveram restringidas. Juncos sou a Malaca sem nunca ter chegado ao seu destino.

das ilhas Ryukyu zarpavam do porto de Naha, o principal Duarte Barbosa descreveu äs Lequios ja em 1516, num

porto de Okinawa, rumo a Malaca, levando artigos diver- capitulo do seu Livro-. "E em frente da referida terra da
sos: "cofres dourados, avanos mujto riquos & bem obra- China para sueste estäo muitas ilhas no mär, a mais lon-
dos, espadas mujtas armas de todas sortes"'3 — para faze- ginqua das quais e uma vasta terra que, segundo se diz,

rem comercio com os Malaqueiros, os Chineses e os e terra firme, e das quais todos os anos 3 ou 4 navios

Portugueses. Produtos das Ryukyu chegaram a Lisboa, via vem ate Malaca, como os dos Chineses, de gente de pele
Goa, bastante cedo. branca que säo grandes mercadores e säo muito ricos.

Tome Pires, o primeiro portugues que escreveu sobre o Trazem muitas barras de ouro e muita prata, seda e ricos

Japäo, consagrou värias päginas äs Ryukyu na sua Suma tecidos, muito trigo bom, porcelana extraordinäria e

Oriental (c. 1515). Assinalou que "a Ilha de Jampon [...] he outras mercancias. Levam de Malaca pimenta e outras
möor que a dos lequios" e chamou äqueles comerciantes coisas identicas äs que os Chineses levam, e os Chineses

que se deslocavam a Malaca gores, referindo que eram chamam-lhes Lequios. Os de Malaca dizem deles que säo
grandes cartögrafos e armeiros'4. Escreveu tambem acerca os melhores dos homens, ricos e grandes mercadores,

das Ryukyu e do seu comercio com a provincia de Fukien mais fionrados que os Chineses, e deles temos ate agora
e com o Japäo-. "[...] os lequjos em sete oito dias vam a pouca informacäo, visto que a sua terra näo foi ainda
Jampon S levam das ditas mercadorias he resgatam ouro descoberta"'8.
0 cobre todo o que vem dos lequeos trazem os leqos de Descricöes posteriores das Ryukyu e da sua misteriosa
Jampon he tratam os lequeos com os de Jampon em puvos gente, encontramo-las em Fernäo Mendes Pinto, na sua
lucoces G outras mercadorias"15. Peregrinacäo, por muito fantasioso que o seu relato possa

198
ser. Ä primeira ilha, ao largo da quäl naufragou em 1543, depois da conquista de Malaca em 1512, os Ryukyuanos
chama-lhe ilha Ryukyu, cuja capital, Pongor, estava "situada nunca mais voltaram, e que o subsequente comercio ile-

a vinte e nove graus de latitude"' 9 . Mendes Pinto tinha na gal entre eles, os Portugueses e os Chineses foi reori-

realidade desembarcado em Okinawa (ou Grande Lu-chu), entado para Fukien. Os Ryukyuanos eram comerciantes

no centro do arquipelago das Ryukyu, cujo tamanho, vege- com um raio de accäo muito vasto e que cruzavam o mär
tacäo e produtos aborda demoradamente, incluindo um da China desde o seculo XIV; obviamente, forneciam aos

grupo de cinco grandes ilhas a oeste de Okinawa 20 . Os Portugueses valiosas informacöes sobre o Japäo e, pos-

lucros do comercio e os abundantes recursos em prata, sivelmente, sobre a Coreia e äs Filipinas. 0 contacto e
cobre, perolas, ämbar, pau-rosa e seda, entre outros pro- o comercio diärios em Cantäo, entre os Portugueses e

dutos e minerios, disponiveis nas Ryukyu, impressiona- os Lequeos, eram cultivados, como refere uma carta
ram fortemente Mendes PintO; tanto o impressionaram, escrita por um portugues, Vasco Calvo, em 1524; Calvo

de facto, que concluiu que seria proveitoso e benefico obteve äs suas informacöes em primeira mäo: "Assim
para Portugal se conquistasse e ocupasse imediatamente senor ao mär deste foquem estäo os Lequeos que cada

o arquipelago. anno vende mercadoria a Patane e soiäo em tempo do

"Do breve relato que aqui fiz das ilhas Ryukyu, pode con- Rei de Malaca ir a Malaca. Säo muitas ilhas e onde esta
cluir-se - e e isso que eu penso, pelo que vi - que, com o Rei he hüa ilha muito grande e näo pode senor ser

apenas dois mil homens, pode conquistar-se e ocupar-se menos porque a gete he limpa e fazem iuncos mui gran-
esta ilha bem como todas äs outras nestes arquipelagos, des. As quaes ilhas te muito ouro e cobre e ferro e mui-

das quais tirariamos muito mais proveito do que tiramos tas mercadorias que ha em Malaca e Patane que trazem

da India, e com muito menos custo para nös em homens e teem damascos e seda muita e porcollanas. Desta gover-

e tudo o mais, porque gracas ao comercio apenas, como näca de Foquem a tomarem äs primeiras ilhas säo tres

os mercadores com quem falämos nos asseguraram, äs tres dias de golfäo. Estes Lequeos vem cada dia fazer mer-
alfändegas nesta ilha Ryukyu tem um rendimento de um cadoria co esta terra de Foque e de Foquem väo escon-

milhäo e meio em ouro, isto ja para näo falar dos rendi- didamente la a fazer mercadoria."23

mentos globais de todo o reino I...]." 21 0 histörico desembarque dos Portugueses em Tanegashima

A Peregrinafäo de Mendes Pinto revela que os (Japäo), a sul de Kyushu, em 1543, talvez näo fosse täo aci-
Portugueses conheciam o Japäo e äs suas äreas circun- dental como pareceu. Os Portugueses, antes da sua che-

dantes näo so atraves de contactos comerciais anterio- gada ao Japäo, estavam obviamente melhor informados
res com os Ryukyuanos em Malaca, e mais tarde em acerca do arquipelago das Ryukyu do que tem sido docu-

Cantäo, mas tambem, evidentemente, atraves de viagens mentado, mantendo uma rigorosa politica de secretismo

e experiencias em primeira mäo no arquipelago das nos anos que mediaram entre 1511 e aquela data. Embora
Ryukyu 22 . Duarte Barbosa foi o primeiro a observar que, faltem dados susceptiveis de apoiarem esta tese, Donald

199
Lach defende-a, postulando que os Portugueses tinham um "abanos lequios", o que indica que se tratava de um tipo

vasto conhecimento do Japäo muito antes de I54224. especifico de leque originärio das Ryukyu26. Em 1561, Catarina
Os Japoneses alcunharam os Portugueses de "bärbaros do comprou quatro leques de marfim pintados com decora-

Sul" (namban-jiri), uma expressäo usada no Japäo para cöes e animais diverses (bichinhos) em ouro, e cujas pon-
designar os europeus e outros estrangeiros das provincias tas eram furadas e presas com cordäo ou fita de seda car-
do Sul da China (Cantäo e Fukien) e do Sueste asiätico. mesim (cf. documento I).

Näo existe nenhuma confirmacäo escrita, mas poderiamos Estes documentos revelam que esses leques eram fabri-

propor que uma rota maritima meridional indirecta foi cados de uma maneira aparentemente ti'pica do artesa-

usada pelos Portugueses para chegarem a Kyushu (por nato das Ryukyu — "säo de feycäo de abanos lequios" —,
acaso ou deliberadamente), a partir de um porto das Ryukyu, o que significa que se abriam como os leques desdo-

em vez de Malaca, Macau ou Cantäo. As relacöes econö- bräveis japoneses ou chineses, com uma ou duas folhas

micas e culturais que os Ryukyuanos mantinham com o de papel pregueado27. 0 leque de papel pintado era conhe-

Japäo e outras nacöes leste-asiäticas, quando os Portugueses cido no Japäo como "leque de morcego", ao passo que
chegaram a Malaca em 1511, teräo de algum modo prepa- o leque de seda ou madeira (bambu, sändalo ou cipreste)

rado o terreno para estes "bärbaros" chegarem a Tane- era conhecido como hiogi. Este Ultimo era furado numa
gashima trinta anos depois. das extremidades, segurado com um rebite, com um fio
na outra extremidade controlando a amplitude do leque28.

Leques de abrir e fechar Um outro tipo de leque desdobrävel japones, populär

das Ryukyu no Portugal no periodo Muromachi (1392-1568), era o leque de "extre-

renascentista midade larga", o suehiro ogi, usado por monges budis-


Uma indicacäo de que a corte de Lisboa poderia estar tas e actores do teatro Nö, e nos papeis feminines no

melhor informada do que se cre acerca das Ryukyu e das caso do Kabuki, cujas varetas exteriores se dobravam

suas exportacöes pode ser deduzida de dois "mandados" para fora a partir do meio e permitiam que o papel se

existentes nos arquivos de Lisboa, relatives a leques das abrisse inteiramente quando o leque era fechado. Como

Lequios, que Catarina de Äustria adquiriu e expediu para Luis Fröis refere em 1585, os sacerdotes japoneses,

Portugal via Goa25. Os dois documentos referem-nos como ou bonzos, eram obrigados por uma questäo de honra

Leque, Suehiro ogi


Japäo, seculo XIX
Londres. Victoria 5 Albert Museum (cortesia)
Leque cerimonial Desafortunadamente, ne-
Ilhas Ryukyu,
seculo XVill nhum dos leques das
Londres,
British Museum Ryukyu ("abanos lequios")
(cortesia)
enviados para Portugal

a pregar dos seus pülpi- sobreviveu ate aos nos-

tos envergando um ves- sos dias.

tuärio de seda e segu- Tome Pires escreveu

rando em leques dourados; pela primeira vez sobre

um costume que os sacerdo- leques orientais na Suma

tes portugueses nunca poderiam Oriental, descrevendo os "ava-


adoptar, pois seriam tomados por nos mujto riquos G bem obrados"

loucos29. Os leques "de resguardo" (uchiwä) levados para Malaca pelos comerciantes

eram feitos com folhas de palmeira, penas, seda, das Ryukyu 3 '. Fernäo Mendes Pinto, na sua descri-

papel ou laca, como este exemplar de um leque ceri- cäo de Tanegashima, refere os leques japoneses que

monial do seculo XVIII com madreperola. No periodo eram oferecidos como presentes de grande valor 32 .

Edo (1600-1868), os leques tinham-se tornado arti- Duarte Barbosa louvou äs subtis e engenhosas coi-

gos essenciais de uso diärio para todas äs camadas sas feitas pelos Chineses, incluindo os leques, mas

da sociedade japonesa, tanto para homens como para näo e ainda claro se os "abanos lequios" de Catarina

mulheres 30 . eram originärios das Ryukyu ou se a sua manufac-


Catarina de Äustria viria a comprar em 1564 cento e tura era ao estilo das Ryukyu. Os especialistas dis-

setenta e oito "abanos lequios", doze dos quais foram cutem se os leques de abrir e fechar orientais teräo

oferecidos a duas das suas damas, Joanna d'Eca (dama sido inventados pelos Chineses ou pelos Japoneses.

de honor) e Leonor Fernandez. Quanto aos leques restan- Afirmam alguns que os leques de abrir e fechar foram

tes, pretendia a rainha usä-los como presentes para mulhe- inventados na Coreia no seculo XI e levados por embai-

res da sua corte. 0 escriba näo nos elucida quanto ao xadas coreanas para a China, onde teräo sido reprodu-

material de que estes leques eram feitos. 0 mais provävel zidos em largas quantidades para a corte do imperador

e que fossem leques de papel pintado, colado sobre vare- Ming, Ch'engTsu (1403-1412)". Leques de marfim pintado

tas de bambu servindo de suportes, com extremidades pro- e decorado, como os que foram comprados por Catarina

tectoras de laca vermelha ou preta, e eram ou "leques de em 1564, podem ter vindo tambem da China, ou mesmo

morcego" ou leques "de extremidade larga". A inacreditä- da Coreia, exportados pelos Ryukyuanos. Contudo, um

vel quantidade encomendada pela rainha indica que os leque das Ryukyu, lacado e pintado a ouro, foi ofere-

leques eram considerados o Ultimo grito da moda. cido como um tributo ä Coroa Ming em 1372, o que com-

20}
prova que ja nessa altura havia producäo de leques nas

Ryukyu 34 .

Os leques tinham uma vasta circulacäo no Extreme Oriente

como objectos de comercio populäres e, no seculo XVI, a

decoracäo e a pintura dos leques tornou-se uma catego-

ria especifica da pintura da China e do Japäo, com emi-

nentes artistas especializando-se na pintura de leques.

0 motivo dos leques desdobräveis completamente aber-

tos tornou-se um motivo pictörico clässico nos periodos

Muromachi e Momoyama, surgindo em texteis, cerämicas

e obras lacadas japonesas, designadamente äs inro (peque-

nas caixas para medicamentos), äs tsuba (guardas de espa-

das), selas e biombos35. Caixas lacadas decoradas com moti-

vos de leques abertos ou feitas segundo a forma dos leques

desdobräveis eram extremamente populäres. Leques des-

dobräveis abertos, simbolizando o elevado estatuto do

samurai, decoravam estandartes (umajirushi) empunhados

por faccöes guerreiras no campo de batalha36. Os Ryukyua-

nos copiaram os Chineses em muitos campos artisticos, Hasegqwa Toi (seculos XVI-XVII), pormenor do Cerco de Veräo
ao Caiteio de Oaafca
especialmente na producäo de laca, mas, apesar disso, Japäo, seculo XVII
Töquio, Idemitsu Museum of Arts (cortesia)
foram capazes de desenvolver os seus pröprios estilos e

tecnicas. Näo poderäo os Ryukyuanos ter criado a sua prö- ate ha pouco tempo se pensava. A etimologia da palavra

pria versäo de leque desdobrävel, baseada em modelos "leque" pode ajudar a clarificar a proveniencia dos leques

chineses? 0 intercämbio cultural e artistico entre äs Ryukyu, de abrir e fechar exportados para Lisboa. Aos olhos dos

a China, o Japäo e a Coreia, exige um exame mais atento. Portugueses, pelo menos, um tipo de leque de abrir e fechar

0 termo portugues "leque" deriva obviamente do nome que vinha efectivamente daquelas regiöes no seculo XVI. Em con-

era dado a estas ilhas no seculo XVI, Lequias37, e foi adop- sequencia disso, os Portugueses passaram a designar todos

tado precisamente numa altura em que os Portugueses pro- os leques de origem, manufactura e proveniencia extremo-

curavam estreitar lacos com o Japäo e äs Ryukyu, relacio- oriental como "leque" ou "leques", ao passo que os leques

namento que, obviamente, desempenhou um papel da India e do Norte de Äfrica eram conhecidos como aba-

importante na evolucäo, no desenvolvimento e na difusäo nos. A quantidade de leques que Catarina de Äustria adqui-

de tipos especfficos de leques de abrir e fechar, mais do que riu constitui um testemunho do extremo fascinio que esses

202
objectos exerciam sobre äs mulheres da elite europeia com guerreiros Samurais segurando leques, como sucede no

enquanto acessörios raros e invulgares; os "abanos lequios" detalhe aqui mostrado. Em meados do seculo XVI, leques

de Catarina foram na realidade os primeiros leques orien- sortidos, em particular os de abrir e fechar, tornaram-se

tais importados pela Europa no Renascimento. A voga dos acessörios quotidianos para äs mulheres da corte de Lisboa.

leques de abrir e fechar orientais na corte portuguesa espa- Pinturas portuguesas de 1552 e 1553 mostram pela pri-

Ihou-se rapidamente por outras cortes europeias; os leques meira vez leques de abrir e fechar em retratos renas-
foram adoptados pelas mulheres como
Gempo Reisan e Ikyo Eitetsu, Retrato de Toyotomi Hideyothi
elementos indispensäveis da indu- Japäo, 1600
Shiga, Museum of Modern Art (cortesia)
mentäria de corte.

Os leques desdobräveis dos periodos

Muromachi e Momoyama foram inicial-

mente usados por guerreiros da classe

samurai, como simbolo do seu elevado

estatuto e poder, comparäveis ao bas-

täo do marechal-de-campo na Europa38.

Pinturas em rolo contemporäneas retra-

tam guerreiros ou senhores feudais (däi-

mios) sentados, segurando leques de

abrir e fechar na mäo direita, como

sucede neste retrato de Toyotomi

Hideyoshi (1536-1598). Estas pinturas

eram frequentemente acompanhadas

por versos que louvam näo apenas o

xögum mas tambem o seu leque:

"0 leque que ele segura e um simbolo

do seu grande poder, capturando todo

o vento na sua mäo"39. Os biombos nam-

ban (biombos em portugues, byobu em

japones) retratam inümeras cenas envol-

vendo "bärbaros do Sul": padres jesui-

tas, missionärios, escravos africanos e

negociantes portugueses misturam-se

203
centistas de princesas da corte,

designadamente a cunhada de
Catarina, a infanta D. Maria
(Convento de las Descalzas Reales,
Madrid, inv. n." PN 822), e a sua

sobrinha, Joana de Äustria (Musee


d'Art Ancien, Bruxelas, inv. n.° 1926),

sentadas ou de pe, segurando leques

japoneses ou das Ryukyu, desdo-


bräveis ou "de morcego", na mäo

direita, como sinais do seu prestigio

e estatuto regio, näo muito diversos


dos seus contrapontos japoneses 40 .
Em Setembro de 1552, o mesmo ano

em que estes retratos foram pinta-


dos, Bernard (um convertido e dis-
cipulo de Francisco Xavier), o pri-

meiro japones a pisar solo europeu,


chegou a Lisboa para uma estada pro-
longada, que durou ate Julho de 1554;

um acontecimento que causou


grande sensacäo na corte portu-

guesa4'. Somos tentados a pensar que


Bernard veio carregado de presentes, designadamente RetraTo de Uma Princeaa £apanho/a
Oficina de Alonso Sänchez Coello, 1550-1565
caixas lacadas e leques de abrir e fechar, do Japäo ou Madrid, Museu do Prado, inv. 4." 1142 (cortesia)

das Ryukyu, para a corte portuguesa.


E possivel que os leques de abrir e fechar fossem usa- Museum, inv. n.° 3337), Maria parece mesmo segurar um
dos em Portugal antes de 1550. Em todos os retratos e leque que se assemelha ao leque "de extremidade larga",
miniaturas da filha de Catarina, D. Maria de Portugal o suehiro ogi. 0 gosto pelos leques de abrir e fechar foi
(1527-1545), a primeira esposa de Filipe II, a princesa surge levado por esta princesa para a corte espanhola em 1543.
sempre segurando um leque de abrir e fechar oriental 42 . A princesa escondia sempre o rosto com o leque, de tal
Num retrato que podemos ver em Viena (Kunsthistorisches forma que Filipe näo conseguia enxergar-lhe äs feicöes.

204
Contudo, um anäo da corte conseguiu convence-la a cada uma com dois elementos; uma caixa grande com
abandonar o leque o tempo suficiente para que Filipe doze lados; uma outra caixa mais pequena com uma tampa
pudesse vislumbrar os tracos da mulher43. Este uso, obvia- tebako ou caixa para acessörios pessoais(?); uma caixa
mente, teve um forte impacte. Retratos posteriores da pequena, redonda, de laca macia, evidentemente sem
corte espanhola, da autoria de Alonso Sanchez Coello, decoracäo; tres caixas de laca pequenas da India, deco-
mostram-nos mulheres aristocratas segurando, de forma radas a ouro; duas caixas octogonais, cada uma delas com
bem visivel, os seus leques de abrir e fechar asiäticos, quatro componentes caixas com prateleiras(?); uma caixa
em imitacäo das damas portuguesas. Em fins do seculo XVI, com dois componentes, da mesma feitura das duas ante-

os leques de abrir e fechar eram manufacturados no riores; duas caixas compridas e baixas cobertas com deco-
Extreme Oriente exclusivamente para a exportacäo para racäo a ouro caixas para cartas(?); uma colher de laca;
mercados europeus. uma escrivaninha escritorio incrustada com madreperola
no exterior; uma mesa de laca preta; uma mesa de laca(?)

Laca e porcelana namban de abrir e fechar com muita decoracäo e uma outra mesa

das ilhas Ryukyu, China de abrir e fechar coberta com madreperola de origem

ejapäo na colecpäo namban ou ryukyuana"45.


de Catarina de Äustria No guarda-roupa da rainha de 1557 havia alguns recipien-
A primeira referencia ä laca asiätica de exportacäo numa tes e louca de mesa de concha de tartaruga importados
coleccäo real portuguesa surge no inventärio de 1557 do da China, uns quantos de porcelana Ming possivelmente

guarda-roupa de Catarina de Äustria. Värios objectos, cai- monöcroma, e um deles uma peca de esmalte chines: uma
xas e pecas de mobiliärio lacadas, vindos da India e do jarra com nove camadas de esmalte branco; dois casticais
Extreme Oriente (Japäo, China ou ilhas Ryukyu), foram com sete bracos cada; quatro tigelas de porcelana ("por-

registados:"[...] tres tabuleiros decorados com ouro e cores celanas") - uma amarela, uma preta (äs outras duas näo
tabuleiros de roupa ou midarebako?; um tabuleiro com especificadas); tres pequenos pratos — dois amarelos e um

madeira dourada decorada com peixes, "velho e rachado"; policromo; um saleiro com a forma de um tinteiro; uma
uma caixa pequena, feita de duas pecas com trabalho de pequena jarra; uma caixa redonda; um recipiente em forma

cestaria a toda a volta, a tampa e o fundo de laca preta44; de ventosa amarela ("de feicäo de ventosa"), possivelmente
uma caixa grande de tinta de laca preta caixa de escre- um recipiente para beber ou uma taca para incenso; e duas
ver ou suzuribako com folhas de ouro de Ködai-ji mäkle grandes bacias para lavar äs mäos, semelhantes talvez ä
ou namban na manufactura; uma caixa grande de laca grande salva (tazza) de concha de tartaruga, outrora inte-
preta compreendendo tres elementos jogo de tres caixas grada na coleccäo de Rudolfe II, actualmente em Viena

para alimentos, encaixadas umas nas outras, oujubacoC?)- (Kunsthistoriches Museum, inv. n.° 4i3i)46. Treze cestos de
duas caixas pequenas redondas com decoracäo de ouro folha de palmeira ("acafates") de värios tamanhos e for-

205
mas da India, muitos deles forrados com cetim, entrete- gem, mas äs pecas näo eram, na manufactura, nem indo-

cido a ouro e prata, foram tambem registados. -portuguesas nem mogöis. Um recipiente, ou "porcelana"49,

Lamentavelmente, näo sobreviveram quaisquer relatos era de laca branca ("alaqueca branca") pintada com peixes

sobre a forma como a rainha usava os seus artigos de laca, de ouro entrecruzando-se, possivelmente uma taca de ceri-

porcelana e outros materiais provenientes da Äsia, no palä- mönia para o chä50. A base e o bocal desta taca estavam

cio real de Lisboa, onde residia e onde a sua coleccäo era engastados com prata dourada; a taca era guardada numa

guardada. E impossivel por ora determinar se estas pecas caixa redonda feita na India. 0 artigo seguinte, uma taca

em laca eram reservadas para uso e exibifäo cerimoniais, de laca branca com uma tampa (um recipiente para chä ou

de modo a que a corte portuguesa e os visitantes estran- para comida?), o bocal engastado com prata dourada, tinha

geiros pudessem admirar o esplendor dos gostos e da colec- um botäo de laca vermelha entre a base e o pe de cada reci-

cäo da rainha, ou se objectos como a escrivaninha e o ora- piente51. 0 botäo de laca na tampa era mais comprido. Näo

törio namban, analisados adiante, eram rigorosamente ha nenhuma referencia a pintura a ouro ou a uma caixa

reservados para uso privado nos aposentos de Catarina. para guardar esta peca. 0 terceiro e Ultimo artigo era um

E possivel que os artigos fossem repartidos entre os apo- oratörio - certamente a primeira referencia ä laca namban

sentos püblicos e privados do paläcio. Durante os anos de em Portugal, no quäl uma cruz feita com madeira de Säo

1550, houve um acrescimo nitido do interesse da rainha Tome de Meliapor, "pao de San Tome", da costa oriental da

por artigos leste-asiäticos. Em 1555, por exemplo, Catarina India no golfo de Bengala - e estava inserido no centro de

comprou trezentas e vinte pecas, "corjas" (isto e, vinte uma caixa de laca preta com duas portas, pintada (por den-

pecas de um dado artige), de porcelana Ming para a sua tro e por fora) com grandes letras de ouro ("da sagrada

mesa, pela substancial soma de 22 420 reais, pagando 1400 escritura"), possivelmente o monograma IHS dos Jesuitas,

reais por cada corja47. com o interior feito de laca preta e decoracäo a ouro52.

A referencia seguinte ä laca asiätica surge no livro de con- Tendo adquirido lacas da Äsia Oriental numa data täo precoce,

tabilidade do tesoureiro da rainha, discriminando compras Catarina era necessariamente uma pessoa bem informada

que Catarina fez em 1588, um ano depois de Macau ter sido quanto ä variedade de produtos e mercadorias ä venda na

instituido como posto avancado portugues no Extremo India e no Extremo Oriente. As lacas brancas, para alem de

Oriente. Trata-se de um carregamento de mercadorias exö- serem raras na Europa nesta data, eram tambem invulga-

ticas da India, levadas para Lisboa pela nau Castello, capi- res no que toca ao suporte, tecnica e cor. Exemplos de laca

taneada por Jacome de Mello48. Entre os artigos indianos - branca chinesa ou japonesa com desenhos pintados a ouro

colchas ricamente bordadas, almofadas, texteis, jarras mar- de meados do seculo XVI näo sobreviveram. A aplicacäo

taban, uma casca de coco engastada e utensilios de cristal superficial de ouro, sob a forma de folha de ouro, conhe-

cingaleses incrustados com pedras preciosas - havia tres cida como kinrande, um termo japones para "brocado de

pecas de laca. 0 documento näo especifica o pais de ori- ouro"53, era mais comum em pecas esmaltadas, ou em por-

206
era desenhada ou incisa58. Em chines,

este metodo era conhecido como

qiangjin ("ouro inciso"), e, em japo-

nes, como chinkin ("ouro afundado")59.

Este Ultimo implica a formacäo de sul-

cos na superficie da laca com um esti-

lete e a aplicacäo de folha de ouro


Tres tacas Ming, Kinrande
para formar o motivo. 0 uso do chinkin em lacas ryukyu-
China, periodo jiajing (1522-1566)
Innsbruck, Kunsthistorisches Museum, inv. n.° PA 1082, 1084, 2675 (cortesia)
anas foi trazido da China durante o seculo XIV, e foi mais

tarde substituido pela pintura kinrande, menos elaborada,

celana azul e branca feita na China para exportacäo para o a quäl imitava a porcelana chinesa do seculo XVI.

Japäo, como estas tres tigelas Ming do periodo Jiajing (1522- Frequentemente, a laca das Ryukyu era combinada com

-1566), da coleccäo de Ferdinande II de Tirol no Schloss madreperola (conhecida como raden), como se pode ver

Ambras, em Innsbruck54. A folha de ouro era aplicada com no leque cerimonial ryukyuano acima, feito de moluscos

um adesivo de clara de ovo, aparada e incisa para realcar encontrados nos recifes de coral do arquipelago.

a decoracäo de pormenores tanto no interior como no exte- Na Äsia Oriental, a laca era vista como um artigo de luxo

rior dos recipientes. Porcelana kinrande do periodo Jiajing, e usada nas prendas diplomäticas entre äs nacöes. Pratos

sob a forma de jarras, vasos, jarros, tigelas e pratos, era de laca vermelha eram normalmente reservados para äs

extremamente apreciada pelos Japoneses, em particular pessoas com o mais elevado estatuto, ao passo que os res-

para a cerimönia do chä, e foi produzida durante um breve tantes convivas eram servidos em pratos de laca preta.

periodo de cinquenta anos, em meados do seculo XVI. Por outro lado, a laca preta com ouro pintado era reser-

A kinrande sobrevive tambem nalgumas pecas de laca deco- vada para palanquins usados por pessoas de um certo

radas com motivos de animais, ärvores e flores, como e o nivel60. Em 1557, a decoracäo para um desses palanquins

caso destes exemplares ryukyuanos em Kyoto55 e no Schloss foi registada na coleccäo de Catarina, talvez importada de

Ambras. Esta tigela de madeira do seculo XVI com folha- Macau ou das Ryukyu 61 . Vasos e pecas de mobiliärio de

gem, andorinhas e borboletas56, e uma das primeiras pecas laca das Ryukyu eram extremamente apreciados no Sueste

de laca leste-asiäticas numa coleccäo europeia57. Nas lacas asiätico e eram amiüde enviados como prendas tributä-

ryukyuanas do seculo XVI, os motivos de flores e pässa- rias por reis das Ryukyu ao xogunato no Japäo e ä corte

ros surgem usualmente sobre um fundo vermelho cinabre, Ming na China, e Catarina estava claramente a par disto.

conhecido como sangue-do-dragäo, com pintura de folha Duas tigelas de porcelana kinrande inteiramente pintadas

de ouro aplicada segundo a tecnica hakue, um metodo a ouro, consideradas äs mais raras de todas, existentes na

usado tambem no Japäo, em que a incrustacäo de ouro Percival David Foundation, em Londres62, e uma tigela kin-

207
de chumbo (litargirio ou litargo), era uma tecnica prati-

cada nas Ryukyu, e que o leque de cores produzido por

este metodo incluia o branco 64 . Catarina de Äustria deve

ter obtido äs suas pecas directamente atraves de um agente

no Japäo ou em Macau, encomendando a caixa (para uma

tigela) e os engastes de prata dourada para ambas em Goa.

Os oratörios namban, ou altares portäteis (apresentando

duas portas laterais que se fecham sobre uma imagem cen-

tral), do tipo existente na coleccäo de Catarina de Äustria

no ano de 1558, eram produzidos na cidade de Kyoto para


Tafa
Ilhas Ryukyu, seculo XVI jesuitas portugueses e para o mercado europeu, na segunda
Innsbruck, Kunsthistorisches Museum, inv. n." PA 543 (cortesia)
metade do seculo XVI, comecando por volta de i58o65. Estes

rande decorada com a carpa (simbolo de longevidade), flo- oratörios continham um icone devocional central que, fre-

res de lötus e crisäntemos em esmaltes vermelhos, azuis quentemente, era pintado na Europa, com um tracado bäsico

e cor-de-rosa no exterior, e azuis e brancos no interior, pesadamente incrustado com madreperola, e pö de ouro ou

existente em Viena, anteriormente pertencente ä colec- prata (hiramaki-e) salpicado sobre a laca hümida. A super-

cäo de Ferdinando II do Tirol6', podem assemelhar-se, no ffcie era polida com carväo, de molde a produzir um acaba-

que toca ao estilo e ä decoracäo, äs tigelas de laca bran- mento semelhante a ouro. Na Suma Oriental, Tome Pires

cas que Catarina comprou em 1558. Poderä afirmar-se que menciona os cofres e caixas de ouro com folhas de ouro ("de

äs pecas de Catarina eram äs mais raras pecas de laca folhajes de ouro") que os comerciantes das Ryukyu levavam

branca pintada que era possivel ver na Europa da altura. para Malaca 66 , e o oratörio de Catarina, presumivelmente

A verdadeira pintura de laca (urushi-e) resulta de uma mis- com ouro maki-e, pode ter sido comprado nessa cidade,

tura de urushi (laca feita a partir da

seiva da ärvore Rhus verniciferä) com

diverses pigmentos, restringidos a uma

paleta de vermelho, verde, amarelo,

castanho e preto. As tigelas da rainha

eram possivelmente originärias das

Ryukyu, e näo da China ou do Japäo,

visto que e sabido que a pintura com

litargirio, ou mitsuda-e, recorrendo a Duas tacas Ming, Kinmnde


China, periodo Jiajing (1522-1566)
cores com uma base de öleo com öxido Londres, Percival David Foundation of Chinese Art, inv. n.° A4&4 e (cortesia)
tendo a cruz indo-portuguesa e a base de madeira sido acres- mesmo o seu pröprio feitor, joäo de Pedroso (que recebia

centadas em Goa. Os esquemas decorativos da laca namban um salärio como "moco da cämara" no paläcio da rainha

assentavam em motivos florais japoneses, contrastando com em Lisboa), instalado em Goa, a fim de supervisionar melhor

os padröes geometricos ou vegetais ocidentais (motivos geo- äs suas compras na Äsia. Joäo de Pedroso foi encarregado

metricos repetidos, dente-de-serra, ziguezagues e xadrez) na de procurar äs melhores e mais belas raridades disponi-

borda, incrustados com concha de näutilo (ömugai) ou com veis em Goa e, obviamente, Macau e Malaca, como atesta

concha de pera (yakugai), segundo a tecnica raden, produ- um documento do ano de 1562. Durante a decada de 1560,

zindo o conjunto um efeito deslumbrante. As extremidades Catarina de Äustria tornou-se uma especialista em mobi-

exteriores deste tipo de artigo em laca säo pintadas com liärio Ming, japones e ryukyuano, e foi o primeiro sobe-

variacöes do rolo namban, conhecidas como karakusa ("gavi- rano europeu a importar para o Ocidente objectos de laca,

nhas de trepadeira Namban"), padröes de trepadeira em como mesas, cadeiras, escrivaninhas (escritorios) e cofres

ouro, ou rinceaux, que vieram da Äsia Ocidental atraves da abobadados namban. No final dessa decada, a corte de

China67. Por outro lado, o oratörio de Catarina pode ter vindo Lisboa estava bem informada acerca das lacas de elevada

de Kyoto, executado num estilo local conhecido como Ködai- qualidade disponiveis na China, como frei Gaspar da Cruz

-ji makie, que precedeu e acompanhou a producäo de lacas refere no seu Tractado em Que Se Contem muito por Estenso

de exportacäo namban encomendadas pelos Portugueses. äs Cousas da China... (Evora, 1570); frei Gaspar da Cruz

No Ködai-ji makie, motivos simples e temas florais em laca refere, a certa altura, os carpinteiros chineses que pro-

preta, como ervas-de-outono em flor, eram os preferidos. duzem "caixas de muitos feitios, algumas envernizadas com

A caixa de tinta de laca com folhas de ouro que Catarina um verniz muito belo"70. Oliver Impey, contudo, afirma que

possuia em 1557 pode tambem ter vindo de Kyoto. Os objec- a maior parte das lacas de exportacäo que chegaram ä

tos Ködai-ß makie diferiam dos objectos namban com a sua Europa antes de meados do seculo XVII eram de origem

profusäo de incrustacöes de madreperola, um metodo corea- japonesa 7 '.

no de incrustacäo tambem usado nas lacas ryukyuanas 68 . Em 1561, quando comprou os seus quatro "abanos lequios"

Durante o seu reinado, Catarina recorreu a värios agen- de marfim, acima referidos, Catarina adquiriu tambem duas

tes para comprar artigos e mercadorias exclusivos na India cadeiras de dobrar chinesas de laca preta com decoracäo

e no Extremo Oriente 69 . 0 seu ourives pessoal, Diogo Vaz, a ouro, cadeiras que abriam e fechavam como äs cadeiras

estivera instalado em Goa desde 1547 para comprar äs ibericas ("feycäo de cadeyras de descanso"), transporta-

melhores pedras preciosas e jöias indianas e cingalesas das num invölucro de couro (cf. documento l)72. Em biom-

disponiveis no mercado. Funcionärios portugueses na Äsia bos namban, vemos numerosos mercadores portugueses

e no Extremo Oriente eram frequentemente contratados sentados em cadeiras de dobrar similares, feitas de laca

para se envolverem em verdadeiras orgias consumistas, preta ou vermelha com pintura a ouro. As cadeiras de

com custos muito elevados para a rainha. Catarina teve dobrar Ming, huanghuali, um artigo populär tambem expor-

209
tado para o Japäo, eram produzidas com diferentes tipos As tres mesas enviadas para Lisboa em 1562, decoradas em

de madeiras, em particular pau-rosa, com dois tipos de ambos os lados, säo minuciosamente descritas no "mandado"

assentos para äs costas-, direitos ou em ferradura (circula- que referimos: äs partes inferiores dos tampos estavam cheias

res), com ou sem descansos para os bracos73. As cadeiras de folhagem, ramos e pässaros de ouro, e äs partes superio-

de Catarina, muito provavelmente, eram pecas para expor- res variavam nas representacöes de cervos, pässaros, folha-

tacäo que seguiam o modelo das huanghuali. gem, cenas de caca e homens com trajes policromos. As pernas

Em Agosto de 1562, foi redigido um "mandado" para o paga- eram de laca preta com pintura a ouro e outras decoracöes

mento de tres mesas de laca preta, äs quais foram com- de superficie. Cada mesa media aproximadamente 170 x HO cm.

pradas por Joäo Pedroso para a rainha em Macau e expe- A primeira mesa tinha dois paineis ("taboas desapegadas"),

didas para Lisboa a partir de Goa (cf. documento II). Segundo que dobravam a meio, com pässaros e cervos pintados a

este documento, aquelas mesas, descritas como chinesas prata sobre um fundo preto, limitados a toda a extensäo

("da China"), eram identicas no estilo e na tecnica a um por uma borda azul pintada cheia de dragöes alados ("bichi-

outro conjunto de mesas (quantas näo e especificado) que nhos de feycäo de rabos de pejes com asas"). Por baixo,

a rainha recebera nesse mesmo ano. Todas estas mesas eram havia pässaros de prata contrastando com ramos de ouro.

de laca preta com decoracäo a ouro, com dois paineis e per- A segunda mesa tinha tambem dois paineis com um fundo

nas separadas, sem düvida pecas de exportacäo näo manu- de laca preta, representando numerosos homens vestindo

facturadas para o mercado chines, mas encomendadas, pre- trajes policromos em navios de carga (naos), fazendo lem-

sumivelmente nas provincias do Sul da China, por mercadores brar o Barco Negro portugues (Kurofune) que, uma vez por

portugueses, copiando mesas levadas de Goa para a Äsia ano, zarpava de Macau rumo ao Japäo, tantas vezes repre-

Oriental. Estas mesas indo-portuguesas, conhecidas como sentado em biombos namban contemporäneos. Na parte de

gonfos, originalmente seguindo o modelo de mesas de cam- baixo, ramos e pässaros de ouro. A terceira mesa retratava

panha portuguesas, eram facilmente transportäveis e eram pässaros, folhagens e cenas de caca a ouro sobre um fundo

produzidas com värios tipos de madeira, designadamente a preto, com pässaros e ramos de ouro na parte de baixo.

teca, e dobravam-se, abriam e assentavam sobre pernas de Em 1564, Catarina comprou mais cinco mesas de laca

cavalete. Mesas de exportacäo preta (cf. documento III).

goesas surgem frequente- Duas eram especialmente

mente representadas grandes (aproximada-

em colchas indianas mente 165 x 65 cm),

contemporäneas e num guarda-jöias de mar- com folhagem, animais värios, pässa-

fim no Munich Schatzkammer, datado de 1542-

-1545, que outrora pertenceu a Catarina


Trabalho cingalo-portugues, Ceilao, seculos XVI-XVII
de Äustria74. Portugal, Colecfäo Jose Regio

2JO
ros, ervos e pavöes a ouro sobre um fundo preto, sendo usados em ocasiöes festivas e cerimoniais. Trabalhos de

o reverso decorado com folhagem de ouro, dois pavöes cestaria (de bambu) lacada com folha de ouro e laca
e um pässaro. Duas outras eram quase identicas na deco- preta, conhecidos como rantai shikki, eram tambem exe-
racäo, mas mais pequenas (aproximadamente 130 x 100 cm). cutados no Japäo78. A adicäo de arames de metal entre-

Todas elas tinham dois paineis que dobravam a meio, lacados, como se verificava nos cestos de Catarina, para
mas vinham sem pernas. A quinta, a mais pequena de fortalecer äs extremidades, ou incorporados como ele-
todas (aproximadamente 110 x 90 cm), tinha animais, mentos decorativos, era um traco da laca chinesa e
veados e pässaros sobre um fundo preto; contudo, näo coreana do seculo XIV, em desuso no seculo XVI, excepto
ha qualquer referencia sobre se dobrava e se vinha com nas Ryukyu, e apenas para objectos de laca79. Tecnicas
ou sem pernas. As cinco mesas foram fornecidas sem de lacagem chinesas transplantadas para äs ilhas Ryukyu
quaisquer dobradicas ("nemhuä tem machefemeas"), o permaneceram a base do trabalho em laca80. Durante o

que implicava que äs ferragens necessärias tivessem de periodo Ming (1368-1644), todo o tipo de laca comercial

ser acrescentadas posteriormente em Portugal. (incluindo a cestaria) produzido no continente chines,


No mesmo carregamento vinham tambem para D. Catarina especialmente nas regiöes costeiras do Sul, era copiado

tres escrivaninhas (escritorios) quadradas de laca (nam- de uma forma particular pelos habitantes das Ryukyu.
ban7), todas com uma grande gaveta no meio para papel E amiüde dificil distinguir os produtos ryukyuanos do
(presumivelmente com cobertura que, depois de corrida, seculo XVI dos produtos provenientes de Fujian, pois äs

servia de tampo de mesa para escrever)75, duas arcas de suas semelhancas levantam problemas tanto ao nivel da
laca (nambanl) abobadadas, uma maior que a outra, datacäo das lacas como ao nivel da identificacäo da sua
cento e setenta e oito leques de abrir e fechar ("abanos proveniencia 8 ', mas podemos conjecturar que äs lacas

lequios"), que ja referimos, quarenta boyöes (caixas) de de Catarina eram das Ryukyu.
porcelana com tampa, e cinco cestos de laca, sem tam- A iconografia presente nas mesas de Catarina - animais

pas, pintados a ouro, com arame de bronze dourado fantästicos, animais selvagens, ärvores, folhagens, cenas

acrescentado em certas partes, fosse como decoracäo de caca e homens envergando trajes caracteristicos — faz

ou como reforco76. lembrar temas similares encontrados em mobiliärio, lacas,


Estes cestos, que podem ter sido tabuleiros, eram pos- texteis e marfins indo-portugueses, mogöis e cingaleses;
sivelmente de manufactura do litoral chines (Fujian) ou imagens que, em parte, foram inspiradas por gravuras e

das ilhas Ryukyu, visto que os trabalhos de cestaria outras fontes europeias. E razoävel sugerir-se que äs mesas

lacada, como artigos de luxo, entraram em voga na de Catarina de Äustria podem ter misturado estilistica-

segunda metade do seculo XVI tanto na China como nas mente iconografia indo-portuguesa, adaptada de mobiliä-

Ryukyu 77 . Belos cestos lacados, feitos com tiras finas de rio de exportacäo levado para o Sueste asiätico por nego-

bambu e com decoracäo pintada, tornaram-se objectos ciantes portugueses, com motivos chineses, japoneses

2JJ
(namban), ou mesmo ryukyuanos, encontrados na laca

leste-asiätica que registava uma larga circulacäo em Macau,


em Cantäo, no Japäo e nas Ryukyu 82 .
Uma mesa de laca preta, de abrir e fechar, chinesa ou

ryukyuana (sem pernas), outrora na coleccäo de


Ferdinando II no Schloss Ambras, e actualmente no Öster-
reiches Museum für angewandte Kunst, em Viena, asse-

melha-se muito na iconografia e nas medidas äs mesas de

laca de abrir e fechar que Catarina adquiriu nos anos de


i56o83. Este tampo de mesa, medindo 96,4 x 121 cm, foi

inventariado nas coleccöes Ambras em 1596 e em 1621, e

a data do seu fabrico situa-se entre 1583 e 1592. Chegou


a Innsbruck, vindo de Lisboa, como prenda do sobrinho

de Ferdinando, o arquiduque Alberto de Äustria (1559-


-1621), vice-rei de Portugal de 1582 a I59384. E composto

por dois paineis que dobram no meio, com dobradicas de Tampo de mesa Hing ou Ryukyuan
Ilhas Ryukyu ou China
bronze ou cobre näo adornadas no lado de cima, fazendo Viena, Kunsthistorisches Museum, inv. n." 4958 (cortesia)

lembrar äs mesas de gonfo portuguesas exportadas de

Goa. As extremidades säo enquadradas por uma borda Ferdinando II, acima referida, que o arquiduque Alberto

separada, como sucede na mesa descrita no "mandado" de Äustria enviou para Innsbruck na mesma altura que a

de Catarina, decorada com uma elaborada ornamentacäo mesa de Viena. Por essa altura, o comercio com äs Ryukyu

de arabescos, de influencia indo-portuguesa (Guzerate) e o Japäo encontrava-se firmemente nas mäos da Coroa

ou pröximo-oriental (Mamelucos) 85 . A fauna e a flora pin- espanhola, e artiges de exportacäo exclusivos estavam

tadas a ouro em ambos os lados da mesa de Viena mos- disponiveis em grande quantidade em Lisboa em i58o86.

tram elaborados arabescos, ärvores, flores, pässaros, vea- Nos inventärios da coleccäo Ambras de 1596 e 1621, a mesma

dos, esquilos, uvas e videiras, replicando o conjunto de e situada na biblioteca de Ferdinando II, näo necessaria-

imagens policromas, em ouro e prata, das mesas de mente usada para receber livros, mas sim para exibicäo.

Catarina, e säo motivos repetidamente encontrados em Contudo, nem todos os livros de Ferdinando se encontra-

lacas contemporäneas namban ou das Ryukyu. A mesa, vam na biblioteca; alguns, como os raros incunäbulos e

executada segundo a tecnica hakue, apresenta seme- manuscritos, estavam no oitavo gabinete da sua kuns-

Ihancas, no estilo, na tecnica, na data e na proveniencia, tkammer1*7, onde se encontravam expostos, em vitrinas,

com a tigela kinrande ryukyuana vermelho-cinabre de objectos e artigos exöticos da coleccäo de Ferdinando.

232
0 arquiduque deve ter considerado a mesa uma peca rara do seculo XVI 89 . Em 1580, o ano em que Filipe II de Espanha

ou antiga, digna de figurar ao lado de moldes de gesso e anexou o trono portugues, mesas de laca, como äs que

de estätuas de märmore e alabastro de figuras mitolögi- Catarina coleccionou e como a mesa de Viena, estavam

cas antigas. Neste sentido, objectos de dois mundos anti- ä venda em grande quantidade na cidade de Lisboa. Um

gos - Ocidente e Oriente - encontravam-se expostos numa relato contemporäneo descreve como eram äs mulheres

ünica sala, remanescente de um studiolo dos primördios e os homens chineses: "[...] engenhosos; eles usam real-

da Renascenca. Retratos contemporäneos de parentes mente obras desenhadas e obras esculpidas, excelentes

Habsburgos, pinturas religiosas e mitolögicas, uma colec- pintores de flores, pässaros e animais, como se pode ver

cäo de minerais, vidro, coral, esferas e um relögio de sol em camas e mesas que de lä säo trazidas. EU pröprio vi

tambem se encontravam ai expostos, tal como uma genea- uma que foi trazida para Lysborne [Lisboa] no ano de 1582

logia iluminada da Casa de Äustria e quarenta e um mode- pelo Capitäo Ribeira, sargento-chefe de Manilla, que era

los de madeira das entradas triunfais do imperador de ficar maravilhado com a excelencia dela; foi causa da

Maximiliano I. Ferdinande, portanto, por associacäo a admiracäo de Sua Majestade o Rei Filipe II e ele e uma

objectos de terras distantes, do passado histörico, e outros pessoa que pouco se maravilha com äs coisas. Todas äs

ligados ä sua ilustre dinastia, podia näo so mostrar aos pessoas ficaram realmente maravilhadas com ela; e mais

visitantes e eruditos o seu notävel conhecimento, poder ainda, os famosos ornamentadores espantaram-se com

e estatuto, mas tambem demonstrar que os mundos anti- a curiosidade que ela provocou." 90

gos, tal como o Extremo Oriente, se encontravam sob o Ainda antes da chegada de Filipe, o comercio de produ-

dominio e a egide dos Habsburgos. tos e lacas asiäticos em Lisboa registara um acrescimo

Em 1609, quando o clä Shimazu invadiu äs Ryukyu e äs substancial em finais do seculo XVI. Todos os niveis da

colocou sob o controlo do xogunato Tokugawa, estä documen- sociedade portuguesa, desde os padres jesuitas aos aris-

tado que mesas de laca preta das Ryukyu foram envia- tocratas, sofriam de uma verdadeira febre pelas coisas

das para Edo como prendas tributärias 88 . Podem ter sido orientais-. objectos de laca, designadamente mesas, camas,

mesas de abrir e fechar, como äs mesas coleccionadas escrivaninhas, arcas, caixas, utensilios religiosos e pin-

por Catarina de Äustria e Ferdinando II do Tirol, estri- turas em rolo chinesas, eram comprados em grande quan-

tamente feitas para exportacäo, visto que os Japoneses tidade. 0 sobrinho de Catarina, Duarte, duque de

e os Ryukyuanos näo se sentavam ä mesa para comer. Guimaräes (1541-1576), dä-nos uma pista no seu testa-

A existencia da mesa do Schloss Ambras, e äs mesas refe- mento de 1576, no quäl sobressaem objectos de prove-

ridas nos documentos de Catarina, comprovam que mesas niencia asiätica: uma pintura em rolo chinesa, quatro

de laca preta, influenciadas pelos trabalhos de laca chin- escudos chineses ou japoneses (samurais) e quatro colo-

kin preta chinesa, e mobiliärio de exportacäo chines e ridas pinturas de Xiäo (China?)9'. Quatro anos depois, o

indo-portugues, eram feitas nas Ryukyu na segunda metade rei de Portugal, cardeal D. Henrique (reinou de 1578 a

2(3
1580), viu-se obrigado a pagar o resgate de cativos por- Catarina de Äustria continuou a adquirir jöias e porcelanas
tugueses no Norte de Äfrica, vendendo tudo quanto per- chinesas e laca leste-asiätica nos Ultimos anos do seu rei-
manecia nas coleccöes e tesouros regios. A quantidade nado; algumas pecas säo registadas numa data täo tardia
de artigos de mobiliärio e porcelanas leste-asiäticas, de como I57393. A ültima referencia a lacas ocorre em 1570,

tapetes e objectos de laca chineses, alguns dos quais, quando a rainha comprou, pela elevadissima soma de qua-
possivelmente, originärios da coleccäo de Catarina, envia- renta e tres mil reais, uma grande peca de ämbar decorada
dos como presentes para o xerife de Marrocos, e abso- com uma corrente de ouro incrustada com diamantes e rubis,

lutamente espantosa-. uma cama chinesa ricamente orna- que podia ser usada a partir do punho. Veio num pequeno

mentada e dourada, com um dossei de tafetä branco, corno preto de madeira, por sua vez colocado numa caixa
pintado com pässaros, ärvores e flores de ouro, e todos redonda da China, trazida da India pela carraca Reis Magoä"'.

os acessörios necessärios (almofadas e mantas); conchas

de näutilo incisas engastadas e näo engastadas (impor- Prendas de laca


tadas da China); uma grande escrivaninha chinesa dou- da Äsia Oriental
rada que pode ter sido de producäo namban- uma mesa para a corte espanhola.
de abrir e fechar, de laca preta, com acessörios e dobra- lsabel de Valois
dicas de prata, e pernas de cavalete de laca preta e ouro, e o infante Carlos
e uma outra mesa de abrir e fechar com äs extremida- Durante a decada de 1560-1570, Catarina de Äustria pre-
des incrustadas com madreperola, e pernas feitas de senteou membros da sua familia na corte de Madrid com

madeira de nogueira (madeira de huanghuali?) pintadas pecas exclusivas de mobiliärio de laca asiätico, como um
a preto e ouro (ambas äs mesas podem ter sido originä- reflexo da sua sorte na obtencäo de tais raridades, e tam-
rias das Ryukyu); uma caixa de escrever japonesa (sur- bem como um reflexo da sua posicäo como princesa
zuribako), contendo utensilios para escrever (pedra de Habsburgo e rainha de um imperio ultramarino. Membros

tinta, batedor de areia, gotejador de ägua, duas penas da sua familia mais chegada receberam pecas de mobiliä-
de prata, um canivete, tesoura dourada, uma libra de rio da China ou das Ryukyu como prendas reais da corte
goma-laca indiana (um substituto semelhante ä cera para de Lisboa. lsabel de Valois, a terceira esposa de Filipe II,

selar cartas) e papel dourado. Dois caixotes enviados por que faleceu em 1568 com vinte e dois anos de idade, foi
D. Henrique para Marrocos continham duzentas e setenta presenteada com uma mesa de abrir e fechar com pernas,
e duas pecas de porcelana chinesa, incluindo louca kin- poucos anos antes da sua morte95. A mesa em causa era

rande. Muitas pecas eram policromas com esmaltes colo- similar, no que toca ä decoracäo, äs mesas de laca preta
ridos e pintura a ouro, e outras tinham a forma de cama- que Catarina adquiriu em 1562 e 1564, e deve ter provindo
röes e cobras douradas. Ate mesmo um jarro de laca de um desses carregamentos. lsabel de Valois recebeu tam-
colorida e decorada a ouro foi incluido92. bem um banco baixo de laca preta, decorado da mesma
maneira que a mesa, banco que näo estava documentado (sem düvida lacas) que a rainha Ihe mandou por correio
nos "mandados" de Catarina. A rainha portuguesa mandou especial100. A fama de Catarina como compradora de objec-
tambem para lsabel de Valois dois escritorios de laca preta, tos exöticos era bem conhecida entre os seus parentes,

com pintura a ouro, provavelmente namban, um dos quais e prendas excepcionais, como papagaios e pedras bezo-
foi vendido em leiläo apös a morte de lsabel. 0 outro, de ares, eram pedidas pelos irmäos, o imperador Ferdinande I
um valor considerado inestimävel, foi para a coleccäo (1503-1564) e Carlos V (1500-1556)'°'. Do mesmo modo, reli-

de Joana de Äustria (1535-1573), em 1573, pouco antes da quias e outros produtos indo-portugueses eram trocados
morte da princesa96. Foi registada no inventärio da colec- com a sua irmä, Maria de Hungria (1505-1558), que rece-
cäo de Joana no Convento de las Descalzas Reales "uma beu uma mesa de laca preta, mais tarde herdada por

escrivaninha de laca preta e ouro com compartimentos Filipe II, e com a sua sobrinha, Maria de Äustria (1528-
dentro, o exterior guarnecido com acessörios de prata, -1603). Na aquisicäo de produtos asiäticos, Joana de Äustria
uma fechadura nigelada e quatro acessörios de prata em chegou mesmo a actuar como intermediäria entre äs cor-

cada canto com a forma de animais" 97 . tes de Viena e de Lisboa, como comprova uma carta de
Catarina adorava presentear o seu neto Carlos (1545-1568) 1572, na quäl o imperador Maximiliano II (1527-1576)

com prendas exöticas: escravos negros e dispendiosos expressa a sua satisfafäo pelo facto de Joana ter escrito
papagaios, bem como uma mesa de abrir e fechar de laca para Portugal, obviamente para Catarina de Äustria,
preta com pernas de cavalete e duas cadeiras de desar- pedindo "coisas estrangeiras" (fremde sachen), ou rari-

mar de laca preta com ouro, äs quais vieram seguramente dades, que ele procurava para a sua coleccäo102. Mesmo
num dos seus carregamentos recebidos em 1562 ou 1564. o embaixador de Maximiliano II em Madrid, Hans
A mesa e äs cadeiras estäo registadas no inventärio de Khevenhüller, recebeu ordens para obter pedras bezoa-

1568 dos bens de Carlos: "[...] uma mesa de madeira da res disponiveis em Lisboa, no ano de 1576.

India [sie] coberta com laca preta pintada a ouro com


dobradicas douradas e duas cadeiras do mesmo labor."98 Filipe II de Espanha
E possivel que äs cadeiras de Carlos sejam äs mesmas que Em 1580, quando anexou a Coroa portuguesa, Filipe II resi-

o pai, Filipe II, integrou na sua coleccäo, hoje no Escorial. diu em Lisboa durante mais de dois anos. Ao longo deste
Joana de Äustria näo foi menos favorecida por Catarina, pen'odo, näo se poupou a esforcos para obter artigos asiä-

que Ihe enviava regularmente prendas leste-asiäticas, ticos para si e para a sua familia. Cartas escritas neste

artigos pelos quais a princesa desenvolveu uma inclina- periodo para äs suas filhas em Espanha confirmam estas

cäo durante os dois anos em que viveu na corte de Lisboa, aquisicöes'03. Em certa ocasiäo, Filipe passou horas a obser-
de 1552 a 1554". Uma carta datada de 1566 informa Catarina var a descarga de navios da India e, numa outra, comprou
do prazer com que Joana recebeu o ämbar, benjoim, por- servicos de porcelana chinesa para os seus filhos, enviou-
celana chinesa, cocos e pratos e recipientes de madeira -Ihes limöes e rosärios da India, prometendo mesmo ao

215
seu filho um "escritorio da India", caso ele perseverasse em gaze, bordados a seda e ouro, com dragöes, pässaros

nos estudos. Um elefante de Goa foi mandado para o "nativos da China", animais e homens; quatro pinturas em
mesmo pn'ncipe em Julho de 1582, uma prenda do vice-rei seda representando nativos a cavalo, levando pässaros;

Francisco de Mascarenhas. Os Interesses de Filipe II nunca uma cadeira de abrir e fechar de laca com um assento

eram negligenciados e, numa carta datada de 25 de Outubro entretecido, muito provavelmente um dos "bancos da gota"

de 1582, escrevia ele äs suas filhas: "Estou determinado em de Filipe II, herdados do seu filho Carlos106.
encontrar outros objectos para levar para Madrid comigo, Ha no inventärio uma ünica referencia directa ao Japäo,

mas e dificil enconträ-los, embora digam que tem muitas na quäl säo registados dois oratörios namban, um deles

coisas a bordo de um dos navios." descrito com pormenor: duas portas, o interior forrado

0 contacto sistemätico de Filipe II com produtos asiäticos com papel, e laca preta no exterior com acessörios de

em Lisboa aticou indubitavelmente o seu desejo de adqui- bronze dourado nigelado. A base era de ebano, com uma

rir mais. Apös a sua morte, ocorrida em 1598, um inven- configuracäo triangulär, assente em tres bolas de madeira.

tärio da sua coleccäo inclui tres mil pecas de porcelana Foi vendido em leiläo quando alguns objectos da colec-

Ming (azul e branca, bem como monöcroma), estatuetas cäo de Filipe foram seleccionados para venda, tendo em

de marfim chinesas, caixas de laca japonesas ou chinesas, vista o pagamento de elevadas dividas.

pecas de mobiliärio e quadros, bem como armas indianas Mais objectos de laca entraram na coleccäo no ano de

e asiäticas, roupas e instrumentos musicais, muitos dos 1584, quando Filipe II recebeu, na corte de Madrid, uma

quais näo sobreviveram104. A lista e muito vasta, pelo que delegacäo japonesa que foi enviada ä Europa pelo jesuita

vou citar apenas alguns casos. Filipe II, por exemplo, pos- Alessandro Valignano (i539-i6o6)'°7. Esta embaixada, cujo

suia uma balanca chinesa guardada numa caixa de laca; destino final era Roma, foi organizada para assegurar o

doze escrivaninhas pretas e douradas; jogos de caixas de apoio papal äs actividades e ao trabalho missionärio da

laca encaixadas umas nas outras; tabuleiros com trabalho ordern jesuita no Japäo, e quatro jovens convertidos japo-

de cestaria, decorados com laca preta ou colorida e pin- neses de proeminentes familias däimio de Kyushu faziam

tados com pässaros, ärvores e folhagens a ouro, ou homens parte da comitiva. Foram trocados presentes, tendo o rei

lutando contra tigres, ao passo que outros (talvez das recebido um biombo namban, pintado com um mapa da

Ryukyu ou da Coreia) estavam incrustados com madrepe- China, talvez executado pelo mais renomado pintor do

rola; cinco arcas encaixadas, designadas como cofrecillos Japäo, Kano Eitoku108. Um sortido de objectos mais peque-

de junco'05; quatro mesas de abrir e fechar de laca preta, nos - incluindo uma bacia de madeira decorada com uma

uma delas incrustada com madreperola e äs outras pinta- borda de ouro e uma escrivaninha de bambu - foi envi-

das com pässaros, animais e ärvores a ouro (uma das quais ado pelo poderoso senhor da guerra Oda Nobunaga (1534-

pertencera a Maria de Hungria); vinte e seis quadros for- -1582). 0 biombo de Filipe II foi descrito por Cassiano dal

rados com papel chines, alguns pintados em tafetä, outros Pozzo em 1626, no Salon Nueva do paläcio de Madrid, como

216
"um especime de pintura" extremamente "encantador"109. Duas pinturas chinesas estavam expostas na Sala Grande

0 sucessor de Nobunaga, Toyotomi Hideyoshi (Fig. 10), pre- do Alcäzar; uma dessas pinturas era um "retrato" de dife-

senteou Filipe II com espadas samurai (daisho) e duas rentes pässaros chineses, que foi descrito num relato de

armaduras completas (Iroiro Odoshi Haramaki) do periodo 1599 e registado no inventärio de Filipe de ijgS"3. Em 1599,

Muromachi, cobertas em parte com laca (urushi), decora- na Sala de las Furias, onde o rei dormia, encontrava-se

das com crisäntemos de ouro maki-e, um distintivo per- um banco baixo chines pintado e coberto com um tapete

tencente ä casa imperial japonesa'10. Estes presentes foram de seda"4. A Pieza de la Torre albergava värias pecas de

levados para Espanha pela embaixada enviada por Valignano porcelana (azul e branca, monocroma, policroma, algumas

e encontram-se hoje na Real Armeria, em Madrid. Filipe II, douradas, e outras talvez kinrande), bem como estatuetas

por sua vez, enviou um elefante a Hideyoshi no ano de de porcelana, como um elefante com um homem em cima,

1596. 0 elefante era um animal exötico extremamente apre- ou barcos com homens.

ciado e fora levado pela primeira vez para o Japäo pelos Uma predileccäo pelo extraordinärio ditava a decoracäo da

Portugueses, naquele que era denominado pelos Japoneses Casa del Tesoro, onde se encontravam numerosas pinturas

o grande Navio Negro"1. de animais exöticos, incluindo tres telas que retratavam rea-

A coleccäo asiätica de Filipe foi guardada em dois locais: listicamente, al natural, pässaros chineses"5. Estas pinturas

o paläcio real do Alcäzar e a Casa del Tesoro, um anexo contrastavam com vasos e jarros de porcelana Hing azul e

exterior ao complexo palaciano, que servia de residen- branca, recipientes de concha de tartaruga, provavelmente

cia a pintores da corte como Alonso Sänchez Coello e originärios de Goa, conchas de näutilo e mobiliärio de laca

Veläzquez" 2 . Parte da coleccäo asiätica de Filipe ficou, preta. Assim, exemplares impressivos de texteis, pinturas,

portanto, em exposicäo, para que a corte a desfrutasse, mobiliärio e porcelana asiäticos eram deliberadamente esco-

em vez de permanecer num ünico local — como numa Ihidos pelo soberano espanhol para a decoracäo de um con-

kunstkammer, por exemplo o Schloss Ambras - onde os junto de cinco salas que eram usadas por ilustres dignitä-

objectos eram hermeticamente isolados e guardados, e rios e diplomatas, os quais, quando visitavam a corte de

mais selectivamente exibidos e vistos por um nümero Filipe II, eram alojados neste anexo do paläcio de Madrid.

mais restrito de visitantes. Alguns desses objectos, como

era o caso das cadeiras huanghuali, usadas para mitiga- O Convento das Descalzas Reales
rem o sofrimento causado pela gota de que Filipe pade- Em 1555, Joana de Äustria adquiriu o paläcio de Madrid,

cia, destinavam-se a uma utilizacäo diäria; outros, muito pertencente ao antigo ministro das Financas de seu pai

provavelmente, eram para exibicäo pUblica em festivi- (Alfonso Gutierrez), e converteu-o no Convento Real de

dades e cerimönias da corte, como reminiscencias exö- las Descalzas Reales para freiras franciscanas que prati-

ticas do domfnio de Filipe sobre um imperio oriental e cavam uma rigorosa observäncia da regra de Santa Clara.

ocidental. 0 convento transformou-se tambem num retiro para mulhe-

2*7
res (legitimas e naturais) das casas espanhola e austriaca mil cruzados, providenciados pela Alfändega, a Casa da

dos Habsburgos — um convento aristocrätico para damas India, em Lisboa, como parte dos rendimentos de Maria"7.
de sangue real ou nobre. Quartes e salas das Descalzas, Outros privilegios de Portugal incluiam certas quantida-

näo pertencentes äs freiras, eram habitados por damas e des de ämbar, almiscar (almizcle) e almiscar de gatos-de-

membros da corte de Joana. Perto dos seus aposentos pri- -algälia (ou civetas) (algaliä), usados na producäo de per-
vados, foi construida uma pequena cämara para impor- fumes. 0 inventärio de Maria de Äustria relative ao ano

tantes relicärios oferecidos por Maria de Äustria, Ana de de 1603 regista värios artigos asiäticos e indianos: um vaso

Äustria (1549-1580) e Rudolfo II de Praga (1552-1612), que de corno de rinoceronte com uma tampa e um pe engas-

Joana posteriormente doou ao convento. Este relicario foi tado, uma taca de ägata, pedras preciosas e jöias sortidas,
construido no quarto onde Joana de Äustria nasceu; o tecto porcelana chinesa e um coco das Maldivas engastado indo-

estava forrado com espelhos para dar a sensacäo de um -portugues com cinco botöes de marfim com a forma de

espaco alargado. As paredes tinham aberturas preenchi- tartaruga"8. Alguns destes artigos podem ter sido ofereci-

das com relicärios, a fim de que o jogo de luz proveniente dos por Catarina de Äustria. Nos dez meses em que viveu

do tecto fizesse sobressair o brilho do cristal de rocha, em Portugal, Maria tratou de obter artigos de exportacäo

das pedras preciosas, do ouro e da prata. 0 quarto funcio- asiäticos para o seu filho, Rudolfo II, a quem enviou um

nava como uma kunstkammer, dentro de um contexto reli- grande corno de rinoceronte engastado com faixas de fili-

gioso, albergando numerosas reliquias, encaradas como grana incrustada com pedras preciosas e um vaso litür-

"maravilhas" de uma natureza divina. Havia tambem um gico de coco com engastes indo-portugueses (Kunsthis-

pequeno nücleo de cofres e guarda-jöias de laca indianos torische Museum, inv. n.° 913), ambos registados no

(Guzerate), japoneses e namban, usados como recipientes inventärio de Rudolfo II de löoy-iön" 9 .

preciosos e exöticos para reliquias igualmente preciosas. Os objectos de origem asiätica, hoje desaparecidos das

A proveniencia e a histöria destas pecas, algumas publi- Descalzas Reales, ou eram compras que Maria fez enquanto

cadas e outras näo, tal como näo ha documentos de registo esteve em Lisboa, ou foram-lhe enviados pelo seu filho,

da sua entrada nas Descalzas"6. o arquiduque Alberto de Äustria, entäo vice-rei de Portugal

A irmä de Joana, a imperatriz Maria de Äustria, instalou- (de 1583 a 1593), que residiu em Lisboa precisamente na

-se na corte espanhola no ano de 1582 e estabeleceu a sua altura em que äs pecas indo-portuguesas, cingalesas e
residencia oficial no convento, reformando os aposentos leste-asiäticas entravam nas coleccöes reais espanhola

que haviam pertencido a Joana. Em 1582, juntou-se a seu e austriaca em nümero crescente120. 0 arquiduque Alberto

irmäo, Filipe II, em Portugal, tendo chegado a Almeirim deve ter fornecido a maior parte dos objectos asiäticos
em Abril do mesmo ano. Ai residiu ate Fevereiro de 1583, de alta qualidade que foram enviados para o Schloss

regressando depois com o irmäo a Madrid. A 4 de Maio de Ambras, entre os quais se contavam mais de duzentas e

1591, Filipe II concedeu-lhe uma soma anual de cinquenta cinquenta pecas de porcelana Ming azul e branca, trinta

2(8
tigelas kinrande, quatro tigelas das ilhas Ryukyu com tra- incrustada com perolas e pedras preciosas, com um valor
balho de cestaria, um grupo de estatuetas de pedra-de- superior a sessenta mil cruzados, excelentes pedras bezoa-

-sabäo chinesas, quatro pinturas em rolo chinesas121, uma res, uma centena de pecas de ämbar e tecidos indianos'25.

escrivaninha namban, conchas de näutilo chinesas, mar- A propensäo coleccionista do arquiduque Alberto deve ter

fins originärios de Ceiläo (guarda-jöias e um leque de sido estimulada pelo contacto com äs coleccöes de Filipe II
abrir e fechar) e, por fim, a mesa de abrir e fechar ryuk- em Espanha, onde residiu de 1570 a 1580. 0 contacto per-

yuana acima referida. Frascos de concha de tartaruga manente com objectos e lacas asiäticos, durante os dez

com a forma de coracöes e com filigrana indo-portuguesa anos em que viveu em Lisboa, agucaram ainda mais o seu

e uma grande salva (tazzä), inicialmente registada no gosto por objectos exöticos.

inventärio de Ferdinande II no Schloss Ambras, e mais Foi Alberto de Äustria quem recebeu oficialmente a mis-

tarde na coleccäo de Rudolfo em Praga, foram obtidos säo japonesa enviada por Valignano, quando esta chegou
atraves de Alberto durante a sua permanencia em a Lisboa no ano de 1584, organizando recepcöes e ban-

Portugal122. Alberto enviaria mais tarde, em 1609, a Rudolfo II, quetes nos värios mosteiros e paläcios de Lisboa, onde

inümeros objectos asiäticos, incluindo recipientes de por- foram trocados presentes'26. Ao arquiduque foram ofere-

celana e laca, oito mesas de abrir e fechar pretas e ver- cidos objectos de laca. Na realidade, Alberto regressou a

melhas, similares ä mesa do Schloss Ambras, e escriva- Espanha em 1593, carregado de objectos e "riquezas" asiä-

ninhas, äs quais foram compradas por intermedio de ticos, que foram transportados para Castela em cento e

agentes em Lisboa1'3. Ate mesmo a irmä de Alberto, lsabel cinquenta grandes carrocas127. A sua coleccäo no paläcio
de Äustria (1554-1592), recebeu artiges provenientes de de Bruxelas, onde residiu apös 1599, como governante dos

Portugal, os quais foram especificados no seu inventärio Paises Baixos, ja casado com a filha de Filipe II, Clara lsabel

de 1593, designadamente noventa e nove pecas de por- Eugenia (1566-1613), compreendia uma kunstkammer repleta

celana chinesa, leques de abrir e fechar da ilha de Ceiläo, de objectos preciosos e muito dispendiosos, alguns dos

pedras bezoares, pinturas em seda chinesas e quatro quais provenientes de Lisboa. 0 retrato de lsabel que foi

guarda-jöias indianos que Rudolfo II reivindicaria mais pintado por Juan Pantoja de la Cruz, em Espanha, no ano

tarde para si'24. de 1599, ou seja, pouco tempo depois do seu casamento,
0 pröprio Alberto de Äustria era um coleccionador e um revela a inclinacäo da princesa por acessörios orientais,

especialista de pecas de kunstkammer e de objectos asiä- um gosto que comecou por ser estimulado pelo pai, Filipe II.

ticos que apreciava muitissimo. Em 1581, Catarina de Nesse retrato, lsabel segura um leque de abrir e fechar

Braganca ofereceu-lhe, no paläcio de Vila Vicosa, dispen- asiätico com extremidades protectoras de laca preta e

diosas prendas provenientes de Goa. Catarina de Braganca ouro; um costume que lsabel, indubitavelmente, levou para

estava consciente de que essas prendas iriam agradar muito os Paises Baixos (Munique, Alte Pinakothek, inv. n.° 987).

a Alberto: uma casca de coco engastada das Seychelles Os arquiduques contrataram agentes na Flandres e
na Peninsula Iberica, para que realizassem aquisicöes missal (shokendai) namban, aqui publicadas pela primeira

reguläres, e extremamente dispendiosas, de objectos e vez, exibem o monograma IHS dos Jesuitas, e a outra,

mercadorias exöticas que iriam enriquecer a sua ampla com äcer pintado (momizi ou folhas-de-outono), incrus-

coleccäo. tado com madreperola, foi na verdade feita com duas

A julgar pelas datas dos objectos asiäticos do Convento portas exteriores de um oratörio namban perdido129.

das Descalzas Reales, e plausivel que Alberto tenha sido A peca mais curiosa e um grande guarda-jöias rectangu-

o responsävel pela expedicäo dessas pecas exclusivas lar de concha de tartaruga castanho-escura com veios ama-

para Madrid, como prendas para a mäe e tambem para relos (23 x 40 cm), com engastes e pegadores de prata, os

a irmä, a arquiduquesa Margarida (Margarida da Cruz), quais foram acrescentados sem düvida em Espanha ou em

que entrou para a Ordern das Descalzas em 1588. Uma Portugal. Toda a superficie sob a concha de tartaruga estä

grande arca abobadada namban do periodo Momoyama profusamente pintada com flores de lötus e animais: tigres,

(38 x 49 cm), datada de finais do seculo XVI, hiramaki-e avestruzes, coelhos, veados, antilopes e pavöes, inspira-

sobre laca preta, incrustada com madreperola (raderi) e dos por uma fönte chinesa (pintura em laca ou seda), que

uma borda com padräo geometrico repetido, e densa- data de meados do seculo XVI. 0 interior da tampa mos-

mente decorada com camelias e flores de cerejeira tra uma cena de banquete, com värios japoneses senta-

(sakura), um simbolo da Primavera, faisöes e cäes-leöes dos, incluindo um samurai, jantando a uma mesa e servi-

chineses. Trata-se de uma arca de excelente qualidade e dos por criados. Esta invulgar representacäo parece ter

era um artigo Standard baseado em modelos europeus, sido livremente copiada de um desenho do Cödice

produzido para exportacäo. 0 interior e de laca preta, Casanatense (ms. 1889), actualmente em Roma, pintado

com vegetacäo a ouro (trepadeiras kudzu) pintada na por um artista anönimo em Goa, em meados do seculo XVI,
tampa superior. Um pequeno guarda-jöias de laca preta que mostra dois casais portugueses sentados a uma mesa,

(13,5 x 18,5 cm), europeu na forma, incrustado com con- servidos por criados, jantando num tanque para se man-

cha de pera (yokugai) segundo a tecnica raden, pintado terem frescos, em Ormuz.

com patos, e divulgado aqui pela primeira vez. E possi- 0 guarda-jöias das Descalzas Reales, com uma iconografia

velmente namban e/ou Ködai-ji makie, do periodo rara, pode ter sido encomendado no Japäo, ou no Sul da

Momoyama, produzido para exportacäo, datando dos ini- China, por um mercador portugues, e pode ter-se baseado

cios do seculo XVII 128 . Patos mandarins (oshidori) simbo- num desenho trazido de Goa, retirado do Cödice Casana-

lizam a fidelidade no casamento, ao passo que os lados tense. Aqui, äs influencias estilisticas ultrapassaram fron-

mostram borboletas e campänulas chinesas com kara- teiras. 0 intenso comercio de artigos de luxo entre o Extremo

kusa (gavinhas de trepadeira namban) pintadas nas mar- Oriente, a corte mogol e a India Portuguesa, cultivava um

gens. Os pes - bolas de ebano - foram provavelmente cruzamento de influencias culturais, uma mistura de fon-

acrescentados em Portugal ou Espanha. Duas estantes de tes pictöricas e a troca de artifices asiäticos, como se pode

220
2l
ver pela mesa de laca ryukyuana de Ambras. Poderemos IAN/TT, Cartas Missivas, maco i, Mendes Pinto, op. cit., p. 301.
doc. 203, in Macau e o Oriente, cat. n.° 2. Para uma sintese dos relatos e des-
apenas especular, no que toca ä pessoa para quem o guarda- IAN/TT, Corpo Cronolögico, I, maco 14, cricöes de viagem sobre äs ilhas Ryukyu
doc. 52, in Macau e o Oriente, cat. desde a Antiguidade ate meados do
-jöias das Descalzas Reales terä sido feito e no que toca ao n.°3. seculo XVI, ver G. Schurhammer, "0 des-
7 IAN/TT, Corpo Cronolögico, i, maco 19, cobrimento do Japäo pelos Portugueses
modo como terä chegado a Madrid; no entanto, o guarda- doc. [02, in Macau e o Oriente, cat. no ano de 1543", in Orientalia,
n." 4. Roma/Lisboa, 1963, pp. 485-524.
-jöias foi certamente obtido em Lisboa, via Macau ou Goa. 8 IAN/TT, Cartas dos Vice-Reis da india, Publicado por R a f f a e l l a D'lntino,
n.° 153; Gavetas, 15, maco 17, n."27, ambos Enformacäo das Cousas da China. Textos
A rede familiär dos Habsburgos, que ligava a corte de in Macau e o Oriente, cat. n.°s 5-6. do Seculo XVI, Lisboa, 1989, p. 470.
9 IAN/TT, Corpo Cronolögico, i, maco 30, Lach, op. cit., p. 655.
Bruxelas, nos Paises Baixos, ä corte imperial nos territö- doc. 49, in Macau e o Oriente, cat. 25 Uma outra possivel referencia ini-
n." 8. tial äs ilhas Ryukyu surge num "man-
rios austriacos, e a Madrid e Lisboa, era uma rede fechada, J. P. Oliveira e Costa. A Descoberta dado" de 1554, em que Catarina de Äustria
da Civilizacäo japonesa pelos Portu- pagou doze mil reais pela compra de
cultivada ao longo do seculo XVI. 0 relacionamento fami- gueses, Macau, 1985, p. 114: "[...] para seis tapetes (chineses?) de Xiu, resul-
andarem tres annos para a China e para tando a ortografia deste Ultimo termo
liär foi fomentado, contra o tempo e äs grandes distän- todas äs partes da India feitorizando provavelmente de uma adaptacäo fone-
para a Rainha." tica do termo chines Liu-ch'iu. Ver
cias, atraves de uma vasta correspondencia, de lacos e 11 IAN/TT, Nücleo Antigo, 790, fl. 93v; IAN/TT, Corpo Cronolögico, maco 93,
.cit. in A. Jordan Gschwend, "As maravi- doc. 151 (25 de Outubro de 1554).
trocas diplomäticos. Os embaixadores residentes nas cida- Ihas do Oriente: Coleccöes de curiosi- Gostaria de manifestar o meu reco-
dades renascentistas em Portugal", in A nhecimento a Rafael Moreira por ter
des de Lisboa, Madrid e Viena, asseguravam que os lacos Heranca de Rauluchantim, Lisboa, 1996, partilhado generosamente comigo os
p. 112. seus pontos de vista sobre leques de
politicos e familiäres fossem constantemente mantidos e 12 C. Clunas, "The Ryukyu Islands", abrir e fechar japoneses. Ver Rafael
in Lacquer. An International History Moreira, "Leques: Um adereco extremo-
que os canais de comunicafäo se mantivessem abertos. and lllustrated Survey, Nova lorque, -oriental ä conquista da Europa", in Arte
1984. pp. 136-141. na Rota dos Descobrimentos Portu-
A troca de prendas cimentava ainda mais essas relacöes. 13
Tome Pires. A Suma Oriental, ed. Ar- gueses, Lagos, simpösio, 18-20 de Abril
mando Cortesäo, Coimbra, 1978, p. 372. de 1996 (Oceanos, Lisboa, a publicar).
A identidade familiär centrava-se no culto da dinastia, e 1 David Lach, Asia in the Making of Ver tambem B. Ferräo, Mobiliario
Europe, vol. I, Chicago, 1969, p. 653. Portugues. india e Japäo, vol. III, Porto,
o seu significado era reforcado pela troca de bens trans- 15 Pires, A Suma Oriental, p. 374. 1990. p. 57, que e o primeiro a levantar
16
Diffie e Winius, op. cit., p. 393. a questäo dos abanos lequios de Catarina
mitidos por heranca no seio dos Habsburgos, reliquias pre- As Gavetas da Torre do Tombo, vol. V, de Äustria; Gschwend, op. cit., pp. m-
Lisboa, 1965, pp. 122-127: Gavetas 15-17- -112.
ciosas de proveniencia exötica. Objectos indianos e do -27 (Malaca, 10 de Agosto de 1518): "[...] 27 H. Brinker, Zauber des chinesischen
porque alem da China ser cousa tarn Fächers, Zurique, 1979; J. Hutt e H.
Extremo Oriente, como aqueles que referimos, frequente- gramde como he e de que vossa alteza Alexander, Ogi. A History ofjapanese
deve ja la de ter informacam ainda a Fan, Londres, 1992, p. 17.
mente permutados entre membros da familia, realcavam outras terras ao maar dela que sam ilhas J. Earle, "The Fan in Japan", in Fans
que se chamarn äs ilhas dos lequeos e from the East, ed. de C. Dorrington-Ward,
a nocäo de um colectivo familiär, reforcando o sentimento que confinam com os tartaros omde ha Nova lorque, 1978, pp. 37-45; Neville John
gramdes minas d'ouro e todalas outras Iröns, Fans of Imperial China, Hong Kong,
de prestigio de que os principes e coleccionadores mercadorias das que ha na China estam 1982, pp. 39-42.
duzentas legoas della he jemte branca 29 Lach, op. cit. p. 715; Luis Fröis, Europa
Habsburgos em Portugal, Espanha, Äustria e Paises Baixos, como aalemäes" (itälicos da autora). Japäo. Um Diälogo Civilizacional no
Z/wo de Duarte Barbosa, in collec- Seculo XVI, ed. de J. M. Garcia e Raffaella
desfrutavam enquanto classe durante o seculo XVI. cäo de noticias para a historia e geo- D'lntino. Lisboa, 1993, p. 92: "Os nossos
grafia das Nacöes Ultramarinas que religiosos se andassem com abanos dou-
vivem nos dominios portugueses, vol. II, rados na mäo te-los-iam por doudos; os
Lisboa, 1867, p. 375. bonzos, por honra, quando pegam e väo
B. W. Diffie e G. D. Winius, Foundation 19 Fernäo Mendes Pinto, The Travels of fora, häo-de levar um abano dourado
of the Portuguese Empire 1415-1580. Europe Mendes Pinto, ed. e tradupäo de Rebecca na mäo."
and the World in the Age of Expansion, Catz, Chicago, 1989, p. 300. 30 Hutt e Alexander, op. cit.. p. 22.

Duarte Barbosa, livro do Que Viu e vol. I, Minneapolis, 1977, p. 380. Mendes Pinto, op. cit., p. 597, cap. Pires, A Suma Oriental, p. 372.
Ouviu no Oriente, ed. de Luis de Aibu- Institute dos Arquivos Nacionais/Torre CXLIII, n. 2. Segundo Catz, Okinawa tem Mendes Pinto, op. cit, pp. 278 e 286.
querque, Lisboa, 1989, p. 144. do Tombo (IAN/TT), Corpo Cronolögico, i, noventa e seis quilömetros de compri- Iröns, op. cit., p. 42.
Jörge Graca, "The Portuguese porce- mafo 6, doc. 82, in Macau e o Oriente mento e dezasseis quilömetros de lar- 34 T. Yoshinobu, "The history of Urushi
lain trade with China", in Ans of Asia na Tone do Tombo, Seculos XVI a XIX, gura, e a sua latitude situa-se entre os lacquer-art of the Ryukyu", in Ryukyuan
(Novembro-Dezembro de 1977), p. 46. Lisboa, 1992, cat. n.° i. vinte e seis e os vinte e oito graus norte. Lacquerware from the Urasoe Art

221
Museum CoHection. Culturai Treasures R. I., 1994, pp. 194-197. 0 mesmo inven- torisches Museum, Sammlungen Schloss J. Hutt, "Japanese lacquer painting",
of the Ryukyu Kingdom, Okinawa, 1995, tärio incluia quatro pequenas caixas de Ambras, Innsbruck, 1977, p. 106, cat. in Lacquerwork in Asia and Beyond, ed.
p. 228. madeira de Fez (Marrocos), pintadas com n.os 264-265; p. 108, cat. n.° 271; pp. no- de W. Watson, Colloquies on Art B
35
S. Tani e T. Sugase, Namban Art, Nova laca e cores. -in, cat. n.us 278-281. Archeology in Asia, n.° u (1981), pp. 105-
lorque, 1973, p. 93, cat. n." 42 e p. 99, Jordan, The Development of Cathe- H. Garner, Ryukyu Lacquer, Mono- -106; East Asian Lacquer, p. 335.
cat. n." 48; Iröns, op. dt, p. 15, ils. 11-13; rine, p. 194; Momoyama, p. 246. graph n.° i, Londres, 1972; Garner, Chinese 65
Japans's Golden Age, p. 225, cat.
Japan's Golden Age-. Momoyama, Dallas, IAN/TT, Corpo Cronolögico, I, maco Export, pp. 24-30; Karamono. Imported n. 124.
'996, p. 80, cat. n." 14; The Triumph of 96, doc. 147 (24 de Outubro de 1555). Lacquerwork — Chinese, Korean and A Suma Oriental de Tome Pires e o
Japanese Style: i6th Century An in Japan, 0 mesmo recibo regista uma caixa de Ryukyuan (Okinawa). Selections from the Livro de Francisco Rodrigues, ed. de A.
Cleveland, 1991, p. 65, cat. n." 21, e p. 87, tecidos indianos, uma cama trazida da Tokugawa Art Museum n.° 2 (1977), pp. 102- CortesSo, Coimbra, 1978, p. 372: "fazem
cat. n.° 37. India para a dama de honor da rainha -120, cat. n.° 193. os cofres dourados"; e p. 373: "cofres
Momoyama, p. 103, cat. n.°22 , fig. 71. que importou em dois mil e quatrocen- Inv. n.° PA 543. Dimensöes: 12,6 cm. caxonjas de foihajes douro". -
Moreira, op. dt. tos reais, bem como cinco mil seiscen- Cit. in "Inventar des Nachlasses Erzherzog 67 ioyer, Japanese Export, p. 64.
38 68
Shogun. Kunstschatze und Lebenstil tos e oitenta e seis reais gastos na com- Ferdinands II in Ruhelust, Innsbruck und ioyer, Japanese Export, p. 64; H.
eines japanischen Fürsten der Shogun- pra de cristal de rocha, espelhos, vidros Ambras, Innsbruck, 30 Mai 1596", in Akio, "The Momoyama flowering: Kodai-
-Zeit, Munique, 1984, p. 61, cat. n.ÜS 20- e estojos para pentes indianos. Jahrbuch der Kunsthistorischen Sammlun- -ji and Namban Lacquer", in East Asian
-22; Japan. The Shaping of Daimyo Jordan, The Development of Cathe- gen des Allerhöchsten Kaiserhauses, Viena, Lacquer, pp. 163-173.
Culture 1185-1868, ed. de Y. Shimizu, rine, pp. 72-73. 1888, vol. VII, n.°2 , p. CCC, H. 43or: "Aingros- Jordan, The Development of Cathe-
Washington, D.C., pp. 67-68, cat. n.° 14; 9 Tacas ou tigelas de qualquer forma ser hafen, auswendig von allerlai thüeren rine, pp. 384-385; Gschwend, "As mara-
Traje Namban, Lisboa, 1994. ou tamanho eram designadas geralmente und taubwerch geziert, auch von roter erd." vilhas do Oriente", p. 117.
The Triumph of Japanese Style, 1991, como "porceiana" na corte de Lisboa do China und Europa, catälogo da expo- Lach, op. cit, p. 770; Enformacäo das
p. 100, cat. n."39. seculo XVI, fossem elas ou näo de sicäo, Berlim, 1973, cat. n.u 1/4; Garner, Cousas da China. Textos do Seculo XVI,
Gostaria de agradecer a Rafael porceiana. Chinese Export, p. 12; Scheicher, op. dt., ed. de Raffaella D'Intino, Lisboa, 1989,
Moreira pelo facto de me ter chamado 50 Jordan, The Development of Cathe- p. 109, cat. n.° 276, fig. 28; A. Auer, V.
a atencäo para esta abordagem dos rine, p. 72. IAN/TT, Nücleo Antigo, 797, Sandbichler. K. Schütz e C. Beaufort- 0. Impey, "Japanese export lacquer
leques de abrir e fechar. Annemarie fl. ii2V: "[...] hua porceiana dalaqueca -Spontin, Schloss Ambras, Kunsthis- of the i7th Century", in Lacquerwork in
Jordan, Retrato de Corte em Portugal. branca com pee e bocal de prata dou- toriches Museum, Viena, 1996, pp. 56-58. Asia and Beyond, pp. 141-142; T. Volker,
0 Legado de Antonio Moro (1552-1572), rada e no corpo della hus peixhinhos H. Arakawa, "Ryukyu Lacquerware in "Japanese export lacquer", in Oriental
Lisboa, 1994, pp. 40 e 65, figs. i, 5 e 7; dourados atravesados que pesou hum Europe — Focusing on hakue technique", Art, vol. ill, n.° 2 (1957), pp. 60-64.
Jordan Gschwend, A Pintura Maneirista marco e duas oitavas. Esta metida em in Shikkoshi. History of Lacquer Art. Ferräo, op. dt., vol. III, 1990, p. 49;
em Portugal. Arte no Tempo de Camöes, sua caxa redonda feita na Yndia." Bulletin of the Academy of Lacquer Gschwend, "As maravilhas do Oriente",
Lisboa, 1995, pp. 302-305, cat. n.° 59. 51 Jordan, The Development of Cathe- Research, vol. XVIII (Novembro de 1995), pp. iio-in. No seculo XVII, eram conhe-
1 Lach, op. dt., pp. 672-674. rine, p. 72. IAN/TT, Nücleo Antigo, 797, pp. 1I-V. figs. 18 e 25. cidas na India pela designacäo "cadei-
2 Jordan, Retrato de Corte, pp. 175-177, fl. ii2V: "Hua copinha con sua sobre M. Boyer, Japanese Export Lacquers ras espanholas".
cat. n.os 80-86, figs. 111-115. coupa de alaqueque branca con seu from the Seventeenth Century in the V. Slomann, "Early scholarship, 1934.
F. Bouza Alvarez, Locos, Enanos y bocal no copa e sobre copa de prata National Museum of Denmark, Cope- The 'Indian' period of European furniture",
Hombres de Placer en Ja Corte de los dourada e entre o baso e o pee dela tem nhaga, 1959, p. 57; Lacquer, pp. 138-141; in Journal ofthe Classical Chinese Furniture
Austrias, Madrid, 1991, p. 77:"[...] se qui- hü botäo dalaqueca vermelho e na sobre Cultural Treasures of the Ryukyu Society (Outono de 1994), pp. 58-69.
tase el abanilio para que el principe la copa tem outro comprido da dita ala- Kingdom, 1995, pp. 11-38. Ferräo, op. dt., vol. III, 1990, pp. 128-
viera". queca que pesa a copa e sobre copa seis Boyer, op. dt., pp. 51-52. -132; Via Orientalis, Bruxelas, 1991, pp. 101-
Para uma caixa de incenso compa- oncas escasas." Jordan, The Development of Cathe- -161, cat. n.° 131; Gschwend, "As maravi-
rävel do seculo XVII (Kyarabako) com 52 Jordan, The Development of Cathe- rine, p. 196; "Guarnimento de catre que lhas do Oriente", pp. 103-110, fig. 17;
trabalho de cestaria, veja-se Cultura! rine, p. 72. IAN/TT, Nücleo Antigo, 797, chamäo palanquim." Jordan Gschwend, "Catherine of Austria,
Treasures ofthe Ryukyu Kingdom, 1995, fl. ii3V: "Hun crucifixo de pao que diz se Inv. n.^ A4&5. Dimensäo: Queen of these Seas and Overseas:
p. 80, cat. n.11 55, e, tambem, H. Garner, chamä pao de Sam Tome posto em seu 10.3 cm. Indian, Ceylonese, Chinese and Japanese
"A group of Chinese iacquers with bas- calbaryo do mesmo pao metido em sua Kunsthistorisches Museum, Kunst- rarities for the Queen's table", in
ketry panels", in Archives of Asian Art, caixa de duas portas e toda a dita caixa kammer, inv. n.° KK 2674. No simbolismo Imported Objects for Roya! and Princely
vol. XX, 1996-1997, pp. 6-23; James C. Y. tengida de lacre preto tem por dentro chines, a carpa representava a perser- Tables in Europe. Comissions and Gifts,
Watt, The Sumptuous Basket. Chinese e por fora letros dourados da sagrada veranca associada ä capacidade de supe- Lisboa, 12-14 de Dezembro de 1996.
Lacquer with Basketry Panels, Nova escritura e tudo mais por parte de den- rar äs adversidades e de aicancar a emi- 75
0 protötipo para tais escrivaninhas
lorque, 1985, pp. 19-21, il. I-i. tro dourado o campo preto." nencia e o exito. Na base, segundo Oliver ibericas renascentistas com fachadas
45 Impey numa carta datada de 22 de Maio
Annemarie Jordan, The Development 53 Lacquer, pp. 53~54- engonfadas e deslocaveis era original-
of Catherine of Austria's Collection in H. Garner, Chinese Export Art in de 1997, dois dos caracteres do lado mente alemäo, conhecido em Espanha
the Queen's Household: Its Characterand Schloss Ambras, Londres, 1975, pp. 6-20; esquerdo eram chang chung, o que sig- pela designacäo de varqueno, tendo ser-
Cost, tese de doutoramento, Providence, E. Scheicher, Die Kunstkammer, Kunsthis- nificava "Primavera Eterna". vido como modelo para äs escrivaninhas

222
japonesas. Ver J. Irwin, "A Jacobean Inventärio Ambras de 1621, fis. i73r- vara menos un dedo y de ancho una cuyos paneles se repliegan uno contra
vogue for Oriental lacquer-ware", in -I97V. tercia; tasado en 16.500 maravedis." el outro a la manera de libros y que,
Burlington Magazine, n.° 95 (Junho de 88 Cultural Treasures of the Ryukyu 98 Archivo General de Simancas (AGS), manteniendose en pie por si solos, sir-
1853), p- 194; Lacquer, p. 124. Kingdom, pp. 82-83, cat. n.ÜS 57-58, p. 228; C. M. C., i Epoca, Leg. 1050, fl. 13: "Assi- ven para divir cuartos y resguardar puer-
In Gschwend, "As maravilhas do Western Influence on japanese Art - mismo. Una mesa de madera dela India tas. Se les llama biombos y estän hechos
Oriente", p- 122; estes cinco cestos de i6th-igth Century, Fukuoka, 1995, p. 96, cubierta de lacre y negro y encima con largos paneles unidos entre si que
laca foram erroneamente interpretados cat. n." 27. dorada y pintada con clavazon dorada se repliegan a la vez a modo de libros.
pela autora como cinco tigeias de por- M. Kouin, "Methods and techniques y las tiseras en que se pone tambien. Han sido construidos segün la mencio-
celana chinesas com engastes de bronze of Ryukyu lacquercraft", in Cultura! Mas dos sillos de la misma madera y nadas pinturas y forman una pequena
dourados. Treasures of the Ryukyu Kingdom, p. 229. labor que la dicha mesa las quales esta- estancia, que ocupa escaso espacio y a
East Aslan Lacquer, p. 334. 90 non piecas para poder se armar." este uso se les destina. Pueden ser cam-
77 Lach, Asia, pp. 770-771.
East Asian Lacquer, pp. 237-238, 91 Jordan, Retrato de Corte, pp. 159 e biados de lugar segün las circunstancias,
Ferräo, op. cit., vol. IV, p. 208. Näo
cat. n.° 113. foi possivel ä autora identificar Xiäo. 272; Gschwend, "As maravilhas do constituyen una encantadora muestra
79
Garner, op. cit., pp. 14-15. 92 Biblioteca da Ajuda (BA), ms. 49-XII-2, Oriente", p. 108. de pintura y pueden formar räpidamente
East Asian Lacquer, p. 353. fls. 39v-45r- Sousa Viterbo, "0 theatro na cörte una habitaciön del modo que se desee."
East Asian Lacquer, pp. 8 e 36. 93 de D. Filippe II", in Archivo Historico C. Torreiro Luengo, "Armas y arma-
1AN/TT, Corpo Cronolögico, I, maco
K. Coomaraswamy, Medieval Singha- 91, doc. in (14 de Fevereiro de 1573). Portuguez, vol. i (1903), p. 10. duras japonesas de la Real Armeria", in
lese Art, Nova lorque, 1995, pp. 215-217; "Mandado" para pagamento de duas cor- Jordan. The Development of Reales Sitios, n." 114 (1992), pp. 37-44.
P. Dias, "A descoberta do Oriente", in A jas e meia, cinquenta pecas de porce- Catherine, p. 383, nota 7; Gschwend, "As Luis Filipe Thomaz, Namhan Jin.
Heranca de Rauluchantim, pp. 30-58. lana chinesa para o boticärio da rainha. maravilhas do Oriente", p. 119. Os Portugueses no Japäo, Lisboa, 1993,
83 J. Schlosser, Kunst- und Wunder- K. Rudolf, "Die Kunstbestrebungen pp. 75-76.
Jordan, The Development of Cathe-
112
kammern der Spätrenaissance, 2* ed., rine, p. 398; Gschwend, "As maravilhas Kaiser Maximilians II in Spannungsfeld Ei Real Alcäzar de Madrid, p. 159.
Braunschweig, 1978, p. 103, fig. 63; E. zwischen Madrid und Wien", in Jahrbuch
113 El Real Alcäzar de Madrid, p. 266.
do Oriente", p. 92. Em 1570, Catarina
Scheicher, Die Kunst- und Wunderka- obteve do "Reis Magos" onze fiadas de der Kunsthistorischen Sammlungen in El Real Alcäzar de Madrid, p. 266-267.
mmern der Habsburger, Viena, 1979,
115 El Real Alcäzar de Madrid, p. 272.
botöes de prata feitos na China e uma Wien, vol. XCI, 1995, p. 170, nota 57.
116 M. T. Ruiz Alcon, "Arquetas relica-
p. 117. Para a iconografia desta mesa, ver corrente de ouro de "trabaiho chines". 103 M. Gachard, Lettres de Philippe II
Markus Neuwith, Der "Weltfrieden" in A. G. de Amezüa e Mayo, lsabel de ä ses Filies les Infantes Isabella et rios de las Descalzas Reales", in Reales
der Kultur begegnung zwischen Asien Vaiois, Reina de Esparla (1546-1568), Catherine Echte pendant son Voyage Sitios, n." 45, pp. 28-36.
und Europa-- die Tischplatte des Kardina! 3 vols., Madrid, 1949, vol. HI, apendice en Portugal (1581-1583), Paris, 1884, 117 Haus-Hof-und Staatsarchiv, Viena,
Albrecht, Erzherzog von Oesterreich, Vll, p. 571: "Primeramente una mesa de p. i2i, n. 5, pp. 124, 130, 186 e 205-206; Familienakten 76, 15 de Fevereiro de
Vizekönig von Portugal (a publicar). la Yndia de Portugal, ques la que dizen Lach, op. cit., pp. 13-15. 1608, fl. &3r.
Kunsthistoriches Museum, inv. n.° enbio a su Magestad la Reina de F. J. Sänchez Cantön, Inventarios 118 AGS, leg. 6, fl. 13.

4958, em depösito em MAK, inv. n." La Portugal, labrado toda de oro y negro, Reales. Bienes Muebles que Perlene- 119 Rudolf U and Prague. The Courtand
280. Veja-se o inventärio de Ambras de que son dos tablas y vnos pies y vn cieron a Felipe //, 2 vols., Madrid, 1956- the City, Londres, 1997, pp. 494 e 496.
1621-. "Volgen die Antiqueten Contrafee banco de las misma labor, en 300 rrea- -1959- 120 Annemarie Jordan, The Marvels of
und allerlay andere Sachen, so in der les. Una escrivania de la Yndia de 105 Boyer, Japanese Export, pp. 86-87, the East: Renaissance Curiosities in
Bibliotheca hin und winder verbanden", Portugal, en diez ducados." fig- 9- Habsburg Collections in Portugal, Spain
fl. 92v: Ain Indianisch Tischblat, vom 96 Gschwend, "As maravilhas do and Äustria (a publicar).
M. P. AguÜö Alonso, "El colleccio-
Cardinal von Österreich, etc. Consultei nismo de objectos procedentes de Oriente", p. no, nota 101. Ambos datam 121 Gschwend, "As maravilhas do Oriente",
uma transcricäo generosamente forne- Ultramar a traves de los inventarios de de c. 1570 ou de mais cedo. Real Monas- pp. 114-116, figs. 22 e 23.
122
cida pelo Dr. Alfred Auer, director do los siglos XVI y xvn", in Relaciones terio de El Escorial, inv. n." 1961, inv. n.° Rudolf II and Prague, p. 497.
1664 (86 x 50 x 40 cm) e inv. n.° 1665
123 R. Bauer e H. Haupt, "Das Kunst-
Sammlungen Schloss Ambras, Kunsthis- Artisticas entre Espana y America,
torisches Museum, Innsbruck. Madrid, 1990, p. 131. {84 x 50 x 25 cm). kammerinventar Kaiser Rudolfs II, 1607-
As minhas conclusöes acerca da histö- 97 C. Perez Pastor, "Inventarios de los 107 Lach, Asia, pp. 686-706; 0. Impey, -1611", in Jahrbuch der Kunsthistorischen
ria e da proveniencia desta mesa, e bienes que quedaron por fin y muerte "Japan: Trade and collecting in seven- Sammlungen in Wien, vol. LXXII, 1976,
acerca do reiacionamento cultivado de Dona Juana, Princesa de Portugal, teenth-century Europe", in Origins of pp. 28-30.
124
entre Ferdinande II do Tirol e o arqui- Infanta de Castilla, 1573", in Memorias Museums. The Cabinet of Curiosities in Rudolf II and Prague, pp. 198-199.
duque Alberto de Äustria, durante os Sixteenth and Seventeenth-Century 125 BA, ms. 51-11-25, fl. i4ir.
de la Real Academia Espanola, 9, 1914,
anos de 1580, foram definidas indepen- P- 379: "Otra escribania de la China, de Europe, ed. de 0. Impey e A. Mac Gregor, Lach, Asia, pp. 691-692.
127 Memorial de Pero Roiz Soares,
dentemente de M. Neuwirth. oro y negro, que tiene dentro un cajön Oxford, 1985, p. 268.
85
Impey, op. cit., p. 141; East Asian con repartimientos, guarnescida como 108 Momoyama, pp. 144-147, cat. 39. Coimbra, 1953, pp. 299-300.
Lacquer, p. 10, fig. 2. cofre, con unas barillas de plata, y 109 El Real Alcäzar de Madrid, catälogo Carta de Ann Yonemura, 16 de Junho
J. C. Boyajian, Portuguese Trade in aldaba y cerradura nielado de negro, da exposicäo, Madrid, 1994, p. 497: "En de 1997.
Asia under the Habsburgs, 1580-1640, e y en las esquinas quatro animales de !a misma estancia, antes de llegar alH, 129 Carta de Oliver Impey, 29 de Abril
Baltimore, Md., 1993, pp. 48 e 68. la dicha plata, que tiene de largo media havia una de esas pinturas de Japön de 1997.

223
Apendice ~" Recebeo dona mecia dandrade camareira da Rainha
No6ta Senhora de a^on&o de cunigua thezoureiro da dita
Dccumentc I Senhora dua& cadeyrai, da china &em courof, nem veludo
IAN/TT, Corpo Cronolögico, i, ma^o 106, 6äo de pao<5 douradoa em campo preto e &äo de beycäo de
doc. 10, 23 de Junho de 1561 cadeyrai, de de&can&o &oo mente o& paaoa de((a4/metida<5
em hua Junda de couro e quatro dbano& de marfim ldbrado&
e 5 de Setembro de 1562
de hu* bichinhoi e douradoi a partei e &ao de jjeycäo de
(sem fölio). Inscripäo no exterior: abanot lequiof, e tem pola roda hu& frocoa de &eda creme&y
+ 7562 das duas cadeyras da china a& quae& cadeyra& e äbanoü ficäo carregado<5 em receita
e 4 avanos &obre a dita camareira por my diese martina e&crlv&o de
&eu carreguo jfolio 120 do iivro da 6ua receita de que Ihe
Alvarä da Rainha para os seus
patey o pre&ente conhecimento em tiorma e que amboi
contadores, levarem em conta at>ynamo& em iixboa a xxiij de Junho de mil blx e hun!
ao seu thezoureiro, äs duas cadeiras dona mecia dandrade dioguo martins

das China e quatro abanos de marfim


Comfadore<5 de minha ca&a mandvoü que levey& em
como costa do conhecimento comta ajjon&o de cunhigua que ora &erve de meu titoureyro
a<5 dua* cadeyrai, da china e o& quatro abanoa de marfim
tudo comteudo no conhecimento em forma acima eacryta
de dona mecia dandrade minha camareira a<5 quaei cadeyra&
e abanoA levarey& em comta ao dito afion&o de cunhigua por
e&te e pello dito conhecimento em frorma baitido daforweca
o fiz em Iixboa a cimco de ^etembro de myll e quinhento&
l <5eienfa e dou<5 e edfe ndo paaara pella chancellaria
Raynha

pera levarez em comta afronöo de cunhigua dua*


cadeyra& da china e quatro abano& de marjjim q entregou
a dona mecia dandrade como parece por &eu conhecimento
em Jorma e&cryto e que näo paaaa pella chancelaria

' As cadeiras e os leques foram registados no guarda-roupa da rainha em


1561, mas o seu pagamento deu-se um ano mais tarde.

22g
Documentc II outra que tem o campo preto e /abrado Aobre o dito
campo muytat, figura* de homerw com beatidod de core<5
1AN/TT, Corpo Cronolögico, i, mafo 106,
em cada taboa da dita meaa figurada huä nao con /jigurai
doc. 9, 22 de Agosto de 1562 de hörnend dentro de((a e toda (abrada de Ramo& dourado*
(sem fölio). Assinado no exterior: e outra<5 pinturai douradoi, - e da outra banda tem tambem
Sebastiäo dafonsequa äs ffl 32. o campo preto e iobre eüe pimtadoi Ramo<5 douradoa e
paaaroi tem 6eu& pee<5 da dita pintura tem de cumplido
Alvarä da Rainha da Raynha para
huä uara e huä o^taua e de (argou pinco ieima* de uara
os Conradores levarem em cont, e mai6 dou* dedoa entrama<5 a* taboai e eitäo Rendida<5
ao seu Thezoreiro äs trez mezas de huä parte a* ditaa tabuai no topo<5
da China como consta do ~^~~ A outra de cumprido huä vara e terca bem medida
conhecimento da camareira e de (argou huä uara e<5ca6ia tem o campo preto toda
D. Mecia de Andrade (abrada de Ramoa e monatria dourada* e a(gun<5 padaro*
todo dourado e da outra banda Ramoa e pa*aro6 dourado<5
em campo preto a<5 quae<5 ditaa trea meaaa atra* dedaradat,
fticäo carregadaa em Receita aobre a dita camareira por
my diogo martina eacriuäo da aua ßeceita de qua( (he
paae^ o preaente conhecimento emjjorma em que amboa
aainamoa em (ixboa a xxj dagoato de mi( blx e doua
dona mecia dandrade dioguo martins

~~~ Comtadorea de minha caaa mandouod que (eue,ya em


comta ajonao de cunhigua que aerue de meu thezoureiro
aa trea meaaa da China conteudaa no conhecimento
emrjorma de dona mecia dandrade minha camareira que
~~ dona mecia Johäo de pedroaa que tem carguo de |ie.ytorizar aa couaaa
Recebeo dona mecia dandrade camareira da Rianha Noaaa da minha fazenda naa parfea da India e vierdo eate
Senhore do Thezoureiro afjonao da cunigua trea meaaa da preaemte annoda qu^nhentoa aeaemta e doua aa queaa
China cada huä com aeua peea labradot da labor daö trea meaaa com aeua peea levareyt em comta ao dito
meamaa a* quaea vieräo eate preaente anno de mü blx e a(jonao de cunhigua per eate e pe((o dito conhecimento
doua da J/ndia que mandou Jodo de Pedro&a moco da em rjorma acima e atraa e&cryW baatiäo dajonaeca a rjiz
camara da dita aenhora e aeu jjeytor na& partea da India em (ixboa aoa xxix dagoato de milb aeaemta e doua. £ata
näo paaara pe((a chance(aria
"" huä que fern o campo preto e no dito campo tem Raynha

huäa paaarinhaa e cervot prateadoa e por cenerjaa ao


redor huä mo/dura (abrada do meamo pao da meaa de ~" pera levarez em comta afronao de cunhigua aa trea
hun<5 bichingoa de jjeycäo de Raboa de pejea con aaaa aobre meaaa da China a eata preaent ano vierNao da Imdia que
campo azul e da outra banda tem o campo preto e pintadoa entregou a dona mecia dandrade de como paerepe per
Ramoa douradoa e paaarinhaa prateadaA a qua( meaa tem aua conhecimento em /jorma acima e atraa ecryta e que
aeua pee<5 da dita pintura tem de cumprido huä uara e näo paaaa pe/(a a chancelaria
huä aeamaa e de (arguo hun vara e aäo duaa taboaa
deiapregadaae para huä parta aa<5 caebpa<5 da& ditaa
taboa* eatäo Rendida* 2 1 Isto e, que estavam parcialmente danificadas.

226
Documentc HI Per levarem em comta afionao de cunhisua todaa aa
couaaa comteudaa nai aete adipöea atraa eacrytaa que
IAN/TT, Corpo Cronolögico, i, mafo 107,
entregou a dona mecia damdrade como perece por aeu
doc. 19, 5 de Novembro de 1564 conhecimento emfrorma atraa eacryta e que eate näo paaae
(sem fölio). Assinado no exterior: pela chancelarya e a6y Ihe levara may& em conta por e&te
6omente aa may& couaaa aclma declarada& que Vos&a
Sebastiäo dafonsequa. Inscrif äo
Alteza mandou dar a camareira mor
no exterior: * 7564 äs coisas que vieram

da Yndia este ano provisäo para serve ~~~~~ Recebeo dona mecia dandrade camareira da Rainha
Noaaa Senhora do Thezoureiro ajonao de cunhigua todaa
levar em despesa entregues
aa pepaa abaixo eacriptaa — cinco me&a& da China douradaa
na Recamara, ff 30
Alvarä da Rainha para se levarem ~""~" duaa grandea todaa pintadaa de Ramoa de ouro &obre

em conta a seu Thezoureiro äs pefas campe preto e con a(guaa aiimariaa de cervo6 e paaarinhoa
e outraa aiimariaa ave& e paböe& e da outra banda Ramo&
conteudas nas adiföes atraz escritas,
e doua paböea e hum pa&aro todo dourado tem de cumprido
que po sua ordern entregou aete pafmoa eafrorpadoa e de /arguo hun covado e trea
a D. Mecia de Andrade, sua Carmariera quartaa aäo cad huä me&a de duaa taboaa e näo tem peea

~~~~~ outraa dua<5 me&a& da China como cw dapima (abradaa


de Ramo6 dourado6 de jjolhaje em campo preto e con
cervoö ave& e a/imariaa que tem de cumprido dou6 covadot
e de (arguo hun covado e meio <säo acad huä de dua&
taboa<5 ioomento e &em pee&

a outra he maia pequena da china pintada de ueadoa


aiimariaa e avea como aa depima tem de cumprido hun
covado e duaa tercaa de /arguo hun couado e huä
dona mecia 22 terpa/henhia tem machejemeaa

Contadoret de mlnha ca&a mandovot que leveyt em ™*^ trea eacritorioa da china douradoa quadradoa que cada
comta a^on&o de cunhlgua que &erve de meu thezoureiro hun ten huä gaueta grande que parece que he para papel
todaa a<5 couaai comteudaa na& aete adipöea atraa eacrytaa
que por meu mandado entregou a dona mecia damdrade "~~~ doua cofrrea da china douradoa tumbadoa hun grande
minha camareira como perece per &eu conhecimento em e outro he maia pequeno
Jorma atraa eacryto aa qäea couaaa Ihe levarey& em comta
per eate e peile dito conhecimento em jjorm e e&te näo paaara ~""~~ pinco azafratea da china douradoa com huna Redea de
pella chancelaria ßaatiäo dafonaequa o Jez em (ixboa a einco ftio datame douradaa a partea cada huä de huä aoo pepa
de novembro de mll blxlilj e a&y levarey& may6 em comta ao
dito ajonao de cunhigua per eate aoomente pimco da china cento e teytenta e oyto abanoa (equioa — aa quaea ditaa
de huä pepa cada hu com auaa Kedea de (atäo douradaa e pepaa e couaaa conteudaa naa aete adipöea deate Rol aclma
doze abanoa (equioa que mande^ dar a Joana deca minha e atraa eacriptaa Jicdo carregadaa em Recelta aobre a dita
camariera mor e alianor fiernandez e aty hun e&crytoryo da camareira por my dloguo martina eacriuäo de aeu carreguo
china grande quadrado e corenta boyöet, de porcefanaa eom Jo/io 41 do Llvro da aua Receita de que Ihe pa&ey o preaente
auaa tapadouraa e doua frofea de pa&ado e&treyto em gunadoa conhecimento em forma em que aainamoa em (ixboa a xxj
amboa em hun eouro que ae emtreguardo a Joana Goncalvez doutubro 1564 — digo cento e aetenta e oyto abanoa (equioa
que tem cargo de minha botica Rainha dona mecia dandrade dloguo martlns

227
Balta&ar Cornejo, frormam aa Inlci- Ihe cobrem a<5 ore(ha&. 0 Üvro de la Loca e Flllpe oju&to, e irmä malt
ai& de D, Catarina (doia ce&), e aäo oracöe&, que &e encontra aberto, era nova do imperador Carlos V, ca&ou
eama/tadoa a preto e branco com certamente um do& muito& llvrot de com o rei de Portugal, D. Joäo lll.
pe'ro/aa pendentea. £atea brincoa horai Jlamengoi ou iberlcof, que D. Catarina chegou a Li&boa tra-
encontram-ae reg/atadoa no Inven- pertenclam ä &ua blblloteca. A& rou- zendo tapeparlat fjlamenga&, ilu-
tärio de 1550-1552, tat como a coifra pa& rica&, o& ornamentoä e a& jölat, mlnuraö, quadrot de plntore& holan-
de pero/aa do aeu cabelo. Joram ae/ecctonado5 para realcar o de&e&, lmportante& J6ia6 de ^amilia
Aa roupaa aumptuoaaa de D. Cata- e&plendor e a e/egäncia de D. Cata- e um Aumptuoto guarda-roupa;
rina, no topo da moda em 1552, rina. 0 &uce&&o de Moro re&ide na e&te& eram element06 importantea
conaiatiam em uma ropa de veludo Aua habllldade em retratar a ral- no dote de uma princeaa ca<5te/hana
preto bordada a fjio dourado aobre nha de tjorma &ot>i&ticada e refjlnada deatinada a aer ralnha. £atea ben*
um Jundo em tafretd cinzento, aendo e que D. Catarina deliberadamente pef>&oai& Jormaram o primeiro
eate um conjunto tradicionai na decidlu näo alterar em ano& po&- nücleo da coleccäo de D. Catarina,
corte portugueaa do Rena&clmento. teriore&. AJ a quäl po&teriormente &e de&envoi-
0 preto, conaiderado na corte de veu tornando-ae numa coleccäo de
ffababurgo como a cor da magnifri- JORDAN, A., Retrato de Corte em Portugal. curio&idade& rena&centi6ta&, ou
0 Legado de Antonio Moro, 1552-1572, Lisboa,
cencia, era uma cor importada da 1994, pp. 147-149, flg. 87, e p. 158, cat. n." 8
Kunttkammer, repleta de artigoa
corte de Borgonha e era apreciada JORDAN, A., "As maravilhas do Oriente: Colecföes colecciondvei& exötlcot,, raridadea
de curiosidades renascentistas em Portugal,"
por cau&a da difiiculdade em tingir e anlmalA importadoa daa coldniaa
in A Heranfa de Rauluchantim, Lisboa, 1996,
de preto o& tecidoa. 0 veludo preto, pp. 117-118 portugueaaa na A&ia e no Cxtremo
JORDAN, A., Court Painting in Portugal. The Legacy
durante o ae'cu/o XVI, era utillzado Oriente. Oa bena compradoa para a
ofAnthonls Mor (no prelo)
como ftundo para a exiblpäo dejoa- Tapefarias de D. Joäo de Castro, catälogo da ralnha portugueaa vlnham de Goa,
exposifäo, Lisboa, 1995, pp- 173-174, cat. n.° 22
Iharla e pe'roiaa caraa. Oa tecidoa Ceüäo, Malaca, Macau, Japäo, China
que con&tltuiam o guarda-roupa de e ate daa iluadriaa ilha& Ryukyu.
D. Catarina eram diapendioaoa.- aa De&de o inicio do &eu reinado, Joi
aedaa, o<s damaacoa, 04 ueludoa e o organizado um aiatema que permitla
Receita dasjöias,
tafietä eram obtidoa em Roma, ä rainha adquirlr bena ae/ecciona-
Pefas de Ouro e Prata
Genova, Florenca. Miläo, Vaienca, doa no ultramar, e oa admini&tra-
da Rainha D. Catarina
Sevilha, Medlna do Campo e Paria dore&, ouriuea e uice-reia portugue-
1528
(I4N/7T, Nücleo Antiyo 792, frte. ggr, aea colocadoa em Goa tinham como
Manuscrito sobre papel
\4\v, igor e 20ov), como &e pode verl- miaaäo ajudar a rainha na procura
39,8 x 30,5 cm
fiicarpelo di&pendlo&o brocado ver- doa produtoa maia excluaiuoa que
Lisboa, Institute dos Arquivos
melho que cobre a me&a que &e nem aempre eatauam diaponi'ueia
Nacionais/Torre do Tombo
encontra ao lado de D. Catarina. em L/aboa. 8m 1531, a mando do rei
N.° Inv. Nücleo Antigo 790-791
D. Catarina u&a uma touca trans- e proveito da rainha, Manuel Bote-
parente que &6 era u&ada por muihe- 8m 1525, Catarina de Äu&trla (1507- Iho Joi para o 8xtremo Oriente
re& cat>ada&, e ladet de cabello, que -1578), a jjilha mai& nova de Juana durante trea anoa levando conaigo
que D. Catarina comepou a colec-
cionar aaaiduamente (ogo apöa a
aua chegada. 0 inuentdrio comepa
com a relacäo daa jöiaa da rainha
(correntea de ouro, coiarea, cintoa,
brincoa, ane'ia e pulaeiraa) e gemaa
de frarmlia, muitaa daa quaia ela
reeebeu da aua mäe, Juana, e do
aeu irmäo, Carioa. Algumaa deaaaa
gemaa eram muito grandea e orna-
mentadaa com diamantea, rubia e
pe'rolaa e froram-ihea atribut'doa
nomea, taia como: £1 Fex, Angulo,
Solomon, Huerfjania, Venera e La
Ro6a. Um doa aeua roadrioa para
orapöea didriaa era freito de criatai
de rocha, muito provavelmente
importado da Jndia. Cntre aa pepaa
de decorapöo doa aeua apoaentoa
encontravam-ae: eapelhoa, doaae'ia,
pendente& em pele trabalhada, car-
petea e a/mofradaa ricamente bor-
dadaa, e tambem trinta e um pai-
neia de tapeparia em ouro e aeda,
trea barcoa. Poucoa anoa depoia, em oa agentea da rainha podiam com- da excelente coleccäo de tapeparia
1537, Antonio Correa, um aeroipai prar directamente na fronte, na Aaia friamenga da aua mäe. /guaimente
doa apoaentoa da rainha em Por- e no Extreme Oriente, e podiam tam- da colecpäo da aua mäe, aeia qua-
tugal, froi por ela mandado para bem infrormar D. Catarina doa bena droa (aobre madeira e tela) hoian-
Goa. onde recebia um aa/a'rio para exittente& no mercado. deaea ou etpanhöit,, cinco repre-
"&ervir a Rainha na India" [In&ti- £ate inventdrio e o primeiro alguma aentando a Kirgem e o Menino e um
tuto doa Arquiuoa Nacionai6/Torre vez realizado da coleccäo de D. Cata- Santa Catarina, froram regiatadoa
do Tombo (IAN/TT), Nücleo Antigo rina, freito trea anoa depoia da aua in frofio Ixix, um doa quaia repro-
792, fr/, togrl. Sem düvlda, uma daa entrada em Portugal, e regiatando duzia a conhecida Virgem Maria da
incumbenciaa de Correa aeria a näo aö oa itena que ela trouxera de Notia Senhora da Antigua da Cate-
auperwaäo da compra de textei&, Capanha, como parte do aeu dote, dral de Sevilha.
roupaa, joiaa e produtoa exotico& a maa refrerindo, tambem pe/a pri- Oa cinquenta e trea couadoa de aeda
pedido da rainha. Deata frorma. meira vez, bena exportado& do leate branca chineaa, aäo a primeira refre-

409
da Indla incluiam doia iequea aeua bena. No aeu caao, eataa &eriam
CfJ. cxviij), värio& aigodöea e gaze, aa de Caatefa, Leäo, Aragflo e Sicf-
como a 6inabat>06 do ßengala, outroa (ia e meamo a inafgnia imperial de
de nome romanod, e didfranoa pen- Hab&burgo. D. Catarina, ciente da
dentea, volantet, talvez de Chaul poderoaa imagem da& conquiataa e
("Jf. cxxliij), benjoim para frina medi- do imperio cultivada na corte de
cinaia (ff. cxxvilj) e doia cocoa. De Liaboa, e&colheu deiiberadamente,
um potentado indiano (o rel de para decorar o exterior do &eu pri-
Parafte)' a rainha recebeu de pre- meiro inventärlo, que incluia pela
aente, em Agoato de (528, duaa tape- primelra vez referenciaa a artigoa
pariaa para pendurar freitaa de aeda da China e da Indla, aa armaa reaia
coforida e ffo de ouro a "maneira de Portugal e a eafera armllar de
de falfonbillaä"(?) e um grande D. Manuel, ellmlnando completa-
tabu/eiro de madeira embutido a mente qualquer referencia äa auaa.
ouro e com decorapäo policromada Como rainha de Portugal, 00 aeua
(ff. cxxxix). ti'tufoa real!, incluiam tambe'm o<5
0 aapecto maia intereaaante deate tftufoa herdadoa de D. Manuel: rai-
inuentdrio ado aa capaa exteriorea nha daquem e dalem mär, e "daa
em couro gravado em relevo e pin- conquiataa, navegacäo e comerclo
tado, apreaentando em cada canto com a Ztlopla, Aräbla, Pe'raia e
0 braaäo de Portugal e a diviia pea- Indla". D. Catarina identificai>a-ae
aoaf de D. Manuel l, o aogro de D. Cata- com o aimboiiamo Imperial de
rina, que reinem de 1498 a 1521. D. Manuel, e apreclava a &ua nova
A eöjjera armllar, ai'mbofo do uni- poaipäo de rainha do imperio por-
uerao, foi o emblema eacofhido por tußueft, realcado e apolado pela
D. Manuei para repreaentar aa dea- quantldade de ben* e&tran§elro6
cobertaa man'timaa portugueaaa e exl&tente6 no &eu inventdrio de 1528
rencla a China no<5 documento<5 de aa conquiataa u/tramarinaa. £ata que Incluia o$erta& real& recebida<5
D. Cata?'ina e foram regiatadoä a eafera eataua wauafmente iigada da india e aedaa raraö da di&tante
30 deAgoato de (528 (fr/, xciij), con- com o nouo papef que D. Manuei China.
Aub&tanciando que o& Porfugueaea aaaumira como aenfior do uniuerao, De 1528 a 1552, D. Catarina con-
continuaram a manter refapöea ou domlnu6 mundl, de doia impe- centrou e6&encialmente a& 6ua& acti-
comerciaia ilegai& com o Sul da rioa, a Leate e a Oeate, de Liaboa a vidade* na procura de raridadeö da
China apeaar da proibipäo uigenfe Goa. Uma rainha e&trangeira, como India e do Cxtremo Oriente. £m 1534
durante eafe periodo. A aeda para D. Catarina, terla normalmente Joi (jeito um aegundo inuentdrio,
D. Catarina era exportada para Goa eacofhido aa auaa pröpriaa armaa onde 6e verljjica um conölderävel
uia Malaca. Oa produtoa exdticoa reaia para adornar o inventdrio doa aumento de ben& vlndot da Äöla.
1 Talvez seja este o reino a que Duarte Barbosa se referia
como Patenexy, no Guzerate.

Você também pode gostar