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LAHEMO APRESENTA

MATERIAL TEÓRICO
EXAMES LABORATORIAIS:

DA TEORIA
À PRÁTICA

FEIRA DE SANTANA - BA
2021
MATERIAL TEÓRICO DO CURSO:

EXAMES LABORATORIAIS

1ª EDIÇÃO
2021

Material teórico de apoio para o curso


promovido pela Liga Acadêmica de
Hematologia e Hemoterapia da
Universidade Estadual de Feira de Santana
(LAHEMO), Exames laboratoriais: da
Teoria á prática. O material foi produzido
pelos integrantes da LAHEMO.
REDAÇÃO
Arthur Rodrigues Alves

Acadêmico do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Deilton Costa Santos

Acadêmico do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Jhoyce Michaelle da Costa Oliveira

Acadêmica do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Magno Augusto Gomes

Acadêmico do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Urleis Joaquim Garcia Júnior

Acadêmico do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana


REVISÃO
Fernando Mendes

Acadêmico do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Isadora Oliveira Santiago Pereira

Acadêmica do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana

Jhoyce Michaelle da Costa Oliveira

Acadêmica do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana


SUMÁRIO

Hemograma........................................................................................ 06

Função Renal ..................................................................................... 13

Urina tipo I......................................................................................... 16

Coagulograma.................................................................................... 21

Função Hepática................................................................................ 25

Principais exames laboratoriais na emergência................................. 32


I. HEMOGRAMA assim, essa capacidade depende do
conteúdo hemoglobínico da massa
Autor: Magno Augusto Gomes eritroide. Assim, a insuficiência
Revisor: Jhoyce Oliveira e Fernando Mendes funcional do eritrócito, conhecida
como anemia, é definida como a
1. CONCEITO diminuição da hemoglobina
sanguínea. Essa diminuição costuma
O hemograma é um dos exames acompanhar-se de uma
mais requeridos nas consultas eritrocitopenia, ou seja, baixa da
médicas, representando uma análise contagem de eritrócito. Existem
qualitativa e quantitativa dos alguns termos relacionados ao
componentes celulares. A avaliação eritrograma que são importantes:
quantitativa é totalmente
automatizada, feita em contadores • Poliglobulia: Quando temos a
eletrônicos através de um software, expansão da massa eritroide ou
atingindo uma incrível exatidão. A hemoglobínica. Isso costuma ser
avaliação qualitativa ocorre através decorrente do aumento da eritropoese
de uma identificação dos subtipos (processo de formação dos
celulares e das anormalidades eritrócitos) mediado por uma
morfológicas relevantes, produção excessiva, apropriada ou
principalmente da série vermelha. inapropriada, de eritropoetina.
Os três componentes principais • Policitemia: esse termo era
para informações de utilidade clínica usado como sinônimo de
do sangue periférico são: eritrócitos poliglobulia, mas, atualmente,
(série vermelha), leucócitos (série tendemos a utilizá-lo apenas para
branca) e plaquetas (série designar especificamente a
plaquetária). policitemia vera, que é uma neoplasia
mieloproliferativa crônica em que há
2. ERITROGRAMA proliferação autônoma do tecido
É a seção do hemograma que eritroide.
avalia os eritrócitos, também • Eritrocitose: refere-se a
conhecidos como hemácias. Nesta aumento da contagem de eritrócitos,
análise vão ser verificados os nem sempre acompanhado de
tamanhos, formatos, intensidade de aumento da massa eritroide ou
cor e quantidade de hemoglobina que hemoglobínica.
cada eritrócito possui, sendo que
também é quantificada a O eritrograma, portanto, destina-se
porcentagem de células sanguíneas, a fazer notar, quantificar e ajudar no
que corresponde ao hematócrito. diagnóstico causal das anemias e
poliglobulias.
O eritrócito desempenha a função
de transportar o oxigênio dos Valores de referência: os valores
pulmões para os tecidos, sendo aceitos para adultos referem-se tanto

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a populações brancas como a 2.1-Dosagem de hemoglobina (Hb)
populações negras; pode sofrer
variações aceitáveis (símbolo ±) para A dosagem da hemoglobina é um
mais ou para menos de acordo com o dado fundamental para o diagnóstico
valor numérico que o acompanha. O de estados anêmicos ou eritrocitoses.
eritrograma pode sofrer algumas Seu valor de referência pode variar
alterações, como: entre laboratórios, aqui
consideraremos:
• Populações negras têm
hemoglobina e hematócrito um pouco Hb (homem): 14 – 17.4
inferiores, mas, como o volume Hb (mulher): 12.3 – 15.3
corpuscular médio (VCM) é também
2 a 3% menor, a diferença não se Esses valores podem se encontrar
expressa na contagem de eritrócitos, alterados em várias situações, como:
que é quase a mesma. anemias; altitude; baixa pressão de
oxigênio; doença pulmonar ou
• Residentes em áreas muito cardíaca avançadas; e neoplasias
acima do nível do mar, pelo estímulo mieloproliferativas.
à síntese de eritropoetina causado
NOTA
pela baixa tensão de oxigênio, têm Diagnóstico de anemia: Caracterizada por hemoglobina <
elevação na produção dos eritrócitos. 13,5 g/dL e/ou hematócrito < 41 % em homens, e
hemoglobina < 12,0 g/dL e/ou hematócrito < 36% em
• A diferença entre os sexos é de mulheres.

causa hormonal. Os andrógenos 2.2-Hematócrito (Ht)


aumentam a sensibilidade do tecido
eritroblástico à eritropoetina; sendo É o volume da massa eritroide de
assim, a castração masculina causa uma amostra de sangue, expresso em
anemia. Por outro lado, os estrógenos porcentagem. Correlaciona-se melhor
desestimulam a eritropoese; logo, que a contagem de eritrócitos com a
após a menopausa, há elevação da viscosidade sanguínea, sendo,
contagem a níveis quase masculinos. portanto, o parâmetro mais utilizado
para avaliar alterações volêmicas.
Tabela 1: Valores de referência do hemograma

PARÂMETRO HOMEM MULHER


Ht (homem): 42 – 50 e
Hemoglobina (g/dl) 15.7 ± 1.7 13.8 ± 1.5
Ht (mulher): 36 – 44
Hematócrito (%) 46.0 ± 4.0 40.0 ± 4.0

Hematimetria (milhões/microL) 5.2 ± 0.7 4.6 ± 0.5 2.3-Volume corpuscular médio


Reticulócitos (%) 1.6 ± 0.5 1.4 ± 0.5 (VCM)
Volume Corpuscular Médio (VCM) 88.0 ± 8.0 88.0 ± 8.0
(fL) É a medida do volume médio dos
Hemoglobina Corpuscular Média
(pg/hemácia)
30.4 ± 2.8 30.4 ± 2.8 eritrócitos. É calculado dividindo-se
Concentração de Hemoglobina 34.4 ± 1.1 34.4 ± 1.1 o hematócrito pelo número de
Corpuscular Média (g/dL de
hemácia) eritrócitos presentes nesse volume. O
Índice de anisocitose (RDW) 13.1 ± 1.4 13.1 ± 1.4 VCM correlaciona-se inversamente
Fonte - Disponível em: https://pebmed.com.br/voce-sabe-interpretar-
corretamente-o-hemograma/
com a contagem de eritrócitos.
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Pessoas com VCM mais baixo que 2.4-Índice de anisocitose (RDW)
o usual costuma ter contagens mais
altas, e vice-versa. Os termos RDW = 11,7 a 14,5
microcitose e macrocitose assumiram Valores mais baixos não costumam
a posição de parâmetros mais ser vistos, pois indicariam população
importantes para o diagnóstico eritroide mais homogênea que a
diferencial laboratorial das anemias. usual, um excesso de normalidade. Já
VCM: 80 – 96 fL valores mais altos indicam excessiva
heterogeneidade volumétrica da
< 80 fL = Microcitose: Anemia população, o que é definido como
ferropriva; talassemias; anemia anisocitose. Uma população eritroide
sideroblásticas; anemia de doença excessivamente heterogênea (=
crônica (tardia); deficiência de cobre; anisocítica), isto é, com RDW
aumentado, é uma população
80-100 fL = Normocitose: Anemia patológica.
ferropriva (precoce); anemia de
doença crônica; perda aguda de O RDW é particularmente útil no
sangue; doença renal crônica; anemia diagnóstico diferencial das anemias
aplásica e supressão medular; por deficiente síntese da
hipotireoidismo; hipopituitarismo; hemoglobina. Segue o raciocínio:
com falta de conteúdo, os eritrócitos
> 100 fL = Macrocitose: Abuso de tornam-se microcíticos. Quando não
álcool; deficiência de ácido fólico; há reservas de ferro, a síntese de
deficiência de vitamina B12; hemoglobina nos eritroblastos
reticulocitose (recuperação de depende do ferro plasmático, grande
anemias hemolíticas, carenciais e parte, oriundo da variável absorção
sangramentos); síndromes intestinal. Há momentos de
mielodisplásicas; leucemia mieloide suficiência fugaz, que geram
aguda; hepatopatia crônica; eritrócitos maiores e melhor
medicamentos (ex.: zidovudina, hemoglobinizados, e momentos de
hidroxiureia); hipotireoidismo; falta, que originam eritrócitos
>115 fL: Macrocitose > 115 fL é descorados.
quase que exclusivamente causada RDW em algumas condições
por deficiência de vitamina B12 e/ou hematológicas:
ácido fólico.
 Na β-talassemia minor, o
NOTA
defeito genético da síntese da
É claro que, se um paciente tiver um VCM ≅ 89 fL em globina é igual em todos os
hemogramas anteriores, um valor atual de 95 fL ou um de 81
fL deverão ser interpretados, respectivamente, como macro eritrócitos, de modo que há
ou microcitose nesse caso particular.
uma população microcítica
homogênea, com baixo RDW.
 Na anemia das doenças
crônicas (ADC), em que pode
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haver microcitose, e na anemia hiperosmolar, por desidratação
da insuficiência renal crônica, dos eritrócitos e, às vezes, em
o RDW também não costuma hemoglobinopatias.
estar aumentado.  Quando há deficiência de ferro à
 Nas anemias sideroblásticas, eritropoese, com anemização
em que há um defeito na progressiva, a CHCM diminui
síntese da heme que varia de lentamente, mas de modo linear e
eritrócito a eritrócito, o RDW é proporcional à queda da
extremamente elevado hemoglobina. A diminuição
(anisocitose extrema). abaixo de 31, isto é, a insaturação
hemoglobínica dos eritrócitos,
pode acontecer na anemia
2.4 - Hemoglobina Corpuscular ferropriva e nas talessemias.
Média (HCM) 2.6- Contagem de Reticulócitos
HCM é calculado dividindo-se a Os reticulócitos são eritrócitos
dosagem de hemoglobina pelo imaturos sem núcleos e sua contagem
número de eritrócitos presentes em fornece uma estimativa da taxa de
um mesmo volume de sangue: HCM produção dos eritrócitos. Além disso,
= Hgb ÷ E sua quantificação revela a atividade
Tomando-se como exemplo, temos medular de produção de eritrócitos,
os seguintes valores médios de estando aumentado em estados
referência: hiperproliferativos e diminuído em
estados hipoproliferativos:
HCM: 27.6 – 33.2 (pg/hemácia)
Reticulócitos (homem): 1.1 – 2.1(%)
NOTA Reticulócitos (mulher): 0.9 – 1.9 (%)
< 27.6 = Hipocromia: Anemia ferropriva; talassemias;
NOTA
> 33.2 = Hipercromia: Costuma acompanhar macrocitoses.
Reticulócitos aumentados: condições em que há uma resposta
hematopoiética aumentada, como nas anemias hemolíticas ou
durante a regeneração da medula óssea.
2.5-Concentração Hemoglobínica
Corpuscular Média (CHCM) Reticulócitos diminuídos: condições em que a hematopoiese
está inadequada ou ineficaz, como anemia aplásica, invasão
medular, infecção, quimioterapia e outras causas de supressão
É a concentração média medulares.
(massa/volume) da hemoglobina nos
eritrócitos. Valor médio de 3. LEUCOGRAMA
referência: Leucograma é a parte do
hemograma que avalia a quantidade
CHCM: 33.3 – 35.5 (g/dL de
de leucócitos e a fórmula diferencial
hemácia)
com quantificação e avaliação
 O aumento real da CHCM morfológica dos diversos tipos.
costuma ocorrer na esferocitose,
pode ocorrer no coma
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Os limites de referência são É o tipo de leucócito mais comum
alterados em lactantes (alterando no adulto e constitui, juntamente com
conforme o tempo de gestação), e em os eosinófilos e basófilos, os
crianças (diferenciado por idades). granulócitos, os quais apresentam
núcleos irregulares e contêm grânulos
A leucocitose e leucopenia são citoplasmáticos específicos.
denominações para contagens acima
e abaixo dos limites de referência, Linfócitos:
respectivamente.
São as principais linhas de defesa
Tabela 2: Valores de referência para contra infecções por vírus e contra o
adultos surgimento de tumores, e é o segundo
tipo mais comum de glóbulos
PARÂMETRO % /uL
Leucócitos - 3.600 – 11.000 brancos, representando de 15 a 45%
Neutrófilos* 40 – 70 1.500 – 6.800
Linfócitos 20 – 50 1.000 – 3.800
dos leucócitos no sangue.
Monócitos 2 – 10 100 – 800
Eosinófilos 1–7 50 – 400 Linfocitose e linfopenia estão
Basófilos 0–3 0–
200 relacionadas com o aumento e a
*Neutrófilos totais: neutrófilos bastonados = 0 – 6%
Fonte - Disponível em: https://pebmed.com.br/voce-sabe-interpretar-
diminuição dos limites de referência,
corretamente-o-hemograma/
respectivamente. O aumento
Os leucócitos são células comumente está relacionado a
sanguíneas responsáveis pela defesa e processos infecciosos e a diminuição
estão majoritariamente concentrados com situações envolvendo a medula
na medula óssea em cerca de 90%. óssea, como anemia aplástica,
Destes 10% dos leucócitos leucemia ou doenças autoimunes.
circulantes, apenas 40% estão
Além disso, os linfócitos são as
disponíveis na corrente sanguínea,
células atacadas pelo vírus HIV, esse
estando os outros 60% concentrados
é um dos motivos da AIDS causar
nos tecidos periféricos. Os leucócitos
imunossupressão e levar a quadros de
são compostos por neutrófilos,
infecções oportunistas.
linfócitos, monócitos, eosinófilos e
basófilos e podem ser classificados Monócitos:
em granulócitos e agranulócitos.
Representam de 3 a 10% dos
Neutrófilos: leucócitos circulantes e são ativados
tanto em processos virais quanto
Os neutrófilos são as primeiras
bacterianos. Os monócitos são
células a migrar para sítios de
responsáveis pela fagocitose
infecção e desempenham importante
(macrófago em sua forma ativa) e
papel na defesa contra vários
pela defesa do organismo.
patógenos. Sua quantidade está
aumentada no sangue quando há Monocitose e monocitopenia são
alguma infecção ou inflamação denominações para valores acima e
ocorrendo. abaixo dos limites de referência,
respectivamente.
10
• Monocitose: é indicativo de O aumento da quantidade de
infecções crônicas como a basófilos é chamado de basofilia, já a
tuberculose. depressão desses basófilos é chamada
de basopenia.
• Monocitopenia: relacionado
com o enfraquecimento do sistema • Basofilia: relacionado a algum
imunológico, como nos casos de processo inflamatório que está
infecções sanguíneas, tratamentos acontecendo no organismo, como nos
quimioterápicos e disfunções na casos da asma, rinite ou sinusite,
medula óssea como na leucemia e artrite, leucemia e anemia hemolítica;
anemia aplásica.
• Basopenia: é uma situação rara
Eosinófilos: e pode acontecer decorrente a uma
diminuição da produção de glóbulos
São os leucócitos responsáveis brancos pela medula óssea, portanto,
pelo combate às parasitoses e pelo as principais causas são em casos de
mecanismo de alergia, representando ingestão de medicamentos que
cerca de 1 a 5% dos leucócitos enfraquecem o sistema imune e em
circulantes. doenças endócrinas.
Eosinofilia e eosinopenia são
NOTA
denominações para valores acima e
 Leucopenia: Pode sugerir anemia aplásica;
abaixo dos limites de referência,  Leucocitose: Pode refletir presença de infecção, inflamação
respetivamente. sistêmica ou neoplasia hematológica;
 Monocitose: Pode refletir a presença de síndrome
mielodisplásica;
• Eosinofilia: associada a  Neutropenia: Pode ser consequente de tratamento
quimioterápico;
processos alérgicos, parasitoses e  Linfopenia: Pode ser consequente a infecção por HIV ou
infecções; outros vírus.

• Eosinopenia: relaciona-se com


infecções bacterianas agudas, como
na pneumonia e meningite, pois, as 4. PLAQUETOGRAMA
infecções bacterianas graves As plaquetas são fragmentos de
costumam aumentar outros tipos de
células responsáveis pelo início do
células de defesa, como os
neutrófilos, o que podem diminuir a processo de coagulação. São
contagem absoluta ou relativa dos produzidas na medula óssea e
eosinófilos. derivam da fragmentação do
citoplasma dos megacariócitos e tem
Basófilos:
a forma de pequenos corpúsculos
São o tipo menos comum de discoides do sangue.
leucócitos no sangue, representando
apenas 0 a 2% dos glóbulos brancos Os limites de referência são
circulantes. similares em ambos os sexos e

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independem da idade e é de 150 000 trombocitopenias por falta de
a 450 000 µL/mm³. produção.

A Trombocitopenia (ou
plaquetopenia) e a trombocitose são
Referências:
contagens de plaquetas abaixo e
acima dos valores de referência, ROSENFELD, Luiz G.; MALTALL, Deborah
C.; SZWARCWALD, Célia L. et al. Valores de
respectivamente. referência para exames laboratoriais de
hemograma da população adulta brasileira:
 Trombocitopenia: O aumento Pesquisa Nacional de Saúde. Revista Brasileira
desses valores normalmente está de Epidemiologia. Vol 22. 2 ed; 2019
relacionado a alterações na
Renato Failace; Flavo Fernandes. Hemograma:
medula óssea, doenças manual de interpretação. 6. ed. Porto Alegre:
mieloproliferativas e anemias Artmed, 2015.
hemolíticas. Pode sugerir: anemia
ZAGO, Marco Antônio; FALCÃO Roberto
aplásica, supressão medular,
Passeto; PASQUINI Ricardo. Tratado de
sepse, deficiência de vitamina Hematologia. 1. ed. São Paulo: Atheneu, 2013.
B12 e ácido fólico, e
hiperesplenismo; Mary A. Williamson; L. Michael Snyder.
Wallach: interpretação de exames
 Trombocitose: pode estar laboratoriais. Tradução: Maria de Fátima
associado a doenças autoimunes; Azevedo; Patricia Lydie Voeux. 10. ed. Rio de
doenças infecciosas; deficiência Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.
nutricional de ferro, vitamina B9 e
B12; e disfunções no baço.
Fração plaquetária imatura (IPF):

Representam as plaquetas recém-


desprendidas dos megacariócitos na
medula óssea e mantém uma
quantidade significativa de RNA;

Os valores de referência são:

IPF: média = 3,4%, limites = 1,1 a


6,1%;

Um aumento da porcentagem de
plaquetas reticuladas seria indicativo
de produção aumentada de plaquetas,
distinguindo trombocitopenias por
destruição periférica de
12
II. FUNÇÃO RENAL e URINA eficiência da eliminação da
TIPO I substância, e o clearence de x (Cx) é
calculado pela razão entre a
Autora: Jhoyce Oliveira quantidade de x eliminada do plasma
Revisor: Fernando Mendes
e a concentração média de x, e Cx é a
soma do clearence renal com o
1. Fisiologia Renal extrarrenal (se uma substãncia for
Os rins exercem uma importante eliminada por via renal e extrarrenal
função regulatória, responsável por o clerance plasmático é maior que o
manter a estabilidade do ambiente clearence urinário). A depuração
interno. Entre as suas funções a mais renal pode ser definida como:
conhecida e importante é a de Cx = Ux x V/ Px
filtração, através da qual é possível
eliminar do organismo dejetos Em que Ux é a concentração urinária
metabólitos e outras substâncias de X, V o fluxo urinário e Px a
indesejadas. Além disso, o rim exerce concentração plasmática de X.
a função de reabsorção, secreção,
regulação do balanço hídrico e A excreção urinária de uma
eletrolítico, regulação da pressão substância depende da filtração, da
arterial e balanço ácido-básico, além secreção tubular e da reabsorção
de função hormonal. tubular. Um marcador ideal de
filtração é aquele que é filtrado pelo
A função renal pode ser avaliada rim, mas não é secretado ou
através da Taxa de Filtração reabsorvido, além disso, a produção
Glomerular (TFG), que representa o tem que ser constante, sem
produto da taxa média de filtração de degradação ou eliminação
cada néfron pelo número de néfrons extrarrenal, não deve sofrer
presente nos rins. A TFG sofre interferência de outros compostos e o
variação de acordo com a idade, ensaio bioquímico deve ter boa
gênero, superfície corporal, dieta, acurácia clínica e de fácil realização.
atividade física, medicamentos e
estados fisiológicos, como a A dosagem mais precisa da TFG
gestação. Como a TFG não pode ser requer a infusão de substâncias
medida diretamente, ela é avaliada exógenas como a inulina, iohexanol
através do clearence urinário de um ou Cr-EDTA, mas na prática clínica a
determinado marcador. creatinina endógena é a mais
utilizada para avaliação da função
O clearance ou a depuração de renal.
uma substância é definido como o
volume de plasma clareado de um 2. Marcadores exógenos
marcador pela excreção em
determinado tempo. Dessa forma, o A inulina é um polímero de frutose e
valor do clearence se relaciona com a padrão-ouro para avaliação da TFG,
não se liga a proteínas plasmáticas,

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sua distribuição no fluido extracelular varia com a idade, gênero, raça e
é total, é inteiramente filtrada e não é tamanho corporal.
reabsorvida ou secretada pelos A facilidade na mensuração, o
túbulos renais. Por não ser produzida baixo custo e a ampla disponibilidade
pelo organismo necessita de infusão são as principais vantagens do seu
contínua em bomba de infusão, o que uso, enquanto que o grande número
torna sua mensuração complexa, de fatores que interferem no resultado
além de que sua escassez na natureza e o fato de que uma grande variação
e seu valor elevado limitam sua na TFG pode modificar pouco o valor
utilização. da creatinina sérica.
Existem alguns marcadores exógenos Em condições fisiológicas normais
alternativos como o iohexol, é liberada na circulação numa taxa
iotalamato e ácido constante, não se liga a proteínas e é
etilenodiaminotetracítico, geralmente livremente filtrada pelo glomérulo e
quelados com radioisótopos para secretada pelos túbulos (alguns
facilitar a detecção. medicamentos, como a cimetidina,
inibem a secreção tubular de
3. Marcadores endógenos creatinina).
A creatinina também compõe
São substâncias geradas no secreções intestinais e pode ser
organismo a uma taxa relativamente degradada por bactérias. Quando a
constante e eliminadas TFG diminui, a quantidade de
principalmente por via renal, de creatinina eliminada por via
modo que a concentração sérica se extrarrenal aumenta; antibióticos
relaciona fortemente com a TFG. podem aumentar a concentração
Geralmente são metabólitos e sérica de creatinina, devido à
proteínas séricas de baixo peso destruição da flora intestinal.
molecular. O clearence de creatinina (Clcr)
A Ureia já foi amplamente pode ser obtido por:
utilizada no passado como marcador Clcr = Ucr x V/ Pcr
de filtração renal, atualmente a
creatinina é utilizada com mais Sendo Ucr a concentração urinária
frequência na prática clínica, e a de creatinina em mg/dL; Pcr a
Cistatina C tem ganhado espaço. concentração plasmática de creatinina
em mg/dL e V o fluxo urinário. Deve
3.1 - Creatinina ser calculado a partir da urina de 24
horas e medida única de creatinina
A creatinina é um produto final do sérica.
catabolismo muscular, deriva do A taxa de excreção de creatinina
metabolismo da fosfocreatina varia com a idade, gênero e raça,
muscular, da ingestão de carne e de sendo cerca de 20 a 25 mg/kg/dia
suplementos. Sua produção é para homens e 15 a 20 mg/kg/dia
proporcional à massa muscular, que para mulheres.
14
O Clcr superestima a TFG devido população com Doença Renal
a secreção tubular. Existem algumas Crônica e subestima a TFG em
equações que estimam a excreção de populações que têm níveis elevados
creatinina considerando as principais da TFG. A equação já foi validada
variáveis. A depuração estimada da para crianças e idosos, porém ainda
creatinina apresenta a vantagem de há poucos trabalhos em gestantes e
poder ser utilizada sem a coleta de pacientes com dosagens extremas de
urina de 24 h e somente com a albumina. Mais recentemente, a
dosagem plasmática. equação original do MDRD foi
modificada pela dificuldade de dosar
Essas equações têm o objetivo de a albumina em todos os pacientes.
diminuir as limitações da creatinina
como marcador da filtração A equação de creatinina da
glomerular, adequando-se a idade, colaboração CKD-EPI (Chronic
gênero, raça e superfície corporal. No Kidney Disease Epidemiology)
entanto, nenhuma equação é baseia-se nas mesmas quatro
suficientemente precisa ao ponto de variáveis da equação do MDRD,
tornar a creatinina um marcador porém utiliza um cálculo estatístico
ideal. diferente para estabelecer a relação
entre a TFG e a creatinina sérica, o
A equação de Cockcroft-Gault que corrige parcialmente a
estima o clearance de creatinina a subestimação da TFG em níveis mais
partir da idade, gênero, peso corporal elevados, observada com a equação
e creatinina sérica. É calculada da do estudo MDRD.
seguinte forma:
3.2 – Ureia
ClCre=(140-idade)x(peso)/72xCrP
(mg/dL) Disfunção renal pode repercutir em
Como as mulheres, geralmente, elevação da ureia plasmática, no
possuem 15% a menos de massa entanto seu valor como marcador da
corporal, faz-se o ajuste TFG é limitado devido a interferência
multiplicando por 0,85. Com essa de diversos fatores.
fórmula, a TFG em pacientes muito A ureia é o produto final do
obesos e nos que estão em dieta catabolismo proteico pelo fígado,
pobre em proteínas é superestimada, assim a sobrecarga de proteína a
e subestimada nos pacientes com partir do uso de dietas hiperproteicas
idade avançada. A equação de e a absorção de sangue após
Cockcroft-Gault foi validada somente hemorragia gastrointestinal, estados
para pacientes com função estável. catabólicos causados por infecção,
administração de corticosteroides ou
A equação do estudo MDRD quimioterapia aumentam a produção
apresenta maior precisão e acurácia de ureia. Enquanto a redução da
do que a fórmula de Cockcroft-Gault, produção de ureia pode ocorrer em
foi elaborada através do estudo em

15
pacientes com desnutrição grave e As equações de estimativa são menos
doença hepática. precisas em pessoas com outros
O clearance urinário de ureia fatores que afetem a creatinina sérica
subestima a TFG já que ocorre além da TFG. Nessas situações, há
reabsorção tubular. Quando há necessidade de testes adicionais,
redução da perfusão renal em como a medida com um marcador de
pacientes com depleção volêmica e filtração endógeno (cistatina C, b2M
estados de antidiurese ocorre e bTP), a medida do clearance a
aumento da reabsorção de ureia, o partir de urina coletada em um
que leva a uma queda do clearance de período de tempo ou a medida do
ureia maior que a redução clearance utilizando um marcador
concomitante da TFG. exógeno.

3.3 – Cistatina C
5. Urina tipo I
A cistatina C é uma proteína da O exame de urina é um dos testes
superfamília dos inibidores da fundamentais para avaliar as doenças
cisteína protease, ela é produzida de dos rins e do trato urinário. Através
maneira constante pelas células da urianálise ou exame de urina tipo I
nucleadas. Parece haver boa é possível fazer a avaliação física da
correlação do seu nível sérico com a urina, análise química e
TFG, melhor do que a creatinina sedimentoscopia.
plasmática. O nível de cistatina C em
indivíduos normais está na faixa de Deve-se coletar o jato médio da
0,54 a 1,55 mg/L. primeira urina matinal, por ser mais
concentrada. Durante a coleta deve-se
4. Aplicação clínica evitar a contaminação, por isso o jato
inicial deve ser desprezado. Nos
As diretrizes atuais recomendam pacientes com incontinência urinária
que pacientes com elevado risco para ou com aumento da tensão vesical, é
DRC ou com TFGe reduzida necessário recorrer ao cateterismo
realizem a estimativa da TFG e o vesical. A avaliação da urina deve
teste de albuminúria, como um ocorrer logo após a coleta, em no
marcador de dano renal, a fim de máximo 2 horas, pois após esse
avaliar tanto a função renal quanto período ocorre deterioração dos
estadiar a gravidade da doença pelo elementos a serem examinados no
grau da TFGe. No entanto, não é sedimento urinário.
suficiente fazer uso da creatinina
sérica isolada como marcador da 5.1- Aspectos físicos
TFG, o uso das equações de
A cor da urina costuma ser
estimativa permite o laudo direto da
amarelo-clara, amarelo-escura ou
TFGe pelos laboratórios clínicos
âmbar. Algumas condições
sempre que a creatinina for medida.
patológicas, medicamentos ou

16
alimentação podem alterar a cor da 5.2 Características químicas
urina. As condições patológicas mais
comumente associadas a mudanças O pH urinário reflete a presença de
na coloração da urina são hematúria íons hidrogênio (H+), mas não
macroscópica, hemoglobinúria ou necessariamente reflete a carga total
mioglobinúria, bilirrubinúria e de ácidos da urina, uma vez que a
cristalúria maciça por ácido úrico, maior parte dos ácidos é excretada
além de algumas infecções urinárias. como amônia. Algumas situações
Os principais medicamentos associadas a pH urinário mais baixo
responsáveis por alterar a cor da são: acidose metabólica , dieta rica
urina são rifampicina, desferoxamina, em proteína e depleção volêmica.
fenitoína e outros. A beterraba e o Um pH urinário baixo pode ajudar a
caroteno são alimentos que também distinguir entre lesão renal aguda,
podem modificar a cor. pré-renal e necrose tubular, que
tipicamente se associa a pH mais
A urina normal é transparente, a alto. O pH mais alto pode ser
alta concentração de qualquer observado em acidose tubular renal,
partícula urinária, como células, dieta vegetariana e infecção por
cristais e bactérias pode torna-la microorganismos produtores de
turva. uréase.
Pode ocorrer alteração no odor A presença de hemoglobina na
devido infecções bacteriana do trato urina pode refletir hematúria maciça,
urinário, consumo de alimentos como devido ao grande número de
aspargo ou por condições específicas. eritrócitos, lise dos eritrócitos, devido
a demora no exame, em razão do pH
A densidade relativa pode ser alcalino da urina ou da GE baixa, ou
medida pela gravidade específica ou hemoglobinúria secundária à
pela osmolalidade. No caso da hemólise intravascular.
gravidade específica (GE) é feita a
relação entre o peso de um volume de Graças aos mecanismos de
urina com o peso do mesmo volume reabsorção efetuados, principalmente,
de água destilada e depende da massa pelos túbulos proximais, a quantidade
e do número de partículas de proteína na urina por dia não
dissolvidas. costuma exceder 150mg. Exceto em
algumas condições em que há
A osmolalidade é avaliada através proteinúria sem lesão renal. Pode ser
da redução do ponto de fusão de uma feita a análise qualitativa, que será
solução, e depende apenas do número expressa em cruzes, e é avaliada
de partículas presentes e não é através da tira reagente de albumina
influenciada pela temperatura da que se baseia na presença de proteína
urina ou pela concentração proteica, em um tampão, causando uma
embora aumente quando há altas mudança no pH proporcional à
concentrações de glicose. concentração de proteína. No entanto,

17
o método padrão-ouro é a coleta de microscópica do sedimento urinário
urina de 24 horas. Uma alternativa podem indicar lesão renal.
prática é fazer a relação proteína-
creatinina em amostra de urina As hemácias encontradas na urina
isolada, uma vez que é fácil de obter podem ser isomórficas (mantém
e não é influenciada pelas variações forma e contorno regular, derivadas
na ingestão de água ou pela taxa de do sistema urinário) ou dismórficas
diurese. A presença de 30 a (forma e controle irregular, de origem
299mg/24 h de albumina na urina é glomerular). De acordo com a
denominada microalbuminúria, e proporção de hemácias isomórficas e
geralmente ocorre em pacientes dismórficas encontradas na amostra,
diabéticos com maior risco de a hematúria é definida como
nefropatia diabética. glomerular ou não glomerular, pois a
passagem da hemácia através da
Leucócitos podem ser detectados membrana glomerular e os insultos
através da fita reagente para esterase físicos e químicos que podem ocorrer
leucocitária quando a microscopia for durante a sua passagem resulta em
negativa e quando os leucócitos uma deformação da célula.
estiverem lisados, devido à baixa
densidade relativa, ao pH alcalino ou A presença de leucócitos na urina
à demora no manuseio e na análise da pode ser devido a diferentes
amostra. condições, caso esteja em grande
quantidade ou em forma de
A maioria das bactérias que agregados com bacteriúria, indica
provocam infecção no trato urinário infecção urinária. Glomerulopatias
pode ser detectada através do teste da também podem cursar com
tira reagente para nitritos, já que leucocitúria, geralmente
essas bactérias reduzem o nitrato a acompanhada de hematúria,
nitrito pela atividade da nitrato proteinúria e ausência de crescimento
redutase. bacteriano. A contaminação urinária
por coleta inadequada deve ser
Em caso de doença hepática pode- considerada.
se identificar a presença de
urobilinogênio e bilirrubina na urina. No lúmen dos túbulos renais
podem se formar estruturas
A presença de glicose ou cetonas cilíndricas compostas por uma matriz
na urina é indício de descompensação da glicoproteína Tamm-Horsfall.
diabética. Cilindros com diferentes significados
5.3- Sedimentoscopia clínicos são formados pelo
aprisionamento de diferentes
Células e outros elementos podem partículas a matriz. Os cilindros
ser encontrados em pequeno número hialinos, por exemplo, são formados
na urina, caso sejam identificados em pela proteína de Tamm-Horsfall que
quantidade elevada na avaliação sofre a ação da acidez e da elevada

18
concentração do filtrado glomerular, Alguns medicamentos provocam
pode ser encontrado em indivíduos cristalúria, principalmente em
normais, havendo aumento em caso contexto de overdose, desidratação
de proteinúria nefrítica ou nefrótica. ou hipoalbuminemia quando há um
Os granulosos são formados por pH urinário propício. As principais
células tubulares descamadas e drogas envolvidas são os antibióticos
podem indicar lesão tubular e necrose sulfadiazina, amoxicilina e
tubular aguda; os leucocitários, ciprofloxacino; os agentes antivirais
constituídos por leucócitos aciclovir e indinavir; os
degenerados podem indicar vasodilatadores piridoxilato e oxalato
pielonefrite ou nefrite intersticial. de naftidrofuril; o barbitúrico
Ainda podem ter os gordurosos primidona; o anticonvulsivante
(gotículas de gordura na síndrome felbamato; o inibidor da lípase
nefrótica) e os hemáticos (hemácias gastroentérica orlistat; e a vitamina C
dismórficas na síndrome nefrítica). intravenosa.
A presença de cristais na O sedimento pode ter a presença
sedimentoscopia urinária pode ter de células do epitélio tubular renal
diferentes significados, desde litíase (CETRs) que derivam da esfoliação
renal a lise tumoral. Eles podem ser do epitélio tubular. Elas não são
do tipo comum, como os cristais de encontradas em indivíduos normais,
ácido úrico, de oxalato de cálcio, e mas podem ser vistas em todos os
fosfato de cálcio; nem sempre têm pacientes com dano tubular agudo,
significado importante, podendo também podem ser encontradas em
representar a supersaturação doenças glomerulares.
transitória da urina provocada por
ingestão de algum alimento ou Dano grave ao urotélio, como
desidratação leve. Em alguns casos ocorre em neoplasias, cálculos,
podem refletir lesão renal aguda. obstrução ou cateteres vesicais de
Cristais de estruvita estão associados demora ou stents uretrais podem
à infecção do trato urinário por cursar com aumento das células de
micro-organismos produtores de camadas epiteliais profundas.
uréase.
Podem ser patológicos, como os de Outro achado que pode estar
colesterol, cistina ou diidroxiadenina. presente no sedimento urinário são
Os cristais de colesterol estão microorganismos. Bactérias são
associados a outras partículas de encontradas com frequência porque a
gordura em pacientes com proteinúria urina é coletada e manuseada em
intensa. Os cristais de cistina são condições não estéreis, e a avaliação
marcadores de cistinúria, e os cristais geralmente é tardia. Deve-se
de 2,8-diidroxiadenina estão suspeitar de infecção urinária apenas
associados à deficiência da enzima se bactérias forem encontradas em
fosforibosiltransferase. urina de jato médio recém-coletada,
19
não contaminada, especialmente na
presença de leucócitos.

Referências:

JOHNSON, Richard J. Nefrologia Clínica. São


Paulo: Elsevier, 2016. 3660 páginas, Volume
único

RIELLA, M.C. Princípios de Nefrologia e


Distúrbios Hidroeletrolíticos. 6 ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.; SILVA,
D.M.G.V. et al.

Chao LW et al. Clínica Médica – Medicina


USP/ HC-FMUSP. Editora Manole. Volume
(3)

20
III. COAGULOGRAMA qualitativos. Apesar de ser
considerado um teste de triagem, o
TS se prolonga somente em
Autora: Arthur Alves
Revisor: Jhoyce Oliveira e Fernando Mendes disfunções plaquetárias moderadas e
graves, tendo pouca sensibilidade e
O coagulograma é constituído por especificidade, além de baixa
alguns exames que avaliam a reprodutibilidade.
hemostasia, esta, por sua vez,
corresponde aos processos que têm Técnica de Ivy: tempo normal de
como objetivo manter o sangue sangramento é entre 6 e 9 minutos
fluido de modo a evitar a formação (varia dependendo do laboratório).
de coágulos ou hemorragia. Os Técnica de Duke: tempo normal de
principais exames são os que avaliam sangramento é entre 1 e 3 minutos.
a hemostasia primária (tempo de
sangramento e contagem de O prolongamento do TS decorre de
plaquetas) e a coagulação plaquetopenia (< 50.000/mm³).
propriamente dita (TP, TTPa e TT).
Algumas causas são:
1. Testes laboratoriais da
 Alterações específicas de função
hemostasia primária
plaquetária (trombastenia de
A hemostasia primária envolve a Glanzmann, síndrome de Bernard
interação das plaquetas com Soulier, doença de estoque
componentes do endotélio vascular e granular);
com proteínas plasmáticas como o  Uremia;
fator de Von Willebrand.  Mieloma;
 Macroglobulinemia;
1.1- Tempo de sangramento  Alteração quantitativa e qualitativa
O tempo de sangramento (TS) é do fibrinogênio;
um teste realizado in vivo, que avalia  Doença de Von Willebrand;
a hemostasia primária dependente da  Medicamentos que atuam no
interação da parede do vaso e metabolismo plaquetário (AAS,
plaquetas. O TS é medido a partir de AINHs, antibióticos).
uma incisão de tamanho e Os casos de tempo de sangramento
profundidade padronizados, realizada diminuído não têm tanta importância
por um dispositivo, na pele do diagnóstica.
antebraço do paciente, atingindo os
pequenos vasos sanguíneos. Esse 1.2- Contagem de plaquetas
procedimento é realizado à pressão
A contagem das plaquetas confere
constante de 30 mmHg, em crianças
uma aplicação prática no fenômeno
até 10 anos de idade, e de 40 mmHg,
hemostático em várias condições
naqueles com idade superior a 10
clínicas e cirúrgicas, em particular,
anos. Alterações do TS refletem
no diagnóstico das plaquetopenias e
defeitos quantitativos e/ou
21
plaquetoses, sendo o primeiro teste  Infecções da medula óssea;
de triagem.  Síndrome mielodisplásica;
 Deficiência de vitamina B12;
É geralmente feita em sangue total  Quimioterapia e radioterapia.
anticoagulado com EDTA, usando-se
contadores automáticos de células. A Principais causas de trombocitopenia
enumeração das plaquetas pode ser por destruição precoce/uso excessivo:
feita também em lâmina, pelo método
de Fonio, cuja precisão é menor, mas  CIVD;
permite a análise da morfologia  Baixa contagem de plaquetas
plaquetária. induzida por medicamentos;
 Aumento do baço;
O método clássico de contagem  Doenças autoimunes;
consiste na observação microscópica  Desordens com formação de
por contraste de fase (contagem em coágulos em pequenos vasos.
câmara de Neubauer). O método
manual além de ser um processo Principais causas de trombocitose
demorado, está sujeito a erros. (>150.000 mm³)
Atualmente, a rotina laboratorial  Anemia hemolítica grave;
emprega métodos eletrônicos  Anemia ferropriva;
automatizados, baseados na medição  Síndromes Mieloproliferativas;
da impedância elétrica, para a  Sarcoidose;
contagem de plaquetas. Esses  Infecções agudas e crônicas;
métodos fornecem resultados com  Leucemia;
maior precisão, rapidez e maior  Após hemorragia aguda;
reprodutibilidade.  Esplenectomia;
Trombocitopenia:  Neoplasias;
 Colite ulcerativa;
 leve (contagem de plaquetas de  Após operações.
100.000 a 150.000 mm³)
 moderado (50.000 a 99.000/mm³) 2. Testes laboratoriais da
 grave (<50.000/mm³) coagulação sanguínea
A trombocitopenia possui duas Os métodos coagulométricos
causas principais: produção baseiam-se na formação do coágulo
diminuída ou destruição precoce. de fibrina, que pode ser visualizado
no tubo, nas técnicas manuais, ou
Principais causas de detectado fotometricamente, através
trombocitopenia por produção dos aparelhos denominados
insuficiente: coagulômetros.
 Anemia aplástica; 2.1- Tempo de protrombina (TP)
 Leucemia;
 Cirrose hepática; Consiste na determinação do
 Deficiência de folato; tempo de formação do coágulo de
22
fibrina após a adição de  Medicamentos (cumarínicos);
tromboplastina tecidual (fator III) e  Coagulopatias de via
de cálcio, o que promove a ativação extrínseca;
do fator VII, seguida da ativação do  Hipofibrinogenemia grave
fator X, iniciando a via comum da (<100 mg/dl);
coagulação. Dessa forma, o TP mede  Afibrinogenemia
os fatores envolvidos na via (incoagulável).
extrínseca e na via comum, sendo
independente da via intrínseca. O TP 2.2- Tempo de Tromboplastina
depende do nível dos fatores Parcial Ativado (TTPA)
vitamina K dependentes (II, VII e X),
sendo o teste usado no controle de O teste mede o tempo de
pacientes em uso de anticoagulantes coagulação do plasma, na presença
orais. de tromboplastina parcial (cefalina),
que substitui os fosfolípides de
A composição e a origem da membrana plaquetária, e de um
tromboplastina interferem na sua ativador da fase de contato da
sensibilidade, por isso os resultados coagulação (caulim, sílica ou ácido
de um TP do mesmo paciente na elágico). O TTPa reflete a integridade
mesma amostra podem variar de um do sistema intrínseco da coagulação
laboratório para outro. Em função (pré-calicreína, cininogênio de alto
disso, criou-se o sistema RNI peso molecular, fatores XII, XI, IX e
(Relação Normatizada Internacional) VIII), mas também se altera nas
com o objetivo de padronizar os deficiências dos fatores da via
resultados de TP. Segundo as comum (fatores V, X, protrombina e
orientações da OMS, todos os fibrinogênio) e a presença de
fabricantes de tromboplastina devem inibidores. Ele é bastante sensível à
comparar o reagente produzido com presença de heparina, sendo o teste
uma tromboplastina de referência. de escolha para a sua monitorização.
Essa comparação permite determinar
o Índice de Sensibilidade Os resultados podem ser expressos
Internacional (ISI), que é utilizado em tempo de coagulação (segundos)
para o cálculo da RNI. Quanto mais e relação (R) do TTPA do plasma do
próximo de 1,0 for o ISI mais paciente e TTPA do plasma normal.
sensível é a tromboplastina. O valor Os valores de referência do
normal varia de 10-14 segundos. laboratório e do tempo de coagulação
do R devem ser calculados utilizando
Causas do alargamento do tempo a média geométrica de pelo menos 20
de protrombina: plasmas de doadores normais. Devem
ser realizados a cada mudança de lote
 Hepatopatias; do reagente do TTPA. O valor
 Deficiência de fator VII ou dos normal do TTPA varia entre 25-35
fatores da via comum; segundos.
 Deficiência de vitamina K;

23
Causas do alargamento do TTPa: suficiente para detectar
anormalidades leves do fibrinogênio.
 Hemofilia A e B;
 CIVD; Causas do alargamento do tempo de
 Heparina não fracionada; trombina:
 Coagulopatias da via intrínseca
ou comum;  Consumo de fibrinogênio
 Coleta de sangue inadequada; (CIVD, veneno botrópico);
 Anticoagulante lúpico.  Fibrinogênio anormal
(disfibrinogenemia congênita
A coleta de sangue inadequada, causa ou adquirida);
muito frequente da deficiência dos  Presença de inibidores de
fatores da via intrínseca, da presença polimerização de fibrina;
de inibidores específicos ou de  Presença de antitrombina
interferência. anormal;
 Heparina na amostra.
2.3- Tempo de trombina (TT)
O TT avalia o tempo em que o
fibrinogênio se transforma em Referências:
fibrina, na presença de uma ZAGO, Marco Antônio; FALCÃO Roberto
quantidade padronizada de trombina. Passeto; PASQUINI Ricardo. Tratado de
É obtido após adição de trombina em Hematologia. 1. ed. São Paulo: Atheneu, 2013.
baixa concentração ao plasma puro,
de maneira que o tempo de Mary A. Williamson; L. Michael Snyder.
Wallach: interpretação de exames
coagulação é influenciado pela
laboratoriais. Tradução: Maria de Fátima
concentração de fibrinogênio e pela Azevedo; Patricia Lydie Voeux. 10. ed. Rio de
presença de inibidores da formação Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.
de fibrina, tais como a heparina.
Manual de diagnóstico laboratorial das
Muitos laboratórios substituem o Coagulopatias Hereditárias e Plaquetopatias
TT pela determinação do [recursoeletrônico] / Ministério da Saúde,
fibrinogênio pelo método de Clauss, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento
que utiliza trombina dez vezes mais de Atenção Especializada e Temática. –
concentrada se comparada à do TT. Brasília: Ministério da Saúde, 2016
Vai estar alargado em RIZZATTI EG & FRANCO RF. Investigação
hipofibrinogenemia (<100mg/dL). diagnóstica dos distúrbios hemorrágicos.
Medicina, Ribeirão Preto, 34: 238-247, jul./dez.
A trombina utilizada no TT deve 2001.
ser de concentração
aproximadamente 4 U/ml para a Chao LW et al. Clínica Médica – Medicina
obtenção do tempo normal de USP/ HC-FMUSP. Editora Manole. Volume
aproximadamente 20 segundos. (3) 319-338, 2009
Assim, o teste terá sensibilidade

24
I. FUNÇÃO HEPÁTICA vezes menor que no fígado. Por
exemplo, as aminotransferases na
1. Conceito geral presença de dano, necrose ou infarto
hepatocelular ou, a fosfatase alcalina
Autor: Urleis Garcia na presença de colestase. Apenas
Revisor: Isadora Santiago e Jhoyce alguns exames laboratoriais, de fato,
Oliveira dão indícios sobre a função hepática
O fígado é um órgão complexo ao avaliar a excreção hepatobiliar, a
localizado no hipocôndrio direito, exemplo das bilirrubinas ou a
logo abaixo da cúpula diafragmática. capacidade de síntese do fígado com
Essa víscera possui várias funções, avaliação do tempo de protrombina
como produção de proteínas, (TP), comumente relatado como
biotransformação, produção de bile, relação normalizada internacional
síntese de hormônios e outras. Suas INR (international normalized ratio),
células (os hepatócitos) e várias e da albumina, dentro do contexto
enzimas participam dos processos das proteínas séricas. Abaixo estão
que o fígado integra. Devido às algumas especificidades sobre os
inúmeras e relevantes funções que o principais marcadores de função
fígado desempenha de forma direta e hepática.
indireta no organismo, foram
desenvolvidas várias técnicas para 2. Aminotransferases
mensurar o desempenho, bem como
apontar possíveis lesões neste órgão. A alanina aminotransferase (ALT)
Os exames laboratoriais hepáticos e a aspartato aminotransferase (AST)
devem ser divididos em testes que são liberadas pelos hepatócitos
mensuram lesão nos hepatócitos, que lesionados; assim, estas enzimas são
detectam colestase e, por fim, os que boas marcadoras de lesão hepática.
avaliam a função hepática. As lesões Níveis bastante elevados (> 1000
nos hepatócitos são detectadas UI/L; sendo os valores normais ≤ a
através da mensuração de enzimas 40 UI/L) indicam necrose ou lesão
séricas liberadas do rompimento hepatocelular e, geralmente, resultam
celular hepático, fornecendo de hepatite aguda viral, hepatite
informações da extensão, magnitude induzida por toxina ou fármaco e
e curso (aguda ou crônica) da lesão. hepatite isquêmica ou infarto
hepático. Níveis elevados dessas
Em geral, testes bioquímicos e de enzimas podem permanecer por
desempenho excretório hepáticos são vários dias e, nos casos de hepatites
chamados de teste de função virais, por várias semanas. Vale
hepática. Porém, muitas dessas destacar que nesses casos a ALT e
provas não avaliam exatamente a AST elevam-se uma semana antes do
função hepática, mas sim, a liberação acréscimo plasmático de bilirrubinas
sanguínea de enzimas no plasma, que e o grau de elevação pode não refletir
é inclusive cerca de 3000 a 7000 a extensão da lesão hepática.
25
Dosagens seriadas traduzem melhor a hemocromatose, lesão hepática
gravidade e, até mesmo, o induzida por metotrexato ou
prognóstico do que uma única amiodarona, hepatite C crônica e na
avaliação. Uma queda das enzimas presença de DHGNA.
para valores normais demonstra
recuperação, a não ser que haja A elevação de ALT ou também
aumento concomitante dos níveis de conhecida como TGP (transaminase
bilirrubina e TP, que pode ser glutamínica pirúvica) é, de certa
indicativo de insuficiência hepática forma, específica de lesão hepática.
aguda grave. Isso porque AST ou TGO
(transaminase glutamínica
Algumas condições podem ser oxalacética) está presente no coração,
preditivas de níveis de no músculo esquelético, nos rins e no
aminotransferases elevados, são elas: pâncreas. Portanto, a elevação de
agudização de hepatite autoimune, AST pode refletir rabdomiólise ou
reativação de hepatite B crônica, lesão destes órgãos. Assim, na
síndrome de Budd Chiari, esteatose maioria das doenças hepáticas, a
aguda da gestação e migração de razão AST/ALT é < 1, ou seja, ALT
cálculo biliar. Elevações moderadas apresentando valores superiores à
(entre 300 e 600 UI/L), geralmente, AST. Mas, na doença hepática
persistem em doenças hepáticas relacionada com o álcool, a razão é
crônicas, como hepatites crônicas e caracteristicamente > 2 porque há
causadas por álcool, e nas obstruções deficiência de piridoxal-5'-fosfato
biliares, exceto quando há passagem nos pacientes alcoólatras, que é
ou migração de um cálculo para o necessário para a síntese da ALT e é
ducto hepático comum que pode menos essencial para a síntese da
resultar em níveis marcadamente AST. Essa deficiência também
altos, às vezes atingindo a casa dos explica por que muitas vezes a
milhares. Os aumentos moderados (< elevação dessas enzimas não é muito
300 UI/L) são inespecíficos, ou seja, importante (< 300 UI/L) na doença
se apresentam em uma ampla hepática alcoólica.
variedade de condições e não são
utilizados como linha diagnóstica Valores de referência:
principal. Frequentemente, estão AST: ATÉ 1 ANO DE IDADE: 30 A 80 U/L

presentes em doenças como cirrose MAIS DE 1 ANO DE IDADE: 10 A 40 U/L


ALT: ATÉ 1 ANO DE IDADE: 5 A 50 U/L
secundária a hepatites virais, doença
MAIS DE 1 ANO DE IDADE: 10 A 40 U/L
hepática gordurosa não alcoólica
(DHGNA), hepatopatias colestáticas,
carcinoma hepatocelular etc. É válido 3. Desidrogenase lática
lembrar ainda que as A DHL é comumente incluída em
aminotransferases podem permanecer análises de rotina e está presente em
normais em certos distúrbios muitos outros tecidos tornando-se
hepáticos, tais como: insensível e inespecífico para lesão

26
hepatocelular. É uma enzima que e, por fim, em urobilinas alaranjadas
catalisa a conversão de lactato a (a maioria destas sendo eliminadas
piruvato, sendo liberada na nas fezes). Esses pigmentos biliares
ocorrência de dano celular. Elevação dão às fezes sua cor típica amarelo-
dos níveis de DHL ocorre em acastanhada. Um quadro instalado de
neoplasias, hipóxia, cardiopatias, hiperbilirrubinemia pode ser
anemia hemolítica, anemia resultado de aumento na produção de
megaloblástica, mononucleose, bilirrubina, diminuição da captação
inflamações, hipotireoidismo, ou conjugação hepática, ou
pneumopatia, hepatites, etilismo, diminuição na excreção biliar, que
pancreatite, colagenoses, trauma e em última análise pode se traduzir
obstrução intestinal. Hemólise pode clinicamente como icterícia.
levar a resultados falsamente
elevados. A bilirrubina total geralmente é
constituída, em sua maior parte, de
Valores de referência: bilirrubina não conjugada, com
ADULTOS: DE 120 A 246 U/L
valores < 1,2 mg/dL (< 20 μmol/L).
CRIANÇAS DE 0 A 3 DIAS: DE 290 A 775 U/L A obtenção das frações de bilirrubina
DE 4 A 9 DIAS: DE 545 A 2.000 U/L permite quantificar a bilirrubina
DE 10 DIAS A 1 ANO: DE 180 A 430 U/L conjugada (direta, que pode ser
DE 2 A 12 ANOS: DE 110 A 295 U/L
medida de forma direta). A obtenção
das frações só é necessária em casos
4. Bilirrubinas de icterícia neonatal ou se a
A Bilirrubina, o pigmento presente bilirrubina estiver aumentada, mas os
na bile, é produzido a partir da outros resultados de testes hepáticos
decomposição das proteínas do heme, estiverem normais, sugerindo que a
sendo parte proveniente de eritrócitos causa não é uma doença do sistema
senescentes. A bilirrubina não hepatobiliar.
conjugada (livre ou não ligada às Hiperbilirrubinemia não conjugada
proteínas plasmáticas) é insolúvel em (fração de bilirrubina indireta > 85%)
água e, por isso, não pode ser reflete um aumento na produção de
excretada na urina. Dessa forma, a bilirrubina, como na hemólise ou
maior parte da bilirrubina não deficiência na captação ou
conjugada é ligada à albumina no conjugação hepática, o que pode ser
plasma. A bilirrubina é conjugada no observado na síndrome de Gilbert.
fígado com o ácido glicurônico para Tais aumentos na bilirrubina não
formar glucuronídeo de bilirrubina, conjugada geralmente são menores
mais solúvel em água. A bilirrubina que 5 vezes o limite normal (< 6
conjugada é então excretada pelo mg/dL [< 100 μmol/L]), a não ser
sistema biliar para o duodeno, no que haja uma doença hepatobiliar
qual é metabolizada em concomitante.
urobilinogênios (alguns dos quais são
reabsorvidos e ressecretados na bile)

27
Hiperbilirrubinemia conjugada mesma forma, aumentos no
(fração de bilirrubina direta > 50%) urobilinogênio têm valor limitado,
resulta da diminuição na formação de não sendo específicos nem sensíveis.
bile ou de sua excreção (colestase).
Quando associado à presença de Valores de referência:
outras anormalidades, o aumento das BILIRRUBINA DIRETA: INFERIOR OU IGUAL A 0,4 MG/DL

bilirrubinas indica a presença de BILIRRUBINA INDIRETA: INFERIOR OU IGUAL A 0,8


MG/DL
disfunção hepatocelular. A
BILIRRUBINA TOTAL: DE 0,3 A 1,2 MG/DL
bilirrubina sérica é pouco sensível BILIRRUBINA TOTAL (RECÉM-NASCIDOS):
para a detecção de insuficiência A TERMO:
hepática e não distingue a colestase MENOS DE 24 HORAS: DE 1,4 A 8,7 MG/DL
da doença hepatocelular. No entanto, DE 24 A 48 HORAS: DE 3,4 A 11,5 MG/DL

o aparecimento de DE 3 A 5 DIAS: DE 1,5 A 12,0 MG/DL


PREMATUROS:
hiperbilirrubinemia grave na
MENOS DE 24 HORAS: INFERIOR A 8,0 MG/DL
colangite biliar primária (também DE 24 A 48 HORAS: INFERIOR A 12,0 MG/DL
chamada de cirrose biliar primária), DE 3 A 5 DIAS: INFERIOR A 16,0 MG/DL
na hepatite alcoólica e na
insuficiência hepática aguda sugere 5. Fosfatase alcalina
um prognóstico reservado.
O aumento no nível desta enzima
Bilirrubinúria reflete a presença de sugere colestase, entretanto, os
bilirrubina conjugada na urina; a resultados não são específicos, uma
bilirrubina se derrama na urina vez que a fosfatase alcalina consiste
porque os níveis sanguíneos estão de diversas isoenzimas e tem ampla
marcadamente elevados, indicando distribuição extra-hepática (placenta,
doença grave. A bilirrubina não intestino delgado, leucócitos, rins e
conjugada, sendo insolúvel em água e principalmente nos ossos). Os níveis
ligada à albumina, não pode ser de fosfatase alcalina elevam-se ≥ 4
excretada pela urina. A bilirrubinúria vezes acima do normal em 1 ou 2
pode ser detectada à beira do leito dias após uma obstrução biliar,
com fitas de testes urinários independentemente do local da
disponíveis comercialmente em obstrução. Os níveis podem
pacientes com hepatite viral aguda ou permanecer elevados por vários dias
outras doenças hepatobiliares, antes após a resolução da obstrução, já que
mesmo da icterícia se tornar evidente. que a meia-vida média da fosfatase é
Mas a precisão diagnóstica desses de cerca de 7 dias. Elevações de até 3
exames de urina é limitada. Os vezes o normal, ocorrem em diversas
resultados podem ser falsos- doenças do fígado, incluindo:
negativos quando a amostra de urina hepatite, cirrose, lesões expansivas
for armazenada por muito tempo, (como nos carcinomas hepáticos),
vitamina C tiver sido tomada ou a doenças infiltrativas (amiloidose,
urina contiver nitratos devido a sarcoidose, tuberculose, metástases,
infecções do trato urinário. Da abscessos) e hepatite sifilítica.

28
DE 1 A 3 ANOS: SEXO MASCULINO DE 124 A 410 U/L;
Casos de elevações isoladas, ou
SEXO FEMININO DE 129 A 376 U/L
seja, quando outros testes de função DE 4 A 6 ANOS: SEXO MASCULINO DE 111 A 367 U/L;
hepática são normais, geralmente SEXO FEMININO DE 114 A 353 U/L
ocorrem em lesões hepáticas focais DE 7 A 9 ANOS: SEXO MASCULINO DE 102 A 374 U/L;
(p. ex., em abscessos e tumores, SEXO FEMININO DE 82 A 396 U/L

obstruções parciais e intermitentes de DE 10 A 12 ANOS: SEXO MASCULINO DE 50 A 430 U/L;


SEXO FEMININO DE 61 A 394 U/L
ductos biliares, na própria hepatite
DE 13 A 15 ANOS: SEXO MASCULINO DE 88 A 463 U/L;
sifilítica e, ocasionalmente, em SEXO FEMININO DE 60 A 193 U/L
doenças infiltrativa). Aumentos DE 16 A 18 ANOS: SEXO MASCULINO DE 62 A 203 U/L;
isolados também ocorrem na SEXO FEMININO DE 56 A 142 U/L
ausência de doenças hepatobiliares,
como em alguns tumores malignos 6. Nucleotidase
sem envolvimento aparente do
fígado, após alimentações gordurosas Aumentos nos níveis desta enzima
(por causa da enzima produzida no são tão sensíveis quanto a fosfatase
intestino delgado), na gestação (por alcalina na detecção de colestase e de
causa da enzima produzida pela obstrução biliar, mas são mais
placenta), em crianças em fase de específicos, quase sempre indicando
crescimento e adolescentes (pelo uma doença hepatobiliar. Uma vez
crescimento ósseo). que os níveis da fosfatase alcalina e
da 5′-nucleotidase nem sempre estão
Os níveis de relacionados, um pode estar normal
gamaglutamiltransferase ou a 5′- enquanto o outro está elevado. Como
nucleotidase, mais específicas do foi anteriormente suscitado, a
fígado, podem diferenciar as fontes dosagem desta enzima é usada no
de origem hepática das extra- diagnóstico de doenças
hepáticas de fosfatase alcalina melhor hepatobiliares. Ela encontra-se
que o fracionamento da fosfatase elevada (4 a 6 vezes) na obstrução
alcalina, que é tecnicamente biliar, colestase intra-hepática e
complexo. Do mesmo modo, a cirrose biliar. Aumentos discretos ou
elevação isolada da fosfatase alcalina níveis normais são encontrados nas
em pessoas idosas assintomáticas doenças parenquimatosas hepáticas.
geralmente tem origem óssea, por
exemplo na doença de Paget, e pode Níveis elevados podem ser
não precisar de investigações observados durante o uso de
adicionais de lesão hepática. anticonvulsivantes e a sua relação
GGT/5-nucleotidase menor que 1,9
Valores de referência: tem sensibilidade de 40% e
ADULTOS: DE 36 A 110 U/L especificamente de 100% para o
CRIANÇAS: diagnóstico preditivo de colestase
DE 1 A 29 DIAS: SEXO MASCULINO DE 89 A 375 U/L; intra-hepática.
SEXO FEMININO DE 57 A 482 U/L
DE 30 D A 11 MESES: SEXO MASCULINO DE 98 A 455 U/L, Valor de referência:
SEXO FEMININO DE 147 A 405 U/L
INFERIOR A 10 UI/L (37º C)

29
7. Gama glutamil transferase laboratório (relação normalizada
(GGT) internacional — INR). A INR é o
parâmetro laboratorial mais preciso
Os níveis desta enzima aumentam para monitorar pacientes em uso de
em doenças hepatobiliares, alguns anticoagulantes. O TP ou a
principalmente na colestase, e INR é um exame importante para
correlacionam-se fracamente com os avaliar a capacidade do fígado de
níveis de fosfatase alcalina e 5′- sintetizar fibrinogênio e fatores de
nucleotidase. Seus níveis não coagulação dependentes de vitamina
aumentam em doenças ósseas, K: fatores II (protrombina), VII, IX e
durante a infância ou durante a X. As alterações podem acontecer de
gestação. A GGT está nas células das forma rápida, uma vez que alguns
vias biliares e a possível lesão dessas dos fatores de coagulação envolvidos
células tende a causar a elevação de apresentam pequena meia-vida
suas enzimas no sangue. É um biológica, como o fator VII com uma
marcador sensível de colestase meia-vida de apenas 6h. Alterações
hepatobiliar e do uso de álcool. Nos indicam disfunções hepatocelulares
quadros de icterícia obstrutiva, níveis graves e são um sinal de gravidade de
5 a 50 vezes acima do normal são doenças hepáticas agudas. Em
encontrados. A GGT apresentando hepatopatias crônicas, TP ou INR
valores duas vezes maior que o valor ascendente indica progressão da
de referência com razão ALT/AST > insuficiência hepática. O TP não se
2:1 sugere consumo alcoólico. Nas altera em hepatopatias leves e,
neoplasias de fígado valores elevados frequentemente, se apresenta normal
podem ocorrer. Níveis de GGT mesmo em pacientes cirróticos. Um
podem elevar-se durante o uso de TP prolongado com alteração do INR
fenitoína, fenobarbital, pode resultar de discrasias, como as
carbamazepina, ácido valpróico e coagulopatias de consumo ou
contraceptivos. Diminuição dos deficiências de vitamina K. Má
valores pode ocorrer no uso de absorção intestinal de gordura, como
azatioprina, clofibrato, estrógenos e a que resulta da colestase, pode
metronidazol. provocar deficiência de vitamina K.
Valor de referência: Em casos de colestase crônica, um
comprometimento hepatocelular
HOMENS: INFERIOR A 73 U/L
MULHERES: INFERIOR A 38 U/L
grave pode ser excluído quando uma
reposição de vitamina K (10 mg, via
subcutânea) propiciar a correção de ≥
8. TP E INR
30% do TP dentro de 24 h.
O TP (tempo de protrombina) pode
Valor de referência:
ser expresso em unidades de tempo
(segundos) ou, preferencialmente, ATIVIDADE: 70 A 100%

como uma razão do TP medido do


paciente em relação ao controle do

30
9. Proteínas séricas de cerca de 20 dias, níveis séricos
levam semanas para se alterar.
Os hepatócitos sintetizam a
maioria das proteínas séricas, como
as globulinas alfa e beta, a albumina
e a maioria dos fatores de coagulação Valor de referência:
(mas não sintetizam o fator VIII, ALBUMINA: 3,5 A 4,8 g/DL

produzido pelo endotélio vascular ou OBS: OS VALORES DE REFERÊNCIA PODEM


a gamaglobulina, produzida pelos SOFRER VARIAÇÕES A DEPENDER DA
MÉTODO E DO LABORATÓRIO. EM GERAL
linfócitos B). Os hepatócitos também ESTÃO DENTRO DE UMA MÉDIA MARCADA
sintetizam proteínas que ajudam no PELA CURVA DE GAUSS PARA MAIORIA DA
diagnóstico de doenças específicas, POPULAÇÃO.
como a alfa-1 antitripsina que se
eleva em caso de DPOC (doença
pulmonar crônica), a ceruloplasmina Referências:
reduzida na doença de Wilson, a Wallach - interpretação de exames
transferrina saturada com ferro e a laboratoriais - 10ª ed. 2016.
ferritina aumentadas na
hemocromatose. Uma vez que o nível Tratado de gastroenterologia - da
graduação à pos-graduação, Schilioma
dessas proteínas se eleva em resposta Zaterka, Jayme Natan Eisig, eds. 2ª ed, são
a danos a tecidos, como em paulo: editora atheneu, 2016.
inflamações, essas elevações não são
específicas para doenças hepáticas. A Schiff's diseases of the liver, twelfth
edition. Eugene R. Schiff . Willis C.
albumina sérica normalmente está Maddrey, K. Rajender Reddy, eds. 12ª ed.
reduzida em hepatopatias crônicas john wiley & sons ltd, 2018.
em razão do aumento do volume de
distribuição desta proteína e da
deficiência de síntese hepática, ou de
ambos. Níveis < 3 g/dL (< 30 g/L)
sugerem síntese diminuída, causada
por um dos seguintes: cirrose
avançada (a causa mais comum),
doença hepática alcoólica,
inflamações crônicas, desnutrição
proteica etc.
A hipoalbuminemia também pode
ser resultado do aumento da perda de
albumina pelo rim na síndrome
nefrótica, pelo intestino nas
gastroenteropatias perdedoras de
proteínas e pela pele nas queimaduras
ou dermatites esfoliativas. Uma vez
que a albumina tem uma meia-vida
31
V. PRINCIPAIS EXAMES gorduras e pobre em
LABORATORIAIS NA carboidratos);
EMERGÊNCIA  Hipoxia celular, incluindo
Autor: Deilton Santos acidose láctica.
Revisor: Isadora Santiago e Jhoyce • Alcalose metabólica: quando há
Oliveira aumento do HCO3 ou redução do
H+.
1. Gasometria Arterial
 Administração excessiva de
A gasometria arterial é um exame álcalis;
que tem por objetivo avaliar a  Alcalose crônica (nefropatia
quantidade dos gases dissolvidos no perdedora de potássio);
plasma sanguíneo do leito arterial e  Esteroides suprarrenais em
avaliar o equilíbrio ácido-base. excesso (doença de Cushing,
Diversas situações clínicas podem aldosteronismo primário).
ocasionar a alteração dos níveis de • Acidose respiratória: quando há
pH sanguíneo, gerando um aumento da pCO2.
desequilíbrio ácido-básico. Quando
 Enfisema, pneumonia, edema
ocorre diminuição de íons de
pulmonar;
hidrogênio (H+), o pH aumenta,
 Broncoconstrição, tampões e
ocasionando alcalose. Ao contrário, fármacos que deprimem o
quando ocorre aumento dos íons de centro respiratório;
H+, o pH diminui, gerando acidose.  Doença pulmonar obstrutiva
Para que haja o equilíbrio entre os ou restritiva.
sistemas, o organismo possui uma
• Alcalose respiratória: quando há
série de componentes
redução da pCO2.
compensatórios.
 Histeria;
É necessário saber que existem
 Estimulação do centro
quatro alterações primárias do
respiratório por aumento da
equilíbrio ácido-básico:
pressão intracraniana;
• Acidose metabólica: quando há  Hipoxia com difusão alveolar
redução do HCO3 ou aumento do global normal de CO2;
H+.  Febre;
 Intoxicação por salicilatos;
 Cetose (DM, inanição,  Ventilação artificial excessiva.
hipertireoidismo, dieta rica em
Os componentes da gasometria
arterial geralmente incluem pH,
32
pressão parcial de O2 (PaO2), em decúbito lateral, com as pernas e
pressão parcial de CO2 (PaCO2), o pescoço em posição neutra. É
concentração de íon bicabornato possível encontrar leucócitos no
(HCO3-), excesso de base (BE) e líquor, em adultos essa contagem
saturação periférica de O2 (SaO2). A varia de 0 a 5 células/mm3, enquanto
PaO2, a PaCO2 e a SaO2 são que em recém-nascidos esse número
componentes das trocas gasosas. O varia de 0 a 30 células/mm3.
pH, a concentração de HCO3- e o BE Hemácias, por sua vez, não são
representam os componentes do frequentes no LSC.
equilíbrio ácido-base.
Tabela 4: Contagem diferencial do LCS.
Tabela 3: Valores de referência na
Tipo de célula Adulto Recém-
gasometria arterial. nascido
Linfócitos 62%± 34 20% ± 18
PARÂMETROS VALORES DE
Células 36%± 20 72% ± 22
REFERÊNCIA
mononucleares
pH 7,35 – 7,45
pO2 90 – 100 mmHg e monócitos
pCO2 35 a 45 mmHg Neutrótófilos 2% ± 5 3% ± 5
HCO3 22 – 26 mEq/L Histiócitos Raros Raros
BE -3,5 a +3,5 mEq/L Eosinófilos Raros Raros
Saturação O2 93,5 – 98,1%

O exame do LCS é necessário


2. Líquido Cerebrospinal (LSC) quando há suspeita de
O LCS é produzido pelo plexo comprometimento por complicações
coroide nos ventrículos laterais e inflamatórias, infecciosas,
terceiro e quarto ventrículos do neoplásicas ou neurológicas. E, a
cérebro e tem, normalmente, aspecto depender dos achados após análise do
límpido e incolor. Nos adultos LCS, podemos suspeitar de algumas
normais o volume total de LCS é de patologias:
90 a 150 ml. Oitenta por cento do  Contagem aumentada de
LCS são encontrados no espaço hemácias: punção hemorrágica
aracnoide do crânio e da medula ou hemorragia subaracnóidea;
espinal, onde pode ser extraída uma  Contagem aumentada de
pequena quantidade para exame, mais neutrófilos: infecção bacteriana
comumente por punção lombar. A ou viral precoce do SNC, TB
pressão do LCS é medida com um precoce do SNC, neurossífilis,
manômetro, em um adulto normal infecção fúngica,
essa pressão está por volta de 90 a contaminação com sangue
180 ml de água, uma vez que esteja periférico através de punção

33
traumática, hemorragia do houver derrame, o líquido pode ser
SNC; aspirado da cavidade afetada, seja
 Contagem aumentada de para diagnóstico seja para alívio da
linfócitos: infecção viral do pressão, comumente para ambos.
SNC, TB do SNC, leucemia
linfocítica aguda ou linfoma do Quanto a análise do líquido
SNC, infecção fúngica do pleural, basicamente dois parâmetros
SNC, neurossífilis, doença são analisados: aspecto do líquido e
parasitária, síndrome de presença de leucócitos. Ao analisar o
Guillain-Barré; aspecto, o líquido pode se apresentar
 Aumento dos eosinófilos: turvo, leitoso ou sanguinolento.
infecção parasitária do SNC, Quando aspecto sanguinolento, há
infecção fúngica do SNC, sugestão de presença de neutrófilos
infecção viral do SNC, indicando uma possível infecção;
neurossífilis, reação alérgica;
quando o aspecto leitoso está
 Aumento dos basófilos:
presente, há sugestão de derrame
leucemia mielógena crônica;
quiloso (quilotórax) em que o
 Linfócitos tumorais: tumores
primários ou metastáticos do líquido se apresenta rico em
SNC; triglicerídios, causado por lesão
 Xantocromia (pigmentação traumática ou neoplásica; já quando
amarelada): marcador de o aspecto é sanguinolento, a
sangramento intracerebral sugestão é de que se trata de punção
prévio. traumática, neoplasia maligna,
pneumonia, traumatismo, estado de
pós-infarto do miocárdio ou infarto
3. Líquido Pleural
pulmonar. Ao se fazer análise do
Em condições normais, existe uma líquido e for encontrada contagem de
quantidade muito pequena de líquido leucócitos >1 × 109/L com linfócitos
pleural (até 50 ml, mas usualmente representando mais de 50% do total,
10 a 20 ml), isso facilita o podemos estar diante de um caso de
movimento das membranas uma tuberculose, câncer, linfoma.
contra a outra. O acúmulo anormal de
líquido é denominado derrame seroso
4. Líquido Ascítico
e pode ser detectado por exame físico
ou radiografia de tórax; a O líquido peritoneal é um líquido
toracocentese e a análise do líquido que age como lubrificante dentro da
pleural costumam ser necessárias cavidade abdominal. Ele é
para determinar a causa. Quando encontrado em pequenas quantidades

34
(geralmente 5 a 20 ml) entre as glicose, amilase e, também,
camadas do peritônio que revestem a marcadores tumorais. Em relação a
parede abdominal. A função do glicose, tradicionalmente, os valores
são semelhantes aos valores de
líquido peritoneal é umedecer a parte
glicose no sangue ou podem ser mais
externa dos órgãos e reduzir a fricção baixos no caso de infecção. Porém, o
causada pelo movimento dos órgãos valor da amilase usualmente aumenta
durante a digestão e a movimentação. na presença de pancreatite. Já os
A análise do líquido peritoneal marcadores tumorais, podem estar
consiste em um grupo de exames que presentes quando há uma doença
avalia esse líquido para determinar a maligna.
causa do seu aumento. O médico Uma vez que há suspeita de
utiliza uma agulha acoplada a uma infecção, exames para pesquisa de
seringa para coletar uma amostra de doenças infecciosas devem ser
líquido peritoneal por meio de um realizados. Entre eles, podem ser
procedimento denominado citados: a coloração de Gram, cultura
de bactérias e antibiograma, pesquisa
paracentese.
de fungos e adenosina deaminase.
Normalmente, o líquido ascético Muito importante, ainda, que seja
apresenta cor de palha e límpido, feita a contagem celular de leucócitos
porém, pode se apresentar com e também hemácias, uma vez que
consistência e coloração alterada. esses parâmetros podem ajudar no
Quando turvo, sugere apendicite, diagnóstico de uma possível doença.
pancreatite, vólvulo intestinal, Quando a contagem das hemácias
ruptura do intestino ou sepse. Tem está superior a 1 × 1011/L, podemos
cor amarela no caso de doença suspeitar de lesão intra-abdominal.
hepática, aspecto leitoso no caso de As peritonites podem estar presentes
obstrução do sistema linfático e é quando a contagem de leucócitos se
esverdeado na presença de bile, apresenta maior que 0,3 × 109/L.
frequente quando há perfuração de
úlcera duodenal, perfuração
intestinal, doença ou perfuração da 5. Eletrólitos
vesícula biliar ou pancreatite aguda. Os eletrólitos são minerais que
O aspecto leitoso pode estar presente carregam uma carga elétrica quando
no derrame quiloso. Por fim, o estão dissolvidos em um líquido,
líquido ascético quando avermelhado, como o sangue. Os eletrólitos do
sanguinolento, sugere punção sangue ajudam a regular as funções
traumática ou lesão intra-abdominal. dos nervos e músculos, e manter
um equilíbrio ácido-base e hídrico.
Além da albumina, normalmente
buscada na análise do líquido, podem Os rins ajudam a manter as
ser investigados a presença de concentrações de eletrólitos através

35
da filtragem de eletrólitos e água do ajuste dos gradientes iônicos, dos
sangue, devolvendo alguns para o quais dependem a transmissão dos
sangue e excretando qualquer impulsos nervosos e a contratilidade
excesso pela urina. Assim, os rins do músculo cardíaco e do músculo
ajudam a manter um equilíbrio entre esquelético.
o consumo diário e a excreção de
eletrólitos e água. O estudo do potássio é importante
para a avaliação do equilíbrio
5.1. Sódio eletrolítico, em arritmias cardíacas,
fraqueza muscular, encefalopatia
O sódio (Na), que é o principal hepática e insuficiência renal.
cátion extracelular, exerce uma
importante influência sobre a Além disso, o diagnóstico e
osmolalidade plasmática. Ele monitoramento da hiperpotassemia e
desempenha um papel central na da hipopotassemia é mandatório em
manutenção da distribuição normal diversas condições, como tratamento
da água e pressão osmótica. O valor do coma diabético, insuficiência
de normalidade do sódio varia de renal, perda hidroeletrolítica grave e
135 a 145 mmol/ℓ. Em alguns casos efeito de certos fármacos.
esse valor pode estar abaixo de 121
ou acima de 158 mmol/l, o que 5.3. Magnésio
implica certo grau de criticidade. O magnésio (Mg) é
Algumas situações podem induzir principalmente um íon intracelular
a elevação sérica de sódio, como associado à absorção GI e excreção
vômitos, diarreia, aporte inadequado renal. Pelo menos 65 a 70% do Mg
de líquido, queimaduras, sudorese estão no estado ionizado e cerca de
excessiva, síndrome de Cushing ou, 35% do Mg sérico estão ligados às
até mesmo, diabetes insípido. Já proteínas. Os valores de referência
outras, induzem a redução, como a para a normalidade estão entre 1,6 e
perda renal de sódio e água 2,4 mg/dℓ. Quando abaixo de 1,0 ou
associada ao uso de diuréticos, acima de 4,9 mg/dℓ, temos quadros
queimaduras, pancreatite, obstrução de hipomagnesemia e
intestinal, perda de sangue etc. hipermagnesemia, respectivamente.

Várias podem ser as causas de


5.2. Potássio elevação do potássio, entre elas:
As concentrações intracelulares insuficiência renal, hipotireoidismo,
elevadas são mantidas pela bomba diuréticos, antiácidos, uso abusivo
de Na-K ATPase, que transporta de laxativos, nutrição parenteral,
continuamente potássio para dentro entre outras causas.
da célula contra um gradiente de
A hipomagnesemia pode ser
concentração. Essa bomba constitui
causada por doenças do trato
um fator crítico na manutenção e
gastrointestinal, diuréticos,
36
antibióticos, hipertireoidismo, 6. Marcadores inflamatórios
aldosteronismo, sepse, sudorese, Marcadores inflamatórios
hiperparatireoidismo e outras. constituem um grupo de proteínas
5.4. Cálcio responsivas extremamente atrelados
a processos inflamatórios. São
O cálcio é necessário para o muitas vezes denominadas proteínas
funcionamento adequado da de fase aguda, mesmo que possam
contração muscular, a condução estar presentes tanto na fase aguda
nervosa, a liberação de hormônios e da inflamação quando na fase tardia,
a coagulação do sangue. Apesar das variando apenas a suas
importantes funções intracelulares, concentrações. Estes biomarcadores
aproximadamente 99% do cálcio do inflamatórios podem ser utilizados
corpo está nos ossos, principalmente em diversas situações clínicas, como
na forma de cristais de em casos de artrite reumatoide,
hidroxiapatita. Cerca de 1% do sepse, infecções bacterianas e lúpus.
cálcio ósseo sofre trocas livres com Dessa forma, essas proteínas estão
o líquido extracelular e, inseridas em contextos inflamatórios
consequentemente, está disponível que cursam com inúmeras mudanças
para tamponar as alterações do no organismo, que vão desde
equilíbrio de cálcio. Os valores alterações da hematopoiese até
normais de referência para alterações hepáticas e
concentração de sérica de cálcio neuroendócrinas. Dentro desse
varia de 8,7 a 10,7 mg/dℓ. contexto, existem os marcadores
O diagnóstico e monitoramento inflamatórios positivos e negativos.
das alterações do nível do cálcio são Os positivos são aqueles que
fundamentais em vários distúrbios, apresentam uma elevação sérica na
incluindo distúrbios das proteínas e vigência de uma inflamação,
da vitamina D, bem como doenças enquanto os negativos têm suas
do osso, rim, glândulas paratireoides concentrações diminuídas.
ou trato GI.
Tabela 5: Principais marcadores
inflamatórios solicitados na emergência.
O nível sérico de cálcio pode estar
Exame Na Normal
aumentado em várias situações como inflamação
hiperparatireoidismo, insuficiência Proteína C AUMENTADO < 0,3 mg/dℓ
renal aguda e crônica, após reativa
Fibrinogênio AUMENTADO 150 a 400 mg/dℓ
transplante renal, rabdomiólise e VHS AUMENTADO HOMEM:0-15
hipofosfatasia. Enquanto a mm/h;MULHER
0-20 mm/h
diminuição é encontrada em Alfa-1 AUMENTADO 88 a 174 mg/dℓ
situações como no antitripsina
hipoparatireoidismo, doenças ósseas, Albumina DIMINUIDO > 16 anos: 3,5 a
4,8 g/dℓ
ingestão insuficiente de cálcio, Transferrina DIMINUIDO 202 a 336 mg/dℓ
dificuldade de absorção, final da
gravidez, entre outras.

37
Referências:

Mary A. Williamson; L. Michael Snyder.


Wallach: interpretação de exames
laboratoriais. Tradução: Maria de Fátima
Azevedo; Patricia Lydie Voeux. 10. ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.

VELASCO, Irineu Tadeu; BRANDÃO


NETO, Rodrigo Antonio; SOUZA,
Heraldo Possolo de; et al. Medicina de
emergência: abordagem prática. [S.l:
s.n.], 2019.

38
Salvador BA

2021

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