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INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO DE CIÊNCIAS E

TECNOLOGIA CURSO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS 

A Criminalização Terciária

4º Ano
Turma: 1M
Período: Manhã
  

Luanda – 2022
Grupo nº 5 

Integrantes: 
 Bernarda Chapua
 Carla Mateta
 Duyane Canhanga
 Fátima Francisco

 Emanuel Cazequene

Trabalho da cadeira de Sistemas de


Controlo Social como requisito para
obtenção de nota da segunda frequência,
ministrada pelo Prof. Carlos da
Conceição.
Luanda – 2022
DEDICATÓRIA
Dedicamos esse trabalho aos nossos pais, nossos maiores incentivadores, pela educação que
nos deram, pela disciplina que nos ensinaram, pela dedicação nos cuidados, e por serem
verdadeiros pilares de esperança, sabedoria, respeito a Deus e amor em nossas vidas.
RESUMO
O presente trabalho ocupa-se do estudo da teoria criminológica da criminalização terciária
visando, ao final, a esclarecer esse processo e verificar a assertividade das lições emanadas da
mencionada teorização no tocante à aplicação e a execução das medidas de segurança e
socioeducativas. O caminho criminológico percorrido inicia-se com a conceptualização do
processo de criminalização e criminalização terciária chegando até rotulação social, sucessora
do controlo social. No que se refere à criminalização terciária, é um processo que leva à
formação de uma subcultura, separando aqueles que já foram atingidos pelo sistema penal,
formando grupos isolados ou verdadeiras gangues, sendo esses indicadores de reincidência.
Apresentados todos os paradigmas que direcionaram seu entendimento, atendo-se ao estudo
do sistema penitenciário e suas finalidades, destacando-se o processo de prisionalização. A
junção dos conhecimentos ocorre com o estudo dos efeitos do etiquetamento ou estigmas nas
prisões e sua ligação com a possibilitação de uma carreira criminosa.

Palavras-chave: Criminalização terciária; Controlo social; Labelling Approach;


Prisão.
SUMÁRIO

Introdução.................................................................................................................................5

1.Conceito de criminalização...................................................................................................6

2.Processo de Criminalização..................................................................................................6

3.O que é a criminalização terciaria?......................................................................................7

4.O sistema penitenciário.........................................................................................................8

4.1 O Processo de prisionalização......................................................................................9

5.Teoria do Labeling Approach.............................................................................................10

5.1 Os desvios, consequências da estigmatização............................................................11

6.Controlo social e a criminalização terciária......................................................................12

CONCLUSÃO.........................................................................................................................14

BIBLIOGRAFIA.....................................................................................................................15
Introdução
Após à criminalização secundária, ocorre a chamada criminalização terciária, não
muito falada por alguns autores. Esta é etapa do processo de criminalização que passou a
ganhar notoriedade nas rotulações sociais. A criminalização terciária ocorre quando o
indivíduo já está condenado por meio de um processo judicial e dá início ao cumprimento de
sua pena privativa de liberdade no sistema prisional. Neste estágio, verifica-se a atribuição da
etiqueta de criminoso ao egresso do sistema carcerário, cujo reflexo recai diretamente sobre o
indivíduo. Na criminalização terciária o foco de estudo são as consequências negativas do
contato do sujeito com as agências criminalizantes, uma vez que se enfatizam as mudanças
que a experiência pode provocar nele, em sua autopercepção e em sua forma de encarar a
sociedade.

É nesse contexto que o presente trabalho investigativo, circunscreve-se na compreensão


do processo de criminalização terciária, numa reflexão através de teorias e investigações
empíricas.

O objectivo geral

 Abordar sobre as questões que envolvem e coadjuvam na ocorrência da


criminalização terciária.

Os objectivos específicos

 Entender o que é a criminalização e a sua terceira fase;


 Para que servem e porquê que ocorrem fenômenos como o etiquetamento na
prisão, num lugar que a sua principal função é a ressocialização do indivíduo
infractor;
 Como o tema está relacionado com a cadeira de Sistemas de Controlo Social.

Trata-se de um trabalho, no qual, para o alcance do objectivo proposto, a metodologia


empregada foi a pesquisa bibliográfica, que consiste no levantamento de material já elaborado
e publicado em documentos, tais como livros e artigos virtuais, com vista explicar um tema
com base em referências teóricas.

Este trabalho está constituído por 6 capítulos, pelos quais iremos apresentar os conceitos
de criminalização e processo de criminalização; definir o que é o sistema penitenciário e

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explicar as suas funções, e apresentar teorias que esclarecem o nosso tema de acordo com
alguns autores. Além disso, temos as conclusões e as referências bibliográficas.

1. Conceito De Criminalização

A criminalização, de acordo com a criminologia, é "o processo pelo qual comportamentos


e indivíduos são transformados em crime e criminosos" (Michalowski, R. J.).

 Actividades anteriormente legais podem ser declaradas crimes por uma legislação ou


decisão judicial. No entanto, dentro da interpretação da lei, presume-se formalmente que leis
não devem ser aplicadas retroactivamente. Exemplo: alguém que cometeu um acto antes de
tal acto virar crime não deve ser punido, como: A criminalização do aborto sem qualquer
excepção; a escravatura e o Apartheid e a transmissão intencional do VIH (art. 205.º do
Código Penal).

Também é desencorajado que juízes apliquem penas retroactivas. Em casos de leis que
não são rigorosamente aplicadas, actos ilegais podem sofrer uma criminalização de facto, com
uma aplicação mais efectiva e comprometida (Wikipédia, a enciclopédia livre).

2. O Processo De Criminalização

Desde a criação das normas a actual das instâncias oficiais (Parlamento, Ministério
Público, Tribunais e Polícia) é possível verificar a actual selectiva do sistema penal. Nas
palavras de Baratta (2011, p. 60) “o poder de criminalização e o seu exercício estão
estreitamente ligados à estratificação e a estrutura antagônica da sociedade”. O processo de
criminalização se divide em três momentos: a criminalização primária, a criminalização
secundária e a terciária.

Podemos considerar que o processo de criminalização primária é a criminalização de


determinados actos, momento de criação da lei, ou seja, ao momento que determinada
conduta lícita passa a ser considerada ilícita através da modificação ou inovação no
ordenamento jurídico. Exemplo: quando o legislador diz que portar arma de fogo sem
autorização legal é crime, estamos diante de um acto de criminalização primária (ARAÚJO,
2010).

A criminalização secundária é a acção punitiva exercida sobre pessoas determinadas. Para


Zaffaroni, a criminalização secundária possui duas características: seletividade e

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vulnerabilidade, visto que o poder punitivo é exercido sobre pessoas previamente escolhidas,
em face de suas fraquezas, a exemplo das pessoas em situação de rua, pessoas negras,
usuários de drogas, etc. Por sua vez, se dá pela actuação das instituições de controlo social na
coerção e punição do agir criminoso. Em suma, cuida do ``ius puniendi estatal´´, responsável
por perseguir, julgar e punir o desviante (ARAÚJO, 2010).

E a criminalização terciária é o rótulo de “criminoso” atribuído àquelas pessoas que vimos


na criminalização secundária. Uma pessoa que passou pelo cárcere, por exemplo, dificilmente
conseguirá voltar a ter uma vida “normal”, considerando os graves efeitos deletérios advindos
de uma prisão, ainda que preventiva.

3. O Que É A Criminalização Terciaria?

A criminalização terciária ocorre quando o indivíduo já está condenado por meio de um


processo judicial e dá início ao cumprimento de sua pena privativa de liberdade no sistema
prisional. A criminalização terciária ou interacionismo simbólico, significa que existem
agentes estigmatizantes que vão desde o mercado de trabalho até o próprio sistema

penitenciário que rotula o indivíduo em seu interno (Sell, 2007).

Uma das consequências da identificação e aplicação da lei penal ao indivíduo identificado


como criminoso é a rotulação que lhe é atribuída, pois passa a ser visto pela sociedade como
delinquente, carregando tal rótulo mesmo após cumprir a sanção imposta. Trata-se da
estigmatização. As consequências sobre o indivíduo, após a punição por eventual prática de
conduta criminosa, são cruéis. A reinserção na sociedade é bastante delicada devido à imagem
formada pela consciência da sociedade, situação que pode conduzir o cidadão, supostamente
ressocializado, de volta ao mundo da criminalidade.

A criminalização terciária é marcada pela rotulação do indivíduo punido em


decorrência da conduta criminosa, estabelecida na criminalização primária e secundária, o
qual passa a carregar a imagem negativa de persona non grata, e tem dificuldades de voltar a
ter interações na sociedade, seja para ingressar no mercado de trabalho ou relacionar-se com
os demais indivíduos. Na visão do doutrinador Alessandro Baratta,

A criminologia ao longo dos séculos tenta estudar a criminalidade não como um dado
ontológico pré-constituído, mas como realidade social construída pelo sistema de

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justiça criminal através de definições e da reação social, o criminoso então não seria
um indivíduo ontologicamente diferente, mas um status social atribuído a certos
sujeitos selecionados pelo Sistema Penal e pela sociedade que classifica a conduta de
tal individuo como se devesse ser assistida por esse sistema. Os conceitos desse
paradigma marcam a linguagem da criminologia contemporânea: o comportamento
criminoso como comportamento rotulado como criminoso. (Baratta, 2002, p. 11)
A forma como a sociedade afirma a marginalização faz com que o cidadão que cometeu
um crime, mesmo tendo cumprido a penalidade que lhe fora imposta, seja consolidado como
criminoso, mesmo após voltar a gozar da sua liberdade, por estar fora do cárcere. Tal situação
direciona o indivíduo de volta às práticas criminosas, já que não possui abertura para voltar a
ocupar uma posição digna na sociedade, frente à estigmatização que lhe é imposta.

A criminalização terciária, finalmente, consiste na execução da pena – uma dupla seleção,


uma vez que a/o condenada/o já foi selecionada/o pelo sistema de justiça e, nesse momento,
galga a posição de “condenada/o”, para depois figurar como “egressa/o” do sistema
penitenciário. Sua condição de cidadã/cidadão nunca mais será a mesma. Para mais
discussões sobre os processos de criminalização (BARATTA, 2003).

4. O Sistema Penitenciário

O sistema penitenciário é parte do conjunto de mecanismos de controlo social que uma


sociedade mobiliza para punir a transgressão da lei. É o conjunto dos estabelecimentos de
regime aberto, fechado e semi-aberto, masculinas e femininas, incluindo os estabelecimentos
penais em que o recluso ainda não foi condenado, sendo estas unidades chamadas de
estabelecimento penal. A sua principal função consiste em punir e ressocializar (ASSIS,
2007).

Ou seja, as prisões lidam com a condenação e punição dos infractores, conforme julgado
no tribunal. Depois que os infractores forem condenados nos tribunais, o sistema prisional os
separará do resto da sociedade. Os infractores podem ser encarcerados na prisão ou colocados
em liberdade condicional/condicional, onde serão monitorados de perto por oficiais dedicados
(Goodwin, 2014).

A ressocialização significa reintegração social, mediante o qual se abre um processo de


comunicação e interação entre a prisão e a sociedade, onde as pessoas presas se identificam na

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sociedade e a sociedade se reconhece nelas. Ressocializar é emancipar o sujeito, orientá-lo
dentro da prisão para que ele possa ser reintegrado à sociedade de maneira efetiva, evitando
com isso a reincidência (ASSIS, 2007).

A criminalização terciária busca internalizar no indivíduo selecionado (criminalização


secundária) praticante da conduta criminosa (criminalização primária) que ele é um criminoso
e merece ser punido, por meio dos processos de prisionalização e aculturação, assim como
imprimir na sociedade a certeza da necessidade da sua segregação através do cárcere,
deixando de tentar entender as razões da prática de crimes e passando a refletir a respeito de
como são selecionadas as condutas a serem criminalizadas. Trata-se do grande mérito da
teoria: demonstrar que o sistema penal seleciona uma parcela específica da população sobre a
qual incidirá com mais veemência (Dos Santos, 2018).

O sistema penal, constituído pelos aparelhos policial, ministerial, judicial e prisional,


aparece como um sistema que protege bens jurídicos gerais e combate à criminalidade (“o
mal”) em defesa da sociedade (“o bem”) através da prevenção geral (intimidação dos
infractores potenciais) e especial (ressocialização dos condenados) e, portanto, como uma
promessa de segurança pública. (ANDRADE 2003, p. 132)

4.1 O Processo De Prisionalização

Como dissemos acima, a criminalização terciária acontece pelos processos de


prisionalização e aculturação. Abordaremos então sobre o processo de prisionalização na
óptica de Cezar Roberto Bitencourt (2001), que possui uma obra muito interessante, fruto do
seu doutoramento na Espanha, a qual, ainda em meados dos anos 2000, já trabalhava com a
dita falência da pena de prisão, em suas causas e alternativas, título, inclusive da sua
publicação.

O autor ao longo de sua obra conta com um capítulo destinado exclusivamente a abordar o
que chama de crise da pena privativa de liberdade, que poderia ser objeto de contestação, haja
vista a centralidade e o reforço sempre actual da pena de prisão; aduzindo, nesse ínterim, que
um dos maiores argumentos a tanto seria o seu factor criminógeno, ou seja, o facto de que a
prisão não consegue frear a delinquência, pelo contrário, é produtora de toda a sorte de
desumanidade, produzindo, assim, mais violência e consequente criminalidade.

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Bitencourt, então, afirma que a maioria dos factores que dominam a vida carcerária
imprime a esta um caráter criminógeno, podendo esses factores serem classificados em
materiais (deficiências em termos de estrutura, higiene, alimentação, entre outros, que causam
prejuízos e são nocivos à saúde das pessoas); psicológicos (disciplina que estimula a
aprendizagem do crime e a delinquência) e sociais.

A prisão, assim, é produtora de um sistema social próprio que se revestiria de algumas


características, tais como o facto de que não há como fugir desse sistema, o qual se apresenta
de forma rígida, uma vez que a mobilidade vertical é muito difícil de ocorrer no seu interior.

O número de papéis que o indivíduo pode desempenhar nesse sistema é limitado e a


selecção do seu papel também o é, além do facto de que desde o momento em que a pessoa
ingressa na instituição, é submetida à influência desse sistema social, o qual seria detentor de
uma subcultura própria, a qual conta com uma gíria própria e com o que chama de código do
recluso, o qual se traduziria nas regras básicas da sociedade carcerária (Bitencourt, 2001).

No entanto, para o referido autor o efeito mais importante que o subsistema social
carcerário produz no recluso é a prisionalização, que é a forma como a cultura carcerária é
absorvida pelos internos, e que se traduz em assimilação, a qual implica um processo de
aculturação, ou seja, as pessoas que são assimiladas vêm a compartilhar sentimentos,
recordações e tradições do grupo estabelecido, o que se assemelharia ao que chamamos de
processo de socialização. A prisionalização, assim, produz efeitos negativos à pretensão dita
‘ressocializadora’ e todo o indivíduo que ingressa em uma prisão sofrerá com uma maior ou
menor prisionalização (Bitencourt, 2001).

Bitencourt cita Donald Clemmer e salienta algumas condições que podem, inclusive,
estimular uma maior prisionalização: condenações longas; poucas relações com as pessoas
que se encontram fora da prisão e que podem exercer influência positiva no recluso; aceitação
incondicional dos dogmas da sociedade carcerária, entre outros.

Então achamos que se devem estabelecer recomendações para a melhoria das condições
de internamento das pessoas privadas de liberdade a cargo do Estado e respeitando dois dos
seus direitos fundamentais, pelo o mesmo deve ter em conta as suas características
sociodemográficas, a sua situação jurídica, oferta institucional, entre outros. Aspectos para

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compreender o grau de satisfação dos direitos da população carcerária. Da mesma forma,
estabelecer recomendações sobre a política pós-prisional do país.

5. A Teoria Do Labeling Approach

A manutenção do estigma de “criminoso” e sua, consequente, internalização pelo próprio


indivíduo, fecha o ciclo vicioso gerado pelo que a criminologia aprendeu a chamar de teoria
do etiquetamento –Labeling Approach–, ou seja, a promoção pela acção do Estado e da
própria sociedade de nichos criminógenos.

A seletividade é, portanto, uma característica marcante do sistema penal e consiste na


identificação do indivíduo como criminoso, ou seja, como o responsável pela prática de
delitos.

Tal rotulação do sujeito delinquente, como bem explica Penteado Filho (2012), foi
bastante trabalhada na teoria do labelling approach (etiquetamento), instituída nos Estados
Unidos nos anos 1960. Essa teoria, entende que a diferença entre o homem comum e o
criminoso consiste na rotulação e estigmatização sofrida por este último. Sendo assim, a
estigmatização pode tanto estereotipar o sujeito como delinquente quanto influenciá-lo a
praticar novos crimes. A Sociologia do desvio e do controlo social foi fortemente influenciada
pelo interacionismo e pela etnometodologia, sendo estas a base conceitual que alçou o a
também conhecida como a teoria interacionista, teoria da reação social ou teoria da rotulação.

A rotulação mencionada confere ao sujeito uma característica de difícil retirada,


proporcionando-lhe uma nova identificação, que é negativa e lhe insere no ramo da
criminalidade. Isto porque, a partir deste ponto ele passa a ser visto apenas como delinquente,
e mesmo após cumprir sua pena será ele estigmatizado pela sociedade. Desta forma,
demonstra-se o quanto é forte o etiquetamento e o quanto ele pode mudar a vida de alguém
(Penteado Filho, 2012).

Para melhor compreender o referido procedimento, faz-se mister explicar que o


etiquetamento do indivíduo se desenvolve a partir de uma conduta desviante, que é definida
por Penteado Filho (2012) como um comportamento considerado perigoso e constrangedor.
Tal conduta gera uma reacção social que é justamente a responsável pela identificação
daquela pessoa como criminosa.

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Nesta senda, a estigmatização sofrida pelo sujeito pode suscitar consequências
devastadoras. Após passar pelo cárcere, a reinserção na sociedade é bem delicada. Torna-se
difícil encontrar um emprego, fazer novas amizades e interagir com o meio. A referida
situação vem, por conseguinte, a refletir na ordem financeira, visto que com a falta de
oportunidade de trabalho não é possível obter uma renda e, vendo-se sem opção, o indivíduo
volta a praticar crimes. É um ciclo vicioso que tira todas as perspectivas de melhora do país
(Penteado Filho, 2012).

5.1 Os Desvios, Consequências Da Estigmatização


Lemert (1967 apud BARATTA, 2002, p. 90) aduz que a criminalidade apresenta dois
grandes problemas, são eles o desvio primário (que corresponde à prática do delito pela
primeira vez) e as consequências desse comportamento para o indivíduo. Na conduta primária
observa-se que há a influência das questões sociais e culturais na prática dos actos
delinquentes e no desvio sucessivo, que ocorre depois da aplicação da pena, nota-se também a
presença de factores psíquicos que contribuem para o exercício de outros delitos. Desta forma,
ainda com base no referido autor, a reincidência na execução de crimes “torna-se um meio de
defesa, de ataque ou de adaptação em relação aos problemas manifestos e ocultos criados pela
reação social ao primeiro desvio”.

Mediante este, verificou-se que tais grupos sociais afectados pela selectividade na
persecução penal dificilmente conseguem reinserção na sociedade, pois carregam consigo o
estigma de terem sido condenados e presos. Nestes casos, o desvio primário dá lugar ao
desvio secundário, fruto do processo de estigmatização. Quando esse processo recai sobre
uma mulher o efeito é infinitamente mais devastador. O etiquetamento criminológico tende a
reforçar um estigma de inferioridade já actuante na sociedade por conta do patriarcalismo, de
acordo com Simone de Beauvoir (2016, p.16. v.1).

6. Controlo Social E A Criminalização Terciária

Araújo (2010, p. 115-116) afirma que este processo se concretiza por meio do controlo
social (formal e informal) estabelecendo-o, juntamente com o sistema penal, como “pilastras
da criminalização”. O controlo social formal é o exercido pelas agências de controlo ligadas
ao poder do Estado de punir, as quais, em razão disso, operam a criminalização ou convergem
na sua produção. Trata-se, pois, do sistema penal. Com relação ao controlo social informal

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corresponde “à fiscalização realizada pela sociedade civil” e, nos dizeres de Andrade (2003),
este controlo também chamado de difuso é realizado ainda por instâncias como as famílias, as
escolas, a mídia e etc.

É válido ressalvar que a identificação do indivíduo como criminoso é tão importante


quanto o crime praticado por ele, isso significa que o facto de alguém cometer um delito não o
torna passível de punição até que a colectividade (as agências e a própria sociedade) o perceba
como criminoso. Neste sentido o status social de delinquente pressupõe, necessariamente, o
efeito das actividades das instâncias oficiais de controlo social da delinquência, enquanto não
adquire esse status aquele que, apesar de ter realizado o mesmo comportamento punível, não é
alcançado, todavia, pela acção daquelas instâncias (BARATTA, 2002).

Perceba-se, assim, não apenas a seletividade praticada pela própria instância de controlo,
mas que tal tratamento diferenciado, de início, já seleciona quem será e quem não será alvo de
tentativas de ressocialização pelos órgãos competentes, ampliando a estigmatização. Alguns
agentes penitenciários envolvidos numa pesquisa que trabalha diretamente com ações de
ressocialização, põem a vista um dos principais problemas deste ofício no Brasil:

``Trabalhamos o sujeito para reintegrar na sociedade na questão do trabalho e


educação. Nós aqui do sistema prisional fazemos a nossa parte, mas e a sociedade?
Como essa sociedade recebe esse indivíduo? Nem tudo depende da gente. Depende do
reeducando, porque ressocialização começa com mostrar que ele tem que participar da
própria educação, e depende da sociedade, que não está preparada para acolhê-lo´´
(Agente penitenciário – gerente de educação) (IPEA, 2015, p. 86).

Neste sentido, a observação dos altos índices de reincidência e os grupos dos quais eles
emergem, permitem verificar, no mínimo, que a reinserção social é mais difícil entre aqueles
que, ao adentrar no sistema penitenciário, já possuíam uma outra etiqueta como, por exemplo,
as de “pobres, pretos e prostitutas” no Brasil. Daí também ser verdadeira a proposição de
Castro (1983) para quem, conforme visto, uma etiqueta sempre leva consigo uma série de
outras etiquetas, ampliando a estigmatização de diversos grupos que já são vítimas de outras
formas de etiquetamento.

Posto isto, analisa-se que os meio formais e informais de controlo social disseminam uma
cultura do pânico na sociedade, propagando que para que haja mais segurança é preciso

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marginalizar parte da população, estigmatizando essa parcela como delinquentes. A partir do
momento em que o sujeito é inserido no cárcere tem-se início a chamada criminalização
terciária que corresponde “às consequências negativas do contacto do sujeito com as agências
criminalizantes, uma vez que se enfatizam as mudanças que a experiência pode provocar nele,
em sua auto percepção, e em sua forma de encarar a sociedade”. (Araújo, 2010, p. 127)

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CONCLUSÃO

Então podemos concluir que a criminalização terciária ocorre quando o indivíduo já


está condenado por meio de um processo judicial e dá início ao cumprimento de sua pena
privativa de liberdade no sistema prisional que tem seu caráter repressor e preventivo ao
mesmo tempo. Ou seja, o indivíduo, já individualizado e considerado como uma pessoa
concreta, conforme a criminalização secundária, passa a ser considerado, também
individualmente, no plano da execução da pena.

Nesse sentido, a criminalização terciária ocorre em relação ao indivíduo já condenado


e que se encontra cumprindo uma pena. No processo, ocorre a manutenção do estigma de
“criminoso” atribuído àqueles rotulados como tal, passando pela internalização desse rótulo
pelo próprio indivíduo. Nesse momento, o indivíduo passa a se sentir inferior em razão do
cumprimento da sanção penal. Ele recebe um tratamento inferiorizado, porque perde muitos
direitos, haja vista que, na prática, a privação da liberdade é apenas o mínimo da pena
privativa de liberdade.

Ademais, há também uma influência psicológica em relação ao indivíduo preso,


considerando que ele assimila essa cultura (ou subcultura) prisional, aceitando-a como o seu
ambiente, isto é, como o local adequado para a sua inserção. Portanto, a criminalização
terciária ocorre dentro do sistema prisional que tem a principal função a ressocialização e a
reintegração social do indivíduo.

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BIBLIOGRAFIA

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