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Questão

O parágrafo único do art. 8º da Lei de Arbitragem diz que "caberá ao árbitro


decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência,
validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a
cláusula compromissória". Por sua vez, o art. 20, caput, da mesma lei determina que
"a parte que pretender argüir questões relativas à competência, suspeição ou
impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia
da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se
manifestar, após a instituição da arbitragem." Já o parágrafo segundo de tal
dispositivo indica que, "Não sendo acolhida a arguição, terá normal prosseguimento
a arbitragem, sem prejuízo de vir a ser examinada a decisão pelo órgão do Poder
Judiciário competente, quando da eventual propositura da demanda de que trata o
art. 33 desta Lei". Por outro lado, o proposta a demanda judicial, o CPC estabelece,
no inciso X de seu art. 337, que, proposta a demanda perante o juízo estatal, incumbe
ao réu arguir a existência de convenção de arbitragem, sendo vedado ao juiz
conhecer de ofício tal matéria e representando renúncia ao juízo arbitral a ausência
de tal arguição.

Considere a situação hipotética de que uma das partes de um contrato que


contém cláusula arbitral (a qual indica a instituição onde deve se ocorrer eventual
procedimento arbitral) proponha demanda judicial conta a outra parte contratante.
Esta outra parte, requerida na demanda judicial, argui a existência de convenção de
arbitragem. A autora da ação, em réplica, argumenta que a cláusula é inválida, tanto
porque o objeto da ação suplanta o objeto do contato, quanto porque sua redação é
patológica. O réu, não satisfeito com a decisão e considerando que a cláusula arbitral
continha todas as informações necessárias à instauração do procedimento arbitral,
dá início a ele na câmara referida na cláusula.

Diante desse quadro, responda: o árbitro do procedimento arbitral pode se


declarar competente? A quem compete decidir sobre a competência no caso? Ao juiz
ou a eventual árbitro quando instaurada a arbitragem? O que ocorrerá se a decisão
do árbitro for contrária à decisão do juiz? Como esse impasse poderá ser justificado?
Justifique a resposta com base em fonte doutrinária ou jurisprudencial, indicando
devidamente a referência.

A partir do cenário apresentado, nota-se que o árbitro do procedimento pode se


declarar competente. O art. 20 da Lei de Arbitragem prevê que a arguição de questões
relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro, bem como nulidade,
invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá ser feita na primeira
oportunidade que a parte interessada tiver, após a instituição da arbitragem.

Sendo assim, cria-se o princípio chamado “competência-competência”, que serve


para garantir que o árbitro seja o primeiro a aferir se detém jurisdição sobre a matéria a ser
decidida na arbitragem,assegurando ao mesmo a possibilidade de decidir se há jurisdição
arbitral para julgar a demanda, bem como dirimir se a convenção de arbitragem é existente,
válida e eficaz.

Com isso, no referido caso, não cabe ao Poder Judiciário interferir na decisão do
árbitro sobre sua própria jurisdição, sendo admissível a intervenção do Estado-juiz apenas
em momento posterior, conforme o artigo 485 do Código de Processo Civil. De acordo com
o mencionado artigo em seu inciso VII, o juiz não resolverá o mérito quando acolher a
alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer
sua competência. Com isso, o reconhecimento do juízo arbitral a propósito de sua
jurisdição, ou mesmo o acolhimento da alegação de existência de convenção de arbitragem
pelo juiz togado, ensejará a extinção do processo judicial sem resolução de mérito.

Esse entendimento é pacífico nas Cortes Superiores, sendo aceito pelo Supremo
Tribunal de Justiça. Ao julgar o REsp 1.614.070-SP, relatado pela ministra Nancy Andrighi, a
3ª Turma do STJ decidiu que o princípio competência-competência atribui "ao árbitro ou
tribunal arbitral,e somente a eles, a prerrogativa para decidir acerca de sua própria
competência", devendo ser respeitada "a precedência temporal da decisão arbitral e,
somente após, realizar o adequado controle pela via judicial", de modo a não tornar
"inoportuna ou indevida a interferência do Poder Judiciário".

Contudo, salienta-se que, caso se declare competente e o Poder Judiciário também


entenda da mesma maneira, haverá um conflito de competências entre o juiz e a Câmara
de Arbitragem. Nesse sentido, destaca-se que não há na legislação brasileira nenhuma
menção expressa ao julgamento de conflito de competência entre juiz e árbitro. Na Lei de
Arbitragem, por exemplo, o artigo 8 reconhece a possibilidade do árbitro decidir sobre a sua
própria competência, mas não aborda sobre o tratamento de decisões conflitantes entre o
juiz e o árbitro sobre esse tema.

Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça possui diversos precedentes conhecendo


de conflitos de competência entre árbitros e juízes. A jurisprudência consolidou que o STJ
tem a atribuição de julgar conflito de competência entre juízes e árbitros . Em um caso
recente,o juízo da 2ª Vara de Direito Empresarial do Rio de Janeiro/RJ e um tribunal arbitral,
ambos declararam-se competentes para decidir sobre um pedido cautelar de arrolamento
de bens, de maneira que o STJ processou e julgou conflito de competência.

Nessa disputa, o STJ decidiu que, como a arbitragem é uma atividade jurisdicional, a
competência e o processo arbitral poderiam colidir com a competência dos juízes estatais,
em tais hipóteses o Superior Tribunal de Justiça poderia ser provocado para decidir sobre
quem seria competente para decidir determinada matéria.

Com isso, pode-se concluir que o STJ parece rejeitar o conceito de que a decisão
sobre um conflito de competência entre duas entidades possa ser decido por uma delas e
apenas posteriormente revisada pela outra, surgindo a concepção de que esse tipo de
conflito deve ser decidido imediatamente por um órgão de cúpula do Poder Judiciário

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