Inatividade física
e comportamento
sedentário:
um caminho para o
suicídio indireto?
///////////////////////////////////////////
D
entre as várias preocu-
pações do Espírito en-
carnado encontra-se o
cuidado com o corpo. Isso é
natural, considerando sua po-
sição como templo do Espírito
(I Coríntios, 6:19). Nessa pers-
pectiva, muito se alerta, em
leituras e palestras espíritas.
acerca dos perigos do abuso
de álcool, fumo e sexo. A falta
de equilíbrio do homem ao in-
vestir em tais comportamentos
pode acarretar numa redução
do seu período de vida na Ter-
ra, mesmo sendo um amante
da vida, condição que pode ca-
racterizá-lo como um suicida –
única forma de desencarnação
que escapa às determinações
superiores da Vida Maior.4
Rafael Gauche
rafaelgauche@gmail.com
Um caso bastante conhecido
é o de André Luiz, que passou
mais de oito anos em esfera
umbralina antes de ser resga-
tado pelas mãos de Clarêncio.
Ao ser recebido em Nosso Lar,
foi tomado por uma curiosa
surpresa: a consciência de ter
cruzado os portais da desen-
carnação por meio do suicídio
indireto, justificado pelos des-
regramentos perpetrados na
área do sexo e dos excessos da
alimentação e bebidas alcóoli-
cas.12 Esse fato, entretanto, não
surpreende; o suicídio indireto
caracteriza quase todos os pro-
cessos de retorno dos encarna-
dos ao Mundo Espiritual.3
Dentro dessa perspectiva – a
do suicídio indireto, entendido
como um conjunto de atitudes
que levam a uma diminuição do
tempo previsto para a existência
física –, chamamos a atenção
para um tema que passa desper-
cebido pela maioria de nós: a
inatividade física e o comporta-
mento sedentário. A inatividade
física pode ser entendida como
a não realização de atividades
físicas ao longo do dia. Em ge-
ral, o conceito é associado com
a meta de 150 minutos/semana
de atividade aeróbia modera-
da (promove um aumento per-
ceptível na frequência cardíaca
– batimentos do coração a cada
minuto; uma caminhada rápida,
por exemplo) ou 75 minutos/
/semana de atividade vigorosa
(promove um grande aumento
Julho de 2016 | Reformador 49 431
 “
na frequência cardíaca, as-
sociado a uma respiração
acelerada), ou uma com-
binação das duas; essas
atividades devem se somar
à realização de treinamen-
to de força (musculação,
por exemplo) em dois ou
mais dias da semana, de-
vendo envolver os grandes
grupos musculares – reco-
mendações mínimas pa-
ra a promoção da saúde.15
Entretanto, o conceito de
atividade física é mais
abrangente, e pode ser entendi-
do como qualquer movimento
corporal que envolva contração
muscular e gasto de energia (ca-
minhada até a padaria, atividades
de jardinagem ou outras domés-
ticas, bem como as oferecidas por
academias ou realizadas indivi-
dualmente; é mais amplo que o
conceito de exercício físico, que
se configura como atividade fí-
sica planejada e estruturada).2 O
comportamento sedentário, algo
diferente, está especificamente
associado a hábitos sedentários,
como o tempo dispensado assis-
tindo à televisão, dirigindo, ou
até mesmo quando estamos sen-
tados. Mas, afinal, qual é a relação
da inatividade física e comporta-
mento sedentário com o suicídio
indireto? Para responder a esta
pergunta, selecionamos alguns
fatos de interesse.
De acordo com documen-
to publicado pela Organização
432 50 Reformador | Julho de 2016
Evitemos doenças,
cuidemos do
nosso corpo tão
bem quanto de
nossa alma
”
Mundial de Saúde, a inatividade
física aparece no 4º lugar entre os
cinco maiores fatores de risco de
morte em nível global16 – digno
de nota, os outros quatro fatores:
pressão alta, uso de tabaco, glice-
mia alta e sobrepeso, e obesidade
–, com exceção do uso de tabaco,
todos são alvo de melhoria com
a prática de atividades físicas.6 No
ano de 2008, por exemplo, a ina-
tividade física respondeu por 9 %
das mortes prematuras em todo
o mundo, o que representa cerca
de 5,3 milhões de um total de 57
milhões de óbitos.11 Isso se deve
ao fato de que indivíduos fisica-
mente inativos apresentam risco
de morte aumentado em compa-
ração aos ativos: 17 % a mais dos
que executam apenas 15 minutos
de atividade física por dia, por
exemplo. Além do mais, esti-
ma-se que a expectativa de vida
no Brasil poderia aumentar em
cerca de um ano com a elimina-
ção da inatividade física.11
Entretanto, esses dados
são fruto de uma análise
conservadora;11 evidências
de um estudo realizado
em 416.175 indivíduos do
Leste Asiático, acompa-
nhados por cerca de oito
anos, demonstraram que a
expectativa de vida dos que
atendem às recomendações
mínimas de exercício pode
chegar a ser 4,21 e 3,67 anos
maior em comparação aos
seus congêneres inativos
do sexo masculino e feminino,
respectivamente.14 Em média, o
número se aproxima da metade
do tempo que André Luiz expe-
rimentou no umbral!
O impacto do comporta-
mento sedentário no risco
de morte por todas as cau-
sas também foi alvo de estu-
dos científicos. Foi demonstra-
do que, entre indivíduos que
apresentam comportamento
sedentário equivalente acerca
de 12 horas/dia, é cinco vezes
maior em comparação aos que
permanecem por nove horas/
/dia nessa condição.10 Um es-
tudo recente, que contou com
a análise de dados referentes a
154.614 indivíduos, acompa-
nhados por 6,8 anos, mostrou
que aqueles que passam 12 ou
mais horas do dia sentados
apresentam risco 20 a 40 %
maior de mortalidade por to-
das as causas em comparação
aos que passam até cinco horas
do dia nessa posição.13 Em ou-
tro estudo publicado recente-
mente, realizado com o intuito
de verificar a associação entre
horas dispendidas em frente
à televisão e mortalidade em
165.087 indivíduos acompa-
nhados por 6,6 anos, foi de-
monstrado que, comparados
com indivíduos que assistiram
à televisão menos de três ho-
ras por dia, os que assistiram
mais de cinco horas, apre-
sentaram um risco de morte
28 % maior.8 Adicionalmente,
em estudo publicado no ano
passado, comprovou-se uma
elevação de 14 % no risco de
morte por todas as causas para
cada duas horas de acréscimo
no tempo dispendido com
a televisão.9
Em relação ao exposto,
cabe um questionamento: não
havendo chegado a hora da
morte, precisamos nos preo-
cupar com essas questões? Fe-
lizmente, a resposta pode ser
inferida tomando como base
o que disse Emmanuel em O
Consolador, na questão 153:5
quando fazemos nossa parte,
Deus oferece proteção e zelo
à nossa existência carnal. En-
tretanto, com relação aos cui-
dados com o corpo, estamos
fazendo nossa parte? A cons-
ciência de cada um poderá res-
ponder! Além disso, esses en-
sinamentos não são novos. A
importância dos cuidados com
o corpo foi anunciada desde
1864 por Georges, um Espírito
protetor, conforme consta no
capítulo XVII de O Evangelho
segundo o Espiritismo.7 Portan-
to, para que a experiência car-
nal da alma se encerre dentro
do previsto, em conformidade
com seu planejamento reen-
carnatório, a inclusão de hábi-
tos saudáveis que incorporem
a prática regular de atividades
físicas é essencial.
Nessa direção, ao lado das
evidências supracitadas – algo
alarmantes –, é importante
analisar como a modificação
de conduta perante a inativi-
dade física e o comportamen-
to sedentário podem diminuir
consideravelmente os riscos de
mortalidade e, por conseguin-
te, de desencarnações possi-
velmente precoces. Um estudo
recente13 demonstrou que indi-
víduos que realizavam de uma
a duas horas diárias de exercí-
cio físico apresentavam risco
de morte diminuído de 20 a
30 %; a realização de uma a
duas horas de atividade física
diária (não incluindo o exercí-
cio físico) foi associada a uma
redução de 30 a 60 % no mesmo
risco. Adicionalmente, foi esti-
mado um risco 42 e 32 % me-
nor de mortalidade com a subs-
tituição de uma hora de tempo
sentado por tempo equivalente
de exercício físico e atividade
física, respectivamente, nos in-
divíduos menos ativos.13 Outro
estudo recente, liderado por um
grupo de pesquisadores nor-
te-americanos, constatou um
risco de morte 31 % menor nos
indivíduos que atenderam às re-
comendações mínimas de exer-
cício, em relação aos inativos.1
E mais, um risco 20 % menor
foi observado para aqueles que
faziam alguma atividade física,
mesmo sem atingir o mínimo
recomendado – alguma coisa
é bem melhor que nada! Dessa
forma, tomando como base as
evidências supracitadas, enten-
demos, com certa segurança,
que o corpo de conhecimento
científico atual é suficiente para
associarmos inatividade física
e comportamento sedentário
com o suicido indireto. Esses
fatores somam-se aos já bem
estabelecidos e comentados
na Doutrina Espírita, como o
abuso de álcool e substâncias
entorpecentes, excessos de ali-
mentação, desregramentos se-
xuais e uso de tabaco (fumo),
dentre outros.
Somos capazes de mudar
para melhor, sempre. E nesse
ponto, o que fazer? A resposta
é simples: assistir menos te-
levisão; passar menos tempo
sentado; parar o carro a alguns
quarteirões do trabalho, pada-
ria, ou qualquer outro destino;
de preferência ir caminhando
ou de bicicleta; trocar escadas
Julho de 2016 | Reformador 51 433
 rolantes e elevadores por esca-
das comuns. Fazer exercícios
com regularidade, tanto os
aeróbios (caminhada, corrida,
natação, ciclismo) como os de
REFERÊNCIAS:
1
AREM H, MOORE SC, PATEL A, HARTGE
P, DE GONZALEZ AB, VISVANATHAN K,
et al. Leisure time physical activity
and mortality: a detailed pooled
analysis of the dose-response re-
lationship. JAMA Intern Med. 2015;
175(6):959-67.
2
CHODZKO-ZAJKO WJ, PROCTOR DN,
FIATARONE SINGH MA, MINSON CT,
NIGG CR, SALEM GJ, et al. American
College of Sports Medicine position
stand. Exercise and physical acti-
vity for older adults. Medicine and
Science in Sports and Exercise. 2009;
41(7):1510-30.
3
EMMANUEL (Espírito). Psicografado
por XAVIER, Francisco Cândido. Har-
monização. 3. ed. São Paulo: Geem,
2010. Problemas da morte.
____. ____. O consolador. 29. ed. 3.
4
imp. Brasília: FEB, 2016. q. 146.
5
____. ____. q. 153.
6
FIUZA-LUCES C, GARATACHEA N,
BERGER NA, AND LUCIA A. Exercise is
the real polypill. Physiology. 2013;
28:330-58.
7
KARDEC, Allan. O evangelho segundo
o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro.
131. ed. 6. imp. (Edição Histórica.) Bra-
sília: FEB, 2015. cap. 17.
8
KEADLE SK, AREM H, MOORE SC,
SAMPSON JN, AND MATTHEWS CE. Im-
pact of changes in television viewing
time and physical activity on longe-
vity: a prospective cohort study. Int
J Behav Nutr Phys Act. 2015; 12:156.
9
KEADLE SK, MOORE SC, SAMPSON JN,
XIAO Q, ALBANES D, AND MATTHEWS
CE. Causes of death associated with
prolonged TV viewing: NIH-AARP Diet
and Health Study. Am J Prev Med.
2015; 49(6):811-21.
434 52 Reformador | Julho de 2016
força (musculação). Evitemos
doenças, cuidemos do nos-
so corpo tão bem quanto de
nossa alma. Nas palavras de
Emmanuel:3
10
KOSTER A, CASEROTTI P, PATEL KV,
MATTHEWS CE, BERRIGAN D, VAN DO-
MELEN DR, et al. Association of seden-
tary time with mortality independent
of moderate to vigorous physical ac-
tivity. PLOS ONE. 2012; 7(6): e37696.
11
LEE I-M, SHIROMA EJ, LOBELO F,
PUSKA P, BLAIR SN, AND KATZMAR-
ZYK PT. Impact of physical inactivity
on the world’s major non-commu-
nicable diseases. Lancet. 2012;
380(9838):219–29.
12
LUIZ, André (Espírito). Nosso lar.
Psicografado por XAVIER, Francisco
Cândido. 64. ed. 4. imp. Brasília: FEB,
2015. cap. 4.
13
MATTHEWS CE, MOORE SC, SAMP-
SON J, BLAIR A, XIAO Q, KEADLE SK,
Aos Colaboradores
NOVAS INSTRUÇÕES PARA ENVIO DE ARTIGOS
I
nformamos aos nossos preza-
dos colaboradores que os arti-
gos destinados a Reformador,
digitados no programa Word,
fonte Times New Roman, tama-
nho de fonte 12, régua 15, justi-
ficado, deve conter, no máximo,
170 linhas já incluídas as refe-
rências bibliográficas, notas de
rodapé, espaço para tabelas ou
ilustrações, se houver, atenden-
do assim à decisão da Comissão
de Redatores, que interdita se-
jam publicados artigos em série.
Os artigos devem ser inédi-
tos, isto é, não divulgados em
outros periódicos ou por meio
Preservai o corpo, como
quem reconhece no santuário
da carne o mais alto tesouro
que o mundo é suscetível de
oferecer.3
et al. Mortality benefits for re-
placing sitting time with different
physical activities. Medicine and
Science in Sports and Exercise. 2015;
47(9):1833–40.
14
WEN CP, WAI JPM, TSAI MK, YANG
YC, CHENG TYD, LEE M-C, et al. Mini-
mum amount of physical activity for
reduced mortality and extended life
expectancy: a prospective cohort stu-
dy. Lancet. 2011; 378:1244-53.
15
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Glo-
bal recommendations on physical acti-
vity for health. Geneva: WHO, 2010.
16
____. Global health risks: morta-
lity and burden of disease attributa-
ble to selected major risks. Geneva:
WHO, 2009.
eletrônico, e encaminhados
pelo e-mail <redacao.reforma
dor@febnet.org.br>.
Nas citações, o articulista
deve mencionar as respectivas
fontes (autor, título da obra,
edição, local, editora, capítulo
e página) em nota de rodapé ou
em referência bibliográfica.
Outrossim, informamos-lhes
que só serão publicados os arti-
gos aprovados pela Comissão de
Redatores.
Agradecemos-lhes o apoio e
a compreensão, e que possamos
continuar unidos na tarefa de di-
vulgação da Doutrina Espírita.