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PORTUGUÊS INSTRUMENTAL – SEMANA 3 – AULAS 5 E 6

DESVIOS LINGUÍSTICOS

A começar pelo título, há neste um termo que se revela como o ápice, ponto-chave da essência discursiva
norteadora do presente artigo – “desvios”. Mas por que não vícios? Inegavelmente seria tamanha pretensão tachá-
los assim, tendo em vista que para a Linguística – ciência cujos progressos se mostram em plena ascensão - o
conceito de certo e/ou errado, carecem de verdadeiras reformulações. 

Por certo, tais reformulações partem do princípio de que a língua, ora concebida como um organismo vivo,
está em constantes transformações, reafirmando-se principalmente no tocante aos “diversos falares”, mais
precisamente às variações linguísticas. Não se trata aqui de privilegiarmos esta ou aquela camada social, mas sim
de enfatizarmos acerca da relação que o indivíduo estabelece com o meio que, por sinal, funciona como agente
influenciador. 

Desta feita, contextualizamo-nos diante do fato relacionado àquela pessoa cujo conhecimento restringe-se apenas
ao método intuitivo, à sabedoria popular, enfim àquele apreendido com base não em uma experiência coletiva, mas
individual. Atendo-nos ao âmbito social, esta pessoa estará fadada à exclusão? Indubitavelmente é um caso a se
pensar, assim como nos revela Marcos Bagno (2009 apud CRYSTAL 1987, p. 328): 
As línguas estão sempre num estado de fluidez. A mudança afeta o modo como às pessoas falam de forma tão
inevitável, quanto afeta qualquer outra área da vida humana!

Longe de aparentarmos contraditórios, mas o fato é que quando se trata da escrita, retomamos a ideia de que
somos condicionados a um conjunto de normas e regras previamente estabelecidas que, sobretudo, imperam
mediante nosso posicionamento enquanto “interlocutores sociais”. E por assim dizer, há ocorrências em que o
emissor se esbarra nesta padronização, ou por não ter o devido conhecimento dela ou por não assimilá-la de forma
plausível, mostrando-se suscetível a cometer os possíveis “desvios” linguísticos, indo de encontro aos postulados
gramaticais.

A título de nos tornarmos conhecedores destes, analisaremos alguns casos que o representam:

a) Cacografia

Atribui-se à forma indevida da qual o emissor se utiliza para grafar uma determinada palavra.

Ex: Mediante a acusação feita a ele, todos os advogados interviram. O enunciado, uma vez reformulado, resultaria
em:

Mediante a acusação feita a ele, todos os advogados intervieram.

b) Silabada 

Consiste no deslocamento do acento prosódico referente a um determinado vocábulo.

Ex: Em meio a este interim, foi inevitável que ela não se apaixonasse pelo rapaz. Retificando o termo em
evidência, teríamos: 

Em meio a este ínterim, foi inevitável que ela se apaixonasse pelo rapaz.

c) Estrangeirismos, galicismo, francesismo, anglicismo, italianismo e germanismo

Referem-se ao emprego de determinadas expressões pertencentes a outro idioma, incorporando-as ao próprio


cotidiano linguístico.
 
Exemplos: A maioria dos bares e restaurantes estão à espera de seus clientes para um happy hour descontraído. 

Final de tarde representa o termo que se adequaria ao contexto.


 
Este modelo démodé não pertence à nova coleção de inverno.

“démodé” representa “fora de moda”.


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Vejamos, pois alguns exemplos típicos dos referidos “empréstimos linguísticos:

* Galicismo – Trabalhar de domingo é não é uma boa opção.


 
O termo poderia ser substituído por “aos domingos”. 

* Italianismo – Alguns alunos terão de repetir de ano.

Em vez deste, seria aplicável outra expressão – repetir o ano.


 

d) Solecismo

Configuram como sendo quaisquer desvios cometidos contra as regras relacionadas à sintaxe, podendo ser assim
representados:

* de concordância – Fazem dias que não o vejo. (Faz dias que não o vejo)

* de regência – As crianças já não obedecem os mais velhos. (As crianças já não obedecem aos mais velhos)
 
* de colocação – Oferecerei-lhe todos os meus préstimos. (Oferecer-lhe-ei todos os meus préstimos)
 

e) Ambiguidade ou anfibologia 

Resulta na incoerência de sentido, implicando na duplicidade de interpretações.

Ex: A mãe pegou a criança chorando.


 
Mediante este contexto não conseguimos identificar se era a criança ou a mãe que chorava. De modo a desfazer tal
ocorrência, obteríamos:

A mãe pegou a criança que estava chorando. 

f) Cacofonia

Resulta na junção de sílabas diferentes, resultando em um péssimo efeito sonoro, podendo também se caracterizar
como escandaloso, obsceno.

Ex: Não vi ela durante toda a festa. (Não a vi durante toda a festa) 

g) Pleonasmo vicioso

Configura-se pelo uso desnecessário de alguns termos, partindo-se do princípio de que nada acrescentam à ideia,
pois esta já revela por si a própria noção de significância.

Ex: Garoto, desça já lá em baixo e me trague a encomenda.


 
Inferimos que a ação de descer já denota algo que se encontra em um plano inferior.
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Desvios linguísticos ocorrem por dois motivos: pela falta de conhecimento ou por
um mero descuido
Desvios linguísticos? Tal assunto o assusta? Se sim, não se preocupe, não estamos fazendo referência a
nada concebido como “anormal”, visto que vez ou outra somos acometidos por dúvidas, questionamentos, acerca
dos fatos que regem a língua de forma geral.
Em face dessa realidade, como não seria possível elencar todas as circunstâncias comunicativas que ilustram
essa situação, serão abordadas algumas delas, bastante corriqueiras, no intuito de ampliar seu conhecimento e,
sobretudo, ajudá-lo a evitar esses possíveis enganos. Nesse sentido, verifiquemos:

# Aquele é de menor, não deveria estar dirigindo. Se fosse de maior, a situação seria diferente.
Mediante tal enunciado, devemos compreender que não existe ninguém de menor e nem de maior. Ele é
maior ou menor de idade.
# Desejávamos muito comprar aquelas casas que estão à venda, mas elas são germinadas.
Saiba, portanto, que as casas não são germinadas, mas sim geminadas, visto que tal adjetivo (geminadas)
provém do substantivo “gêmeo”.
# Mais uma vez aquele aluno ficou de recuperação.
Aquele aluno, assim como todos os outros que passam por esta circunstância, não fica de recuperação, fica
para recuperação.
# Naquele momento em que você precisa de um retorno, uma resposta acerca de um dado assunto, você diz:
estou no aguardo de notícias.
Entenda que a forma mais conveniente de dizer tal enunciação é “estou aguardando notícias”.
# Os cadernos exigidos pela professora são espirais ou aspirais?
Saiba que em virtude de eles possuírem a forma comparada à rosca de um parafuso, eles são espirais.
# Normalmente ouvimos muito por aí, no sentido de retratar que alguém se parece com o pai ou a mãe: “fulano é
cuspido e escarrado”.
Compreenda que, nesse caso, dizemos que “O filho (a) saiu ao pai (ou a mãe), esculpido (a) e encarnado
(a)”.
# O paciente foi internado com apêndice estuporado.
Dizer “estuporado” significa dizer que algo se encontra parado, paralisado, em estado de estupor. Dessa
forma, o apêndice sempre se apresenta supurado, ou seja, convertido em pus, e não estuporado.
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10 desvios da norma culta da Língua Portuguesa sempre ocorrentes na expressão
popular

1 - "Mal cheiro", "mau-humorado". Mal opõe-se a bem e mau, a bom. Assim: mau cheiro (bom cheiro), mal-
humorado (bem-humorado). Igualmente: mau humor, mal-intencionado, mau jeito, mal-estar. 
2 - "Fazem" cinco anos. Fazer, quando exprime tempo, é impessoal: Faz cinco anos. / Fazia dois
séculos. / Fez 15 dias.
3 - "Houveram" muitos acidentes. Haver, como existir, também é invariável: Houve muitos acidentes. / Havia
muitas pessoas. / Deve haver muitos casos iguais.
4 - "Existe" muitas esperanças. Existir, bastar, faltar, restar e sobrar admitem normalmente o plural: Existem
muitas esperanças. / Bastariam dois dias. / Faltavam poucas peças. / Restaram alguns objetos. / Sobravam ideias.
5 - Para "mim" fazer. Mim não faz, porque não pode ser sujeito. Assim: Para eu fazer, para eu dizer, para eu
trazer.
6 - Entre "eu" e você. Depois de preposição, usa-se mim ou ti: Entre mim e você. / Entre eles e ti.
7 - "Há" dez anos "atrás". Há e atrás indicam passado na frase. Use apenas há dez anos ou dez anos atrás.
8 - "Entrar dentro". O certo: entrar em. Veja outras redundâncias: Sair fora ou para fora, elo de ligação,
monopólio exclusivo, já não há mais, ganhar grátis, viúva do falecido.
9 - "Venda à prazo". Não existe crase antes de palavra masculina, a menos que esteja subentendida a
palavra moda: Salto à (moda de) Luís XV. Nos demais casos: A salvo, a bordo, a pé, a esmo, a cavalo, a caráter.
10 - "Porque" você foi? Sempre que estiver clara ou implícita a palavra razão, use por que separado: Por
que (razão) você foi? / Não sei por que (razão) ele faltou. / Explique por que razão você se atrasou. Porque é usado
nas respostas: Ele se atrasou porque o trânsito estava congestionado.
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DESVIOS LINGUÍSTICOS
Em relação aos desvios gramaticais, vamos classificar alguns deles como bárbaros, denominados cacoépia,
silabada, cacografia, deslize, entre outros.

Coépia é a péssima pronúncia de uma palavra, isto é, sua forma errônea: “cadalço” no lugar de “cadarço”,
“carderneta” em vez de “caderneta”, “mortandela” no lugar de “mortadela”, “Antártida” em vez de “Antártica” e
“aspiral” no lugar de “espiral”. 

Silabada ocorre quando há troca de acentuação prosódica de uma palavra, ou seja, deslocamento da sílaba
tônica, como nos seguintes casos: “rúbrica” (rubrica), “récorde” (recorde) e “gratuíta” (gratuita).

Cacografia é a má grafia ou a má flexão de uma palavra. Exemplos: “aniz” (anis), “cidadões” (cidadãos) e


“maizena” (maisena).

Deslize é o mau emprego de uma palavra, ou melhor, quando se troca uma palavra por outra erroneamente,
comprometendo o sentido do contexto: o “mandado” do deputado acabou (mandato); a guerra está “eminente”
(“iminente”, ou seja, prestes a ocorrer).

Estrangeirismos também são classificados como barbarismos, pois quem abusa desses vocábulos utiliza
palavras que não existem em nosso idioma, como boate (boîte), coquetel (cocktail), checape (check-up) e xampu
(shampoo).

Cacofonia é o som desagradável oriundo da união das sílabas de palavras contíguas. Por isso muitas vezes
são usadas de propósito em certas piadas, trocadilhos e "pegadinhas": “Ele beijou a boca dela"; “Paguei cinco mil
reais por cada”; “Na vez passada, comi naquele restaurante”.

Eco vem a ser a própria rima que ocorre quando há na frase terminações iguais ou semelhantes, provocando
dissonância:"Falar em desenvolvimento é pensar em alimento, saúde e educação";  "O aluno
repetente mente alegremente"; “O presidente tinha dor de dente constantemente”.

Colisão ocorre quando usamos a mesma vogal ou consoante em várias palavras. A esse processo
denominamos aliteração (recurso estilístico usado com a intenção de se atingir efeito literário ou para atrair a
atenção do receptor). Entretanto, quando seus usos não são intencionais ou quando causam um efeito estilístico
ruim ao receptor da mensagem, a aliteração torna-se um vício de linguagem e recebe, nesse contexto, o nome
de colisão: “Eram comunidades camponesas com cultivos coletivos"; "Opapa Paulo VI pediu a paz".
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SENTENÇA
A sentença, também denominada “frase”, é um enunciado de sentido completo, a unidade mínima de
comunicação. (Cunha e Cintra, 2008, p.133). Sob esse prisma, pode ser composta de apenas uma palavra ou de
muitas palavras. Observe:

a) Parabéns!

Trata-se de uma sentença, que acompanhada pelo sinal de exclamação, reforça o seu caráter afetivo.

b) Que pena! Ele estudou tanto para o concurso, contudo não foi aprovado.

Nesse caso, a primeira sentença indica uma lamentação e a segunda, constituída de duas orações, explica o
porquê da lamentação.

A construção eficiente de sentenças é fundamental para que o ato comunicativo seja concretizado, sobretudo,
no âmbito da escrita formal. Serão elencados, a seguir, exemplos de sentenças que apresentam algumas
inadequações, no que concerne à norma culta da Língua Portuguesa. Examine-as:

a) Referência inapropriada ao sujeito:

Está na hora dos jogadores entrarem em campo.

O sujeito da sentença é “jogadores”, quem praticará a ação de entrar em campo. Portanto, a preposição
aglutinada que o precede precisa ser desmembrada para especificá-lo: (dos = de + os). Assim, tem-se: “Está na
hora de os jogadores entrarem em campo.”. A forma “dos” deveria ser empregada, caso “jogadores” funcionasse
como complemento:

Estes são os uniformes dos jogadores:

b) Sentenças desintegradas:

A revitalização da rua ainda não ocorreu. Apesar das reivindicações dos moradores.

Note que as sentenças se encontram desintegradas, em decorrência da pontuação inadequada, o que pode
dificultar a compreensão. Mais precisamente, o que se percebe é a ausência da vírgula entre as sentenças que
necessitam estar sintaticamente unidas:

A revitalização da rua ainda não ocorreu, apesar das reivindicações dos moradores.

Se houver a intenção de realçar o ato das reivindicações, pode-se optar pela inversão:

Apesar das reivindicações dos moradores, a revitalização da rua ainda não ocorreu.

c) Comparação indevida:

Aquele aluno tem o perfil diferente da turma.

É fundamental a utilização adequada dos termos que estabelecem a comparação entre elementos de uma
sentença. A omissão dos referidos termos ocasiona comparações indevidas, que podem comprometer a
compreensão do enunciado. No exemplo acima, equipara-se “perfil do aluno” com “turma”, de forma equivocada.
Portanto, têm-se:

Aquele aluno tem o perfil diferente do perfil da turma.

(Opção pela repetição de “perfil”.).

Aquele aluno tem o perfil diferente do da turma.

(Opção pela preposição “do”, retomando-se a “perfil”).


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d) Ambiguidade indesejada:

Reformaram a mesa do consultório em que realizo os atendimentos.

É imprescindível que a ambiguidade (duplo sentido) seja evitada, de maneira que dificuldades de
entendimento não sejam provocadas. Para tal, a referência a constituintes de uma sentença deve ser feita com
clareza. Perceba que “em que” pode se referir à “mesa” e ao “consultório”. Para se evitar a ambiguidade,
recomenda-se:

 Reformaram a mesa do consultório no qual realizo os atendimentos. (Retomada ao “consultório”)


 Reformaram a mesa do consultório na qual realizo os atendimentos. (Retomada à “mesa”)

Vale elucidar que a ambiguidade e as sentenças desintegradas são utilizadas de modo constante pela
Literatura. Nesse caso, são adequadamente elaboradas, com propósitos bem definidos, para gerarem efeitos de
sentido variados, provocando múltiplas interpretações. Cabe reiterar que, exceto no domínio literário, devem ser
evitadas em situações formais de uso da língua.

e) Paralelismo inadequado:

O filme tem três horas de duração e muita complicação.

O encadeamento de ideias, quando congruentes, necessita ser apresentado de modo sequencial. Note, na
sentença em questão, que os complementos oriundos do verbo “ter” possuem características sintáticas
diferenciadas. O número de horas do filme se equivaleu à avaliação feita em relação a ele. Nesse sentido, não
pode haver paralelismo entre ideias que não se complementam. Sugerem-se, então:

 O filme tem três horas e meia de duração e é muito complicado.


 O filme é muito longo e complicado.

Na primeira opção, foi colocado o verbo “é” para a adequada referência da característica (muito complicado)
ao sujeito (filme). Já na segunda, as informações sobre o filme foram transformadas em formas equivalentes
(adjetivos), que complementam o sentido do mesmo verbo: “é”. Em suma, é crucial a construção adequada de
sentenças, de modo que os objetivos comunicativos sejam alcançados.

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