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GRANDES TEMAS DO CONHECIMENTO

PSICOLOGIA
CAUSAS

ESPECIAL SERIAL KILLERS


O FASCÍNIO DOS COMO SABER SE
HISTÓRIA

ESTÁ CONVIVENDO
PSICOPATAS COM UM ASSASSINO?
Um dos distúrbios que mais atrai Pode ser a pessoa ao lado no ônibus,
a atenção da mídia, carrega uma lista no metrô, ou o vizinho que você nem
de personagens que evocam imagina, entenda como saber
assassinos cruéis, sanguinários se você está diante de um
e frios, os quais intrigam por sua assassino sem perceber
ENTREVISTA

inteligência e capacidade de
seduzir a todos a sua volta

Nº 16 - R$ 16,90 - €$ 10,50
MEDICAMENTOS

A DIFERENÇA VERSÃO DIGITAL

ENTRE O
ELABORADA POR
PACO’S AGÊNCIA
PACO’S
DIGITAL

TRANSTORNO
DIGITAL

E A CRUELDADE MANIPULADORES
A inteligência dos psicopatas é notória;
FILME

Alguns de nós trazemos, para o bem


ou para o mal, uma certa dose de charmosos, sedutores e mestres na arte
transtornos psicológicos, mas como de usar as fraquezas humanas a seu
saber quando isso se torna uma porta favor, eles têm a capacidade de moldar as
para a crueldade? pessoas aos seus objetivos cruéis.
ÍNDICE
Mythos Editora
3
Diretor-Executivo:
NOTAS Helcio de Carvalho

Diretor-Financeiro:
Dorival Vitor Lopes

6 Editor-Executivo:
Alex Alprim
ASSASSINOS SERIAIS: (alprim@gmail.com)
LOUCOS OU CRUÉIS?
Revisão:
Melissa Correa

12 Produtor Gráfico:
Ailton Alipio
O QUE CARACTERIZA OS (ailton@mythoseditora.com.br)
ASSASSINOS SERIAIS?
Colaboradores:
Graciela Gema Pasa, Ivan Mario Braun, Júlio Delmanto,
Marcelo Oliveira do Nascimento, Marcelo Quirino, Pablo
17 Ornelas Rosa e Ricardo Sanches Pinheiro.

PESQUISANDO OS Estagiário:
ASSASSINOS SERIAIS Pedro Faria

Gerente de Vendas/Livros:
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24 Coordenação de Consignação:
PSICOPATIA E SERIAL Mônica A. Silva
KILLERS
Números Atrasados:
Fabiana Dionísio

Circulação:
30 Antonia B. Coelho
ASSASSINOS SERIAIS E
Impressão:
A NATUREZA HUMANA Gráfica São Francisco

Distribuição Nacional:
Fernando Chinaglia
34
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SÉRIE Dúvidas:
faleconosco@mythoseditora.com.br

(PRODUÇÃO, PROJETO GRÁFICO,


DIAGRAMAÇÃO E PUBLICIDADE)
40 Paco´s Serviços Gráficos
Dir. Executivo/Projetos: Alex Alprim
COMPREENDENDO O Dir. Financeiro: Paula Francisquini
SERIAL KILLER Designer-Chefe: Percila Souza
Designer-Júnior: Pedro Faria
Estagiária: Mayara Santos

Revista de Psicologia Especial é uma publicação da Mythos Editora.


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NOTAS

A MAIOR BASE DE DADOS SOBRE ASSASSINOS SERIAIS

Fotodivulgação: Flickr-tangi_bertin
A Universidade de Radford, nos Estados Uni- são os responsáveis pelas atualizações, e uti-
dos, mantém o Centro de Informações sobre lizam fontes diversas como registros de pri-
Assassinos Seriais, o maior no mundo para es- são, transcrições de tribunais, mídia, livros e
tudo e coleta de dados sobre estes casos. A or- internet.
ganização foi criada para fornecer aos alunos,
Uma das primeiras etapas para a criação do
professores e pesquisadores informações mais
Centro de Informações foi definir quem seria
precisas sobre este tipo de crime – cuja frequ-
ência é muito maior no país (ver tabela 1). considerado um serial killer: “indivíduos que
Criado em 1992, seus dados são revistos conti- mataram pelo menos duas pessoas, que repre-
nuamente, e hoje registram 3.873 casos e 11.187 sentam dois ou mais eventos individuais, com
vítimas. Os estudantes da própria universidade um período de reflexão entre os eventos”.

Tabela 1:

CASOS
DÉCADA CASOS NOS EUA TOTAL
INTERNACIONAIS

1900 19 13 32
1910 34 16 50
1920 34 29 63
1930 39 24 63
1940 37 40 77
1950 50 35 85
1960 168 67 235
1970 512 145 657
1980 680 192 872
1990 572 269 841
2000 318 229 547
2010 73 53 126

Fonte: Radford University/FGCU Banco de Dados de Assassinos Seriais

3
NOTAS

Fotodivulgação: Flickr-cbamber85
O CONCEITO DE “SERIAL KILLER”

O FBI, policia investigativa americana, classi- No Brasil, em 1988, o Instituto Nacional de Jus-
fica um assassino como serial quando ele mata tiça criou a definição brasileira para os “assas-
três ou mais vítimas, com períodos de “cal- sinos seriais”: “Uma série de dois ou mais as-
maria” entre os assassinatos. É importante sassinatos cometidos como eventos separados,
entender este período entre um assassinato e normalmente, mas nem sempre, por um infra-
outro para não confundir o serial killer com um tor atuando isolado. Os crimes podem ocorrer
“assassino em massa”, que mata, sim, várias durante um período de tempo que varia desde
pessoas, mas de uma vez (ou curto período de horas até anos. Quase sempre o motivo é psico-
tempo) e no mesmo local; ou “assassino turbu- lógico, e o comportamento do infrator e a evi-
lento”, que mata em diversos locais em um cur- dência física observada nas cenas dos crimes
to espaço de tempo. refletiram nuances sádicas e sexuais”.

MULHERES TAMBÉM COMETEM ASSASSINATOS EM SÉRIE

Apesar de pouco divulgados, casos de mulhe- homens, mas sua capacidade de agir com
res assassinas seriais existem. Como afirma crueldade não necessariamente. Dentre as ca-
a especialista Ilana Casoy, os homens são res- racterísticas comuns das assassinas em série
ponsáveis pela grande maioria dos assassina- estão: algum tipo de trauma na infância en-
tos em série, mas não se pode negligenciar os
volvendo homens, matam pessoas conhecidas
crimes cometidos por mulheres. Dentre os ca-
(como crianças ou maridos) e procuram fazer
sos registrados nas primeiras décadas do sécu-
lo passado, de 20% a 40% foram cometidos por com que as mortes pareçam naturais.
mulheres. Já na década de 2000, apenas 8,6%,
caindo para 5,6% a partir dos anos 2010. Fonte: Radford University/FGCU Banco de Dados de Assassi-
Suas motivações costumam diferir das dos nos Seriais

4
NOTAS

POR QUE A EXPRESSÃO “SERIAL KILLER” OU


“ASSASSINOS EM SÉRIE”?

A expressão mais conhecida para assassinos Criar esta expressão e difundi-la foi importan-
seriais é a da língua inglesa, “serial killer”. O te para que outros tipos de crimes não fossem
termo surgiu na década de 70 com Robert Res- classificados da mesma forma, atrapalhando
sler, ex-diretor do Programa de Prisão de Cri- seu entendimento e estudo. Antes deste perío-
minosos Violentos do FBI. Sua inspiração foi a do, assassinatos em massa e matar uma pes-
polícia inglesa, que classificava assassinatos soa estranha podiam ser considerados “assas-
semelhantes como “crimes em série”, em refe- sinatos seriais”.
rência aos programas de tv chamados de “sé-
rie”, com frequência e padrão definidos. Fonte: https://www.institutomarconi.com.br/serialkillers.htm

Fotodivulgação: Flickr-wespeck

O QUE MOTIVA UM ASSASSINO SERIAL?

Estudos apontam que a maior motivação para (7,84%), ações de gangues (3,28%), a tentativa
a realização de assassinatos em série é o pra- de se evitar a prisão (1,21%), a busca por aten-
zer em si (46,11%), como emoção, luxúria, ção (0,62), conveniência (0,73%), alucinações
poder, seguido do ganho financeiro (31,68%). (0,41%) e cultos religiosos (0,21%).
Representando os outros 22% do total, temos
ainda os múltiplos motivos (8,12%), a raiva Fonte: Radford University/FGCU Banco de Dados de Assassinos Seriais

O QUE É QUE OS ESTADOS UNIDOS TÊM?

Os Estados Unidos possuem menos de 5% de apresentou 101 casos e a Itália, 100. A base de
toda a população mundial, mas produziram dados internacional contabilizou 15 assassinos
mais de 84% de todos os assassinos seriais seriais na história brasileira.
conhecidos desde 1980. De todos os casos re-
gistrados, o país apresentou 2.625, seguido Fonte: Radford University/FGCU Banco de Dados de Assassi-
pela Inglaterra, com 142 casos. África do Sul nos Seriais

5
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

ASSASSINOS
SERIAIS
LOUCOS OU CRUÉIS?

6
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

Assassinos seriais, ou serial killers, são indi-


víduos que cometem, no mínimo, dois homicí-
dios com um intervalo temporal entre eles, que
pode ser de dias ou, até mesmo, de anos. No
entanto, há autores que exigem a existência de,
no mínimo, três delitos 1 .
Os serial killers mais conhecidos – e re-
tratados pela grande mídia – são homens que

M
UITOS SERIAL KILLERS cometeram três ou mais homicídios sexuais se-
SERVIRAM DE INSPIRAÇÃO riados, nos quais as vítimas são escolhidas ao
PARA PERSONAGENS DE acaso e seguem um determinado padrão, sendo
HOLLYWOOD, COMO ED GEIN, EM esta uma parte de sua fantasia 2 .
O SILÊNCIO DOS INOCENTES. NO Contudo, estes não são os únicos, pois
BRASIL, MAIS RECENTEMENTE, existem outras formas de serial killing, como
GLÓRIA PEREZ, NA MINISSÉRIE assassinatos praticados por profissionais de
DUPLA IDENTIDADE, CRIOU O saúde (enfermeiros, médicos), que envenenam
PERSONAGEM EDU, UM SERIAL pacientes em hospitais ou mesmo em suas re-
KILLER COM TRANSTORNO DE sidências, ou ainda homicídios praticados por
PERSONALIDADE ANTISSOCIAL.O mulheres, onde frequentemente não existe ele-
PROBLEMA ACONTECE QUANDO A mento sexual 3.
REALIDADE É MAIS SINISTRA DO A maior parte dos casos registrados é am-
QUE A FICÇÃO... plamente noticiada nos meios de comunicação,

1. MARTA, Taís Nader; MAZZONI, Henata Mariana de Oliveira. Assassinos em série: uma questão legal ou psicológica? Revista USCS Direito, São Caetano do Sul, v. 10, n. 17,
7 p.21-37, jul./dez.2009.
2. Casoy. Ilana. Serial Killers, definições. Disponível em <http://serialkiller.com.br/> Consulta realizada em 14/01/2015.
3. MORANA, Hilda C P; STONE, Michael H; ABDALLA-FILHO, Elias. Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo , v. 28, supl. 2, Oct.
2006 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000600005&lng=en&nrm=iso>. Consulta realizada em 14/01/2015.
ASSASSINOS SERIAIS - ANÁLISE

atraindo a atenção e a curiosidade do públi-


co em geral, bem como de estudiosos, os quais
tentam buscar uma explicação para justificar
tamanha brutalidade com seu semelhante. En-
tão, quando um novo caso é constatado, res-
surge a pergunta: estes indivíduos são loucos
ou cruéis?
A resposta para esta pergunta não é unâ-
nime, pois implica uma discussão sobre aspec-
tos psicológicos, precipuamente sobre a perso-
nalidade, que refletem diretamente na pena a
ser aplicada ao criminoso. Dependendo do caso
concreto (em especial, da prova pericial produ-
zida), será aplicada pena de prisão ou interna-
ção em um manicômio judiciário.

TRANSTORNOS
No que tange ao aspecto psicológico, a
personalidade é definida pela totalidade dos
traços emocionais e a forma como o indivíduo
se comporta frente aos outros, o que equivale-
ria à denominação de caráter. Um transtorno
de personalidade traduz uma interação erráti-
ca em sociedade, um estilo pessoal de vida mal
adaptado, inflexível e prejudicial a si próprio ou
aos outros. Importante grifar, ainda, que uma
mesma pessoa pode apresentar dois ou mais
transtornos de personalidade (v.g. transtorno
de personalidade antissocial e transtorno de
personalidade narcisista).
Portanto, por se tratar de um padrão de
comportamento, os transtornos de persona-
lidade não se tratam de um tipo de “doença
mental” que exista uma “cura” definida. Note-
-se que os “serial killers” possuem transtornos
de personalidade que permitem o cometimento
de diversos homicídios, representando verda-
deiro descaso com a vida humana.
Hilda Morana, psiquiatra forense, publicou
um estudo, de Ston4, o qual concluiu pela gran-
de prevalência de três tipos de transtornos de
personalidade em assassinos em série: psico-
pático 5 , esquizoide e sádico.
O transtorno de personalidade antissocial,
ou psicopático, é um aspecto proeminente nos
serial killers, no qual o indivíduo é extrema-
mente envolvente e inteligente, utilizando-se de prisional por longos períodos de tempo 6 .
ardis para enganar e atrair suas vítimas. Os No transtorno esquizoide, predominam o
portadores de tal transtorno de personalidade
afastamento do contato social e a dificuldade
(TPAS) não possuem qualquer tipo de remorso
em experimentar prazer. Os sujeitos afetados
ou empatia por suas vítimas e, tampouco, se
importam com as consequências danosas que mostram frieza emocional, isolamento e dis-
advêm de seus atos. Por tal razão, muitos es- tanciamento afetivo.
tudiosos entendem que a única possibilidade, O transtorno de personalidade sádica tra-
mesmo que remota, de controle dos compor- ta-se de um padrão invasivo de comportamento
tamentos grosseiramente violentos dos por- cruel, humilhante e agressivo (verbal e fisica-
tadores de TPAS é a sua restrição no sistema mente) na maior parte de seus relacionamentos.
4. Ibidem.
8 5. Segundo os critérios estabelecidos por Robert Hare (Psychopathy Checklist-Revised – PCL-R). Para o DSM IV trata-se de transtorno de personalidade antissocial.
6. GABBARD, G. O. Psiquiatria psicodinâmica na prática clínica. Trad. Alceu Edir Fillmann. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. Apud Souza, Carlos Alberto Crespo de, e Cardoso,
Rogério Göettert (orgs.). Psiquiatria forense, 80 anos de prática institucional – 2ª. Edição. Porto Alegre: Sulina, 2008. P. 268.
ASSASSINOS SERIAIS - ANÁLISE

O comportamento sádico é mais evidente quan- normalmente é uma predisposição hereditária.


do o indivíduo se encontra em posição de poder, Portanto, os três tipos de transtornos de
como no papel de pai, mãe e chefe. Os sujeitos personalidade retratados por Morana, em as-
sádicos sentem prazer no sofrimento alheio, in- sassinos em série, refletem o tipo e o grau des-
clusive, de animais7. Alguns assassinos seriais, ta má adaptação à vida em sociedade destes
com tendências sádicas, podem traduzir uma indivíduos.
combinação entre o narcisismo e predisposições
cerebrais, sendo esta uma resposta ao ambiente CASOS FAMOSOS
hostil, existindo exceções 8.
O comportamento sexualmente sádico exi- Muitas vezes, quando tratamos do tema de
bido pela maior parte dos serial killers vem a serial killers, nos vem à mente figuras famo-
revelar sua necessidade de domínio, pois sub- sas que, inclusive, inspiraram filmes, como Ted
jugam suas vítimas a seus caprichos. A própria Bundy, que estuprou e matou aproximadamente
escolha da “vítima em potencial” segue este 36 mulheres, e John Wayne Gacy, o “Palhaço As-
“ritual”, uma vez que são escolhidas pessoas sassino”, acusado de torturar, violentar e matar
em situação de vulnerabilidade, a fim de fa- cerca de 33 rapazes 9.
cilitar o domínio sobre elas. Digno de registro Já, no cenário brasileiro, destacam-se al-
que este transtorno de personalidade apareceu guns casos que chocaram o país, como o de
apenas em um apêndice da terceira edição do Pedro Rodrigues Filho, “Pedrinho Matador”,
Diagnostic and Statistical Manual of Mental que assumiu a autoria de mais de 100 mortes;
Disorders (DSM-III), não sendo mais retratado Francisco das Chagas Rodrigues de Brito, co-
nas versões mais recentes do DSM (DSM IV, DSM nhecido pelo caso dos “Meninos emasculados
IV-TR e DSM-5). do Maranhão”, indiciado pela morte e mutilação
Para Morana, a personalidade sádica se- de 42 meninos; e Francisco de Assis Pereira, o
ria proveniente de agressões e abusos na in- “Maníaco do Parque”, que assumiu a autoria do
fância, enquanto a personalidade esquizoide estupro e morte de 9 mulheres 10.

7. SEGAL, Daniel L.; COOLIDGE, Frederick L.; Rosowsky, Erlene. Personality Disorders and Older Adults: Diagnosis, Assessment, and Treatment. Hoboken: John Wiley & Sons,
9 2006. p. 138/139. Tradução livre.
8. MORANA, op. cit.
9. http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/10/141022_serial_killer_recorde_fd
10. http://veja.abril.com.br/120898/p_106.html
ASSASSINOS SERIAIS - ANÁLISE

O Rio Grande do Sul, até o momento, re- um casal saiu ileso do encontro com o matador
gistra apenas três assassinos em série 11,12 , “O porque, segundo ele, não teriam reagido 15.
Monstro de Passo Fundo 13 , indicado como o Em trechos de seu depoimento policial,
autor da morte de 12 meninos, “O matador da publicado na revista Veja 16 , Paulo Sérgio decla-
praia do Cassino”, que atacou 4 casais, matando rou que seu objetivo era superar, em número
7 pessoas, e, mais recentemente, “O assassino de mortes, o “maníaco do parque” (Francisco
de taxistas”, Luan Barcelos da Silva, que matou de Assis Pereira): “O Sul precisava de um moto-
seis taxistas nas cidades de Santana do Livra- boy”, afirmou, com uma frieza surpreendente.
mento e Porto Alegre, em 2013 14. “Eu sou o motoboy do Sul, quero ser mais fa-
Os três casos relatados causaram como- moso do que o motoboy paulista” 17.
ção nacional, mas Paulo Sérgio Guimarães da A reportagem ainda esclareceu que Paulo
Silv a, o “Matador da praia do Cassino”, chama Sérgio teve uma infância e adolescência mar-
a atenção por se inspirar em outro serial kil- cadas por maus tratos e por uma família deses-
ler brasileiro, fazendo de seu objetivo principal truturada. A avó, Marina Maria Jesus da Silva,
a superação numérica de vítimas do “Maníaco à época, declarou para a revista que “certa vez,
do Parque”, e por buscar reconhecimento em a mãe bateu tanto nele, com uma tábua, que o
nível nacional, justamente como um assassino menino ficou todo roxo, de molho em uma ba-
em série. cia com água quente” 18 .
O tipo de vítimas escolhidas pelo matador
O MATADOR DA PRAIA DO da praia do cassino eram casais que estacio-
navam o veículo na praia do Cassino para na-
CASSINO morar: “São mais fáceis de matar”, justificou. “A
mulher é mais fraca e a tendência do homem é
Entre dezembro de 1998 e março de 1999, a de não reagir para protegê-la” 19.
cidade gaúcha de Rio Grande ficou horroriza- O modo escolhido para a abordagem e
da com os homicídios perpetrados na praia do execução dos casais era quase o mesmo: Saía
Cassino. À noite, a praia do Cassino era local pela praia e escolhia os veículos mais sofisti-
escolhido para os namorados praticarem atos cados e aproximava-se rastejando: “Eu ataca-
sexuais, geralmente dentro de seus veículos. va os mais boyzinhos” 20. Colocava o rapaz no
Aproveitando-se da distração das víti- porta-malas e saía com o veículo para sacarem
mas, Paulo Sérgio Guimarães da Silva, arma- valores nos caixas automáticos. Após, levava
do, abordou cinco casais, roubando dinheiro e suas vítimas novamente para a praia e os fazia
pertences pessoais. Ao todo, matou sete pes- deitar na areia, de bruços, e atirava.
soas e deixou uma jovem paraplégica. Apenas O modo como agia foi se aperfeiçoando a
11. Casoy. Ilana. Dados obtidos no site <http://serialkiller.com.br>. Consulta realizada em 16/01/2015.
10 12. Há registro que no Século 19 um casal cometeu uma série de assassinatos em Porto Alegre, denominados como “Crimes da Rua do Arvoredo”, nos quais as vítimas
teriam sido transformadas em linguiça. Para saber mais em: http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/maniaco-acougue-porto-alegre-433749.shtml
13. http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/crimes/caso-adriano-da-silva-o-serial-killer-de-passo-fundo/n1596992257793.html
14. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/04/1262476-jovem-preso-por-matar-6-taxistas-no-rs-confessa-o-crime.shtml
15. http://veja.abril.com.br/120599/p_048.html
16/17/18/19/20. Ibidem
ASSASSINOS SERIAIS - ANÁLISE

vários delitos da mesma espécie, constituindo-


-se em verdadeiro matador em série.
Os crimes foram praticados com emprego
de meio cruel, tendo em vista que o denunciado
por longo tempo andou com as vítimas, sempre
sob ameaça da pistola, impondo-lhes verdadei-
ro clima de terror, torturando-as psicologica-
mente, deleitando-se com isso, acabando por
matá-las, o que demonstra extrema frieza e
total falta de sentimentos humanitários.
Os delitos foram praticados com emprego
de recurso que dificultou a defesa das vítimas,
visto que as apanhou desprevenidas no carro,
mantendo-as, a partir de então, sob total domí-
nio, terminando por alvejá-las quando deitadas
ao solo, de bruços, pelas costas, sem dar-lhes a
mínima chance de defesa.” 21
No curso do processo, após realizada pe-
rícia para verificação da sanidade mental de
Paulo Sérgio, os peritos concluíram que o mes-
mo era portador de transtorno de personali-
dade antissocial, mas era capaz de entender o
caráter delituoso dos fatos que cometera:
“Gize-se que os peritos, no incidente em
apenso, à fl. 34, salientaram que o acusado é
portador de mero transtorno de personalida-
de antissocial, que não prejudica a cognição do
indivíduo frente aos delitos que comete. Além
disso, referiram os peritos que é alto o risco
de reincidência no caso em testilha, sendo que
eles próprios sugeriram a não redução de pena
para o acusado” (fl. 34, ‘in fine’) 22 .
Então, Paulo Sérgio Guimarães da Silva
restou condenado por sete homicídios tripla-
“No curso do processo, após realizada perícia para mente qualificados, uma tentativa de homicídio
verificação da sanidade mental do assassino, os triplamente qualificado, quatro roubos majora-
peritos concluíram que o mesmo era portador de dos, uma tentativa de roubo majorado e estu-
transtorno de personalidade antissocial, mas era
capaz de entender o caráter delituoso dos fatos que pro, totalizando a pena de 171 anos, 4 meses e
cometera.” 20 dias de reclusão.
No entanto, apesar de a pena restar justa
cada homicídio, passando a utilizar luvas ci- para os crimes cometidos, Paulo Sérgio cumpri-
rúrgicas, extraídas do kit de primeiros socor- rá apenas 30 anos, em face da vedação legal do
ros dos veículos das vítimas, a fim de dificultar Código Penal. Seu transtorno de personalidade,
o trabalho da perícia, e a atirar em pontos es- contudo, o acompanhará por toda sua vida.
tratégicos, na nuca e pescoço. Resta, então, o questionamento sobre como
Todas estas circunstâncias foram des-
a sociedade, e ele, irão enfrentar a repercus-
critas na denúncia do processo e levadas em
consideração quando de seu julgamento pelo são dos crimes cometidos - e que poderão se
Tribunal do Júri: repetir. O que, também, se estende aos demais
“Ambos os homicídios foram praticados assassinos em série, frente ao nosso ordena-
por motivos torpes. Primeiro, porque o denun- mento jurídico.
ciado buscava vingar-se da sociedade, em vir-
tude de condenação anterior por crimes que * Isabel Medeiros de Castro é bacharel em Ciências Jurídicas
praticara. Em segundo, porque buscava ganhar e Sociais pela PUC-RS, mestranda em Ciências Criminais
notoriedade pública, eis que planejara praticar pela PUC-RS, servidora do Tribunal de Justiça do RS.
21. Excerto retirado da Apelação Criminal nº 70004516886. Disponível em <www.tjrs.jus.br>. Consultado em 15/01/2015.
11 22. Excerto retirado da Apelação Criminal nº 70004516886. Disponível em <www.tjrs.jus.br>. Consultado em 15/01/2015.
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

O QUE
CARACTERIZA
OS ASSASSINOS
SERIAIS?
PARA SE ENTENDER ESTE TIPO DE CRIMINOSO É NECESSÁRIO CONHECER A
DINÂMICA PSICOLÓGICA E COMPORTAMENTAL HUMANA. PARA TAL, DEVEM-SE
CONSIDERAR OS TRÊS ELEMENTOS QUE CONECTAM OS CRIMES EM SÉRIE: O
MODUS OPERANDI, O RITUAL E A ASSINATURA

12
O QUE CARACTERIZA OS ASSASSINOS SERIAIS? - DEFINIÇÕES

O
S ADVENTOS DE CRIMES DE ações. As vítimas podem ser escolhidas, consi-
HOMICÍDIOS ENVOLVENDO derando, por exemplo: raça, gênero, atividade
VÁRIAS VÍTIMAS profissional, idade etc. ou aleatórias (ao acaso).
ASSOCIADOS A UM MESMO AUTOR E quando se estuda a ocorrência de assassina-
RECENTEMENTE NA REALIDADE tos seriais é comum identificar comportamen-
BRASILEIRA TÊM LEVANTADO tos sádicos, cruéis, perversos e de tortura, bem
QUESTÕES IMPORTANTES QUANTO como a observação de rituais na sua execução.
ÀS POSSÍVEIS CAUSAS DESTE Na realidade brasileira não temos estudos com
COMPORTAMENTO. E no natural do dados consistentes sobre estes tipos de crimi-
abismo relativo ao desconhecimento em nosos. A maior parte dos livros e artigos publi-
relação aos possíveis fatores que levam uma cados é internacional.
pessoa a cometer uma série de crimes graves, E para identificar se a ocorrência de ho-
norteados por manifestações de crueldade micídios é de natureza em série deve-se reali-
e insensibilidade, por exemplo, tende a se zar uma Análise do Comportamento Criminoso
cria uma relação direta dessas pessoas com que engloba: o levantamento de informações
alguma doença mental (transtorno mental, acerca das possíveis ações durante a prática
termo utilizado pela Organização Mundial de de um crime; deve ser pautada na investigação
Saúde para descrever os vários quadros de dos traços comportamentais que o criminoso
alterações psicológicas). adota e deixa na cena do crime; além dos as-
E esta relação tem fundamento? Será que pectos comportamentais, leva-se em conside-
assassinos em série são doentes mentais? Ve- ração o perfil geográfico criminoso (análise do
jamos então o que caracteriza um assassino ambiente) e por fim utilizam-se dados estatís-
em série. O termo “assassino em série” serve ticos que sinalizam padrões de comportamento
para descrever o comportamento homicida de criminoso na área de captação geográfica do
um indivíduo que comete estes crimes (três ou crime. Sendo assim, para se entender este tipo
mais) dentro de um determinado tempo, es- de criminoso é necessário conhecer a dinâ-
tabelecendo, para isso, intervalos de dias. Os mica psicológica e comportamental humana.
Padrões de comportamentos homicidas são ca- Para tal, devem-se considerar os três elemen-
racterizados pela frequência e intensidade das tos que conectam os crimes em série: o modus

Fotodivulgação: Flickr-rosengrant

13
O QUE CARACTERIZA OS ASSASSINOS SERIAIS? - DEFINIÇÕES

operandi, o ritual e a assinatura, conforme o


diagrama a seguir.
O modus operandi é o comportamento do
criminoso que assegura o sucesso do crime,
protege sua identidade e garante sua fuga. Não
se pode conectar crimes com base apenas no
modus operandi. Ele é dinâmico e vai se sofis-
ticando conforme o aprendizado do criminoso
e a experiência adquirida com os crimes ante-
riores. Deve-se considerar ainda que o modus
operandi representa o ritual que se traduz em
padrão de comportamento que excede o neces-
sário para a execução do crime; esta caracte-
rística é crítica para a satisfação das necessi-
dades emocionais do criminoso e enraizada em
sua própria fantasia.
Já o ritual representa um comportamento
que excede o necessário para a execução do
crime. É baseado nas necessidades psicológicas
sádicas e de crueldade e, dessa forma, torna-
-se crítico para a satisfação das necessidades
emocionais do criminoso, passando de sadismo
sexual, tortura, cativeiro, escravidão etc. Por
outro lado, a assinatura é uma combinação
de comportamentos, que está associada tanto
pelo modus operandi quanto pelo ritual. O que
é relevante em tudo isso é que não estamos
falando de comportamentos inusitados, mas
sim de comportamentos extremos. Por vezes,
o assassino expõe-se a um alto risco para sa-
tisfazer todos os seus desejos, permanecendo
muito tempo no local do crime, por exemplo.
Como também usam algum tipo de amarração
específica, ou um roteiro específico de ações
executadas pela vítima, como no caso dos estu-
pradores assassinos em série. Tem-se também
que determinados tipos de ferimentos podem
representar uma forma de assinar o crime.
Já a investigação da motivação engloba
a possibilidade de levantar as necessidades
psicológicas do agressor, isto é, identificar os
motivos primários e seus impulsos, traduzidos
pela expressão do comportamento físico e pela
análise do ambiente e da vítima. Peguemos “O objeto de desejo e a excitação não estão ligados
como exemplo os dados psicológicos e compor- diretamente ao ato sexual e sim ao fato de exercer
tamentais de um estuprador e assassino em domínio sobre o frágil, sobre o vulnerável.”
série no Brasil. Caráter impulsivo (desejo sem
controle) e compulsivo (necessidade de repetir é diretamente proporcional à violência, que
o comportamento), que se reflete na necessi- pode ser fatal. O crime é premeditado e ritua-
dade imperiosa de repetição da experiência. lizado, sendo resultado de um elaborado plano
A dificuldade no controle da expressão desse de ataque. Machuca a vítima de forma fatal, e
comportamento se apresenta como o fator de a prática do canibalismo pode ser frequente.
maior vulnerabilidade para a ocorrência de Castração de meninos, brutalização da área
condutas criminosas. O objeto de desejo e a ex- genital feminina e decapitação fazem parte do
citação não estão ligados diretamente ao ato repertório de mutilações deste criminoso.
sexual e sim ao fato de exercer domínio sobre Com base neste breve relato levanta-se
o frágil, sobre o vulnerável. Subjugar o outro a questão: um indivíduo que pratica este tipo
o excita sexualmente. Seu excitamento sexual de comportamento é “normal” (normal aqui

14
O QUE CARACTERIZA OS ASSASSINOS SERIAIS? - DEFINIÇÕES

“Quando nos reportamos aos transtornos mentais, estamos falando de psicopatologia. Ao se abordar a psicopa-
tologia, busca-se compreender na pessoa o seu comportamento, a consciência, o pensamento, a cognição e as
experiências subjetivas anormais.”

no sentido de saudável em termos mentais)? a crimes em série são dois. Alguns indivíduos
A resposta não é simples, mas é viável de es- com psicose (esquizofrenia, por exemplo), uma
clarecimentos. Quando nos reportamos aos doença mental grave que afeta o juízo de rea-
transtornos mentais, estamos falando de psi- lidade da pessoa devido aos delírios (alterações
copatologia. Esta palavra vem do grego psychê do pensamento) e às alucinações (alteração
(alma, psiquismo), pathos (patológico, doença) da percepção, órgãos dos sentidos, ouvir vo-
e logos (estudo), representando uma disciplina zes etc.), o comportamento dessa pessoa será
interdisciplinar que envolve a psiquiatria e a regido por estas alterações, podendo cometer
psicologia. Trata da natureza da doença men- crimes em séries devido ao comando de vozes
tal, considera suas causas, as mudanças es- ou pelos delírios.
truturais e funcionais associadas a ela e suas Outro quadro tem a ver com retardo men-
formas de manifestações. Ao se abordar a psi- tal (deficiência mental), no qual a pessoa não
copatologia, busca-se compreender na pessoa tem o desenvolvimento mental completo. Al-
o seu comportamento, a consciência, o pensa- guns desses indivíduos podem cometer crimes
mento, a cognição (inteligência, raciocínio etc.) em série, inclusive assassinatos associados a
e as experiências subjetivas anormais (delírios, impulsos sexuais. O que é comum aos dois qua-
alucinações, euforia, depressão, mania, obses- dros é que, embora possam cometer assassina-
sões etc.), que são as formas de manifestação e tos em série, dado o grau de desorganização
expressão das doenças mentais decorrente da mental, deixam um rastro de provas e acabam
frequência e intensidade. Então, que casos de sendo pegos antes praticarem um número su-
transtornos mentais ou doenças mentais pode perior a três crimes.
um assassino em série apresentar? Os poucos Embora pessoas não portadoras de trans-
casos de transtornos mentais graves associados tornos mentais possam cometer crimes em

15
O QUE CARACTERIZA OS ASSASSINOS SERIAIS? - DEFINIÇÕES

séries, por pura crueldade ou maldade, a maio- sexual impessoal, trivial e pouco integrada;
ria dos casos de assassinatos em série são falta de sentimentos de culpa e de vergonha;
cometidos por pessoas tidas como psicopatas. indigno de confiança e falta de empatia nas
A psicopatia representa um agravo do trans- relações pessoais; manipulação do outro com
torno de personalidade antissocial. De acordo recursos enganosos; incapacidade para seguir
com CID-10 (Classificação Internacional das qualquer plano de vida; conduta antissocial
Doenças, 1993), o indivíduo com personalidade sem aparente arrependimento; ameaças de sui-
antissocial apresenta um padrão de compor- cídio, raramente cumpridas; incapacidade em
tamento caracterizado por um desprezo das
aprender com a experiência, bem como de-
obrigações sociais e falta de empatia para com
monstrações de uma elevada pobreza de rea-
os outros.
ções afetivas básicas.
Apresenta ainda uma baixa tolerância à
frustração (ou seja, a qualquer contrariedade, Em várias situações nas quais estive em
pode reagir com explosividade) e um baixo li- contato com alguns assassinos em série foi
miar de descarga da agressividade, inclusive possível observar uma insensibilidade e a to-
da violência. Geralmente tendem a culpar os tal incapacidade de perceber a responsabili-
outros ou a fornecer racionalizações (justifi- dade sobre os seus próprios atos, aspecto que
cativas) plausíveis para explicar um comporta- se apresenta como a marca registrada de vá-
mento que leva o sujeito a entrar em conflito rios indivíduos que praticam homicídios sem o
com a sociedade. E o psicopata teria, além das menor senso ético e empatia e respeito à vida
características acima: encanto superficial, lo- humana. No entanto, ressalto que nem todo in-
quacidade (habilidade na fala para convenci- divíduo considerado psicopata vai ser neces-
mento); egocentrismo patológico, autovaloriza- sariamente um serial killer ou qualquer outro
ção e arrogância; incapacidade de amar; vida tipo de criminoso. Diante disso, reforça-se a
necessidade da avaliação de autores de assas-
“É importante ressaltar que nem todo indivíduo sinatos em série por especialistas como psicó-
considerado psicopata vai ser necessariamente um logos e psiquiatras para que possam estabe-
serial killer ou qualquer outro tipo de criminoso.” lecer informações adequadas da real condição
psicológica destes indivíduos, evitando, assim,
especulações diagnósticas a distância. E, claro,
que não se pode negar o crescimento da vio-
lência urbana, como os latrocínios, homicídios,
estupros e sequestros, entre outros, caracteri-
zados por violações da ética, da lei e da moral,
e que acabam por estabelecer uma associação
entre doença mental e violência, traduzindo-se,
por vezes, em um importante preconceito con-
tra os portadores de transtornos mentais. Até
porque a visão popular do doente mental como
um “louco perigoso”, atacando a população de
uma maneira geral em lugares públicos, ainda
influencia tanto juristas quanto formuladores
de políticas, e essa ideia necessita ser revertida
por uma maior participação da universidade
na produção e divulgação de conhecimentos à
sociedade, bem como uma melhor preparação
científica das forças policiais na investigação
de prováveis crimes de séries.

* Antonio de Pádua Serafim é psicólogo e neuropsicólogo.


Mestre e Doutor pela USP; Professor Titular do Programa
de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde da Universidade
Metodista de São Paulo; Diretor do Serviço de Psicologia
e Neuropsicologia e Coordenador do Núcleo de Psiquiatria
e Psicologia Forense, ambos do Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

16
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

PESQUISANDO OS
ASSASSINOS
E CANIBAIS, PEDÓFILOS, NECRÓFILOS E
DOUTORES DA MORTE SÃO ALGUNS DOS
PERFIS TRAÇADOS POR PESQUISA DESTINADA
A COMPREENDER O FUNCIONAMENTOS DOS

R S
SERIAL KILLERS

ERIAL KILLERS SEMPRE EXISTIRAM,


E FALAR DELES É ENTRAR EM
TERRENO DIFÍCIL E COMPLEXO, POIS
SÃO INDIVÍDUOS QUE SE DIFERENCIAM

I
DA MAIOR PARTE DA POPULAÇÃO NO
COMPORTAMENTO E NA CONDUTA MORAL
E ÉTICA. SÃO ASSIM CHAMADOS PORQUE
COMETEM ASSASSINATOS EM SÉRIE, NUMA
SEQUÊNCIA, SEMPRE SEGUINDO UM CERTO
RITUAL (MÉTODO PRÓPRIO, MANEIRA DE

A
PROCEDER). Analisar o potencial da destrutividade
humana é muito interessante e pode esclarecer pontos em
comum entre grandes manifestações fora do normal da
personalidade.
Antes de iniciar a descrição, é importante esclarecer
que as características predominantes neles e que serão

I
apresentadas a seguir não podem ser generalizadas para
todos, porque uns terão algumas delas, alguns terão outras
e outros terão todas essas características.
Durante seis anos, pesquisei detalhes sobre 468 serial
killers do mundo todo e constatei que são frios, calculistas,
manipuladores, articulados e muito inteligentes. A maioria

S
sofreu abusos consideráveis, sejam eles físicos, psicológi-
cos ou sexuais. Os brutais maus tratos geraram neles pro-
fundos sentimentos de humilhação e impotência. Funda-
mental para completar minha pesquisa foi uma entrevista
realizada com Marcos Antunes Trigueiro, “O Maníaco de

17
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

Contagem”.
A conduta violenta de todos os serial kil-
lers apresentados em minhas pesquisas pode
ser compreendida como o resultado da intera-
ção entre a personalidade prévia do autor, seu
estado emocional atual, sua situação interpes-
soal e o contexto social em que se desenvolve o
ato criminoso. Porém, essa seria uma definição
incompleta, sendo necessário acrescentar o es-
tudo dos aspectos mais relevantes da agressão,
da angústia, do medo, da fobia, de ansiedade e
depressões, os fatores genéticos, sociais, cultu-
rais e vivenciais de cada um deles.

PERFIL
Não são pessoas normais e nem pré-de-
terminados a serem portadores de transtornos
mentais, mas isso não significa que eles não
tenham consciência do que fazem, embora pos-
sam não ter o domínio no controle de seus im-
pulsos, distinguindo muito bem o certo do er-
rado, tanto que buscam sempre satisfazer seus
desejos sem correrem o risco de serem apa-
nhados. A maioria deles não é doente mental.
H. Haefner e W. Boecker, 1982, realizaram estu-
dos epidemiológicos dos crimes de violência e
distúrbios mentais, e o resultado mostrou que
apenas 2,97% dos criminosos apresenta proble-
mas mentais, para a esquizofrenia a probabi-
lidade foi de 0,05% e para a psicose afetiva foi
de 0,06%.
A ampla investigação foi coordenada pelo
National Institute of Mental Health dos EUA
(Epidemiological Catchment Area - ECA, Swan-
sonet al. 1997). Estes estudos não encontraram “Os serial killers costumam ser passivos e retraídos
uma associação, ou apenas uma associação e atuam seguindo um ritual dentro de uma mesma
discreta entre doença mental e o risco de co- região, analisada cuidadosamente e com significação
meter crimes de violência. Concluiu-se que os especial no seu contexto fantasioso.”
crimes violentos cometidos por doentes men-
tais são quantitativamente proporcionais aos especial no seu contexto fantasioso. Conhecem
crimes da população geral. e investigam detalhadamente suas vítimas, são
Os serial killers têm dificuldades em lidar perigosos por sua forma de ser e suas con-
com figuras de autoridade masculina devido a dutas criminosas são egossintônicas, ou seja,
ressentimentos com os pais e, quando domina- seus pensamentos, atitudes, comportamentos,
dos pela mãe, nutrem por elas forte hostilida- impulsos e sentimentos não perturbam a pró-
de, extremo isolamento social, ódio generaliza- pria pessoa. São também portadores de per-
do pelo mundo e por todos (inclusive por eles sonalidade anômala (não doente), suas condu-
mesmos), interesses precoces e duradouros tas agressivas são voluntárias, sem compulsão
pela sexualidade degenerada, utilizam a vio- planejada e premeditada, planejam detalhada-
lência para reafirmarem seu poder e elevar a mente o crime com antecipação, no momento
autoestima, têm percepção de si mesmo como do crime excitam-se muito, transformam-se,
de “machos”, embora com incômodos sentimen- adquirem seguridade e o impulso sexual que
tos de insegurança. lhes falta, além de não terem arrependimentos
Têm poucos ou nenhum amigo, são pas- nem piedade.
sivos e retraídos, atuam seguindo um ritu- Narcisistas, egocêntricos, vaidosos, que-
al e uma constante dentro da mesma região rem ser notórios antes de serem ignorados,
analisada cuidadosamente e com significação atrás de uma fachada distante existe uma

18
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

profunda fúria e agressividade que não po- sistemáticas e têm comportamentos fantasio-
dem expressar. São impulsionados por neces- sos, grande ausência de sentimentos afetuosos,
sidades sádicas e depravadas, agem de forma amoralidade, impulsividade, incorrigibilidade,
racional, ardilosa e demonstram alto nível de falta de adaptação social e violência extrema.
inteligência, também não possuem consciência, A maioria coleciona objetos de suas víti-
olham os outros como objetos a serem manipu- mas como troféus da submissão do outro, são
lados, destruídos e descartados sem nenhuma tranquilos, tímidos, estudiosos, de bons mo-
importância. dos, agradáveis, reservados, normalmente não
Podem exercer também um processo de fumam, não bebem e nem usam drogas e, se
progressão no qual os intervalos entre os cri- o fazem, não chegam a ser dependentes. Es-
mes ficam cada vez menores. No primeiro cri- tão sujeitos a delinquir quando sofrem perda
me, antes de alcançarem o prazer, sentem medo da autoestima ou quando se sentem engana-
e insegurança, ficam muito assustados, porém, dos ou rejeitados, ou se têm a masculinidade
vão se tornando mais seguros, adquirem cer-
questionada.
ta confiança e começam a aprimorar cada vez
As lembranças que guardam de suas ví-
mais as técnicas, julgam terem o plano perfeito.
timas podem ter vários significados, servin-
Eles têm alterações na personalidade em
do para se recordarem de seu triunfo e como
relação a condutas delituosas, são violentos,
com dificuldades de controlar os impulsos, com prova de suas façanhas; os troféus (como são
sexualidade de risco e desordenada e, às vezes, chamados) eles justificam que só os têm quem
com o consumo abusivo de substâncias tóxi- ganhou alguma coisa, expressam uma certa
cas. Desenvolvem ainda agressão egossintônica vitória. Raramente esses itens têm valor e po-
contra os outros na forma de sadismo ou di- dem ser convertidos em dinheiro, os itens que
rigidas a si mesmos com tendências automu- eles mais estimam possuem um poder quase
tiladoras, suicídios sem depressão e conduta mágico para o assassino, servem de inspiração
paranoide. masturbatória. Mas nem todos guardam obje-
Nas relações com os outros têm uma inten- tos, alguns preferem tirar fotos ou documentar
sa rivalidade e inveja consciente/inconsciente de alguma forma suas atrocidades, outros pre-
refletida na contínua exploração dos outros, ferem colecionar partes de suas vítimas, que
incapacidade de depender dos outros, encan- surgem como uma relíquia macabra, mas muito
to superficial, manipulação, usam mentiras preciosa para eles.

“A maioria dos serial killers coleciona objetos de suas vítimas como troféus de submissão, As lembranças que
guardam podem ter vários significados, servindo para se recordarem de seu triunfo e como prova de suas
façanhas.”

19
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

Fotodivulgação: Flickr-thisisjamesjackson

“Quando estão em atividade, criam uma rotina específica e bem particular, decidem os meios de locomoção que
usarão, o local onde vivem e irão atuar, os tipos de vítimas, as armas e roupas que utilizarão, tudo tem um certo
significado para eles.”

FASES E CLASSIFICAÇÕES negam veementemente os crimes ou tentam


alegar insanidade, depois passam a mostrar
Passam por algumas fases no desenvol- sempre bom comportamento no convívio com
vimento assassino, iniciando-se na fase áurea, os demais, dizem-se convertidos a Deus, dis-
quando começam a perder a compreensão da postos aos estudos e trabalhos, e demonstram
realidade, entrando na fase da pesca, quando falso arrependimento pelas atrocidades come-
começam a procurar a vítima ideal, vão para tidas, em geral se mostram outra pessoa.
a fase galanteadora, enganando e seduzindo a Podem mudar o modus operandi, ou seja,
vítima, entram na fase da captura, quando a a maneira de cometerem os crimes, vão sofisti-
vítima cai na armadilha, e seguem para a fase cando e aperfeiçoando seus métodos. Têm for-
do assassinato ou totem, quando alcançam o mas pessoais que podem classificá-los de acor-
auge da emoção, e finalizam entrando na fase do com aspectos mais úteis, como seus métodos
da depressão (calmaria), que ocorre depois do preferidos de matar, tipos de ferimentos que
assassinato. Após a fase da depressão, eles vol- gostam de infligir, e há aqueles que se limitam
tam para a fase áurea. a um tipo específico de arma e ainda aqueles
Observei que desenvolvem duas zonas de cujos crimes são cometidos em uma explosão
conforto, sendo que a primeira (que eu chamo frenética e espontânea, com armas disponíveis
de período de simbolização e atuação) acontece naquele momento.
quando estão em atividade, criam uma rotina Ainda podem ser classificados como as-
específica e bem particular, decidem os meios sassinos territoriais (que são a maioria dos se-
de locomoção que usarão, o local onde vivem rial killers, estabelecem um limite territorial
e irão atuar, os tipos de vítimas, as armas e para atuarem), estacionários (são mais espo-
roupas que utilizarão, tudo tem um certo signi- rádicos, praticam o crime num local, que pode
ficado para eles. ser sua própria residência, trabalho ou hotéis
A segunda zona de conforto desenvolvem onde estejam hospedados) ou nômades (os que
quando são capturados, em cárcere e já cons- mudam várias vezes de um lugar para o outro,
cientes que não tem mais jeito. Inicialmente vão matando conforme suas viagens).

20
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

Entre os serial killers, a classe predomi- a dúvida se existe um porquê. De acordo com
nante é a dos psicopatas, caracterizados por meus estudos, constatei que pode ser devido a
condutas antissociais crônicas, pessoas que uma integração de fatores genéticos, sociais e
não se enquadram nas doenças mentais bem culturais, psicológicos, fisiológicos, comporta-
delineadas, com características específicas, mentais e sexuais. Eles reproduzem instintos
situam-se à margem da normalidade psicoe- ferozes da humanidade primitiva e dos animais
mocional ou comportamental. inferiores, são portadores de impulsos som-
As categorias são várias, e são distribuí- brios e bárbaros originados dos níveis mais
dos em classes distintas no livro Serial Killers primitivos da mente, são o resquício do homem
– A Maldade Indômita (Silva, Simone Elizabeth selvagem, uma espécie de subtipo humano, se-
Simone da, 2014): os canibais (os que conso- res degenerados.
mem a carne humana), os pedófilos (gostam de Todos os seres humanos têm um lado pri-
crianças), os necrófilos (praticam sexo com ca- mitivo, e eu acreditava que esse lado já havia
dáveres), os barba-azuis (matam suas esposas sido aprimorado. Vivemos em uma época de
assim que se casam pelo prazer sádico e tam- grandes avanços, tanto tecnológicos como em
bém por lucro), as viúvas-negras (mulheres que conhecimentos que hoje são mais ricos e aces-
matam uma sequência de maridos ou pessoas síveis, fica difícil acreditar que alguns seres
que têm como obstáculos para sua felicidade),
os serial killers mirins (crianças), os douto-
res da morte (médicos que usaram a profissão
para cometerem os crimes), os policiais serial,
funcionários públicos serial, os homossexuais
seriais, os estranguladores, os estripadores, os
bissexuais, os casais seriais, as famílias assas-
sinas, os vampiristas (que bebem o sangue das
vítimas), os sádicos (gostam de torturar e infli-
gir dor ao extremo nas vítimas), os pervertidos,
os fetichistas (usam ou fazem as vítimas usa-
rem objetos para se excitarem), os gerontófilos
(só matam pessoas idosas), os imitadores (co-
piaram os crimes dos serial killers famosos),
os psicopatas, entre outros. Em cada categoria,
foi possível observar que, mesmo fazendo par-
te de uma classe específica, sempre há pontos
distintos em cada um deles e, por isso, é neces-
sário um estudo de caso de cada um.
Não existe uma receita de serial killer,
cada um tem suas particularidades: uns são
sádicos (gostam de ver o sofrimento alheio),
outros são previsíveis (aqueles com longo his-
tórico de fantasias e comportamentos brutais),
alguns são respeitáveis (sem histórico prévio
de crimes violentos, cuja progressão para o as-
sassinato em série é inesperada), outros são
psicóticos (agem sob influência de suas aluci-
nações), temos os psicopatas (matam por pra-
zer sexual sádico), os visionários (ouvem vozes
ou têm visões que os ordenam a matar), os mis-
sionários (geralmente assassinos de prostitu-
tas que acreditam estar em uma cruzada para
purificar o mundo), os hedonistas (estabelecem
o prazer como objeto principal de suas vidas) e
os controladores.

MOTIVOS “O grau de maldade e perversão é tão extremo que


chega a ser inacreditável. Serial killers são portado-
O grau de maldade e perversão é tão ex- res de impulsos sombrios e bárbaros originados dos
tremo que chega a ser inacreditável. Sempre há níveis mais primitivos da mente.”

21
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

“Os serial killers têm fantasias mentais favoritas, de violência e estupro, torturas, abusos sexuais, perversões,
sadismo, mas nem tentam afastá-las de seus pensamentos, pelo contrário, irão cultivá-las e executá-las.”

humanos ainda cultivam uma criatura selva- Suas fantasias iniciam-se precocemente
gem e subumana no âmago de cada ser e a e na puberdade elas se tornam mais sexuais
sensação que tenho é que permitem que essa e aberrantes, com pensamentos de dominação,
criatura venha à tona e se aposse tempora- degradação, perversão, tortura e dor. Têm uma
riamente deles, só para realizarem seus mais ânsia irresistível de colocar suas fantasias em
profundos desejos depravados. ação, têm vínculo frágil com a realidade, tran-
Falando do comportamento desse tipo de cados em um mundo de horrores, vivem-nas
personalidade, há neles o desprezo pelas obri- dentro das próprias cabeças.
gações sociais, falta de empatia, desvio consi- Não portam constrangimentos por escrú-
derável entre o comportamento e as normas pulos de consciência, dão prioridade às suas
sociais, têm baixa tolerância a frustrações, ten- necessidades sórdidas, não se satisfazem fa-
dência a culpar os outros ou fornecerem ra- cilmente e cada atrocidade cometida sustenta
cionalizações duvidosas para explicarem seus mais as suas fantasias. Quando atingem o pe-
comportamentos conflitantes com a sociedade, ríodo de calmaria, masturbam-se com a lem-
desrespeitam e violam os direitos alheios, agri- brança de seus atos, a fantasia é a mola mestra
dem pessoas e animais, destroem propriedades dos serial killers. A eliminação dos corpos é
e cometem defraudações e furtos. mais uma fonte de prazer do que uma preocu-
O criminoso continua objeto de forças pação a ser resolvida, e o que eles fazem com
emancipadas de seu arbítrio e decisão, possui os restos mortais de suas vítimas é parte de
uma anomalia moral, uma lesão ética, respon- seu modus operandi, tanto quanto seus méto-
sável pela prática de crimes. Os serial killers dos preferidos de matá-las. Com sua incapaci-
têm fantasias mentais favoritas, de violência e dade de sentirem culpa, remorsos ou empatia,
estupro, torturas, abusos sexuais, perversões, são capazes de realizarem esta tarefa com no-
sadismo, mas nem tentam afastá-las de seus tável distanciamento emocional e, para alguns,
pensamentos, pelo contrário, irão cultivá-las e o momento de se livrarem dos corpos é o ápice
executá-las. dos seus crimes.

22
PESQUISANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - ESTUDOS

Não existe um tipo racial para os serial


killers, não há uma base étnica (raça) especí-

Fotodivulgação: Flickr-philipbitnar
fica. Temos casos de brancos, negros, asiáticos,
hispânicos, enfim, uma variada nacionalidade,
pois são um fenômeno humano e universal com
ocorrências em todas as culturas. É importante
esta informação porque quando falamos sobre
serial killers, a primeira ideia que temos é a
de que são americanos, devido a maioria dos
casos ocorrerem nos EUA, porém eles não são
restritos apenas a um país, abrangem todas as
etnias e têm ocorrido ao longo da história, des-
de os tempos mais remotos.
A sociedade assusta-se, apavora-se com
as atrocidades cometidas por eles e cobram
dos governantes programas de segurança pú-
blica, mais eficiência policial para sua prote-
ção, pois a maioria da população vê os serial
killers como criminosos comuns que cometem
atos abomináveis devido ao uso de drogas e/
ou álcool ou para roubarem. Segundo Luís
Flávio Sapori (Segurança Pública no Brasil:
Desafios e Perspectivas, Rio de Janeiro, Edi-
tora FGV, 2007, P. 124,126), deve-se considerar
a abordagem técnica que investiga o fenômeno
criminoso a partir do contexto de sua reali-
zação, preocupando-se em entender quais são
os fatores responsáveis pela viabilização da
motivação criminosa. A “Teoria das Atividades
Rotineiras” busca explicar a evolução dos cri-
mes não só pelas características dos crimino-
sos, mas também pelas circunstâncias que os
crimes ocorreram para que se desenvolva uma
política de segurança pública mais eficaz. A
governança da política governamental respon-
sável pela provisão da ordem pública prescinde
de intervenções nas supostas causas estrutu-
rais do fenômeno criminoso para alcançar re-
sultados satisfatórios no controle e/ou redução
da criminalidade.
Fica difícil dizer se têm recuperação ou se
é possível voltarem a viver em sociedade, pois
a razão de viver de todos os seres humanos
é sempre buscar coisas boas que geram pra-
"SERIAL KILLERS – A MALDADE INDÔMITA" zer, vivemos em função disso. Os serial killers
também fazem isso, porém, só alcançam o bem-
Simone Silva apresenta em seu livro estudos de casos -estar e prazer cometendo suas atrocidades e
e fatos reais sobre 468 serial killers minuciosamente estarão sempre em busca desse prazer.
pesquisados, contendo a infância, adolescência, Não importa de onde são, os métodos, os
vitimologia, modus operandi, além do lado clínico e tipos de vítimas ou as armas que usam, todos
científico, opiniões de especialistas diversos e o perfil de são o retrato autêntico e explícito da perversão
cada categoria. e da crueldade.

*Simone Silva é Analista Executiva de Defesa Social,


pedagoga, pesquisadora, especialista em análise de
comportamento e perfil criminal, trabalha na Secretaria de
Estado de Defesa Social de Minas Gerais. Telefone: (31)
9335-9646. E-mail: Simone.bete@hotmail.com

23
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

RS
LLE
K I
IAL
R
SE
E
TIA
PA
I CO
PS
ASSASSINOS SERIAIS, COMO THIAGO HENRIQUE
GOMES DA ROCHA, O SERIAL KILLER DE GOIÂNIA,
ENCAIXAM-SE NA HIPÓTESE DIAGNÓSTICA DE UM
PERFIL DE TRANSTORNO DE PERSONALIDADE COM
CARACTERÍSTICAS ANTISSOCIAIS, CONHECIDOS E
DEFINIDOS COMO PSICOPATAS

N
OS ÚLTIMOS TEMPOS, TEMOS
PRESENCIADO, PRINCIPALMENTE PELA
MÍDIA, UM AUMENTO NA DIVULGAÇÃO
DE CRIMES QUE FOGEM COMPLETAMENTE
DA COMPREENSÃO HUMANA. TAIS CRIMES
DEMONSTRAM UMA MOTIVAÇÃO QUE NÃO É
LIGADA A UMA NECESSIDADE DE DEFESA,
SOBREVIVÊNCIA OU AINDA JUSTIFICADA
POR SITUAÇÕES DE ORDEM PASSIONAL OU
ECONÔMICA. São atos delituosos estimulados por um desejo
perverso, que atua em um comportamento de busca do prazer,
ou ainda a eliminar algo que possa ser perturbador e ameaçador
à percepção daquele que comete.
Fotodivulgação: Flickr-norue

Em outubro de 2014, uma série de crimes gerou pânico e


mal-estar em toda a população goiana. Thiago Henrique Gomes da
Rocha, um vigilante de 26 anos, confessou ter matado 39 pessoas
entre os anos de 2011 e 2014 na cidade de Goiânia. Os seus crimes
estavam associados a vítimas do sexo feminino. São 22 mulheres,
dentre elas duas garotas de programa. Entre os 17 homens, Tiago
afirma ter matado oito moradores de rua e alguns homossexuais. O
interessante é que na época de tais crimes, alguns órgãos ligados ao
Ministério da Justiça, como a Secretaria de Direitos Humanos (SDH),
pediu até a federalização de todo processo de denúncia, investigação

24
PSICOPATIA E SERIAL KILLERS - TRANSTORNOS

e julgamento dos crimes praticados, por entender grupo de extermínio?”. Diversas opiniões emitidas
que se tratava de um grupo de extermínio orga- pelos profissionais, até o presente momento, pode
nizado para matar população de rua. Passado um levar a uma possível hipótese diagnóstica de um
pouco mais de um ano, já em agosto de 2014, a perfil de transtorno de personalidade com caracte-
Polícia Civil do Estado de Goiás, por meio de uma rísticas antissociais. Tais indivíduos são conhecidos
investigação criteriosa e utilizando de conheci- e definidos como psicopatas.
mento técnico e científico (inclusive com apoio de Até o presente momento, o caso está ain-
um psicólogo da área criminal), chegou de fato ao da em investigação e sob processo judicial, mas já
acusado. foi cogitado um exame de sanidade mental, a ser
Ao ser detido, Tiago, que ficou conhecido realizado por uma junta formada de psicólogos e
como o “serial killer de Goiânia”, foi objeto de muita psiquiatras forenses, a fim de excluir ou afirmar tal
diagnóstico. Tal exame se torna necessário em vir-
especulação por parte da mídia, da própria comu-
tude de não haver motivações pessoais consistentes
nidade local e principalmente pelos profissionais
que possam justificar a quantidade de homicídios.
da área das ciências da saúde e do comportamento,
Como também, é comum verificarmos tal diagnósti-
como psicólogos e psiquiatras. Várias foram as in- co em acusados de promover crimes em série.
dagações sobre um possível diagnóstico que pudes- O caso do Tiago é apenas mais um caso,
se justificar os crimes cometidos. “Será Tiago um hipoteticamente diagnosticado como psicopatia,
louco? Ou uma pessoa acometida de uma crueldade que temos relatado na história. Entre 1432 e 1440,
perversa, que sentia prazer em matar para saciar Gilles de Rais ficou famoso por matar mais de 800
a sua frustração? Ele estava a serviço de algum crianças e jovens, apesar de ter confessado ape-
nas 150. Giles era um cidadão francês pertencente
à classe nobre e soldado que lutou em diversas
batalhas, inclusive ao lado de Joana D’Arc contra
os ingleses. Além de cometer os assassinatos, ele
ainda estuprava suas vítimas.
Atualmente, com a melhor qualificação
dos profissionais psicólogos e psiquiatras, e com a
utilização de método científico, seja testes psicoló-
gicos, entrevistas diagnósticas ou exames de ima-
gem, é possível aferir com maior precisão a ex-
clusão ou indicação ao diagnóstico de psicopatia.
Haja visto que pode haver outras patologias que
possam estar desencadeando tal sintomatologia.
Além dos instrumentos e procedimentos
específicos, os profissionais utilizam manuais
diagnósticos que trazem diretrizes características
específicas para definir traços de personalidade e
comportamentos. O transtorno de personalidade,
seja ele do tipo antissocial (psicopatia) ou qual-
quer outro, manifesta-se por uma forma de agir
muito inflexível e mal-ajustada. Ou seja, prejudica
a adaptação do indivíduo às situações que enfren-
ta, causando a ele próprio ou mais comumente aos
que lhe estão próximos, sofrimento e incômodo.
De acordo com a Classificação Internacio-
nal de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde
Fotodivulgação: Flickr-carbonnyc

(também conhecida como Classificação Interna-


cional de Doenças – CID 10, 1993), que é publica-
da pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e
visa padronizar a codificação de doenças e outros
problemas relacionados à saúde, a psicopatia é
definida como sendo um Transtorno de Personali-
dade Antissocial com as seguintes características:
desprezo das obrigações sociais; falta de empatia
para com os outros; desvio considerável entre o
comportamento e as normas sociais estabeleci-
das; comportamento não é facilmente modificado

25
PSICOPATIA E SERIAL KILLERS - TRANSTORNOS

“Os estudos epidemiológicos estimam que na população em geral, as taxas dos transtornos de personalidade
antissocial podem variar de 0,5% a 3%. Antes deste tempo, qualquer conduta antissocial é definida como trans-
torno de conduta em criança e adolescente.”

pelas experiências adversas, inclusive pelas pu- com animais, comportamento do tipo hiperativo
nições; existe uma baixa tolerância à frustração com necessidade constante de estimulação, bai-
e um baixo limiar de descarga da agressividade, xo controle de impulsos, e uso frequente de com-
inclusive da violência e; finalmente, existe uma portamento manipulador e mentiras (Ajuriguerra,
tendência a culpar os outros ou a fornecer racio- 1991). Este tipo de perfil comportamental é comum
nalizações plausíveis para explicar um comporta- vir acompanhado do uso e abuso de substancias
mento que leva o sujeito a entrar em conflito com psicoativas, como o álcool, tabaco, entorpecentes
a sociedade. (maconha e, principalmente, as estimulantes com
Os estudos epidemiológicos estimam que na a cocaína e crack).
população em geral, as taxas dos transtornos de Mesmo analisando a manifestação da psico-
personalidade antissocial podem variar de 0,5% a patia com algo desenvolvimental, a origem e etio-
3%, subindo para 45-66% entre presidiários (Soa- logia da psicopatia ainda não é definida de forma
res, 2010). Tal diagnóstico apenas é definido após única sob aspectos positivistas. De acordo com
os 18 anos de idade. Antes deste tempo, qualquer Blair (2003), há possíveis evidencias que determi-
conduta antissocial é definida como transtorno de nam a associação entre lesões do lobo frontal do
conduta em criança e adolescente. cérebro e a manifestação de comportamentos im-
Neste tipo psicopatológico de transtorno in- pulsivos e agressividade, que podem levar a uma
fantil, a criança ou o jovem tem uma prevalên- inadequação social.
cia permanente em se comportar de uma forma O lobo frontal é uma região do cérebro di-
incômoda e perturbadora, vindo a prejudicar vidida em 3 partes: córtex motor primário (que é
pessoas ao seu redor. Além disto, há a tendên- responsável pela motricidade voluntária), o córtex
cia em se envolver em atividades perigosas e até pré-motor (regula a integração dos atos motores e
mesmo ilegais, como o cometimento de pequenos sequências de ações aprendidas), e finalmente o
delitos do tipo furto, roubo e lesão corporal. Es- córtex pré-frontal (que regula as funções cogniti-
ses jovens não aparentam sofrimento psíquico vas, o afeto, o humor, a forma de estabelecer o com-
ou constrangimento com as próprias atitudes, e portamento social e, com isso, gerenciar a conduta,
ainda não demonstram culpa ou arrependimento e de manifestar os traços de personalidade).
em constranger os que estão ao seu redor, atra- Pela sua complexidade em regular o com-
vés do desrespeito dos direitos alheios. Portan- portamento humano, tem relação direta com o
to, seu comportamento apresenta maior impacto sistema límbico, área localizada em uma região
nos outros do que em si mesmo. Os comporta- interior do cérebro, também chamada de subcorti-
mentos antissociais tendem a persistir, parecendo cal. É formada por várias estruturas, como o hipo-
faltar a capacidade de aprender com as conse- tálamo, o tálamo, os núcleos da base e hipocampo.
quências negativas dos próprios atos. Pode ainda Auxilia na regulação de emoções e sentimentos,
ocorrer o comportamento de provocar crueldade representados como ira, pavor, paixão, amor, ódio,

26
PSICOPATIA E SERIAL KILLERS - TRANSTORNOS

alegria e tristeza. Este sistema ainda é responsá- frias e não dotadas de sentimentos”. Porém, além
vel por alguns aspectos da identidade pessoal e dos aspectos biológicos é importante investigar os
por importantes funções ligadas à memória. Des- aspectos ligados à convivência familiar e social
ta forma, a o lobo frontal trabalha em conexão de tais sujeitos durante a sua primeira infância.
com o sistema límbico, e os dois juntos realizam a Não raros encontramos históricos de vivências
função de regular e fazer a manutenção de com- marcadas por situações de violência doméstica,
portamentos de ordem complexa, utilizando-se de representadas por abuso sexual, agressões físicas
processos cognitivos e afetivos para estabelecer e psicológicas, negligência, violência, ausência to-
a análise e consequência de comportamentos no tal de regras e limites. Isto é a demonstração de
presente, o julgamento de ações no passado, como que o meio ambiente é um fator que desencadeia
também prever uma ação futura, mesmo não ten- a ocorrência e vigência de tal transtorno. Ou seja,
do vivido uma algo semelhante. não basta apenas ter a pré-disposição genética,
Alguns estudos, citados por Raine (2013), de- é necessário ter um gatilho fenotípico que esteja
monstram que uma conduta antissocial, ou típica ligado a desencadeantes comportamentais.
de um psicopata, pode estar associada a uma di- É importante ressaltar que, dentre os indi-
minuição da massa cinzenta na área pré-frontal, víduos portadores de tal transtorno, podemos ter
como também uma possível diminuição do volume indivíduos que cometem crimes de maneira orga-
do hipocampo posterior, o que gera o aparecimen- nizada ou desorganizada.
to de comportamentos de característica agressiva. Os psicopatas organizados planejam seus
Mas, mesmo como este déficit neurobiológico, Rai- crimes de uma forma que os permite ocultar pro-
ne (2013) afirma que os psicopatas são indivíduos vas ou ainda alterá-las, e de fugir da polícia com
com capacidade para discernir entre o certo e o estratégias mirabolantes. Geralmente têm o coe-
errado, mas agem impulsivamente, não se auto- ficiente intelectual elevado (supera o QI igual a
determinando contra o prejuízo alheio. Em situa- 110), procuram e selecionam suas vítimas de forma
ções de estresse, apresentam batimento cardíaco predatória com o intuito de satisfazer desejos per-
abaixo do normal, transpiram menos do que as versos e mórbidos. Para isto, se comportam com
outras pessoas, como se não fossem afetados. Ou atos e ações baseados na mentira, na simulação,
seja, não há respostas psicofisiológicas frente a sendo portanto sedutores e manipuladores.
situações que podem causar medo ou ameaça de No momento em que percebem que as suas
uma maneira geral. Por isto, o senso comum tem possíveis e futuras vitimas demonstram confian-
uma crença de que os psicopatas “são pessoas ça por sua pessoa, agem forma a não dar chance
“Os psicopatas organizados planejam seus crimes de uma forma que os permite ocultar provas ou ainda
alterá-las, e de fugir da polícia com estratégias mirabolantes.”

Fotodivulgação: Flickr-59101414@N02

27
PSICOPATIA E SERIAL KILLERS - TRANSTORNOS

para a reação ou fuga. Sentem muito orgulho e


prazer em saber que seus atos delitivos foram
executados de modo pré-determinado, com um
fim específico. Este tipo de comportamento é re-
presentativo de uma expressão egocêntrica e nar-
císica. Neste caso, não há a manifestação da alte-
ridade, que é o reconhecimento de que a própria
existência é fundamentada a partir do outro, e da
visão do outro. Na alteridade é possível compreen-
der o mundo pela experiência do contato com “o
outro”. Ou seja, sabemos o que somos a partir do
momento em que enxergamos a existência de ou-
tro ser humano. Paradoxalmente, conduzem-se na
satisfação imediata dos impulsos, não se impor-
tando com as consequências e com a responsabi-
lidade da dor alheia. Neste contexto, não há espaço
para a culpa e o reconhecimento de que provoca-
ram o sofrimento e o prejuízo alheio. Aliado a isto,
tais indivíduos procuram fugir constantemente da
frustração. Naturalmente, agem de forma agres-
siva, com direcionamento de tal agressividade ao
outro, vindo a ser violentos.
Os atos que culminam em violência levam ao
dano do tipo físico, como torturas, lesões corporais, “A justiça brasileira não possui uma legislação espe-
chegando de fato ao próprio homicídio. Ou ainda cífica para poder caracterizar e punir o ato criminal
do tipo psíquico, ao qual utiliza de comportamen- provocado por um portador de psicopatia. Por isto,
to marcado por dominação, chantagem e ameaça. torna-se difícil aplicar uma punição condizente com o
Assim, pelo fato de tais vítimas viverem um terror ato criminal.”
psicológico, podem chegar a cometer o suicídio pelo
fato de não visualizarem qualquer outra situação demonstram a conduta criminosa, como pegadas,
que solucione o problema em questão. marcas de sangue e rompimentos de obstáculos.
O padrão desorganizado não executa um No cotidiano são pessoas que expressam um com-
planejamento de seus atos. São indivíduos que portamento desagradável e imaturo (não agem
apresentam um coeficiente mental baixo (QI me- pensando nas consequências). Por isso, podem ter
nor que 70) e agem por impulsividade e descon- diversas psicopatologias associadas ao comporta-
trole. Seus delitos são executados num momento mento antissocial, como a deficiência intelectual,
oportunista, que não puderam ser organizados, transtornos impulsivos, psicoses e parafilias.
elaborados, planejados, e as possíveis consequên- A justiça brasileira não possui uma legisla-
cias futuras não foram analisadas. A justiça pode, ção específica para poder caracterizar e punir o
em alguns casos, considerá-los como inimputá- ato criminal provocado por um portador de psico-
veis, o que os definiria como incapazes de enten- patia. Por isto, torna-se difícil aplicar uma punição
der o caráter ilícito de seus atos, e assim se auto- condizente com o ato criminal. Apenas nos casos
determinarem para não agir com tal finalidade. O de comorbidade com doença mental, com trans-
próprio Código Penal Brasileiro (Brasil, 2008), no tornos que interferem no entendimento da ação
artigo 26, coloca esta condição de que aquele que criminosa, há a promoção de um tratamento dife-
não consegue entender a natureza de seus atos
renciado, numa instituição de saúde mental ligada
e de determinar-se de acordo com esse entendi-
ao meio forense. Caso contrário, o acusado é con-
mento, deve ter um tratamento especial no sentido
duzido à convivência normal com outros detentos.
de não ser responsabilizado e, sim, tratado.
Antes do ato antissocial, eles percebem a
*Leonardo Faria é psicólogo, mestrando em Ciências
situação de forma ameaçadora, e com isto são
Criminológicas-Forenses, especialista em Neuropsicologia,
acometidos de uma ansiedade antecipatória, que
Criminologia e Psicologia Jurídica. Psicólogo Criminal da
os conduzem a desenvolver extrema frustração
Polícia Técnico-Científica do Estado de Goiás. Professor
e violência. O modus operandi do local do cri-
universitário. Consultor em temas de neurociências e perícia
me dos desorganizados não é alterado. Neste psicológica. Orientador de Estágio do Curso de Pós-Graduação
caso, é comum deixarem evidências expressivas, em Neuropsicologia da PUC-GO. Orientador de Estágio do Curso
como o corpo, a arma ou o meio utilizado para de Pós-Graduação em Neuropsicologia do NEPNEURO (Núcleo
a consumação do delito, e outros vestígios que de Ensino e Pesquisa em Neurociências).

28
FOTOINSPIRAÇÃO

Fotodivulgação: Flickr-frosch50

NENHUMA MENTE DE VILÃO É FORMADA SEM


PASSAR POR MUITO SOFRIMENTO E REJEIÇÃO DA
SOCIEDADE.

PROMESSIUS

29
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

30
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

ASSASSINOS
SERIAIS E A
NATUREZA
HUMANA
UMA ANÁLISE DO PONTO DE VISTA DA NEUROCIÊNCIA

Q
UAL A VERDADEIRA ESSÊNCIA DA
NATUREZA HUMANA? O QUE DIZER DE
PERSONALIDADES, TEMPERAMENTOS,
CARÁTER TÃO DISTINTOS, E AINDA COMO SÃO
MOLDADOS POR UM MEIO AMBIENTE QUE VAI
DO QUASE PARADISÍACO, AO MAIS DEMONÍACO
POSSÍVEL? COMO DIMENSIONAR OS PAPÉIS
FUNDAMENTAIS QUE O AMBIENTE FAMILIAR,
A CLASSE SOCIOECONÔMICA, A RELIGIÃO,
CULTURA ENTRE OUTRAS VARIÁVEIS, IMPÕE NA
ESTRUTURA PESSOAL DE CADA UM DE NÓS? E para
completar nossas indagações, o que a genética, nossas heranças
familiares e transversais, as disgenesias intrauterina, as lesões e
patologias que nos acometem na trajetória existencial, interferem nas
nossas ações, relações com o mundo que nos cerca?
Dito isso, para desenvolver-se um tema tão amplo, controverso,
polêmico como os assassinos seriais, precisamos alertar que é terreno
minado, onde filósofos, antropólogos, sociólogos, bem como psicólogos,
psiquiatras forenses, policiais, religiosos, advogados e uma gama de
outros profissionais se debruçam há séculos sem que o tema se esgote
ou se defina.
Já dizia Rousseau que “o homem nasce bom, a sociedade é
que o corrompe”. Busco um outro pensador, Hobbes, para contra-
dizê-lo: “a natureza humana é vil e má, e a sociabilidade depen-
de de leis, normas e mecanismos coercitivos, limitadores, puni-
tivos, ou gratificadores para quando agir bem”. Como diriam os

31
ASSASSINOS SERIAIS E A NATUREZA HUMANA - NEUROCIÊNCIA

Fotodivulgação: Flickr-125992663@N02
“Se compararmos com o período de sonho noturno, temos 70% de pesadelos, para 30% de bons sonhos. Medo,
pavor, pânico, insegurança sempre nos acompanharam em meio a guerras, massacres, fome, em grande parte
de nossa história.”

gregos, “in medium virtus”, realmente a virtude de raciocínio e pensamentos. E que comportamentos
está no meio, no equilíbrio de posições extremas. estes “cérebros” determinam?
Mas para contribuir com um pouco de luz, nesta se- O reptiliano tem a ver com a agressividade pri-
ara nebulosa, tentarei apresentar algumas novidades mária e instintiva, que se justifica pela necessidade de
em neurociência e estudos do comportamento, tan- defender território e onde a sobrevivência se garante.
genciando aspectos neurogenéticos, neurofisiológicos, Ainda pertence à herança comportamental reptiliana
usando uma linguagem mais informal e acessível. a necessidade de seguir liderança baseada em for-
Peço desculpas onde isso não for possível, e tenta- ça e domínio. Força bruta e impiedosa não guarda
rei dar exemplos, fazer analogias ou usar metáforas força com manifestações  emocionais. É a violência
quando necessário. no seu estágio original. Mas quando o cérebro evolui
Começo por lembrar que a história do nosso para estágios mais avançados e mamíferos, quando o
planeta é basicamente uma luta por adaptação, sobre- Sistema límbico nos traz estruturas mais complexas
vivência, modificações constantes do meio ambiente. que originam emoções, coordenam o estresse, o com-
A evolução é de luta, guerra, extinção, reinício, auges portamento condicionado, sentimentos como o medo,
e decadências. Na nossa memória ontogenética, até fi- insegurança, ciúme, inveja, busca de liderança, estra-
logenética (ou seja, no registro histórico que trazemos tégias de alianças hierárquicas, até mesmo simpatia e
do ser humano e outros animais que nos antecede- proteção mútua, além de raiva, ódio, traição, atenuam
ram), a maior parte do conteúdo é selvagem, sangren- ou potencializam a agressividade ou impulsividade
to, violento. Se compararmos com o período de sonho dos bandos, criando rivalidades, guerras por territó-
noturno, temos 70% de pesadelos, para 30% de bons rios, disputas por lideranças, alianças internas.
sonhos. Medo, pavor, pânico, insegurança sempre nos Mas sem dúvida, no cérebro mamífero, a socia-
acompanharam em meio a guerras, massacres, fome, bilidade e cuidado com a cria é maior complexidade
em grande parte de nossa história. E é exatamente social fazem amortecer aquele agressividade e im-
isso que nosso cérebro, o grande computador divino, pulsividade reptiliana. Finalmente, o córtex, a porção
nos revela quando estudamos sua formação. mais humana do cérebro, ao desenvolver a lógica, o
Para melhor compreensão, tomarei emprestado, raciocínio, a linguagem e assim estabelecer regras
estudo de Ballone, GJ e seu colega Moura, EC, que citam sociais, religiosas, culturais e legais, de natureza pu-
os três cérebros evolutivos: o primitivo ou reptiliano, a nitivas, constituíram a terceira forma de atenuar as
parte mais baixa da estrutura, onde se destacam bul- tendências agressivas inerentes à natureza humana,
bo, ponte, cerebelo, tálamo; o cérebro mamífero, acima tornando possível sua vida em sociedade e estabe-
e no meio, onde está o sistema límbico, que se destaca lecendo civilizações que podem ser mais ou menos
por seu papel modulador de comportamentos condi- pacíficas dependendo exatamente de suas origens.
cionados, o estresse e a regulação das emoções; e por Saindo da seara ontológica e penetrando na
fim a parte nobre, mais nova, o telhado do cérebro, evolução neurofisiológica, é curioso observar como
onde o córtex se destaca pela capacidade de expres- o cérebro humano desenvolveu um sistema de re-
são através da fala, domínio da lógica e estruturação gulação natural das emoções negativas. E quando

32
ASSASSINOS SERIAIS E A NATUREZA HUMANA - NEUROCIÊNCIA

alterado, explica o comportamento impulsivo e vio- sexualidade, impulsividade e agressividade. Realmente


lento que foi descrito como Transtorno Explosivo de é do macho atitudes como estupro, violência doméstica,
Personalidade (Pesquisa da Universidade Wisconsin- atitudes insanas e impensadas. Tudo isso é agrava-
-Medison Science 07/00) ao descrever lesões na re- do por milhões de relatos do papel explosivo que as
gião pré-frontal conectadas ao sistema límbico. Mas, bebida e as drogas exercem ao multiplicar, em mui-
paradoxalmente, a região do córtex pr-e frontal orbi- to, esta situação, tirando não só a consciência crítica,
tal (acima dos olhos) teria importante função pacifi- mas os valores mínimos de civilidade, animalizando
cadora, pois refrearia ímpetos agressivos. Já o córtex os instintos e potencializando os impulsos e força
cingulado anterior seria um ativador das respostas física agressiva e sexual. Uma disfunção genética, a
ao conflito, à impulsividade e à agressão. Impor- trissomia do cromossomo Y (XYY), tem sido relatada
tante o papel das amígdalas, estruturas do sistema nos presídios entre os criminosos sexuais em série.
límbico, o mais importante modulador emocional do Quanto à história pregressa e familiar, grande
cérebro, regulador de medo, pânico, que pode ate- parte dos estudos vem dos países do hemisfério nor-
nuar ou ampliar a agressividade e a impulsividade. te, em especial dos EUA, onde o grande interesse, a
Não à toa, vemos na história tentativas extremas e glamourização e os filmes hollywoodianos chegam a
radicais de tratamentos, às vezes medievais, de lobo- colocar em dúvida até onde as motivações são indu-
tomia, onde os indivíduos extremamente agressivos e zidas por fatores ambientais, naturais ou locais, visto
impulsivos com históricos de assassinatos eram sub- que não se reproduzem em outras partes do mundo
metidos à lobotomia do pré-frontal, tornando-se apá- na mesma frequência. Talvez aspectos do “american
ticos, indiferentes, dóceis. Ou ainda faziam a extração way of life”, ou o jeito americano de viver, estejam por
do giro cingulado, e assim ficavam domesticados, e, traz deste tipo de fenômeno. Afinal, relatos de abu-
sem ansiedade, eram liberados. No acaso das amíg- so infantil por parte de familiares, cuidadores, sejam
dalas, sua extirpação deixava as pessoas indiferentes, eles sexuais ou maus tratos físicos, abandono, pobre-
sem identificação sexual. za, trabalho forçado, discriminação na escola, gan-
Um aspecto crucial, que salta aos olhos, é o gues, furtos são muito comuns, assim como rigidez
constante envolvimento de assassinos em séries a religiosa, comunidades pequenas e autovigilantes. O
práticas de atrocidades libidinosas e sexuais.. Cha- bullying, a discriminação, o preconceito são outros
ma a atenção, o absoluto predomínio do gênero fatores comuns aos histórico dos assassinos em série.
masculino nesta prática e não é de se estranhar. Mas o mais importante é que eles são perfeccio-
Afinal, a testosterona é um hormônio que tem três nistas, obsessivos e frios. Obedecem a rituais e podem
características claras e predominantes: instigar obedecer a padrões que para eles têm uma lógica,
“Realmente é do macho atitudes como estupro, desde uma voz que os comande e de forma imperati-
violência doméstica, atitudes insanas e impensadas. va os obrigue a rituais satânicos, a um prazer indizí-
Tudo isso é agravado por milhões de relatos do papel vel, mais que orgástico, quase mântrico, à iluminação.
explosivo que as bebida e as drogas exercem ao mul- Ou ainda o alívio de culpas dolorosas e demoníacas
tiplicar esta situação.” que nunca acabam. Para os narcisistas, cujos crimes
são sofisticados e elaborados, pistas serão deixadas,
pois eles querem ser pegos e reconhecidos. Para os
gênios do mal, como o famoso Zodíaco, a satisfação
Fotodivulgação: Flickr-24258698@N04

reside no fato de nunca ser encontrado, apesar dos


códigos. O importante é não confundir múltiplos ma-
tadores com os de série. Os que entram em colégios
e massacram seus colegas vingando o bullying, ou
o desempregado, seus colegas. Assassinos em séries
são meticulosos, observadores, obsessivos e excên-
tricos. São predadores, sádicos, desumanos, além de
psicopatas. Vivem num mundo à parte, alienígenas da
espécie humana, cada qual de um planeta distinto.

* Eduardo Andrade Aquino é formado em medicina pela UFMG (1982),


com residência médica em Psiquiatria pelo Hospital do IPSEMG, em
Belo Horizonte. É psiquiatra, neurocientista, psicoterapeuta. Fundou
o Núcleo de Neurociências em Belo Horizonte, atuando como diretor
clínico no período de 1990 a 1994. Por cinco anos foi o representante,
no Brasil, do HZI Research Center of New York, conceituado centro de
pesquisas norte-americano. Aquino é palestrante requisitado em todo
o país, ministrando seminários sobre o comportamento e o psiquismo
humano, o bem-estar e os danos causados pelo estresse.

33
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

MANIPULADORES
EM SÉRIE
PARA SE ENTENDER ESTE TIPO DE CRIMINOSO É NECESSÁRIO
CONHECER A DINÂMICA PSICOLÓGICA E COMPORTAMENTAL
HUMANA. PARA TAL, DEVEM-SE CONSIDERAR OS TRÊS
ELEMENTOS QUE CONECTAM OS CRIMES EM SÉRIE: O MODUS
OPERANDI, O RITUAL E A ASSINATURA

E
M UM SENTIDO MAIS USUAL,
A PALAVRA MANIPULAR
REMETE À POSSIBILIDADE
DE INFLUENCIAR OU CONTROLAR
OUTRO INDIVÍDUO. EM TODOS OS
SEUS POSSÍVEIS EMPREGOS, TRATA-
SE DE UM VERBO TRANSITIVO. Quem
manipula, manipula sempre alguém ou alguma
coisa.
A capacidade de persuadir e a capacidade
de manipular as vítimas não são características
definidoras de um assassino em série. Afinal,
para que assassinatos desse tipo sejam come-
tidos, nem sempre é preciso agir sobre os inte-
resses ou sobre as expectativas de outra pessoa.
Alguns assassinos em série apenas atiram em
suas vítimas, pouco interagindo com as mesmas,
tal como ficou evidenciado em recentes episó-
dios em nosso país, ocorridos na cidade de Goi-
ânia. Em certos casos, muitos criminosos desse
tipo podem, até mesmo, nunca dirigir uma única
palavra para quem está sendo atacado.
De outro modo, em assassinos mais orga-
nizados, para usar aqui a terminologia menos
restritiva, é possível identificar, muitas vezes, o
emprego de algumas estratégias de manipulação
cujo principal objetivo é atrair as vítimas. Na
maioria dos casos, essa capacidade está rela-
cionada a um quadro de psicopatia, ainda que

34
MANIPULADORES EM SÉRIE - ESTRATÉGIAS

a maioria dos psicopatas não seja formada por serão analisados e mencionados neste texto,
assassinos em série propriamente ditos e que tendo por base certos casos famosos. Tal aná-
nem todos os assassinos em série sejam psico- lise pode igualmente sugerir futuros caminhos
patas. Porém, é na sobreposição dessas catego- para a pesquisa nesse campo, principalmente
rias, bem como quando há uma real necessida- no Brasil, onde os estudos ainda são incipien-
de de que a vítima acabe, sem perceber, agindo tes, mas podem revelar-se promissores.
conforme o interesse do assassino, que aquilo Pode-se pensar, inicialmente, no caso de
que chamamos manipulação pode ser identi- Ted Bundy. Ted ou Teddy foi o apelido dado a
ficado, necessitando ainda ser devidamente Theodore Robert Cowel Bundy. Ted matou trinta
estudado. e cinco mulheres ou mais, conseguindo atrair
Até o momento, não existe uma medida a maior parte delas para um velho Volkswagen
confiável ou exclusiva para avaliar e mensurar antes que pudesse golpeá-las e jogá-las para
comportamentos interpessoais que poderiam dentro do automóvel. No ano de 1974, a polí-
ser considerados de assassinos em série. Há, cia americana começou a encontrar crânios de
de outro modo, um sistema de avaliação para garotas desaparecidas no parque estadual do
quantificar comportamentos desse tipo em psi- Lago Sammamish, em Washington. Começavam
copatas. Um sistema que fornece, nesse senti- a aparecer, naquele local, as primeiras evidên-
do, algumas pistas para que possamos entender cias dos diversos assassinatos cometidos por
como agem os assassinos em séries que apre- um dos mais loquazes e inteligentes assassinos
sentam uma maior capacidade de manipulação. em série da história.
Porém, esse mesmo sistema de avaliação de- A estratégia que Ted usava para atrair
manda uma entrevista, não podendo ser pontu- suas vítimas era tão elementar quanto efi-
ado apenas com as informações obtidas a partir ciente e remete a um dos itens do citado ins-
de outras fontes. Trata-se de um teste chamado trumento de avaliação psicológica, ou seja, à
Medida Interpessoal de Psicopatia (IM-P), que chamada busca por aliança. Alianças humanas
avalia comportamentos recorrentes em situa- estabelecem-se quando há uma relação de re-
ções de interação social. Alguns dos seus itens ciprocidade e confiança, ainda que temporária.

“Até o momento, não existe uma medida confiável ou exclusiva para avaliar e mensurar comportamentos inter-
pessoais que poderiam ser considerados de assassinos em série, mas existe um sistema que fornece algumas
pistas para entender como eles agem.”

Fotodivulgação: Flickr-16210667@N02

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MANIPULADORES EM SÉRIE - ESTRATÉGIAS

Ted Bundy fingia estar com o braço lesiona-


do e, portanto, sem conseguir abrir a porta do
carro. Solicitava ajuda e conseguia aparentar
pouco perigo nas condições em que suposta-
mente se encontrava. Para as jovens que o aju-
davam, havia o sutil prazer de estar auxiliando
o próximo, considerando o próprio fato de que
os mecanismos de recompensa em nosso cé-
rebro podem ser ativados em situações dessa
natureza. É interessante notar que ao longo da
sua trajetória criminal, exceto nos últimos as-
sassinatos cometidos, quando matou de forma
menos planejada, seu modus operandi não mu-
dou muito e a explicação para isso é simples.
Ted Bundy não precisava mudar muito, pois a
estratégia de aproximar-se e criar uma aliança
momentânea, capaz de mobilizar o altruísmo
das vítimas, mostrou-se rotineiramente eficaz.
De um modo geral, constata-se que psico-
patas que são assassinos em série, ao contrário
de psicopatas que são meros estelionatários,
não necessitam, por um tempo mais prolon-
gado, ludibriarem suas vítimas. Só precisam
atraí-las para o local certo, no momento certo.
Dito de outro modo, não há a necessidade de
sofisticação, mas apenas de uma total precisão,
Fotodivulgação: Flickr-31151995@N04

diante de uma situação na qual o desejo predo-


minante é tão somente matar.
Há, entretanto, assassinos em série que po-
dem agir sob outras motivações, incluindo a mo-
tivação financeira. Casos desse tipo são exce-
ções já que assassinos seriais, quando roubam
suas vítimas, o fazem por motivos secundários,
muitas vezes com o propósito de obter um sou-
venir. Charles Sobhraj fez parte desse grupo
minoritário. Apelidado de “A Serpente”, Charlie
foi acusado de assassinar um grande número
de mochileiros que viajavam pelo sudeste asiá-
tico. Sobre a motivação para tais atos, Charles
chegou responder para uma jornalista que o
entrevistou após a condenação: “Foram apenas “Existem, também, assassinos em série motivados
negócios, somente uma profissão”. Em parte, a pelo dinheiro. Casos desse tipo são exceção, ja que
explicação de Charles Sobhraj condiz com os normalmente quando eles roubam a vítima, fazem
seus atos antes de começar a matar. Ou seja, an- por motivações secundárias.”
tes de se tornar um assassino em série, Sobhraj tais condições, demandava um menor esforço
era um estelionatário muito bom em manipular do que enganar ou controlar alguém por um
pessoas. Costumava, em suas relações, ser tan- longo tempo. Acusado de vinte assassinatos,
gencial quando precisava ou invasivo quando
presume-se que esse estelionatário tenha se
as circunstâncias demandavam. Características
tornado um assassino em série, assim que a
condizentes com a psicopatia e também avalia-
das pelo teste anteriormente aludido. satisfação obtida por intermédio do ato de ma-
Na França, conseguiu fazer vários ami- tar passou a fazer parte das suas motivações,
gos ricos ou milionários para roubá-los depois. ainda que nunca tenha estado no cerne delas.
Mas a fonte parece ter secado quando Sobhraj Tais casos revelam-se emblemáticos pelo
precisou sair do país e voltar para o continente fato de que embora a capacidade de manipula-
asiático. Na Tailândia, percebeu que a melhor ção tenha se mostrado notória nesses indivídu-
estratégia para obter dinheiro rápido era ma- os, ela, por certo, não se revelou completamen-
tar e roubar. Percebeu também que matar, em te indispensável para o cometimento dos seus

36
MANIPULADORES EM SÉRIE - ESTRATÉGIAS

Fotodivulgação: Flickr-treamus
“Tudo que Kordiyeh costumava fazer era fingir ser um taxista e rodar de carro pela cidade, até que nele en-
trassem mulheres que seriam posteriormente escolhidas para serem estupradas e mortas. Uma tática aparen-
temente banal, mas que conseguiu manter a polícia sem pistas sobre sua identidade.”
crimes. Em outras palavras, uma significativa mulheres que seriam posteriormente escolhi-
capacidade de manipular pode ser fundamen- das para serem estupradas e mortas. Uma tá-
tal para disfarçar a personalidade de muitos tica aparentemente banal, mas que conseguiu
indivíduos que cometem assassinatos em série, manter a polícia sem pistas sobre a identida-
mas não se faz igualmente indispensável para de do Vampiro de Teerã por um longo tempo.
executá-los. Nesses termos, a mera identifica- Quem ousaria dizer que esse assassino se re-
ção de estratégias empregadas para atrair as velou muito ou pouco inteligente apenas ana-
vítimas não costuma ser suficientemente infor- lisando o seu modus operandi? Quem pode-
mativa sobre o potencial intelectual dos assas- ria dizer, apenas com base nesses dados, que
sinos em série no que se refere ao chamado Kordiyeh era um hábil manipulador de outras
profiling criminal. mentes, embora optasse por atrair suas vítimas
Um exemplo dessa limitação refere-se ao sem correr maiores riscos?
caso de Ali Reza Khoshruy Kuran Kordiyeh, Avaliar a real capacidade de manipulação
conhecido como o Vampiro de Teerã e um dos de um indivíduo é, portanto, algo que não está
poucos assassinos em série noticiados agindo ao pleno alcance dos profissionais, quando,
em um país muçulmano. Chama atenção o quão para tanto, não se faz possível uma entrevis-
singela aparentou ser a estratégia usada para ta e o uso de um instrumento adequado. Em
viabilizar seus atos. Tudo que Kordiyeh costu- contrapartida, principalmente no caso da psi-
mava fazer era fingir ser um taxista e rodar copatia, a interlocução entre profissionais que
de carro pela cidade, até que nele entrassem traçam, por exemplo, o perfil a partir de uma

37
MANIPULADORES EM SÉRIE - ESTRATÉGIAS

cena de crime, com avaliadores voltados para


um psicodiagnóstico posterior demonstra ser
necessária para o próprio avanço da Crimino-
logia. A compreensão de algumas estratégias
interpessoais empregadas por psicopatas pode
ser, conforme este texto buscou evidenciar, elu-
cidativa sobre o próprio modo de agir de uma
parte significativa dos assassinos em série. Tal
compreensão demanda sempre a avaliação da
personalidade de alguém e não apenas uma
análise dos seus comportamentos criminosos
mais recentes.
Por outro lado, não existem evidências
científicas sobre um conjunto de comporta-
mentos interpessoais capazes de indicar que
alguém está manipulando outro alguém com o
intuito de assassiná-lo depois. O que existem
são indícios de que determinados psicopatas
que são também assassinos em série tendem
a empregar o mesmo conjunto de estratégias
quando, para matar, precisam manipular. Por-
tanto, se entendermos que alguns assassinos
em série estão inseridos em uma subcategoria
que poderíamos aqui chamar de manipulado-
res em série, a constatação dessa tendência
só pode ser feita a partir de uma avaliação
criteriosa. Existem, de outro modo, evidências
científicas de que essa perversa capacidade de
manipulação não nasce pronta e é, principal-
mente, o produto de um longo e problemático
processo de desenvolvimento. Sendo assim, a
maneira mais eficaz de prevenir o surgimento
de determinados tipos de assassinos em série
seria prevenir a consolidação de um transtor-
no que está presente na maior parte desses in-
divíduos. Em outros termos, essa asserção re-
fere-se à psicopatia. Um transtorno que existe
enquanto realidade biopsicossocial, não sendo,
conforme evidencia a moderna Neurociência
Cognitiva, uma mera construção social.
Na atualidade, pode-se dizer que estamos
Fotodivulgação: Flickr-izarbeltza

compreendendo, cada vez mais, o que de fato é


a psicopatia e, por conseguinte, o que está por
trás da maioria dos casos de assassinato em
série e como podem ser prevenidos. Avanços
nesse campo só continuarão sendo possíveis
por intermédio da pesquisa ética, não dogmá-
tica e interdisciplinar. Pesquisa essa que, fe-
lizmente no Brasil, também está começando a
avançar a partir da validação e adaptação de
novos instrumentos de avaliação psicológica.

* Silvio José Lemos Vasconcellos é psicólogo, mestre


“Avaliar a real capacidade de manipulação de un em Ciências Criminais (PUCRS) e Doutor em Psicologia
indivíduo é algo que não está ao pleno alcance dos (UFRGS). Professor do Programa de Pós-Graduação em
profissionais, mas cada vez mais pode se compreen- Psicologia da UFSM e autor da obra O bem, o mal e as
der sobre o que está por tras dos casos de assassi- ciências da mente: Do que são constituídos os psicopatas
nato em série.” (Editora Ícone, 2014).

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FOTOINSPIRAÇÃO

OS COVARDES MORREM VÁRIAS VEZES ANTES


DA SUA MORTE, MAS O HOMEM CORAJOSO
EXPERIMENTA A MORTE APENAS UMA VEZ.

WILLIAM SHAKESPEARE

Fotodivulgação: Flickr-g-ratphotos

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REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

COMPREENDENDO
O SERIAL KILLER
A PSIQUIATRIA FORENSE NÃO CONSIDERA OS ASSASSINOS SERIAIS
DOENTES MENTAIS, POIS SUA CAPACIDADE COGNITIVA ESTÁ
PRESERVADA. TRATA-SE DE UMA PERTURBAÇÃO DA SAÚDE MENTAL CUJA
DEFINIÇÃO NÃO É CONSENSUAL ENTRE OS ESPECIALISTAS

O
S
S ASSASSINOS
ASSASSINOS SERIAIS
SERIAIS assassinos seriais, exibe um comportamento
CAUSAM
CAUSAM HORROR
HORROR ÀS ÀS SUAS
SUAS sexualmente sádico, onde o domínio da outra
VÍTIMAS
VÍTIMAS EM EM SEUS
SEUS ÚLTIMOS
ÚLTIMOS pessoa e a subjugação dela aos seus desejos
MOMENTOS
MOMENTOS DE DE VIDA
VIDA E E EM
EM SEUS
SEUS são elementos centrais de sua satisfação. 1
FAMILIARES
FAMILIARES E E AMIGOS,
AMIGOS, MAS,
MAS, Os assassinos seriais podem ser encon-
CURIOSAMENTE,
CURIOSAMENTE, ESTE ESTE TEMA
TEMA trados em todas as classes sociais. No entanto,
TAMBÉM
TAMBÉM ATRAI ATRAI A A ATENÇÃO
ATENÇÃO E E a complexidade do universo mental não per-
SEDUZ
SEDUZ AS AS PESSOAS.
PESSOAS. DESPERTA,
DESPERTA,
mite limitar todo e qualquer assassino serial à
E
E MUITO,
MUITO, O O INTERESSE
INTERESSE NA NA
condição de psicopata. Mesmo assim, esse será
POPULAÇÃO
POPULAÇÃO EM EM GERAL:
GERAL: SEJASEJA EM
EM
o transtorno aqui abordado por dois motivos
PALESTRAS,
PALESTRAS, EM EM FILMES
FILMES FICTÍCIOS,
FICTÍCIOS,
EM
EM REPORTAGENS
REPORTAGENS DA DA VIDA
VIDA REAL.
REAL. básicos: por sua altíssima frequência nesses
Entende-se pelo termo “assassinos se- crimes e pelo alto nível de sua gravidade. A
riais” não aqueles homicidas que tão somen- maioria dos assassinos seriais é composta por
te cometem uma série de crimes. É necessária indivíduos psicopatas. Stone 2 , pesquisando as-
certa especificidade: os vários crimes prati- sassinos do sexo masculino que cometeram três
cados, em diferentes intervalos de tempo, têm ou mais homicídios sexuais seriados, constatou
algo em comum, o chamado “modus operandi”. que 86,5% deles preenchiam os critérios para
Esse termo em latim (plural “modi operandi”) psicopatia da escala de Robert Hare.
significa o modo de operação do criminoso, o Mas, afinal, quem é o psicopata? O psico-
mesmo modo usado para matar as diferentes pata é aquela pessoa que tem um transtorno
vítimas. Ele deixa, assim, a sua marca, a sua em sua personalidade, do tipo antissocial e
presença. com tendência a práticas criminais recidivan-
Portanto, assassinos seriais são homici- tes. Não se trata de um doente mental, uma vez
das que cometem dois ou mais crimes em in- que sua esfera cognitiva mantém-se preserva-
tervalos de tempo diversos, com modi operandi da 3. Em psiquiatria forense (área especializada
semelhantes, tendo, com frequência, motiva- da psiquiatria a serviço da Justiça), o psicopa-
ções psicológicas de cunho sádico e/ou sexual. ta é considerado um portador de perturbação
Segundo Hazelwood e Michaud 1 , a maioria dos da saúde mental. Isso porque nessas pertur-
serial killers, nome mais popularizado dos bações, a capacidade cognitiva (capacidade de

1. Hazelwood R, Michaud SG. Dark dreams, sexual violence, homicide and the criminal mind. New York: St. Martin’s Press; 2001.
40 2.Stone MH. Serial sexual homicide: biological, psychological, and sociological aspects. J Personal Disord. 2001;15(1):1-18.
3. Abdalla-Filho E. Os transtornos de personalidade em psiquiatria forense. In: Fonseca AC. Psicologia e Justiça. Coimbra: Edições Almedina, 2008.

Fotodivulgação: Flickr-sjb79
COMPREENDENDO OS SERIAL KILLERS - DEBATE

entendimento) está preservada, mas sua capa- Ao contrário do doente mental, que tem
cidade volitiva (capacidade de se determinar de um desenvolvimento dentro da normalidade
acordo com o entendimento) está comprometi- até certa idade, para depois eclodirem os sin-
da pelas falhas expostas logo adiante. O mundo tomas psicóticos, o psicopata apresenta cedo
emocional do psicopata é a parte mais afetada sinais reveladores de uma personalidade que
em sua personalidade e isso influencia direta- está se desenvolvendo de forma transtornada.
É uma criança má, um adolescente transgres-
mente seu comportamento criminoso. É inteli-
sor. Sua história de vida é marcada por ina-
gente e capaz de arquitetar planos sofisticados
daptações sociais e infrações. Por isso mesmo,
para alcançar sua meta mortífera sem deixar o diagnóstico de um psicopata é longitudinal,
rastros fáceis de serem identificados. ou seja, para esse diagnóstico é necessária a
pesquisa de toda a vida da pessoa. Por mais
“Até mesmo os termos ‘psicopata’ e ‘sociopata’ reve-
grave ou bizarro que seja um crime praticado
lam, de certa forma, essa falta de consenso.”
por alguém, não se pode dar o diagnóstico sem
o levantamento de toda a sua história de vida,
embora, como dito antes, o modus operandi
seja um forte indicador do tipo de transtorno
mental.
Os fatores causais do comportamento psi-
copático não constituem um consenso entre os
diversos profissionais. No entanto, valorizam-
se os aspectos biológicos, psicológicos e sociais.
Até mesmo os termos “psicopata” e “sociopata”
revelam, de certa forma, essa falta de consen-
so. Tais termos encontram defensores de suas
diferenças e aqueles que veem em tais palavras
verdadeiros sinônimos, diferindo tão somente a
valorização maior de fatores biológicos (no pri-
meiro termo) ou de fatores sociais (no segundo
termo) na causação do transtorno.
Citando Hare 4, “a maioria dos criminosos
não é psicopata, e muitos dos indivíduos que
conseguem agir no lado obscuro da lei e per-
manecem fora da prisão são psicopatas”. Aqui,
Hare está se referindo aos criminosos comuns
e não aos criminosos seriais. A maioria dos
crimes comuns tem um objetivo que não é a
morte em si da vítima, mas o roubo de seus
pertences (seguido ou não de morte), estupro,
estelionato ou qualquer outro objetivo em que
a vítima pode ser até assassinada, mas não é
a morte dela o objetivo principal do criminoso,
exceto em casos muito específicos, como nos
crimes passionais ou em determinados qua-
dros psicóticos. Já o psicopata sente profundo
prazer em exercer seu poder e domínio sobre
o outro, que acaba culminando com a morte
da vítima. Aqui, o objeto desejado não é algum
pertence da vítima, mas ela própria. A vítima
é que passa a ser o próprio pertence do psi-
copata. Ela fica totalmente entregue e rendida
a ele. Certo psicopata que estuprava e matava
em série suas vítimas em um parque revelou
que, apesar do prazer que sentia no ato sexual
violentador, o ponto máximo desse prazer era
4. Hare RD. Sem consciência. O mundo perturbador dos psicopatas que vivem entre
41 nós. Porto Alegre: Artmed; 2013.
COMPREENDENDO OS SERIAL KILLERS - DEBATE

“Certo psicopata que estuprava e matava em série suas vítimas em um parque revelou que, apesar do prazer
que sentia no ato sexual violentador, o ponto máximo desse prazer era sentido no momento de matar a vítima.
Aí estava o seu êxtase.”

sentido no momento de matar a vítima. Aí esta- auxiliar no esclarecimento do tipo de transtor-


va o seu êxtase. no mental que um criminoso possa apresentar.
Esse comportamento criminoso serial é Ele revela parte da psicopatologia de seu autor.
uma das formas de manifestação desses ins- É importante ressaltar que não existe na
tintos que ele consegue, no entanto, planejar de atual Classificação Internacional de Doenças,
modo muito bem arquitetado. Ao executar o seu em sua décima revisão (CID-10), o diagnóstico
plano, ele está revelando parte de sua mente de psicopata5. O que se tem registrado na CID-
perturbada. Seus crimes tendem a se repetir de 10 como F 60.2 é o diagnóstico de Transtorno
modo semelhante (o modus operandi) porque é de Personalidade Antissocial (TPAS), que não
somente desse jeito que ele consegue se satis- é sinônimo de psicopatia. Nem todo portador
fazer, consegue atender a esses desejos per- de TPAS é psicopata, sendo necessário um exa-
versos. Sabe da ilicitude do ato criminoso que me cauteloso para investigação diagnóstica de
cometeu e que vai continuar cometendo, mas comportamento psicopático. Uma das maiores
isso é apenas um detalhe para ele. Por isso que autoridades mundiais nesta área é o canaden-
o modus operandi do crime é um importante se Robert Hare. Ele desenvolveu uma escala de
5. Organização Mundial de Saúde. Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre:
42 Artmed,1993.
COMPREENDENDO OS SERIAL KILLERS - DEBATE

pesquisa de psicopatia mundialmente conheci- gravidade do quadro em si: a falta de trata-


da, a PCL-R (Psychopathy Checklist Revised).4 mento eficaz. Isso mesmo. Não existe tratamen-
São vinte os fatores que compõem essa es- to médico, psicológico ou pedagógico para os
cala criada por ele: loquacidade/charme super-
psicopatas. Se presos, enganam os funcioná-
ficial; autoestima inflada; necessidade de esti-
mulação/tendência ao tédio; mentira patológica; rios penitenciários, se internados, enganam a
controlador/manipulador; falta de remorso ou equipe profissional para passarem a eles exa-
culpa; afeto superficial; insensibilidade/falta de tamente o aparente resultado esperado do tra-
empatia; estilo de vida parasitário; frágil con- tamento. 8 Por se tratar, como dito antes, de um
trole comportamental; comportamento sexual transtorno de personalidade, não existe qual-
promíscuo; problemas comportamentais preco- quer medicamento que possa mudar, transfor-
ces; falta de metas realísticas a longo prazo;
mar a personalidade de alguém. Por outro lado,
impulsividade; irresponsabilidade; falha em as-
sumir responsabilidade; muitos relacionamen- a psicoterapia não funciona porque não exis-
tos conjugais de curta duração; delinquência te demanda por parte do paciente. Em outras
juvenil; revogação de liberdade condicional e palavras, o psicopata é egossintônico (e não
versatilidade criminal. Existe uma pontuação egodistônico) em relação à sua perturbação, ou
de 0 a 2 para cada item, perfazendo um total seja, ele não sofre com seu transtorno. Não so-
de 40 pontos. Alguns itens avaliam traços afeti-
frendo, ele não sente necessidade de ser ajuda-
vos e interpessoais da pessoa enquanto outros
avaliam aspectos comportamentais de psicopa- do. Isso é um impeditivo para o funcionamento
tia. O ponto de corte não é rigidamente estabe- de uma psicoterapia.
lecido, podendo variar entre os diversos países, Diante de tudo isso, é legítimo perguntar:
mas 30 pontos revelariam um psicopata típico. qual o lugar do psicopata? Na prisão? Não pare-
A escala PCL-R já foi validada no Brasil ce justo com alguém que tem de fato um trans-
por Morana6 , e, segundo essa autora, as faixas torno mental. Na sociedade? Impraticável pela
de pontuação para a população forense estuda-
violência que ele provou ser capaz de realizar.
da no Brasil correspondem a: não criminoso (0
a 12); transtorno parcial na personalidade (12 a No hospital? Não faz sentido, por dois motivos
23) e transtorno global de personalidade (23 a básicos: a falta de tratamento já explicada e a
40). O transtorno parcial é uma condição ate- possibilidade de manipulação dos pacientes.
nuada do transtorno global, o que é importante É importante que as autoridades governa-
na avaliação da probabilidade de reincidência mentais considerem a possibilidade de se cons-
criminal, uma vez que o transtorno parcial fala
truir estabelecimentos específicos para essa
a favor de uma menor probabilidade de reinci-
dência do que o transtorno global. população, a exemplo de outros países mais
Apesar do auxílio da escala acima, a prá- avançados nesse sentido, para uma custódia
tica clínica do profissional forense é funda- mais apropriada.
mental. Isso porque o psicopata se revela muito
no próprio exame clínico. Ele vai repetir o seu *Elias Abdalla-Filho é psiquiatra clínico e forense
padrão utilizado lá fora, embora, sabendo es- pela Associação Brasileira de Psiquiatria; pós-doutor
tar sendo examinado, vai tentar dissimular o em Psiquiatria Forense pela Universidade de Londres;
que lhe for conveniente. Aliás, existe um debate psicanalista, membro da International Psychoanalytical
a nível internacional sobre o melhor método Association (IPA/London); membro titular e professor titular
diagnóstico, se baseado em entrevistas livres e
da Sociedade de Psicanálise de Brasília e membro associado
exame clínico ou se focado em testes padroni-
da Sociedade Brasileira de Psicanálise de SP; especialista
zados, como a escala em questão7. Entende-se
em Bioética e Doutor em Ciências da Saúde (Bioética) pela
aqui que o equilíbrio e a complementarieda-
Universidade de Brasília (UnB). Foi coordenador do Setor
de desses dois recursos seriam a escolha mais
sensata, já que não são excludentes, podem ser de Psiquiatria Forense da Polícia Civil do DF (IML), onde
realizados em momentos diferentes e só enri- trabalhou por 20 anos. Também coordenou o Departamento
quecem a investigação diagnóstica. de Ética e Psiquiatria Legal da Associação Brasileira
A atenção voltada aos psicopatas, assas- de Psiquiatria, onde atualmente é consultor. Trabalha
sinos seriais ou não, aumenta ao se conside- atualmente em Brasília como psiquiatra e psicanalista em
rar outro fator complicador, além da enorme sua clínica particular.
6. Morana HC, Arboleda-Flórez J, Portela Câmara F. Identifying the cutoff score for the PCL-R scale (psychopathy checklist-revised) in a Brazilian forensic population.
43 Forensic Sci Int 2005; 147(1):1-8.
7. Abdalla-Filho E. Transtornos da personalidade. In: Taborda JGV, Chalub M, Abdalla-Filho E. Psiquiatria Forense. Porto Alegre:Artmed Editora; 2004.
8. Morana HC, Stone MH, Abdalla-Filho E. Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers. Rev Bras Psiquiatr. 2006;28(Supl II):S62-8.
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

DESMISTIFICANDO OS
ASSASSINOS
SERIAIS
MOTIVAÇÃO EXCLUSIVAMENTE SEXUAL É UM DOS ENGANOS MAIS
COMUNS QUE SE COMETE AO ANALISAR OS SERIAL KILLERS

M
ATAR UMA PESSOA É UM DOS PIORES
CRIMES DA HUMANIDADE. É UM ATO QUE
SUBESTIMA O VALOR DA VIDA. DURANTE
MUITOS ANOS, POLICIAIS, INVESTIGADORES
E ESPECIALISTAS EM SAÚDE MENTAL VÊM
TENTANDO COMPREENDER OS ASSASSINOS
SERIAIS E SEUS ATOS CRIMINOSOS.
Desde a antiguidade, existem indícios da atuação de assassi-
nos seriais ao redor do mundo. Deste modo, e levando em conta os
dados atuais, sabe-se da natureza multicultural desse tipo de cri-
minoso, já que, de acordo com o FBI (2005), o assassinato serial está
presente em diversos países e pelo menos em cinco continentes. Na
Europa do século 19, o Dr. Richard von Krafft-Ebing realizou algu-
mas das primeiras pesquisas documentadas sobre violentos agres-
sores sexuais e seus crimes (FBI, 2005).
A definição mais recente de assassino serial foi elaborada por
um grupo de profissionais no Simpósio Multidisciplinar de Assassi-
nos Seriais que aconteceu na sede da Polícia Federal Norte-Ameri-
cana, em Santo Antonio, Texas, em 2005:
“É a morte ilegal de duas ou mais vítimas pelo(s) mesmo(s)
infrator(es), em eventos separados.”
A maior parte desses sujeitos preenche os critérios de psico-
patia, que se caracteriza por sujeitos desprovidos de consciência
moral, ética e humana e por uma deficiência significativa de em-
patia. Apresentam comportamento patológico, tendência à delinqu-
ência e grande capacidade de manipulação. É considerada como a
mais grave alteração da personalidade, uma vez que os indivíduos

44
REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

45
DESMISTIFICANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - MITOS

caracterizados por essa patologia são respon- já que suas vítimas tendem a ser pessoas da
sáveis pela maior parte dos crimes violentos, própria família, como marido e filhos, ou ou-
além de cometerem vários tipos de crimes com tras pessoas conhecidas, podendo também ser
uma frequência maior do que os não psicopa- do ambiente de trabalho. Elas tendem a usar
tas e, ainda, apresentam os maiores índices de veneno em seus crimes, e a imagem mais co-
reincidência (Ambiel, 2006). nhecida de que se tem conhecimento de as-
No entanto, não se deve confundir psico- sassinas seriais é aquela da mulher que mata
patia com Transtorno de Personalidade Antis- vários maridos por motivos financeiros.
social (TPAS) pois, de acordo com o Manual da Outro mito bastante conhecido do assas-
Escala Hare (2004), os psicopatas preenchem sino serial é que, uma vez começando a matar,
os critérios para Transtorno de Personalidade eles não são mais capazes de parar. Segundo
Antissocial, mas nem todos os indivíduos com o dados do FBI (2014), existem casos em que eles
TPAS preenchem critérios para psicopatia. param de matar antes de serem pegos pela po-
Este texto tem como objetivo abordar al- lícia. Nesses casos, geralmente são eventos ou
gumas características dos assassinos seriais e, circunstâncias da vida desses sujeitos que os
com isso, desmistificar alguns pontos a respei- inibem de continuar, o que pode incluir uma
to desse tema, assim como fazer uma discussão maior participação na vida familiar ou a subs-
sobre a política criminal brasileira. tituição de comportamentos patológicos.
O primeiro mito a ser abordado é que esse Existe ainda a crença popular de que eles
tipo de crime é essencialmente moderno, devi-
matam sozinhos. Segundo Hickey (2012), pelo
do às características específicas da sociedade
menos um em cada quatro assassinos seriais
atual. Uma sociedade em que as pessoas são
possuem um(a) ou mais parceiros(as), o que
consideradas estranhas umas às outras e que
a mídia transforma os assassinos seriais em “Ao contrário da crença popular, concluiu-se, com
celebridades (Haggerty, 2009). Como mencio- bases nos casos já estudados, que é muito comum que
nado anteriormente, há relatos históricos da eles tenham uma família e um emprego estável no
presença do assassino serial em todos os tipos momento em que cometem os crimes.”
de sociedades, desde as mais primitivas até as
mais modernas.
Fotodivulgação: Flickr-joiseyshowaa

Outro mito em pauta é a crença de que os


assassinos seriais são necessariamente pessoas
socialmente reclusas e desorganizadas. Ao con-
trário da crença popular, concluiu-se, com bases
nos casos já estudados, que é muito comum que
eles tenham uma família e um emprego estável
no momento em que cometem os crimes.
Outra crença comum é de que os assassi-
nos seriais são essencialmente homens bran-
cos. No entanto, o histórico mostra que eles
podem ser das mais diversas raças: brancos,
negros, hispânicos, orientais etc.; não haven-
do, portanto, uma raça específica determinante
para eles.
Ao contrário do que se pensa, os crimes
nem sempre são impulsionados por questões
de cunho sexual. Nesse caso, existem outras
formas de assassinatos em série, como, por
exemplo, aqueles cometidos por profissionais
da área de saúde (enfermeiros, médicos), que
matam pacientes em hospitais ou clínicas. Exis-
tem também assassinatos seriais cometidos por
mulheres, que frequentemente não possuem
um elemento sexual.
Dentro dessa questão está o mito de que
apenas homens são assassinos seriais. Existe
um número significativo de mulheres que ma-
tam e, de acordo com Vronsky (2007), elas ge-
ralmente entram nessa categoria citada acima,

46
DESMISTIFICANDO OS ASSASSINOS SERIAIS - MITOS

Fotodivulgação: Flickr-ajari
tende a dificultar o trabalho da polícia, já que pena caso apresente bom comportamento (con-
são dois ou mais retratos falados, duas ou mais dição esta que pode ser grande risco para a
digitais e ainda formas diferentes de compor- sociedade, já que é alto o índice de reincidência
tamento para se analisar. criminal).
De um modo geral, acredita-se que esse Tendo em vista todo o conhecimento cien-
tipo de criminoso possui uma inteligência aci- tífico na área de psicologia forense, neuropsi-
ma da média, no entanto, como no restante da cologia e psiquiatria a respeito dessa popula-
população, seu funcionamento intelectual pode ção, tem-se como modelo ideal julgá-los como
variar desde abaixo da média até superior à semi-imputáveis e encaminhá-los para prisões
média esperada para sua idade e escolaridade. especiais, sob os cuidados de profissionais es-
E, ao contrário do que se pensa, nem todos são pecializados para um possível trabalho de re-
mentalmente insanos. abilitação. Em condições ideais, eles poderiam
No que concerne a saúde mental dos as- trabalhar e serem acompanhados e avaliados
sassinos seriais e o que considerar no momen- para, após um período longo de reclusão, se
to da sua captura e punição, há uma grande analisar a possibilidade de retorno à convivên-
discussão nos meios jurídicos brasileiros e in- cia na sociedade. Nestes casos, há de se levar
ternacionais. Segundo Morana (2006), em geral, em consideração um monitoramento desses su-
o psicopata pode seguir dois caminhos na Jus- jeitos pela polícia, dentro das comunidades em
tiça brasileira. O juiz pode declará-lo imputável que voltarem a viver.
(tem plena consciência de seus atos e é punível Diante dessas colocações, percebe-se a
como o criminoso comum) ou semi-imputável necessidade de uma reforma na política cri-
(não consegue controlar seus atos, embora te- minal brasileira, objetivando uma melhora no
sistema carcerário e nos programas de reabili-
nha consciência deles). Nesse segundo caso, o
tação. Não dar atenção a esse tema coloca toda
juiz pode reduzir de um a dois terços sua pena
uma sociedade em risco; sociedade esta que é
ou enviá-lo para um hospital de custódia, se
construída com base em um modelo moral de
considerar que tem tratamento (por esse mo-
que para se viver em liberdade e poder convi-
tivo, muitos promotores brasileiros evitam a
ver com o outro, devem existir regras básicas
semi-imputabilidade). Os hospitais de custódia,
de comportamento e de convivência, modelo
em geral, abrigam criminosos diagnosticados
este que parede estar ausente ou minimizado
com doença mental tratável, o que não é o caso no assassino serial.
do psicopata, já que seu quadro é um trans-
torno da personalidade e é caracterizado por *Tatiana Bulgacov é doutoranda em Neuropsiquiatria
ausência de remorso e sentimento de culpa, o e Ciências do Comportamento pela UFPE e mestre em
que o leva a cometer crimes novamente. Como Psicologia da Infância e Adolescência pela UFPR. É
não há prisão especial para esse tipo de crimi- neuropsicóloga e Psicóloga Clínica com especialização em
noso no Brasil, ele é preso com os criminosos Terapia Cognitivo-Comportamental e Psicologia Jurídica.
comuns, ficando sob a condição de redução de E-mail: tatibulgacov@yahoo.com

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REVISTA DE PSICOLOGIA - ESPECIAL

ASSASSINOS
SERIAIS QUE
VIRARAM
PERSONAGENS DE
CINEMA
SERIAL KILLERS DESPERTAM MUITA CURIOSIDADE,
SEJA PELOS REQUINTES DE CRUELDADE
DE SEUS ASSASSINATOS, SEJA POR SUAS
HISTÓRIAS DE VIDA MUITAS VEZES TRADICIONAIS
OU MOTIVAÇÕES PESSOAIS COMUNS. ESSAS
CARACTERÍSTICAS INSPIRARAM O CINEMA A
CONTAR SUAS HISTÓRIAS AO MUNDO ATRAVÉS
DAS TELONAS. AQUI APRESENTAMOS ALGUNS
CASOS REAIS E FILMES QUE INSPIRARAM.

O CASO REAL: JACK, O ESTRIPADOR


INSPIROU O FILME: PRESENTE NO IMAGINÁRIO DA
POPULAÇÃO, TEVE UMA APARIÇÃO NO FILME ‘‘DO
INFERNO’’
O assassino nunca foi identificado, e seu nome foi sugerido por alguém
que se apresentou como o próprio assassino em carta entregue à Agência
Central de Notícias, em Londres. Atacou cinco mulheres na região de
Whitechapel, em Londres, Inglaterra, no ano de 1888. Todas elas eram
prostitutas, duas foram mutiladas e tiveram suas gargantas cortadas.
A remoção de órgãos de três vítimas sugeriu que o assassino tivesse
conhecimentos de anatomia. Sua fama é explicada pela ampla cobertura
que a mídia deu na época, tanto pela violência dos assassinatos, como
pela ineficácia da polícia em prender o criminoso.
No ano passado, estudos de DNA tentaram novamente apontar a
identidade de Jack, sendo então identificado como o imigrante polonês
Adam Kosminski, com 23 anos na época.

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ASSASSINOS SERIAIS QUE VIRARAM PERSONAGENS DE CINEMA

O CASO REAL: PETER KÜRTEN matou dois colegas afogados e, quando adolescente,
atacou animais sexualmente, assim como suas irmãs.
INSPIROU O FILME: ‘‘ M – O VAMPIRO DE
À época, houve o registro do assassinato de 11 pessoas
DÜSSELDORF“ na região de Düsseldorf, sendo a maioria crianças e
mulheres mortas por asfixia ou a facadas. Quando preso,
Um dos filmes alemães mais clássicos dentro da em 1930, confessou ter bebido sangue de uma de suas
categoria “horrores” se inspirou na história de Peter, vítimas, o que explica o título do filme. Foi executado
que, nascido na Alemanha em 1883, matava e mutilava em 1931 sob as acusações de roubo, assassinato, abuso
animais como cachorros e sapos. Com apenas nove anos sexual, tentativas de assassinatos e incêndios.

O CASO REAL: AILEEN CAROL PITTMAN,


CONHECIDA COMO AILEEN WUORNOS
INSPIROU O FILME: ‘‘ MONSTER - DESEJO
ASSASSINO“
O cinema não deixou de lado casos de assassinas seriais,
e Charlize Theron ganhou o Oscar ao interpretar Aileen.
Nascida em Rochester, nos Estados Unidos, em 1956,
Aileen foi abandonada pela mãe e, sendo criada pelos avós,
passou a sofrer abusos sexuais do avô. Ela cometia atos de
automutilação na infância, o que lhe conferiu um rosto todo
marcado. Aos catorze anos teve um filho com o irmão, com
quinze saiu de casa e se tornou prostituta.
Após períodos de muitas dificuldades financeiras,
vandalismo e violência, convenceu sua amante a se
vingar de todos os males que atribuía aos homens. Seu
primeiro assassinato teve sinais de autodefesa, por ter sido
espancada e estuprada por ele. Matou mais cinco homens,
quando, após denúncia, foi presa e diagnosticada com
transtorno de personalidade Borderline. Pediu ao tribunal
para ser condenada à morte e afirmou que voltaria a matar
se fosse solta. Foi condenada e assassinada em outubro
de 2002.

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ASSASSINOS SERIAIS QUE VIRARAM PERSONAGENS DE CINEMA

O CASO REAL: ALBERT HENRY DESALVO


INSPIROU O FILME: ‘‘ O HOMEM QUE ODIAVA
AS MULHERES“
Com ao menos 13 assassinatos em Boston, nos
Estados Unidos, durante a década de 1960, não se
sabe ao certo quantas pessoas estuprou e matou,
nem mesmo se era ele o então assassino em série.
Dentro do padrão dos crimes atribuídos a ele, havia o
abuso sexual e posterior estrangulamento de vítimas
mulheres com suas próprias roupas – por isso foi
chamado na época de “O estrangulador de Boston”.
Em nenhum dos casos houve sinal de arrombamento
das casas das vítimas, o que não foi explicado.
Algumas estimativas chegam ao número de 300
vítimas de estupro. Foi condenado à internação em
hospício, de onde fugiu. Foi levado então à prisão, onde
foi assassinado seis anos depois.

O CASO REAL: CHARLES STARKWEATHER


INSPIROU O FILME: ‘‘ TERRA DE NINGUÉM“,
‘‘ ASSASSINOS POR NATUREZA“ E ‘‘ FÚRIA
ASSASSINA“
Charles era um adolescente americano de 17 anos,
solitário e violento, quando se apaixonou por Caril Ann. Os
dois passaram a namorar e, meses depois, durante uma
discussão com a família de Ann, atirou na mãe, na irmã
dela e no padrasto. Todos morreram.
Durante três dias de fuga em direção ao México, Charles
matou mais sete pessoas com tiros de rifle e facadas. Os
dois foram capturados e presos, Charles foi condenado à
cadeira elétrica e morreu no ano seguinte. Caril Ann foi
condenada à prisão perpétua, podendo ser libertada após
20 anos. Passados 17 anos na prisão, ela foi libertada e
ainda está viva.

O CASO REAL: ALBERT FISH


INSPIROU O FILME: ‘‘ O SILÊNCIO DOS
INOCENTES“
Considerado um dos piores assassinos em série da
história, é um clássico exemplo de quem sofreu agressões
na infância e, durante a vida adulta, sentia prazer em
agredir e ingerir fezes e urina. Mesmo após várias relações
homossexuais, casou e teve filhos, quando passou a abusar
sexualmente de crianças, muitas com menos de dez anos
de idade, daí o nome do filme.
Já com idade avançada, manteve sua tendência à pedofilia.
O caso mais famoso foi o abuso e assassinato de Grace
Budd, de quem comeu a carne. Em 1936, morreu na
cadeira elétrica condenado por sequestro, abuso sexual e
assassinato.

50
FOTOINSPIRAÇÃO

NÓS PODERÍAMOS SER MUITO MELHORES SE NÃO


QUISÉSSEMOS SER TÃO BONS.

SIGMUND FREUD

Fotodivulgação: Flickr-drflint

51
BIBLIOGR AFIA
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