Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Valentina Pereira Gomes *
O termo cárie oculta vem sendo utilizado para descrever lesões de cárie em
dentina sob superfícies de esmalte aparentemente hígidas ou minimamente
Camila Jatobá Amorim **
desmineralizadas. Considerando a dificuldade de diagnóstico e como essas Marta Lua Pimentel Winz Almeida ***
lesões possuem progressão silenciosa, muitas vezes não são detectadas no Rodolfo de Almeida Lima Castro ****
exame clínico de rotina. O objetivo deste trabalho é relatar, baseado na Roberto Braga de Carvalho Vianna*****
literatura, dois casos clínicos de cárie oculta, ressaltando a importância Andréa Gonçalves Antonio ******
da radiografia interproximal para o seu diagnóstico, bem como descrever
o tratamento restaurador através da técnica da matriz oclusal individual * Aluna do Mestrado em Odontologia da Uni
de acrílico. versidade Veiga de Almeida
Palavras-chave: Cárie dentária – diagnóstico; radiografia interproximal; ** Especialista em Odontopediatria pela Uni
dentição permanente. versidade Veiga de Almeida
*** Especialista e Mestre em Odontopediatria
Abstract pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
The term hidden caries is used to describe carious lesions in dentine **** Mestre em Odontologia (Odontopediatria)
under apparently sound enamel surface or minimum desmineralized one. pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
Considering the difficult in its diagnosis and as these injuries have slow (UFRJ), Doutor em Saúde Pública pela Escola
progression, many times they are not detected in the clinical examination of Nacional de Saúde Pública (ENSP/FIOCRUZ);
routine. The objective of this work is to discuss two clinical cases of hidden Pesquisador Assistente do Instituto de Pesqui
caries, standing out the importance of the interproximal radiography for the sa Clínica Evandro Chagas (IPEC/FIOCRUZ);
diagnosis, as well as to describe the restoring treatment carried through the Professor Adjunto do Departamento de Nu
use of individual occlusal acrylic matrix technique. trição em Saúde Pública da Universidade Fe
Keywords: Dental caries – diagnosis; interproximal radiography; dentition, deral do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
permanent. ***** Mestre em Odontopediatria pela Univer
sidade de Indiana, Estados Unidos da América
e Doutor em Odontologia pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Professor As
sociado do Departamento de Odontopediatria
e Ortodontia da Faculdade de Odontologia da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
****** Mestre e Doutora em Odontopediatria
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Professora do Departamento de Odontopedia
tria e Ortodontia da Faculdade de Odontologia
da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Introdução
A cárie oculta é uma lesão que acomete a dentina e que, aparentemente, preserva
a estrutura externa do esmalte (ECHEVERRIA e IMPARATO, 2002; CORBELLINI et al.,
2009), sendo diagnosticada através da radiografia interproximal. Também pode ser chama
da como cárie escondida ou síndrome do flúor (WEERHEIJM, 1997). Não possui etiologia
bem definida. No entanto, existem hipóteses que tentam explicar este tipo de lesão, tais
como: a teoria de que está associada à microbiota bucal, à anatomia da superfície oclusal
e defeitos estruturais desta face, ou ao uso de fluoretos (BALL, 1986). MILICICH (2000) e
RICKETTS et al. (1997) associaram a formação da cárie oculta com a presença e morfologia
das fissuras oclusais. Após ocorrer a penetração bacteriana na fissura é criado um novo
ambiente, que aparentemente parece estar protegido dos vários métodos preventivos. Estes
autores acreditam que na cárie oculta, a microbiota bacteriana é mais simples do que nas
lesões clinicamente visíveis, com a presença de Streptococcus mutans e Lactobacillus spp.,
basicamente. Em 1995, DE SOET; WEERHEIJM e VAN AMERONGEN (1995) comparando a
flora microbiana de lesões de cárie oculta com pequenas lesões visíveis estendendo-se para
a dentina, observaram que os Streptococcus mutans foi encontrado mais freqüentemente no
grupo das cáries ocultas, enquanto que Streptococcus sobrinus foi mais freqüentemente en
contrado no grupo das pequenas lesões visíveis. Esse resultado também mostrou uma baixa
complexidade da microflora em lesões de cárie oculta, comparando com lesões pequenas
e visíveis, indicando que a etiologia da cárie oculta pode ser diferente das lesões abertas.
A exata prevalência da cárie oculta em uma determinada população é difícil de
ser estabelecida devido a alguns aspectos como: as condições em que o exame clínico é
realizado, os critérios aplicados durante a avaliação clínica e a idade do grupo examinado
(WEERHEIJM et al., 1992). KIDD, NAYLOR, WILSON (1992) encontraram uma prevalência
de 50 % de cárie oculta em primeiros e segundos molares permanentes. SEOW (2000),
avaliando primeiros molares de pacientes entre 14 e 15 anos de idade, observaram esta
condição em 0,8% desses elementos dentários. Já no estudo de WEERHEIJM, GRUYTHUY
SEN, VAN AMEROGEN (1992) a prevalência de cárie oculta encontrada foi de 15%, sendo
a maior freqüência em primeiros molares superiores. Quando os segundos molares foram
considerados, a maior frequência observada foi nos elementos inferiores. Esses autores
ressaltaram, ainda, que uma maior prevalência de cárie oculta foi verificada em indivíduos
com maior idade, sendo 26%, 37,5% e 50% nas idades de 14, 17 e 20 anos, respectivamente.
Tais autores atribuíram estes resultados ao amplo uso de fluoretos, o que levaria a uma
maior remineralização dentária superficial ao longo do tempo.
Devido à dificuldade em diagnosticar a lesão de cárie oculta na superfície oclusal, o
exame clínico visual não leva a resultados precisos quando utilizado sem complementação
radiográfica (PENNING et al., 1992). De acordo com YASSIN (1995), o exame não deve
ser realizado com o auxílio de sonda exploradora devido à imprecisão de diagnóstico e
pela possibilidade de gerar pequenas perfurações nas regiões com desmineralizações. A
radiografia interproximal é vista como meio complementar para o exame visual, visando
minimizar as dificuldades no diagnóstico da cárie oculta (WEERHEIJM et al., 1990; PITTS,
1991; LUSSI, 1993; RICKETTS et al., 1997).
2D). Após a remoção total de todo o tecido cariado, o complexo dentino-pulpar também
foi protegido com hidróxido de cálcio (Hydro C, Dentisply), e, em seguida, o dente foi
restaurado através da técnica da réplica oclusal de acrílico (Figura 2E), possibilitando a
reconstrução da morfologia oclusal (Figura 2F), salientando-se que a restauração foi confec
cionada seguindo os mesmos procedimentos restauradores descritos no Caso 1. A paciente
recebeu instrução de higiene oral e orientações quanto à dieta e tratamento restaurador
para as demais lesões de cárie. As consultas de revisão foram agendadas a cada 3 meses.
Discussão
Alguns autores (MILLMAN, 1984; LEWIN, 1985; LUSSI, 1993) consideram o fluoreto
como agente etiológico da cárie oculta. Eles acreditam que o flúor pode ser o causador de
mudanças no padrão de cárie, pelo fato de favorecer a remineralização das lesões oclusais
de esmalte, tornando-o mais resistente, não permitindo sua cavitação ou diminuindo a
progressão de cárie neste tecido, podendo mascarar sua propagação na dentina. Apesar
de não possuir um efeito direto no fenômeno da cárie oculta, a freqüência desta condição
irá aumentar em áreas onde haja a presença de fluoreto, já que os dentes apresentarão um
menor risco na superfície do esmalte (MILLMAN, 1984; LEWIN, 1985; SAWLE e ANDLAW,
1988). Em contrapartida, um recente estudo (HASHIZUME et al., 2013) demonstrou que
a cárie oculta não está diretamente relacionada ao uso prolongado de fluoretos, quando
comparou a prevalência de cárie em dentina (cárie oculta), de crianças brasileiras, em
momentos distintos - antes e após a fluoretação da água de abastecimento pública. Tais
autores (HASHIZUME et al., 2013) observaram uma redução proporcional de 51% de lesões
de cárie oculta em áreas fluoretadas.
precisão. Em outros trabalhos, além da resina acrílica, foram utilizados diferentes tipos de
materiais para confecção da matriz oclusal, dentre estes estão o cimento cirúrgico fotopo
limerizável (Barricaid, Caulk-Dentisply), cimento temporário fotopolimerizável (Fermit,
Vivadent), PVS (Poly-Vinil-Siloxane) e resina composta fotopolimerizável (PEREIRA et al.,
2008; PANDOLFI et al., 2003). Além disso, tal técnica foi escolhida, por se tratar de pacien
tes infantis, sendo fundamental optar por uma técnica restauradora de rápida execução,
possível de ser realizada em uma única sessão.
Conclusão
As lesões de cárie oculta merecem atenção especial, pois muitas vezes apesar do
esmalte da face oclusal, ao exame clínico aparentar estar hígido, uma lesão em dentina
pode estar presente, tornando indispensável o exame radiográfico interproximal de rotina.
Além disso, enfatiza-se que o tratamento mais indicado para a cárie oculta é a remoção
da dentina cariada e posterior restauração do dente. De maneira que a técnica da réplica
oclusal individual de acrílico constitui uma excelente escolha, principalmente em crianças,
por possibilitar a reconstrução da morfologia oclusal, eliminando a etapa de ajuste clínico,
ser de baixo custo e de fácil/rápida execução.
Agradecimentos
Os autores agradecem o suporte financeiro dado pela FAPERJ para a realização
desse estudo.
Referências
BALL, I. A. The ‘fluoride syndrome’: occult caries? Br Dent J, v. 160, n. 3, p. 75-6, Feb 8 1986.
BUSSADORI, S. K.; IMPARATO, J. C. P.; GUEDES-PINTO, A. C., Eds. Reabilitação Bucal em Odontopediatria. São
Paulo, v.1, p.122-155ed. 1999.
CHAIN, M. C.; BARATIERI, L. C. Restaurações adesivas diretas em dentes posteriores. São Paulo: Artes Médicas,
p. 47-129, 1998.
CORBELLINI, C.; CARVALHO, A.S.; LIMA-ARSATI, Y.B.O. Diagnóstico e tratamento da cárie oculta: relato de caso
clínico. Rev Saúde, v.3, n.3, p.30-35, 2009.
ECHEVERRIA, S. R. P.; IMPARATO, J. C. P. Uma opção para restauração de dentes com cárie oculta. APCD, v. 569,
n. 60, p. 423-425, 2002.
GUIMARÃES, R.; REIS, R. Reconstrução da morfologia oclusal através da técnica da matriz individual de acrílico.
Rev Ibero-am odontol Estet Dent, v. 3, n. 10, p. 154-9, 2004.
HASHIZUME, L.N.; MATHIAS, T.C.; CIBILS, D.M.; MALTZ, M. Effect of the widespread use of fluorides on the
occurrence of hidden caries in children. Int J Paediatr Dent, v.23, n.1, p.72-76, Jan, 2013.
HYATT, T. P. Observable and unobservable pits and fissures. Dent Cosmos, v. 73, p. 586-92, 1931.
KIDD, E. A.; NAYLOR, M. N.; WILSON, R. F. Prevalence of clinically undetected and untreated molar occlusal
dentine caries in adolescents on the Isle of Wight. Caries Res, v. 26, n. 5, p. 397-401, 1992.
LEWIN, D. A. Fluoride syndrome. Br Dent J, v. 158, n. 2, p. 39, Jan 19 1985.
LUSSI, A. Comparison of different methods for the diagnosis of fissure caries without cavitation. Caries Res, v.
27, n. 5, p. 409-16, 1993.
MILICICH, G. Clinical applications of new advances in occlusal caries diagnosis. N Z Dent J, v. 96, n. 423, p. 23-6,
Mar 2000.
MILLMAN, C. K. Fluoride syndrome. Br Dent J, v. 157, n. 10, p. 157-341, Nov 24 1984.
OLIVEIRA, L. B.; TAMARY, T. K.; RODRIGUES, C. R. M. D.; WANDERLEY, M. T. Réplica da face oclusal: técnica
alternativa para restauração de molares decíduos. J Brás Odontopediatric Odontol Bebê, v. 4, n. 21, p. 405-410, Set./
Out 2001.
PANDOLFI, M.; TORRES, L.T.P.; IMPARATO, J.C.P. Matriz ocluso-proximal: alternativa para restaurações de dentes
decíduos posteriores com resinas compostas. Rev Odontol Vitória, v.5, n.3, p.53-59, 2003.
PENNING, C.; VAN AMERONGEN, J. P.; SEEF, R. E.; TEN CATE, J. M. Validity of probing for fissure caries diag-
nosis. Caries Res, v. 26, n. 6, p. 445-9, 1992.
PEREIRA, R.F.; GOMES, R.H.; VOLPATO, L.E.R. Lesão de cárie oculta: restauração utilizando a técnica da matriz
oclusal. Rev INPEO de Odontologia Cuiabá – MT, v.2, n.1, p.25-32, Jan – Jul 2008.
PINTO, M.M.; IMPARATO, J.C.P.; BUSSADORI, S.K. Restauração em Dentes Decíduos Posteriores pela Técnica de
Moldagem Ocluso-Proximal. JBP. Jornal Brasileiro de Odontopediatria & Odontologia do Bebê, v. 4, n.22, p. 455-460,
2002.
PITTS, N. B. The diagnosis of dental caries: 1. Diagnostic methods for assessing buccal, lingual and occlusal sur-
faces. Dent Update, v. 18, n. 9, p. 393-6, Nov 1991.
RICKETTS, D.; KIDD, E.; WEERHEIJM, K.; DE SOET, H. Hidden caries: what is it? Does it exist? Does it matter?
Int Dent J, v. 47, n. 5, p. 259-65, Oct 1997.
SAWLE, R. F.; ANDLAW, R. J. Has occlusal caries become more difficult to diagnose? A study comparing clinically
undetected lesions in molar teeth of 14-16-year old children in 1974 and 1982. Br Dent J, v. 164, n. 7, p. 209-11, Apr
9 1988.
SEOW, W. K. Pre-eruptive intracoronal resorption as an entity of occult caries. Pediatr Dent, v. 22, n. 5, p. 370-6,
Sep-Oct 2000.
SUSIN, A.E.; POZZOBON, R.T.; SKUPIEN, J.A.; PACHALY, R. Técnica da réplica oclusal x restauração direta con-
vencional com resina composta – relato de caso. Int J Dent, v.7, n.4, p.250-254, out/dez, 2008.
WEERHEIJM, K. L. Occlusal ‘hidden caries’. Dent Update, v. 24, n. 5, p. 182-4, Jun 1997.
WEERHEIJM, K. L.; DE SOET, J. J.; DE GRAAFF, J.; VAN AMERONGEN, W. E. Occlusal hidden caries: a bacterio-
logical profile. ASDC J Dent Child, v. 57, n. 6, p. 428-32, Nov-Dec 1990.
WEERHEIJM, K. L.; GRUYTHUYSEN, R. J.; VAN AMERONGEN, W. E. Prevalence of hidden caries. ASDC J Dent
Child, v. 59, n. 6, p. 408-12, Nov-Dec 1992.
YASSIN, O. M. In vitro studies of the effect of a dental explorer on the formation of an artificial carious lesion.
ASDC J Dent Child, v. 62, n. 2, p. 111-7, Mar-Apr 1995.