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Problema 6 - M1 - Moisés Popp de Oliveira

Doença de Graves
A doença de Graves (DG) representa a etiologia mais comum de hipertireoidismo
(80% dos casos). Ela tem origem autoimune e sua prevalência é incerta, mas
estima-se que afete 3% das mulheres e 0,5% dos homens ao longo de suas vidas.
Na Suécia, sua incidência vem aumentando nos anos 2000, atingindo 20 a 30 casos
por 100.000 indivíduos a cada ano. A DG se mostra 5 a 10 vezes mais comum em
mulheres do que em homens. Seu pico de incidência ocorre entre 30 e 60 anos,
mas pode manifestar -se em qualquer faixa etária. Ela se mostra mais comum na
raça branca, mas dados recentes sugerem um possível aumento da incidência da
DG em jovens negros americanos.
Apesar de ser uma doença autoimune órgão-específica, a DG cursa com
manifesta ções ou complicações sistêmicas autoimunes ou decorrentes do excesso
de hormônios tireoidianos.
A DG pode estar associada a outros distúrbios autoimunes endócrinos (diabetes
melito tipo 1, doença de Addison, ooforite autoimune, deficiência isolada de ACTH
etc.) e não endócrinos (miastenia gravis, lúpus eritematoso sistêmico, artrite
reumatoide, doença de Sjögren, anemia perniciosa, hepatite crônica ativa, vitiligo
etc.).
De 10 a 20% dos pacientes com DG apresentam remissão espontânea, e cerca de
50% tornam-se hipotireóideos após 20 a 30 anos, na ausência de qualquer
tratamento. Isso ocorre, mais provavelmente, em razão da contínua destruição da
tireoide pelo processo autoimune. Entretanto, em função das complicações
cardiovasculares do hipertireoidismo (taquiarritmias, insuficiência cardíaca e
fenômenos tromboemb ólicos), a DG não tratada mostra-se potencialmente fatal,
sendo de suma importância que seu diagnóstico e tratamento sejam precoces.
Etiopatog ênese
A DG é um distúrbio autoimune cujo principal sítio antigênico é o receptor do TSH
(TSHR). O hipertireoidismo se origina da produção pelos linfócitos B de anticorpos
contra o TSHR (TRAb). Tais anticorpos se ligam ao TSHR e ativam complexos de
sinalização das proteínas Gsα e Gq, o que, em última análise, resulta em
crescimento da tireoide, aumento de sua vascularização e incremento da taxa de
produção e secreção dos hormônios tireoidianos.
Ao se ligarem ao receptor do TSH, os TRAb vão estimular a síntese e a liberação
dos hormônios tireoidianos (T3 e T4), que, por sua vez, exercem retroalimenta ção
negativa sobre a hipófise, mas não sobre os TRAb. Como consequência, surgirá
elevação do T3 e T4 , associada à supressão do TSH.
Outras variedades de TRAb também podem estar presentes. Anticorpos que atuam
como antagonistas do TSH são referidos como TRAb bloqueadores. Eles são
encontrados em alguns pacientes com DG e em 15% dos pacientes com tireoidite
crônica autoimune (tireoidite de Hashimoto), particularmente naqueles sem bócio
(variedade atrófica). A DG e a tireoidite de Hashimoto compõem o espectro da
chamada doença tireoidiana autoimune (DTA).
Ocasionalmente, em pacientes com DTA, pode acontecer modificação (temporária
ou permanente) do tipo predominante de TRAb, fazendo com que eles possam
evoluir do hipo para o hipertireoidismo e vice-versa. Além disso, em alguns
pacientes com DG, o hipertireoidismo pode estar ausente (transitoriamente ou não),
devido a um equilíbrio entre anticorpos bloqueadores e estimuladores.
A exata sequência de eventos que leva à produção de anticorpos contra o receptor
do TSH ainda não foi plenamente identificada. Um defeito antígeno-específico,
mediado geneticamente, na função do linfócito T supressor tem sido proposto. Esse
defeito na vigilância imunológica tornaria possíveis o surgimento e a persistência de
clones de linfócitos T helper. Tais clones estimulariam a produção de anticorpos
pelos linfócitos B contra o receptor do TSH. Como alternativa, as células tireoidianas,
ao serem estimuladas por citocinas específicas, produzidas em resposta a uma
infecção viral, poderiam expressar, na sua superfície, moléculas classe II de tipos
específicos de HLA-DR, que apresentariam fragmentos do receptor do TSH aos
linfócitos T. Estes, por sua vez, estimulariam os linfócitos B a produzir os
mencionados anticorpos. Os dois mecanismos não são, contudo, mutuamente
excludentes, e ambos poderiam contribuir na patogênese da DG.

Fatores predisponentes
A DG é poligênica e multifatorial ; se desenvolve como resultado de uma interação
complexa entre a suscetibilidade genética e fatores ambientais ou endógenos, o que
conduz à perda da tolerância imunológica a antígenos da tireoide e, em particular,
ao receptor do TSH.
Fatores genéticos
Na DG, há uma nítida predisposição familiar, especialmente materna ; 15% dos
pacientes têm um parente próximo com DG, e cerca de 50% dos parentes de
pacientes com a doença apresentam anticorpos antitireoidianos. Ademais, a
ocorrência da doença é maior em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos (17
a 35% vs. 2 a 5%). Análises de estudos de gêmeos sugerem que fatores genéticos
contribuem com cerca de 80% para o desenvolvimento da DG, mas há ainda muito
a ser definido. A propensão para o desenvolvimento de autoanticorpos da tireoide
parece ser uma característica autossômica dominante ligada ao gene do antígeno
do linfócito T citotóxico 4 (CTLA 4) que codifica para um modulador do segundo
sinal para as células T. Existe também uma associação bem-estabelecida de certos
alelos HLA (cromossomo 6), variável de acordo com a etnia dos pacientes; por
exemplo, em caucasianos, o HLA-DR3 e o HLA-DQA1*0501 estão positivamente
associados à DG, enquanto o HLA-DRB1*0701 tem efeito protetor. Contudo, os
haplótipos HLA conferem menos de 5% da suscetibilidade genética à DG e
propiciam taxa de risco de apenas 2 a 4 vezes. Uma contribuição adicional tem sido
atribuída aos genes da tirosina fosfatase linfoide (PTPN22), da molécula de
sinalização CD40, do receptor α da interleucina -2, da tireoglobulina, do receptor do
TSH e do receptor Fc L3, entre outros.

Fatores ambientaiseend ógenos


Informa ção considerável tem se acumulado sobre os fatores ambientais que podem
induzir DG. Entre eles se incluem danos à tireoide, por radiação ou por injeção de
etanol, com a liberação de antígenos tireoidianos na circulação. Aumento da
ocorrência de DG foi relatado em pacientes com linfoma submetidos à radioterapia
cervical, bem como em crianças e adolescentes vitimados pela explosão de
Chernobyl. Tratamento com iodo radioativo (RAI) para bócio multinodular (tóxico e
atóxico) e injeção de etanol para cura de bócios nodulares tóxicos podem ser
seguidos do surgimento de TRAb e desenvolvimento de DG. De fato, cerca de 1%
dos pacientes com bócio nodular tóxico desenvolve DG após RAI, sendo esta
incidência 10 vezes maior se anticorpos antitireoperoxidase (anti-TPO) estiverem
presentes.
Indução de autoimunidade tireoidiana, incluindo a doença de Graves, pode ser
consequente à utilização terapêutica de interleucina (IL-1 alfa, IL-2), bem como
interferon -α e γ. DG tem também sido associada à terapia antirretroviral altamente
ativa para o HIV. Isso pode estar relacionado com aumento do número de células T
CD4+ ou com alteração em suas funções. Hipertireoidismo de Graves também
ocorre em pacientes com esclerose múltipla tratados com o anticorpo monoclonal
Campath-1H, dirigido contra as células T. Da mesma maneira, pode ser induzido
pela terapia com lítio (pode modificar as respostas imunes), bem como
desencadeado ou agravado pelo uso da amiodarona. Em alguns pacientes,
situações adversas (como privação, aflição, divórcio, perda do emprego etc.) ou,
mesmo, programas agressivos de perda de peso, antecedem a eclosão da DG. Isso
sugere a participação do estresse como fator iniciante da doença, pelas vias
neuroend ócrinas. O tabagismo aumenta em duas vezes o risco para DG e está mais
fortemente relacionado com o desenvolvimento da oftalmopatia, a qual é mais
frequente e tende a ser mais acentuada em fumantes.
Diagnóstico clínico
A DG apresenta -se com três manifesta ções principais: hiper-tireoidismo com bócio
difuso, oftalmopatia infiltrativa e dermopatia (mixedema pré-tibial). Raramente, os
pacientes com doença de Graves podem desenvolver um quadro de
hipertireoidismo grave (tempestade tireoidiana ou crise tireotóxica). Também é raro
o achado de inflamação subperióstea em falanges de mãos e pés (osteopatia
tireoidiana).
Hipertireoidismo
As manifesta ções clínicas do hipertireoidismo são decorrentes do efeito
estimulatório dos hormônios tireoidianos sobre o metabolismo e os tecidos. Entre as
mais características, incluem-se nervosismo, insônia, emagrecimento (apesar da
polifagia), taquicardia, palpitações, intolerância ao calor, sudorese excessiva com
pele quente e úmida, tremores, fraqueza muscular e hiperdefeca ção.
Há, contudo, um quadro chamado de hipertireoidismo apático, observado em
pacientes idosos, em que não há os sintomas de hiperatividade adrenérgica
(agitação, nervosismo etc.), mas astenia intensa, fraqueza muscular e prostração ou
depressão grave. Muitas vezes, predominam manifesta ções cardiovasculares (p. ex.,
fibrilação atrial e/ou insuficiência cardíaca refratárias ao tratamento usual). De modo
geral, quanto mais idoso o paciente, mais atípicas são as manifesta ções da DG.
Uma distinção pode ser feita entre hipertireoidismo e tireo-toxicose. O primeiro
implica que tanto a formação quanto a liberação de hormônios tireoidianos estejam
aumentadas, enquanto tireotoxicose representa a síndrome clínica resultante do
excesso circulante de T3 e T4 . Entretanto, essas denomina ções comumente são
usadas como sinônimos.
Bócio
Na DG, o bócio é caracteristicamente difuso, sendo observado em 97% dos casos.
Pode ser assimétrico ou lobular, com volume variável. Em alguns pacientes, há
frêmito e sopro sobre a glândula, produzidos por um notável aumento do fluxo
sanguíneo, sendo esse achado exclusivo da doença. Qualquer paciente com bócio
difuso e hipertireoidismo tem DG até que se prove o contrário. Em idosos, quando
presente, o bócio tende a ser pequeno.
Oftalmopatia
A oftalmopatia ou orbitopatia tem a mesma etiopatog ênese autoimune do
hipertireoidismo da DG e pode ser exacerbada tanto pelo hipo como pela
hiperfun ção tireoidiana. Os anticorpos reagem provocando autoagress ão
intraorbit ária, como no tecido tireoidiano. A oftalmopatia pode preceder
hipertireoidismo (20% das vezes), sucedê-lo (40%) ou surgir concomitantemente a
ele (40%). Os casos em que a oftalmopatia, transitória ou permanentemente, não se
faz acompanhar de hipertireoidismo são denominados doença de Graves
eutireóidea.
Oftalmopatia clinicamente evidente ocorre em até 50% dos pacientes com DG.
Decorre do espessamento dos músculos extraoculares e aumento da gordura
retrobulbar, o que leva a um incremento da pressão intraorbit ária.
Como consequência, podem ocorrer protrusão do globo ocular (proptose ou
exoftalmia) e diminuição da drenagem venosa, resultando em edema periorbital,
edema da conjuntiva (quemose) e hiperemia conjuntival. As manifesta ções oculares
mais comuns na DG são a retração palpebral, o olhar fixo ou assustado e o sinal de
lid-lag (retardo na descida da pálpebra superior quando o globo ocular é movido
para baixo). Entretanto, elas ocorrem em qualquer forma de tireotoxicose, por serem
consequentes à hiperatividade adrenérgica. Em contrapartida, o achado de edema
periorbital e exoftalmia praticamente confirma o diagnóstico de DG. Além disso,
diplopia pode acontecer em 5 a 10% dos pacientes, em razão do comprometimento
funcional da musculatura extrínseca ocular. Oftalmoplegia e ptose palpebral podem,
também, ser ocasionalmente observadas. Finalmente, nos casos graves, pode
haver disfunção do nervo óptico (por compressão ou isquemia), defeitos nos
campos visuais, distúrbios da visão em cores e/ou perda da visão (Quadro 30.5).
Homens idosos e fumantes apresentam maior risco de desenvolver oftalmopatia
grave.
A exoftalmia na DG, geralmente, é bilateral, mas pode ser unilateral. Nessa situação,
precisa ser diferenciada de um tumor retrobulbar ou malforma ção arteriovenosa por
meio de tomografia computadorizada ou ressonância magnética (Figura 30.6).
Exoftalmia grave impede o fechamento da pálpebra durante o sono, podendo levar
à inflamação da córnea (queratite) por exposição. A quemose pode ser leve, apenas
evidenciável por pressão da pálpebra inferior sobre a conjuntiva, ou grave, com
prolapso da conjuntiva edemaciada.
A melhor maneira de se certificar da existência da proptose e estabelecer sua
magnitude é por meio do exoftalmômetro de Hertel. Considera-se anormal uma
medida maior do que 20 mm em caucasianos, 18 mm entre orientais e 22 mm em
negros. É necessário, contudo, cautela nas interpreta ções limítrofes em até 2 mm. A
proptose pode ser classificada como leve (aumento de 3 a 4 mm), moderada (5 a 7
mm) e grave (> 7 mm).

Dermopatia(mixedema pré-tibial)
Acomete apenas 5 a 10% dos pacientes com DG e, quase sempre, está associada
à oftalmopatia (geralmente grave) e a títulos elevados de TRAb. Excepcionalmente,
é vista em pacientes eutireóideos com DG 22 ou com tireoidite de Hashimoto.
Consiste no espessamento da pele, particularmente na área pré-tibial, devido ao
acúmulo de glicosaminoglicanos. As lesões mostram-se em placas e, nelas, a pele
está bastante espessada, com aspecto de casca de laranja e coloração violácea. Às
vezes, a dermopatia envolve toda a parte inferior da perna e pode estenderse até os
pés. Raramente (menos de 1% dos casos), pode ser vista em outros locais (p. ex.,
mãos ou ombros), sobretudo após traumatismo prolongado. Muito raramente, o
mixedema pré-tibial é a manifesta ção inicial da DG.
Uma manifesta ção mais comum da doença de Graves, envolvendo pele e fâneros, é
a onicólise (unhas de Plummer), que se caracteriza pela separação da unha de seu
leito. Geralmente reverte espontaneamente, com a melhora do hipertireoidismo.
Diagnóstico laboratorial
Exames bioquímicose hormonais
Função tireoidiana . A DG e quase todas as outras causas de tireotoxicose
endógena significativa caracterizam -se por níveis baixos ou indetect áveis de TSH,
associados à elevação das frações total (ligada à globulina de ligação da tiroxina
[TBG]) e livre do T4 e T3 . Ocasionalmente, apenas o T3 está elevado,
acompanhando a supressão do TSH (T3-tireotoxicose). Tal situação é mais comum
na fase inicial da doença ou em casos de recidiva. Além disso, inicialmente podemos
encontrar apenas níveis baixos de TSH, com T4 e T3 normais, caracterizando o
hipertireoidismo subclínico.
Anticorpos antitireoidianos . Entre os pacientes com DG, até 50% apresentam
anticorpos antitireoglobulina (anti-Tg) e até 90%, anticorpos antitireoperoxidase
(anti-TPO), em títulos mais baixos do que os observados na tireoidite de Hashimoto.
Embora anticorpos antirreceptores do TSH (TRAb) possam ser encontrados em
indivíduos normais (excepcionalmente), na tireoidite de Hashimoto (em 6 a 60%) e
na tireoidite subaguda indolor ou tireoidite pós-parto (em 5 a 15%), sua ocorrência
em pacientes hipertire óideos é altamente específica para a DG (presentes em 90 a
100% dos casos).
Na Europa, cerca de 85% dos especialistas dosam o TRAb na avaliação diagnóstica
inicial da DG. Uma conduta similar é relatada no Japão e na Coreia.
Em nosso meio 31 e nos EUA, 5,29 as diretrizes ainda recomendam priorizar a
dosagem dos TRAb em algumas situações específicas, tais como:
(1) no diagnóstico da DG eutireóidea;
(2) no diagnóstico do hipertireoidismo apático;
(3) na distinção entre DG e tireoidite pós-parto ou tireoidite subaguda
linfocítica;
(4) na avaliação do risco de recidiva do hipertireoidismo após a suspensão
do tratamento com as tionamidas (títulos elevados aumentam o risco de
recidiva); e
(5) em gestantes com DG. TRAb em títulos elevados no final da gestação
implica risco aumentado de hipertireoidismo neonatal. Em contrapartida, sua
negativação favorece a interrup ção do tratamento, visando diminuir o risco
de hipotireoidismo fetal.
Parâmetros hematológicose bioquímicos. Na DG, observam-se leucopenia
(comum), hipercalciúria e hipercalcemia (ocasionais), elevação de transaminases e
hiperbilirrubinemia (nos casos mais graves). Redução do colesterol total e do
LDL-colesterol pode, também, ser encontrada.
Exames de imagem
Captação do iodo radioativo nas 24 horas(RAIU/24 h). A captação elevada do
iodo radioativo nas 24 h (RAIU/24 h) normal em nosso meio situa-se entre 15 e 35%.
Ela se encontra elevada em praticamente 100% dos casos de DG, o que possibilita
facilmente sua diferencia ção com os casos de tireotoxicose secundária à tireoidite
subaguda linfocítica e tireoidite pós-parto, situações em que a RAIU/24 h está
caracteristicamente muito baixa ou ausente. Esse exame somente deve ser solicitado,
portanto, quando houver dúvida diagnóstica entre a DG e as mencionadas patologias.
Uma alternativa para fazer essa distinção é a determina ção dos níveis dos TRAb
(menos acurada) ou com a ultrassonografia (US) tireoidiana com Doppler colorido.
Ultrassonogra fia. A US tem sensibilidade semelhante à RAIU/24 h para o
diagnóstico da DG (95,2% vs. 97,4%, respectivamente). Vantagens da US são
ausência de exposição à radiação ionizante, maior precisão na detecção de eventuais
nódulos tireoidianos e custo mais baixo. Além disso, a US com Doppler colorido pode
diferenciar a DG (glândula hipoecog ênica difusamente aumentada) da tireotoxicose
induzida pela destruição folicular (volume glandular e fluxo sanguíneo diminuídos).
Cintilogra fia tireoidiana . Cintilografia com iodo radioativo (I-123 ou I-131) ou
tecnécio deve ser realizada em pacientes com nódulos identificados à
ultrassonografia, para avaliar se tais nódulos são “quentes ” ou “frios”.
Punção aspirativa com agulha fina. Estará indicada quando forem encontrados
nódulos tireoidianos normo ou hipocaptantes à cintilografia. Foi sugerido, por alguns
estudos, que tais nódulos teriam maior risco para malignidade em pacientes com
DG, porém estudos mais recentes não confirmaram essa possibilidade.
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1. Diferenciar tireotoxicose e hipertireoidismo.
Tireotoxicose é o estado clínico decorrente do excesso de hormônios tireoidianos
circulantes sistemicamente, seja qual for a origem desses hormônios (ingestão de
hormônio externo, produção de hormônio por algum tumor, produção excessiva de
hormônio pela glândula tireoidiana, liberação de hormônio pré-formado pela
glândula tireoidiana que tenha sofrido algum dano celular – autoimune, infeccioso,
químico ou mecânico – com ruptura dos folículos, com coloide pré-formado etc.).
Já o hipertireoidismo é o estado de tireotoxicose quando a origem do excesso de
hormônio tireoidiano é a própria glândula tireoide que está sintetizando e liberando
sistemicamente quantidades aumentadas de hormônio.
2. Descrever as principais causas de hipertiroidismo.
Doença de Graves. Doença autoimune, causada pela presença de
autoanticorpos estimuladores do receptor de hormônio tireoestimulante
(TRAb estimulante), que estimulam a glândula tireoide a aumentar sua
produção hormonal. Geralmente ocorre em mulheres jovens, na presença de
autoimunidade. É a principal causa de hipertireoidismo. Até 30% dos
pacientes podem ter remissão espontânea do quadro, mesmo na ausência
de tratamento.
Bócio multinodular tóxico (BMNT). Surgimento de novos nódulos e/ou
crescimento de nódulos preexistentes em glândulas tireoides após longos
períodos em áreas carentes em iodo. Com o passar do tempo, geralmente
esses nódulos progressivamente adquirem certa autonomia e começam a
produzir hormônio tireoidiano em excesso. Acontece principalmente em
indivíduos mais idosos, sendo a principal causa de hipertireoidismo nessa
população de mais idade.
Adenoma tóxico. Causado por uma mutação somática ativadora em algum
gene regulador da atividade das células foliculares, determinando um
aumento de sua função e de sua produção hormonal independentemente do
estímulo do hormônio tireoestimulante (TSH).
Tireoidite subaguda indolor. Causada pela inflamação da glândula tireoide
com liberação de hormônio pré-formado que estava estocado nos folículos
tireoidianos. Corresponde a 10% dos casos de tireotoxicose. A inflamação
tireoidiana pode ter origem medicamentosa (uso de lítio, interferon-alfa,
amiodarona – em 5 a 10% dos pacientes tratados com esses fármacos),
autoimune (autoanticorpos positivos), no período pós-parto ou idiopática.
Geralmente causa hipertireoidismo leve e transitório na primeira fase, que,
na maioria das vezes, não precisa de tratamento. Se o paciente estiver muito
sintomático, pode ser tratado com betabloqueador. Tionamidas não
funcionam nas tireotoxicoses por tireoidite, pois a síntese hormonal é baixa;
o problema é a liberação de hormônio pré-formado que estava estocado na
glândula.
Tireoidite subaguda dolorosa de DeQuervain. Causada por infecção de via
respiratória superior atual ou recente. O antígeno viral ativa um antígeno
leucocitário humano (HLA) que ativa linfócitos que passam a atacar o tecido
tireoidiano. Cursa com tireoide dolorosa (dor que pode se irradiar para os
dentes e ouvidos), endurecida, inflamada, febre, mal-estar e aumento de
provas inflamatórias – velocidade de hemossedimenta ção (VHS), proteína
C reativa (PCR). É a principal causa de tireoide dolorosa. Causa dano às
células foliculares, com ruptura e liberação de hormônio tireoidiano pré-
formado na circulação. O diagnóstico de tireoidite subaguda dolorosa é
clínico. A ultrassonografia (USG) mostra aumento difuso da tireoide e
glândula hipoecog ênica (pela grande quantidade de células inflamatórias),
com reduzida vascularização. A cintilografia de tireoide é fria, e a cintilografia
com gálio, quente. O tratamento é feito com anti-inflamat órios, prednisona 40
mg/dia durante 4 a 8 semanas, e betabloqueador, se houver sinais e
sintomas de tireotoxicose na primeira fase da tireoidite.
Secreção ectópica de hormônio tireoidiano. Struma ovarii e os tumores
produtores de hormônio tireoidiano.
3. Explicar a abordagem diagnóstica e tratamento do hipertireoidismo.
Quadro clínico
O quadro clínico da tireotoxicose é decorrente da ação do hormônio ativo
[triiodotironina (T3)] sobre seus receptores nucleares, estimulando a transcrição
gênica de alguns genes e inibindo a transcrição gênica de outros. Basicamente, a
T3 age em todas as células do organismo, e por isso suas ações são bastante
sistêmicas.
As principais características são:
Aumento da taxa metabólica basal, podendo causar perda de peso;
Aumento da fome, podendo provocar ganho de peso;
Redução dos níveis de colesterol;
Perda de massa magra (muscular e óssea), podendo causar osteoporose;
Maior sensibilidade às catecolaminas, causando aumento da frequência
cardíaca, taquiarritmias, palpitações, fibrilação atrial e aumento de pressão
sistólica, por aumento na força de contração do miocárdio;
Redução da resistência vascular periférica induzida pela T3, causando
redução da pressão diastólica e aumento da pressão de pulso;
Insuficiência cardíaca congestiva (ICC) de alto débito pela taquicardia e pelo
aumento da volemia e pré-carga, com redução do tempo diastólico, edema
de membros inferiores, fadiga, dispneia e consequências da ICC, como
colapso cardiovascular ou até morte;
Aumento de eventos tromboemb ólicos;
Aumento da sudorese, pele pegajosa, hiperidrose e intolerância ao calor;
Tremor de extremidades;
Fraqueza muscular proximal e hiper-reflexia;
Dermopatia infiltrativa (mixedema pré-tibial);
Alterações psiquiátricas e neuropsiqui átricas, ansiedade, agitação,
irritabilidade e labilidade emocional;
Hiperdefeca ção;
Hipermenorragia ou irregularidade menstrual;
Oftalmopatia de Graves.
Abordagem inicial
Anamnese
Avaliar a presença de sintomatologia relacionada à tireotoxicose e à hiperatividade
adrenérgica e de efeitos compressivos causados por bócios muito volumosos.
Verificar o tempo de sintomatologia, a história de exposição recente a compostos
ricos em iodo e gravidez recente.
Anamnese familiar
Avaliar a presença de história familiar de tireoidopatia.
Exame físico direcionado
Avaliar emagrecimento, palpação tireoidiana (tamanho, simetria, consistência, dor,
mobilidade, nodulações, sopro), frequência respiratória, ritmo e frequência cardíaca,
pressão arterial, ausculta respirat ória, edema de membros inferiores, turgor da pele
e tremores de extremidades. Avaliar sinais de oftalmopatia de Graves (exoftalmo,
proptose, retração palpebral, lid lag, lagoftalmo, eritema e edema conjuntival,
palpebral ou de carúnculas, dor ocular espontânea ou à movimenta ção).
Avaliação bioquímica
TSH (é o exame mais sensível), tiroxina (T4) livre, T3 total. Algumas situações
podem mostrar TSH suprimido com T3 elevada e T4 normal (tireotoxicose por T3).
O hipertireoidismo geralmente cursa com síntese proporcionalmente maior de T3
que a habitual, enquanto as tireoidites costumam cursar com liberação muito maior
de T4 pré-formada. Portanto, se disponível, pode-se dosar T3 e T4 totais para
avaliar o valor dessa relação. Uma relação T3 (ng)/T4( μg) > 20 favorece o
diagnóstico de hipertireoidismo, enquanto uma relação de T3/T4 < 20 favorece o
diagnóstico de tireotoxicose por tireoidite.
Em caso de suspeita de tireotoxicose factícia pela ingestão de hormônios
tireoidianos, pode-se fazer a dosagem de tireoglobulina, que vem muito baixa nesta
situação.
Autoanticorpos | Antitireoperoxidase (TPO), antitireoglobulina (Tg), TRAb
O TRAb, apesar de ajudar muito no diagnóstico de doença de Graves, pois até 95%
das pessoas com essa doença apresentam TRAb positivo, e esse é um anticorpo
muito específico e pouco comum na população geral, não é considerado um exame
essencial para o diagnóstico dessa doença. Casos muito típicos de hipertireoidismo
com bócio difuso, acometimento ocular e quadro clínico muito típico de doença de
Graves não necessitam da dosagem desse autoanticorpo para a sua confirmação.
Consideram-se como indicações para solicitação de TRAb: gestantes com
antecedente de doença de Graves (para avaliar risco de tireotoxicose fetal pela
passagem transplacent ária do TRAb), diagnóstico diferencial entre hipertireoidismo
gestacional do primeiro trimestre ou doença de Graves na gestação, pacientes
eutireóideos com acometimento ocular sugestivo de oftalmopatia de Graves.
Ultrassonografia de tireoide
Avaliam-se tamanho, simetria, ecogenicidade, nodularidade e vascularização ao
doppler.
Também não é considerado um exame essencial para a investigação do
hipertireoidismo, sendo especialmente útil para os casos em que há palpação de
nódulos na glândula. A utilização de doppler pode auxiliar na avaliação etiológica de
alguns casos de hipertireoidismo, pois a velocidade do fluxo das artérias tireoidianas
ao doppler ajuda no diagnóstico diferencial entre hipertireoidismo e outras causas
de tireotoxicose, como as tireoidites subagudas (velocidade de fluxo sistólico muito
mais alto no hipertireoidismo), além de ajudar a diferenciar entre os vários tipos de
tireotoxicose induzidos pela amiodarona.
O fluxo sanguíneo na doença de Graves é muito alto, na tireoidite de Hashimoto
eleva-se um pouco, na tireoidite subaguda é quase ausente.
Cintilografia diagnóstica
Avaliar se a captação é difusa, sugerindo doença de Graves, se é nodular difusa,
sugerindo BMNT, ou se é nodular única com inibição do restante do parênquima,
sugerindo adenoma tóxico. Se a glândula for fria, sugere tireotoxicose por outra
causa que não o hipertireoidismo, ou pode se apresentar dessa maneira em
pacientes que tenham feito exames contrastados nos últimos 30 a 60 dias ou que
tenham recebido lugol ou alguma substância ou alimento rico em iodo recentemente.
Deve-se aguardar pelo menos 30 dias, idealmente 3 meses, após esse tipo de
exposição ao iodo para a realização da cintilografia.
A cintilografia não é obrigat ória em todos os casos de hipertireoidismo. Nos casos
em que a história, o exame físico e os exames laboratoriais já forem muito típicos da
doença de Graves, a cintilografia não precisa ser realizada. No entanto, ela deve ser
feita nos casos em que ainda há dúvida etiológica da tireotoxicose, principalmente
se houver suspeita de tireoidite ou de nódulo quente. Lembre-se que a cintilografia
não deve ser realizada em gestantes ou lactantes.
Tratamento
Betabloqueadores ou inibidores de canais de cálcio
Deve ser realizado tratamento sintomático da tireotoxicose com betabloqueadores
em pacientes com sintomas adrenérgicos (palpitações, hipertens ão, tremores,
ansiedade) em que o uso desse tipo de fármaco não esteja contraindicado (por ICC
descompensada, asma grave etc.), independentemente da causa da tireotoxicose.
O uso de betabloqueadores (propranolol, atenolol, metoprolol) reduz a frequência
cardíaca, a pressão arterial, os tremores, a fraqueza muscular, a ansiedade, a
irritabilidade e a labilidade emocional, e aumenta a capacidade física.
Propranolol: 20 a 80 mg, 2 a 4 vezes/dia
Atenolol: 25 a 100 mg, 1 vez/dia.
No caso de contraindica ção ao uso de betabloqueadores, pode-se usar
bloqueadores dos canais de cálcio, como verapamil ou diltiazem.
Tionamidas
As tionamidas – propiltiouracil (PTU), metimazol (MMZ - droga de escolha) ou
carbimazol, não disponível no Brasil – são medicações que agem reduzindo a
produção de T3 e T4 pelas células foliculares tireoidianas. Apesar de não
bloquearem a captação de iodo pela glândula e nem a liberação de hormônios pré-
formados, as tionamidas inibem a organifica ção do iodo e o acoplamento das
moléculas de MIT (monoiodotirosinas) e DIT (di-iodotirosinas) para formar T3 e T4.
O PTU tem ainda um mecanismo de ação adicional, de inibir a deiodinase tipo 1, e
assim reduzir a conversão periférica de T4 em T3, principalmente se utilizado em
altas doses. Além de reduzirem a síntese hormonal pela tireoide, as tionamidas têm
um efeito adicional imunomodulador, capaz de reduzir a expressão de antígenos
tireoidianos e, desse modo, reduzir a imunidade contra a glândula. Por isso, são
especialmente utilizadas para o tratamento do hipertireoidismo causado pela
doença de Graves, uma vez que no seu decorrer podem cursar com até 30 a 50%
de chance de remissão da doença (ou 20 a 30% nos casos de crianças), com a
suspensão do medicamento após 12 a 18 meses do seu uso, principalmente nos
casos de pacientes cujo TRAb se tornou negativo ao longo do tratamento (em 70 a
80% dos pacientes o TRAb se torna negativo após 1 a 2 anos de tratamento).
Radioiodoterapia
A RIT é um tratamento no qual o paciente recebe uma dose oral de iodo radioativo (I
131 ), que irá se concentrar nos tecidos mais ávidos por iodo no organismo e causar
a destruição actínica desses tecidos, ou seja, causa uma tireoidite destrutiva. Dessa
maneira, consegue-se reduzir a produção hormonal pela glândula, que se torna
hipofuncionante, na maioria das vezes, depois de alguns meses ou anos do
tratamento.
Tem a vantagem de ser um tratamento definitivo e muito eficaz, com baixas taxas de
recidiva (10 a 20%), geralmente muito bem tolerado, capaz de trocar o
hipertireoidismo, que é uma doença de morbidade bem maior e de controle mais
difícil, pelo eutireoidismo ou hipotireoidismo, que é uma doença de controle muito
mais fácil e morbimortalidade muito menor.
A RIT deve ser a opção de escolha de tratamento para os casos de doença de
Plummer ou BMNT (que, ao contrário da doença de Graves, não apresentam
remissão espontânea com o uso de tionamidas, já que sua causa não é autoimune),
para os casos de recidiva pós-curso de tratamento com tionamidas, para pacientes
com contraindica ção ao tratamento com tionamidas e cirúrgico e para aquelas que
precisam obter controle rápido do hipertireoidismo ou que queiram engravidar
depois de 1 ano do tratamento e desejam reduzir o risco de evoluírem com
hipertireoidismo gestacional ou pós-parto.
Pacientes com hipertireoidismo significativamente sintomático, idosos ou com
comorbidades com alto risco de se manterem muito tempo em hipertireoidismo
(arritmias, fibrilação atrial, ICC etc.) devem ser tratados com betabloqueador
associado ou não às tionamidas enquanto aguardam a dose de radioiodo (RAI).
Caso estejam estáveis e pouco sintomáticos, podem ser encaminhados diretamente
para a RIT sem necessidade de controle prévio do hipertireoidismo. Prefere-se
inclusive que o paciente seja encaminhado para a RIT em pleno hipertireoidismo,
para que a tireoide esteja ávida pelo iodo radioativo e tenha, portanto, uma alta
captação, de modo que a irradiação sobre a glândula seja mais efetiva. Caso se
opte pelo tratamento prévio com tionamidas, deve-se orientar a suspensão da
tionamida entre 7 e 14 dias antes da dose de iodo, visando encaminhar o paciente à
RIT com pelo menos um hipertireoidismo leve (T4L entre 1,5 a 2 ng/dℓ, p. ex.), mas
nunca em eutireoidismo, pois, neste caso, a captação do iodo radioativo pela
glândula será menor.
Contraindica ções:
Gestantes e mulheres que queiram engravidar nos próximos 6 a 12 meses: a
RIT não pode ser realizada em uma gestante, pelo risco de queimar a
tireoide fetal após 10 semanas de idade gestacional, além de aumentar o
risco de neoplasias e de retardamento intelectual no feto. Deve-se esperar
pelo menos 6 a 12 meses para engravidar após a RIT, para evitar oscilações
de função tireoidiana, que costumam ocorrer no primeiro ano pós-RIT,
durante uma eventual gestação;
Lactantes: o radioiodo acumula-se na mama da lactante, aumentando o
risco de desenvolvimento de carcinoma de mama futuramente. Caso opte
por fazer RIT em uma mulher que esteja amamentando, deve-se suspender
o aleitamento por 6 semanas antes da realização da RIT, para reduzir o risco
de carcinoma de mama na mulher por acúmulo do iodo radioativo nas
glândulas mamárias;
Crianças com < 5 anos: risco teórico de malforma ções, déficit de
desenvolvimento e câncer de tireoide nessa faixa etária. Em crianças entre 5
e 10 anos, pode-se utilizar a RIT, desde que a dose calculada seja < 10 mCi.
Em crianças com > 10 anos, deve-se calcular a dose utilizando > 160 mcCi/g
de tecido tireoidiano. Ao se dar alta dose, o objetivo é alcançar
hipotireoidismo, e não eutireoidismo, pois o uso de baixa dose de radiação
na infância deixa uma parcela de tecido tireoidiano viável com maior risco de
desenvolver nódulos e carcinoma de tireoide ao longo da vida. Portanto,
sempre se deve calcular doses > 160 mcCi/g de tecido nessa faixa etária. É
preciso deixar a criança eutireóidea antes do RAI, pois foram descritos
alguns casos de crise tireotóxica em crianças submetidas ao procedimento
em hipertireoidismo. Por isso, mantém-se MMZ até 3 a 5 dias antes do dia
da dose da RIT nessa faixa etária;
Pacientes com nódulo tireoidiano suspeito: deve-se excluir completamente a
possibilidade de câncer de tireoide antes da RIT, pois a punção de um
nódulo de tireoide pós-RIT pode vir com material bastante distorcido e
prejudicado. Portanto, na presença de um nódulo frio suspeito, faz-se a
punção do nódulo antes do RAI e, se a citologia for suspeita, opta-se pelo
tratamento cirúrgico;
Oftalmopatia de Graves grave, com risco de perda de visão, em atividade;
Glândulas que não mostram grande captação à cintilografia;
Pessoas que não possam seguir as orientações de segurança pós-
exposição ao material radioativo.
Cirurgia
O tratamento cirúrgico deve ser indicado para pacientes com hipertireoidismo na
presença de câncer de tireoide ou nódulo suspeito ou naqueles que não obtiveram
controle com os outros tipos de tratamento ou tenham algum tipo de contraindica ção
aos tipos menos invasivos de tratamento disponíveis na atualidade. Também deve
ser indicado nos casos de hipertireoidismo associado a hiperparatireoidismo
primário com indicação cirúrgica, ou nos casos de bócios muito volumosos
apresentando sintomas compressivos (principalmente bócios > 80 g), em gestantes
que não tenham adquirido controle do hipertireoidismo com o uso das tionamidas ou
tenham apresentado algum tipo de reação grave a esses medicamentos, mulheres
que pretendam engravidar no ano seguinte que tenham algum tipo de
contraindica ção ao uso das tionamidas, entre alguns outros casos, como escolha do
paciente.
Geralmente é realizada tireoidectomia total ou quase total, dependendo da presença
ou não de câncer de tireoide ou de nódulo suspeito. O risco de recidiva é
praticamente zero, se for realizada a tireoidectomia total, e varia de 5 a 20% nos
casos de tireoidectomia quase total.
Escleroterapia de nódulos ou cistos
A escleroterapia de cistos autônomos com injeção de etanol ou a ablação com laser
ou radiofrequ ência de nódulos sólidos autônomos são opções eficazes, baratas e
seguras de tratamento para nódulos ou cistos autônomos em pacientes que tiverem
contraindica ção ou não queiram ser submetidos aos tipos mais tradicionais de
tratamento (iodo ou cirurgia).
4. Discutir a conduta diante do nódulo e indicações de PAAF.
Nódulos tireoidianos (NT) são um achado clínico comum, com prevalência de 3 a
7% com base na palpação. À ultrassonografia (US), a prevalência de NT na
população geral é estimada em 20 a 76%, percentual similar ao relatado em
estudos de necropsia. Além disso, em 20 a 48% dos pacientes com um nódulo
tireoidiano palpável, são encontrados outros nódulos na investigação por US. Os NT
são mais comuns em pessoas idosas, em mulheres, em indivíduos com deficiência
de iodo e naqueles com história de exposição à radiação.
A grande importância no manuseio dos NT, apesar de a maioria representar lesões
benignas, é descartar a possibilidade de câncer (Ca) da tireoide, que ocorre em 5 a
10% dos casos em adultos e em até 26% em crianças. Esses percentuais não
diferem significativamente se a glândula apresentar um nódulo único ou múltiplos
nódulos.
As causas mais frequentes de NT são cistos coloides e tireoidites (80% dos casos),
além de neoplasias foliculares benignas (10 a 15%) e carcinoma (5 a 10%).
Quando se detecta um nódulo na tireoide, qualquer que seja o modo de
identifica ção inicial, é fundamental descartar a possibilidade de neoplasia maligna e
caracterizar o status funcional e anatômico da glândula. Essa investigação inclui
uma história clínica completa e um exame clínico cuidadoso, além dos testes de
função tireoidiana, exames de imagem e, se necessário, punção aspirativa com
agulha fina (PAAF).
História clínica
Apesar de a história clínica, na maioria das vezes, não ser sensível ou específica,
existem alguns fatores que interferem no risco para malignidade em NT, entre os
quais se destacam:
Sexo: embora nódulos sejam oito vezes mais comuns em mulheres, o risco
de malignidade no sexo masculino é duas a três vezes maior;
Idade: o Ca da tireoide é mais comum em crianças (10 a 26% dos nódulos
são malignos) e pessoas idosas, mas a maioria das lesões nodulares nessa
faixa etária é benigna. Nódulos em indivíduos com menos de 20 anos e
acima de 70 anos de idade apresentam maior risco de serem malignos;
Sintomas locais: sintomas como rápido crescimento do nódulo, rouquidão
persistente ou mudança da voz e, mais raramente, disfagia e dor podem
indicar invasão tissular local por um tumor. Entretanto, pacientes com Ca de
tireoide em geral evoluem sem sintomas. Lesões benignas mais
vascularizadas podem apresentar rápido crescimento e dor em decorrência
de hemorragia intranodular, achado mais frequente em neoplasias benignas,
como os adenomas. A disfunção do nervo recorrente laríngeo, em 17 a 50%
dos casos, resulta de patologias tireoidianas sem malignidade;
Doenças associadas: embora os dados da literatura sejam controversos
sobre o tema, existem evidências de maior prevalência de nódulos
tireoidianos e Ca de tireoide em pacientes com doença de Graves, em
comparação à população geral. Da mesma forma, foi relatado que um
nódulo em paciente com tireoidite autoimune teria um risco
significativamente maior de ser maligno. Uma possível explicação seria o
fato de que TSH e TRAb têm efeitos mitogênicos e antiapopt óticos sobre as
células foliculares tireoidianas. Por outro lado, a maioria dos casos do raro
linfoma primário da tireoide ocorre em pacientes com TH;
Outros fatores: neste item, incluem-se história familiar de Ca de tireoide ou
síndromes heredit árias como neoplasia endócrina múltipla (MEN) do tipo 2,
síndrome de Cowden, síndrome de Pendred, síndrome de Werner, polipose
adenomatosa familiar, bem como radioterapia externa do pescoço durante a
infância ou adolescência. Em um estudo foi relatado que, quanto mais
elevado o TSH, maior o risco de o nódulo ser maligno.
Exame físico
A avaliação de um paciente com um ou mais NT deve incluir o exame detalhado do
pescoço, com especial ênfase para algumas características do nódulo (tamanho,
consistência, mobilidade e sensibilidade) e adenopatia cervical. Nódulo solitário, de
consistência endurecida, pouco móvel à deglutição e associado à linfadenomegalia
regional representa um achado bastante sugestivo de câncer, embora essas
características sejam pouco específicas.
Na interpreta ção do exame físico cervical, algumas considera ções são importantes:
A consistência do nódulo pode ser enganosa, uma vez que alguns
adenomas hemorrágicos ou calcificados têm aparência suspeita à palpação,
e carcinomas papilíferos eventualmente se apresentam com consistência
cística. A palpação da tireoide tem baixa sensibilidade para identificar
nódulos, assim como determinar o número real de nódulos presentes. Na
realidade, a US detecta nódulos (um terço dos quais com mais de 2 mm) em
pacientes com exame cervical normal. Além disso, não raramente, a
palpação pode indicar a existência de nódulos que, posteriormente, não são
confirmados pela US, bem como frequentemente subestimar a quantidade
de nódulos. De fato, em 20 a 48% dos pacientes com um nódulo palpável,
detectam -se nódulos adicionais à US;
A tireoidite de Hashimoto (TH) pode parecer aderente às estruturas locais, e
a rara tireoidite de Riedel tem consistência pétrea, além de ser localmente
invasiva. Doença benigna da tireoide já foi demonstrada em 30% de nódulos
endurecidos ou com aparente fixação às estruturas locais;
Linfonodos cervicais são encontrados em cerca de 25 a 33% dos pacientes
com Ca papilífero, mas já foram relatados em igual percentual de pacientes
com doenças benignas.
Avaliação laboratorial dafunção tireoidiana
A dosagem de TSH e T4 livre deve obrigatoriamente fazer parte da avaliação inicial.
A maioria dos pacientes com Ca de tireoide se apresenta eutireóidea. O achado de
hipertireoidismo em paciente com bócio nodular é um forte indicativo contra o
diagnóstico de neoplasia maligna. Anticorpos antitireoperoxidase (anti-TPO), em
títulos elevados, confirmam o diagnóstico de TH, mas não descartam a
concomitância de uma neoplasia tireoidiana.
A elevação da calcitonina sérica (sCT) é o achado mais característico do Ca
medular da tireoide (CMT). A mensuração de rotina da sCT em todos os pacientes
com nódulos tireoidianos (NT) não selecionados ainda é motivo de debate,
principalmente devido à raridade do CMT. Ela é, contudo, realizada na Europa, onde
os estudos demonstram que o diagnóstico mais precoce do CMT possibilita um
melhor prognóstico. Em estudo recente, dosamos a sCT em 270 consecutivos
pacientes com NT > 1 cm. CMT foi confirmado em 2 de 3 pacientes com sCT > 10
Dosagem da sCT é imperativa em pacientes com histórico ou suspeita clínica de
CMT familiar ou MEN-2. Também é recomendada se os resultados citológicos das
amostras obtidas por PAAF forem sugestivos de CMT, em casos de amostras
citológicas insatisfatórias e em pacientes com bócio nodular a serem submetidos à
tireoidectomia, para evitarmos que o paciente se submeta a uma abordagem
cirúrgica menos extensa do que a necessária (p. ex., lobectomia, em vez de
tireoidectomia total).
Cintilografia
A cintilografia com radioiodo ou tecnécio tem pouco valor para distinguir lesões
malignas de benignas. A maior parte dos nódulos mostra-se hipocaptante (frios) ou
normocaptante à cintilografia (> 90%), porém não mais do que 15% dos nódulos
“frios” são malignos. Em contrapartida, é excepcional o achado de malignidade em
nódulos “quentes ” ou hipercaptantes (1 a 2%).
Devido a sua baixa especificidade, a cintilografia deve ser reservada para algumas
situações específicas. A principal indicação seria a patologia nodular associada ao
hipertireoidismo, para um preciso diagnóstico do adenoma tóxico ou do bócio
multinodular tóxico. Em caso de nódulo normo ou hipocaptante, deverá ser seguido
o protocolo de investigação com PAAF, mesmo quando detectado em pacientes com
a doença de Graves. Nos casos com diagnóstico citológico de neoplasia folicular ou
suspeito de neoplasia folicular, a cintilografia com radioiodo ou tecnécio poderá ser
realizada na tentativa de se identificar um adenoma hipercaptante autônomo, o que
afastaria a malignidade.
Ultrassonografia
A US da tireoide é o melhor exame de imagem para a detecção de nódulos, com
sensibilidade de aproximadamente 95%, superior a outros métodos mais
sofisticados, como a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética
(RM). Além disso, não raramente, ela modifica a conduta clínica baseada apenas no
exame da palpação tireoidiana. A US torna possível a visualização de nódulos não
palpáveis, avalia com precisão as características desses nódulos (volume, número)
e diferencia cistos simples, que têm baixo risco de malignidade, de nódulos sólidos
ou mistos. Além disso, a US pode também servir como guia para procedimentos
diagnósticos (p. ex., PAAF) e terapêuticos (p. ex., aspiração de cistos, injeção de
etanol e terapia com laser), assim como o monitoramento de crescimento do nódulo.
Punção aspirativa com agulha fina
A PAAF é o melhor método para diferencia ção entre lesões benignas e malignas da
tireoide, sendo tecnicamente simples e de fácil execução ambulatorial.
Estará indicada quando forem encontrados nódulos tireoidianos normo ou
hipocaptantes à cintilografia. Foi sugerido, por alguns estudos, que tais nódulos
teriam maior risco para malignidade em pacientes com Doena de Graves, porém
estudos mais recentes não confirmaram essa possibilidade.
Nos últimos 4 anos, de uma forma mais ampla, passou-se a adotar em nosso país o
sistema Bethesda para a classificação dos laudos citopatológicos, o qual propicia
maior uniformidade dos mesmos, além de permitir uma estimativa do risco de
malignidade (RM). As amostras são classificadas em 6 categorias:
I – amostra não diagnóstica (RM de 1 a 4%);
II – benigno (0 a 3%);
III – atipia ou lesão folicular de significado indeterminado (5 a 15%);
IV – suspeito de neoplasia folicular (15 a 30%);
V – suspeita para malignidade (70 a 75%); e
VI – maligno (97 a 99%).

Acurácia
A PAAF representa o procedimento mais sensível e específico para o diagnóstico
etiológico dos nódulos tireoidianos, com sensibilidade de 68 a 98% (média de 83%),
e especificidade de 72 a 100% (média de 92%). A taxa média relatada de
falso-negativos em PAAF guiadas por palpação variou de 1 a 11% (média de 5%).
No entanto, com o uso da PAAF guiada por US (US-PAAF), essa proporção baixa
para aproximadamente 1 a 2%40–43 e diminui ainda mais com repetidas US-PAAF.
Os erros mais comuns ocorrem em lesões > 4 cm ou < 1 cm, assim como nos
nódulos císticos. A incidência relatada de resultados falso-positivos varia de menos
de 1 a 7,7%.
A PAAF tem como principal limitação diagnóstica a distinção das neoplasias
foliculares e as de células de Hürthle quanto a sua natureza benigna ou maligna.
Entre as lesões malignas, o carcinoma papilífero é o mais comum e o mais
facilmente diagnosticado pela citologia, com raríssimos resultados falso-negativos.
Indicação
Na indicação para PAAF deve-se levar em conta o tamanho do nódulo e, sobretudo,
seu aspecto ultrassonogr áfico. Nódulos < 1 cm, a princípio, não devem ser
puncionados, exceto em indivíduos com padrão ultrassonogr áfico de alto risco ou se
houver adenomegalia cervical de aspecto não reacional. Tal abordagem se baseia
nas dificuldades técnicas para a adequada coleta da amostra (maior risco de
falso-negativo ou amostra insatisfatória) e, sobretudo, no habitual bom prognóstico
do microcarcinoma tireoidiano (< 1 cm).
A PAAF deve ser repetida diante de um resultado citológico insatisfatório ou
indeterminado. Geralmente, recomendase que o novo exame seja realizado após 3
meses, para se evitarem lesões reativas da punção prévia. No entanto, esse
período deve ser menor quando houver uma suspeita maior de malignidade.
Em alguns serviços, costuma-se repetir a PAAF após 6 a 12 meses, se o resultado
da primeira punção for benigno. Outros autores recomendam repetir o procedimento
por 3 anos consecutivos. No entanto, as atuais diretrizes da Associação Americana
de Endocrinologistas Clínicos (AACE)/Associação Europeia de Tireoide (ETA) e da
Associação Americana de Tireoide (ATA), bem como o consenso brasileiro, são
mais favoráveis ao seguimento clínico, com realização de US 6 a 24 meses após a
PAAF inicial, repetindo -se o procedimento apenas se o nódulo aumentar em mais de
20% em pelo menos duas dimensões, tiver aumento de volume > 50% ou caso
surjam características ultrassonogr áficas indicativas de malignidade. Essa
recomenda ção baseia-se na baixa ocorrência de resultados falsonegativos (1 a 2%),
em centros com larga experiência em PAAF, quando a amostra é retirada por meio
de PAAF guiada por US.

Conduta
Condutas na avaliação de um nódulo tireoidiano variam de um serviço a outro. No
entanto, hoje é consenso que a PAAF representa o principal exame de investigação
e, sempre que possível, deve ser guiada por US. Inicialmente, solicitamos TSH, T4
livre e US. Na ausência de hipertireoidismo, todo nódulo sólido ou
predominantemente sólido ≥ 1 cm (ou ≥ 1,5 cm, se for de baixo risco) deve ser
puncionado. No caso de nódulos menores (≥ 0,6 e < 1 cm), só indicamos PAAF se
houver imagens ultrassonogr áficas suspeitas de malignidade no nódulo ou em um
ou mais linfonodos cervicais. Na depend ência do laudo citopatol ógico, o caso será
assim conduzido:
Categoria VI (maligno): indicamos tireoidectomia total (TT), na grande
maioria das vezes seguida de ablação do tecido tireoidiano remanescente
com iodo radioativo, 8 a 12 semanas após cirurgia;
Categoria II (benigno): o seguimento do paciente poderá ser feito com US,
inicialmente a cada ano e depois em intervalos maiores. Costumamos repetir
a PAAF uma vez, após 12 meses (particularmente, nos pacientes com
aspecto de maior suspeita à US). As recentes diretrizes da ATA recomendam
repetir a PAAF apenas diante da detecção de crescimento nodular > 20%
em pelo menos duas dimensões, aumento no volume total > 50% ou
aparecimento de características ultrassonogr áficas sugestivas de
malignidade. Se a segunda amostra citológica for benigna, as chances de
falso-negativo para malignidade são praticamente nulas e não há
necessidade de avaliações ultrassonogr áficas posteriores;
Categoria III (AUS/FLUS): deve-se repetir a PAAF e, diante da manuten ção
do resultado, costumamos indicar cirurgia, na depend ência dos fatores de
risco, aspectos ultrassonogr áficos e preferência do paciente. Nesta situação,
entre pacientes submetidos à cirurgia, o risco de malignidade variou de 6 a
48% (média de 16%). Uma outra opção bastante interessante, se disponível,
seriam os testes moleculares;
Categoria IV (FN/SFN): deve-se repetir a PAAF e, diante da manuten ção do
resultado, costumamos indicar cirurgia, sobretudo nos pacientes com
aspectos ultrassonogr áficos de maior risco, e cujo nódulo não seja
hipercaptante à cintilografia. Nesta categoria, o risco estimado de
malignidade é de 15 a 30% e, entre os pacientes submetidos à cirurgia,
situou-se entre 16 e 33% (média de 26%). Se disponíveis, os testes
genéticos podem ser muito úteis na decisão cirúrgica. De fato, nódulos
citologicamente classificados como AUS/FLUS ou FN/SFN, e que sejam
positivos para mutações de BRAF V600E , RET/PTC ou PAX8/PPARc, têm
um risco estimado de malignidade > 95% e devem, pois, ser considerados
como categoria similar a carcinoma da tireoide citologicamente confirmado.
No entanto, um achado negativo não exclui malignidade (44 a 100% de
sensibilidade);
Categoria V (suspeito de malignidade): deve-se repetir a PAAF e,
mantendo -se o diagnóstico, a conduta é sempre cirúrgica, devido ao
estimado risco de 60 a 75% para malignidade. Em alguns estudos, esse
risco foi confirmado em até 87% das vezes à histopatologia;

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