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1 – BREVE INTRODUÇÃO

A legislação eleitoral possui uma série de vedações aos agentes públicos e cidadãos
comuns (sejam ou não políticos/pré-candidatos) pouco conhecidas até mesmo por
quem atua no dia a dia das campanhas eleitorais.
Dentro da concepção do nosso curso ELEITORAL CLASS, que é fazer com que
as pessoas tenham acesso a um curso que prepara o aluno com estratégia para
as eleições de 2022, apresentaremos abaixo um quadro-resumo dessas limitações,
tanto cíveis como criminais.

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2 – QUADRO-RESUMO DOS CRIMES ELEITORAIS QUE PODEM SER PRATICADOS A
QUALQUER MOMENTO DO ANO (PRÉ)-ELEITORAL (Incidência a partir de 01/01/2022)
A maioria dos crimes eleitorais, como não poderia ser diferente, tutela, direta
ou indiretamente, a regularidade do processo eleitoral como um todo, nas suas mais
variadas etapas.
Dentro desse contexto, há um pensamento comum de leigos e profissionais da
área político-jurídica no sentido de que não existem crimes eleitorais com incidência
anterior ao ano eleitoral, ou mesmo previamente aos momentos do chamado
micro processo eleitoral, que começa com as convenções e termina no dia do pleito.
Trata-se de um grave equívoco acadêmico, que traz como reflexo prático
uma certa letargia das instituições na prevenção e repressão aos diversos delitos que
são cometidos em ano pré-eleitoral ou já no início do ano eleitoral, com o fim de le-
gitimar escusamente pré-candidaturas ou pretensões político-partidárias, o que, não
raro, possui reflexo direito com o resultado das urnas
A verdade é que não há uma regra geral para o início do período de incidên-
cia de todos os crimes eleitorais, pois cada redação típica traz particularidades que
devem ser observadas pelo intérprete para saber quando a mesma poderá ser praticada.
Isso sem descurar da premissa básica no sentido de que não basta a subsunção
objetiva do fato à norma (tipicidade formal), sendo necessária a lesão ou potencialida-
de de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma em questão.
Assim, existe uma variedade temporal difusa para o cometimento dos crimes
eleitorais, pois há tipos que só podem ser cometidos no dia da eleição (caso dos
artigos 302 e 313, do Código Eleitoral, ou do artigo 39, §5°, da Lei n°9.504/97), outros
que estão vinculados com a propaganda (artigos 323, 331, 332 e 335, do Código
Eleitoral), ou com atividades partidárias (artigo 337, do Código Eleitoral), com o não
oferecimento de denúncia pelo Ministério Público no prazo legal (artigo 342, do
Código Eleitoral), com o financiamento eleitoral (artigo 354-A, do Código Eleitoral),
ou que só podem ser cometidos a partir de determinado período antes do dia da
eleição, como são os incisos I (cinquenta antes do pleito), III (da véspera ao dia posterior
a eleição) e V (noventa dias antes do dia da votação), todos da Lei n°6.091/74, bem com
do artigo 298, do Código Eleitoral, cuja incidência começa quinze dias antes das eleições
e vai até as quarenta e oito horas após o seu fim, dentre outros casos.
Por fim, temos crimes eleitorais de natureza permanente, que podem ser
praticados a qualquer momento do ano eleitoral, ou até mesmo antes dele.
Preparamos uma tabela esquemática com aqueles mais recorrentes na prática
eleitoral:

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

- Em anos eleitorais, a transferência pode ser feita até


cento e cinquenta e um dias antes da eleição (vide arti-
go 91 da Lei n°9.504/97).
Assim, no pleito de 2022, 04/05, será o último dia para
que o eleitor requeira a sua inscrição ou transferência. A
partir dessa data e até o final do pleito, o cadastro eleito-
ral está fechado, período em que nenhuma alteração po-
derá ser efetuada no registro do eleitor, sendo permiti-
da somente a emissão de segunda via do título eleitoral.
A leitura do art. 289 do Código Eleitoral eviden-
cia que o crime de inscrição fraudulenta de elei-
tor não demanda nenhuma finalidade eleitoral es-
pecífica para sua configuração, de modo que, para
subsunção da conduta ao tipo penal, basta a von-
tade consciente do agente para realizar, mediante
INCRIÇÃO FRAUDULENTA expediente ardil, transferência ou inscrição eleito-
DE ELEITOR ral (dolo genérico).” (TSE, Agravo de Instrumento nº
3158, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Car-
valho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrôni-
ARTIGO 289, DO CÓDIGO ELEI-
co, Tomo 192, Data 03/10/2019, Página 32/33).
TORAL - Inscrever-se fraudulentamen-
te eleitor: Por se tratar de crime comissivo, o delito descrito no
art. 289 do Código Eleitoral se consuma com o com-
Pena - Reclusão até cinco anos e paga-
parecimento do eleitor à Justiça Eleitoral para re-
mento de cinco a 15 dias-multa.
querer o respectivo alistamento. A expressão “ins-
crever-se”, contida na norma incriminadora descrita no
art. 289 do CE, é gênero do qual são espécies as de-
mais modalidades de alistamento eleitoral. Preceden-
te do TSE.8. Segundo orientação perfilhada em julgado
deste Tribunal, o bem jurídico protegido pela norma in-
criminadora é a higidez do cadastro eleitoral, razão pela
qual o fato típico é passível de se concretizar não apenas
por ocasião da inscrição eleitoral originária, mas tam-
bém nas operações dela derivadas, tais como a de revi-
são e a de transferência de domicílio, as quais têm por
escopo a atualização dos dados contidos no registro ge-
ral de eleitores. (TSE, Recurso em Habeas Corpus nº
060057294, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De
Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça ele-
trônico, Tomo 239, Data 04/12/2018).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

O TSE já pontificou a possibilidade desse tipo não pos-


suir qualquer correlação com a existência de candidatu-
ra ou momento específico da campanha eleitoral: “Em
se tratando de corrupção eleitoral, irrelevante é o pe-
ríodo em que se deu a conduta típica, pois a condição de
candidato não é fundamental para a consumação do cri-
me, que pode ocorrer em qualquer tempo. Para a con-
figuração deste tipo penal, basta que a vantagem ofere-
cida esteja vinculada à obtenção de votos. Precedente.”
(Agravo de Instrumento nº 383, Acórdão, Relator(a)
Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário da
justiça eletrônica, Tomo 102, Data 26/05/2020).
“O crime de corrupção eleitoral ativa é crime instan-
tâneo, cuja consumação é imediata, ocorrendo com a
simples prática de um dos núcleos do tipo (dar, ofere-
CORRUPÇÃO ELEITORAL cer, prometer, solicitar ou receber), bem como se qua-
lifica como crime formal, pois a consumação indepen-
ARTIGO 299 DO CÓDIGO ELEITO- de do resultado, da efetiva entrega da benesse em troca
RAL - Dar, oferecer, prometer, solicitar do voto ou da abstenção, sendo irrelevante se o eleitor
ou receber, para si ou para outrem, di- corrompido efetivamente votou no candidato indicado.
nheiro, dádiva, ou qualquer outra van- Exige-se (i) que a promessa ou a oferta seja feita a um
tagem, para obter ou dar voto e para eleitor determinado ou determinável; (ii) que o elei-
conseguir ou prometer abstenção, ain- tor esteja regular ou que seja possível a regularização
da que a oferta não seja aceita: no momento da consumação do crime; (iii) que o elei-
Pena – reclusão até quatro anos e pa- tor vote no domicílio eleitoral do candidato indicado
gamento de 5 a 15 dias-multa. pelo corruptor ativo.” (TSE, Agravo de Instrumento nº
20903, Acórdão, Relator(a) Min. Gilmar Ferreira Men-
des, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo
43, Data 05/03/2015, Página 44/45).
Além disso, é importante destacar que “o crime de cor-
rupção eleitoral (Cód. Eleitoral, art. 299), na modalida-
de “prometer” ou “oferecer”, é formal e se consuma
no momento em que é feita a promessa ou oferta, in-
dependentemente de ela ser aceita ou não”, de modo
que “a oferta de dinheiro em troca do voto, realizada em
ação única, a mais de uma pessoa, caracteriza o tipo do
art. 299 em relação a cada um dos eleitores identifica-
dos.” Assim, “há concurso formal impróprio, ou imperfeito,
quando o candidato, em conduta única, promete bem ou
vantagem em troca do voto de dois ou mais eleitores de-
terminados, agindo com desígnios autônomos (Cód. Penal,

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

art. 70, segunda parte). (TSE, Recurso Especial Eleitoral


nº 1226697, Acórdão, Relator(a) Min. Henrique Neves
Da Silva, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico,
Tomo 183, Data 30/09/2014, Página 487/488).
Por fim, não custa lembrar que “a absolvição do réu,
por falta de provas, da imputação de crime de corrup-
ção eleitoral (art. 299 do CE), nos autos de ação penal,
por si só, não tem o condão de afastar a condenação
por captação ilícita de sufrágio e abuso do poder eco-
nômico em sede de ação de investigação judicial eleito-
ral, pois a jurisprudência desta Corte consolidou-se no
sentido da incomunicabilidade das esferas criminal e ci-
vil-eleitoral.” (TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 82911,
Acórdão, Relator(a) Min. Admar Gonzaga Neto, Publi-
cação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume, Tomo
170, Data 02/09/2016, Página 72/73).

- O crime se consuma com a indução e o início da


inscrição irregular, sendo indiferente a obtenção do
fim pretendido1 e a utilização posterior dela para fins de
INDUÇÃO À INSCRIÇÃO votação, que é mero exaurimento da conduta típica. As-
FRAUDULENTA sim, para que reste caracterizada a execução criminosa,
é preciso que o alistando inicie o processo administrati-
vo de inscrição eleitoral.
ARTIGO 290 DO CÓDIGO ELEI- - “O crime previsto neste dispositivo somente pode ser
TORAL - Induzir alguém a inscrever praticado pelo eleitor, não admitindo coautoria, mas par-
eleitor com infração de qualquer dis- ticipação.” (Ac.-TSE, de 3.3.2015, no REspe nº 571991).
positivo dêste Código.
- “O crime de falsidade ideológica eleitoral (art. 350 do
Pena - Reclusão até 2 anos e pagamen- CE) não é meio necessário nem fase normal de prepa-
to de 15 a 30 dias-multa. ração para a prática do delito tipificado neste artigo.
Os crimes descritos são autônomos e podem ser pra-
ticados sem que um dependa do outro.” (Ac.-TSE, de
18.8.2011, no REspe nº 23310).

1 Nesse sentido: TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 571991, Acórdão, Relator(a) Min. Maria Thereza Rocha De
Assis Moura, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 58, Data 25/03/2015, Página 37.

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

O Código Eleitoral prevê dois tipos penais que incrimi-


nam a coação realizada para fins de conseguir o voto ou
a abstenção do voto (artigos 300 e 301)2.
Nesse sentido, cumpre apresentar, ainda que de relan-
ce, as principais características diferenciadoras entre
eles para que o leitor já as assimile de pronto. Vejamos.
A primeira delas diz respeito ao sujeito ativo, pois en-
quanto o crime do artigo 300 é próprio, só podendo ser
praticado por servidor público (eleitoral ou não), o tipo
do artigo 301 pode ser praticado por qualquer pessoa.
Em seguida, devemos observar que coação do artigo
CRIMES DE COAÇÃO ELEITORAL 300 só pode ser do tipo moral ou psíquica, pois, se hou-
ver violência ou grave ameaça, o crime será o do artigo
301 do Código Eleitoral.
Por fim, as consequências são distintas, uma vez que o
artigo 300, por se tratar de crime de menor potencial
ofensivo, possibilita a aplicação da transação penal e do
sursis processual sem gerar inelegibilidade, ao passo que
o artigo 301 não comporta transação penal, embora cai-
ba a suspensão condicional do processo e a sua conde-
nação seja apta a gerar a inelegibilidade.
Pois bem, feita essa distinção preliminar, passemos a
analisar os referidos tipos penais.

Deve-se destacar que o tipo penal possui momento de con-


sumação variável de acordo com o beneficiário da coação.
COAÇÃO ELEITORAL DE Se o comportamento for voltado para beneficiar
um partido político (pessoa jurídica de direito privado
SERVIDOR PÚBLICO com existência jurídica perene, salvo extinção ou fusão),
trata-se de crime que pode ser praticado e consu-
ARTIGO 300 DO CÓDIGO ELEI- mado a qualquer momento.
TORAL - Valer-se o servidor público Contudo, caso a conduta se direcione a beneficiar
da sua autoridade para coagir alguém “pré-candidato”, o crime só se perfectibiliza após
a votar ou não votar em determinado a escolha realizada em convenção partidária e o
candidato ou partido: consequente pedido de registro de candidatura.
Pena - detenção até seis meses e pa- Se isso não ocorrer, o fato será atípico, pois não exis-
gamento de 60 a 100 dias-multa. te a figura do “candidato” beneficiado exigido pelo tipo.

2 Não custa lembrar que a coação eleitoral também pode configurar, cumulativamente ou não, dois ilícitos eleitorais
cíveis: a) captação ilícita de sufrágio (artigo 41-A, §2º, da Lei nº9504/97); b) abuso de poder (político ou econômico),
a depender da gravidade das circunstâncias do caso concreto (artigo 22, da Lei Complementar nº64/90).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

Parágrafo único. Se o agente é mem- Além disso, o crime se consuma com a prática da
bro ou funcionário da Justiça Eleitoral coação eleitoral, sendo indiferente se o eleitor votou
e comete o crime prevalecendo-se do ou deixou de votar no candidato indicado pelo coator.
cargo a pena é agravada. Caso, porém, a violência ou grave ameaça possua uma
finalidade diversa da especificada no tipo, ainda que de
caráter eleitoral (escolha de alguém na convenção par-
tidária como candidato de determinado partido, ou do
presidente do partido na eleição interna), não haverá o
crime em estudo, mas o de constrangimento ilegal (arti-
go 146, do Código Penal).

Os artigos 324, 325 e 326 do Código Eleitoral regulam os


crimes eleitorais contra a honra mais tradicionais (calú-
nia, difamação e injúria, respectivamente), cujo aumento
de pena está previsto no artigo 327, dentre os quais está
a sua prática em comícios3 ou por meio de aplicativos de
conversa (whatsapp4, telegram, instagram, twitter etc), .
Apesar de tais delitos seguirem, a priori, a mesma configu-
CRIMES ELEITORAIS CONTRA ração daqueles previstos no Código Penal no que diz res-
A HONRA peito ao núcleo dos tipos, existem fatores diferenciado-
res entre ambos, pois, do contrário, seria um típico caso
de bis in idem. Vejamos, pois, cada um deles.
Inicialmente, destaco que se faz necessário que a
conduta criminosa seja praticada, alternativamente,
em ato de propaganda eleitoral ou em ato alheio à
propaganda, mas que tenha fins eleitorais5. Nesse

3 “As condutas ilícitas ocorreram durante um único comício, voltado para as eleições de 2012, na presença de
várias pessoas, circunstância que se amolda perfeitamente à causa de aumento de pena prevista no art. 327
do CE, tendo sido valorada como tal na terceira fase da dosimetria da pena, em virtude de expressa previsão
legal.” (TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 47335, Acórdão, Relator(a) Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Pu-
blicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 03/11/2017).
4 “Imputar-se a outrem, falsamente, a prática de fato definido como crime, em grupos do aplicativo WhatsApp,
visando fins de propaganda eleitoral negativa, constitui calúnia eleitoral.” (TRE/GO, RECURSO CRIMINAL n
6611, ACÓRDÃO n 40/2019 de 13/03/2019, Relator(aqwe) LUCIANO MTANIOS HANNA, Publicação: DJ -
Diário de justiça, Tomo 051, Data 21/03/2019, Página 6/10).
5 “A divulgação de montagem fotográfica e da inclusão do nome e da imagem de candidato em eleição municipal
associando-o à prática de crimes que foram julgados pelo Supremo Tribunal Federal, realizada no período crítico
das campanhas eleitorais, as quais se revelaram falsas, demonstra quadro fático que se insere no tipo do art. 324 do
Código Eleitoral, como foi corretamente definido pelo Tribunal Regional Eleitoral. A divulgação de fatos ou notícias,
em especial as falsas, tem o condão de influenciar as campanhas eleitorais e, por isso, podem ser consideradas
elementos que visam a fins de propaganda.” (TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 24326, Acórdão, Relator(a) Min.
Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 14/03/2016, Página 57).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

sentido: “O objetivo do art. 326 do CE é coibir a manifesta-


ção ofensiva à honra subjetiva dos jurisdicionados, para a qual
basta que a conduta tenha sido levada a efeito na propagan-
da eleitoral ou com repercussão nessa seara, ou seja, apura-
-se a conotação eleitoral da manifestação, o que se verifica no
caso.” (TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 40224, Acórdão,
Relator(a) Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE -
Diário de justiça eletrônico, Data 02/02/2017, Página 387).
Diante dessa interpretação da elementar “na propagan-
da, ou visando fins de propaganda”, destaco também que
não é preciso que a ofensa seja praticada contra
candidato, uma vez que a norma descreve as condutas de
difamar e injuriar alguém, sem especificar nenhuma quali-
dade especial quanto ao ofendido.” (TSE, Habeas Corpus
nº 187635, Acórdão, Relator(a) Min. Aldir Guimarães
Passarinho Junior, Publicação: DJE - Diário de justiça
eletrônico, Tomo 033, Data 16/02/2011, Página 44-45).
Esse precedente revela como esses delitos podem ser
praticados a qualquer momento, desde que presen-
te a finalidade eleitoral da conduta típica de caluniar, di-
famar ou injuruar.
E mais: “por não possuir honra subjetiva, visto tratar-se de
pessoa jurídica, o partido político não pode ser agente pas-
sivo de crime de injúria ou calúnia.” (TRE/BA, PETICAO
n 1188, ACÓRDÃO n 468 de 31/03/2009, Relator(aqwe)
ESERVAL ROCHA, Publicação: DPJ-BA - Diário do Poder
Judiciário, Data 14/04/2009, Página 76/77 ).
Convém referenciar, ainda, que não se aplica na seara
eleitoral a isenção da pena decorrente da retratação ca-
bal da afirmação feita pelo autor do fato antes da senten-
ça (artigo 143, do Código Penal). Assim já decidiu a Su-
prema Corte Eleitoral (TSE): “O depoimento do réu, em
juízo, ainda que contivesse retratação explícita, e não a con-
tém, não se mostra apto a isentá-lo de pena. Mesmo com
boa vontade interpretativa, inexiste nos autos qualquer re-
tratação peremptória, absoluta, a afastar a aplicação analó-
gica do art. 143 do Código Penal.” (Recurso Especial Eleito-
ral nº 35322, Acórdão, Relator(a) Min. Joaquim Benedito
Barbosa Gomes, Publicação: DJE - Diário de justiça ele-
trônico, Tomo 165, Data 31/08/2009, Página 41).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

O crime de denunciação caluniosa eleitoral, criado a


DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA partir da Lei n°13.834/2019, foi aprovado para reprimir
ELEITORAL o denuncismo irresponsável de pessoas que usam
a boa-fé das autoridades, que acreditam nas impu-
ARTIGO. 326-A DO CÓDIGO tações apresentadas, para instaurar investigações poli-
ELEITORAL - Dar causa à instaura- ciais ou administrativas, bem como processos judiciais
ção de investigação policial, de pro- em desfavor de pessoa(s) que o denunciante sabe ino-
cesso judicial, de investigação admi- cente6, mas que, por finalidade eleitoral escusa, faz a co-
nistrativa, de inquérito civil ou ação municação de crime ou de ato infracional.
de improbidade administrativa, atri- Trata-se de delito que pode ser praticado por qualquer
buindo a alguém a prática de crime ou pessoa (juízes, membros do Ministério Público, advoga-
ato infracional de que o sabe inocente, dos e qualquer do povo) que pratique a conduta proibida.
com finalidade eleitoral: (Incluído pela A “finalidade eleitoral” exigida pelo tipo signifi-
Lei nº13.834, de 2019) ca que o comportamento do denunciante deve ser di-
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) recionado a repercutir negativamente nas preten-
anos, e multa. (Incluído pela Lei sões político-eleitorais da vítima da vítima, tenham
nº13.834, de 2019) elas sido reveladas ao público ou não.
§ 1º A pena é aumentada de sexta par- Observe-se que não há necessidade obrigatória que
te, se o agente se serve do anonima- a conduta seja voltada para as eleições, o que esva-
to ou de nome suposto. (Incluído pela ziaria o dolo específico do tipo, que foi mais abrangen-
Lei nº13.834, de 2019) te do que isso, já que “finalidade eleitoral” pode abran-
§ 2º A pena é diminuída de metade, ger situações ou pretensões político-partidárias de
se a imputação é de prática de contra- alguém que vão repercutir nas suas decisões eleitorais.
venção. (Incluído pela Lei nº13.834, Assim, vislumbramos algumas hipóteses de incidência na
de 2019) prática, tais como 1 – praticar o crime com o fim de in-
viabilizar a filiação de determinada pessoa em partido

6 “O crime de denunciação caluniosa, previsto no art. 399 do Código Penal exige que o agente tenha conhe-
cimento da inocência e, mesmo assim, movimente, dolosamente, a máquina judiciária com a intenção de
prejudicar a vítima. Neste caso, não há nos autos qualquer elemento capaz de demonstrar a conduta dolosa
do paciente e dos demais acusados e, sem prova desse elemento subjetivo, não se pode falar na prática do
fato típico atribuído ao paciente na inicial acusatória. Precedentes do STJ: APn 824/DF, Rel. Ministro MAU-
RO CAMPBELL MARQUES, Corte Especial, julgado em 2/5/2018, DJe 15/5/2018; APn 489/SP, Rel. Ministro
ARI PARGENDLER, Corte Especial, julgado em 8/9/2008, DJe 23/10/2008; RHC 106.998/MA, Rel. Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 21/02/2019, DJe 12/03/2019; HC 160.893/SP, Rel.
Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 23/08/2013.” (STJ, HC
510.410/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 15/08/2019,
DJe 30/08/2019).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

político, que é um requisito formal para que alguém


possa ser candidato; 2 – praticar o crime com o fim de
impedir que alguém concorra ou se eleja para cargos de
direção administrativaem partidos políticos; 3 – praticar
o crime com o fim de desestimular pré-candidato a tro-
car de partido, ou que a direção da agremiação não acei-
te a vítima; 4 - praticar o crime com o fim de impedir a
escolha da vítima em convenção partidária como candi-
dato; 5 - praticar o crime com o fim de denegrir a ima-
gem de pré-candidato opositor.
Dificilmente, a finalidade eleitoral restará comprovada
de plano com a representação do(s) criminoso(s), já que
o(s) mesmo(s) sempre diz(em) que formula(m) as de-
núncias com o fim de que “se faça justiça”, ou que “não
têm qualquer interesse no caso”.
Assim, a fórmula para a demonstração desse especial
animus vai decorrer da intricada equação entre com-
portamentos anteriores/posteriores à comunicação, em
especial pela divulgação, em redes sociais ou qualquer
meio de comunicação em massa, de que a investigação
ou ação judicial temerária decorreu de sua iniciativa, re-
forçada pela circunstância de ser opositor político ou
pré-candidato assumido.
Por todas essas circunstâncias, fica claro que o crime de
denunciação caluniosa eleitoral pode ocorrer a qual-
quer momento e não possui qualquer vinculação
necessária com o ano ou calendário eleitoral7.
É de se destacar, ainda, que a expressão “investigação
policial, constante no tipo, é objeto de acirrada polêmi-
ca, prevalecendo, porém, tanto na doutrina como na ju-
risprudência, que “é necessário que a denúncia falsa dê
ensejo à deflagração de uma investigação administrati-
va, sendo prescindível, contudo, que haja a formalização
7

7 No mesmo sentido do que defendemos, conferir: “O tipo não descreve elemento temporal, de maneira que
a conduta incriminada pode ocorrer antes ou durante o processo eleitoral.” (GOMES, José Jairo. Crimes
Eleitorais e Processo Penal Eleitoral. São Paulo: Atlas, 4ª edição, 2020, p.161.”

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

de inquérito policial ou de termo circunstanciado.” (STJ,


AgRg no AREsp 1222635/ES, Rel. Ministro NEFI COR-
DEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 04/09/2018, DJe
11/09/2018).
Por fim, se a representação do denunciante for arquiva-
da de plano, sem qualquer diligência investigativa, não
haverá o crime em estudo, a despeito da possível carac-
terização de calúnia (artigo 324, do Código Eleitoral).
Assim, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao
julgar o RHC n°74941/MT, julgado em 19/09/2017.

VIOLÊNCIA POLÍTICA CONTRA


A MULHER

- Art. 326-B, do CE: Assediar, cons- O tipo penal em referência foi inserido no Código Elei-
tranger, humilhar, perseguir ou amea- toral por meio da Lei n°14.192/2021.
çar, por qualquer meio, candidata a
Sua redação aponta que o crime de “violência política
cargo eletivo ou detentora de man-
contra a mulher” pode ser praticado a qualquer mo-
dato eletivo, utilizando-se de menos-
mento, pois atinge a “detentora de mandato” (que exis-
prezo ou discriminação à condição
te durante todo o ano eleitoral ou antes mesmo), bem
de mulher ou à sua cor, raça ou etnia,
como a “candidata” (no caso da pré-candidata, é preci-
com a finalidade de impedir ou de di-
so esperar a escolha em convenção e o pedido de regis-
ficultar a sua campanha eleitoral ou o
tro para a consumação).
desempenho de seu mandato eletivo.
Há posição doutrinária no sentido de que esse delito
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4
foi revogado tacitamente pela Lei dos Crimes Contra
(quatro) anos, e multa.
a Ordem Democrática (Lei n°14.197/2021), que inse-
Parágrafo único. Aumenta-se a pena riu o crime de “violência política” no Código Penal (ar-
em 1/3 (um terço), se o crime é co- tigo 359-P).
metido contra mulher:
I – gestante;
II – maior de 60 (sessenta) anos;
III – com deficiência.

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

O tipo penal criminaliza a restrição, o impedimento e a


criação de dificuldades ao exercício de direitos políticos,
cuja existência é permanente e inalienável, salvo as res-
trições instituídas pela Constituição Federal e pela legis-
lação eleitoral.
Ora, sendo assim, está claro que o delito pode ser pratica-
do a qualquer momento, desde que observados os meios
VIOLÊNCIA POLÍTICA de execução e as razões presentes na descrição do tipo.
Não comungamos do entendimento de que esse crime
Art. 359-P DO CÓDIGO PENAL - revogou o previsto no artigo 326-B, do Código Eleito-
Restringir, impedir ou dificultar, com ral, pelas seguintes razões:
emprego de violência física, sexual ou a) Há diversidade relevante nos núcleos, de modo que
psicológica, o exercício de direitos po- a redação do tipo previsto no código penal não abran-
líticos a qualquer pessoa em razão de ge necessariamente todos os comportamentos previs-
seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou tos no código eleitoral, que são bem mais amplos. Ex:
procedência nacional: (Incluído pela assediar, humilhar e ameaçar não se encaixam em qual-
Lei nº 14.197, de 2021). quer dos verbos presentes do 359-P do código penal.
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) b) O “violência política contra a mulher” possui finalida-
anos, e multa, além da pena corres- des criminais específicas (impedir ou dificultar a campa-
pondente à violência. (Incluído pela nha eleitoral ou o desempenho do mandato eletivo da
Lei nº 14.197, de 2021). candidata ou detentora do mandato). Isso torna a obje-
tividade jurídica deles diversa.
c) O “violência política contra a mulher” possui sujeito
passivo específico e restrito, comparado com o violên-
cia política do código penal.
d) No código eleitoral, precisa demonstrar menosprezo
ou discriminação à condição de mulher, o que é dispen-
sável no código penal.

REALIZAÇÃO DE COOPTAÇÃO
OU PROPAGANDA POR MEIO
Tradicionalmente, um dos mecanismos mais utilizados
DE DISTRIBUIÇÃO DE BENS
por pré-candidatos, candidatos, partidos políticos e ca-
bos eleitorais para obter vantagem ilícita na corrida pela
ARTIGO 334 DO CÓDIGO ELEI- vitória nas urnas ocorre por meio da distribuição gratui-
TORAL - Utilizar organização comer- ta ou quase não-onerosa (à preços módicos ou subven-
cial de vendas, distribuição de mercado- cionados) de benesses em geral (mercadorias, serviços
rias, prêmios e sorteios para propaganda ou prêmios), tudo como forma de aliciar eleitores, em
ou aliciamento de eleitores: especial aqueles mais humildes.

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

Pena - detenção de seis meses a um Trata-se de estratégia vil e que deve ser reprimida de
ano e cassação do registro se o res- maneira exemplar, uma vez que esse tipo de compor-
ponsável fôr candidato. tamento gera nos eleitores mais incautos uma mistura
dos sentimento de gratidão e expectativa quanto à sua
continuidade durante o mandato político a ser exercido
pelo candidato “benfeitor”.
Ocorre que esses atos de “caridade política” (leia-se:
cooptação eleitoral escusa), cuja frequência e intensida-
de aumentam em nível diretamente proporcional à proxi-
midade do pleito eleitoral, podem ter também outro fim
que não seja o de aliciar eleitores, mas, sim, o de promo-
ver politicamente determinado partido político, pré-can-
didato ou candidato oficializado perante a Justiça Eleitoral.
Quem conhece a realidade, sabe da proliferação de bin-
gos, rifas, bolões, bazares, ou qualquer evento asseme-
lhado com os fins proibidos pelo tipo penal em estu-
do, razão pela qual deve-se atentar para a circunstância
de que o esse crime eleitoral pode ser praticado
a qualquer momento, independentemente de ser
ou não ano eleitoral.8
Nesse contexto, não se pode deixar de referenciar di-
versas práticas desse crime no ano de 2020, por
efeito da pandemia da COVID-19, quando gestores
públicos e outros pré-candidatos, supostamente “sensi-
bilizados” com a grave crise sanitária e a queda no ren-
dimento da população em geral, passaram a doar, mi-
diaticamente, itens de higiene pessoal, de proteção
individual ou de cestas básicas, com a vil estratégia de
divulgação e grande promoção pessoal nas redes sociais,
de natureza institucional ou mesmo particular.

8 CRIME ELEITORAL. DELITO PREVISTO NO ART. 334 DO CÓDIGO ELEITORAL. RÉU ABSOLVIDO POR
SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU. REFORMA DE SENTENÇA. 1 - O único objetivo visado pelo acusado
na distribuição de cestas básicas foi a propaganda eleitoral, a fim de garantir sua permanência ad eternum no
poder. 2 -É irrelevante a ocorrência ou não de pleito eleitoral. 3 - Comprovado está nos autos que o acusado
vem praticando este crime eleitoral desde o ano de 1997 até março de 1999, o que subsume a figura penal
da continuidade delitiva. 4 - Recurso conhecido e provido para reformar a sentença de primeiro grau. (TRE/
ES, RECURSO CRIMINAL n 12, ACÓRDÃO n 100 de 17/09/2001, Relator(a) ALINALDO FARIA DE SOUZA,
Relator(a) designado(a) MACÁRIO RAMOS JÚDICE NETO, Revisor(a) MAURÍLIO ALMEIDA DE ABREU,
Publicação: DOE - Diário Oficial do Estado do Espírito Santo, Data 22/10/2001, Página 104).

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

Em tais hipóteses, o dolo específico do tipo de alicia-


mento de eleitores está, em nosso sentir, plenamen-
te caracterizado, devendo o Ministério Público Eleito-
ral, Polícia Federal e Justiça Eleitoral coibir, de maneira
exemplar, práticas dessa natureza, pois violadoras, a um
só tempo, da igualdade de oportunidades que o crime
tutela, bem como indiciária, no campo cível, da condu-
ta vedada do artigo 73, IV e §10 c/c artigo 74 da Lei
n°9.504/97 e do abuso de poder econômico e político
(no casos dos gestores), sem embargo do desprezível
comportamento imoral de alguém tentar tirar proveito
eleitoreiro de uma dramática situação que atinge a to-
dos, em especial os os de maior vulnerabilidade social.

USO DE SERVIÇOS E BENS


PÚBLICOS PARA FINALIDADES
POLÍTICO-PARTIDÁRIAS De antemão, é importante deixar registrado que o fato
de existir sanção cível, fixada por lei posterior ao Códi-
go Eleitoral (no caso, a Lei das Eleições – 9504/97), pu-
ARTIGO 346 DO CÓDIGO ELEITO-
nindo o uso de bens, serviços e servidores públicos em
RAL - Violar o disposto no Art. 377:
benefício de candidatos, partidos políticos ou candida-
Pena - detenção até seis meses e pa- tos não tem o condão de revogar as disposições crimi-
gamento de 30 a 60 dias-multa. nais alusivas ao mesmo fato, pois o nosso sistema impõe
Parágrafo único. Incorrerão na pena, a independência das instâncias, salvo no caso de absol-
além da autoridade responsável, os vição por negativa de autoria ou materialidade. Nesse
servidores que prestarem serviços e os mesmo sentido, vem decidindo a jurisprudência há bas-
candidatos, membros ou diretores de tante tempo, o que se mantém na atualidade
partido que derem causa à infração. Assim sendo, destaco que, salvo os casos das exceções
Art. 377. O serviço de qualquer re- legais que serão oportunamente apresentadas, qual-
partição, federal, estadual, municipal, quer uso político-partidário da estrutura administrati-
autarquia, fundação do Estado, so- va pública ou privada que receba recurso público con-
ciedade de economia mista, entidade figurará o crime em estudo, a não ser que a conduta
mantida ou subvencionada pelo poder seja a utilização em campanha eleitoral, no decurso dos
público, ou que realiza contrato com 90 (noventa) dias que antecedem o pleito), veículos e
êste, inclusive o respectivo prédio e embarcações pertencentes à União, Estados, Territó-
suas dependências não poderá ser uti- rios, Municípios e respectivas autarquias e sociedades
lizado para beneficiar partido ou orga- de economia mista, cuja tipificação está no artigo 11, V,
nização de caráter político. da Lei nº6091/74.

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CRIMES ELEITORAIS
OBSERVAÇÕES
PERMANENTES RELEVANTES

Parágrafo único. O disposto neste ar- Destaco que o fato do tipo elencar “partido ou organi-
tigo será tornado efetivo, a qualquer zação de caráter político” como beneficiários necessá-
tempo, pelo órgão competente da rios do ato ilícito não exclui a figura do pré-candidato, do
Justiça Eleitoral, conforme o âmbito candidato escolhido em convenção, das coligações e, até
nacional, regional ou municipal do ór- mesmo, dos partidos políticos em formação desse rol dos
gão infrator mediante representação possíveis favorecidos, já que todos eles são, efetivamen-
fundamentada partidário, ou de qual- te, os grandes atores do processo (pré)eleitoral que po-
quer eleitor. dem se beneficiar com essa conduta criminosa. Até por-
que fica o uso dos bens e serviços a favor de determinado
candidato ou pré-candidato beneficiam, inquestionavel-
mente, o partido, que se capitalizará eleitoralmente.
Esse aspecto revela também outra faceta do delito, qual
seja: a incidência temporal variável.
Assim, pode-se dizer que o tipo incide durante todo e
qualquer ano (não só eleitoral), salvo no caso de uma
conduta específica para beneficiar um candidato, cujo ter-
mo a quo será a escolha em convenção partidária.
É de se destacar também que a melhor interpretação
da expressão “serviço de qualquer repartição” cons-
tante do artigo 377 é no sentido de significar o uso
efetivo de toda estrutura física (móvel/imóvel9) ou
de pessoal da Administração Pública e de entidade
por ela mantida ou subvencionada. Essa linha de ra-
ciocínio é corroborada pelo próprio dispositivo, que, ao
mencionar o uso dos prédios e dependências públicas ou
privadas, usa a expressão “inclusive”, em clara demons-
tração de que o rol é meramente exemplificativo.

9 Nesse sentido, conferir os seguintes precedentes:


I – “Não caracteriza o crime dos arts. 346 c.c. 377, CE, a simples visita dos candidatos à sede da entidade
que recebe subvenção da municipalidade. - Os dispositivos visam coibir o uso efetivo e abusivo de ser-
viços ou dependências de entes públicos ou de entidades mantidas ou subvencionadas pelo poder
público, ou que com este contrata, em benefício de partidos ou organização de caráter político.
Precedentes. - Não se trata de exigir potencialidade do ato, mas o uso efetivo das instalações.”
(TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 25983, Acórdão, Relator(a) Min. José Gerardo Grossi, Publica-
ção: DJ - Diário de justiça, Página 169);
2 – “A mera guarda de petrechos para confecção de material de propaganda eleitoral, sem a com-
provação cabal da utilização das dependências de prédio público, não é suficiente para caracterizar o
crime previsto nos artigos 346 e 377 do Código Eleitoral.” (TRE/PR, PROCESSO n 36544, ACÓR-
DÃO n 53570 de 30/10/2017, Relator(a) NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Publicação: DJ - Diário de justiça,
Data 06/11/2017).

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É importante registrar que, nesse caso, há necessida-
de de comprovação do dolo específico de causar
qualquer espécie de benefício político-partidário,
sob pena de atipicidade do delito eleitoral e con-
sumação de crime comum (via de regra, peculato
– artigo 312, do Código Penal, ou artigo 1°, do De-
creto-Lei n°201/67).
O tipo se consuma a partir do momento em que é utili-
zado qualquer bem, serviço ou agente público a favor de
ações político-partidárias não autorizadas por lei.
Não custa lembrar, por oportuno, que não existe con-
duta insignificante nesse aspecto, já que um dos fun-
damentos desse tipo é a moralidade administrativa, que
não admite qualquer espécie de isenção de pena por “pe-
quena lesão”. Reforçando essa linha de pensamento, des-
taca-se o enunciado nº599, da Súmula do Superior
Tribunal de Justiça (julgado em 27/11/2017), segundo o
qual “o princípio da insignificância é inaplicável aos cri-
mes contra a administração pública”, que deve incidir,
pela coincidência de fundamento10, sobre o caso em tela.

Quase todos os crimes contra a fé pública eleito-


ral seguem a mesma estruturação normativa dos tipos
análogos previstos no Código Penal (à exceção do tipo
CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA previsto no artigo 354 – obtenção de documento falso
ELEITORAL – que não possui correspondente), deles diferindo, po-
(artigos 348 a 352, do Código Eleitoral) rém, apenas pelo fato de trazerem consigo a necessá-
ria finalidade eleitoral na ação delituosa, o que não
significa necessidade de coincidência temporal en-
tre a ação criminosa e o período eleitoral.

10 Vários são os julgados paradigmas sobre o assunto, in verbis:


1 - «[...] Segundo a jurisprudência desta Corte, não se aplica o princípio da insignificância aos crimes cometidos
contra a administração pública, ainda que o valor seja irrisório, porquanto a norma penal busca tutelar não
somente o patrimônio, mas também a moral administrativa. [...]» (AgRg no AREsp 487715 CE, Rel. Ministro
GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 01/09/2015);
2 - “[...] O aresto objurgado alinha-se a entendimento assentado neste Sodalício no sentido de ser incabível
a aplicação do princípio da insignificância aos delitos cometidos contra a Administração Pública, uma vez que
a norma visa a resguardar não apenas a dimensão material, mas, principalmente, a moral administrativa, in-
suscetível de valoração econômica. [...]” (AgRg no AREsp 572572 PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA
TURMA, julgado em 08/03/2016, DJe 16/03/2016).

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Esse é o entendimento da doutrina e da jurisprudência
do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dos Tribunais Re-
gionais Eleitorais (TRE’s):
- “A finalidade eleitoral, para fins do art. 350 do Código
Eleitoral, não exige que o crime seja cometido, neces-
sariamente, durante o período eleitoral, bastando que
ocorra lesão às atividades-fim da Justiça Eleitoral. Não
impossibilita a configuração do crime previsto no art.
350 do Código Eleitoral o fato de a falsidade ser cometi-
da em processo de prestação de contas posterior à data
das eleições. Precedente.” (TSE, Recurso Especial Elei-
toral nº 59536, Acórdão, Relator(a) Min. Gilmar Ferrei-
ra Mendes, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrôni-
co, Tomo 58, Data 24/03/2017, Página 90).
- “Compete à Justiça Eleitoral julgar todo e qual-
quer falso perpetrado em detrimento da auten-
ticidade dos documentos públicos e particulares
relevantes ao seu ofício (CE, art. 350), não deven-
do se limitar a reprimir apenas fraude documental
que tenha por desígnio interferir, efetiva ou poten-
cialmente, no processo de escolha dos candidatos
a determinado cargo eletivo. A finalidade eleitoral
exigida para tipificação do delito não está correla-
cionada, única e exclusivamente, às eleições, mas,
também, “às atividades-fim da Justiça Eleitoral”
(Pedro Roberto Decomain, Comentários ao Códi-
go Eleitoral, São Paulo: Dialética, 2004, fl. 435).
(TRE/SC, PROCESSO CRIME ELEITORAL n 1120854,
ACÓRDÃO n 27752 de 23/10/2012, Relator(a) ELÁ-
DIO TORRET ROCHA, Revisor(a) JULIO GUILHERME
BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Publicação: DJE -
Diário de JE, Tomo 199, Data 29/10/2012, Página 5).

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