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1. INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por objectivo avaliar a viabilidade da


implantação na cidade de Leiria de centros comerciais de
dimensão relevante, com particular destaque para os de influência
regional, bem como analisar os impactes potenciais de tais
equipamentos, nomeadamente, ao nível do aparelho comercial
“tradicional” da cidade, das práticas das compras e do
abastecimento da população. Face às recentes intenções de
investimento manifestadas por vários operadores, e a necessidade Objecto e objectivos do
do município poder responder com eficácia aos desafios que estes estudo
empreendimentos colocam à governança da cidade, espera-se
que o estudo constitua um instrumento de apoio às tomadas de Metodologia e fontes de
decisão relativamente ao licenciamento de futuras unidades informação
comerciais de dimensão relevante e, num quadro mais amplo, à
política estratégica da cidade em matéria de oferta comercial. Apresentação da
problemática
O estudo desenvolvido é composto por cinco partes distintas:

1. A introdução, onde se apresentam o objecto de análise e os Construção do modelo de


análise: dimensões
objectivos e se explicita a metodologia de trabalho, bem como indicadores e variáveis
o quadro teórico e o modelo analítico de referência.
Análise dos resultados: (i)
2. Análise das potencialidades e constrangimentos da cidade de potencial comercial da
Leiria, em matéria urbanística, da oferta de bens e serviços e do cidade e da região
perfil dos consumidores em relação à implantação de centros (ii) impactos prováveis da
implantação de centros
comerciais de influência regional.
comerciais regionais
3. Análise dos atributos dos centros comerciais de influência
regional e dos seus impactes potenciais: económicos, sociais e Recomendações de
urbanísticos. política

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4. As características dos centros comerciais na cidade de Leiria e


dos novos projectos que decorrem das actuais intenções de
investimento.

5. As Conclusões e recomendações de política, em matéria do


número de projectos, da dimensão e da localização dos
empreendimentos e de acções a desenvolver tendo em vista a
minimização das externalidades negativas que os mesmos
possam gerar no sistema comercial preexistente e no
desenvolvimento sustentável da cidade.

1.1. OBJECTIVOS DO ESTUDO

Os centros comerciais, particularmente os de grande dimensão,


capazes de alargar a sua influência a uma vasta região, são
fórmulas comerciais de grande sucesso em Portugal, afigurando-se
hoje como um dos elementos mais marcantes da paisagem das
nossas cidades. Analisar atentamente os impactes destes
empreendimentos nos domínios em que mais profunda e
directamente fazem sentir a sua influência, no sentido de, em cada
sector, minimizar as suas externalidades negativas e potenciar as
positivas, embora seja uma tarefa difícil, devido aos múltiplos
factores que estão em jogo, é de primordial importância para a
governança da cidade contemporânea, sobretudo quando esta se
pauta por preocupações com a sustentabilidade do seu
desenvolvimento.

A avaliação das repercussões da implantação destes


empreendimentos justifica-se tanto do ponto de vista económico,
como social ou urbanístico. Verdadeiros «espaços de síntese» da

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sociedade urbana pós-moderna (Cachinho, 20021), susceptíveis de


responder com eficiência aos desideratos de actores tão
heterogéneos como os promotores imobiliários, os retalhistas, os
operadores de serviços e os indivíduos-consumidores, a sua
influência faz-se sentir em múltiplos domínios. Em conjunto com
outras grandes superfícies comerciais, que frequentemente
albergam no seu interior como âncoras ou locomotivas, estes
posicionam-se entre as formas de comércio que mais alterações
têm produzido nos hábitos de consumo e de abastecimento das
famílias, bem como nas práticas de lazer e na ocupação dos
tempos livres da população urbana.

A análise da evolução dos centros comerciais em Portugal, permite


observar que se trata de um formato com uma grande
capacidade de adaptação, tanto aos interesses dos pequenos
proprietários, com espaços devolutos na cidade que procuram
rentabilizar, transformando os mesmos em pequenas galerias, das
quais são exemplo em Leiria as Galerias Lena, Eurosol e S. José ou os
centros comerciais Liz, S. Francisco e D. Dinis, como aos grandes
grupos do imobiliário e da construção civil, por vezes associadas às
grandes empresas da distribuição, segmento onde em Leiria,
apenas se enquadra presentemente o centro comercial
Continente, do Grupo SONAE, bem como os novos projectos que
solicitaram parecer junto da autarquia.

Ao nível do urbanismo, os centros comerciais se, por um lado, Impactos dos centros
podem ter efeitos nocivos sobre alguns sectores do pequeno comerciais

comércio tradicional e contribuir para o empobrecimento do


colorido e da ambience das ruas e avenidas das nossas cidades,
que importa a todo o custo contrariar, por outro lado, não se pode
esquecer que estes são talvez das poucas manifestações
permanentes da paisagem urbana com potencial suficiente para:

 trazer a cidade para os subúrbios, guarnecendo os bairros Fazer cidade nos


dormitórios com a função comercial e, por essa via, dotá-los da subúrbios
animação que as deslocações para o abastecimento e a ida
às compras proporcionam;

1 H. Cachinho (2002). O Comércio Retalhista Português: Pós-modernidade,


consumidores e espaço, GEPE, Lisboa.

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 criar no seio de novas urbanizações focos de centralidade, Criar pólos de vida social
onde à semelhança da praça das vilas e cidades de outros e focos de centralidade
nas novas urbanizações
tempos, a população se pode abastecer, distrair e conviver,
funcionando, nesta perspectiva, também como pólos de vida
social;

 quando implantados no centro da cidade ou em áreas em


manifesta em crise funcional, podem participar de forma Modernização e
decisiva na sua renovação e requalificação, desempenhando, requalificação do tecido
neste contexto, o papel de verdadeiras locomotivas de comercial

desenvolvimento;

 por último, alguns projectos pela sua qualidade arquitectónica,


pela oferta comercial que proporcionam e pelo espaço de
relação que conseguem criar em torno de si, introduzem na
cidade novos espaços de modernidade, tanto do ponto de
vista urbanístico como comercial.

Neste sentido, tendo em consideração os atributos desta forma de


Objecto e objectivos do
urbanismo comercial, bem como os desafios que a sua
estudo
implantação coloca à governança e desenvolvimento sustentável
das cidades, os objectivos que se pretendem alcançar com a
elaboração deste estudo são os seguintes:

 analisar a cidade em função dos seus atributos mais Características


significativos: urbanísticos, demográficos e sócio-económicos, urbanísticas da cidade
de Leiria
as políticas inerentes à gestão e o seu papel na região, para
avaliar as ameaças e as oportunidades que a implantação de
centros comerciais de influência regional representa para a sua
governança e desenvolvimento sustentável;

 caracterizar o tecido comercial da cidade de Leiria, em termos Caracterização do


tecido comercial da
de composição sectorial, standing, modernização e formatos cidade
de estabelecimentos, no sentido de avaliar as potencialidades
e os constrangimentos da oferta no contexto local e regional;

 traçar o perfil dos indivíduos-cidadão-consumidores da região,


em termos demográficos, sócio-económicos, valores, estilos de Perfil dos consumidores

vida, hábitos de consumo e práticas da compra e do


abastecimento, para aferir a sua apetência pela frequência

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dos centros comerciais e os impactos que esta poderá ter na


transferência de consumidores;

 analisar o papel dos centros comerciais na organização e vida Papel dos centros
comerciais na vida da
comercial da cidade de Leiria, bem como nas práticas do cidade e nas práticas de
abastecimento e das compras da população; consumo

 avaliar os impactos potenciais dos centros comerciais sobre o


aparelho comercial preexistente, em termos de formatos dos Avaliação dos impactos
dos centros comerciais
estabelecimentos, ramos de actividade e áreas comerciais, de influência regional
com especial destaque para o centro da cidade, de forma que
o licenciamento de novas unidades não ponha em causa o
equilíbrio do sistema, mas, também, não trave a sua
modernização, no contexto da progressiva afirmação de Leiria
como importante centro de comércio regional;

 avaliar a viabilidade de algumas localizações na cidade e na Avaliar localizações


sua periferia imediata para implantação de equipamentos mais favoráveis à
evolução comercial
comerciais de dimensão relevante, sobretudo de influência sustentável da cidade
regional, susceptíveis de potenciar o desenvolvimento
harmonioso do aparelho comercial da cidade e, se possível,
fortalecendo o protagonismo do centro histórico, manifesta-
mente em crise de alguns anos a esta parte;

 analisar as implicações da instalação de grandes empre- Analisar as implicações


nas acessibilidades e na
endimentos comerciais ao nível das acessibilidades e da circulação
circulação, em função de diferentes localizações (periferia,
centro da cidade, áreas pericentrais, …);

 Elaborar algumas sugestões de medidas e acções a


Medidas e acções para
desenvolver na cidade de forma a minimizar as externalidades
minimizar as externali-
negativas dos empreendimentos, em matéria do comércio e de dades negativas
urbanismo comercial, com especial destaque para o centro da
cidade, nos seus sectores mais vetustos, mais frágeis e com mais
dificuldades para conseguirem responder aos desafios da
sociedade pós-moderna.

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1.2. QUADRO TEÓRICO E MODELO ANALÍTICO

Nas últimas décadas tem-se difundido a ideia que os centros


Introdução
comerciais, em associação com outras formas de distribuição
(hipermercados, megastores, grandes superfícies especializadas,
lojas de desconto, …) estão a introduzir profundas mudanças na
organização e funcionamento da cidade, bem como a alterar
radicalmente a nossa concepção global de comprar e consumir.
Alguns analistas vão mesmo mais longe e sugerem que o declínio
comercial do centro das cidades e do pequeno comércio
tradicional, um sintoma comum à esmagadora maioria dos
aglomerados urbanos europeus nos últimos 40 anos, se fica a dever,
em muito, à difusão destas novas formas de comércio e de
urbanismo comercial.

Todavia, estabelecer uma relação directa entre a difusão dos Os problemas inerentes à
centros comerciais e as mudanças operadas no comércio e nas avaliação dos impactes

práticas urbanas levanta algumas questões de difícil resolução. Se


em alguns casos a avaliação do problema se tem processado de
forma objectiva e desapaixonada, recorrendo por vezes a técnicas
de medição complexas, noutros casos, porém, tal não acontece,
deixando transparecer claramente a influência dos valores sociais,
políticos e ideológicos dos seus analistas. Aliás, mesmo nos estudos
mais elaborados, seja porque os critérios usados na avaliação não
são os mais apropriados, seja porque as técnicas se revestem de
forte subjectividade, nem sempre se conseguem demonstrar
convincentemente a validade das afirmações proferidas (Davies,
19842; Guy, 19983). Divididos entre a razão e a emoção, face à

2 R. Davies (1984). Retail and Comercial Planning, Croom Helm.

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pressão das associações e confederações comerciais, ou do


simples peso dos votos dos pequenos retalhistas e operadores de
serviços, não é raro que a segunda prevaleça sobre a primeira.

Na realidade, a preocupação com as repercussões dos centros


comerciais no tecido comercial tradicional afectou e dirigiu de tal
modo o espírito dos analistas, que estes acabaram quase sempre
por realizar estudos muito parciais, desprezando campos tão
importantes como, por exemplo, os efeitos nos domínios do
emprego, em termos de volume e qualidade dos postos de
trabalho criados e destruídos, da satisfação da procura à escala
regional e local, ou até mesmo o seu papel potencial na
modernização do aparelho comercial, mais que não seja pelas
inovações que introduzem e pelos efeitos de demonstração sobre
os operadores menos dinâmicos e menos abertos à mudança e à
inovação.

Que os centros comerciais têm vastos e profundos impactes em A necessidade de


metodologias que
domínios muito diversificados não há a menor dúvida. No entanto, combinem técnicas de
a avaliação dos mesmos deve ser criteriosamente pensada, não se análise quantitativas e
qualitativas
compadecendo com meras afirmações produto da intuição ou de
cálculos superficiais e simplistas. Os argumentos usados na
avaliação dos prós e dos contra relativamente aos campos em que
fazem sentir a sua influência devem, por conseguinte, comportar
diferentes pontos de vista, metodologias e técnicas quantitativas e
qualitativas, para que a mesma possa ser rigorosa e contemplar as
dimensões mais sensíveis do problema. Depois, independentemente
da combinação de técnicas e pontos de vista que se utilizem, os
resultados e as conclusões a que os estudos chegam não devem
ser tidos como a verdade; isto é, ser lidos de uma forma mecânica
ou linear.

Os resultados da
Independentemente do cuidado e rigor que se imprima nos avaliação dos impactos
estudos, a arte da avaliação dos impactos está repleta de devem ser vistos como
meras indicações dos
dificuldades e requer numerosas suposições, cuja validade nem
efeitos prováveis – não
sempre se confirma, sobretudo na dimensão com que foram são mais do que
estimativas

3 C. M. Guy (1998). “Controlling new retail spaces: the impress of planning policies in
western Europe”, Urban Studies, vol. 35, n.º 5-6, pp. 953-979.

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estimad0s. Como refere Jeremy Williams (1991)4, especialista de um


dos mais conceituados centros de pesquisa de impactos no
comércio no Reino Unido, o OXIRM, o maior perigo que se corre
com a avaliação é as pessoas entenderem os números como algo
de exacto e infalíveis. Devemos por isso lembrar que os cálculos
que se realizam nestes estudos fornecem apenas uma indicação
dos efeitos prováveis que estes empreendimentos poderão ter. A
segurança de tais estimativas deve sempre ser questionada.

Em primeiro lugar, a relação entre as novas formas de distribuição, A importância do


com particular destaque para os centros comerciais, e o declínio contexto na avaliação
do centro da cidade necessita de comprovação. Países como os
EUA, o Canadá e a Austrália, que adoptaram uma política de
laissez-faire face à implantação de grandes complexos comerciais
na periferia das áreas urbanas, debatem-se hoje com graves
problemas para reanimarem o centro das cidades, começando a
aparecer publicações e movimentos com o intuito de travar a sua
expansão. Porém, em outros contextos sócio-culturais, como a
Inglaterra, a adopção de uma política extremamente restritiva,
nem por isso conseguiu impedir a descentralização da actividade
comercial para os subúrbios, que o declínio e a desertificação
assolassem o centro das cidades, e de alguns anos a esta parte, é
precisamente através dos novos formatos comerciais que muitos
urbanistas esperam resolver parte dos problemas associados ao
comércio, à falta de animação e à viabilidade económica das
áreas centrais. Na perspectiva destes pensadores, mais do que
agentes nocivos à cidade os centros comerciais podem ser vistos
como âncoras ou ímanes, capazes de atrair para as áreas centrais
novos investimentos, animação e vida. Afinal, feitas as contas, à
primeira vista parece que o problema pode não estar tanto nos
centros comerciais em si mesmos, mas antes na sua localização e
no mix comercial, que tanto pode ser complementar como
concorrente com o tecido comercial tradicional das áreas centrais.

Neste estudo, procuraremos identificar os possíveis impactes dos


centros comerciais de influência regional na cidade de Leiria. O
reduzido número de trabalhos neste domínio levados a cabo no

4 J. M. Williams (1991). “Meadowhall: its impact on Sheffield city centre and


Rotherham”, International Journal & Distribution Management, vol. 19, N.º 1, pp. 29-
37.

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espaço nacional, limita as nossas referências essencialmente a


exemplos estrangeiros, que nem sempre são de fácil transposição.
No entanto, o número significativo de unidades de média e grande
dimensão que povoa hoje as cidades portuguesas, o
conhecimento dos valores atribuídos ao consumo e a apetência
dos indivíduos-consumidores de Leiria por estes novos espaços
comerciais, bem como às formas de comércio tradicionais, que
tivemos oportunidade de desenvolver em Leiria em estudo anterior
(Cachinho: 20025), permite-nos posicionar o problema em estreita
relação com a cidade e as pessoas, compensando, em parte, as
lições que poderíamos colher de estudos empíricos em cidades
portuguesas.

Os centros comerciais, sobretudo os de média e grandes Controlo das externalida-


dimensões, capazes de estender a sua influência a uma vasta des negativas, melhorar a
eficiência do mercado,
região, são equipamentos complexos com características
promover a equidade
genéticas, fisionómicas, topológicas e funcionais distintas dos assegurada pela diversi-
centros de comércio convencionais. De um modo geral, melhor dade de oportunidades

preparados que estes últimos para responder às exigências de


consumo e aos estilos de vida da sociedade pós-moderna,
rapidamente conquistaram o agrado dos citadinos e fizeram
sucesso em Portugal, pelo que existe um número importante de
repercussões económicas, sociais e ambientais que devem ser
analisadas. No caso da cidade de Leiria, a natureza do tecido
comercial existente, em termos de mix de formatos, associada às
recentes intenções de investimento, tornam esta questão
particularmente relevante, pela necessidade de controlar as
externalidades negativas que possam ser originadas pelos novos
empreendimentos, e, naturalmente, possam pôr em causa o
desenvolvimento sustentável da cidade, que associe modernização
do tecido comercial, equidade social e territorial, qualidade de
vida dos indivíduos-cidadãos-consumidores e valorização e requali-
ficação do espaço público.

Tendo em atenção a “textura do espaço” de Leiria, avaliada do


Textura do espaço da
ponto de vista das características urbanísticas, das dinâmicas cidade de Leiria
comerciais, do perfil sócio-económico e dos estilos de vida da

5 H. Cachinho (2002). O Comércio retalhista Português. Pós-modernidade,


Consumidores e espaço, GEPE, Lisboa.

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população, e do modelo estratégico de gestão e governança


urbana, que paulatinamente vem construindo a cidade de Leiria
do futuro, e reconfigurando a sua posição na região, os impactes
económicos, sociais e ambientais que poderão advir da
implantação de empreendimentos desta natureza podem ser
avaliados em função de seis grandes questões, que formulamos do
seguinte modo:

 Localização: a expansão dos centros comerciais, em simultâneo Localização: periferia


com o declínio do pequeno comércio, tem preocupado todos versus centro da cidade
aqueles que directa ou indirectamente participam na
construção da cidade (organismos públicos, urbanistas,
cidadãos, …). A sua implantação, quer se faça na periferia ou
no centro, assume papel de relevo na configuração dos futuros
padrões espaciais do comércio e na organização da
actividade comercial (Bunce, 19836); Guy, 1998; Lowe, 20057);

 Capital de mudança: em muitos locais onde se construíram


Capital de mudança do
centros comerciais de grande envergadura, os empreendi-
sistema de lugares
mentos afectaram pela positiva algumas unidades comerciais centrais do ponto de vista
vizinhas e negativamente outras, modificaram por vezes o comercial

ambiente comercial das áreas mais próximas (Davies, 1984) e


até a própria orientação da expansão comercial da cidade
(Giggs, 19728; Metton, 19899). Neste caso, os centros comerciais
poderão inclusive alterar substancialmente a hierarquia dos
lugares centrais existentes, seja intra-urbanos, seja no contexto
regional (Lowe, 200010);

 Espaços de coabitação ou segregação? Quando devida-


mente planeados, os centros comerciais oferecem, quase Centros comerciais:
espaços de coabitação
sempre, uma gama equilibrada de tipos de lojas, onde ou de segregação entre
segmentos importantes da população podem encontrar cadeias de distribuição e
pequenos retalhistas?
6 V. Bunce (1983). “Revolution in the High Street? The emergence of the enclosed

shopping centre”, Geography, n.º 301, vol. 68, pp. 307-318.


7 M. Lowe (2005). “The regional centre in the inner city: a study of retail-led urban

regeneration”, Urban Studies, vol. 42, n.º 3, pp.449-470.


8 G. Giggs (1972). “Retail change and decentralization in the Nottingham
Metropolitan Community”, Geographia Polonica, n.º 24, pp. 173-188.
9 A. Metton (1989). «Centre-ville et périphérie. Complémentarité ou concurrence

commerciale ? ». Bulletin Association Géographes Français, n.º 4, pp. 265-276.


10 M. Lowe (2000). “Britain’s regional shopping centres: new urban forms?”, Urban
Studies, vol. 37, n.º 2, pp.261-274.

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praticamente todos os tipos de bens e serviços. Mais do que um


complemento às áreas comerciais tradicionais, estes afiguram-
se, por vezes, como focos organizadores da actividade
comercial das áreas envolventes. Deste modo, a sua estrutura
económica difere consideravelmente das áreas de comércio
convencionais. Neles coabitam, lado a lado, o pequeno
comerciante local com as cadeias de reputação, regional,
nacional e internacional. Desde que se salvaguardem princípios
de equidade e subsidiariedade tanto podem promover o
pequeno como o grande negócio. No entanto, vários estudos
têm demonstrado que, nos empreendimentos de dimensão
regional, os pequenos comerciantes tendem a não passar de
um mero “condimento” local (Alonso; Juste, 199111), ou ainda
que as unidades destruídas pelos seus impactos não
compensam as que são inseridas nestes empreendimentos
(Benninson; Davies, 198012);

 Âncoras de revitalização do centro da cidade: em muitos Centros comerciais:


âncoras da revitalização
países onde os centros comerciais alcançaram elevados níveis
económica e da
de sucesso, fazendo crer que a vida económica do centro da animação dos centros das
cidades
cidade poderia ter os dias contados, têm-se aproveitado as
inovações introduzidas por estas formas de urbanismo comercial
para reestruturar e revitalizar as áreas centrais (Guy, 1998; Lowe,
2000; 2005). A sua participação na alteração da estrutura
espacial e no arranjo do centro da cidade é por vezes notável,
manifestando-se tanto no encerramento de ruas ao tráfego e
sua pedonização, como pela abertura de inúmeras galerias e
centros comerciais, ou ainda nos movimentos de luta levados a
cabo pelos comerciantes mais inconformados;

 Desvalorização do espaço público: alienantes, confortáveis, Centros comerciais:


protegidos das intempéries e dos ruídos, voltados para dentro e artificialidade do
ambiente urbano;
apenas acessíveis nas horas de funcionamento, os centros
privatização do espaço
comerciais se, por um lado, têm contribuído para o público
aperfeiçoamento do acto de mercadejar, por outro lado, são

11 R. Alonso ; A. Juste (1991). « Centros comerciales: el ocio es el negocio »,


Distribución y Consumo, N.º 1, pp. 124-128.
12 Benninson, D.; Davies, R. L. (1980). “The impact of town centre shopping schemes in
Britain: their impact on traditional retail environments”, Progress in Planning, N.º 14 (1),
p. 40

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também símbolo da decadência e desvalorização da cidade


pública, que consagra as ruas, as praças e os jardins como
espaços privilegiados do desenrolar da vida urbana. A sua
difusão e crescimento poderão a longo prazo acarretar
múltiplas transformações na organização dos espaços-
actividade das cidades, na conduta dos indivíduos-cidadãos-
consumidores e na forma de viver (n)a cidade.

 Efeitos sociais, ao nível dos consumidores e dos comerciantes.


Impactos sociais ao nível
Os centros comerciais e outras modernas formas de distribuição, das práticas de consumo
trouxeram inquestionavelmente benefícios para os consumi-
dores, desde logo, pela ampliação da oferta de bens e serviços
e a crescente diferenciação de bens, formatos comerciais e
estilos de vida (Longley; Clarke, 199513; Guy, 1998). São muitos os
estudos que têm dado conta das mudanças dos padrões de
consumo, sobretudo ao nível das práticas do abastecimento,
decorrentes dos horários de funcionamento alargados e do
ambiente criado por estes empreendimentos. Alguns trabalhos
têm também demonstrado a falsa neutralidade dos novos
conceitos comerciais, apelando para os seus efeitos negativos
sobre os consumidores mais desfavorecidos (idosos, pessoas de
fraca mobilidade, ou de baixos rendimentos), residentes nas
áreas que sofreram o impacto directo dos novos formatos e que
não beneficiaram totalmente da modernização comercial.
Incluem-se neste grupo o centro da cidade, bairros residenciais
com tradição comercial e as áreas rurais, onde se assistiu a um
empobrecimento do tecido comercial, através do encerra-
mento e o desaparecimento de lojas afectas a alguns sectores
de actividade (Bromley; Tomas, 199314; Westlake, 199315;
Cachinho, Barata Salgueiro, 1994)16.

13 P. Longley; G. Clarke (Eds.) (1995). GIS for Business and Service Planning,
Cambridge, GeoInformation International.
14 R. Bromley; C. Thomas (1993). “The retail revolution, the careless shopper and dis-
advantage”, Transactions of the Institute of British Geographers, N.º 18, pp. 222-236.
15 T. Westlake (1993). “The disadvantaged consumer: problems and policies”, in R.
Bromley; C. Thomas (Eds.), Retail Change: Contemporary Issues, pp. 172-191.
16 H. Cachinho, T. Barata Salgueiro (1994). “Les transformations du commerce de
détail et ses manifestations dans la vie quotidienne : les specificités du cas

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Tendo presentes estes grandes domínios, onde os centros


comerciais, de acordo com vários estudos conduzidos
principalmente além fronteiras, mais fazem sentir a sua influência, o
modelo de análise que preconizamos para avaliação dos impactes
dos centros comerciais na cidade de Leiria materializa-se
graficamente na Figura 1.
Figura 1.1
Modelo de Análise

POTENCIALIDADES E CONSTRANGIMENTOS DO CENTROS COMERCIAIS


CONTEXTO URBANO
- textura do espaço -

ATRIBUTOS DOS CENTROS COMERCIAIS

 Dimensão dos projectos


CARACTERÍSTICAS DA OFERTA COMERCIAL
 Mix comercial
 Mix de funções  Padrões de localização
 Organização espacial  Valor simbólico
 Formatos de estabelecimentos  Qualidade arquitectónica
 Perfil dos comerciantes e
prestadores de serviços

IMPACTES POSITIVOS E NEGATIVOS

 No aparelho comercial tradicional


CARACTERÍSTICAS DA PROCURA
 No dinamismo do centro da cidade
 Poder de compra da população
 Na produção de espaço público
 Valores e estilos de vida
 Hábitos de consumo  Na gestão e governância urbana
 Padrões espaciais de compra e de  Na criação e destruição de emprego
abastecimento  Na circulação, trânsito

CARACTERÍSTICAS URBANÍSTICAS

 Cidade média
GESTÃO DO LICENCIAMENTO DE NOVOS
 Modelo de organização urbana
PROJECTOS
 Qualidade do espaço público
 Acessibilidades e facilidades de  Número de empreendimentos
circulação  Dimensão dos projectos
 Opções de política urbanística  Mix comercial
 Padrões de localização

portugais », in A. Metton (Eds.) Commerce et Lien Sociale, UGI-CNRS-MTG Rouen, pp.


231-244.

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Em linhas gerais, o modelo de análise que preconizamos para a


avaliação dos impactes dos centros comerciais coloca em relação
as potencialidades e os constrangimentos da “textura do espaço”
da cidade e região de Leiria com os atributos dos centros
comerciais, nomeadamente os de influência regional, domínio
onde se integram os três projectos que solicitaram parecer de
localização junto da Câmara Municipal de Leira: Fóum Leiria, W
Shopping e Liz Shopping.

Na avaliação das potencialidades e limitações da cidade e da


região de Leiria em relação à implantação de empreendimentos
desta envergadura é considerada relevante a apreciação das
seguintes dimensões:
As características
 as características urbanísticas da cidade. Inserem-se neste urbanísticas da cidade
campo, nomeadamente, a condição de cidade média, o
posicionamento estratégico de Leiria na região, o modelo de
desenvolvimento urbano, a qualidade do espaço público
construído, os espaços em crise/marginalidade que necessitam
de requalificação/reabilitação e ainda as políticas de gestão e
governança urbana;
O perfil da procura e o
potencial de consumo da
 o perfil da procura e o potencial de consumo da região. São região
atributos deste domínio as características demográficas e sócio-
económicas da população, o poder de compra das famílias, os
padrões de consumo, os valores e estilos de vida, ou a maior ou
menor apetência dos consumidores pela frequência dos
centros comerciais; Os atributos do tecido
comercial da cidade
 os atributos do tecido comercial da cidade, onde se integram,
por um lado, os formatos das lojas, o mix de funções centrais, o
standing e a organização espacial dos estabelecimentos, as
diferentes formas de venda e, por outro lado, o perfil dos
comerciantes, no que concerne ao empreendedorismo,
capacidade competitiva, inovação e reacção à mudança; As imagens e
representações dos
 as imagens e representações dos principais actores da cidade, actores da cidade e
da região
grupo no qual incluímos um conjunto de entidades, individuais e
colectivas, que através da sua participação empenhada na

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gestão e governança da cidade, na defesa dos interesses


profissionais, e em prol do desenvolvimento económico e social
da região e da qualidade de vida da população, geram e
difundem ideias, mobilizam recursos e constroem opiniões, que
de uma forma ou de outra acabam por influenciar o discurso
sobre a cidade e, naturalmente, as práticas na base das quais
se vai moldando a cidade.

Quanto aos atributos dos centros comerciais, não podemos olvidar


que estes tanto podem ser um factor de desenvolvimento urbano
como actuar no sentido inverso; situação que acontece se as suas
externalidades negativas colocarem em causa a coesão social, a
equidade, a competitividade dos diferentes sectores da cidade e,
naturalmente, a diversidade de formatos e formas de distribuição.
Neste contexto, em relação aos empreendimentos torna-se
relevante considerar:
A importância da
dimensão dos projectos
 a dimensão dos projectos, avaliada em área total de
construção, de área bruta locável e número de lojas. A
dimensão dos empreendimentos de um modo geral é um
indicador da sua área de influência e capacidade de
atracção;
O papel do mix funcional
 o mix funcional. Da sua diversidade e qualidade depende não
só competitividade do empreendimento mas também a maior
ou menor concorrência ou complementaridade em relação ao
centro da cidade ou outros sectores comerciais;
A localização dos
 a localização dos empreendimentos. A localização avaliada projectos: centro da
em função de um conjunto de indicadores, onde se incluem a cidade vs periferia
acessibilidade, a facilidade de circulação, o enquadramento
urbanístico e ambiental, é um factor determinante para o
sucesso do empreendimento e também dos potenciais
impactos que os centros comerciais poderão originar no tecido
comercial preexistente, bem como na maior ou menor
participação do mesmo na construção da cidade. Tanto
podem promovê-la como negá-la, caso se afirmem como
enclaves, espaços sem qualquer ligação com o seu entorno;

Estudo de Avaliação dos Impactos dos Centros Comerciais na Cidade de Leiria 19


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 qualidade arquitectónica, valor simbólico dos edifícios e


Valor simbólico e
relevância dos equipamentos para a cidade. Os centros qualidade arquitectónica
dos empreendimentos
comerciais regionais tendem hoje a ser flagships da cultura
urbana que paulatinamente se foi transferindo para o consumo.
É importante que estes se afirmem como uma imagem de
marca da cidade e, se possível, que façam parte da sua
identidade. A sua inserção na cidade tanto pode ir ao encontro
do seu modelo de desenvolvimento e imagem como,
contrariarem ou transfigurarem a mesma, com efeitos claros na
sua sustentabilidade.

A avaliação dos potenciais impactos da implantação na cidade


de centros comerciais de dimensão regional, combina assim as
limitações/constrangimentos do contexto urbano, entendido à
escala local e regional, com os atributos dos empreendimentos
considerados mais relevantes. A avaliação destes domínios,
mediada pelas as opções estratégicas de desenvolvimento, gestão
e governança, devem permitir chegar, de acordo com diferentes
cenários prospectivos, a uma matriz referencial de gestão do
licenciamento de novos projectos, em termos de número, dimensão
e localização, de forma a garantir a sustentabilidade do sistema
comercial da cidade. Naturalmente, esta apenas será possível pela
via da modernização da oferta e da vitalidade das diferentes áreas
comerciais, bem como através de opções estratégicas que
valorizem e promovam a eficiência do sistema comercial, a
equidade e a coabitação entre diferentes formatos de
estabelecimentos, formas de venda e tipo de comerciantes. A par
destas preocupações é também fundamental que se entenda o
sistema comercial como um “agente” activo na modernização e
embelezamento da cidade, com claros reflexos na melhoria da
qualidade de vida da população.

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1.3. METODOLOGIA DE TRABALHO E FONTES

A realização do estudo comportou duas fases distintas. Uma


primeira orientada para a identificação e conceptualização do
problema da avaliação dos impactes dos centros comerciais de Leituras e pesquisa
documental sobre estudos
dimensão regional, levantamento das principais questões-chave e e experiências
hipóteses a testar, bem como a fixação definitiva do modelo de semelhantes vivenciadas
em outros países
análise. Trata-se de uma fase de trabalho teórico e de pesquisa
documental de suporte à fundamentação das opções tomadas.
Por outras palavras; consiste essencialmente num trabalho de
concepção da bússola de orientação para os itinerários traçados
no campo da avaliação dos impactes dos empreendimentos.
Dado o número limitado de estudos realizados em Portugal sobre
esta temática, incluem-se nesta fase uma pesquisa documental
sobre estudos e experiências semelhantes, efectuados noutros
países.

Quanto à segunda fase, uma vez definida a problemática e o


caminho a percorrer procedeu-se à construção da base de dados
imprescindível à avaliação dos impactos dos projectos e de suporte
à decisão. Tendo em consideração a metodologia adoptada e os
objectivos fixados, desta fazem parte:

 A análise das memórias descritivas e outra documentação


relativa aos projectos que solicitaram parecer à Câmara Análise das memórias
descritivas dos projectos
Municipal de Leiria. Esta permitirá, posteriormente, construir o dos empreendimentos
perfil dos diferentes empreendimentos e avaliar o seu interesse
potencial para a cidade em função de um conjunto de critérios
considerados pertinentes para a análise;

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 O levantamento do aparelho comercial da cidade de Leiria e a


Levantamento do
análise do tecido comercial em matéria de composição por aparelho comercial da
ramos de actividade e dinamismo (natalidade e mortalidade cidade

de pontos de venda), qualidade da oferta, formatos de


estabelecimentos, dinâmicas espaciais. Esta análise permitir-nos-
á avaliar as dinâmicas comerciais na cidade, antes da abertura
na mesma de empreendimentos de dimensão regional; de
avaliar os ramos de actividade e as áreas da cidade em
declínio ou em crescimento; domínio que deve ser objecto de
monitorização em fase pós-inauguração dos empreendimentos.

 Entrevistas com a administração local e outros observadores Entrevistas com a


administração pública e
privilegiados da cidade ou da região: presidência e vereação outros actores da cidade
da câmara municipal, presidentes das juntas de freguesia do e da região

concelho de Leiria, vice-presidente da Associação Comercial e


Industrial de Leiria (ACILIS), presidente do Núcleo Empresarial da
Região de Leiria (NERLEI), Associação de Desenvolvimento de
Leiria (ADLEI), delegação da Defesa do Consumidor (DECO).
Além de permitirem auscultar a sensibilidade dos diferentes
actores em relação ao problema da localização na cidade de
centros comerciais de influência regional, estas devem permitir
também avaliar a pertinência dos mesmos para a cidade;

Inquéritos à população
 Inquéritos à população sobre os hábitos de consumo, as
sobre os hábitos de
práticas da compra e do abastecimento e a sua relação com consumo e as práticas
os centros comerciais. Enquanto lugar de compras e de da compra e do
abastecimento
abastecimento, importa consultar os indivíduos-consumidores
sobre as suas práticas de consumo, os lugares que elegem para
se abastecer, como o fazem e que apetência têm pelos
centros comerciais. Da sua maior ou menor adesão a estes
empreendimentos dependerá, naturalmente, os impactos
destes últimos;

 Inquérito de opinião aos comerciantes para avaliar as


Inquérito de opinião aos
representações dos mesmos em relação à possível localização comerciantes da cidade
na cidade de empreendimentos comerciais de influência de Leiria

regional. Em princípio é suposto que os comerciantes da cidade


repartam o seu comportamento por três situações distintas: i) os
que verão a inauguração de empreendimentos comerciais de

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grande dimensão na cidade como uma ameaça directa ao


seu negócio; ii) os que perspectivam os mesmos como uma
oportunidade para expansão dos seus negócios e, iii) os que se
mostrarão indiferentes, sobretudo porque exploram ramos de
actividade diferentes destes empreendimentos. Importa avaliar
o peso das diferentes opiniões e os argumentos que alimentam
as suas preocupações. Estes poderão ser de grande utilidade
na definição de medidas e acções a desenvolver na
minimização das externalidades negativas;

 Grelhas de observação directa, selectivamente orientadas para


Grelhas de observação
a avaliação das potencialidades e constrangimentos dos directa
diferentes lugares da cidade em relação à implantação de
empreendimentos com grande impacto na região, bem como
no que respeita às oportunidades e ameaças da inserção dos
mesmos no modelo de desenvolvimento da cidade. Trata-se
não só de questionar os lugares previstos para a implantação
dos empreendimentos em relação aos seus atributos físicos, mas
também olhar mais além, ler os mesmos à luz das relações que
mantêm com a cidade e as mudanças que poderão surgir com
o tempo.

A segunda fase do trabalho é sobretudo empírica. Nesta se


procede, essencialmente, à determinação do número de
empreendimentos que a cidade pode suportar e à análise dos seus
impactos, tendo como suporte a informação recolhida através dos
diferentes instrumentos de observação (grelhas de descrição,
entrevistas, inquéritos à população …).

Na avaliação das potencialidades e constrangimentos da cidade Modelos matemáticos na


estimativa dos impactos
de Leiria em relação à implantação de empreendimentos
que combinam técnicas
comerciais de influência regional, bem como dos impactos que os de análise qualitativa e
referidos empreendimentos poderão ter no tecido comercial qualitativa

preexistente, no dinamismo do sistema de lugares centrais intra-


urbanos, nas práticas de compra e de abastecimento e, por essa
via, na promoção do desenvolvimento sustentável da cidade,
foram utilizados diferentes modelos, de uso frequente nos estudos

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de geomarketing. Ainda que o comportamento dos indivíduos-


consumidores seja, por natureza, imprevisível, acreditamos mesmo
assim que é possível encontrar padrões na sua conduta. É nesta
linha de pensamento que se inscreve, neste estudo, o cálculo de
um conjunto de índices que nos vão, em primeiro lugar, ajudar a
determinar a viabilidade económica na região de empreendi-
mentos desta natureza e, em segundo lugar, estimar a
concorrência que os empreendimentos vão estabelecer com a
oferta preexiste, bem como com os diferentes centros de comércio
e serviços.

Por último, na selecção do(s) empreendimento(s) mais vantajosos Análise multicritério, com
para a cidade recorremos à análise multicritério, por ser aquela que ponderação dos pesos
das variáveis
nos permite lidar com um leque diversificado de variáveis consideradas relevantes
consideradas relevantes na abordagem de problemas desta para a abordagem do
problema
natureza. Os resultados obtidos devem, no entanto, ser lidos com
alguma relatividade, isto é, devem ser vistos não tanto como aquilo
que vai ocorrer com a implantação na cidade de centros
comerciais regionais, mas antes como aquilo que provavelmente
poderia vir a acontecer, caso não sejam tomadas medidas ou
delineadas acções no sentido de contrariar tais tendências. É
precisamente para eliminar, ou pelo menos minimizar, as
externalidades negativas que poderão ser causadas pela
implantação dos novos projectos que se encerra o estudo com um
conjunto de recomendações que podem melhorar o
funcionamento do sistema comercial da cidade e, naturalmente,
contribuir para a sustentabilidade do seu desenvolvimento.

Do ponto de vista metodológico, este estudo comporta um


conjunto de opções que importa considerar e explicar, porque os
resultados alcançados são, em larga medida, um produto das
mesmas. Entre estas merecem particular atenção as seguintes:

 Geomarketing: a nossa opção por esta técnica resulta de várias


razões. Em primeiro lugar, porque nas mais diversas disciplinas
O Geomarketing como
científicas este tem emergido como uma ferramenta de grande ferramenta privilegiada
importância. Não em vão, pois a viabilidade económica de um na análise dos impac-
negócio depende do conhecimento que os gestores tenham tos dos centros comer-
ciais e dos estudos do
do espaço e de todos os factores que interactuam com o comércio em geral

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mesmo. Estes devem ter um conhecimento dos seus clientes


quanto mais exaustivo melhor, tal como devem conhecer a sua
capacidade de atrair clientes ou onde estão seus principais
concorrentes e de que modo estes podem afectar os seus
negócios. Mas não basta conhecer estas variáveis. É necessário
também quantificar a sua influência dentro de uma escala de
intervalos de razão para podermos avaliar o peso das mesmas,
tanto particularmente como numa visão de conjunto. Só esta
avaliação nos pode dar uma ideia da viabilidade dos negócios
em questão.

Entre as principais aplicações do Geomarketing encontram-se


Geomarketing e análises
precisamente os estudos sobre a viabilidade de grandes empre- multivaridas: multi-critério
endimentos comerciais e os seus impactos na cidade, bem e multi-objectivo
como a determinação das localizações mais apropriadas em
função de objectivos preestabelecidos. Para isso iremos gerar os
necessários modelos de apoio à simulação da procura,
utilizando diferentes técnicas e modelos, nomeadamente de
multi-critério e multi-objectivo.

 Sistemas de Informação Geográfica (SIG). Esta tecnologia Os Sistemas de


estabelece de forma exemplar o elo de ligação da informática Informação Geográfica
(SIG) enquanto
com a geografia. Trata-se de uma ferramenta imprescindível no
ferramenta de apoio à
desenvolvimento das diferentes operações geográficas que nos avaliação dos impactos
dos centros comerciais
vão apoiar na construção das respostas aos problemas
anteriormente enunciados. No essencial, os SIG permitem-nos
armazenar, gerir, manipular, transformar e analisar o espaço e
todos os elementos que nele confluem e, no caso do presente
estudo, avaliar com maior rigor e objectividade os potenciais
impactes decorrentes da implantação na cidade de centros
comerciais regionais.

A capacidade do sistema para manter e criar diferentes níveis


temáticos de informação (layers) e a possibilidade de operar
com eles ou de cruzar a informação sobre eles, de realizar
diferentes operações com estes dados, obter diferentes
cartografias a partir de dados iniciais ou a possibilidade de gerir
as Bases de Dados temáticas e espaciais, ajudam-nos na tarefa
de responder às questões essenciais que nos foram colocadas

Estudo de Avaliação dos Impactos dos Centros Comerciais na Cidade de Leiria 25


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pela autarquia de Leiria, tais como, se é viável a instalação de


novos centros comerciais na cidade e se sim qual a localização
ideal para os mesmos. Ojeda (200217) reconhece que neste
campo o principal problema com que nos teremos de
confrontar prende-se com os dados e a disponibilidade dos
mesmos e, de facto, o caso de Leiria não constitui excepção. A
informação disponível é escassa, os dados encontram-se
dispersos e em diferentes formatos, obrigando a operações de
reconversão e compatibilização nem sempre fáceis, mas sem
as quais a informação pouco nos interessa, já que dificilmente
poderá ser usada de forma adequada.

 Determinação da área de influência dos empreendimentos. O Determinação da área de


número de centros comerciais que poderão ser implantados na influência dos centros
comerciais
cidade depende directamente da sua área de influência.
Avaliada através dos quantitativos de população que
conseguem captar, esta permite-nos estimar a cifra de
potenciais clientes que gozam de boa acessibilidade e
identificar as áreas na cidade/região tidas como marginais.
Para avaliar os potenciais clientes tomaremos como referência
a população incluída nos círculos de atracção delimitados para
o efeito.

 Teoria de avaliação multi-critério. Na determinação do número Teoria da avaliação multi-


de empreendimentos que o concelho de Leiria pode suportar e critério
na selecção das localizações ideais para a sua implantação
recorremos à Teoria da avaliação multi-critério. Esta baseia-se
na selecção e ponderação de um conjunto de critérios, que
devem constituir uma evidência sobre a qual se baseará a
decisão. Cada critério pode ser entendido como um ponto de
referência para a decisão. A forma como os critérios podem ser
medidos é um aspecto de crucial importância, pois desta
dependerá, em grande medida, o resultado da avaliação.
Existem processos distintos para atribuir os pesos aos valores dos
critérios. Um dos mais utilizados e por nós aplicado é através de

17 J. Ojeda (2002). Iniciación al Geomarketing, Valladolid

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uma matriz de dupla entrada, processo que explicaremos mais


adiante.

Os critérios podem assumir a forma de potencialidades ou


constrangimentos. Tratam-se de critérios que, respectivamente,
realçam ou restringem as capacidades de aceitação de uma
alternativa específica para a actividade que se está a
seleccionar.

Na teoria da avaliação multi-critério outro aspecto fundamental


Análise multi-critério:
consiste na regra de decisão, que pode ser muito simples regra de decisão
quando somente se pretende aplicar um princípio com base
num critério simples, ou pode ser bastante complexa,
dependendo dos critérios que vamos utilizar. A regra de decisão
é o procedimento a partir do qual se obtém uma determinada
avaliação, permitindo assim avaliar diferentes soluções. A regra
de decisão estrutura-se a partir de uma série de procedimentos
aritmético-estatísticos que permitem comparar as diferentes
alternativas.

A regra de decisão permite realizar dois tipos de procedimentos:


(i) a função de selecção simples e (ii) a selecção heurística. No
primeiro caso a regra de selecção oferece um meio
matemático para comparar as diferentes alternativas, pelo que
é um requisito que estas sejam todas mensuráveis. No segundo
caso, a função heurística especifica um procedimento a seguir
para alcançar a solução. Nesta situação não é necessário
avaliar. Trata-se de procedimento muito simples devido à sua
simplicidade.

O passo final consiste na avaliação. A regra de decisão é Análise multi-critério:


objectivos
alimentada pelos critérios, mas a sua estrutura é criada a partir dos
objectivos. Tanto uns como os outros devem ser definidos pelo
centro decisor. Neste caso, estes resultaram da auscultação das
edilidades locais (vereadores e outros actores privilegiados da
região, …) por parte da equipa, respeitando, naturalmente, os
princípios, já expostos anteriormente, relacionados com as funções
que estes empreendimentos devem desempenhar na cidade e o
modelo de desenvolvimento e gestão urbana garante da

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sustentabilidade da cidade. Os resultados finais serão dados por


regras quantitativas e modelos territoriais.

Por último, importa ainda referir que os objectivos devem ser


estabelecidos a partir de um objectivo geral, que tenha em vista a
avaliação dos critérios com que se construirá a regra de decisão,
que inclui os procedimentos para levar a cabo a avaliação multi-
critério. O conjunto destes procedimentos baseia-se em funções
aritméticas. Neste estudo aplicaremos dois modelos de localização:
o EMUPRO PC; e o Modelo Estatístico.

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