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Dinis Abrantes Figueiredo

Direito Penal III

Ano letivo de 2023/2024


1. Introdução
O Curso de Direito Penal III tem por objeto de estudo as consequências jurídicas do crime,
onde se incluem as penas (principais, acessórias e de substituição) e as medidas de
segurança (privativas e não-privativas da liberdade). Existem, todavia, outras consequências
jurídicas que, juntamente com a aplicação de uma pena ou de uma medida de segurança,
garantem que a intervenção penal atinge as finalidades que visa prosseguir (registo criminal,
inserção do perfil genético e dos dados pessoais em base de dados, registo de identificação
criminal, perda de instrumentos, produtos e vantagens (109º a 112º-A CP), etc.).
Nota fundamental:
O legislador estabelece um regime legal orientado para a censura de certo tipo de crimes
(crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexuais), para a estigmatização de certo
tipo de agentes (abusadores sexuais) e para a proteção de certo tipo de vítimas (menores):
- Cancelamento definitivo no registo criminal da sentença condenatória pela prática de
crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexuais decorridos 25 anos sobre a
extinção da consequência jurídico-penal aplicada (em vez do prazo máximo de 10 anos)
- Conservação do perfil genético e dos dados pessoais de condenados pela prática de
crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexuais em base de dados durante um
período de 23 anos (em vez do prazo máximo de 10 anos)
- Registo da identificação criminal de condenados pela prática de crimes contra a
liberdade e a autodeterminação sexuais, ainda que a condenação já tenha ocorrido e a
consequência jurídico-penal esteja cumprida (tendo tal sido declarado inconstitucional)

2. Caracterização do sistema sancionatório português


2.1 Regras e princípios orientadores do programa político-criminal de emanação
jurídico-constitucional
A Constituição da República Portuguesa estabelece um conjunto de regras e de princípios
jurídicos orientadores de qualquer programa político-criminal em matéria de consequências
jurídicas do crime:
Regras jurídico-constitucionais:
- 24º, n. 2 CRP: Em caso algum haverá pena de morte.
- 25º, n. 2 CRP: Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas cruéis,
degradantes ou desumanos.
- 30º, n. 1 CRP: Não pode haver penas nem medidas de segurança privativas da liberdade
com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida, ainda que o n. 2 permita (não
obriga!) a prorrogação sucessiva das medidas de segurança privativas da liberdade. Esta
segunda disposição legal é de revogar numa próxima revisão constitucional.
Princípios jurídico-constitucionais:
- Princípio da legalidade criminal (29º, n. 3 e 4 CRP): Não podem ser aplicadas penas ou
medidas de segurança que não estejam expressamente cominadas em lei anterior da
Assembleia da República ou em decreto-lei do Governo mediante lei de autorização
legislativa (165º, n. 1, al. c) CRP); ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais
graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos
respetivos pressupostos.

2
- Princípio da necessidade da intervenção penal (18º, n. 2 CRP): A aplicação de penas e
de medidas de segurança deve limitar-se ao necessário para a proteção de bens jurídicos que
sejam dignos de tutela penal (Strafwürdigkeit) e carecidos de tutela penal (Strafbedürftigkeit)
– prevenção geral positiva ou de integração (manutenção da paz jurídica e da confiança da
generalidade dos membros da comunidade na força do ordenamento jurídico-penal, sempre
que é abalado pela prática de crimes) – e a reintegração do agente na sociedade – prevenção
especial positiva ou de socialização (correção do agente do crime de forma a que seja
possível integrá-lo na comunidade à qual pertence) (40º, n. 1 CP).
- Princípio da proporcionalidade: Em matéria de penas, não pode haver pena sem culpa
(culpa enquanto pressuposto da pena) e a pena não pode ser superior à culpa do agente
(culpa enquanto limite inultrapassável da pena) (40º, n. 2 CP). Em matéria de medidas de
segurança, a medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do
facto e à perigosidade do agente (40º, n. 3 CP).
- Princípio da socialidade (2º CRP, 9º, al. d) CRP, 26º, n. 1 CRP, 30º, n. 1 CRP): Incumbe
ao Estado proporcionar ao condenado as condições necessárias para a sua integração na
comunidade à qual pertence.
- Princípio de preferência pelas consequências jurídicas do crime não-privativas da
liberdade: O tribunal deve dar preferência às consequências jurídicas do crime não-
privativas da liberdade (70º CP, 98º, n. 1 CP), em respeito pelos princípios da necessidade da
intervenção penal (18º, n. 2 CRP) e da proporcionalidade (40º, n. 2 e 3 CP).
- Princípio da aplicação da lei penal mais favorável (29º, n. 4, 2ª parte CRP): Em virtude
do princípio da legalidade criminal, é proibida a aplicação da lei penal nova sempre que dela
resulte a fundamentação ou agravação da responsabilidade criminal do agente. Em virtude do
princípio da necessidade da intervenção penal, é permitida a aplicação da lei penal nova
sempre que dela resulte a atenuação ou exclusão da responsabilidade criminal do agente.1
- Princípio da insusceptibilidade de transmissão da responsabilidade penal (30º, n. 3
CRP): A responsabilidade criminal é insuscetível de transmissão. Deste princípio resultam
duas consequências:
-» A responsabilidade criminal extingue-se pela morte do agente (127º, n. 1 CP).
-» A morte do agente extingue tanto o procedimento criminal, como a pena ou a medida
de segurança (128º, n. 1 CP).
- Princípio da não-automaticidade dos efeitos da pena (30º, n. 4 CRP, 65º, n. 1 CP):
Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis,
profissionais ou políticos.
- Princípio consagrado no artigo 30º, n. 5 CRP: Os condenados a quem sejam aplicadas
pena ou medida de segurança privativas da liberdade mantêm a titularidade dos direitos
fundamentais, salvas as limitações inerentes ao sentido da condenação e às exigências
próprias da respetiva execução.

1O princípio da aplicação da lei penal mais favorável não é uma exceção ao princípio da legalidade criminal,
uma vez que não está em causa a fundamentação ou agravação da responsabilidade criminal do agente, mas
antes a sua atenuação ou exclusão.
3
2.2 Características gerais do sistema sancionatório português
1) O sistema sancionatório português recusa a pena de morte (24º, n. 2 CRP) e consequências
jurídicas do crime com caráter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida (30º, n. 1
CRP), o que vai ao encontro de um princípio da humanidade e da regra segundo a qual
ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas cruéis, degradantes ou
desumanos (25º, n. 2 CRP).
2) O sistema sancionatório português dá preferência às consequências jurídicas do crime não-
privativas da liberdade (70º CP, relativamente às penas 2 - 98º, n. 1 CP, relativamente às
medidas de segurança3), em respeito pelos princípios da necessidade da intervenção penal
(18º, n. 2 CRP) e da proporcionalidade (40º, n. 2 e 3 CP).
3) O sistema sancionatório português é um sistema tendencialmente monista, uma vez que,
tendencialmente4, não permite a aplicação cumulativa, ao mesmo agente, pelo mesmo facto,
de uma pena e de uma medida de segurança privativas da liberdade.
4) O sistema sancionatório português prevê que a aplicação de penas e, em geral5, de medidas
de segurança visa, a título primário, exigências de prevenção geral positiva e, a título
secundário, exigências de prevenção especial positiva (40º, n. 1 CP). Já a execução das penas
e das medidas de segurança visa, a título primário, exigências de prevenção especial positiva
e, a título secundário, exigências de prevenção geral positiva (42º, n. 1 CP).
5) O sistema sancionatório português prevê consequências jurídicas do crime específicas para
as pessoas coletivas e entidades equiparadas (90º-A a 90º-M CP).
2.3 Tipos de penas
No ordenamento jurídico-penal português, existem três tipos de penas:
- Pena principal: As penas principais são aquelas que se encontram expressamente previstas
como consequência jurídica do tipo legal de crime e que podem ser fixadas pelo julgador na
sentença condenatória independentemente de quaisquer outras (penas de prisão e de multa).
- Pena de substituição: As penas de substituição são aquelas que são aplicadas em vez de
uma pena principal (multa (45º CP), proibição do exercício de profissão, função ou atividade
(46º CP), suspensão da execução da pena de prisão (50º a 57º CP), prestação de trabalho a
favor da comunidade (58 CP), admoestação (60º CP), etc.).
- Pena acessória: As penas acessórias são aquelas cuja aplicação pressupõe a fixação na
sentença condenatória de uma pena principal ou de uma pena de substituição (proibição do
exercício de função (66º CP), proibição de conduzir veículos com motor (69º CP), proibição
de confiança de menores e inibição de responsabilidades parentais (69º-C CP), proibição de
contacto com a vítima, proibição de uso e porte de armas e obrigação de frequência de
programas específicos de prevenção da violência doméstica (152º, n. 4 e 5 CP), etc.).

2 Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá
preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
3 O tribunal que ordenar o internamento determina, em vez dele, a suspensão da sua execução se for

razoavelmente de esperar que com a suspensão se realize de forma adequada e suficiente a finalidade da medida.
4 É a pena relativamente indeterminada que faz com que o sistema sancionatório português seja um sistema

tendencialmente monista, uma vez que, na fase da sua execução, tem natureza mista ( → ver ponto 8).
5 A medida de segurança de internamento apenas prossegue, de forma autónoma, finalidades de prevenção

especial positiva ( → ver ponto 7).


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2.3.1 Penas principais
No ordenamento jurídico-penal português, existem dois tipos de penas principais:
1) Pena de prisão: A pena de prisão é, por um lado, uma pena única e simples e, por outro
lado, uma pena de duração limitada e definida.
- A pena de prisão é única, porque não existem formas diversificadas da prisão. Isto não
significa, todavia, que não faça sentido6 distinguir vários graus da pena de prisão em função
da sua duração:
-» As penas de prisão de curta duração são inferiores a 1 ano.
-» As penas de prisão de média duração são não-superiores a 5 anos.
-» As penas de prisão de longa duração são superiores a 5 anos.
- A pena de prisão é simples, porque à sua aplicação não se ligam efeitos jurídicos
necessários ou automáticos (30º, n. 4 CRP, conjugado com o artigo 65º, n. 1 CP).
- A pena de prisão é de duração limitada e definida, porque tem a duração mínima de 1 mês
e, em regra, a duração máxima de 20 anos (41º, n. 1 CP). É, porém, permitido um limite
máximo excecional de 25 anos nos casos previstos na lei (41º, n. 2 CP), não podendo este
limite em caso algum ser excedido (41º, n. 3 CP). Isto não significa, todavia, que esta última
disposição legal conceda ao agente um direito a não-permanecer mais do que 25 anos da sua
vida privado da liberdade; significa, antes, que ao agente não pode ser aplicada, numa mesma
condenação, uma pena de prisão de duração superior a 25 anos.
2) Pena de multa: A pena de multa é uma pena não-privativa da liberdade, pelo que o
julgador deve dar-lhe preferência em detrimento da aplicação da pena de prisão sempre que
realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º CP).
São várias as vantagens que a pena de multa apresenta em relação à pena de prisão:
1. Não quebra a ligação do condenado ao seu meio familiar, social, profissional.
2. Permite uma execução mais flexível (pagamento em dinheiro ou em espécie
(substituição por trabalho (48º CP)), diferido ou em prestações (47º, n. 3 CP)).
3. Permite que o produto da multa seja canalizado para a indemnização dos lesados.
4. Permite uma alocação mais eficiente dos recursos para a execução das penas de prisão
e, por consequência, para a integração dos condenados em pena de prisão na sociedade.
No entanto, também apresenta desvantagens:
1. Trata de forma desigual pobres e ricos. Este inconveniente é diminuído, uma vez que o
tribunal determina a pena de multa em função da situação económico-financeira do
condenado e dos seus encargos pessoais (47º, n. 2 CP).
2. Tem reflexos negativos sobre a situação económico-financeira da família do condenado.
Este inconveniente não faz sentido, uma vez que a aplicação de qualquer pena tem reflexos
negativos sobre a família do condenado, sendo que os que resultam da aplicação da pena de
multa serão inferiores aos que resultam da aplicação da pena de prisão.
3. Estimula o condenado à prática de outros crimes para poder pagar a pena de multa. Este
inconveniente é diminuído, uma vez que o tribunal determina a pena de multa em função da
situação económico-financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (47º, n. 2 CP).

6 Faz sentido distinguir vários graus da pena de prisão em função da sua duração:
- As penas de substituição só podem ser aplicadas em vez de penas de prisão de curta e de média duração.
- A dispensa de pena vale, em regra (143º, n. 1 CP), quando em causa estejam penas de prisão de curta duração.
5
4. Tem eficácia político-criminal7 de grau menor em relação à pena de prisão. Este
inconveniente é diminuído, uma vez que o tribunal determina a pena de multa em função da
situação económico-financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (47º, n. 2 CP).
Notas fundamentais:
1) O Código Penal Português prevê a pena de multa principal enquanto pena autónoma
(encontra-se expressamente prevista como consequência jurídica do tipo legal de crime
autónoma da pena de prisão (ex. 250º, n. 1 CP, 268º, n. 3 e 4 CP e 366º, n. 2 CP)) e
enquanto pena alternativa (encontra-se expressamente prevista como consequência
jurídica do tipo legal de crime alternativa à pena de prisão (ex. 143º CP, etc.)), mas já não
enquanto pena complementar (encontrava-se expressamente prevista como consequência
jurídica do tipo legal de crime complementar à pena de prisão).
2) A pena de multa tem a duração mínima de 10 dias e, em regra, a duração máxima de
360 dias (47º, n. 1 CP). É, porém, permitido um limite máximo superior nos casos
previstos na lei (600 dias – 204º, n. 1 CP; 900 dias – 77º, n. 2 CP).

2.3.2 Penas de substituição


No ordenamento jurídico-penal português, existem dois tipos de penas de substituição:
1) Penas de substituição em sentido estrito: As penas de substituição em sentido estrito são
penas não-privativas da liberdade, sendo cumpridas em liberdade, e pressupõem a
determinação da medida concreta da pena de prisão, sendo aplicadas em vez desta (ex. pena
de multa (45º CP), proibição do exercício de profissão, função ou atividade (46º CP),
suspensão da execução da pena de prisão 8 (50º a 57º CP), prestação de trabalho a favor da
comunidade (58º a 59º CP)).
2) Pena de admoestação: A pena de admoestação, que consiste numa solene censura oral
feita ao agente, em audiência, pelo tribunal (60º, n. 4 CP), é uma pena não-privativa da
liberdade e pressupõe a determinação da medida concreta da pena de multa, sendo aplicada
em vez desta (60º CP). Em regra, esta pena de substituição da pena de multa é proferida após
o trânsito em julgado da sentença condenatória; é, porém, proferida de imediato se o
Ministério Público, o arguido e o assistente declararem que renunciam à interposição de
recurso.9
Nota fundamental:
Até 2017, existia um terceiro tipo de penas de substituição, nomeadamente as penas de
substituição privativas da liberdade: o regime de permanência na habitação, a prisão por
dias livres e o regime de semidetenção. No que diz respeito ao regime de semidetenção e
à prisão por dias livres, ambos foram extintos pela falta de condições para a sua execução.
No que diz respeito ao regime de permanência na habitação, foi convertido numa forma
de execução da pena de prisão de duração não-superior a 2 anos (43º a 44º CP).

7 A pena de multa tem eficácia político-criminal quando o agente deixa de poder fazer o que quer para poder
pagar a pena de multa.
8 A suspensão da execução da pena de prisão pode ser simples, com imposição de deveres ( 51º CP), com

imposição de regras de conduta (52º CP) ou com regime de prova (53º CP).
9 Se, por exemplo, o arguido interpusesse recurso da sentença condenatória em pena de admoestação e…:

- …se o tribunal de 2ª instância alterasse a pena de admoestação, haveria violação do artigo 29º, n. 5 CRP.
- …se o tribunal de 2ª instância absolvesse o arguido, este teria sido punido sem haver condenação pela prática
de um crime.
6
2.3.3 Penas acessórias
As penas acessórias aplicam-se por referência ao ilícito-típico praticado, ligam-se à culpa do
agente, justificam-se do ponto de vista preventivo e não podem ser um efeito automático da
aplicação da pena principal ou da pena de substituição cuja fixação pressupõem.
2.4 Tipos de medidas de segurança
No ordenamento jurídico-penal português, existem dois tipos de medidas de segurança:
- Medida de segurança privativa da liberdade: As medidas de segurança privativas da
liberdade são aplicáveis a inimputáveis (ex. internamento (91º CP), suspensão da execução
do internamento (98º CP)).
- Medida de segurança não-privativa da liberdade: As medidas de segurança não-
privativas da liberdade são aplicáveis tanto a inimputáveis, como a imputáveis (ex. interdição
de atividades (100º CP), cassação do título ou da licença e interdição da concessão do título
de condução de veículo com motor ou do título ou licença de pilotagem de aeronaves com ou
sem motor (101º CP), aplicação de regras de conduta (102º CP).

3. Determinação da pena em sentido amplo


A determinação da pena em sentido amplo abrange três operações: a determinação da
moldura da pena (pena aplicável), a determinação concreta da pena (pena aplicada) e a
escolha da pena.10
3.1 Determinação da moldura da pena (pena aplicável)
Num primeiro momento, cabe ao julgador determinar a pena aplicável ao agente da prática do
crime, por via da determinação do tipo legal de crime (1) e da averiguação de circunstâncias
modificativas (atenuantes ou agravantes) (2).
1) Determinação do tipo legal de crime: Primeiro, cabe ao julgador subsumir os factos
dados como provados no processo num determinado tipo legal de crime 11 (ex. A pena
aplicável ao agente da prática do crime de homicídio é de 1 a 6 anos de pena de prisão (164º,
n. 1 CP)).
Nota fundamental:
Se a moldura penal indicar apenas o limite máximo ou apenas o limite mínimo ou se não
indicar qualquer limite, valem os limites previstos nos artigos 41º, n. 1 CP, relativamente
à pena de prisão, e 47º, n. 1 CP, relativamente à pena de multa.

2) Averiguação de circunstâncias modificativas: A moldura penal aplicável resultante da


subsunção dos factos dados como provados no processo num determinado tipo legal de crime
pode ser modificada por efeito de circunstâncias modificativas que tanto podem ser
agravantes (modificam a moldura penal aplicável elevando-a num dos limites ou nos limites
mínimo e máximo (ex. reincidência (75º CP))) ou atenuantes (modificam a moldura penal

10 A escolha da pena é uma operação eventual, podendo ocorrer logo ao nível da determinação da moldura da
pena quando a pena de prisão e a pena de multa se encontram expressamente previstas no tipo legal de crime
enquanto penas alternativas ou depois de determinada a medida concreta da pena principal.
11 O tipo legal de crime pode ser um tipo fundamental (ex. 131º CP), um tipo qualificado (ex. 132º CP) ou um

tipo privilegiado (ex. 133º CP).


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aplicável baixando-a num dos limites ou nos limites mínimo e máximo (ex. tentativa (23º, n.
1 e 2 CP), cumplicidade (27º, n. 2 CP), idade do agente))12 e gerais (aplicam-se a qualquer
tipo legal de crime) ou especiais (aplicam-se apenas a certos tipos legais de crime).

Nota fundamental:
- Em caso de concorrência de circunstâncias modificativas atenuantes e de concorrência
de circunstâncias modificativas agravantes, o julgador deve fazê-las funcionar
sucessivamente (ex. A, jovem adulto, comete um crime, para o qual o Código Penal
Português prevê uma pena de prisão cuja moldura tem um limite máximo de 9 anos. Atua
como cúmplice, sendo que o crime não chegou a consumar-se. Existindo 3 circunstâncias
modificativas atenuantes (idade do agente, cumplicidade e tentativa), o julgador deve
reduzir 1/3 do limite máximo da pena (9 x 1/3 = 3; 9-3 = 6 anos), reduzir 1/3 dos 6 anos
(6 x 1/3 = 2; 6-2 = 4 anos) e reduzir 1/3 dos 4 anos (4 x 1/3 = 1.33; 4-1.33 = 2.67 anos).
- Em caso de concorrência de circunstâncias modificativas atenuantes e agravantes, o
julgador deve, em primeiro lugar, fazer funcionar as circunstâncias modificativas
agravantes e, em segundo lugar, as circunstâncias modificativas atenuantes, exceto em
caso de reincidência, devendo, neste caso, o julgador fazer funcionar primeiro as
circunstâncias modificativas atenuantes e depois a circunstância modificativa agravante .

3) Escolha da pena: Nos casos em que a pena de prisão e a pena de multa se encontrarem
expressamente previstas no tipo legal de crime enquanto penas alternativas e esta última
realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º CP, conjugado com o
artigo 40º, n. 1 CP), o julgador deverá dar-lhe preferência e fundamentar a não-aplicação da
pena privativa da liberdade e a aplicação da pena não-privativa da liberdade (→ ver ponto 5).
3.2.1 Determinação concreta da pena de prisão (pena aplicada)
Num segundo momento, nos casos em que o julgador optou pela aplicação da pena de prisão,
cabe-lhe determinar a pena que será concretamente aplicada ao agente da prática do crime.
1) Critérios de determinação concreta da pena: De acordo com o artigo 71º, n. 1 CP,
conjugado com o artigo 40º, n. 1 e 2 CP, a determinação concreta da pena de prisão, dentro
dos limites da moldura penal aplicável, é feita em função da culpa do agente (a culpa é
pressuposto e limite inultrapassável da pena) e das exigências de prevenção geral e especial
positivas (manutenção da paz social e da confiança da generalidade dos membros da
comunidade na força do ordenamento jurídico-penal, sempre que é abalado pela prática de
crimes e correção do agente por forma a que seja possível integrá-lo na comunidade à qual
pertence). A este propósito, o Curso adere à teoria da moldura da prevenção, segundo a qual
a medida concreta da pena é dada pela medida da necessidade de proteção de bens jurídicos
que fornece ao julgador uma moldura da prevenção, cujo limite mínimo é composto pelo
ponto abaixo do qual se põe em causa a proteção de bens jurídicos e cujo limite máximo é
composto pelo ponto ótimo de proteção de bens jurídicos. A moldura da prevenção a que se
chega é limitada pela culpa do agente que, por ser o limite inultrapassável da pena, fornece o
limite máximo da medida concreta da pena. Por fim, o julgador determina a pena que
concretamente será aplicada ao agente da prática do crime, atendendo à necessidade de
reintegração do agente na sociedade (ex. Determinada a moldura penal aplicável ao agente da

12 Para as circunstâncias modificativas atenuantes vale o disposto no artigo 73º CP.


8
prática do crime de homicídio (8 a 16 anos), o julgador constrói a moldura da prevenção,
atendendo às exigências de prevenção geral positiva (9 a 15 anos). A moldura da prevenção a
que se chega é limitada pela culpa do agente que fornece o limite máximo da medida da pena
(9 a 13 anos). Por fim, o julgador determina a medida concreta da pena aplicada ao agente da
prática do crime, atendendo às exigências de prevenção especial positiva (11 anos)).
Nota fundamental:
Para além da teoria da moldura da prevenção, existem outras teorias que versam sobre a
relação entre a culpa do agente e as exigências de prevenção, dentre as quais se destaca a
teoria do espaço de liberdade ou moldura da culpa, defendida por Roxin. Para esta
teoria, a medida concreta da pena é dada pela medida da culpa que fornece ao julgador
uma moldura da culpa, cujo limite mínimo é composto pela pena que já se revela
adequada à culpa e cujo limite máximo é composto pela pena que ainda se revela
adequada à culpa. Qualquer pena dentro desta moldura satisfaz as exigências de
prevenção geral positiva, sendo a pena que concretamente será aplicada ao agente da
prática do crime determinada atendendo às exigências de prevenção especial.
Observações críticas: Por um lado, esta teoria relega para segundo plano as exigências
de prevenção, contrariamente ao disposto no artigo 40º, n. 1 CP. Por outro lado, esta
teoria contraria a ideia de que a culpa é apenas pressuposto e limite inultrapassável da
pena, contrariamente ao disposto no artigo 40º, n. 2 CP.

2) Fatores de medida da pena e princípio da proibição da dupla-valoração:


- De acordo com o artigo 71º, n. 2 CP, na determinação concreta da pena, o julgador atende a
todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente
ou contra ele, procedendo depois a uma exemplificação de fatores de medida da pena. Estes
fatores podem ser agrupados em fatores relativos à execução do facto (alíneas a) a c)),
fatores relativos à personalidade do agente (alíneas d) e f)) e fatores relativos à conduta do
agente (alínea e)). Estes fatores são duplamente ambivalentes: Por um lado, podem relevar
tanto para a culpa do agente, como para as exigências de prevenção, exceto a conduta
posterior ao facto que só pode relevar para as exigências de prevenção 13 (ex. Depois de A ter
destruído o jardim de B, resolveu arranjá-lo e colocá-lo no estado em que se encontrava antes
da prática do facto. Apesar de A ser condenado pela prática de um crime de dano, a
circunstância de ter arranjado e colocado o jardim no estado em que se encontrava antes da
prática do facto relevará a favor do agente ao nível da determinação concreta da pena). Por
outro lado, um mesmo fator pode servir para agravar a culpa do agente e atenuar as
exigências de prevenção ou atenuar a culpa do agente e agravar as exigências de prevenção.
- De acordo com o artigo 71º, n. 2 CP, na determinação da medida concreta da pena o
julgador não atende às circunstâncias que façam já parte do tipo de crime. É o princípio da
proibição da dupla-valoração, segundo o qual o julgador não pode utilizar para determinar a
medida concreta da pena as circunstâncias que o legislador já tenha tido em consideração ao
construir a moldura da pena (ex. O julgador subsume os factos dados como provados no

13A confissão do arguido releva a favor dele para as exigências de prevenção. O silêncio do arguido não é um
fator de medida da pena e, portanto, não releva – é, antes, um direito do arguido, pois “ninguém é obrigado a
cavar a sua própria sepultura”. A falta de arrependimento do arguido por se ter remetido ao silêncio não é um
fator de medida da pena e, portanto, não releva – do silêncio do arguido não se pode concluir que há ou não falta
de arrependimento.
9
processo no crime de ofensa à integridade física grave pelo facto de o agente ter privado a
vítima de importante membro. Determinada a moldura penal aplicável, o julgador não pode
utilizar para determinar a medida concreta da pena a circunstância de o agente ter privado a
vítima de importante membro, pois tal já foi tido em consideração ao nível da determinação
da moldura da pena. Pode o julgador, todavia, utilizar para determinar a medida concreta da
pena a circunstância de o agente ter privado a vítima da mão direita, sendo ela destra).
3) Fundamentação da medida da pena: De acordo com o artigo 71º, n. 3 CP, na sentença
condenatória são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena.
3.2.2 Determinação concreta da pena de multa (pena aplicada)
Num segundo momento, nos casos em que o julgador optou pela aplicação da pena de multa,
cabe-lhe determinar a pena que concretamente será aplicada ao agente da prática do crime. A
este propósito, o Direito Penal Português consagra o sistema dos dias de multa que abrange
três operações:
1) Determinação do número de dias de multa: De acordo com o artigo 47º, n. 1 CP, a
determinação concreta da pena de multa, dentro dos limites da moldura penal aplicável, é
feita em função dos critérios gerais de determinação concreta da pena (culpa do agente e
exigências de prevenção geral e especial positivas) previstos no artigo 71º, n. 1 CP e
atendendo aos fatores de medida da pena enunciados no artigo 71º, n. 2 CP.
2) Determinação do quantitativo diário: De acordo com o artigo 47º, n. 2 CP, cada dia de
multa corresponde a uma quantia entre 5€ e 500€ que o julgador determina em função da
situação económico-financeira do condenado e dos seus encargos pessoais. 14
3) Determinação da forma de pagamento da multa: De acordo com o artigo 47º, n. 3 CP,
para além de o condenado poder pagar a multa logo após o trânsito em julgado da sentença
condenatória, o tribunal pode, sempre que a situação económico-financeira do condenado o
justificar, autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda 1 ano
(pagamento diferido) ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir
além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação. De acordo com o
artigo 48º, n. 1 CP, para além de o condenado poder pagar a multa em dinheiro, o tribunal
pode, a requerimento do condenado, ordenar que a pena de multa fixada seja total ou
parcialmente substituída por dias de trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do
Estado ou de outras pessoas coletivas de Direito Público, ou ainda de instituições particulares
de solidariedade social, quando concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma
adequada e suficiente as finalidades da punição.

14Quando se aplica uma pena de multa a pessoas carentes de rendimentos próprios (ex. estudantes,
desempregados não-beneficiários de subsídio de desemprego), há que considerar aquilo de que possam dispor
para proveito pessoal (ex. mesada, etc.). Quando se aplica uma pena de multa a pessoas que vivam no mínimo
existencial ou abaixo dele (ex. desempregados beneficiários de subsídio social de desemprego ou de rendimento
social de inserção), resta ao julgador fixar o quantitativo diário no mínimo legal (5€), converter a pena de multa
em prisão subsidiária, suspender a sua execução e impor ao condenado o cumprimento de deveres ou regras de
conduta de conteúdo não-económico ou financeiro (49º, n. 1 e 3 CP). Entende-se que assim o seja, uma vez que
não é admissível deixar de aplicar uma pena de multa a condenado que, por razões que lhe não são imputáveis,
não pode pagar o quantitativo mínimo diário, em respeito pelo princípio da igualdade (13º, n. 2 CRP).
10
4. Casos especiais de determinação da pena
Estudado o processo “normal” de determinação da pena, importa agora analisar os casos em
que o processo de determinação da pena se rege por critérios especiais.
4.1 Reincidência
A reincidência é uma circunstância modificativa agravante que se justifica por uma maior
culpa do agente (por este ter desrespeitado a solene advertência contra o crime contida na
condenação anterior) e por exigências acrescidas de prevenção (por haver indícios de uma
maior perigosidade do agente).
4.1.1 Pressupostos da reincidência
Para que se esteja perante uma situação de reincidência, exige-se a verificação cumulativa de
quatro pressupostos formais e de um pressuposto material (75º CP):
1) Crimes dolosos: É necessário que estejam em causa, pelo menos, dois crimes dolosos (o
anterior pelo qual o agente foi julgado, condenado e punido e o novo pelo qual está a ser
julgado). Tal deve-se ao facto de só relativamente a crimes dolosos se justificar o juízo ético-
jurídico de censura que recai sobre o agente da prática do crime por ter desrespeitado a solene
advertência contra o crime contida na condenação anterior.
2) Crime anterior e novo crime punidos com pena de prisão efetiva superior a 6 meses:
É necessário que o crime anterior tenha sido punido com pena de prisão efetiva superior a 6
meses e que o novo crime deva ser punido com pena de prisão efetiva superior a 6 meses.
Algumas notas:
- Este pressuposto formal não está preenchido quando o agente tenha cumprido pena de
prisão na sequência da revogação da pena de substituição.
- Este pressuposto formal está preenchido quando o agente tenha sido ou deva ser punido
com pena de prisão superior a 6 meses e não-superior a 2 anos que tenha sido ou deva ser
executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização de meios técnicos de
controlo à distância (43º, n. 1, als. a) e b) CP).
- Este pressuposto formal está preenchido mesmo quando o agente tenha sido julgado,
condenado e punido por sentença transitada em julgado em pena de prisão efetiva superior a
6 meses, que cumpriu de forma parcial, e esteja a ser julgado pela prática de um novo crime
que deva ser punido com pena de prisão efetiva superior a 6 meses (75º, n. 4 CP) (ex. A foi
punido por sentença transitada em julgado em pena de prisão efetiva superior a 6 meses, mas
houve uma prescrição da pena/uma amnistia/um perdão genérico/um indulto).
3) Trânsito em julgado da condenação pelo crime anterior: É necessário que a
condenação pela prática do crime anterior tenha transitado em julgado 15.
4) Decurso de menos de 5 anos entre a prática do crime anterior e a prática do novo
crime: É necessário que entre a prática do crime anterior e a prática do novo crime não
tenham decorrido mais de 5 anos (75º, n. 2, 1ª parte CP). Na posição do Curso, faria sentido
que se passasse a exigir que entre o trânsito em julgado da sentença condenatória pela prática
do crime anterior e a prática do novo crime não tenham decorrido mais de 5 anos, por ser

15A sentença transitada em julgado é insuscetível de recurso ou, sendo suscetível de recurso, já tenha expirado o
prazo para a interposição de recurso.
11
naquele momento que o agente é advertido contra o crime. Neste prazo de 5 anos não é
computado o tempo durante o qual o agente tenha cumprido medida processual, pena ou
medida de segurança privativas da liberdade (75º, n. 2, 2ª parte CP), uma vez que não se
pode afirmar que o agente, durante o período em que esteve privado da liberdade – seja em
meio prisional, seja em regime de permanência na habitação, seja em liberdade condicional,
seja em liberdade para prova –, respeitou a solene advertência contra o crime, pois o respeito
pela solene advertência contra o crime só pode ser apurado em liberdade.
5) Conexão íntima entre o crime anterior e o novo crime: É necessário que, de acordo com
as circunstâncias do caso, o agente for de censurar por a condenação ou as condenações
anteriores não lhe terem servido de suficiente advertência contra o crime. Este juízo só é
possível se entre o crime anterior e o novo crime existir uma conexão íntima (ex. A foi
condenado por sentença transitada em julgado em pena de prisão efetiva superior a 6 meses
pela prática de um crime doloso de burla e, não tendo decorrido ainda 5 anos sobre a prática
deste crime, praticou um novo crime de homicídio. Neste caso, não se pode afirmar que o
agente desrespeitou a solene advertência contra o crime (de burla!) contida na condenação
anterior, pois não existe entre o crime de burla e o crime de homicídio uma conexão íntima).
4.1.2 Operações de determinação da pena em caso de reincidência
A determinação da pena em caso de reincidência abrange quatro operações:
1) Determinação concreta da pena se o agente não fosse reincidente: Primeiro, cabe ao
julgador determinar a pena que concretamente caberia ao agente se ele não fosse reincidente,
seguindo o procedimento “normal” de determinação da pena (ex. 3 anos). Trata-se de uma
operação duplamente instrumental 16: Por um lado, serve para verificar se o novo crime é
punido com pena de prisão efetiva superior a 6 meses. Por outro lado, serve para tornar
possível a quarta operação de determinação da pena em caso de reincidência.
2) Determinação da moldura penal da reincidência: Segundo, cabe ao julgador construir a
moldura penal da reincidência que tem como limite mínimo o limite mínimo da moldura
penal aplicável elevado de um terço (ex. 3 a 10 anos → 3 x 1/3 = 1; 3+1 = 4 anos) e como
limite máximo o limite máximo da moldura penal aplicável (ex. 10 anos) (76º, n. 2 CP).

Nota fundamental:
Em caso de concorrência de circunstância modificativa atenuante e da reincidência, o
julgador deve, em primeiro lugar, fazer funcionar a circunstância modificativa atenuante
e, em segundo lugar, a reincidência.

3) Determinação concreta da pena da reincidência: Terceiro, cabe ao julgador determinar


a medida concreta da pena da reincidência, de acordo com os critérios de determinação
concreta da pena previstos no artigo 71º, n. 1 CP e atendendo aos fatores de medida da pena
enunciados no artigo 71º, n. 2 CP (ex. 5 anos).
4) Comparação entre a primeira e a terceira operações: Quarto, cabe ao julgador
comparar a pena que concretamente caberia ao agente se ele não fosse reincidente (3 anos)
com a pena que lhe é aplicada por ser reincidente (5 anos). Em nome de uma ideia de

16O caráter duplamente instrumental da primeira operação de determinação da pena em caso de reincidência
garante a observância do princípio da proibição da dupla -valoração.
12
proporcionalidade, a agravação da pena não pode exceder a medida da pena mais grave
aplicada nas condenações anteriores (ex. A agravação é de 2 anos. Imagine-se que a medida
concreta da pena mais grave aplicada nas condenações anteriores foi de 10 meses. Neste caso,
a agravação não pode exceder os 10 meses).17
4.2 Concurso (verdadeiro ou efetivo) de crimes
4.2.1 Pressuposto do concurso (verdadeiro ou efetivo) de crimes
Para que se esteja perante uma situação de concurso (verdadeiro ou efetivo) de crimes, exige-
se que o agente pratique vários crimes – mais do que um crime (ex. A furta a carteira de B e
mata C) ou várias vezes o mesmo crime (ex. A mata duas pessoas) (30º, n. 1 CP) – antes de
transitar em julgado a condenação por qualquer deles (77º, n. 1 CP).
4.2.2 Sistemas de acumulação
Existem vários sistemas de acumulação possíveis:
- Sistema de acumulação material: Segundo o sistema de acumulação material, o julgador
determina a pena concreta cabida a cada crime em concurso (penas parcelares) e executa-as.
- Sistema de pena única: Segundo o sistema de pena única, o julgador determina uma única
pena cabida a todos os crimes em concurso. Este sistema divide-se em dois subsistemas:
-» Sistema de pena única unitária: Segundo o sistema de pena única unitária, o julgador
determina uma única pena, ficcionando que existe apenas um crime.
-» Sistema de pena única conjunta: Segundo o sistema de pena única conjunta, o julgador
determina a pena concreta cabida a cada crime em concurso e transforma-as numa pena
única, de acordo com um dos seguintes princípios:
1. Princípio da absorção: De acordo com o princípio da absorção, o julgador determina
a pena concreta cabida a cada crime em concurso e condena o agente na pena concreta mais
grave. Problema: impunidade dos crimes aos quais correspondem penas menos graves.
2. Princípio da exasperação: De acordo com o princípio da exasperação, o julgador
condena o agente na pena concreta determinada dentro da moldura penal correspondente ao
crime mais grave. Problema: o sistema deixa de funcionar quanto maior for o número de
crimes em concurso.
3. Princípio do cúmulo jurídico, adotado pelo Direito Penal Português (77º, n. 1, 1ª
parte CP).
4.2.3 Operações de determinação da pena em caso de concurso de crimes
A determinação da pena única conjunta abrange três operações:
1) Determinação concreta das penas parcelares: Primeiro, cabe ao julgador determinar a
medida concreta da pena cabida a cada um dos crimes em concurso (penas parcelares),
seguindo o procedimento “normal” de determinação da pena (ex. 16 e 18 anos).
2) Determinação da moldura penal do concurso de crimes: Segundo, cabe ao julgador
construir a moldura penal do concurso de crimes:
- Quando em causa estejam penas parcelares da mesma natureza (todas de prisão ou todas
de multa), a moldura penal do concurso de crimes tem como limite mínimo a pena mais

17Esta operação permite que ao agente seja aplicada uma pena inferior ao limite mínimo da moldura da
reincidência, não podendo nunca ser inferior ao limite mínimo da moldura da pena aplicável.
13
elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite máximo a soma
das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos
(tratando-se de pena de prisão) ou 900 dias (tratando-se de pena de multa) (77º, n. 2 CP) (ex.
18 e 25 anos).
- Quando em causa estejam penas parcelares de natureza diferente (umas de prisão e
outras de multa), “a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da
aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores” (77º, n. 3 CP). Isto significa
que cabe ao julgador determinar a medida concreta das penas parcelares, converter a pena
parcelar de multa em prisão subsidiária (49º, n. 1 CP) e construir a moldura penal do
concurso de crimes (77º, n. 2 CP) dentro da qual será determinada a medida concreta da pena
única conjunta. O condenado poderá, contudo, optar por pagar a pena parcelar de multa,
evitando que esta se repercuta na determinação concreta da pena única conjunta.
3) Determinação concreta da pena única conjunta: Terceiro, cabe ao julgador determinar a
medida concreta da pena única conjunta, sendo essa determinação feita em função dos
critérios gerais da culpa do agente e das exigências de prevenção geral e especial positivas
(71º, n. 1 CP) e do critério especial da consideração, em conjunto18, dos factos e da
personalidade do agente (77º, n. 1, 2ª parte CP). Algumas notas:
- O julgador poderá ainda substituir a pena única conjunta de curta ou de média duração
por uma pena de substituição.
- O julgador poderá ainda decidir executar a pena única conjunta de duração não-superior
a 2 anos em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de
controlo à distância.
- O julgador poderá ainda juntar à pena única conjunta uma pena acessória ou uma medida
de segurança não-privativa da liberdade (77º, n. 4 CP).
4.2.4 Determinação superveniente da pena única conjunta
As situações da vida mostram que os vários crimes que o agente pratica nem sempre são
conhecidos ao mesmo tempo, seja por um funcionamento deficiente do sistema de
administração da justiça, seja pelos limites à conexão de processos. Para colmatar tais
inconvenientes, o artigo 78º CP permite que a pena única conjunta seja supervenientemente
determinada. Para tal, exige-se a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
1) Prática de outro crime anteriormente à condenação: É necessário que o crime de que
haja só agora conhecimento tenha sido praticado antes da condenação anteriormente
proferida. Não é este, porém, o entendimento do STJ que, através do acórdão n. 9/2016, de
28 de Abril, decidiu que é necessário que o crime de que haja só agora conhecimento tenha
sido praticado antes do trânsito em julgado da condenação.19

18 A consideração, em conjunto, dos factos e da personalidade do agente ao nível da determinação concreta da


pena única conjunta garante a observância do princípio da proibição da dupla -valoração.
19 É de criticar este entendimento por parte do STJ, essencialmente por duas razões:

- Por um lado, não tem em consideração a razão de ser do artigo 78º CP que serve para colmatar o
funcionamento deficiente do sistema de administração da justiça e os limites à conexão de processos.
- Por outro lado, leva à impunidade dos crimes que o agente pratique entre a condenação e o trânsito em julgado
da mesma por força do limite máximo da pena única conjunta (ex. A é julgado e condenado pela prática do
crime X e a sentença condenatória transita em julgado. No entanto, o julgador conhece, já depois do trânsito em
14
2) Trânsito em julgado da condenação: É necessário que as condenações pelo crime
anterior e pelo crime de que só agora haja conhecimento tenham transitado em julgado (78º,
n. 2 CP).
3) Desconto da pena parcialmente cumprida: É necessário que a pena aplicada ao agente
por sentença condenatória transitada em julgado ainda não esteja totalmente cumprida,
prescrita ou extinta, sendo o tempo da pena que já tiver sido cumprida descontado no tempo
de cumprimento da pena única conjunta supervenientemente determinada (ex. A é condenado
em pena de prisão de 10 anos. Cumpriu 5. Vem-se a descobrir que anteriormente àquela
condenação tinha cometido outro crime. Neste caso, admite-se a determinação superveniente
da pena do concurso, sendo os 5 anos descontados no cumprimento da pena única conjunta).
A determinação superveniente da pena única conjunta é feita nos seguintes moldes:
- Se a condenação anteriormente proferida tiver sido uma condenação por um crime singular,
o julgador determina supervenientemente a pena única conjunta, de acordo com as regras da
punição do concurso de crimes (77º CP).
- Se a condenação anteriormente proferida tiver sido uma condenação por concurso de
crimes, o julgador anula a pena única conjunta e determina supervenientemente uma nova
pena única conjunta, de acordo com as regras da punição do concurso de crimes (77º CP).
- Se a condenação anteriormente proferida tiver sido uma condenação por um crime singular
ou por concurso de crimes e a pena de prisão ou a pena única conjunta aplicada tiver sido
substituída, o julgador revoga a pena de substituição e determina supervenientemente a pena
única conjunta, de acordo com as regras da punição do concurso de crimes (77º CP).
4.2.5 Crime continuado
O crime continuado encontra-se previsto no artigo 30º, n. 2 CP, segundo o qual constitui um
só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime
que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente
homogénea e no quadro de um circunstancialismo externo que arrasta o agente para a prática
de vários crimes e, por essa razão, diminui consideravelmente a sua culpa (ex. A, caixa do
banco, recebe uma conta para pagar. Estando rodeado de dinheiro, tem a tentação de retirar
dinheiro para poder pagar tal conta. “É só hoje e, mal recebo o meu salário, reponho o que
tirei”, pensa ele. Ao fim de 4 dias, surge outra conta para pagar. A volta a ter a tentação de
retirar mais dinheiro para pagar essa conta. Neste caso, está-se perante uma situação de
concurso de crimes no quadro de um circunstancialismo externo – a circunstância de o
dinheiro estar à disposição de A – que arrasta o agente para a prática de vários crimes e, por
essa razão, diminui consideravelmente a sua culpa).
De acordo com o artigo 79º, n. 1 CP, o crime continuado é punível com a pena aplicável à
conduta mais grave que integra a continuação. Isto significa que o julgador determina a
medida concreta da pena do crime continuado, de acordo com o princípio da exasperação,
sendo o agente condenado na pena concreta determinada dentro da moldura penal

julgado daquela sentença, que A tinha praticado outro crime antes daquela condenação. Se esta “condenação”
fosse “condenação transitada em julgado”, e tendo em conta que o julgador não pode determinar
supervenientemente uma pena única conjunta cujo limite máximo vá além dos 25 anos de prisão, permitir -se-ia
que o agente ficasse com “carta branca” para praticar crimes sem ser punidos pelos mesmos).
15
correspondente ao crime mais grave. Algumas notas:
- Ainda que o julgador não conheça todos os crimes que integram a continuação, o efeito
do caso julgado estende-se a todos eles (ex. A cometeu 6000 crimes e já depois de julgado e
condenado por crime continuado descobre-se que, afinal, não eram 6000, mas antes 32000. O
efeito do caso julgado estende-se também aos 28000 crimes). No entanto, o artigo 79º, n. 2
CP veio diminuir esta vantagem processual, dizendo que se, depois de uma condenação
transitada em julgado, for conhecida uma conduta mais grave que integre a continuação, a
pena que lhe for aplicável substitui a anterior.
- A doutrina e a jurisprudência portuguesas entenderam sempre, sem divergências, que o
instituto do crime continuado não vale quando em causa estejam crimes praticados contra
bens jurídicos eminentemente pessoais, exceto se a vítima fosse a mesma (ex. violência
doméstica). A certo momento, contudo, colocou-se a questão de saber se o instituto do crime
continuado poderia ou não valer quando em causa estivessem crimes praticados contra a
liberdade e a autodeterminação sexuais de uma mesma criança. A este propósito, entendeu-se
que, nestes casos, o instituto do crime continuado não poderia valer, uma vez que os vários
crimes não foram praticados no quadro de um circunstancialismo externo que diminui
consideravelmente a culpa do agente, mas antes no quadro de um circunstancialismo externo
que aumenta consideravelmente a culpa do agente! Hoje, o artigo 30º, n. 3 CP diz apenas que
o instituto do crime continuado não vale quando em causa estejam crimes praticados contra
bens jurídicos eminentemente pessoais, independentemente de a vítima ser ou não a mesma.
4.3 Desconto
4.3.1 Medidas processuais privativas da liberdade
- De acordo com o artigo 80º, n. 1 CP, a detenção, a prisão preventiva e a obrigação de
permanência na habitação sofridas pelo arguido são descontadas por inteiro no cumprimento
da pena de prisão em que o agente venha a ser condenado.
- De acordo com o artigo 80º, n. 2 CP, a detenção, a prisão preventiva e a obrigação de
permanência na habitação sofridas pelo arguido são descontadas à razão de 1 dia de privação
da liberdade por, pelo menos, 1 dia de multa no cumprimento da pena de multa em que o
agente venha a ser condenado.
4.3.2 Pena anterior
- De acordo com o artigo 81º, n. 1 CP, a pena aplicada por sentença transitada em julgado é
descontada por inteiro no cumprimento da pena que posteriormente a substitua (tratando-se
de penas da mesma natureza).
- De acordo com o artigo 81º, n. 2 CP, a pena aplicada por sentença transitada em julgado é
descontada equitativamente no cumprimento da pena que posteriormente a substitua
(tratando-se de penas de natureza diferente).
Nota fundamental:
O desconto é feito depois da operação da escolha da pena, aplicando-se igualmente às
penas de substituição (ex. A esteve 2 anos em prisão preventiva e o julgador substituiu a
pena de prisão pela suspensão da sua execução. No cumprimento desta pena é descontada
a prisão preventiva sofrida por A).

16
4.4 Atenuação especial da pena
De acordo com o artigo 72º, n. 1 CP, o tribunal atenua especialmente a pena, para além dos
casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou
posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude
do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena. Para efeito deste disposto, são
consideradas, entre outras, as circunstâncias enunciadas no artigo 72º, n. 2 CP.
De acordo com o artigo 73º, n. 1 CP, sempre que houver lugar à atenuação especial da pena:
- Tratando-se de pena de prisão, o limite máximo é reduzido de um terço e o limite mínimo
é reduzido a um quinto se for igual ou superior a 3 anos e ao mínimo legal (ou seja, a 1 mês
(41º, n. 1 CP)) se for inferior a 3 anos (als. a) e b)).
- Tratando-se de pena de multa, o limite máximo é reduzido de um terço e o limite mínimo é
reduzido ao mínimo legal (ou seja, a 10 dias (47º, n. 1 CP)) (al. c)).
De acordo com o artigo 73º, n. 2 CP, a pena que for concretamente determinada dentro da
moldura penal especialmente atenuada pode ainda vir a ser substituída.
4.5 Dispensa de pena
Apesar de o agente praticar um facto ilícito-típico e ser declarado culpado, o tribunal pode
dispensá-lo de pena, em respeito pelo princípio da necessidade da intervenção penal (18º, n. 2
CRP, conjugado com o artigo 40º, n. 1 CP). Para que se esteja perante uma situação de
dispensa de pena, exige-se a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
1) Limite máximo do crime: É necessário que o crime seja punível com pena de prisão de
duração não-superior a 6 meses ou com pena de multa de duração não-superior a 120 dias
(74º, n. 1 CP).
2) Ilicitude do facto e culpa do agente diminutas: É necessário que a ilicitude do facto e a
culpa do agente sejam diminutas (74º, n. 1, al. a) CP).
3) Reparação do dano: É necessário que o dano tenha sido reparado ou esteja em vias de
reparação, caso em que o julgador pode adiar a sentença para reapreciação do caso dentro de
1 ano (74º, n. 1, al. b) e n. 2 CP).
4) Inexistência de exigências de prevenção: É necessário que à dispensa de pena não se
oponham razões de prevenção (74º, n. 1, al. c) CP).
Notas fundamentais:
- A sentença que dispensa o agente de pena é uma sentença condenatória.
- A sentença condenatória que dispensa o agente de pena é inscrita no registo criminal.
- Apesar de se dispensar o agente de pena, podem ser-lhe aplicadas outras consequências
jurídicas do crime (ex. perda de instrumentos, produtos e vantagens (109º a 112º-A CP)).
- Apesar de se dispensar o agente de pena, pode ser-lhe aplicada uma pena acessória –
nomeadamente a proibição do exercício de função quando se trata de crime de
recebimento ou oferta indevidos de vantagem ou de corrupção (66º, n. 1 CP).

5. Escolha da pena e penas de substituição


A determinação da pena em sentido amplo completa-se com a operação eventual da escolha
da pena que tanto pode ocorrer ao nível da determinação da moldura da pena (neste caso, a

17
escolha é entre a pena de prisão e a pena de multa principal), como depois da
determinação concreta da pena (neste caso, a escolha é entre a pena de prisão e a pena de
multa de substituição, a pena de proibição do exercício de profissão, função ou atividade, a
pena de suspensão da execução da pena de prisão ou a pena de prestação de trabalho a favor
da comunidade ou entre a pena de multa principal e a pena de admoestação).
5.1 Escolha da pena alternativa e da pena de substituição
1) Escolha da pena alternativa: Nos casos em que a pena de prisão e a pena de multa se
encontrarem expressamente previstas no tipo legal de crime enquanto penas alternativas e
esta última realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º CP,
conjugado com o artigo 40º, n. 1 CP), o julgador deverá dar-lhe preferência20 e fundamentar
a não-aplicação da pena privativa da liberdade e a aplicação da pena não-privativa da
liberdade.
2) Escolha da pena de substituição: Nos casos em que, depois de determinada a pena que
concretamente será aplicada ao agente da prática do crime, o julgador chega a uma pena de
prisão em medida não-superior a 5 anos ou a uma pena de multa principal em medida não-
superior a 240 dias e as respetivas penas de substituição realizarem de forma adequada e
suficiente as finalidades da punição (70º CP, conjugado com o artigo 40º, n. 1 CP), deverá
dar-lhes preferência20 e fundamentar a não-aplicação daquelas penas principais e a aplicação
destas penas de substituição.

Nota fundamental:
Tendo em consideração o critério de escolha da pena alternativa e da pena de substituição
é composto pelas exigências de prevenção geral e especial positivas (40º, n. 1 CP),
importa sublinhar duas notas:
- Por um lado, ainda que a pena alternativa ou a pena de substituição realize de forma
adequada e suficiente as exigências de prevenção especial positiva, o julgador não deve
dar-lhes preferência se elas não realizarem de forma adequada e suficiente as exigências
de prevenção geral positiva.
- Por outro lado, quando são várias as penas de substituição que realizam de forma
adequada e suficiente as exigências de prevenção geral positiva, o julgador deve dar
preferência àquela que realize de forma mais adequada e suficiente as exigências de
prevenção especial positiva.

5.2 Regime geral das penas de substituição da pena de prisão


5.2.1 Determinação concreta das penas de substituição da pena de prisão
- Pena de multa de substituição: De acordo com o artigo 45º, n. 1 CP, sempre que o
julgador concluir que por meio da substituição da pena de prisão em medida não-superior a 1

20O critério de escolha da pena de multa principal em detrimento da pena de prisão é o da conveniência da
pena, enquanto que o critério de escolha da pena de multa de substituição em detrimento da pena de prisão é o
da necessidade da pena. Tal explica o facto de o julgador poder, ao nível da determinação da moldura da pena,
escolher a pena de prisão em detrimento da pena de multa principal – a pena de prisão pode revelar-se mais
conveniente, pois o julgador poderá ter um leque mais alargado de penas de substituição – e, depois de
determinada a medida concreta da pena de prisão, acabar por escolher a pena de multa de substituição – a pena
de prisão pode revelar-se desnecessária, pois a pena de multa de substituição realiza de forma adequada e
suficiente as finalidades da punição.
18
ano por pena de multa de substituição se realizam de forma adequada e suficiente as
finalidades da punição (70º CP, conjugado com o artigo 40º, n. 1 CP), aquela é substituída
por esta. A medida concreta da pena de multa de substituição é determinada dentro de uma
moldura de 10 dias a 360 dias, de acordo com os critérios de determinação concreta da pena
previstos no artigo 71º, n. 1 CP e atendendo aos fatores de medida da pena enunciados no
artigo 71º, n. 2 CP. Cada dia de multa corresponde a uma quantia de 5€ a 500€ que o julgador
fixa em função da situação económico-financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
É este o sentido da remissão do artigo 45º, n. 1, 2ª parte CP para o artigo 47º CP.
- Pena de proibição do exercício de profissão, função ou atividade: De acordo com o
artigo 46º, n. 1 CP, sempre que o julgador concluir que por meio da substituição da pena de
prisão em medida não-superior a 3 anos por pena de proibição do exercício de profissão,
função ou atividade se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º
CP, conjugado com o artigo 40º, n. 1 CP), aquela é substituída por esta. A medida concreta da
pena de proibição do exercício de profissão, função ou atividade é determinada dentro de
uma moldura de 2 a 8 anos, de acordo com os critérios de determinação concreta da pena
previstos no artigo 71º, n. 1 CP e atendendo aos fatores de medida da pena enunciados no
artigo 71º, n. 2 CP.
- Pena de suspensão da execução da pena de prisão: De acordo com o artigo 50º CP,
sempre que o julgador concluir que por meio da substituição da pena de prisão em medida
não-superior a 5 anos por pena de suspensão da execução da pena de prisão se realizam de
forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º CP, conjugado com o artigo 40º,
n. 1 CP), aquela é substituída por esta. A medida concreta da pena de suspensão da execução
da pena de prisão é determinada dentro de uma moldura de 1 a 5 anos, de acordo com os
critérios de determinação concreta da pena previstos no artigo 71º, n. 1 CP e atendendo aos
fatores de medida da pena enunciados no artigo 71º, n. 2 CP.
- Pena de prestação de trabalho a favor da comunidade: De acordo com o artigo 58º CP,
sempre que o julgador concluir que por meio da substituição da pena de prisão em medida
não-superior a 2 anos por pena de prestação de trabalho a favor da comunidade se realizam de
forma adequada e suficiente as finalidades da punição (70º CP, conjugado com o artigo 40º,
n. 1 CP), aquela é substituída por esta. Cada dia de prisão é substituído por uma hora de
trabalho, no máximo de 480h.

Nota fundamental:
A medida concreta de todas as penas de substituição da pena de prisão é determinada de
forma autónoma, exceto aquela da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

5.2.2 Incumprimento da pena de substituição da pena de prisão


- Pena de multa de substituição: De acordo com o artigo 45º, n. 2 CP, o incumprimento da
pena de multa de substituição importa o cumprimento integral da pena de prisão que se quis
substituir (45º, n. 2 CP).
- Pena de proibição do exercício de profissão, função ou atividade: De acordo com o
artigo 46º, n. 3 CP, o incumprimento da pena de proibição do exercício de profissão, função
ou atividade importa a sua revogação e o cumprimento da pena de prisão que se quis
substituir, sendo descontado neste o tempo de proibição já cumprido (46º, n. 5 CP).
- Pena de suspensão da execução da pena de prisão: De acordo com o artigo 56º CP, o
19
incumprimento da pena de suspensão da execução da pena de prisão importa a sua revogação
e o cumprimento integral da pena de prisão que se quis substituir.
- Pena de prestação de trabalho a favor da comunidade: De acordo com o artigo 58º, n. 2
CP, o incumprimento da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade importa a sua
revogação e o cumprimento da pena de prisão que se quis substituir, sendo descontado neste
os dias de trabalho já prestados (59º, n. 2 CP).

6. Execução das penas de prisão, de multa principal e de substituição


6.1 Execução da pena de prisão
Determinada a pena de prisão em que o agente da prática do crime deverá ser condenado,
segue-se a fase da sua execução.
6.1.1 Regime de permanência na habitação
O regime de permanência na habitação (43º e 44º CP) é uma forma de execução da pena de
prisão de duração não-superior a 2 anos que consiste na obrigação de o condenado
permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo
tempo de duração da pena de prisão. Para que a pena de prisão seja executada desta forma,
exige-se a verificação cumulativa de dois pressupostos formais e de um pressuposto
material:
1) Consentimento do condenado: É necessário que o condenado consinta na execução da
pena de prisão em que foi condenado em regime de permanência na habitação.
2) Condenação em pena de prisão efetiva de duração não-superior a 2 anos: É necessário
que esteja em causa uma condenação em pena de prisão efetiva não-superior a 2 anos (al. a)),
uma condenação em pena de prisão efetiva não-superior a 2 anos resultante do desconto (al.
b)) ou uma condenação em pena de prisão não-superior a 2 anos na sequência da revogação
de pena de substituição (al. c)).
3) Finalidades da execução: É necessário que o tribunal conclua que por meio do regime de
permanência na habitação se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da
execução da pena de prisão (42º, n. 1 CP).
4) Fundamentação da execução: É necessário que o tribunal fundamente a execução da
pena de prisão em regime de permanência na habitação e a não-execução da pena de prisão
em estabelecimento prisional.

Notas fundamentais:
- O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de
ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do
condenado (43º, n. 3 CP).
- O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de
regras de conduta destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade (43º,
n. 4 CP).
- A revogação do regime de permanência na habitação com fundamento nalguma das
alíneas do artigo 44º, n. 2 CP importa a execução da pena de prisão ainda não cumprida
em estabelecimento prisional (44º, n. 3 CP).

20
6.1.2 Liberdade condicional
A liberdade condicional (61º a 64º CP) é outra forma de execução da pena de prisão,
podendo ser concedida a metade, a dois terços e a cinco sextos do cumprimento desta pena.
Notas fundamentais:
- De acordo com o artigo 43º, n. 5 CP, não se aplica a liberdade condicional quando a
pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação, uma vez que a
execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação não se traduz num
mero confinamento do condenado na sua habitação.
- De acordo com o artigo 44º, n. 4 CP, relativamente ao tempo de pena que venha a ser
cumprido em estabelecimento prisional na sequência da revogação do regime de
permanência na habitação pode ter lugar a concessão de liberdade condicional.

Concessão da liberdade condicional a metade da pena:


Para que a liberdade condicional a metade do cumprimento da pena de prisão seja concedida,
exige-se a verificação cumulativa de três pressupostos formais e de dois pressupostos
materiais:
1) Consentimento do condenado: É necessário que o condenado consinta na concessão da
liberdade condicional a metade do cumprimento da pena de prisão em que foi condenado
(61º, n. 1 CP).
2) Cumprimento de metade da pena de prisão: É necessário que o condenado tenha
cumprido metade da pena de prisão em que foi condenado (61º, n. 2 CP).
3) Cumprimento mínimo de 6 meses de prisão: É necessário que condenado tenha
cumprido no mínimo 6 meses de prisão (61º, n. 2 CP). Algumas notas:
- Quando o agente tenha sido condenado em pena de prisão de duração de 10 meses, a
liberdade condicional a metade da pena (aos 5 meses) não pode ser concedida, tendo o agente
que cumprir, no mínimo, 6 meses de prisão.
- Quando o agente esteve detido, preso preventivamente ou em obrigação de permanência
na habitação e seja condenado em pena de prisão que deva ser executada em regime de
permanência na habitação, o tempo de privação processual da liberdade é descontado na
metade da pena (80º, n. 1 CP), essencialmente por razões de igualdade de tratamento:
-» Exemplo 1: A foi condenado em pena de prisão de 10 anos. Neste caso, a liberdade
condicional a metade da pena pode ser concedida (aos 5 anos). Sendo assim, A ficou 5 anos
privado da liberdade e 5 anos em liberdade condicional.
-» Exemplo 2: A esteve 2 anos detido e foi condenado em pena de prisão de 10 anos.
1. Se o tempo de privação processual da liberdade devesse ser descontado na pena, A
ficaria 6 anos privado da liberdade (2 de medida processual privativa da liberdade e 4 da
pena de prisão) e 5 anos em liberdade condicional.
2. Como o tempo de privação processual da liberdade deve ser descontado na metade
da pena, A fica 5 anos privado da liberdade (2 de medida processual privativa da liberdade e
3 da pena de prisão) e 5 anos em liberdade condicional.
4) Juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado em
liberdade: É necessário que seja fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso,
a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena

21
de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo
socialmente responsável, sem cometer crimes (61º, n. 2, al. a) CP).
5) Compatibilidade da concessão da liberdade condicional e a defesa da ordem pública e
da paz social: É necessário que a libertação se revele compatível com a defesa da ordem
pública e da paz social (61º, n. 2, al. b) CP). A este propósito, deve o tribunal de execução
das penas ter por referência o limite mínimo da moldura da prevenção a que o tribunal da
condenação chegou ao nível da determinação concreta da pena (ex. A é condenado pela
prática de homicídio qualificado em 12 anos de pena de prisão. Se o tribunal concedesse
liberdade condicional a metade da pena (aos 6 anos), A estaria 6 anos privado da liberdade e
5 anos em liberdade condicional (6+5 = 11 < 12 (limite mínimo da moldura da pena))).
Verificados os pressupostos, o tribunal de execução das penas tem o poder-dever de colocar o
condenado em liberdade condicional. Se não for concedida a metade do cumprimento da pena
de prisão, a concessão da liberdade condicional deve ser reapreciada anualmente à luz dos
pressupostos da concessão da liberdade condicional a metade da pena (61º, n. 2 CP) – é a
chamada renovação anual da instância – até o condenado ter cumprido dois terços da pena.
Concessão da liberdade condicional aos dois terços da pena:
Para que a liberdade condicional a dois terços do cumprimento da pena de prisão seja
concedida, exige-se a verificação cumulativa de três pressupostos formais e de um
pressuposto material:
1) Consentimento do condenado: É necessário que o condenado consinta na concessão da
liberdade condicional aos dois terços do cumprimento da pena de prisão em que foi
condenado (61º, n. 1 CP).
2) Cumprimento de dois terços da pena de prisão: É necessário que o condenado tenha
cumprido dois terços da pena de prisão em que foi condenado (61º, n. 3 CP).
3) Cumprimento mínimo de 6 meses de prisão: É necessário que condenado tenha
cumprido no mínimo 6 meses de prisão (61º, n. 3 CP).
4) Juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado em
liberdade: É necessário que seja fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso,
a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena
de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo
socialmente responsável, sem cometer crimes (61º, n. 2, al. a) CP).21
Verificados estes pressupostos, o tribunal de execução das penas tem o poder-dever de
colocar o condenado em liberdade condicional. Se não for concedida aos dois terços do
cumprimento da pena de prisão, a concessão da liberdade condicional deve ser reapreciada
anualmente à luz dos pressupostos da concessão da liberdade condicional aos dois terços da
pena (61º, n. 3 CP) – é a chamada renovação anual da instância – até o condenado ter
cumprido cinco sextos da pena.

21Tendo em conta o tempo de pena de prisão já cumprido, é de presumir que a libertação é compatível com a
defesa da ordem pública e da paz social.
22
Concessão da liberdade condicional cinco sextos da pena:
Para que a liberdade condicional aos cinco sextos do cumprimento da pena de prisão seja
concedida, exige-se a verificação cumulativa de dois pressupostos formais:
1) Consentimento do condenado: É necessário que o condenado consinta na concessão da
liberdade condicional aos cinco sextos do cumprimento da pena de prisão em que foi
condenado (61º, n. 1 CP).
2) Cumprimento de cinco sextos de pena de prisão com duração de 6 anos: É necessário
que o condenado tenha cumprido cinco sextos da pena de prisão de duração de 6 anos em que
foi condenado (61º, n. 4 CP).22
Nota fundamental:
Tudo aquilo que se disse até aqui vale em caso de pena de prisão, quer em caso de pena
única conjunta.

Duração da liberdade condicional:


De acordo com o artigo 61º, n. 5 CP, em qualquer das modalidades a liberdade condicional
tem uma duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, até ao máximo de cinco anos23,
considerando-se então extinto o excedente da pena.
Regime da liberdade condicional:
O regime da liberdade condicional encontra-se previsto no artigo 64º CP, segundo o qual é
aplicável à liberdade condicional o disposto nos artigos 52º CP, 53º, n. 1 e 2 CP, 54º CP, 55º,
als. a) a c) CP, 56º, n. 1 CP e 57º CP.
- A liberdade condicional pode ficar condicionada pela imposição do cumprimento de regras
de conduta (52º CP).
- A liberdade condicional pode ficar condicionada pelo acompanhamento de regime de prova
(53º, n. 1 e 2 CP), assente num plano de reinserção social (54º CP).
- Se, durante o período da liberdade condicional, o condenado, culposamente, deixar de
cumprir qualquer das regras de conduta impostas ou não corresponder ao plano de reinserção
social, pode o tribunal fazer uma solene advertência, exigir garantias de cumprimento das
obrigações que condicionam a suspensão, impor novas regras de conduta, ou introduzir
exigências acrescidas no plano de reinserção social (55º, al. a) a c) CP).
- A liberdade condicional é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado infringir
grosseira ou repetidamente as regras de conduta impostas ou o plano de reinserção social ou
cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na
base da liberdade condicional não puderam, por meio dela, ser alcançadas (56º, n. 1 CP). A
revogação da liberdade condicional importa a execução da pena de prisão ainda não cumprida
(64º, n. 2 CP). Algumas notas:
-» A pena de prisão que o condenado ainda tenha que cumprir na sequência da revogação
da liberdade condicional não poderá ser executada em regime de permanência na habitação,
mas poderá ter lugar a concessão de nova liberdade condicional (64º, n. 3 CP).

22 A liberdade condicional aos cinco sextos da pena é designada “liberdade condicional obrigatória”, uma vez
que a sua concessão não depende de um qualquer pressuposto material.
23 Cinco anos correspondem ao tempo considerado suficiente para se poder afirmar que o condenado conduzirá

a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes


23
-» A duração da pena de prisão que o condenado ainda tenha que cumprir na sequência da
revogação da liberdade condicional corresponde à duração da pena de prisão em que o
condenado foi condenado, devendo deduzir-se o tempo de pena já cumprido e o tempo em
que o condenado esteve em liberdade condicional (ex. A é condenado em pena de prisão de
20 anos. É colocado em liberdade condicional a metade da pena (aos 10 anos). No entanto, ao
fim de 2 anos, a liberdade condicional é revogada. Segundo o entendimento da Dr.ª Maria
João Antunes, a pena de prisão que A ainda tem que cumprir na sequência da revogação da
liberdade condicional corresponderia a 8 anos (20-10-2)). Não é este, porém, o entendimento
dos tribunais de execução das penas e do STJ que, através do acórdão n. 7/2019, de 4 de
Julho, decidiu que não deve deduzir-se à duração da pena de prisão em que o condenado foi
condenado o tempo em que o condenado esteve em liberdade condicional (ex. A é condenado
em pena de prisão de 20 anos. É colocado em liberdade condicional a metade da pena (aos 10
anos). No entanto, ao fim de 2 anos, a liberdade condicional é revogada. Segundo o
entendimento dos tribunais de execução das penas e do STJ, a pena de prisão que A ainda
tem que cumprir na sequência da revogação da liberdade condicional corresponderia a 10
anos (20-10)).24
- A pena de prisão é declarada extinta se, decorrido o período da liberdade condicional, não
houver motivos que possam conduzir à sua revogação (57º CP).
Concessão da liberdade condicional em caso de execução sucessiva de várias penas:
De acordo com o artigo 63º, n. 1 e 2 CP, se houver lugar à execução de várias penas de
prisão, a execução da pena que deva ser cumprida em primeiro lugar é interrompida 25 quando
se encontrar cumprida metade da pena, decidindo o tribunal sobre a concessão da liberdade
condicional no momento em que possa fazê-lo, de forma simultânea, relativamente à
totalidade das penas (ex. A é condenado numa pena única conjunta de 20 anos e numa pena
de prisão de 10 anos. Inicia-se a execução da pena de 20 anos. A metade do cumprimento da
pena de 20 anos (aos 10 anos), interrompe-se a execução dessa pena e inicia-se a execução da
pena de 10 anos. A metade do cumprimento da pena de 10 anos (aos 5 anos), o tribunal
decide sobre a concessão de liberdade condicional).
De acordo com o artigo 63º, n. 3 CP, se a soma das penas que devam ser cumpridas
sucessivamente exceder 6 anos de prisão, o tribunal coloca o condenado em liberdade
condicional, se dela não tiver antes aproveitado, logo que se encontrarem cumpridos cinco
sextos da soma das penas (ex. Naquele caso, visto que a soma das duas penas que devem ser
cumpridas sucessivamente excede 6 anos (20+10 = 30 anos), se A não tiver antes aproveitado

24 É de criticar este entendimento por parte do STJ, essencialmente por duas razões :
- Por um lado, tendo em conta que a liberdade condicional é uma forma de execução da pena de prisão, o tempo
em que o condenado esteve em liberdade condicional deve ser descontado na duração da pena de prisão que o
condenado ainda tenha que cumprir na sequência da revogação da liberdade condicional.
- Por outro lado, se o tempo em que o condenado esteve em liberdade condicional não fosse descontado no
tempo de cumprimento da pena de prisão que o condenado ainda tenha que cumprir na sequência da revogação
da liberdade condicional, o condenado estaria privado da liberdade sem uma lei que permitisse essa privação,
em violação do princípio da necessidade da intervenção penal (18º, n. 2 CRP).
25 A interrupção da execução da pena que deva ser cumprida em primeiro lugar, por um lado, impede que o

condenado esteja, ao mesmo tempo, em liberdade condicional e em cumprimento da outra pena de prisão e, por
outro lado, garante que a liberdade condicional seja cumprida em liberdade.
24
da concessão da liberdade condicional, é colocado em liberdade condicional aos cinco sextos
da soma das duas penas (30 x 5/6 = 25 anos), se nisso consentir).
De acordo com o artigo 63º, n. 4 CP, a concessão da liberdade condicional em caso de
execução sucessiva de várias penas não é aplicável ao caso em que a execução da pena de
prisão resultar de revogação da liberdade condicional (ex. A é condenado numa pena única
conjunta de 20 anos e tem que cumprir uma pena de prisão na sequência da revogação da
liberdade condicional. Neste caso, não é aplicável o disposto no artigo 63º, n. 1 a 3 CP).
6.1.3 Execução da pena de prisão em estabelecimentos destinados a inimputáveis
Nas hipóteses em que o agente sofra de anomalia psíquica ao tempo da prática do crime e
tenha sido condenado em pena de prisão (104º CP) e em que tenha sobrevindo ao agente uma
anomalia psíquica depois de ter sido condenado em pena de prisão (105º CP) – em ambos os
casos, o agente é declarado imputável –, pode o tribunal ordenar o seu internamento em
estabelecimentos destinados a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena.
6.2 Execução da pena de multa principal
6.2.1 Execução da pena de multa principal
Determinada a pena de multa principal em que o agente da prática do crime deverá ser
condenado, segue-se a fase da sua execução. A execução da pena de multa principal pode
ocorrer de duas formas:
- Por pagamento voluntário (47º, n. 3 CP): Para além de o condenado poder pagar a multa
logo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o tribunal pode, sempre que a
situação económico-financeira do condenado o justificar, autorizar o pagamento da multa
dentro de um prazo que não exceda 1 ano (pagamento diferido) ou permitir o pagamento em
prestações, não podendo a última delas ir além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em
julgado da condenação.
- Por prestação de dias de trabalho (48º CP): O condenado pode requerer ao tribunal que
ordene que a pena de multa principal seja total ou parcialmente substituída por dias de
trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas coletivas de
Direito Público, ou ainda de instituições particulares de solidariedade social se concluir que
esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
6.2.2 Incumprimento da pena de multa principal
1) Se a multa principal, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga
voluntariamente, tem lugar o pagamento coercivo (49º, n. 1 CP).
2) Se a multa principal, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga
coercivamente, o condenado cumpre prisão subsidiária pelo tempo correspondente aos dias
de multa reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão (49º, n. 1
CP). Esta prisão subsidiária tem natureza de sanção de constrangimento, visando constranger
o condenado a pagar a multa. É por isso que:
- O condenado que estiver a cumprir pena subsidiária não pode ser colocado em liberdade
condicional.
- A pena subsidiária não pode ser executada em regime de permanência na habitação.
- O montante da multa já paga repercute-se no tempo de prisão subsidiária (49º, n. 2 CP).

25
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 49º, n. 3 CP, se o condenado provar que a razão do não-
pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser
suspensa, por um período de 1 a 3 anos, desde que a suspensão seja subordinada ao
cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não-económico ou financeiro.
- Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão
subsidiária.
- Se os deveres ou as regras de conduta forem cumpridos, a pena de multa principal é
declarada extinta.
6.3 Execução da pena de multa de substituição
6.3.1 Execução da pena de multa de substituição
Determinada a pena de multa de substituição, segue-se a fase da sua execução. A execução da
pena de multa de substituição pode ocorrer de duas formas:
- Por pagamento voluntário (47º, n. 3 CP): Para além de o condenado poder pagar a multa
logo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o tribunal pode, sempre que a
situação económico-financeira do condenado o justificar, autorizar o pagamento da multa
dentro de um prazo que não exceda 1 ano (pagamento diferido) ou permitir o pagamento em
prestações, não podendo a última delas ir além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em
julgado da condenação.
- Por prestação de dias de trabalho (48º CP)26: O condenado pode requerer ao tribunal que
ordene que a pena de multa de substituição seja total ou parcialmente substituída por dias de
trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas coletivas de
Direito Público, ou ainda de instituições particulares de solidariedade social se concluir que
esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
6.3.2 Incumprimento da pena de multa de substituição
1) Se a multa de substituição, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga
voluntariamente, tem lugar o pagamento coercivo (49º, n. 1 CP).
2) Se a multa de substituição, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga
coercivamente, o condenado cumpre integralmente a pena de prisão que se quis substituir
(45º, n. 2, 1ª parte CP). É por isso que:
- O condenado que estiver a cumprir pena de prisão pode ser colocado em liberdade
condicional.
- A pena de prisão pode ser executada em regime de permanência na habitação (43º, n. 1,
al. c) CP).
- O montante da multa já paga não se repercute na pena de prisão, tendo de a cumprir
integralmente.

26 Há autores que não admitem a substituição do pagamento da multa de substituição pela prestação de dias de
trabalho, uma vez que entendem que se estaria a substituir uma pena de substituição por outra pena de
substituição. No entanto, uma coisa é a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade (que é uma pena de
substituição da pena de prisão) (58º CP); outra coisa é a prestação de dias de trabalho (que é uma forma de
execução da pena de multa principal ou de substituição) (48º CP).
26
Nota fundamental:
De acordo com o artigo 45º, n. 2, 1ª parte CP, que remete para o artigo 49º, n. 3 CP, se o
condenado provar que a razão do não-pagamento da multa de substituição lhe não é
imputável, pode a execução da pena de prisão ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos,
desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta
de conteúdo não-económico ou financeiro.
- Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão
subsidiária.
- Se os deveres ou as regras de conduta forem cumpridos, a pena de prisão é declarada
extinta.

7. Medidas de segurança
A medida de segurança é, ao lado da pena, uma outra consequência jurídica do crime. Surgiu
como resposta à especial perigosidade de delinquentes imputáveis especialmente perigosos e
de delinquentes de imputabilidade diminuída, em relação aos quais a pena é tida como
insuficiente do ponto de vista preventivo-especial (a pena é complementada por uma medida
de segurança não-privativa da liberdade) e à especial perigosidade de delinquentes
inimputáveis em razão de anomalia psíquica, em relação aos quais a pena é tida como
inadequada (a pena tem como pressuposto a culpa e os delinquentes inimputáveis não são
passíveis de culpa).
As medidas de segurança não têm o mesmo pressuposto, fundamento e limite das penas:
- Pressuposto: Enquanto que o pressuposto da pena é a culpa do agente, o pressuposto da
medida de segurança é a perigosidade criminal do agente (fundado receio da prática de factos
ilícitos-típicos da mesma espécie, no futuro, por parte daquele mesmo agente 27).
- Fundamento: Enquanto que o fundamento da pena é composto, a título primário, pelas
finalidades de prevenção geral positiva e, a título secundário, pelas finalidades de prevenção
especial positiva, o fundamento da medida de segurança suscita alguma discussão. A este
propósito, existe uma divergência na doutrina:
-» Figueiredo Dias defende que todas as medidas de segurança, inclusive a medida de
segurança de internamento, prosseguem finalidades de prevenção geral e especial positivas:
1. Por um lado, o artigo 40º, n. 1 CP prevê que a aplicação de penas e de medidas de
segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. Por outro lado, o artigo 91º, n. 2 CP prevê a libertação de inimputável, condenado pela
prática de crime contra as pessoas ou de crime de perigo comum puníveis com pena de prisão
superior a 5 anos, se tal se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
-» Maria João Antunes defende que todas as medidas de segurança prosseguem, de forma
autónoma, finalidades de prevenção geral e especial positivas, exceto a medida de segurança
de internamento que prossegue, de forma autónoma, apenas finalidades de prevenção especial
positiva:
1. Por um lado, quando é um inimputável a praticar um facto ilícito-típico, a generalidade
dos membros da comunidade mantém a confiança na força do ordenamento jurídico-penal,
não sentindo a necessidade de reafirmar essa mesma força. Nessa medida, a aplicação de uma

27 A medida de segurança é, portanto, pós-delitual.


27
medida de segurança de internamento visaria apenas a reintegração do agente na sociedade.
2. Por outro lado, o artigo 91º, n. 2 CP vale apenas para os casos em que o agente, embora
seja imputável, é declarado inimputável nos termos do artigo 20º, n. 2 CP (delinquente de
imputabilidade diminuída), justificando-se do ponto de vista preventivo-geral que a medida
de segurança de internamento em que for condenado tenha uma duração mínima de 3 anos.
- Limite: Enquanto que o limite da pena é o princípio da culpa (40º, n. 2 CP), o limite da
medida de segurança é o princípio da proporcionalidade (40º, n. 3 CP).
Quando as medidas de segurança surgiram, existia ainda uma quarta diferença entre as penas
e as medidas de segurança ao nível dos princípios. À medida que estas se foram aproximando
daquelas, a diferença em causa foi desaparecendo. Hoje, as medidas de segurança estão
sujeitas ao princípio da legalidade criminal (29º, n. 3 e 4 CRP), da proporcionalidade (18º,
n. 2 CRP, 40º, n. 3 CP), da prescritibilidade (124º CP), da proibição de medidas de
segurança com caráter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida (30º, n. 1 CRP).
7.1 Medida de segurança de internamento
Pressupostos da medida de segurança de internamento:
Para que seja aplicada uma medida de segurança de internamento, exige-se a verificação
cumulativa dos pressupostos previstos no artigo 91º CP:
1) É necessário que a pessoa seja declarada inimputável, nos termos do artigo 20º CP.
2) É necessário que a pessoa declarada inimputável tenha praticado um facto ilícito-típico.
3) É necessário que o tribunal conclua que a pessoa é criminalmente perigosa por virtude da
anomalia psíquica e da gravidade do facto praticado.
4) É necessário que o tribunal conclua que a medida de segurança é proporcionada à
gravidade do facto e à perigosidade do agente (18º, n. 2 CRP, 40º, n. 3 CP).
Duração da medida de segurança de internamento:
Ao contrário das penas, a medida de segurança de internamento não é pré-determinada
quanto à sua duração. Tal decorre do artigo 92º, n. 1, 2ª parte CP, segundo o qual o
internamento finda quando o tribunal verificar que cessou o estado de perigosidade criminal
que lhe deu origem. No entanto, existem casos em que a medida de segurança de
internamento tem uma duração máxima e uma duração mínima:
- Duração mínima: Quando o agente, embora seja imputável, é declarado inimputável nos
termos do artigo 20º, n. 2 CP (delinquente de imputabilidade diminuída) e pratica um crime
contra as pessoas ou um crime de perigo comum puníveis com pena de prisão superior a 5
anos, o internamento tem uma duração mínima de 3 anos, salvo se a libertação se revelar
compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social (91º, n. 2 CP).
- Duração máxima: Tendo em conta que a medida de segurança de internamento não é pré-
determinada quanto à sua duração, ela tem uma duração máxima, nomeadamente o limite
máximo da pena correspondente ao tipo do crime cometido pelo inimputável (92º, n. 2 CP).
Execução da medida de segurança de internamento:
1) Finalidade do internamento: A medida de segurança de internamento é executada em
estabelecimento de cura, de tratamento ou de segurança, consoante a sua finalidade:
2) Revisão da situação do internado: De acordo com o artigo 93º CP, se for invocada a
existência de causa justificativa da cessação do internamento, o tribunal aprecia a questão a
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todo o tempo, sendo a apreciação obrigatória, independentemente de requerimento, decorrido
um ano sobre o início do internamento ou sobre a decisão que o tiver mantido, ressalvado, em
qualquer caso, o prazo mínimo fixado no artigo 91º, n. 2 CP (ex. A é condenado em medida
de segurança de internamento. Inicia-se a sua execução. Decorrido um ano sobre o início da
execução da medida de segurança de internamento é revista a situação do internado).
3) Reexame da medida de internamento: De acordo com o artigo 96º CP, não pode iniciar-
se a execução da medida de segurança de internamento, decorrido um ano ou mais sobre a
decisão que a tiver decretado, sem que seja apreciada a subsistência dos pressupostos que
fundamentaram a sua aplicação (ex. A é condenado em medida de segurança de
internamento. Decorrido um ano sobre a decisão que a decretou, sem que tenha sido
executada, é reexaminada a medida de internamento). O tribunal pode:
- Confirmar a medida de segurança de internamento, caso se mantenha o estado de
perigosidade criminal do agente.
- Suspender a execução do internamento, caso for razoavelmente de esperar que com a
suspensão se alcance a finalidade da medida.
- Colocar o internado em liberdade para prova, caso haja razões para esperar que a
finalidade da medida possa ser alcançada em meio aberto.
- Revogar a medida de segurança de internamento, caso já tenha cessado o estado de
perigosidade criminal do agente.
4) Liberdade para prova28: De acordo com o artigo 94º CP, se da revisão da situação do
internado resultar que há razões para esperar que a finalidade da medida possa ser alcançada
em meio aberto, o tribunal coloca o internado em liberdade para prova.
- De acordo com o artigo 94º, n. 2 CP, o período de liberdade para prova é fixado entre
um mínimo de 2 anos e um máximo de 5, não podendo ultrapassar, todavia, o tempo que
faltar para o limite máximo de duração do internamento.
- De acordo com o artigo 94º, n. 3 CP, a liberdade para prova pode ficar condicionada
pela imposição do cumprimento de regras de conduta, etc.
- De acordo com o artigo 94º, n. 4 CP, se não houver motivos que conduzam à revogação
da liberdade para a prova, findo o tempo de duração desta a medida de internamento é
declarada extinta.
- De acordo com o artigo 95º CP, a liberdade para prova é revogada quando o
comportamento do agente revelar que o internamento é indispensável ou quando o agente for
condenado em pena privativa da liberdade e não se verificarem os pressupostos da suspensão
da execução. A revogação determina o reinternamento.
5) Regime de vicariato na execução: De acordo com o artigo 99º CP, quando o mesmo
agente, por factos diferentes, seja considerado imputável em relação a um facto e condenado
em pena de prisão e considerado inimputável em relação a outro facto e condenado em
medida de segurança de internamento, a medida de segurança de internamento é executada
antes da pena de prisão (n. 1, 1ª parte). O tempo de execução da medida de segurança de
internamento é descontado no tempo de cumprimento da pena de prisão (n. 1, 2ª parte). Se,

28A liberdade para prova está para a medida de segurança de internamento como a liberdade condicional está
para a pena de prisão.
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efetuado este desconto, se encontrar cumprido o tempo correspondente a metade da pena e a
libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social, pode o
tribunal colocar o agente em liberdade condicional (n. 2). Se, efetuado o desconto, não se
encontrar cumprido o tempo correspondente a metade da pena, pode o tribunal, a
requerimento do condenado, substituir o tempo de prisão que faltar para metade da pena, até
ao máximo de 1 ano, por prestação de trabalho a favor da comunidade, se tal se revelar
compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social (n. 3).
7.2 Suspensão da execução do internamento
De acordo com o artigo 98º CP, o tribunal que ordenar o internamento determina, em vez
dele, a suspensão da sua execução 29, condicionada pela imposição do cumprimento de regras
de conduta, bem como do dever de se submeter a tratamentos e regimes de cura ambulatórios
apropriados e do dever de se prestar a exames e observações nos lugares que lhe forem
indicados, se for razoavelmente de esperar que com a suspensão se alcance a finalidade da
medida.
- A suspensão da execução do internamento tem a duração máxima correspondente à da
medida de segurança de internamento, devendo findar quando o tribunal verificar que cessou
o estado de perigosidade criminal que lhe deu origem (98º, n. 6, al. a) CP).
- A suspensão da execução do internamento é revogada se o comportamento do agente
revelar que o internamento é indispensável ou se o agente for condenado em pena privativa
da liberdade e não se verifiquem os pressupostos da suspensão da execução da pena de prisão
(98º, n. 6, al. b) CP).

8. Pena relativamente indeterminada


A pena relativamente indeterminada é uma pena cuja duração não é pré-determinada na
sentença condenatória – o condenado apenas conhece o limite mínimo e o limite máximo
desta pena –, sendo na fase da sua execução que ele ficará a conhecer quanto tempo irá ficar
efetivamente privado da liberdade. Surgiu como resposta à especial perigosidade da
delinquência por tendência e da delinquência ligada ao abuso do álcool e de estupefacientes,
em relação às quais a pena é tida como insuficiente (a pena é pré-determinada quanto à sua
duração).
Nota fundamental:
É a pena relativamente indeterminada que faz com que o sistema sancionatório português
seja um sistema tendencialmente monista, uma vez que, na sua execução, tem natureza
mista – é, em parte, executada segundo as regras de execução da pena de prisão e, em
parte, executada segundo as regras de execução da medida de segurança de internamento,
acabando por permitir que seja cumulativamente aplicada, ao mesmo agente, pelo mesmo
facto, uma pena e uma medida de segurança privativas da liberdade.
8.1 Delinquência por tendência
Relativamente à delinquência por tendência, importa distinguir a delinquência por tendência
grave (83º CP) e a delinquência por tendência menos grave (84º CP).

29A suspensão da execução do internamento está para a medida de segurança de internamento como a
suspensão da execução da pena de prisão está para a pena de prisão.
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8.1.1 Delinquência por tendência grave
Para que seja aplicada uma pena relativamente indeterminada em caso de delinquência por
tendência grave, exige-se a verificação cumulativa de três pressupostos formais e de um
pressuposto material:
1) Crimes dolosos (culpa do agente): É necessário que o novo crime e os crimes anteriores
(dois ou mais) sejam dolosos.
2) Condenação ou mera prática de crimes que tenham sido ou sejam punidos com pena
de prisão efetiva superior a 2 anos: É necessário que o novo crime deva ser punido e os
crimes anteriores tenham sido ou sejam punidos com pena de prisão efetiva superior a 2 anos.
3) Decurso de menos de 5 anos entre a prática do crime anterior e a prática do novo
crime: É necessário que entre a prática do crime anterior e a prática do crime seguinte não
tenham decorrido mais de 5 anos (83º, n. 3 CP).
4) Acentuada inclinação para o crime (perigosidade criminal do agente): É necessário
que a avaliação conjunta dos factos praticados e da personalidade do agente revele uma
acentuada inclinação para o crime, que no momento da condenação ainda persista.
Verificados estes pressupostos, o julgador começa por determinar a pena de prisão que
concretamente caberia ao crime praticado, seguindo o procedimento “normal” de
determinação da pena (ex. A pratica um crime de homicídio, para o qual se prevê uma pena
de prisão de 8 a 16 anos. O julgador chega a uma pena de prisão de 12 anos). Depois,
determina os limites mínimo e máximo da pena relativamente indeterminada (83º, n. 2 CP):
- O limite mínimo corresponde a dois terços da pena de prisão que concretamente caber ia ao
crime (ex. 12 x 2/3 = 8 anos).
- O limite máximo corresponde à pena de prisão que concretamente caberia ao crime,
acrescida de 6 anos, sem exceder 25 anos no total (ex. 12+6 = 18 anos).
8.1.2 Delinquência por tendência menos grave
Para que seja aplicada uma pena relativamente indeterminada em caso de delinquência por
tendência menos grave, exige-se a verificação cumulativa de três pressupostos formais e de
um pressuposto material:
1) Crimes dolosos (culpa do agente): É necessário que o novo crime e os crimes anteriores
(quatro ou mais) sejam dolosos.
2) Condenação ou mera prática de crimes que tenham sido ou sejam punidos com pena
de prisão efetiva: É necessário que o novo crime deva ser punido e os crimes anteriores
tenham sido ou sejam punidos com pena de prisão efetiva.
3) Decurso de menos de 5 anos entre a prática do crime anterior e a prática do novo
crime: É necessário que entre a prática do crime anterior e a prática do novo crime não
tenham decorrido mais de 5 anos (84º, n. 3 CP).
4) Acentuada inclinação para o crime (perigosidade criminal do agente): É necessário
que a avaliação conjunta dos factos praticados e da personalidade do agente revele uma
acentuada inclinação para o crime, que no momento da condenação ainda persista.

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Verificados estes pressupostos, o julgador começa por determinar a pena de prisão que
concretamente caberia ao crime praticado, seguindo o procedimento “normal” de
determinação da pena (ex. A pratica um crime de homicídio, para o qual se prevê uma pena
de prisão de 8 a 16 anos. O julgador chega a uma pena de prisão de 12 anos). Depois,
determina os limites mínimo e máximo da pena relativamente indeterminada (84º, n. 2 CP):
- O limite mínimo corresponde a dois terços da pena de prisão que concretamente caber ia ao
crime (ex. 12 x 2/3 = 8 anos).
- O limite máximo corresponde à pena de prisão que concretamente caberia ao crime,
acrescida de 4 anos, sem exceder 25 anos no total (ex. 12+4 = 16 anos).
8.2 Delinquência ligada ao abuso do álcool e de estupefacientes
Para que seja aplicada uma pena relativamente indeterminada em caso de delinquência ligada
ao abuso do álcool e de estupefacientes, exige-se a verificação cumulativa de um
pressuposto formal e de um pressuposto material:
1) Condenação de crimes que sejam punidos com pena de prisão efetiva: É necessário
que o agente tenha praticado crime que tenha sido punido com pena de prisão efetiva e que
pratique crime que seja punido com pena de prisão efetiva.
2) Abuso do álcool e de estupefacientes: É necessário que os crimes tenham sido praticados
em estado de embriaguez ou estiverem relacionados com o alcoolismo ou com a tendência do
agente (86º, n. 1 CP) ou com o consumo abusivo de estupefacientes (88º CP).
Verificados estes pressupostos, o julgador começa por determinar a pena de prisão que
concretamente caberia ao crime praticado, seguindo o procedimento “normal” de
determinação da pena (ex. A pratica um crime de homicídio, para o qual se prevê uma pena
de prisão de 8 a 16 anos. O julgador chega a uma pena de prisão de 12 anos). Depois,
determina os limites mínimo e máximo da pena relativamente indeterminada (86º, n. 2 CP):
- O limite mínimo corresponde a dois terços da pena de prisão que concretamente caber ia ao
crime (ex. 12 x 2/3 = 8 anos).
- O limite máximo corresponde à pena de prisão que concretamente caberia ao crime,
acrescida de 2 anos, sem exceder 25 anos no total (ex. 12+2 = 14 anos).
8.3 Execução da pena relativamente indeterminada
Tendo em consideração que a pena relativamente indeterminada é uma pena cuja duração não
é pré-determinada na sentença condenatória – o condenado apenas conhece os limites mínimo
e máximo desta pena –, sendo na fase da sua execução que ele ficará a conhecer quanto
tempo irá ficar efetivamente privado da liberdade, importa agora analisar como ela se
executa.
8.3.1 Regras até se mostrar cumprida a pena que concretamente caberia ao crime
Até ao momento em que se mostrar cumprida a pena que concretamente caberia ao crime, a
pena relativamente indeterminada é executada segundo as regras de execução da pena de
prisão (90º, n. 1 e 2 CP):
- Atingido o limite mínimo da pena relativamente indeterminada, o agente pode ser colocado
em liberdade condicional se nisso consentir (1), se tiver cumprido no mínimo 6 meses de
prisão (2) e se for fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior
do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o
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condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável,
sem cometer crimes (3) (61º, n. 1 e 3 CP):
- Se não for concedida liberdade condicional, a concessão da liberdade condicional é
reapreciada anualmente. É a chamada renovação anual da instância.
- A liberdade condicional tem uma duração igual ao tempo que faltar para atingir o limite
máximo da pena, mas não será nunca superior a 5 anos.
- A liberdade condicional pode ficar condicionada pela imposição do cumprimento de regras
de conduta (52º CP).
- A liberdade condicional pode ficar condicionada pelo acompanhamento de regime de prova,
assente num plano de reinserção social (53º, n. 1 e 2 CP, 54º CP).
- Se, durante o período da liberdade condicional, o agente, culposamente, deixar de cumprir
qualquer das regras de conduta impostas ou não corresponder ao plano de reinserção social,
pode o tribunal fazer uma solene advertência, exigir garantias de cumprimento das obrigações
que condicionam a suspensão, impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir
exigências acrescidas no plano de reinserção (55º, als. a) a c) CP).
- A liberdade condicional é revogada sempre que o condenado infringir grosseira ou
repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social ou
cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na
base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas (56º CP).
8.3.2 Regras depois de se mostrar cumprida a pena que concretamente caberia ao crime
Se o agente não tiver sido colocado em liberdade condicional ou, tendo sido, houve a sua
revogação, a partir do momento em que se mostrar cumprida a pena que concretamente
caberia ao crime, a pena relativamente indeterminada é executada segundo as regras de
execução da medida de segurança de internamento (90º, n. 3 CP).
- A pena relativamente indeterminada finda quando o tribunal verificar que cessou o estado
de perigosidade criminal que lhe deu origem (92º, n. 1 CP).
- Se for invocada a existência de causa justificativa da libertação do agente, o tribunal aprecia
a questão a todo o tempo, sendo a apreciação obrigatória, independentemente de
requerimento, decorrido um ano sobre o momento em que se mostrar cumprida a pena que
concretamente caberia ao crime ou sobre a decisão que tiver mantido a execução da pena
relativamente indeterminada (93º, n. 1 e 2 CP).
- Se da revisão da situação do agente resultar que há razões para esperar que a finalidade da
pena relativamente indeterminada possa ser alcançada em meio aberto, o tribunal coloca o
agente em liberdade para prova. O período de liberdade para prova é fixado entre um mínimo
de 2 anos e um máximo de 5, não podendo ultrapassar, todavia, o tempo que faltar para o
limite máximo de duração do internamento. A liberdade para prova pode ficar condicionada
pela imposição do cumprimento de regras de conduta. Se não houver motivos que conduzam
à revogação da liberdade para a prova, findo o tempo de duração desta a medida de
internamento é declarada extinta (94º CP).
- A liberdade para prova é revogada quando o comportamento do agente revelar que o
internamento é indispensável ou quando o agente for condenado em pena privativa da
liberdade e não se verificarem os pressupostos da suspensão da execução. A revogação
determina o reinternamento (95º CP).

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