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Departamento de Direito

Licenciatura em Direito
Ano letivo 2020/21
Terças: 822 0752 1752

Finanças Públicas

Dinis Abrantes Figueiredo

Prof. José Fernandes Farinha Tavares

Lisboa
Índice
1. Introdução................................................................................................................................4
1.1 Noção e objeto das Finanças Públicas................................................................................4
1.1.1 A etimologia de Finanças Públicas..............................................................................4
1.1.2 Os recursos financeiros e as necessidades públicas.....................................................4
1.1.3 Os recursos tributários em especial e a sua gestão.......................................................4
1.2 Finanças Públicas e Direito................................................................................................5
1.2.1 Distinção entre Orçamento e Finanças.........................................................................5
1.3 Finanças Públicas e Economia...........................................................................................5
1.3.1 Distinção entre Finanças Públicas e Economia............................................................5
1.3.2 Exemplo com a crise económico-financeira de 2008 relativo ao n. 3).........................6
1.3.3 Exemplos com os recursos tributários relativos ao n. 3)..............................................6
1.3.4 Exemplo com a atual crise pandémica relativo ao n. 3)...............................................6
1.4 A atividade financeira pública, o seu enquadramento e relacionamento com outras
atividades públicas...................................................................................................................7
1.4.1 Distinção entre atividade financeira e atividade administrativa...................................7
1.4.2 Distinção das atividades públicas................................................................................7
1.5. Visão global e integrada das Finanças Públicas, nos planos internacional, da União
Europeia, do Estado, das Regiões Autónomas e das Autarquias Locais...................................9
1.6. O regime jurídico-financeiro no estado de exceção. A necessidade de fast-law para
situações emergentes..............................................................................................................10
2. Estrutura da Administração Pública financeira da União Europeia e Portuguesa...................10
2.1. Administração Pública e Setor Público............................................................................10
2.2. Setores, subsetores e instituições financeiras...................................................................11
2.3. Setor Público Administrativo (SPA) e Setor Público Empresarial (SPE)........................11
2.4. A organização do Setor Público e a sua repercussão na consolidação financeira,
orçamental e de contas...........................................................................................................12
3. As finanças públicas europeias, estaduais, regionais e locais.................................................12
3.1. Características fundamentais...........................................................................................13
3.1.1 A breve evolução histórica da União Europeia..........................................................13
3.1.2 A evolução da afiliação dos Estados-membros à União Europeia.............................13
3.1.3 Os órgãos da União Europeia....................................................................................13
3.2. Linhas de integração europeia.........................................................................................13
3.2.1 Zona de Comércio Livre e União Aduaneira.............................................................13
3.2.2 União Financeira.......................................................................................................14
3.2.3 Mercado Comum.......................................................................................................14
3.2.4 União Económica, Monetária e Política....................................................................14

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4. Orçamentos da UE, do Estado, incluindo o da Segurança Social, das Regiões Autónomas, das
Autarquias Locais, das demais entidades do Setor Público Administrativo e das entidades do
Setor Público Empresarial..........................................................................................................15
4.1. Noção de orçamento........................................................................................................15
4.1.1 Distinção entre o orçamento e a conta.......................................................................15
4.2. Orçamento e plano...........................................................................................................15
4.3. Funções do orçamento.....................................................................................................15
4.4. Estrutura orçamental........................................................................................................16
4.5. Regime(s) de preparação, aprovação e execução.............................................................19
4.5.1 Técnicas de elaboração do orçamento.......................................................................19
4.5.2 Sobre-orçamentação e a sub-orçamentação...............................................................19
4.5.3 Orçamento participativo............................................................................................19
4.5.4 Processo orçamental..................................................................................................19
4.6. Alterações orçamentais....................................................................................................20
5. A gestão financeira e orçamental............................................................................................20
5.1. Princípios.........................................................................................................................20
5.2. Regime............................................................................................................................21
5.3. Instrumentos de gestão, incluindo os planos de prevenção de riscos de gestão...............21
5.4. A gestão e a utilização de dinheiros públicos por entes públicos de direito privado e por
entes privados.........................................................................................................................21
5.4.1 Distinção entre dinheiros públicos e dinheiros privados............................................22
5.4.2 Distinção entre dinheiro privado e dinheiro privativo................................................22
6. As contas................................................................................................................................22
6.1 Sistemas de contabilidade.................................................................................................23
6.2 A Conta Geral do Estado..................................................................................................23
7. O controlo das finanças públicas............................................................................................24
7.1. Modalidades de controlo financeiro e orçamental...........................................................24
7.2. O controlo e a jurisdição do Tribunal de Contas em especial..........................................25
7.2.1 As recomendações do Tribunal de Contas.................................................................26
8. As responsabilidades inerentes à gestão e utilização de dinheiros, valores e património
públicos. A responsabilidade financeira em especial..................................................................27
8.1 Fundamentos da responsabilidade....................................................................................27
8.1. Tipos de responsabilidade...............................................................................................27
8.2. A responsabilidade financeira em especial......................................................................27

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O Direito acompanha a vida. O pensamento acompanha a evolução social.

1. Introdução
1.1 Noção e objeto das Finanças Públicas
1.1.1 A etimologia de Finanças Públicas
A origem etimológica da palavra “Finanças” vem do latim “finis” e significa fim. Mas fim de
quê? Fim das transações. Mas como é que termina uma transação? Uma transação termina com
a entrega do produto e com o pagamento do seu preço. Por conseguinte, quando se fala em
finanças, está-se automaticamente a falar de recursos (bens, dinheiro) que põem fim às
transações. Já a palavra “Públicas” sugere que uma determinada coisa pertence a uma
coletividade de pessoas e que está ao acesso de todas elas. Sendo assim, as “Finanças Públicas”
são uma área do saber concernente aos recursos financeiros que pertencem a uma determinada
comunidade, a um Estado, a uma Organização Internacional, a um município, a uma freguesia, a
uma determinada entidade pública. Porém, não se limitam somente a isso.
1.1.2 Os recursos financeiros e as necessidades públicas
A vida em comunidade tem necessidades específicas. O que são necessidades? Uma
necessidade é uma situação de carência que é necessário ser satisfeita. Tem de ser satisfeita por
quem? Depende. Há necessidades individuais que podem e devem ser providas pelos próprios
indivíduos, mas também há necessidades públicas, como por exemplo a saúde, a segurança, a
justiça, a construção de infraestruturas, a educação e formação, o bem-estar, a agricultura, o
ordenamento do território, a investigação, etc. Estas últimas têm de ser satisfeitas, não pelo
indivíduo individualmente observado, mas sim pelo Estado e pelas entidades infraestaduais
públicas com a contribuição dos indivíduos habitantes no território que àquele diz respeito.
 Uma comunidade necessita de ter recursos para satisfazer as necessidades públicas. Mas que
recursos são esses que podem ser obtidos?
Podem ser recursos tributários, ou seja impostos e taxas (IRS, IRC, IVA, etc.). Os cidadãos
devem pagar impostos para serem realizadas as despesas com vista a satisfazer as necessidades
públicas. Para além dos recursos tributários, pode haver recursos patrimoniais, ou seja, uma
comunidade pode ter património que possa dar rendimento (arrendamento de prédios, etc.).
Quando os recursos obtidos de um determinado Estado não são suficientes para suportar as
despesas, há um problema de défice (: situação em que os recursos são inferiores às despesas).
Quando tal caso se verifica, das duas uma: Ou aumentam-se as receitas ou reduzem-se as
despesas para que haja uma situação de equilíbrio. Outra possibilidade é recorrer a empréstimos
(obtenção de recursos creditícios) para enfrentar a situação de desequilíbrio. É isso que fazem
muitas vezes os Estados (Banca, Organizações Internacionais (FMI), Banco Mundial, etc.).
Conclusão: As Finanças Públicas traduzem-se numa área do saber, numa ciência, que visa
estudar o modo de obtenção de recursos tributários, patrimoniais ou creditícios (Receita) e a sua
afetação à realização de despesas (Despesa) para satisfazer as necessidades públicas.
1.1.3 Os recursos tributários em especial e a sua gestão
Nos países subdesenvolvidos há uma tendência, cultural, para se fugir ao pagamento de
impostos até porque a própria Administração Pública não está devidamente organizada. Nos
países mais desenvolvidos, por sua vez, mais pessoas pagam mais impostos, apesar de também
haver um número significativo de pessoas que não o faz. Porém, poderá afirmar-se que com o
desenvolvimento de um país, torna-se mais difícil fugir ao pagamento de impostos, não só por
se aperfeiçoarem os mecanismos tributários, mas também porque as pessoas mudam a sua
maneira de pensar e interiorizam que se querem ter, por exemplo, serviços hospitalares baratos
ou mesmo grátis, têm que contribuir para o efeito e o indivíduo que não contribui para tal efeito
provocará uma situação de rutura para com a sociedade, demonstrando um comportamento
antiético, antissocial, condenável. Resumidamente e literalmente viverá à custa dos outros.

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Em contrapartida, quem paga impostos também tem direito em fazer algumas exigências:
- Se uma pessoa entrega parte do seu rendimento para realizar despesas públicas de modo a
satisfazer necessidades coletivas, terá o direito de exigir que quem dirige as Finanças Públicas e
exerce a atividade administrativa e financeira terá de o fazer de forma digna, pois estará a gerir
o que é de outrem e que poderia ser utilizado para outros fins senão públicos.
- Se uma pessoa entrega parte do seu rendimento para realizar despesas públicas de modo a
satisfazer necessidades coletivas, terá de exigir que tenha acesso aos bens e serviços que o
Estado produzirá com esses dinheiros que se tornam públicos.
Quando se fala da obtenção de recursos para a realização de despesas com vista à satisfação de
necessidades públicas, nas entidades públicas há quem seja responsável pela definição e tomada
de decisões, nomeadamente a Assembleia da República, o órgão representativo dos cidadãos. É
também a Assembleia, por exemplo, que aprova o Orçamento de Estado. Muitas revoluções que
eclodiram na nossa História, ocorreram devido à cobrança ilegítima de impostos, como por
exemplo a Revolução Americana (“no taxation without representation”). Isto porque o imposto
é uma medida que se dirige aos cidadãos e os obriga coercivamente a entregar parte do seu
rendimento em nome da coletividade para satisfazer necessidades públicas. Por conseguinte, os
cidadãos devem indignar-se, manifestar-se contra os seus representantes e exigir-lhes que ajam
não em nome do interesse público, mas conforme o interesse público.
Os impostos são um exemplo de relação jurídica que consiste num acordo, protegido pelo
Direito, entre duas ou mais pessoas perante um objeto, um facto e uma garantia. A relação tem a
ver com uma situação de interdependência. E assim o é quando se fala em ética que é o conjunto
de valores e de princípios que são construídos e aceites por uma sociedade. Também existe a
ética nas Finanças que é o consentimento de todos os cidadãos em pagar impostos e
naturalmente obter a devida contrapartida.

1.2 Finanças Públicas e Direito


As Finanças Públicas são reguladas juridicamente pelo Direito Financeiro, ou seja, por um
conjunto de normas jurídicas que regulam a obtenção de recursos (cobrança de impostos,
cobrança de rendas, contração de empréstimos) e a realização de despesas a fim de satisfazer as
necessidades públicas. O Direito Financeiro é como se fosse o filho do Direito Administrativo
que, por sua vez, regula a Administração Pública. Para além destes ramos de Direito, existe
também o Direito Fiscal que regula especificamente os impostos e que é uma pormenorização
do Direito Financeiro.
1.2.1 Distinção entre Orçamento e Finanças
O Orçamento é um instrumento de gestão que faz parte das Finanças Públicas e que faz uma
previsão/estimativa/cálculo das receitas que uma entidade, quer pública quer privada, vai obter e
das despesas que vai realizar para um determinado período de tempo. Em conjunto com um
Orçamento, normalmente faz-se um Plano de Atividades que enumera as atividades em que os
recursos obtidos pela atividade administrativa e financeira serão gastos com vista à satisfação de
necessidades públicas. Mas as Finanças Públicas abrangem mais realidades do que o
Orçamento, pois também englobam as Contas realizadas ao fim de cada ano com base no
Orçamento para verificar se existe um excedente ou um défice, o Património Público, quer
disponível (que se pode vender ou alienar), quer indisponível (que não se pode vender ou
alienar), a Tesouraria do Estado, a própria Atividade Financeira e outras realidades.
Tudo o que é orçamental é financeiro. Mas nem tudo o que é financeiro é orçamental.

1.3 Finanças Públicas e Economia


1.3.1 Distinção entre Finanças Públicas e Economia
As Finanças Públicas e a Economia são realidades interligadas, mas distintas uma da outra:
-» As Finanças Públicas são uma ciência que tem como objeto a obtenção de recursos para

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afetar à realização das despesas públicas que servem para satisfazer necessidades coletivas.
-» A Economia é uma ciência que tem como objeto a produção de bens e serviços, a sua
comercialização e o seu consumo, preocupando-se com o equilíbrio dos vários setores
económicos (primário (: agricultura e pesca), secundário (: indústria) e terciário (: serviços e
comércio)).
O que interliga a Economia e as Finanças Públicas é a tributação que se aplica às empresas de
modo a obter recursos para realizar despesas com vista a satisfazer as necessidades públicas.
1) Os Estados podem ser um agente económico (produtor, comercializador, consumidor). O
grau de produção e de consumo depende já de decisões ideológicas que delineiam a forma
económica do Estado.
2) Os Estados podem ter um setor público maior ou menor, dependendo de decisões políticas.
Um Estado que nacionaliza todas as empresas que existem tem um setor público maior do que
um Estado que privatiza todas as empresas que possui.
3) Os Estados podem condicionar, restringindo ou ampliando, o raio de ação da economia.
1.3.2 Exemplo com a crise económico-financeira de 2008 relativo ao n. 3)
Como consequência da crise financeira de 2007-2008, o sistema financeiro/bancário faliu. Esta
crise foi uma crise tão grande que os Estados tiveram que recorrer à austeridade (Sparpolitik) e
a mecanismos de apoio internacional (FMI, UE) para enfrentá-la. Como não tinha recursos
financeiros públicos, o Estado por um lado fechou a torneira do consumo para que se poupasse,
evitando que se criasse despesa, e por outro lado recorreu à ajuda do FMI para lhe conceder
empréstimos que obviamente teriam de ser pagos, mais tarde ou mais cedo. Ou seja, devido à
crise, muitas empresas tiveram de fechar por deixarem de ter procura pelos seus bens e serviços,
diminuindo o rendimento dos empregadores. Por conseguinte, as empresas tiveram de despedir
os seus empregados, aumentando o desemprego e aumentando deste modo a despesa pública
pelo pagamento de subsídios de desemprego.
1.3.3 Exemplos com os recursos tributários relativos ao n. 3)
- Se o Estado aumenta os impostos, as pessoas têm menos rendimento disponível. Tendo menos
rendimento disponível as pessoas optam por consumir menos e as empresas não precisam de
produzir tanto nem precisam de empregados, aumentando desta forma o desemprego e por
conseguinte as despesas da Segurança Social. Mas aumentando os impostos, aumenta-se a
receita que poderá ser suficiente para suportar as despesas da Segurança Social e, deste modo,
evitar situações de défice.
- Se o Estado baixa os impostos, o rendimento disponível das pessoas aumenta, o seu consumo
dispara, as empresas crescem, o desemprego reduz e as pensões sociais e os subsídios de
desemprego baixam, o que significa que apesar de se baixarem os impostos, diminuindo-se as
receitas, pode-se evitar uma situação de défice devido à descida das despesas da Segurança
Social.
1.3.4 Exemplo com a atual crise pandémica relativo ao n. 3)
Começou por ser uma crise sanitária que fez com que surgisse uma crise económica, pois
obrigou alguns setores da economia a parar, e essa crise económica provocou uma crise
financeira, pois o Estado obteve menos recursos e viu-se obrigado a realizar despesas de modo a
amortecer os problemas provenientes das crises. Neste âmbito, o Presidente da República
promulgou três diplomas aprovados pela Assembleia da República de aumento de apoios
sociais. Estes apoios são recursos financeiros, obtidos através de impostos, rendas e créditos,
que pretendem ser utilizados para evitar que as empresas fechem devido à crise económica.
Estas deverão ser auxiliadas pelo Estado através de instrumentos financeiros como o lay-off,
pagando este parte dos salários das empresas para que os empregados não percam o seu
emprego, aumentando as despesas públicas. Resumindo e concluindo, as Finanças Públicas
estão a oxigenar a Economia.

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1.4 A atividade financeira pública, o seu enquadramento e relacionamento
com outras atividades públicas
Como se pôde observar, as Finanças Públicas são uma ciência que tem como objetivo a
obtenção de recursos para a realização de despesas com vista à satisfação das necessidades
públicas. Deste modo, para que se possam realizar despesas é necessário obter recursos, planear
a satisfação das necessidades públicas e haver uma atividade que realize, com os recursos
obtidos, despesas destinadas a satisfazer necessidades públicas. Estes recursos são obtidos por
intermédio das entidades públicas, ou melhor dizendo, por intermédio da Administração
Pública.
1.4.1 Distinção entre atividade financeira e atividade administrativa
-» À atividade de obtenção de recursos tributários, patrimoniais ou creditícios e a sua afetação à
realização de despesas para satisfazer necessidades públicas, denomina-se atividade financeira.
-» A atividade financeira está interligada com a atividade administrativa, ou seja, com a
atividade de gestão ou de administração.
 As duas atividades, apesar de interligadas, são diferentes uma da outra: Enquanto que a
atividade financeira só é possível ser desenvolvida com recursos, a atividade administrativa
pode ser desenvolvida sem a necessidade de recursos.
-» Exemplo: O Estado considera que é necessário construir mais um hospital em Lisboa.
Para isso, tem-se por um lado de verificar o local da construção e por outro se há recursos para
tal. O ato de decisão da construção do hospital e o local da mesma é uma atividade
administrativa, enquanto que o ato de verificação da existência de recursos para a construção
do hospital é uma atividade financeira. Sendo observados todos estes aspetos, começam os
trabalhos de construção do hospital. Normalmente o Estado não tem meios de construção e, por
conseguinte, este celebra um contrato de empreitada de construção do hospital com um privado,
traduzindo-se numa atividade administrativa. Contudo, este contrato tem uma dimensão
financeira, pois o Estado tem de pagar as várias prestações relativas à construção do hospital de
acordo com o contrato celebrado, traduzindo-se numa atividade financeira. Deste modo,
conclui-se que as duas atividades são distintas, mas intrinsecamente interligadas, ambas
subordinadas à Lei.
1.4.2 Distinção das atividades públicas
Poder-se-á fazer uma distinção entre as diversas atividades públicas, tendo como auxílio os
seguintes quatro critérios (veja-se também “As funções e atividades do Estado e demais
entidades públicas”):
Critério orgânico (órgão da atividade)
- Função política (stricto sensu): Atos políticos são praticados por órgãos políticos.
- Função legislativa: Atos legislativos são praticados por órgãos legislativos.
- Função administrativa: Atos administrativos são praticados por órgãos administrativos.
- Função financeira: Atos financeiros são praticados por órgãos financeiros.
- Função jurisdicional: Atos jurisdicionais são praticados por órgãos jurisdicionais.
- Função de controlo: Atos de controlo são praticados por órgãos de controlo.
Contudo, esta distinção é insuficiente, pois existem órgãos com várias funções, o que torna a
distinção um pouco mais complexa do que até aqui foi demonstrada.
-» Exemplo: O Governo pode ser um órgão político (197º CRP), legislativo (198º CRP) e
administrativo (199º CRP). A Assembleia da República é um órgão político, legislativo (161º
CRP) e de controlo (162º CRP) por excelência e, acessoriamente, administrativo. O Tribunal de
Contas é um órgão jurisdicional e de controlo por excelência e, acessoriamente, administrativo.
 O critério orgânico é necessário e útil, mas não é suficiente.

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Critério formal (forma (: modo como o ato se exterioriza) da atividade)
Quando a Assembleia da República, exercendo a sua função legislativa, aprova uma lei, poder-
se-á presumir que a lei é um ato legislativo. Ou quando o Governo, exercendo a sua função
legislativa, faz um decreto-lei, poder-se-á igualmente presumir que o decreto-lei é um ato
legislativo. Mas há que se ter cuidado ótimo, pois pode ter sido dado indevidamente o nome de
lei ou decreto-lei a um ato que na realidade não é legislativo, mas reveste outro tipo de forma.
Há, por conseguinte, formas de atos que podem ser utilizadas em vários tipos de atos:
-» Exemplo 1: Há uns anos atrás, existiu uma lei que previa que os atos administrativos com
a forma de decreto-lei não podiam ser impugnados nos tribunais. Ora houve casos em que o
Governo atribuiu aos seus atos a forma de decreto-lei de modo a evitar que fossem impugnados
nos tribunais…
-» Exemplo 2: A resolução do Conselho de Ministros tanto pode ser um ato político, como
um ato administrativo, como um regulamento.
- Ato político (stricto sensu): Estratégia nacional contra a corrupção
- Ato administrativo: Nomeação de pessoas para cargos públicos
- Regulamento: Norma que estabelece a obrigatoriedade da existência de páginas web
para todas as entidades públicas
 O critério da forma é importante, mas muito enganador e também insuficiente.
Critério material (conteúdo da atividade)
- Os atos políticos (stricto sensu) são aqueles cujo conteúdo é a definição de valores, linhas de
orientação, opções fundamentais do Estado que não se traduzem em normas jurídicas.
-» Exemplo: A dissolução da Assembleia da República, a convocação de eleições e a
nomeação de André Ventura para Primeiro-Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais,
por parte do Presidente da República é um ato político, pois traduz-me numa opção política.
- Os atos legislativos são aqueles cujo conteúdo é a definição de opções e valores fundamentais
da comunidade que se traduzem em normas jurídicas.
-» Exemplo: A Assembleia da República aprova a lei sobre a morte medicamente assistida.
- Os atos administrativos são aqueles que visam satisfazer necessidades públicas. Neste âmbito
não são definidos opções ou valores fundamentais do Estado, mas sim opções e linhas de
orientação de administração.
-» Exemplo: A decisão por parte do Governo de construir mais uma ponte é um ato
administrativo, pois traduz opções com vista a satisfazer necessidades públicas.
- Os atos financeiros são aqueles que realizam despesas, utilizando recursos obtidos, com vista à
satisfação de necessidades públicas. A atividade financeira desempenha um papel de suporte às
demais atividades públicas, fazendo face aos custos que emanam dos respetivos exercícios.
- Os atos jurisdicionais são aqueles que são independentes e imparciais e que visam dirimir
conflitos, aplicando o Direito e de acordo com o Direito.
- Os atos de controlo são aqueles que visam assegurar/ fiscalizar/ controlar o exercício das
atividades públicas.
Critério do grau de vinculação à ordem jurídica
- As atividades política (stricto sensu) e legislativa são atividades relativamente livres. Não há
nenhuma lei que oriente tais atividades, tendo estas apenas como limite principal a Constituição.
Por conseguinte, não podem ser impugnadas pelos tribunais, pois tal violaria o princípio da
separação de poderes.
-» Exemplo: Não existe nenhuma lei que estabeleça os requisitos que tenham de se reunir
para se poder ir para o Panteão Nacional. São os órgãos políticos que, interpretando o sentido da
comunidade, consideram que o cidadão X merece ser homenageado, transladando os seus restos
mortais para o Panteão Nacional. Os tribunais nunca poderiam impugnar esta decisão.
 Atenção: Tudo que é livre, é mais frágil. Logo, tal implica uma maior ponderação/ reflexão!

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- As atividades administrativas, financeiras, jurisdicionais e de controlo são atividades que estão
subordinadas à Ordem Jurídica, podendo ser impugnadas pelos tribunais.
Conclusão
- A atividade política (stricto sensu) é uma atividade pública praticada por órgãos políticos,
que não tem uma forma especial (a não ser que a lei o preveja), que se traduz na definição de
opções e valores fundamentais do Estado (que não se traduzem em normas jurídicas) e que é
relativamente livre, estando essencialmente subordinada à Constituição.
- A atividade legislativa é uma atividade pública praticada por órgãos legislativos, que não tem
uma forma especial (a não ser que a lei o preveja), que se traduz na definição de opções e
valores fundamentais do Estado (que se traduzem em normas jurídicas) e que é relativamente
livre, estando essencialmente subordinada à Constituição.
- A atividade administrativa é uma atividade pública praticada por órgãos administrativos, que
não tem uma forma especial (a não ser que a lei o preveja), que visa satisfazer necessidades
públicas e que está subordinada à Ordem Jurídica.
- A atividade financeira é uma atividade pública praticada por órgãos financeiros, que não tem
uma forma especial (a não ser que a lei o preveja), que visa realizar despesas, utilizando
recursos, para satisfazer necessidades públicas e que está subordinada à Ordem Jurídica.
- A atividade jurisdicional é uma atividade pública praticada por órgãos jurisdicionais que visa
dirimir conflitos e que está subordinada à Ordem Jurídica.
- A atividade de controlo é uma atividade pública praticada por órgãos de controlo que visa
fiscalizar uma determinada atividade e que está subordinada à Ordem Jurídica.

1.5. Visão global e integrada das Finanças Públicas, nos planos


internacional, da União Europeia, do Estado, das Regiões Autónomas e das
Autarquias Locais
Hoje é impossível compreender as Finanças Públicas sem se ter uma visão global e integrada.
Ou seja, os recursos públicos relativamente aos quais as Finanças Públicas incidem podem ser
vistos:
… no plano mundial/internacional: No plano internacional, existem fluxos financeiros entre as
várias Organizações Internacionais, tais como a OMS (Organização Mundial de Saúde), o FMI
(Fundo Monetário Internacional), o Banco Mundial e a ONU (Organização das Nações Unidas)
e os Estados.
… no plano europeu/da União Europeia: No plano europeu, existem fluxos financeiros entre a
União Europeia e os seus Estados-membros.
… no plano nacional: No plano nacional, fala-se das receitas, despesas e património do Estado,
mas também do plano das Regiões Autónomas que têm um regime financeiro próprio mas com

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ligações ao Estado.
… no plano regional: No plano regional, podem existir fluxos financeiros entre as duas Regiões
Autónomas da Madeira e dos Açores.
… no plano local: No plano local, existem fluxos financeiros entre o Estado e os seus
municípios e freguesias e entre as Regiões Autónomas e os seus municípios e freguesias.

1.6. O regime jurídico-financeiro no estado de exceção. A necessidade de


fast-law para situações emergentes
Nos termos dos artigos 19º, 134º alínea d) e 138º n. 1 da CRP, o Presidente da República, após
autorização da Assembleia da República e audição do Governo, decretou o estado de
emergência em 18 de Março de 2020. Esse estado de emergência, provocado pela pandemia
COVID-19, implicou que fossem rapidamente aprovadas leis que fizessem face à situação
sanitária, económica e financeira e que entrassem numa vigência temporária enquanto não se
regressasse ao estado de normalidade, a denominada fast-law. Houve assim leis que foram
aprovadas em Março de 2020 que num curto período de tempo foram alteradas sucessivamente,
o que não é normal se de uma lei normal se tratasse. Deduz-se então que em situações de crise é
necessário haver também um regime jurídico-financeiro de crise. Esse regime jurídico-
financeiro caracteriza-se pela necessidade de obtenção de recursos acrescidamente devido ao
crescimento das necessidades, e por conseguinte, das despesas (ex. saúde, empresas, Segurança
Social). Deste modo, é natural que depois de uma crise se verifiquem situações de défice
público (: insuficiência de recursos para realizar despesas com vista a satisfazer as necessidades
públicas) e de crescimento da dívida pública. É por isso que existe um Plano de Recuperação e
Resiliência no âmbito da União Europeia (veja-se também “O regime jurídico-financeiro no
estado de exceção - A necessidade de fast-law para situações emergentes”).
 Metáfora: Quando nós estamos seriamente doentes, vamos ao hospital para que nos possam
curar e, para isso, será necessário gastar recursos para atender às necessidades que teremos ao
longo do período de cura e recuperação. No fim, quando estivermos curados, poderemos
verificar que teremos um défice nas nossas contas, pois enquanto estivemos no hospital tivemos
que realizar elevadas despesas em prol do nosso bem-estar e não pudemos ir trabalhar…

2. Estrutura da Administração Pública financeira da União Europeia e


Portuguesa
Neste segundo ponto ir-se-á responder à pergunta: “Como é que a Administração Pública está
organizada?” Para tal, observar-se-á não só o plano nacional, mas também o plano europeu, uma
vez que Portugal é um Estado-membro da União Europeia e que, por conseguinte, a
generalidade dos organismos da Administração Pública Portuguesa tem ligações com os
organismos da Administração da União Europeia. Deste modo, ter-se-á em conta a visão global
e integrada que se deve ter quando se pretende
compreender as Finanças Públicas.

2.1. Administração Pública e Setor Público


A atividade administrativa e financeira é uma atividade
desenvolvida pelo Setor Público Português ou pela
Administração Pública que pode perspetivar-se em
várias dimensões: a Administração Estadual (Estado), a
Administração Regional Autónoma (Regiões
Autónomas), a Administração Local Autárquica
(autarquias locais) e as entidades administrativas
independentes (veja-se também “Estrutura do setor
público português”).

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2.2. Setores, subsetores e instituições financeiras
- Administração Estadual: O Estado pode administrar as necessidades nacionais diretamente,
através dos Ministérios, indiretamente, através de institutos públicos e empresas públicas, ou
autonomamente, através de associações públicas, como por exemplo as ordens profissionais.
-» Exemplo: Uma necessidade de âmbito nacional é por exemplo as ligações referentes às
comunicações e transporte entre Portugal Continental e as Regiões Autónomas.
- Administração Regional Autónoma: Já as Regiões Autónomas podem administrar as
necessidades regionais diretamente, através das Secretarias Regionais, indiretamente, através de
institutos públicos e empresas públicas regionais, ou autonomamente, através de associações
públicas.
-» Exemplo: Uma necessidade de âmbito regional é por exemplo as ligações referentes às
comunicações e transporte entre as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
- Administração Local Autárquica: Do mesmo modo, as autarquias locais podem administrar
as necessidades municipais diretamente, através dos seus serviços locais, indiretamente, através
de serviços municipalizados e empresas municipais, ou autonomamente, através de associações
públicas.
-» Exemplo: Uma necessidade de âmbito local é por exemplo as ligações referentes às
comunicações e transporte entre as freguesias de um determinado município.
- Portanto, a Administração Pública é composta por milhares de entidades/ pessoas coletivas
públicas que visam o exercício da atividade administrativa e financeira para satisfazer as
necessidades públicas (ex. Estado, Regiões Autónomas, autarquias locais (municípios e
freguesias), institutos públicos, empresas públicas, associações, fundações, etc.).

2.3. Setor Público Administrativo (SPA) e Setor Público Empresarial (SPE)


Quando se fala em Administração Financeira Pública, e se incluirmos a União Europeia à
realidade portuguesa, ter-se-á de fazer uma distinção entre o Setor Público Administrativo e o
Setor Público Empresarial, porque este não se rege exatamente pelos mesmos parâmetros
daquele. O Setor Público Administrativo é composto por entidades/ pessoas coletivas públicas
que desenvolvem a atividade financeira sem fins lucrativos (União Europeia, Estado, Regiões
Autónomas, Municípios e Freguesias), enquanto que o Setor Público Empresarial é constituído
por empresas públicas que desenvolvem a atividade económica com fins lucrativos (Caixa Geral
de Depósitos, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, TAP) - (veja-se também “Quadro estrutural
da Administração Financeira Pública (União Europeia e Portugal)”).
Atividades que são exercidas no plano das Finanças Públicas pelas entidades do SPA:
- Autoridade financeira/orçamental: Os recursos financeiros são obtidos principalmente
através dos impostos. Estes só podem, em termos do artigo 103º, n. 2 da CRP, ser criados por
lei, ou seja, só podem ser criados pelos representantes dos cidadãos, no exercício das suas
funções, reunidos em Assembleia (tenha-se em consideração a questão referente à revolução
liberal dos Estados Unidos da América: “no taxation without representation”). Para além disso,
são também os Parlamentos que discutem a repartição dos recursos públicos e que aprovam os
Orçamentos do Estado e a Conta Geral do Estado. Ou seja, quem tem autoridade
financeira/orçamental são os órgãos legislativos, representativos dos cidadãos.
- Função de administração: É aos órgãos administrativos a quem cabe prestar contas da sua
administração, pois são os Governos que elaboram o Orçamento do Estado e gerem, após aquele
ser aprovado pela Assembleia da República, os recursos públicos tributários, patrimoniais e
creditícios para realizar despesas públicas de modo a satisfazer as necessidades públicas.
- Controlo interno: Quem administra ou gere, deve ter junto de si um órgão de controlo interno
que tem como objetivo fiscalizar se os recursos são legalmente obtidos e afetados à satisfação
das necessidades públicas, sendo este órgão todavia dependente do órgão administrativo.

11
- Controlo externo e independente: Para além do controlo interno, dependente do
administrador, existe o controlo externo, independente e imparcial, que informa os Parlamentos
e os cidadãos e fiscaliza se os recursos públicos são legalmente obtidos e gastos pelo órgão
administrativo, sendo tal controlo atribuído aos Tribunais de Contas, órgão este previsto na
Constituição, nomeadamente nos artigos 209º, alínea c) e 214º da CRP.

2
.
4
.

A organização do Setor Público e a sua repercussão na consolidação


financeira, orçamental e de contas
Uma boa organização é, segundo o Professor José Tavares, metade dos objetivos cumpridos e,
em termos financeiros, tal tem efeitos positivos.
Imagine-se uma entidade pública como um município. Como já se verificou, o município pode
administrar as necessidades públicas diretamente através dos seus serviços locais, mas também
indiretamente, criando empresas municipais. Essas “empresas satélite do município” ficam
assim incumbidas de satisfazer as necessidades públicas locais.
Quer o município quer as empresas municipais têm receitas e despesas, orçamentos e contas
próprios, como se de uma verdadeira família se tratasse (mãe: município; filhos: empresas).
Sendo assim, um grupo de empresas municipais pode dar um prejuízo tão grande ao município
(lato sensu) que desestabiliza o seu sistema financeiro, o que pode não ser evidente à primeira
vista. Ou seja, para se saber a verdadeira situação do município, englobando as empresas
municipais, tem de se agregar as contas (receitas e despesas) quer do município quer das
empresas municipais, elaborando uma conta consolidada orçamental e de contas.

Empresa municipal Empresa municipal

Empresa municipal Município Empresa municipal

Empresa municipal Empresa municipal

Para se fazer a consolidação de contas correta e uma globalização enquadrada por padrões
uniformes, é necessário que o sistema contabilístico seja o mesmo, existindo normas
internacionais de contabilidade, que se designam por IPSAS (International Public Sector
Accounting Standards) e de auditoria, as ISA (International Standards on Auditing).

3. As finanças públicas europeias, estaduais, regionais e locais


Como já se pôde deduzir, vive-se hoje num mundo altamente interligado. No plano europeu,
verifica-se que existem fluxos financeiros entre a União Europeia e os Estados, entre o Estado
Português e as Regiões Autónomas, entre o Estado e os municípios, entre as Regiões

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Autónomas e os seus municípios, e assim por diante, sempre de acordo com as necessidades que
as entidades do Setor Público Administrativo que estão em causa têm de satisfazer.

3.1. Características fundamentais


3.1.1 A breve evolução histórica da União Europeia
Aquilo que é hoje a União Europeia é fruto de um longo processo de aproximação e cooperação
entre os Estados europeus e de uma longa evolução composta por várias etapas que foram sendo
levadas paulatinamente a cabo. Quando, no âmbito da celebração do Tratado de Paz de
Vestefália, lhes foi reconhecida a soberania aos Estados, estes não estavam dispostos a sacrificar
uma parcela dela para a criação de uma ordem internacional que consagrasse uma cooperação
mútua e coletiva entre os diversos Estados. Foi principalmente após as I e II Guerras Mundiais
que os Estados europeus, observando os graves níveis de destruição no velho continente,
decidiram juntar-se para erguê-lo das cinzas, começando também a surgir as primeiras
organizações internacionais. É então que se verifica a criação em 1951 da Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço (CECA). Em 1957 foram criadas mais duas comunidades: a
Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA) e a Comunidade Económica Europeia
(CEE). A Comunidade Económica Europeia evoluiu posteriormente para a Comunidade
Europeia (CE) nos anos 80, tornando-se a partir dos anos 90 a atual União Europeia.
3.1.2 A evolução da afiliação dos Estados-membros à União Europeia
Os 6 Estados fundadores das três Comunidades Europeias foram a França, a República Federal
da Alemanha, a Bélgica, a Holanda, o Luxemburgo e a Itália. Em 1973, entraram a Dinamarca,
a Irlanda e o Reino Unido na sequência dos Tratados de Adesão de 1972. Posteriormente, os 9
Estados passaram a 10 com a Grécia em 1981, em 1986 a 12 com Portugal e Espanha, em 1995
a 15 com a Áustria, a Finlândia e a Suécia, em 2004 a 26, em 2007 a 28 e, recentemente com a
saída do Reino Unido, passaram a 27.
3.1.3 Os órgãos da União Europeia
Os órgãos principais da União Europeia, tal e qual como se conhece hoje, distinguem-se uns dos
outros quanto à respetiva dimensão, composição e estatuto, a cada um deles cabendo-lhes
distintas competências. São eles:
- Parlamento Europeu
- Conselho Europeu
- Conselho
- Comissão Europeia
- Tribunal de Justiça da União Europeia
- Tribunal de Contas Europeu
- Banco Central Europeu

3.2. Linhas de integração europeia


O desenvolvimento da atual União Europeia, composto por diversas fases de integração, foi
acompanhado por uma evolução nas Finanças Públicas das Comunidades Europeias (veja-se
também “Linhas de Evolução das Finanças Públicas Europeias”).
3.2.1 Zona de Comércio Livre e União Aduaneira
No início, as três Comunidades Europeias eram uma Zona de Comércio Livre e uma União
Aduaneira, onde os bens e serviços circulavam livremente dentro do território por elas
abrangente e onde existia uma taxa aduaneira comum relativamente a países terceiros. Para
além disso, as três comunidades europeias eram organizações internacionais
intergovernamentais que, com a exceção da CECA cujas receitas provinham de produtos das
indústrias de carvão e siderúrgicas, não possuíam receitas próprias, financiando-se através das
contribuições de cada Estado-membro que eram destinadas, por um lado, ao seu funcionamento
e, por outro lado, à união dos Estados para reconstruir a Europa. No que respeita à estrutura

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orgânica, a Assembleia, composta por delegados designados pelos Parlamentos dos Estados-
membros, não tinha funções de autoridade financeira/orçamental, incumbindo-se dessa função o
Conselho, órgão executivo de administração/gestão. No final dos anos 60, as Comunidades
Europeias começam a ter a necessidade de ter meios/recursos próprios suficientes para
satisfazer as suas necessidades comuns, indo mais além das simples contribuições pagas pelos
Estados-membros.
3.2.2 União Financeira
Logo no início dos anos 70, as Comunidades Europeias passaram então a ter, como assim se
pretendia, recursos próprios através, entre outras coisas, da percentagem do Imposto sobre o
Valor Acrescentado (IVA) e de impostos próprios das Comunidades, começando os cidadãos
dos Estados-membros a sentir-se verdadeiros contribuintes europeus. A obtenção de recursos
próprios levou a que fosse necessário elaborar um orçamento próprio das Comunidades, como
se de um Estado ou de uma entidade infraestadual se tratassem. Com uma obtenção de receitas
próprias e a elaboração de um orçamento próprio, seria possível realizar uma atividade
financeira própria, financiando projetos com vista a satisfazer necessidades comuns no âmbito
das Comunidades Europeias. Como passou a existir um orçamento próprio, também deveria
existir, por um lado, um órgão externo e independente que fiscalizasse a obtenção e a aplicação
dos dinheiros públicos das Comunidades Europeias, criando-se em 1975 o Tribunal de Contas
Europeu e, por outro lado, um órgão representativo dos cidadãos europeus que aprovasse o
orçamento (recorde-se do lema “no taxation without representation”) e que fosse eleito, tendo a
primeira eleição ocorrido em 1979, passando a ser a autoridade financeira/orçamental o
Parlamento Europeu. É com estes passos que se estabelece paulatinamente uma União
Financeira entre os Estados no âmbito das Comunidades Europeias.
3.2.3 Mercado Comum
Em 1986 foi assinado o Ato Único Europeu que previu que, a partir de 1993, se entrasse num
Mercado Comum que se caracteriza pela livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais,
como se as Comunidades Europeias de um verdadeiro país se tratassem.
3.2.4 União Económica, Monetária e Política
Em 1992, foi assinado o Tratado de Maastricht que constituiu um novo passo na integração
europeia, depois da constituição do Mercado Comum, abrindo portas à União Económica,
Monetária e Política. No âmbito da União Económica e Monetária, foi instituído em 1998 o
euro como moeda única que só passou a circular em 2002. Todavia, como esta só seria
consagrável se todos os países tivessem o mesmo nível de desenvolvimento, ainda existem hoje
alguns Estados que não lhe aderiram por não terem chegado ao nível de desenvolvimento dos
demais ou porque simplesmente não o querem fazer. Já no âmbito da União Política, foi
assinado o Tratado de Lisboa em 2008 que reforçou as políticas comuns, mais precisamente na
área da defesa, dos negócios estrangeiros e da justiça.
Com esta evolução ao longo dos anos, as receitas próprias da União Europeia foram sendo
aprofundadas, sendo hoje as seguintes:

- Recursos próprios tradicionais (direitos aduaneiros cobrados às


importações e encargos de produção sobre o açúcar) – (12%)
Receitas da
- Recursos próprios calculados com base no IVA – (11%)
União Europeia
- Recursos próprios derivados do Rendimento Nacional Bruto – (71%)
- Outras receitas – (6%)

No que toca às despesas, a União Europeia realiza-as recorrendo às suas receitas próprias de

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modo a satisfazer necessidades no plano mundial, europeu, nacional, regional e local (ex.
agricultura, ambiente, segurança, transportes, comunicações, etc.)

4. Orçamentos da UE, do Estado, incluindo o da Segurança Social, das


Regiões Autónomas, das Autarquias Locais, das demais entidades do
Setor Público Administrativo e das entidades do Setor Público
Empresarial
4.1. Noção de orçamento
O orçamento é um instrumento de gestão que faz parte das Finanças Públicas e que faz uma
previsão das receitas que uma entidade, quer pública quer privada, vai obter e das despesas que
vai realizar para um determinado período de tempo (veja-se também “Orçamento DJAP 2006”).
Os orçamentos públicos, ou seja, os orçamentos das entidades do Setor Público Administrativo
(União Europeia, Estado, Regiões Autónomas, municípios, freguesias) e do Setor Público
Empresarial (empresas públicas, institutos públicos, etc.) são, relativamente à noção geral de
orçamento, mais específicos:
 O orçamento público não é só uma previsão, mas também uma autorização por parte da
autoridade financeira para que o órgão administrativo possa cobrar receitas e realizar despesas.
4.1.1 Distinção entre o orçamento e a conta
O orçamento é aprovado pela autoridade financeira/orçamental para o ano ulterior. No dia 1 de
Janeiro desse ano, as entidades administrativas começam a obter recursos através dos impostos
e das rendas do património, ou recorrendo a créditos, e a realizar despesas com vista a satisfazer
necessidades públicas. No final desse ano, o órgão de administração tem de registar quanto é
que se obteve de receitas e quanto, onde, porquê e para que é que se gastaram. Por outras
palavras: é feita uma conta, onde são registadas as receitas obtidas e as despesas realizadas.
 A grande distinção entre o orçamento e a conta é o facto de o orçamento ser uma previsão e a
conta descrever uma realidade.

4.2. Orçamento e plano


Como foi previamente mencionado, tudo o que é orçamental é financeiro, mas nem tudo o que é
financeiro é orçamental. Ou seja, para além do orçamento (e da conta), existem outros
instrumentos de gestão importantes que pertencem às Finanças Públicas:
- Plano de atividades: Ao lado do orçamento existe o plano de atividades que regista as
orientações, opções, objetivos, programas e projetos que devem ser desenvolvidos por
determinada entidade em determinado período de tempo.
- Relatório de atividades: Ao lado da conta existe o relatório de atividades que regista os
recursos que foram aplicados para desenvolver o que foi estabelecido no plano de atividades.
- Balanço social: Uma empresa, para gerir os recursos humanos, tem de averiguar o número de
pessoas que para ela trabalham, a sua formação académica, a previsão de progressão nas suas
carreiras, a dimensão etária da empresa e o impacto que estes fatores têm nas suas finanças.

4.3. Funções do orçamento


O orçamento desempenha quatro funções principais:
- Função política: Como o orçamento é aprovado pela autoridade financeira/orçamental, ou
seja pelo Parlamento enquanto órgão representativo dos cidadãos, através de uma lei, esta, por
um lado, confere legitimidade política à cobrança de receitas e à realização de despesas e, por
outro lado, evita que eclodam revoluções decorrentes de uma cobrança excessiva e não-
legitimada de receitas como foi o caso das Revoluções Americana e Francesa (tenha-se uma vez
mais em consideração a máxima “no taxation without representation”).

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- Função jurídica: Para cobrar-se receitas e realizar-se despesas é necessária a existência de
legislação que regule como o orçamento se deve elaborar e que, emanada do Parlamento
enquanto autoridade financeira/orçamental, legitime juridicamente a atividade financeira.
- Função económica: O orçamento tem importantes implicações económicas, tendo em conta as
decisões que são tomadas e que dizem respeito às receitas e às despesas no âmbito da lei do
Orçamento:
-» Um aumento dos impostos faz com que os cidadãos tenham menos rendimento disponível
e consumam menos, as empresas não necessitem de produzir tanto nem de tantos empregados e
o desemprego e as despesas da Segurança Social aumentem. Pelo contrário, uma redução dos
impostos faz com que os cidadãos tenham mais rendimento disponível e consumam mais, as
empresas produzam mais e precisem de mais empregados e o desemprego baixe e as despesas
da Segurança Social desçam.
-» Um aumento das despesas do Estado devido a uma situação excecional de saúde pública
provoca uma recuperação económica, diminuindo o desemprego, aumentando o consumo, etc.
Contudo, a realização de despesas deve ser feita com uma certa ponderação, devendo a
economia basear-se e sustentar-se naquilo que se produz, não se realizando despesas excessivas.
- Função disciplinadora: O orçamento disciplina a utilização dos recursos públicos, sendo as
receitas cobradas e as dotações (: verba financeira destinada a cobrir determinada despesa)
orçamentais atribuídas mensalmente ao longo do ano.
Para além destas funções, destaca-se igualmente a sua fonte de responsabilidade, ou seja o
gestor público é responsável pela obtenção de recursos e pela realização de despesas de acordo
com a lei e obedecendo ao princípio da boa administração da economia, da eficiência e da
eficácia. A origem etimológica da palavra “responsabilidade” provem da palavra composta:
-» re: Re significa retorno, ou seja, a pessoa tem de suportar e sujeitar-se às consequências do
compromisso que assume.
-» sponsus: Sponsus é uma pessoa que assina um contrato, assumindo um compromisso.
-» habilitas: Habilitas implica que uma pessoa só pode assumir um determinado
compromisso se estiver capacidade para tal.
 Em conclusão, a responsabilidade é a situação em que uma pessoa, em virtude de um
compromisso assumido e alegando ter capacidade para, efetivamente, assumi-lo e cumpri-lo, se
sujeita às consequências do compromisso que assumiu.

4.4. Estrutura orçamental


Serão de seguida analisados aspetos importantes que fazem parte integrante do Orçamento do
Estado, consagrados na Lei de Enquadramento Orçamental (Lei n. 151/2015).
Sistematização da lei do Orçamento do Estado
Artigo 40º (Sistematização da lei do Orçamento do Estado) – A lei do Orçamento do Estado
integra um articulado, os mapas contabilísticos e demonstrações orçamentais e financeiras.
Artigo 41º (Conteúdo do articulado) – O articulado da lei do Orçamento do Estado contém as
normas que vão nortear a vida financeira e orçamental num determinado ano.
 alínea h) – A determinação do limite máximo dos empréstimos
 alínea k) – A determinação dos limites máximos do endividamento das regiões autónomas
 o aumento e a descida de impostos
Artigo 42º (Mapas contabilísticos) – A lei do Orçamento do Estado contém os seguintes mapas
contabilísticos:
 alínea a) – Mapa das despesas por missão de base orgânica, desagregadas por programas
 alínea b), c) e d) – Mapa da classificação funcional, económica e orgânica das despesas

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 alínea e) – Mapa da classificação económica das receitas públicas
 alínea f) – Mapa das despesas com vinculações externas e despesas obrigatórias
Em termos das alíneas b) a e) do artigo 42º da LEO, as receitas e as despesas públicas devem
aparecer na lei do Orçamento do Estado de acordo com determinados critérios:
-» De acordo com a alínea e) do artigo 42º da LEO, as receitas (tributárias, patrimoniais e
creditícias) devem aparecer segundo uma classificação económica, distinguindo-se entre
receitas correntes (p.e. pagamento de impostos e taxas pelos contribuintes) e receitas de capital
(p.e. contração de empréstimos). Existe, para além desta distinção, uma outra entre receitas
efetivas (: receitas de natureza habitual) e receitas não efetivas (: receitas de natureza pontual).
-» De acordo com as alíneas b) a d) do artigo 42º da LEO, as despesas devem ser apresentadas
no Orçamento do Estado segundo a tripla-classificação, constituída pelas classificações
orgânica, funcional e económica.
Primeiro, a classificação orgânica diz respeito às despesas que cabem a uma determinada
organização (p.e. Ministério da Defesa, Ministério da Economia, Ministério da Agricultura,
Ministério da Educação, Ministério da Saúde).
Segundo, a classificação funcional diz respeito às despesas que cabem a uma determinada
função, podendo esta ser levada a cabo por mais do que uma organização (p.e. função da
proteção civil levada a cabo pelas entidades públicas da PSP, da GNR, do Ministério da Defesa,
do SEF e da Autoridade Nacional da Proteção Civil).
Terceiro, a classificação económica diz respeito às despesas correntes (p.e. pagamento de
salários, aquisição de equipamentos) e às despesas de investimento (p.e. investimento).
Artigo 43º (Demonstrações orçamentais e financeiras) – As demonstrações orçamentais e
financeiras a que se refere a alínea c) do artigo 40º são as seguintes:
 alínea e) – Plano de recursos humanos e respetivo orçamento
Artigo 44º (Vinculações externas e despesas obrigatórias) – No Orçamento do Estado tem-se de
respeitar as vinculações externas do Estado Português e as despesas obrigatórias.
 Vinculações externas: A inscrição das despesas e das receitas nos mapas contabilísticos
tem em consideração o Programa de Estabilidade, os limites de despesas e as projeções de
receitas previstos na Lei das Grandes Opções e as obrigações decorrentes da União Europeia.
 Despesas obrigatórias: Os mapas contabilísticos devem ainda prever as dotações
necessárias para a realização de despesas obrigatórias…
alínea a) – … decorrentes de lei ou de contrato: No n. 2 do artigo 105º da CRP, consta
que o Orçamento é elaborado harmonicamente com as grandes opções em matéria de
planeamento e tendo em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato.
-» Os contratos são sagrados. A expressão latina “pacta sunt servanda” tem de ser tida em conta
e significa que os contratos devem ser cumpridos.
alínea b) – … associadas ao cumprimento das decisões dos tribunais: Se o tribunal
condena o Estado a indemnizar alguém, evidentemente que tem que haver do Orçamento do
Estado uma dotação suficiente para dar execução a essas decisões.
 Distingue-se entre despesas obrigatórias e despesas facultativas.
Estrutura do Orçamento do Estado
Artigo 45º (Caracterização dos programas orçamentais) – Os programas orçamentais incluem
as receitas e as despesas inscritas nos orçamentos dos serviços e das entidades dos subsetores da
administração central e da segurança social.
-» Exemplo: A Defesa Nacional tem despesas muito acentuadas. Portanto, carece de uma
programação orçamental rigorosa que tenha como objetivo, por exemplo, a manutenção de
equipamentos militares e a aquisição de novos equipamentos militares.
 n. 11: Dentro do Ministério das Finanças, é obrigatória a constituição de um programa
destinado a fazer face a despesas imprevisíveis e inadiáveis, bem como de um programa não

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vinculativo destinado a gerir e a controlar a despesa fiscal resultante da concessão de benefícios
tributários.
 Dotação previsional: Dotação antevidente para despesas imprevisíveis e inadiáveis.
Princípios orçamentais
Os artigos 9º a 19º da LEO enumeram um conjunto de princípios que devem nortear a
elaboração não só do Orçamento do Estado, mas também do Orçamento das Regiões
Autónomas, dos municípios e até da União Europeia, visto que são aceites pela generalidade
dos Estados.
Artigo 9º (Unidade e universalidade)
Só há um orçamento do Estado e todas as suas receitas e despesas devem estar nele incluídas.
No que toca às Regiões Autónomas e às autarquias locais, estas têm orçamentos próprios que
contêm as respetivas receitas e despesas, existindo contudo fluxos financeiros entre o Estado e
estas entidades infraestaduais, uma vez que o Orçamento do Estado atribui dotações anuais para
os seus orçamentos.
Artigo 10º (Estabilidade orçamental)
A estabilidade orçamental consiste numa situação de equilíbrio ou excedente orçamental. Por
sua vez, a instabilidade orçamental consiste numa situação de défice orçamental, que não deve
existir.
Artigo 11º (Sustentabilidade das finanças públicas) -» remete para os artigos 10º e 13º da LEO
O Estado deve ter capacidade de pagar as suas dívidas e de assumir os seus compromissos, com
respeito pela regra do saldo orçamental estrutural e pela regra da dívida pública.
Artigo 12º (Solidariedade recíproca)
Os subsetores do Setor Público devem comunicar entre si e cooperarem mutuamente, no que
respeita a meios financeiros, de forma a satisfazer o melhor possível as necessidades públicas.
Artigo 13º (Equidade intergeracional)
As gerações atuais não devem onerar (: oprimir, sobrecarregar) as gerações futuras de uma
forma insuportável, no que diz respeito, por exemplo, a investimentos, compromissos e pensões.
-» Exemplo: O Estado não deve celebrar contratos com uma extensa duração e com encargos
insuportáveis, pois quem os pagará serão as gerações atuais e vindouras.
Artigo 14º (Anualidade e plurianualidade)
O Orçamento do Estado é anual (o ano económico coincide com o ano civil), embora se deva ter
em atenção os programas orçamentais plurianuais.
Artigo 15º (Não compensação)
O Estado tem o dever de registar e inscrever no Orçamento do Estado todas as suas receitas e
todas as suas despesas no seu valor integral, sem qualquer tipo de deduções ou compensações.
-» Exemplo: Se o Estado deve 5000€ a uma entidade privada e esta entidade privada deve
1000€ ao Estado, não se pode fazer uma compensação, ou seja, não se deve considerar que o
Estado deve 4000€ à entidade privada (5000€-1000€) e esta não deve, por conseguinte, nada ao
Estado. Deste modo, não se fica a saber a vida financeira das entidades em questão.
Artigo 16º (Não consignação)
Todas as receitas e despesas que o Estado prevê no seu Orçamento não podem ser consignadas,
ou seja, todas as receitas servem para cumprir todas as despesas, existindo exceções.
-» Exemplo: O Estado prevê receber uma determinada dotação e determina que essa será
abruptamente consignada ao pagamento de uma determinada despesa, em vez de ir para o “bolo
geral” das receitas.

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Artigo 17º (Especificação)
As receitas devem ser especificadas por classificador económico e fonte de financiamento (: ato
ou efeito de facultar os capitais necessários para um dado negócio ou projeto). As despesas
devem ser especificadas por classificador orgânico, funcional e económico.
Artigo 18º (Economia, eficiência e eficácia) -» princípio da boa administração e da boa gestão
Na elaboração e execução do Orçamento do Estado, tudo o que faz parte integrante deste deve
ser regulado e norteado por estes princípios, i.e., deve-se gastar o menos possível porque os
recursos são escassos (economia), conseguir o máximo de resultados ao mais baixo custo
(eficiência) e executar aquilo que se planeia e programa (eficácia).
Artigo 19º (Transparência orçamental)
O Orçamento do Estado deve conter toda a informação disponível para se poder governar bem.

4.5. Regime(s) de preparação, aprovação e execução


Aquilo que será relatado acerca do Orçamento do Estado aplica-se, mutatis mutandis (: com as
necessárias adaptações), ao Orçamento da União Europeia, conforme está previsto no
Regulamento Financeiro da União Europeia, ao Orçamento das Regiões Autónomas dos Açores
e da Madeira, conforme está previsto na Lei de Enquadramento do Orçamento de cada uma das
Regiões Autónomas, e aplica-se também aos Orçamentos das autarquias locais, de acordo com a
lei das finanças locais.
4.5.1 Técnicas de elaboração do orçamento
1) A técnica mais simples, mais seguida pelos Estados, mas menos recomendável, é aquela em
que o Estado tem a mesma dotação do ano anterior com pequenos ajustamentos derivados da
taxa de inflação, da conjuntura económica, etc.
2) Já a técnica de orçamentação de base 0 traduz-se na técnica em que o Estado elabora o
Orçamento de Estado para o ano seguinte como se fosse o seu primeiro orçamento. Isto implica
que o Estado repense a sua atividade e a sua organização anualmente.
-» Num primeiro passo, o Governo tem de elaborar um Plano de Atividades, no qual são
registadas as orientações, as opções, os objetivos, programas e projetos que deverão ser
desenvolvidos ao longo de um determinado período de tempo.
-» Num segundo passo, o Governo elabora, com base no Plano de Atividades, o Orçamento
de Estado, prevendo-se as receitas que irá cobrar e as despesas que irá realizar pelo
desenvolvimento dos aspetos traçados no Plano de Atividades.
4.5.2 Sobre-orçamentação e a sub-orçamentação
Ainda sobre a elaboração do orçamento considera-se que não se deve “sobre-orçamentar” nem
“sub-orçamentar”, sobreavaliando as receitas e subavaliando as despesas para obter sempre
como resultado um excedente orçamental. Essa situação pode averiguar-se enganadora.
-» Exemplo: Uma entidade pública sobreavalia as suas receitas (1000€ em vez de 200€) para
realizar determinados eventos, para os quais não havia efetivamente dinheiro. O resultado foi
um défice de 800€, a diferença entre as receitas hipotéticas (1000€) e as receitas reais (200€).
 Conclui-se que se deve avaliar o mais rigorosamente possível as receitas e as despesas, de
forma a que não se tenha no final uma situação de desequilíbrio orçamental.
4.5.3 Orçamento participativo
O orçamento participativo é um orçamento no qual está prevista a reserva de uma parcela das
dotações orçamentais/ dos recursos para realizar determinados projetos escolhidos pelos
cidadãos, sendo esta possibilidade prevista por lei.
4.5.4 Processo orçamental
O processo de elaboração do Orçamento do Estado está previsto na Lei de Enquadramento
Orçamental nos artigos 32º e ss.

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1) O processo orçamental inicia-se com a apresentação de um projeto de lei do Orçamento do
Estado para o ano económico seguinte, pelo Governo, na Assembleia da República, até ao dia 1
de Outubro de cada ano.
2) De Outubro até Dezembro, o projeto de lei do Orçamento do Estado é discutido (na
generalidade e na especialidade) e votado (na generalidade, na especialidade e votação global
final) pela Assembleia da República. A lei do Orçamento do Estado deve estar aprovada de
forma a entrar em vigor no dia 1 de Janeiro do ano a que respeita.

4.6. Alterações orçamentais


Após o Orçamento do Estado ter entrado em vigor, este poderá ser alterado ao longo do ano, nos
termos previstos na Lei de Enquadramento Orçamental nos artigos 59º e ss.
Conforme o n. 1 do artigo 59º, competem à Assembleia da República as revisões orçamentais
(: alteração orçamental mais profunda e estrutural) que envolvam…
 alínea a) – … o aumento da despesa total da administração central.
 alínea b) – … o aumento da despesa total de cada missão de base orgânica.
 alínea c) – … a alteração dos programas orçamentais que acarretem o aumento dos
compromissos do Estado.
 alínea e) – … um acréscimo dos limites do endividamento.
 alínea f) – … o aumento das despesas do orçamento da segurança social.
Nos termos dos n. 2 e 3 do artigo 59º, as demais alterações orçamentais são da competência do
Governo.
 Todas as revisões orçamentais são alterações orçamentais, mas nem todas as alterações
orçamentais são revisões orçamentais.
As alterações orçamentais devem ainda ser publicadas de acordo com o artigo 61º da LEO.

5. A gestão financeira e orçamental


Aprovado e entrado em vigor o Orçamento do Estado, obter-se-ão os recursos e realizar-se-ão as
despesas de forma a satisfazer as necessidades públicas, incumbindo-se desta tarefa os gestores/
administradores públicos. Mas o que é que significa “gestão” ou “administração”?
A palavra “administrador” provém do latim “ad ministrare” e significa “diagnóstico das
necessidades públicas”. Por conseguinte, a primeira coisa que um administrador público tem de
fazer é fazer um diagnóstico das necessidades públicas. Seguidamente, deverá obter os recursos
e afetá-los à realização de determinadas despesas para satisfazer as necessidades públicas
diagnosticadas. Como estas são muitas e os recursos para satisfazê-las são poucos, “ad
ministrare” também significa “hierarquizar as necessidades públicas”, satisfazendo, antes de
todas as outras, as mais urgentes. Um bom administrador/ gestor é, sendo assim, aquele que com
poucos recursos, consegue bons resultados, traduzindo-se daí o princípio da boa
administração.

5.1. Princípios
A execução do Orçamento do Estado, quer no campo das receitas, quer no campo das despesas,
obedece ao disposto do artigo 52º da LEO.
Artigo 52º (Princípios gerais de receita e de despesa)
-» n. 1: Na gestão orçamental nenhuma receita pode ser liquidada ou cobrada sem que,
cumulativamente, seja legal, esteja corretamente inscrita e esteja classificada.
-» n. 2: A liquidação e a cobrança de receita podem ser efetuadas para além dos valores
previstos na respetiva inscrição orçamental. Ou seja, na sua previsão de receitas, o Estado pode
cobrar mais do que aquilo que previu, por exemplo, se a economia estiver pujante. O que o
Estado não pode fazer é cobrar receitas que não estejam legalmente previstas, traduzindo-se daí

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o princípio da tipicidade qualitativa das receitas. No que toca à despesa, o Estado só pode
realizar despesas se tiverem cabimento orçamental, não podendo gastar mais do que o que está
previsto no Orçamento, traduzindo-se daí o princípio da limitação quantitativa das despesas.
-» n. 3: Nenhuma despesa pode ser autorizada sem que seja legal, esteja inscrita
orçamentalmente, tenha cabimento (: cabe na dotação orçamental), identifique se os pagamentos
se esgotam no ano ou em anos futuros e que seja económica, eficiente e eficaz.
-» n. 6: As operações de execução do orçamento das receitas e das despesas obedecem ao
princípio da segregação das funções de liquidação e de cobrança (receita) e de autorização da
despesa e do respetivo pagamento (despesa).
-» n. 7: A segregação de funções a que se refere o número anterior pode estabelecer-se entre
diferentes serviços ou entre diferentes agentes do mesmo serviço.
Artigo 54º (Unidade de tesouraria)
-» n. 3: O princípio da unidade de tesouraria concretiza-se através da gestão integrada da
Tesouraria Central do Estado e da dívida pública direta do Estado.
 Os dinheiros das entidades públicas, do Estado, devem estar concentrados no Tesouro
Público (: Banco do Estado).

5.2. Regime
O regime de execução do Orçamento do Estado, nas suas linhas fundamentais, está previsto no
artigo 52º da LEO, quer quanto à cobrança de receitas, quer à realização de despesas.

5.3. Instrumentos de gestão, incluindo os planos de prevenção de riscos de


gestão
Para além dos instrumentos de gestão previamente analisados (Orçamento, Plano de Atividades,
Conta, Relatório de Atividades, Balanço Social), existe ainda um outro merecedor de ser
analisado, nomeadamente o plano de prevenção de riscos de gestão. Este é um instrumento de
gestão no qual devem ser identificados os potenciais riscos em todas as áreas da atividade da
entidade que o elabora e previstas as medidas concretas destinadas a impedir ou a minimizar a
probabilidade da sua ocorrência. Uma vez que as entidades públicas gerem dinheiros públicos,
estas deveriam obrigatoriamente elaborar um plano de prevenção de riscos de gestão, de modo a
estarem melhor preparadas a ultrapassar situações fora da normalidade.
-» Exemplo: Nas entidades públicas existe o risco de desvio de dinheiros públicos. Como
superar esse risco? Quando se giram recursos públicos deve proceder-se a uma “segregação de
funções”, devendo estar implicadas várias pessoas a intervir no processo de cobrança de receitas
e de realização de despesas. Quem liquida o imposto, não é quem o cobra. Quem autoriza um
pagamento, não é quem o paga.
No tocante o conteúdo de um plano de prevenção de riscos de gestão, o Prof. José Tavares no
seu artigo “O Plano de Prevenção de Risco – Um Instrumento de Gestão Indispensável no Setor
Público”, propõe a seguinte estrutura:
- Caracterização da organização da entidade em questão
- Identificação, avaliação, análise e estimativa do grau de probabilidade de ocorrência dos riscos
e grau de gravidade das consequências derivadas da sua ocorrência
- Medidas de prevenção dos riscos identificados e avaliados e separação de funções e
responsabilidades aos intervenientes da entidade em causa
- Acompanhamento contínuo, avaliação e atualização periódica da “vida da organização”

5.4. A gestão e a utilização de dinheiros públicos por entes públicos de


direito privado e por entes privados
A gestão pública, ou seja a atividade de administração dos dinheiros públicos que visa a
satisfação das necessidades e dos interesses coletivos/públicos, pode ser desenvolvida por

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pessoas coletivas de Direito Público, por pessoas coletivas de Direito Privado ou por pessoas
singulares, formando deste modo o Setor Público Português (veja-se também “A Ponderação de
Interesses na Gestão Pública vs. Gestão Privada).
5.4.1 Distinção entre dinheiros públicos e dinheiros privados
Quando uma entidade de natureza privada paga um determinado montante do seu dinheiro a
qualquer entidade de natureza pública, seja ela uma ordem profissional, um município, uma
freguesia, uma Região Autónoma, um instituto público, um banco público, uma fundação
pública, uma associação pública, etc. esse dinheiro privado torna-se dinheiro público.
-» Exemplo 1: A Ordem dos Advogados é uma pessoa coletiva pública que foi criada pelo
Estado para regular a profissão em questão. A lei que prevê ordens desta espécie determina que
cada associado, neste caso todos os advogados, tem de pagar uma quota. Estas quotas pagas
pelos advogados à Ordem dos Advogados são dinheiros privados quando ainda não entraram na
Ordem em questão, mas, uma vez lá, tornam-se dinheiros públicos.
-» Exemplo 2: O Fundo de Resolução é uma entidade pública que funciona junto do Banco
de Portugal e desempenha a função de auxílio aos bancos em situações de crise, tendo todos eles
de pagar anualmente uma quota a essa entidade. O dinheiro pago pelos bancos ao Fundo de
Resolução são dinheiros públicos.
-» Exemplo 3: A Caixa Geral de Depósitos é uma sociedade anónima de capitais
exclusivamente públicos, i.e. um banco público. Este banco público criou a fundação Culturgest
para fins culturais, podendo-se realizar exposições, conferências, etc. Quem quiser utilizar a
fundação para estes fins, terá de pagar um determinado montante de dinheiro. Esse dinheiro é
privado quando está na posse daqueles que desejam organizar um evento, tornando-se público
quando entra na fundação.
Quando uma entidade de natureza pública atribui um determinado montante de dinheiro a
qualquer entidade de natureza privada, sendo observadas certas condições, esse dinheiro público
torna-se dinheiro privado. Contudo, a entidade de natureza pública tem o direito e o dever de
fiscalizar se o dinheiro público que se tornou privado é efetivamente aplicado ao fim pré-
estabelecido e se as condições são cumpridas, podendo exigir o retorno desse dinheiro.
-» Exemplo: O Estado decide conceder um subsídio a um agricultor para auxiliar
financeiramente a sua atividade. Este, quando recebe o montante financeiro, não pode aplicá-lo
a qualquer outro fim específico, senão àquele que foi pré-estabelecido pelo Estado. Contudo, se
não o fizer, poderá ser obrigado a devolver o dinheiro em causa.
5.4.2 Distinção entre dinheiro privado e dinheiro privativo
Enquanto que o dinheiro privado é dinheiro que pertence às entidades de natureza privada, o
dinheiro privativo é dinheiro que uma determinada entidade, pública ou privada, recebe, para
que seja afetado a fins públicos que estão a seu cargo.
-» Exemplo: Os impostos cobrados nos municípios são receitas privativas públicas dos
mesmos.

6. As contas
1) Elaboração do Orçamento de 2021 em 2020
2) Execução do Orçamento de 2021 em 2021
3) Conta do Orçamento de 2020 em 2021
4) Elaboração do Orçamento de 2022 em 2021
A Conta é um instrumento de gestão que demonstra quanto uma determinada entidade, pública
ou privada, recebeu de receitas e quanto gastou durante um determinado período de tempo e
qual o valor do seu património (Balanço), ou seja dos seus ativos (: conjunto de valores
patrimoniais positivos, representativo de dinheiro, imóveis, máquinas, créditos) e dos seus

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passivos (: conjunto de valores patrimoniais negativos, representativo de dívidas, obrigações,
compromissos, responsabilidades) - (veja-se também “Encontro de Contas – Uma Visão
Interdisciplinar das Contas”).

A elaboração e prestação de contas é de extrema relevância. Os gestores públicos que gerem


dinheiros de outrem são obrigados a prestar contas, apresentando demonstrações financeiras
transparentes e fiáveis, acompanhadas de relatórios, como é o caso do Relatório de Atividades
(: instrumento de gestão onde são registadas as atividades onde, como, para que finalidade,
porquê, quando e quanto se gastou durante um determinado período de tempo), contribuindo
desta mesma forma para uma boa gestão dos dinheiros públicos, para o conhecimento da
realidade financeira de uma determinada entidade, para o planeamento do seu futuro, para o
reforço da confiança dos cidadãos na eficiência e eficácia da gestão das Finanças Públicas e
para o apuramento das responsabilidades por ilegalidades e irregularidades verificadas. Importa,
neste âmbito, citar Goethe que dizia que “quem não elabora e presta contas vive nas trevas
ignorante.”

Para além de um instrumento de gestão, as contas são ainda um instrumento de cidadania,


através do qual os cidadãos são informados sobre a atividade desenvolvida pelos seus gestores
públicos, sendo-lhes desta forma possível avaliá-la. Como refere o artigo 15º da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789: “A sociedade tem o direito de exigir contas a todos
os gestores públicos da sua administração”.

6.1 Sistemas de contabilidade


O modo de contabilizar (: registar as operações comerciais ou financeiras) e de prestar contas
constitui uma área do conhecimento científico que foi evoluindo ao longo do tempo, o que
permitiu o seu aperfeiçoamento constante. Poder-se-ão distinguir os diversos sistemas de
contabilidade:
- Contabilidade unigráfica: Registo dos recebimentos e dos pagamentos.
-» Exemplo: Um comerciante, no final do seu dia de trabalho, regista o que recebeu e os
pagamentos que efetuou pelo fornecimento de bens.
- Contabilidade digráfica: Registo das operações financeiras que geram dois movimentos.
-» Exemplo: Um indivíduo gasta 50 000€ para comprar um carro do qual fica proprietário
(débito: 50 000€ | crédito: 50 000€). No ano seguinte, o carro desvalorizou, passando a ter o
valor de 35 000€ (débito: 35 000€ | crédito: 35 000€).
- Contabilidade patrimonial: Registo das receitas e das despesas, compreendendo o
património
- Contabilidade de compromissos: Registo dos compromissos que são assumidos num
determinado momento que produzem efeitos para o futuro.
- Contabilidade de custos: Registo dos custos da produção de determinados bens ou serviços.
-» Exemplo: Um sapateiro tem de saber quais os custos que tem ao produzir um par de
sapatos.

6.2 A Conta Geral do Estado


No âmbito das contas, existem três contas de grande relevância pela abrangência e pelo valor
que têm:
- Conta Geral do Estado - Conta da Região Autónoma dos Açores e da Madeira

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Existem também contas de algumas instituições que são importantes pela importância simbólica
das instituições que estão em causa e pelo caráter exemplar que devem ter:
- Conta da Assembleia da República - Conta da Presidência da República
- Conta da Assembleia Legislativa dos Açores - Conta do Tribunal de Contas
- Conta da Assembleia Legislativa da Madeira
Relativamente à Conta Geral do Estado (: agregação de todo o movimento financeiro da
Administração Pública central (Ministérios, serviços e fundos autónomos do Estado, etc.), a Lei
de Enquadramento Orçamental contém algumas normas importantes sobre aquilo que é o
reflexo da execução do Orçamento do Estado:
Artigo 66º (Conta Geral do Estado)
-» n. 1: O Governo, que tem a responsabilidade de administrar o Estado, tem igualmente a
responsabilidade de prestar contas, elaborando a Conta Geral do Estado (accountability). É
também o Governo que submete à Assembleia da República até ao dia 15 de Maio a Conta
Geral do Estado do ano anterior.
-» n. 4-6: Para além da submissão da Conta Geral do Estado à Assembleia da República, o
Governo tem ainda de a submeter ao Tribunal de Contas até ao dia 15 de Maio para que este
possa certificá-la até ao dia 30 de Setembro. O Tribunal de Contas emite depois um parecer
sobre a Conta Geral do Estado e remete-o à Assembleia da República até ao dia 30 de Setembro
para que esta, com base no parecer do Tribunal de Contas, dê ou não a quitação ao Governo.
 Se houver responsabilidades financeiras para apurar, a Assembleia da República remete o
seu relatório ao Ministério Público e este requere o julgamento dos responsáveis no Tribunal de
Contas pelas infrações financeiras que foram apuradas.

7. O controlo das finanças públicas


Todas as sociedades têm de ter mecanismos de controlo “saudáveis” em todos os domínios. Mas
o que é o controlo?
A origem etimológica da palavra “controlo” provém da palavra composta francesa “contre rôle”
e significa fiscalização, verificação ou auditoria. Explicando: O gestor público desempenha a
função de administrar, de gerir os dinheiros públicos (rôle). Por sua vez, quando alguém gere,
tem de existir alguém que interrogue, ouça e verifique se a atividade desenvolvida por ele está
conforme a lei e de acordo com os seus princípios (contre rôle). Para além da atividade de
fiscalização, o controlo serve igualmente para apurar as responsabilidades inerentes à gestão
financeira pública, tópico este que será observado mais adiante.

7.1. Modalidades de controlo financeiro e orçamental


O controlo orçamental distingue-se do controlo financeiro, uma vez que todo o controlo
financeiro é controlo orçamental, mas nem todo o controlo orçamental é controlo financeiro.
Sendo assim, o controlo financeiro é uma atividade que assegura o cumprimento da
Constituição e da Lei do Orçamento aprovada pela Assembleia da República e garante a boa
gestão dos recursos públicos, podendo-se distinguir vários tipos de controlo, tendo em conta
certos critérios:
- Critério do objeto: O critério do objeto distingue o controlo financeiro e orçamental
relativamente às receitas e às despesas.
- Critério orgânico: O critério orgânico distingue o controlo financeiro e orçamental
relativamente aos órgãos que o desenvolvem, podendo-se fazer uma distinção entre:
-» Controlo administrativo: O controlo administrativo é desenvolvido por órgãos
administrativos (ex. Direção-Geral do Orçamento).
-» Controlo jurisdicional: O controlo jurisdicional é desenvolvido por órgãos jurisdicionais
(ex. Tribunal de Contas).

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-» Controlo político: O controlo político é desenvolvido por órgãos políticos (ex. Assembleia
da República).
-» Controlo social: O controlo social é desenvolvido por órgãos sociais (ex. opinião pública,
partidos políticos, imprensa).
- Critério do conteúdo: O critério do conteúdo distingue o controlo financeiro e orçamental
relativamente ao conteúdo sobre o qual incide. O controlo pode incidir sobre a atividade global
de uma entidade, um programa, um projeto, uma medida, sobre todos os instrumentos de gestão
previamente analisados, etc. A título de exemplo, o Tribunal de Contas pode, de acordo com o
artigo 1º, n. 1 da Lei n. 98/97:
-» Fiscalizar se a execução do contrato está de acordo com a lei (legalidade)
-» Fiscalizar se os procedimentos seguintes foram regulares (regularidade)
-» Fiscalizar a boa gestão da execução do contrato, obedecendo ao princípio da economia,
eficiência e eficácia (boa-gestão).
-» Avaliar (: controlar a eficácia) a utilidade do projeto, do programa, da medida, etc.
- Critério do momento do controlo: O critério do momento do controlo distingue o controlo
financeiro e orçamental relativamente ao momento em que o controlo é exercido. Distingue-se
entre:
-» Controlo prévio: Depois da celebração de contratos ou atos mas antes de os mesmos
produzirem efeitos, o Tribunal de Contas tem de os fiscalizar previamente e verificar a sua
legalidade, “concedendo-lhes o visto”, em termos do artigo 44º e ss. da Lei n. 98/97. Os atos e
contratos que são obrigatoriamente sujeitos ao controlo prévio são aqueles com valor superior a
750 000€.
-» Controlo concomitante: O Tribunal de Contas, de acordo com o artigo 49º da Lei n. 98/97
pode decidir acompanhar a execução de um determinado ato ou contrato e fiscalizá-la.
-» Controlo sucessivo: O Tribunal de Contas pode ainda, com base no artigo 50º da Lei n.
98/97, fiscalizar os desvios que ocorreram depois da execução de um determinado ato ou
contrato e apurar responsabilidades financeiras.
- Critério dos níveis de controlo quanto ao organismo ou agente: O critério dos níveis de
controlo quanto ao organismo ou agente distingue:
-» Controlo interno: O controlo interno é desempenhado por órgãos juntos do órgão
administrativo (ex. Inspeção Geral de Finanças).
-» Controlo externo e independente: O controlo externo é desempenhado pelo Tribunal de
Contas, constitucionalmente previsto no artigo 209º, n. 1, alínea c) da Constituição da República
Portuguesa, e pela Assembleia da República.
Uma ação de controlo pode ser repartida por três fases principais:
- Planeamento, programação e estudo preliminar da entidade e do objeto alvo da ação de
controlo
- Execução do controlo
- Elaboração de um relatório sobre tudo aquilo que foi objeto da ação de controlo

7.2. O controlo e a jurisdição do Tribunal de Contas em especial


As sociedades têm muitos riscos. Para que esses riscos sejam minimizados ou não existam é
necessária a criação de defesas. Uma dessas defesas é a existência de entidades de controlo que
impeçam que se cometam determinados atos que atentem contra o património público, como é o
exemplo do Tribunal de Contas.
A Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas n. 98/97, de 26 de Agosto consagra
no seu artigo 2º, n. 3, a possibilidade de o Tribunal de Contas fiscalizar tudo o que implique
gastos públicos. Pode não vir a controlar tudo, mas é-lhe legalmente atribuída a possibilidade de

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tudo controlar. Por sua vez, o Decreto-Lei n. 166/98, de 25 de Junho, que institui o sistema de
controlo interno da administração financeira do Estado, estabelece que os organismos de
controlo interno devem atuar de uma forma coordenada, articular os seus programas e
atividades para que estes não coincidam, aumentando desta forma as possibilidades de controlo.
Existem alguns princípios de controlo importantes:
- Princípio da atualidade: Quem tem o dever de controlar deve fazê-lo a realidades que sejam
as mais atuais possível.
- Princípio do controlo seletivo: O controlo deve incidir sobre um determinado assunto.
- Princípio do contraditório: Consagrado no artigo 13º da Lei n. 98/97, este princípio significa
que “nos casos sujeitos à sua apreciação, o Tribunal de Contas ouve os responsáveis individuais
e os serviços, organismos e demais entidades interessadas e sujeitas aos seus poderes de
jurisdição e controlo financeiro”.
As equipas integrantes nos organismos de controlo devem ser multidisciplinares para que uma
realidade específica possa ser observada sob diversos pontos de vista, o que ajuda a elaborar um
relatório completo.
7.2.1 As recomendações do Tribunal de Contas
Primeiramente, há que distinguir aquilo que é uma ordem daquilo que é uma recomendação. O
Prof. José Tavares, no seu artigo “Recomendações do Tribunal de Contas – Conceito, Natureza
e Regime“ explica que:
- Aquele que dá uma ordem é responsável pelos efeitos que a mesma produz. Quem a recebe
sabe que tem obrigatoriamente de a cumprir.
- Aquele que dá uma recomendação é responsável pelos efeitos que a mesma produz. Quem a
recebe deve, num primeiro passo, ponderá-la, uma vez que a mesma não tem caráter
obrigatório. Se o recetor optar por não segui-la e ocorrerem os efeitos previstos e constantes na
recomendação emitida, terá a sua responsabilidade agravada.
Sendo assim, uma recomendação do Tribunal de Contas é um conselho que traduz a sua posição
relativamente a um determinado ato ou situação atinente à atividade financeira pública para os
quais aponta um ou vários caminhos a seguir pelos fiscalizados, tendo em vista a melhor
prossecução do interesse público. As recomendações do Tribunal de Contas devem, em
princípio, ser acolhidas pelos respetivos destinatários, embora seja lícito o seu não acolhimento,
desde que devidamente justificado, não tendo deste modo caráter obrigatório, uma vez que:
1- … dentro do espaço de tempo entre a emissão e a receção da recomendação pode acontecer
um conjunto de eventos que façam com que não seja necessário seguir aquilo que foi
recomendado.
2- … quem emite a recomendação pode não estar na posse de todos os elementos necessários
para a elaborar.
3- … quem recebe a recomendação pode não concordar com ela.
O Tribunal de Contas, no exercício dos seus poderes, pode formular recomendações, sendo este
por exemplo o caso do parecer sobre a Conta Geral do Estado, de acordo com o artigo 41º, n. 3
da Lei n. 98/97 ou de relatórios de auditoria.
1) Se não foram verificadas quaisquer ilegalidades, irregularidades e procedimentos de má-
gestão, os fiscalizados não serão responsabilizados.
2) Se, pelo contrário, a ação de controlo averiguou indícios de infrações financeiras, o relatório
que emanou dessa mesma ação é enviado ao Ministério Público que irá requerer o julgamento
dos responsáveis no Tribunal de Contas.
3) Se o relatório de controlo do Tribunal de Contas conter recomendações, este tribunal
estabelece que os fiscalizados têm que lhe comunicar, no prazo de um determinado período de

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tempo, o que fizeram com as suas recomendações. Se não o fizerem e não justifiquem a razão
por não o fazerem, podem ser sancionados.
4) Para além da responsabilização e do acolhimento, ou não, das recomendações, esses
relatórios são publicados, em termos do artigo 9º da Lei n. 98/97. Os cidadãos ficam
consequentemente a saber a qualidade dos gestores públicos e a forma como estes gerem os
recursos públicos. Para além disso, esses relatórios servem para programar ações futuras.

8. As responsabilidades inerentes à gestão e utilização de dinheiros,


valores e património públicos. A responsabilidade financeira em
especial
Se a ação de controlo ter verificado ilegalidades, irregularidades e procedimentos de má-gestão
por parte do gestor público fiscalizado, este terá de vir a ser responsabilizado pelas infrações
que cometeu.
Como previamente referido, a responsabilidade é a situação em que uma pessoa, em virtude de
um compromisso assumido e alegando ter capacidade para, efetivamente, assumi-lo e cumpri-
lo, se sujeita às consequências do compromisso que assumiu. Este conceito tem ligações
intrínsecas com o princípio “pacta sunt servanda” que significa que os contratos têm de ser
cumpridos.

8.1 Fundamentos da responsabilidade


- Liberdade: É responsável quem é livre. Quem não for livre, ter-se-á de pedir a
responsabilidade a quem lhe tirou a liberdade. É por isso que viver em democracia e em
liberdade é muito mais difícil do que viver em regimes autoritários/totalitários.
- Poder: É responsável quem tem poder. Poder é a faculdade de determinar a vida de outrem.
Sendo assim, se um gestor público tomar decisões ou medidas que piorem ou compliquem a
vida de outrem, terá de ser responsabilizado.
- Autonomia: É responsável quem tem autonomia. Quanto maior for o grau de autonomia, maior
o grau de responsabilidade, e não o contrário.

8.1. Tipos de responsabilidade


Quem exerce as Finanças Públicas tem vários tipos de responsabilidade (veja-se também “As
Responsabilidades na Gestão Pública – Seu Enquadramento”):
- Responsabilidade política: A responsabilidade política é apreciada por órgãos políticos e
segundo critérios de natureza política, como é o exemplo da responsabilidade política do
Governo perante a Assembleia da República.
- Responsabilidade criminal: A responsabilidade criminal é apreciada pelos tribunais
competentes e segundo critérios de natureza jurídico-criminais/-penais.
- Responsabilidade civil: A responsabilidade civil é apreciada pelos tribunais competentes,
traduzindo-se numa obrigação por parte do lesante de indemnizar, ou seja, de repor a situação
do lesado igual àquela que existia antes da ocorrência do ato que causou os danos.
- Responsabilidade disciplinar: A responsabilidade disciplinar é apreciada pelos órgãos
administrativos competentes e segundo critérios jurídico-disciplinares.

8.2. A responsabilidade financeira em especial


Para além de todos aqueles tipos de responsabilidades, existe ainda a responsabilidade
financeira, que no âmbito desta Unidade Curricular é de extrema relevância:
- Responsabilidade financeira …: A responsabilidade financeira é apreciada pelo Tribunal de
Contas, podendo ser dividida entre:
-» … reintegratória – O Tribunal de Contas, em termos do artigo 59º e ss. da Lei n. 98/97,
pode condenar os responsáveis a repor nos cofres do Estado o dinheiro que deveria lá estar e

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não está.
-» … sancionatória – O Tribunal de Constas, de acordo com o artigo 65º e ss. da Lei n.
98/97, pode aplicar multas aos responsáveis.
Quando se aprecia uma situação de responsabilidade, tem de se dar resposta às seguintes
questões:
- Quem é responsável? - Quais foram os efeitos produzidos?
- Por que factos é responsável? - Qual é a relação entre os factos e os efeitos?
A lei determina que há responsabilidade…
-» … por factos ilícitos (contrários à ordem jurídica);
-» … por factos culposos (com culpa (: dever de ter agido de outra maneira e não daquela)).
Contudo também pode haver responsabilidade…
-» … por factos lícitos: Quando o Estado expropria um terreno, tal ato é lícito, mas produz o
direito de indemnização.
-» … por factos sem culpa: Quando um carro estacionado numa descida, devido a uma falha do
travão de mão, bate contra o carro estacionado à sua frente, o titular daquele é responsável,
apesar de não ter culpa do ocorrido.

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