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Os trabalhos de Adam Przeworski são uma referência incontornável nos estudos de economia
política e política comparada e, do ponto de vista brasileiro, indissociáveis da história do Cebrap e da
Novos Estudos. Seja em seus estudos pioneiros sobre o socialismo eleitoral, sobre o papel (ou não)
das instituições no desenvolvimento econômico e nas transições democráticas, ou em seus trabalhos
mais recentes sobre a lógica da disputa democrática, a obra de Przeworski é marcada por duas
virtudes intelectuais preciosas, nem sempre encontradas em um mesmo intelectual: rigor analítico e
abertura intelectual.
Przeworski é, acima de tudo, um teórico da dignidade da política. Talvez não o teórico dos modelos
ideais de autogoverno, mas sobretudo do valor - raramente questionado pelos cidadãos e cidadãs de
carne e osso - de não sermos governados por “outros específicos” depois do próximo ciclo eleitoral.
O texto a seguir foi publicado pelo autor em sua conta pessoal do Twitter1 em janeiro deste ano.
Trata-se de uma síntese (“em 350 palavras”) daquilo que Przeworski entende como “o valor e a
essência da democracia” após mais de quatro décadas de contribuição intelectual e engajamento
pessoal na causa democrática.
Muitas pessoas valorizam a democracia porque esperam dela certos valores extrínsecos a ela, como
a liberdade e a igualdade política, ou que ela promova objetivos sociais ou econômicos valiosos.
Contudo, a democracia possui também um valor que lhe é intrínseco: ela permite, de tempos em
tempos, que uma coletividade decida quem a governará e, em alguma medida, como isso será feito.
Quais desses motivos fazem com que distintos indivíduos em sociedades diferentes valorizem a
democracia é uma questão sobre a qual ainda pouco sabemos.
A essência da democracia reside no fato de que ela processa, de forma pacífica e em relativa liberdade,
os mais diferentes conflitos que possam surgir em uma sociedade. Eleições são o principal
mecanismo com base no qual conflitos são conduzidos. Eleições produzem vencedores e perdedores
temporários de acordo com regras específicas. Eleições processam pacificamente conflitos caso
perdedores não considerem a sua derrota excessivamente danosa e caso acreditem que contarão com
chances razoáveis de vitória no futuro, o que significa, por sua vez, que vencedores não devem infligir
demasiado dano sobre os perdedores e que não devem impedir a possibilidade de serem eles
próprios removidos do governo por meio de eleições. Quanto maior forem os riscos em uma
determinada eleição, maior deve ser a probabilidade de que os derrotados de hoje se transformem
nos ganhadores de amanhã, o que significa, portanto, que em sociedades divididas eleições não
produzem transformações sociais duradouras.
A ameaça populista à democracia surge quando os apoiadores das forças incumbentes adotam, com
conhecimento de causa, medidas desenhadas com o propósito de erodir restrições institucionais
contra seu próprio poder ou entranham-se permanente no cargo até tornar-se praticamente
impossível removê-las por meios pacíficos. Os perigos da polarização aumentam quando os riscos de
uma eleição se tornam excessivamente elevadas, levando perdedores a não reconhecerem sua
derrota.
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Referências
Przeworski, Adam. Capítulo 1 de Democracy and the Market. Nova York: Cambridge University Press,
1991 [Edição brasileira: Democracia e Mercado no Leste Europeu e na América Latina. Rio de Janeiro:
Relume Dumará, 1994].
Przeworski, Adam; Stokes, Susan C.; Masin, Bernard (orgs.). Democracy, Accountability and
Representation. Nova York: Cambridge University Press, 1999.
Przeworski, Adam. “Democracy as an Equilibrium”. Public Choice 123, pp. 253-73, 2005.
Przeworski. Adam. Democracv and the Limits of Self Government. Nova York: Cambridge University
Press, 2010.
Przeworski, Adam; Rivero, Gonzalo; Xi, Tianyang. “Elections as a method of processing conflicts”.
European Journal of Political Economy 39, pp. 235-43, 2015.
Luo, Zhaotian; Przeworski, Adam. "Democracy and Its Vulnerabilities”. Quaterly Journal of Political
Science, no prelo.