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Ideias Cientificas:
Dos Gregos
ao Positivismo
difícil determinar com certeza, mas há indícios de que o homem tenha sur-
gido sobre a Terra há aproximadamente 40 mil anosi. E, com esse evento,
teve inicio o lento processo de constituição da linguagem e da cultura.
Sabemos também que, desde tempos imemoriais, o homem, por meio da
linguagem e do pensamento, desenvolve representações (na forma de
ideias, crenças e conceitos) sobre o ambiente e sobre si mesmo, sem o que
não seria possível desenvolver a chamada "cultura". Isso ocorre porque o
homem não foi dotado de mecanismos biológicos ordenadores, que permi-
tiram aos animais uma adaptação rápida e eficiente ao meio que os cercava.
Em vez disso, ele desenvolveu a capacidade de construir modelos mentais
sobre a realidade, a partir dos quais tornou possível a sua interação com
essa mesma realidade.
Esse processo de construção social da realidade (BERGER; LUCKMANN,
2002) foi adquirindo características modeladoras diferentes ao longo do tempo.
Assim, na chamada Antiguidade, o homem organizava suas referências em torno
dos mitos transmitidos pela tradição oral. A partir da Idade Média, no entanto,
essas referências passaram a tomar como base o conhecimento teológico, que,
469-399 a.C. S6crates Sua filosofia estava voltada não para a natureza, mas
para o homem e a sociedade. Acreditava na supremacia
da argumentação e do diálogo.
(continua)
18 METODOLOGIA DA CIÊNCIA
1225-1274 Sao Tomas de Admitiu ser possível chegar a certas verdades por meio
Aquino da razão e dos sentidos, além da iluminação divina. Para
ele, o homem é livre porque é racional — o que o
distingue de todos os outros seres.
1266-1308 Duns Scotus Postulava a ideia da tabula rasa, isto 6:a mente dos
recém-nascidos encontrava-se em branco, devendo ser
preenchida a partir dos sentidos — de onde vem todo o
conhecimento.
1561-1626 Francis Bacon Propôs a indução como principal motor para a produção
de novos conhecimentos. Elaborou uma teoria do erro
(os "ídolos" impediam o avanço da ciência).
1685-1753 George Berkeley Idealista radical, argumentou que não era possível pressu-
por a existência das coisas, apenas a das percepções. Para
ele, "ser é ser percebido".
EVOLUÇÃO DAS IDEIAS CIENTÍFICAS... 19
Contem poraneidade
(continua)
— 20 METODOLOGIA DA CIÊNCIA
Contem poraneidade
a de que nem toda quantidade podia ser expressa por números inteiros; e,
finalmente, na astronomia, chegou a desenvolver os primeiros estudos acerca
do movimento orbital dos planetas. De fato, com Pitágoras, o pensamento
racional alcançou uma dimensão que jamais havia atingido.
Seguindo nessa rota, encontramos nossos próximos três personagens — tal-
vez os filósofos gregos mais famosos de todos os tempos: Sócrates (cerca de
469-399 a.C.), Platão (cerca de 427-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.).
Devemos ao primeiro o desenvolvimento da fina arte da argumentação e do
diálogo e, acima de tudo, o reconhecimento da nossa ignorância como o pri-
meiro passo necessário para a obtenção do verdadeiro conhecimento. Seu
método — a ironia — consistia basicamente em uma busca pela verdade por
meio de um processo de perguntas e respostas que, em um primeiro momen-
to, levavam o interlocutor a admitir a própria ignorância (momento da "refuta-
ção") para, posteriormente, fazer com que ele buscasse dentro de si próprio os
conhecimentos que preexistiriam em sua alma (momento da "maiêutica").
Assim, para Sócrates, as ideias encontravam-se em um plano mais elevado que
a experiência, e, portanto, o pensamento podia ser considerado uma virtude
superior aos sentidos.
Seu discípulo, Platão, tendo sofrido forte influência do mestre, propunha
a existência de dois mundos: o mundo das ideias e o mundo das coisas sen-
síveis — constituído pela realidade percebida pelos órgãos dos sentidos: o
mundo em que vivemos, com todos os seus seres e objetos. 0 mundo das
ideias, por outro lado, era o mundo das verdades eternas, invisíveis e incor-
póreas, não obstante reais. Assim, por exemplo, os conceitos de beleza e
coragem seriam eternos e indestrutíveis — porque concernentes ao perfeito
mundo das ideias, do qual o nosso mundo sensível seria apenas uma mera
cópia imperfeita.
Aristóteles de Estagira, discípulo de Platão, completa nosso triunvirato.
Filósofo de obra extremamente vasta, Aristóteles foi responsável por uma das
pedras fundamentais da ciência moderna: a lógica. Por meio de uma de suas
principais obras, o Órganum (que, em grego, significa "instrumento"), entra-
mos em contato com a sistematização máxima da linha de pensamento que
estamos explorando, denominada racionalismo. Com Aristóteles, não apenas
vemos reforçada a ideia da primazia da razão sobre os sentidos, como também
temos acesso ao primeiro grande empreendimento histórico, levado a cabo por
um único indivíduo, que logrou assentar as bases da ciência do discurso — divi-
didas por ele em quatro elementos: a poética, a retórica, a dialética e a ana-
lítica (que hoje denominamos lógica). Em suma, Aristóteles não só apontou a
supremacia da razão, como também a dissecou e sistematizou.
22 METODOLOGIA DA CIÊNCIA
"nada existe, a não ser átomos e espaço vazio; todo o resto é opinião"
(DEMÓCRITO apud MARTINS, 2002). Criticando a noção anterior de que o uni-
verso seria composto pelos quatro elementos (terra, ar, fogo e água), Demócrito
inaugurou a doutrina do atomismo, defendendo a ideia de que o eterno movi-
mento entre os átomos e suas diferentes combinações explicariam a formação
dos diversos corpos do universo.
Após um período de quase dois séculos de relativo esquecimento, a teo-
ria atomista foi retomada por Epicuro (342-270 a.C.). Esse filósofo constitui um
grande marco para a nossa trilha, visto que considerava a sensação como a
maior fonte para a produção do conhecimento. Para Epicuro, as sensações ori-
ginadas pelas perturbações atômicas e obtidas pelo contato direto do homem
com os fenômenos do mundo eram a base para o conhecimento das coisas.
Embora o empirismo possa ter suas origens ainda incipientes tragadas desde
o inicio da história grega, inegavelmente foi apenas no século XVII que essa
doutrina adquiriu a importância devida. De fato, esse reconhecimento deveu-se,
em grande parte, ás ideias do pensador inglês Francis Bacon (1561-1626).
Embora não tenha sido propriamente um cientista, Bacon tragou as linhas
fundamentais da ciência moderna (JAPIASSO, 1995). Sua importância reside
em inúmeras contribuições, inclusive no que se refere à finalidade da própria
ciência, uma vez que, para ele, ela devia contribuir para a melhoria das con-
dições de vida do ser humano. De fato, Bacon considerava que o conheci-
mento em si não possuía nenhum valor, mas apenas os resultados práticos
que dele adviessem.
Mas vamos nos centrar em dois aspectos fundamentais das ideias de
Bacon: o desenvolvimento de sua teoria dos idolos e do método indutivo.
Em sua obra Novum organum ("Novo instrumento", em referência à obra
original de Aristóteles), Bacon expôs sua critica aos acadêmicos da época,
defendendo a ideia de que o principio de todo o conhecimento era a obser-
vação da natureza. E essa observação devia se encontrar livre de certos
preconceitos, os quais ele denominou idolos (do termo grego eidolon, que
significa simulacro, imagem, fantasma). Bacon enumerou quatro tipos prin-
cipais de ídolos:
Racionalismo Empirismo
Pitigoras, Platão, Demócrito, Epicuro,
Aristóteles, Descartes Bacon
Método Cientifico
Galileu, século XVII
Positivismo
Comte, século XIX
Thomas Hobbes, todos da mesma época. Nessa fase inicial da ciência, que
podemos designar como fase formativa, muitos autores importantes foram
omitidos, como Isaac Newton (1642-1727), George Berkeley (1685-1753) e
David Hume (1711-1776), apenas para citar alguns (ver Quadro 2.1). Em vista
disso, para uma visão mais completa, sugerimos ao leitor observar as indica-
ções bibliográficas complementares mencionadas ao final do capitulo.
Conceitos-Chave do C. pLulo
Racionalismo Empirismo Positivismo
GOTTSCHALL, C. A. M. Do mito ao pensamento cientifico: a busca da realidade, de Tales a Einstein. São Paulo:
Atheneu, 2003.
Obra rigorosa e completa, perfaz minuciosamente o percurso apresentado neste capitulo apenas de forma
muito resumida.A leitura não é das mais fluentes e a editoração do livro não ajuda muito, mas o desafio vale
para quem quer estudar esse tema em detalhes.
JAPIASSÚ, H. Francis Bacon: o profeta da ciência moderna. sac, Paulo: Letras e Letras, 1995.
Conta a história das ideias do filósofo Francis Bacon, precursor do pensamento cientifico moderno, de forma
acessível e agradável. Em sua segunda parte, junta textos selecionados das próprias obras do filósofo.