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A concepção dogmática do direito

administrativo
Contributo para uma (re)construção hermenêutica

Leonel Ohlweiler

Sumário
1. Dogmatismo e o sentido comum teórico
dos juristas. 2. Dogmática jurídico-administra-
tiva e ideologia. 3. O modo de ser cotidiano da
dogmática jurídico-administrativa: a importân-
cia do sentido. 4. Uma análise crítica dos crité-
rios dogmáticos para definir o direito admi-
nistrativo.

O direito administrativo, como a seguir


será examinado, construiu-se, em regra,
como disciplina marcada pelo dogmatismo,
ou seja, um conjunto doutrinário despreo-
cupado em aprofundar as diversas possibi-
lidades de sentido oriundas de outros cam-
pos do saber, como política, sociologia, his-
tória, filosofia, etc., fundado em alguns dog-
mas previamente estabelecidos e inquestio-
náveis. No presente estudo, buscar-se-á de-
limitar a influência exercida pelo conheci-
mento dogmático1 sobre o direito adminis-
trativo, bem como problematizar sua forma
de atuação e influência exercida em relação
aos operadores do direito, além de colocar
em discussão outros modos de compreen-
der.

1. Dogmatismo e o sentido comum


teórico dos juristas
Um dos grandes filósofos do século XX,
Arthur Kaufmann, ao tecer considerações
Leonel Ohlweiler é Procurador de Justiça. sobre a dogmática, assim referiu: “o dogmá-
Mestre e Doutor em Direito. Professor do tico parte de pressupostos que aceita como
PPGLD da UNISINOS-RS. verdadeiros sem qualquer prova, pensa ‘ex
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datis’. O jurista dogmático não pergunta o ser unificada em uma única abstração uni-
que é o Direito, nem sobre que circunstânci- versal, ou fragmentada em diversas racio-
as, com que extensão e de que modo existe o nalidades locais, mas passa a ser ligada à
conhecimento jurídico” (KAUFMANN, efetividade das diversas problematizações.
2000, p. 26-26), sendo que tais questiona- Outra possibilidade de lidar com o di-
mentos seriam feitos pela filosofia do direi- reito administrativo e os seus diversos insti-
to. O que se busca aqui não é defender o tutos é aquela na qual predomina o aspecto
entendimento segundo o qual a filosofia da resposta, em que determinados elementos
deva substituir a dogmática. Tal seria in- são subtraídos da dúvida e do questionamen-
concebível, mas apenas ressaltar o excessi- to problematológico, “postos fora de questio-
vo grau de dogmatismo2 que tem preponde- namento, mantidos como respostas não ata-
rado no agir cotidiano de alguns juristas e cáveis, eles são, pelo menos temporariamen-
operadores do direito, deixando de proble- te, postos de modo absoluto” (FERRAZ
matizar aspectos fundamentais desse cam- JÚNIOR, 1991, p. 46). No primeiro caso, fala-
po do conhecimento em relação ao Estado se, então, de questões zetéticas e, no segundo,
Democrático de Direito. de questões dogmáticas. No direito administra-
Portanto, esse modo de pensar o direito tivo diversos exemplos poderiam ser enume-
caracteriza-se pelo estabelecimento de pre- rados para detectar a preponderância de um
missas com caráter vinculante, predominan- viés dogmatista; por exemplo, relativamente
do a chamada inegabilidade dos pontos de par- ao princípio da legalidade, mesmo após a
tida (Cf. FERRAZ JÚNIOR, 1995, p. 48)3, cons- chamada viragem hermenêutica do pensa-
truindo-se um discurso monológico em que mento jurídico moderno, insiste-se em labo-
a própria fala já vem previamente habitada rar com a categoria básica de uma “lei-em-
(BOURDIEU, 1994; WARAT, 1994). No âm- si”, olvidando-se a rica pesquisa além des-
bito do próprio direito administrativo, a aná- se restrito universo fenomênico. Obviamen-
lise dos diversos institutos pode ser revesti- te, não se quer dizer a necessidade de aban-
da de duas possibilidades. Na primeira, pre- donar o princípio da legalidade, até porque
valecerá o aspecto da pergunta como um dos constitui-se em importante princípio cons-
principais elementos de investigação cien- titucional, explicitado no artigo 37, caput, da
tífica, e os conceitos tidos como fundamen- Constituição Federal.
tais são postos em dúvida. Como esclarece Mas a atividade de perguntar pelos va-
Ferraz Júnior (1991, p. 45): “se o aspecto riados institutos jurídico-administrativos
pergunta é acentuado, os conceitos-chave, deveria adotar uma orientação diversa,
as dimensões que constituem as normas e aquela na qual os questionamentos fossem
as próprias normas na sua referibilidade a feitos de maneira mais aberta, entendendo
outras normas, que permitem a organiza- os pontos de partida não como dogmas, mas
ção de um sistema de enunciados, são pos- indicações de sentido submetidos a um pro-
tos em dúvida”. cesso de reflexão. A univocidade de sentido
Com efeito, no âmbito desse modo de ser, pregada pelo dogmatismo cria obstáculos
o operador do direito abandona uma postu- impeditivos de uma maior abertura da com-
ra de passividade perante as construções preensão do fenômeno jurídico. Corolário,
significativas postas e herdadas e atua como diversos institutos do direito administrati-
um “questionador comprometido”, no caso, vo adquirem a forma de problemas estan-
comprometido com uma gama de indicações dardizados, como em relação aos atos ad-
constitucionais direcionadas para fazer ministrativos, por exemplo, sendo que os
acontecer o Estado Democrático de Direito, operadores do direito devem primar o seu la-
como será melhor explicitado ao longo des- bor pelo que Lenio Luiz Streck nominou senti-
te estudo. A compreensão, assim, deixa de do-primevo-fundante (STRECK, 1999, p. 74).

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Em relação a esse aspecto, Ferraz Júnior sa-se a encontrar aquele conjunto de regras
(1991, p. 42) alude como objetivo da dogmá- capaz de fornecer o “correto” sentido, a “ver-
tica jurídica criar condições para a decidi- dadeira” significação, mas que, em última
bilidade de conflitos juridicamente defini- análise, não passa da aceitação de um “arbi-
dos, valendo-se para tal dos modelos analíti- trário juridicamente prevalecente” (STRECK,
co, hermenêutico e empírico que são intercam- 1999). Não se pode olvidar que a dogmática
biáveis. No modelo analítico mencionado, o jurídica, dentro de uma perspectiva herme-
texto legal adquire importância capital no nêutica, faz a lei falar (FERRAZ JÚNIOR,
sentido de construir toda e qualquer possibi- 1995), tornando-se uma forma de instituci-
lidade de sentido. A conseqüência é que onalizar dogmatismos de sentido, quer di-
“as diversas respostas dadas a estas zer, há um controle das conseqüências jurí-
questões levaram a Ciência do Direito dicas da incidência das normas, e o seu sen-
a constituir-se como uma espécie de tido vem, desde o seu aparecimento, “do-
analítica das figuras jurídicas, cuja mesticado”. Dentro dessa perspectiva, o re-
finalidade última seria a proposição levante para a atividade do jurista seria a
de um saber sistemático capaz de dar busca da “correta interpretação” dos termos
um quadro coerente e integrado do jurídicos, por meio da utilização de proces-
direito como conexão de normas e dos sos postos a sua disposição pela “melhor
elementos típicos que as compõem” doutrina”, “jurisprudência dominante”, ol-
(FERRAZ JÚNIOR, 1991, p. 51-52). vidando-se, muitas vezes, a criação, no caso
O operador do direito analítico adota uma concreto, de uma “teratologia significativa”.
postura formalista, no sentido de buscar no Um aspecto importante desse modelo
sistema jurídico as informações do mundo consiste no estabelecimento de métodos de
circundante, exercendo a sua tarefa por meio interpretação, institucionalizando-se uma
de standards jurídicos. Logo, há um distan- discussão sobre qual o melhor para que seja
ciamento da práxis social, sendo engendra- atingida a mens legislatoris ou a mens legis,
da uma técnica de neutralização dos confli- conforme seja adotada uma concepção sub-
tos econômicos, políticos e sociais. jetivista ou objetivista. Como decorrência,
O grau de abstração é tão grande que os mais uma vez estabeleceu-se um processo
problemas jurídicos são tratados unicamen- de abstração do conflito social, provocan-
te dentro de um imaginário reduto normati- do-se um deslocamento discursivo. Ade-
vo, por meio de instituições, conceitos e clas- mais, as questões fáticas são definidas juri-
sificações dogmáticas. Os conflitos não são dicamente, com o objetivo de resgatar aque-
tomados em todos os seus aspectos, mas tra- la racionalidade perdida do “mundo do le-
duzem uma questão de decidibilidade, ou gislador racional”. Segundo Ferraz Júnior
seja, deve haver a resolução da questão com (1995, p. 308), a “Ciência Jurídica, de mode-
um mínimo de perturbação social. lo hermenêutico, tem por finalidade inter-
O segundo modelo dogmático apresen- pretar textos e suas intenções, tendo em vis-
tado pelo autor supracitado é o hermenêuti- ta uma finalidade prática”, qual seja, criar
co. Após ser identificado o direito analitica- condições para que os problemas possam
mente, a próxima tarefa reside em fixar as ser decididos com um mínimo de perturba-
condições a partir das quais tal direito será ção social. Esse processo de abstração reve-
entendido, ou seja, elabora-se a construção la uma “astúcia da razão dogmática”4. O
de um processo de atribuição de sentido. conflito social acaba perdendo-se no ema-
Aqui, a atividade do operador do direito não ranhado de construções técnico-jurídicas,
se restringe à busca de um texto legal capaz passando a ser definido em termos jurídi-
de abarcar o conflito; feito isto – normaliza- cos e em termos juridicamente interpretáveis
da a parcela fenomênica da questão –, pas- e decidíveis.

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Por fim, o último modelo apresenta-se mas são “as realizações científicas univer-
como conseqüência dos dois anteriores, aí salmente reconhecidas que, durante algum
residindo o caráter intercorrente antes refe- tempo, fornecem problemas e soluções mo-
rido. O conflito já se apresenta instituciona- delares para uma comunidade de pratican-
lizado. Agora, será feito um trabalho de ar- tes de uma ciência” (KUHN, 1995, p. 13)5.
gumentação jurídica para “racionalmente” É importante especificar, novamente, a
demonstrar que aquele problema enquadra- diferenciação entre dogmática jurídica e
se no sentido retirado do texto legal. Pode- dogmatismo. A primeira mostra-se útil, a fim
se dizer que, neste modelo, o “pensamento de propiciar a construção de um conheci-
jurídico constitui-se um sistema explicativo mento jurídico, fornecendo elementos para
do comportamento humano enquanto regu- as pré-compreensões dos operadores. O se-
lado por normas” (FERRAZ JÚNIOR, 1991, gundo merece maiores críticas, pois estabe-
p. 87). Posicionamento semelhante fornece lece vinculações arbitrárias a certos dogmas
Warat (1995, p. 17), para quem o conheci- – instituindo-os como pontos de partida e
mento dogmático busca, portanto, por meio de chegada da própria discussão. Aqui re-
do desenvolvimento de três etapas, o esta- side o caráter diferencial, pois a dogmática
belecimento de conceituações prévias, a fi- – como construção doutrinária – é vista
xação de dogmas e a sistematização. Num como instrumental imprescindível para a
primeiro momento, pelo método exegético, aplicação do direito. Inseridos em tal reali-
são estabelecidos conceitos fulcrados em dade estão os operadores do Direito, em ge-
textos legais, ensejando-se um certo reduci- ral, condicionados pelos paradigmas do-
onismo metodológico, prevalecendo a visão minantes e determinados pelo “sentido co-
“sobre” o direito positivo. mum teórico dos juristas”, que, segundo
A seguir, ocorre a fixação de verdadei- Warat (1994, p. 13), “designa as condições
ros dogmas jurídicos, culminando com a das verdades nas diferentes práticas de
“descoberta” de princípios jurídicos extraí- enunciação e escritura do Direito”, compre-
dos dos textos legais. Não obstante, não se- endendo “as diversas representações, ima-
ria proveitoso estabelecer conceituações e gens, pré-conceitos, crenças, ficções, hábi-
dogmas sem a devida sistematização desse tos de censura enunciativa, metáforas, este-
conhecimento jurídico. Eis a terceira etapa, reótipos e normas éticas que influenciam os
como bem referido pelo autor destacado, atos e decisões jurídicas”.
“chegando-se assim a meta perseguida pela O discurso, dentro da idéia supra-referi-
ciência de matriz positivista, que é a consti- da, é sempre feito como se houvesse uma
tuição de uma disciplina específica, objeto voz incógnita, atrelado a uma realidade dita
de um conhecimento, em um sistema” “dominante”. Destarte, o estabelecimento de
(WARAT, 1995, p. 19). um sentido comum, apto a determinar uma
Facilmente, é possível constatar a utili- realidade discursiva, apresenta-se com ca-
zação de processos paradigmáticos pela ráter de funcionalidade, direcionado para o
dogmática jurídico-administrativa, pois os objetivo de estabelecer um controle social,
dogmas valem em razão de serem aceitos sendo que “o controle jurídico da sociedade
por uma comunidade científica. Os paradig- passa a ser feito através de um saber jurídi-
mas exercem uma função de delimitar a dis- co acumulado” (WARAT, 1994, p. 13)6.
cussão científica, ensejando uma suspensão As vozes de um discurso impregnado de
de maiores apreciações críticas que estejam dogmatismo, portanto, não estão direciona-
fora de sintonia com os paradigmas vigen- das para o desvendar de verdades ou con-
tes, o que equivale a não adotar uma con- cretização de critérios confiáveis, como pro-
cepção problematológica. Vale mencionar o palado muitas vezes, por intermédio de
entendimento segundo o qual os paradig- “máscaras de autoridade”, mas, com certe-

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za, decorrem da opinião do sentido comum fusão de horizontes. Partindo do pressuposto
e ficam circunscritas aos paradigmas funci- de que toda compreensão é histórica, aque-
onalmente produzidos. O sentido comum le conjunto de elementos que chegam da tra-
teórico dos juristas atua de maneira invisí- dição não devem ser simplesmente ignora-
vel no interior do Direito (WARAT, 1994), dos. No âmbito do direito administrativo,
contribuindo para a solidificação de padrões os operadores e juristas estão inseridos
de significação arbitrariamente impostos, numa dada tradição com a qual devem man-
transmitidos como “realidades verdadeiras”, ter uma postura dialógica7. A compreensão
escondendo aí um componente político. resulta dessa fusão de horizontes do intér-
A questão da verdade, inclusive, tem so- prete e da tradição, devendo-se, assim, vis-
frido mutações, no sentido de ser conside- lumbrar a dogmática como um dado con-
rada “não como uma garantia, a mais segu- junto de significações construído pelo sen-
ra e sólida das garantias, do conhecimento, tido comum. Para Gadamer (1993), e esse
mas como o objecto de uma suspeita, e de aspecto de sua teorização é crucial para o
uma suspeita extrema, radical, quanto ao seu presente estudo, o conhecimento é históri-
valor na compreensão do mundo, dos fenô- co. Cotidianamente, tem-se a impressão, por
menos, dos acontecimentos” (CARRILHO, parte daqueles que estão mergulhados no
1995, p. 31). As variadas enunciações dos senso comum, que a compreensão dos entes
institutos jurídico-administrativos, como administrativos é sempre a-histórica.
serviços públicos, contratos administrati- Mas, hermeneuticamente, o entender
vos, atos administrativos, etc., não podem nunca pode lograr segurar definitivamente
ser vislumbradas dentro do “mito do refe- seu objeto, sequer havendo um método ca-
rente puro”, no qual prevalece a concepção paz e suficiente de concretizar essa tarefa.
correspondencial de verdade, na medida em As variadas indicações conceituais do di-
que um enunciado é verdadeiro quando reito administrativo constituem-se muito
corresponde aos fatos, surgindo, assim, mais em “experiências de sentido”, experi-
“uma condição semântica de significação, ências essas nas quais os juristas e opera-
a partir da qual se aceita como significati- dores possuem profunda participação. Co-
vos, unicamente os enunciados reduzidos rolário, em todo modo de ser dogmático já
a uma dimensão denotativa unívoca” há uma espécie de “antecipação de senti-
(WARAT, 1995, p. 316). O sentido comum do”, isto é, o sentido construído dos entes
teórico dos juristas leva ao estabelecimento administrativos manifesta-se porque já se
de “sistemas conotativos dominantes” que faz a leitura desde determinadas expectati-
servem de base para a estrutura argumenta- vas de sentido. O que não se pode perder de
tiva dos operadores do direito. Haveria a vista é que a compreensão é um ato de con-
constituição de um paradigma significante validação constante, até porque entender a
a contaminar as práticas jurídicas. Pode-se coisa é sempre entender-se com a coisa.
dizer que não há uma dita “realidade ver-
dadeira”, mas apenas uma “realidade-sig- 2. Dogmática jurídico-
nificativamente-prevalecente”. administrativa e ideologia
Aqui reside o grande desafio para os que
lidam com o direito administrativo, laborar Na medida em que o modo de pensar
com a dogmática jurídica, mas sem cair no dogmático do direito administrativo leva o
dogmatismo. Uma teorização interessante operador do direito a uma espécie de roboti-
para lidar com a questão é a de um dos gran- zação de sentidos, sempre surge o tema re-
des filósofos do século XX, Hans-Georg ferente às influências da ideologia, abando-
Gadamer, em sua principal obra Verdade e nando-se, no entanto, a concepção por meio
Método, na qual menciona a importância da da qual ela era vinculada ao aspecto da re-

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presentatividade. Como salienta Zizek A concepção ideológica8 do senso co-
(1996a, p. 13) “a ideologia nada tem a ver mum busca eliminar as possibilidades sig-
com a ilusão, com uma representação equi- nificativas, apresentando as evidências de
vocada e distorcida de seu conteúdo social”. sentido emanadas de sistemas conotativos
Adota-se esse pressuposto teórico por consi- dominantes. Destarte, a sistematização de
derar-se que toda compreensão está fundada critérios dogmáticos para a resolução de
em uma concepção de mundo. Não há co- conflitos entre cidadãos e a Administração
nhecimento destituído de um conjunto de pré- Pública, de certo modo, revela uma funcio-
compreensões que o alimenta. Em relação a nalidade da dogmática, no sentido de esta-
tais representações de mundo, com certeza, o belecer a “comensurabilidade do valor jurí-
que se discute reside, exatamente, em criticar dico” dos fatos do mundo fenômenico, na
ou não tais elementos determinantes do co- medida em que ela é que vai calibrar os pro-
nhecimento. Logo, torna-se importante vis- cessos hermenêuticos. Estabelece-se um pro-
lumbrar que uma ideologia não é necessaria- cesso de fetichização dos dogmas produzi-
mente falsa. Segundo Zizek (1996a, p. 13-14), dos, com pitadas de universalidade que se
o conteúdo positivo pode ser verdadeiro: prolongam no tempo, como se as determi-
“Assim, uma ideologia não é ne- nações de sentido estivessem excluídas do
cessariamente ‘falsa’: quanto a seu ciclo natural da geração e da deterioração9.
conteúdo positivo, ela pode ser ver- No direito administrativo, como nos de-
dadeira, muito precisa, pois o que re- mais ramos da Ciência Jurídica, salvo raras
almente importa não é o conteúdo afir- exceções, há um vício de contemplação,
mado como tal, mas o modo como esse como menciona Coelho Neto (1996, p. 86),
conteúdo se relaciona com a postura estabelecendo-se como pressuposto de que
subjetiva envolvida em seu próprio no interior de sua própria arquitetura vão
processo de enunciação. Estamos ser achadas as respostas significativas,
dentro do espaço ideológico propria- como se nele fosse possível encontrar a “cha-
mente dito no momento em que esse ve mágica”, por meio de um jogo de elemen-
conteúdo ‘verdadeiro ou falso’ (se ver- tos internos. Certos postulados típicos de
dadeiro, tanto melhor para o efeito um Estado liberal-individualista ainda são
ideológico) é funcional com respeito a utilizados com exclusividade pelos opera-
alguma relação de dominação social dores, em que pese vivenciarmos uma or-
(“poder”,“exploração”) de maneira dem constitucional voltada para a constru-
intrinsicamente não transparente: ção de um Estado Social e Democrático de
para ser eficaz, a lógica de legitima- Direito (art. 1 o, CF). As lições sobre a legali-
ção da relação de dominação tem que dade, por exemplo, demonstram que a lei,
permanecer oculta”. de um modo geral, é tratada como uma subs-
Dessa forma, uma das grandes questões tância imutável, uma substância sobre a
da dogmática jurídico-administrativa não qual o tempo não exerce nenhum poder,
está exclusivamente no conteúdo que enun- constituída de uma dimensão sublime, in-
cia, mas naquilo que deixa de dizer; não está destrutível e imutável.
na presença, mas na ausência, pois a ideo- Algumas construções doutrinárias, ain-
logia depende de sua capacidade de ser in- da dentro do paradigma ficcional de cons-
visível, de como tal não ser percebida. A trução de um sistema logicamente coerente
questão da ideologia não exige um trabalho e harmônico, capaz de abarcar toda a reali-
no âmbito da identificação de conteúdos dade, estão sempre engendrando esquemas
ideológicos, ou seja, o conteúdo por trás da de redefinição, adquirindo os contornos do
forma, mas em desnudar o segredo dessa cadáver da vítima sádica de que fala Slavoj
própria forma. Zizek (1996b, p. 305), “que suporta todas as

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torturas e sobrevive com sua beleza imacu- forte carga de elementos externos, não exis-
lada”. A dogmática jurídica, de cunho ex- tindo uma lei em si reveladora de sentido. O
cessivamente formalista, também atua como funcionamento da ideologia, com efeito, é
uma autoridade simbólica, conferindo a baseado em um distanciamento cínico, que
determinados esquemas de sentido o cará- faz parte do jogo, quer dizer, “a ideologia
ter de objeto sublime, como um “indestrutí- dominante não pretende ser levada a sério
vel corpo dentro do corpo”. Um efeito im- no seu sentido literal” (ZIZEK, 1996b, p.
portante é ensejar a transformação dos ope- 311)12. De qualquer sorte, a ideologia não é
radores do direito em “solipsistas práticos”: mais tida como uma falsa consciência da
sujeitos do conhecimento que, por estarem realidade, como aquilo que mascara, pois
envoltos em um grau de abstração, no mo- passa a ser um sistema que reivindica a ver-
mento da aplicação da lei, desconsideram a dade, “uma mentira vivenciada como uma
dimensão social do seu ato, que fica reduzi- verdade, uma mentira que pretende ser le-
do a um encontro casual de indivíduos – vada a sério” (ZIZEK, 1996b, p. 314). Agora,
Juiz, Promotor, Advogado – autorizados deve ser questionada a razão pela qual a lei
pela dogmática jurídica10. continua a ser tida como uma lei-em-si, ca-
Poder-se-ia dizer então que, na ideolo- paz de abarcar toda a realidade social, quan-
gia, sua própria existência implica o não do, em última análise, é crível admitir a pre-
conhecimento do seu processo de engendra- sença de fortes componentes de dominação
mento por parte dos participantes; ausên- no conhecimento jurídico. Qual a razão para
cia de conhecimento que é capaz de assegu- que alguns operadores dogmáticos perma-
rar a sua efetividade social. Eliseu Veron, neçam atrelados a determinados postulados
inclusive, chega a falar de uma “gramática metafísicos 13?
de engendramento” como responsável pela Mostra-se importante entender a ques-
introdução de padrões significativos no tão da discordância entre o que as pessoas
imaginário social. O entendimento dessa efetivamente fazem e o que pensam estar
procedimentalização passa a ser importan- fazendo, conforme menciona Zizek (1996b,
te para detectar que a produção de sentidos p. 314). Estabelecendo um paralelo entre lei
jurídicos está intimamente ligada com o so- e Direito, os operadores jurídicos sabem
cial, “sendo impensável conceber qualquer muito bem que a lei é apenas uma das mani-
fenômeno de sentido à margem do trabalho festações do Direito, mas, em sua prática,
significante de uma cultura” (VERON, 1980, agem como se houvesse um Direito-em-si,
p. 173). No entanto, o que parte dos juristas como entidade abstrata, realizado apenas
ainda continuam a fazer é exatamente o na lei. Há todo um processo de coisificação
oposto, isolando o exame dos diversos ins- do Direito, o que leva também a um distan-
titutos do direito administrativo dos proces- ciamento da realidade social. Os operado-
sos de produção social e de engendramento res são guiados por uma “ilusão fetichista”
historicamente localizados. Nesse campo do (ZIZEK, 1996b, p. 314)14. Com efeito, na com-
conhecimento, há também uma relação so- preensão de um preceito legal, dentro da
cial que assume perante os olhos dos opera- visão dogmática, já está a ilusão, ao lado
dores jurídicos a forma de uma relação en- daquilo que as pessoas fazem. Mas o que os
tre coisas (Cf. ZIZEK, 1996b, p. 308)11, em operadores desconhecem é que a sua pró-
que as relações jurídicas passam a ser coisi- pria atividade é guiada por uma ilusão, por
ficadas. uma inversão fetichista. Por certo, não des-
No entanto, é claro que os próprios ope- conhecem a sua atuação como aplicadores
radores do Direito têm conhecimento da for- jurídicos, mas sim a ilusão que estrutura sua
ma como são feitas certas construções dou- realidade, sua atividade social, sendo essa
trinárias e jurisprudenciais, havendo uma ilusão considerada e inconscientemente

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chamada de “fantasia ideológica” (Cf. gunda dimensão do homem” (BOURDIEU,
ZIZEK, 1996b, p. 316)15. 1994, p. 14).
A dogmática jurídica, muitas vezes, fun- Pierre Bourdieu (1994, p. 15) estabeleceu
ciona como o que se chama de “roda tibeta- a seguinte definição:
na de orações”(ZIZEK, 1996b, p. 317)16, isto “sistema de disposições duráveis, es-
é, os problemas referentes são colocados em truturas estruturadas, predispostas a
conjuntos abstracionais e passam a ser re- funcionarem como estruturas estrutu-
solvidos pela dogmática e não pelos opera- rantes, isto é, como princípio que gera
dores. Eles passam a não falar por si, mas e estrutura as práticas e as represen-
por meio dela. Logo, retira-se a responsabi- tações que podem ser objetivamente
lidade dos aplicadores, transferindo-se a ‘regulamentadas’ e ‘reguladas’ sem
questão para a dimensão da formulação de que por isso sejam o produto de obe-
conceitos jurídicos. No entanto, a dogmáti- diência de regras, objetivamente adap-
ca jurídica não poderia ser obedecida “sim- tadas a um fim, sem que se tenha ne-
plesmente porque é”. Para que funcione cessidade da projeção consciente des-
“normalmente”, é imprescindível um pro- te fim ou do domínio das operações
cesso que lhe atribua um caráter de neces- para atingi-lo, mas sendo, ao mesmo
sária, cuja fundamentação passa a residir tempo, coletivamente orquestradas
no aspecto da funcionalidade (ZIZEK, sem serem o produto da ação organi-
1996b, p. 318-319). O Direito possui um ri- zadora de um maestro”.
tual ideológico. Assim, os operadores do A partir de uma visão dogmatista, os varia-
Direito devem abandonar o caráter proble- dos institutos do direito administrativo são
matológico de suas argumentações para sim- aplicados pelos operadores jurídicos con-
plesmente submeterem-se ao “ritual-ideoló- forme o sentido do jogo, por intermédio de
gico-jurídico”, pois repetindo os gestos sem práticas voltadas para fazer o que havia de
sentido, agindo como se acreditassem, a ser feito e sem a necessidade de tematizar a
crença há de vir! aplicação, gerando condutas “juridicamente
É importante referir, ainda dentro das adequadas”.
idéias do autor supracitado, que uma ideo-
logia pega para valer quando consegue de- 3. O modo de ser cotidiano da
terminar o modo da experiência cotidiana dogmática jurídico-administrativa: a
do homem, da própria realidade, quando se
importância do sentido
passa a aplicar e entender a interpretação
de uma forma robotizada e banalizada pe- Considerando o que até o momento foi
las concepções racionalistas e abstratas da problematizado em relação ao pensamento
dogmática jurídico-administrativa. Aqui dogmático, é crível afirmar o seu caráter co-
parece aplicável a noção de habitus, exposta tidianamente metafísico-objetificador. A
por Pierre Bourdieu, como sendo aquela pre- metafísica constitui-se numa forma de com-
disposição compartida no âmbito do imagi- preender o sentido dos entes administrati-
nário dos juristas. A noção de habitus foi uti- vos, mas de forma objetificada, caracterizan-
lizada pelo autor com base em lições anti- do-se pela idéia de (a) fundamento último e
gas da própria escolástica, sendo tal expres- (b) pela compreensão auto-referencial (Cf.
são relacionada com um modus operandi. MICHELAZZO, 1996, p. 41)17. Com relação
Vale referir, “como disposição estável para ao primeiro aspecto, as construções dogmá-
se operar numa determinada direção, atra- ticas primam pela idéia de fundar ontica-
vés da repetição criava-se, assim, uma certa mente os entes jurídicos, ou seja, fixam um
conaturabilidade entre sujeito e objeto no determinado sentido que é tido como inques-
sentido de que o hábito se tornava uma se- tionável. Utilizando a expressão de Tércio

178 Revista de Informação Legislativa


Sampaio Ferraz Júnior, trata-se da inegabi- rio de igualdad formal que consagra
lidade dos pontos de partida. Nada há além la ideología liberal y con la neutrali-
do dito dogmaticamente pelo senso comum dad jurídica que se deriva del mismo”.
teórico dos juristas, conforme, inclusive, já Dessa forma, é possível evidenciar que,
ressaltado anteriormente. no labor cotidiano de certas práticas dog-
Portanto, as teorizações tradicionais não máticas do direito administrativo, ainda há
desenvolvem um trabalho mais profundo esse pendor para direcionar o processo de
sobre o sentido dos entes administrativos, compreensão do fenômeno jurídico-admi-
laborando dedutivamente com um arbitrá- nistrativo à realização da igualdade formal,
rio juridicamente prevalecente, isto é, aque- como se fosse crível alcançar um direito ad-
le sentido legal aceito pela comunidade dos ministrativo perfeito, suscetível de uma qua-
juristas. Olvidam que as coisas do mundo se-materialização lógico-dedutiva. Uma das
somente são compreendidas a partir daqui- deletérias conseqüências de tal modo de
lo que chega como sentido. É preciso, assim, pensar consiste no papel superficial atribu-
construir uma nova Teoria do Direito Ad- ído ao intérprete, ao administrador público
ministrativo, dando-se conta de que a com- e ao operador do direito em geral, como se
preensão dos entes administrativos é um não desempenhassem atividade primordi-
existencial. Logo, (a) o modo existencial de al no fazer acontecer dos textos legais, pois
compreender é lançado para uma situação tal seria resultado de uma dada metodolo-
concreta; (b) a compreensão ocorre num es- gia. Desconsideram, assim, que a compre-
paço discursivo e (c) esse modo existencial ensão humana sempre chega antes de qual-
de compreender é sempre entendimento quer método.
(possibilidade de sentido dos entes jurídi- Logo, pode-se detectar que a compreen-
cos e de nós mesmos) (Cf. GUIGNON, 1993, são dogmática dos entes administrativos,
p. 28). em regra, é inautêntica, no sentido de lança-
A dogmática administrativista de viés da para aquilo que Martin Heidegger deno-
metafísico, no seu modo de ser cotidiano, minou o Impessoal, a instância do coletivo.
age como se compreender fosse um proces- Lançada para o modo de ser do impessoal,
so abstrato, fruto de universais, corolário da a função social da dogmática jurídica passa a
recepção do chamado direito racional-for- ser: a) inserir o intérprete numa instância
mal, expressão utilizada por Max Weber e de superficialidade, pois não há como tare-
aludida por Manuel Calvo Garcia (1994b, fa do operador do direito problematizar os
p. 90), ao tratar do caráter excessivamente sentidos, mas apenas acoplar aos casos
abstrato da aplicação do direito como requi- concretos aquilo que lhe é dado previamen-
sito imprescindível para um modo de ser te pelo sentido comum teórico; b) facilita-
racional, segundo as concepções ideológi- ção, pois o papel da dogmática é, exatamen-
cas liberais: te, evitar a angústia do estranhamento por
“la aplicación del derecho no debía parte do intérprete, deslocando para a esfe-
tener en cuenta más que las caracte- ra do impessoal a tomada de decisão, (c) cri-
rísticas generales, unívocas, de los ando a instância de evidência, o que leva o
hechos y debía consistir en la aplica- jurista a ficar desconectado do mundo da
ción de leyes abstractas e generales. vida.
Esto es, debía excluirse de la interpre- É possível defender o entendimento se-
tación cualquier critério substantivo gundo o qual as teorizações tradicionais do
ajeno al contenido abstracto y general direito administrativo partem do pressupos-
del derecho y a sua racionalidad for- to de que o fundamento dos entes administrati-
mal, para evitar que la aplicación del vos é um fundamento pronto e acabado quan-
derecho pudiera romper con el crite- do, hermeneuticamente, o fundamento só

Brasília a. 42 n. 167 jul./set. 2005 179


resulta acessível como sentido. O que mui- mática administrativista poderia contribuir
tos não se dão conta é que não há uma idéia para desenvolver uma espécie de responsa-
correspondencial entre as coisas e a com- bilidade fenomenológica, pois o operador do
preensão, pois, no campo do direito admi- direito é responsável pelo sentido que pro-
nistrativo, os entes jurídico-administrativos duz.
são vislumbrados com um dado sentido Outra importante crítica ao pensamento
aberto pelo homem. A função social da dog- tradicional relaciona-se com a compreensão
mática jurídica poderia consistir em ressal- a respeito da linguagem. Essa análise pro-
tar que a produção de sentidos jurídicos não blemática da linguagem foi desenvolvida
se dá de forma fechada e definitiva, pois, em por filósofos importantes como Martin Hei-
razão do caráter histórico de toda compre- degger e Hans-Georg Gadamer, esse último
ensão humana, possui um horizonte verda- especialmente em sua obra Verdade e Méto-
deiramente mutável. do. O pensamento jurídico preponderante
A dogmática tradicional seqüestra o tem- adota uma concepção ultrapassada de lin-
po da existência compreendedora, do ho- guagem, como mero instrumento que veicu-
mem que compreende, na medida em que la “essências”, uma terceira coisa que se
objetifica os entes administrativos ao con- interpõe entre o sujeito e o objeto, conforme
gelar os seus sentidos. No entanto, descon- a percuciente crítica desenvolvida, de for-
sidera-se que não há compreensão total das ma inédita, por Streck (2004, p. 196):
possibilidades de ser dos entes administra- “A linguagem, então, é totalida-
tivos. Há sempre uma falta. A dogmática de; é abertura para o mundo; é, enfim,
jurídica, por vezes, trabalha como se fosse condição de possibilidade. Melhor
senhora do tempo. Uma teorização do direi- dizendo, a linguagem, mais do que
to administrativo, que não pretende cair na condição de possibilidade, é consti-
tentação metafísica, teria que ser construí- tuinte e constituidora do saber, e, por-
da como indicação de sentido, mas levando tanto, do nosso modo de ser no mun-
o intérprete a uma espécie de culpa existen- do, que implica as condições de pos-
cial de não estar sendo a possibilidade de sibilidades que temos para compreen-
ser a si mesmo e que tivesse a consciência der e agir. Isto porque é pela lingua-
de que nunca ocorre a completa materiali- gem e somente por ela que podemos
zação de sentido dos entes jurídico-admi- ter o mundo e chegar a esse mundo.
nistrativos. Outrossim, poderia contribuir Sem linguagem não há mundo, en-
para desvelar novas possibilidades de sen- quanto mundo”.
tido impensadas dos entes administrativos. A dogmática jurídica, normalmente, tem
Fazer acontecer os entes na substancialidade contribuído para a construção de uma lin-
constitucional ainda é uma importante tarefa guagem incapacitante para fazer acontecer
crítica a ser desenvolvida, o que, aliás, já o sentido constitucional dos entes adminis-
acontece por parte de alguns juristas, diga- trativos. Alguns exemplos podem ser men-
se de passagem. cionados. Circulam em conhecidos manu-
No entanto, em geral, a dogmática de ais de direito administrativo enunciados
cariz metafísico-objetificadora trabalha como “na interpretação da lei, deve o intér-
como se houvesse uma verdade absoluta. E prete buscar o verdadeiro sentido”; “cum-
por quê? Em virtude de não laborar com a prir simplesmente a lei na frieza de seu tex-
temporalidade do sentido. Faz-se mister to não é o mesmo que atendê-la na sua letra
construir uma dogmática que seja capaz de e no seu espírito”; “obedece o princípio da
dar-se conta de que o desvelar, o fazer acon- finalidade o ato administrativo que for pra-
tecer o sentido dos entes depende do modo ticado com finalidade pública”; “a razoabi-
de ser do homem compreendedor. A dog- lidade não pode ser lançada como instru-

180 Revista de Informação Legislativa


mento de substituição da vontade da lei pela práticas objetificadoras, especialmente aque-
vontade do julgador ou do intérprete, mes- las referentes ao controle dos atos adminis-
mo porque cada norma tem uma razão de trativos. Com efeito, a superação desse agir
ser”, etc. encobridor exige que a Teoria do Direito
Daí reside a seguinte questão: a dogmá- Administrativo passe a entabular maior
tica administrativista pode contribuir para diálogo com a filosofia. Há de se problema-
construir uma linguagem capaz de abrir o tizar o modo de ser da investigação dogmá-
mundo? É possível responder sim, na medi- tica realizada.
da em que se assuma como instância capaz No seu modo de ser cotidiano, o sentido
de desenvolver uma linguagem originária, comum teórico não trabalha com a possibi-
quer dizer, que nomeia pela primeira vez o lidade de sentido dos entes administrativos,
ente. Como mencionava Martin Heidegger, mas com instâncias de evidência. A partir
a linguagem é a casa do ser. Infelizmente, mui- de uma perspectiva mais hermenêutica, a
to ainda há para se fazer de modo a que o dogmática poderia desenvolver uma ativi-
pensar objetificador da dogmática tradicio- dade de descrição dos indícios formais18, não
nal deixe de produzir uma linguagem me- como conceitos, mas possibilidades de sen-
tafísica, como, por exemplo, a linguagem que tido, assumindo-se mais como conhecimen-
estrutura o princípio da “supremacia” do to empírico do direito administrativo. Os
interesse público, da intangibilidade do entes administrativos que estão inseridos
mérito administrativo, da presunção de le- nesse conhecimento empírico já estão des-
galidade, etc. de sempre mergulhados numa dimensão de
Não há no âmbito do direito administra- compreensão prévia e que não é de caráter
tivo, também, uma produção jurídica pro- reflexivo, mas, como alude Stein (2002, p.
funda sobre as repercussões da distinção 104), simplesmente resulta do nosso próprio
entre texto e norma na construção do princí- modo de ser no mundo. Corolário, deveria
pio da legalidade, com raras exceções. O ser repensada a própria relação entre os
questionamento de uma postura mais her- administradores públicos, juristas e opera-
menêutica pode contribuir para que o pen- dores do direito com o constitucionalismo
sar dogmático do direito administrativo pro- moderno.
blematize sua tarefa a partir, por exemplo, Não se pode adotar a crença ingênua de
da idéia de poiesis. A linguagem jurídica que os entes administrativos fazem parte de
enquanto poiesis significa uma linguagem uma espécie de “mundo natural”, com um
voltada para o fazer acontecer os entes ad- determinado conteúdo, pois, quando se fala
ministrativos, capaz de problematizar o di- de qualquer ente jurídico, o intérprete desde
zer originário, e não adotar a postura de sempre está nele envolvido, compreenden-
mera repetidora do sentido comum teórico do-o num contexto de sentido. Ultrapassa-
dos juristas. A dogmática administrativista do o mito do mundo natural, a interrogação
há de ser capaz de suspender o modo corri- que a dogmática poderia desenvolver resi-
queiro de dizer os entes e pensá-los no seu de no perguntar e voltar-se para as coisas
sentido constitucional-democrático. mesmas, “das quais, no entanto, só temos
A partir dessa análise crítica do modo notícias quando conseguimos expor o mo-
cotidiano de ser da dogmática administra- vimento de pré-compreensão que é condi-
tivista, é crível afirmar que ela tem contribu- ção de possibilidade de qualquer compre-
ído, de um modo geral, para esconder (velar) ensão” (Cf. STEIN, 2002, p. 118). Quando o
os fundamentos metafísicos do direito admi- intérprete descrever os diversos modos de
nistrativo. Um dos exemplos mais marcan- os entes administrativos virem ao seu en-
tes reside no princípio da separação de po- contro com seu mundo, não haverá apenas
deres que tem influenciado um conjunto de uma descrição da experiência ou um regis-

Brasília a. 42 n. 167 jul./set. 2005 181


tro empírico mediante conceitos fixos, mas construir uma Teoria do Direito Administrati-
uma descrição de indícios formais. Portan- vo para países de modernidade tardia como
to, “... não se trata de um repertório metafísi- o Brasil. Não há como desconsiderar em
co de conceitos com que se organiza a no- qualquer processo de construção de senti-
meação das coisas. Os indícios formais são do dos entes administrativos, por exemplo,
a aproximação para nomear seu acontecer o conjunto de indícios formais constitucio-
em diversos âmbitos” (Cf. STEIN, 2002, p. nais dos artigos 1 o e 3o da Constituição Fe-
156). Ora, grande parte do que tem sido pro- deral, que coloca a importância de construir
duzido no Brasil sobre dogmática admi- uma sociedade justa e solidária, de materia-
nistrativa satisfaz que espécie de dimen- lização da dignidade da pessoa humana,
são? Tem contribuído para uma simples or- bem como de erradicação da pobreza. Qual-
ganização de repertórios metafísicos ou quer idéia de interesse público há de cons-
construções de indicações críticas para pro- truir suas indicações fundadas em tais ele-
blematizar os sentidos do direito adminis- mentos, sob pena de constituir-se de modo
trativo no Estado Democrático de Direito? ilegítimo. Portanto, são relevantes as críti-
A Teoria do Direito Administrativo pre- cas à Teoria do Direito levadas a cabo por
cisa ser construída de modo que ela não se Ferrajoli (1995; 1999) quando sustenta que
transforme em simples atividade de apre- a tarefa de uma teoria do direito é evidenci-
sentar argumentos jurídicos em série ou for- ar as contradições, ou seja, desvelar as pos-
mas lógico-jurídicas, mas que ela seja um sibilidades de sentidos e não objetificar os
modo de ser (Cf. STEIN, 2002, p. 37). A fun- entes jurídicos, fundada em um arbitrário
ção dos chamados indícios formais é orien- juridicamente prevalecente.
tar a construção dos repertórios existenci-
ais do direito administrativo. A dogmática 4. Uma análise crítica dos
administrativista poderia contribuir feno- critérios dogmáticos para definir
menologicamente para determinar como os
o direito administrativo
conceitos jurídicos são construídos, como
eles chegam aos operadores do direito, e não No âmbito do modo de ser cotidiano das
funcionar como instância de objetificação diversas produções dogmáticas, são encon-
do arbitrário juridicamente prevalecente. trados variados critérios para definir o que
Seria de grande valia uma propagação mai- poderia ser considerado como direito admi-
or do horizonte histórico de construção do nistrativo. De plano, já se evidencia um gran-
direito administrativo pátrio, as relações que de equívoco pretender erigir uma definição
foram construídas entre os cidadãos e a perfeita e acabada, não se dando conta do
Administração Pública, enfim, fundar uma caráter existencial antes mencionado em
concepção teórica do direito administrativo todo o processo de compreensão. Em tal di-
mais voltada para capacitar os operadores versidade, pode-se destacar, por exemplo, o
jurídicos a dimensionarem na sua cotidia- critério do serviço público, tendo como gran-
nidade as pré-compreensões liberais-indi- des expoentes Leon Duguit, Jèze e Bonnard,
vidualistas que alimentam o imaginário preponderando como elemento delimitador
nacional. do direito administrativo o instituto de ser-
Muito embora, como acima referido, as viço público. No intuito de ultrapassar a
concepções mais tradicionais do direito ad- vetusta concepção até então predominante
ministrativo tenham contribuído para de- de identificar o direito administrativo com
senvolver um modo de pensar objetificador, a idéia de pussance public, esse ramo do di-
é crível sustentar a possibilidade de uma reito seria o conjunto de regras que regula a
nova dogmática jurídica. Utilizando os apor- prestação de serviços públicos pelo Estado,
tes de Streck (2004, p. 21 et seq.), é preciso normatizando ainda os direitos dos usuári-

182 Revista de Informação Legislativa


os e deveres dos prestadores 19. Uma das crí- maneira que o direito civil. Na órbita das
ticas que têm sido realizadas no que tange a preocupações de alguns administrativistas
esse conceito reside na redução do campo franceses, George Vedel e Pierre Delvolvé
do direito administrativo à prestação de ser- (1992, p. 76 et seq.) refletem a grande preo-
viços públicos. Não há dúvida, o direito cupação de construir certas concepções teó-
administrativo estuda o tema referente aos ricas que ressaltem a autonomia do direito
serviços públicos, mas sem que tal possa administrativo como um conjunto de regras
constituir-se como o universo desse ramo capaz de derrogar a aplicação das leis de
do direito. direito privado no que concerne à via admi-
De outra banda, deve-se mencionar o cri- nistrativa. Outrossim, Diogo Freitas do
tério do Poder Executivo20, sendo que o di- Amaral (1998, p. 130) vislumbra o direito
reito administrativo consistiria no estudo administrativo “como o ramo do direito
das relações entre esse poder e os cidadãos, público constituído pelo sistema de normas
além de problematizar sua estruturação e jurídicas que regulam a organização e fun-
funcionamento. Igualmente, detectam-se as cionamento da Administração Pública, bem
insuficiências dessa concepção ao reduzir como as relações por ela estabelecidas com
o direito administrativo ao estudo do poder outros sujeitos de direito no exercício da
executivo. Nos demais poderes – Legislati- actividade administrativa de gestão públi-
vo e Judiciário – também há o exercício de ca”.
atividade administrativa, não sendo crível Portanto, qualquer conceito que se tenha
reduzir sua problematização ao primeiro. sobre o direito administrativo não pode dei-
Além desses critérios, encontra-se na xar de vislumbrar que há sempre uma de-
dogmática administrativista uma multipli- terminada pré-compreensão a ordená-lo,
cidade de outros elementos determinantes uma espécie de a priori fundante. Os concei-
da definição desse ramo do direito, como os tos não podem ser compreendidos como re-
critérios das relações jurídicas, teleológico, pertórios metafísicos, capazes de abarcar a
etc21. No entendimento de Eduardo García totalidade. Estabelecer um conceito é uma
de Enterría (1995, p. 39), o direito adminis- relação de aproximação com a coisa, bus-
trativo constitui-se em “un Derecho de na- cando-se descrever como ela acontece em
turaleza estatutária, en cuanto se dirige a la seus diversos âmbitos (Cf. STEIN, 2002, p.
regulación de las singulares especies de 156)22. Qualquer tentativa de conceituação
sujetos que se agrupan bajo el nombre de não passará de um destaque, um colocar
Administraciones Públicas, sustrayendo a entre parênteses algumas manifestações, no
estos sujetos singulares del Derecho común”. caso, do fenômeno jurídico-administrativo,
Este autor faz questão de ressaltar a impor- até porque sempre deverá ser considerada a
tância de vislumbrar no direito administra- temporalidade que impede o homem de abar-
tivo a difícil tarefa de proceder ao equilíbrio car em definitivo as formas de expressão.
entre privilégios e garantias, com a finali- Uma crítica interessante sobre o ideal de
dade última de salvaguardar o interesse conceituar o direito administrativo, no cam-
geral da comunidade, mas sem desconside- po dogmático, foi realizada por Juan Alfon-
rar os cidadãos. No âmbito da visão de Otto so Santamaría Pastor (2000, p. 83-84) quan-
Mayer (1982, p. 17 et seq.), por sua vez, o do menciona a ausência de utilidade práti-
direito administrativo deveria ser compre- ca das disposições conceituais, pois
endido como o direito relativo à adminis- “hablar del Derecho administrativo
tração, o direito que lhe é aplicável, opon- como de un sistema o subsistema de
do-se ao direito constitucional, subsistindo normas, delimitado en el interior del
como um ramo especial do direito público, total ordenamiento jurídico, no pasa
dotado de um método próprio, da mesma de ser una convención terminológica

Brasília a. 42 n. 167 jul./set. 2005 183


sin significado preciso (...); por otra cialmente da história política; é nela
parte intentar hallar una noción nu- que encontra o seu fundamento, é a
clear en torno a la cual construir la ela que deve a sua filosofia e os seus
‘ciencia’ del Derecho administrativo, traços mais íntimos. Não se trata de
no deja de ser una inversión de los relembrar o passado, mas sim de co-
términos lógicos de la investigación nhecer o próprio solo do qual o direi-
científica (...), y, por último, resulta to administrativo extraiu a seiva que
notorio que algo tan convencional ainda hoje o alimenta”.
como el contenido de las enseñanzas No âmbito da referência supracitada, é
académicas no puede definirse abs- interessante ressaltar a chamada crise do
tractamente mediante noción teórica direito, e portanto também do direito admi-
de ningún tipo...”. nistrativo, e destacar as possibilidades de
Corolário do que acima restou explicita- ultrapassá-la. Nesse sentido, Streck (2004,
do, no campo das construções conceituais p. 55 et seq.) tem dado um grande contribu-
do direito administrativo, há uma grande to ao destacar a nominada crise de dupla
propensão em destacar no fenômeno jurídi- face do direito, pois (a) os operadores do
co-administrativo basicamente o aspecto da direito estão inseridos no paradigma da fi-
norma 23 . Certamente, tal aspecto também losofia da consciência e (b) estão inseridos
fará parte das problematizações a serem no paradigma liberal-individualista. Em
desenvolvidas, mas não reduz o conjunto apertada síntese, boa parte dos que lidam
de possibilidades de tratamento da maté- com o direito não se deu conta da necessi-
ria. Hodiernamente, um dos elementos inte- dade de superar o paradigma liberal que
ressantes para abarcar uma gama conside- ainda grassa na prática jurídica e compre-
rável de manifestações administrativas é a ender o direito como condição de possibili-
idéia de ação administrativa, entendida como dade para fazer acontecer um Estado preo-
o agir da Administração Pública, seja por cupado com a sociedade, vocacionado para
meio de seus órgãos específicos ou de pes- intervir em prol dos direitos e garantias fun-
soas jurídicas criadas para determinadas damentais, sejam eles liberais ou sociais,
finalidades e em coordenação com particu- assumindo o Poder Judiciário um papel fun-
lares. O direito administrativo, assim, po- damental, conforme o autor: “Por tudo isso
deria ser indicado como o campo de conhe- é possível sustentar que, no Estado Demo-
cimento que estuda a ação administrativa, crático de Direito, há – ou deveria haver –
seja no que tange ao conjunto de regras e um sensível deslocamento do centro de deci-
princípios co-relacionados ou no aspecto sões do Legislativo e do Executivo para o pla-
atinente às suas formas de expressão (atos no da justiça constitucional” (Cf. STRECK,
administrativos, poderes, contratos, presta- 2004, p. 55). Ao examinar-se o direito admi-
ção de serviços, administração de bens, etc.). nistrativo, faz-se mister destacar explicita-
Destarte, qualquer ação administrativa de- mente a importância da jurisdição constitu-
verá ser compreendida a partir do horizon- cional na construção de uma Administra-
te de sentido do Estado Democrático de Di- ção Pública mais democrática, sendo impe-
reito (arts. 1o e 3o da Constituição Federal), rioso, por exemplo, compreender de um
fundando-se no conjunto de direitos e ga- modo diferenciado alguns princípios epo-
rantias fundamentais dos cidadãos e na cais que estruturaram a atividade adminis-
promoção do bem-estar da comunidade. Em trativa como o princípio da separação de
tal sentido, vale a idéia de Prosper Weil poderes.
(1977, p. 10) para quem Ademais, além dessa dimensão de filo-
“o direito administrativo não pode, sofia política a orientar a construção do di-
pois, ser desligado da história, e espe- reito administrativo, faz-se mister destacar,

184 Revista de Informação Legislativa


no âmbito de uma dimensão hermenêutico- ficadora de construção de mundo. Quando
filosófica, o problema da filosofia da cons- for lançado o questionamento “o que é isto
ciência, ou seja, o direito administrativo?”, é crucial que não
“... é necessário registrar que, na sus- se pretenda respondê-lo arrolando alguns
tentação desse imaginário jurídico enunciados lingüísticos, pois no enuncia-
prevalecente, encontra-se dissemina- do não está a resposta para tal indagação.
do ainda o paradigma epistemológi- A problematização a ser levada a cabo exi-
co da filosofia da consciência – calca- ge dialogar como aquilo que vem sendo
da na lógica do sujeito cognoscente, transmitido como sentido de direito admi-
onde as formas de vida e relaciona- nistrativo, ultrapassando-se as evidências
mentos são reificadas e funcionaliza- lógico-formais do dogmatismo e assumin-
das, ficando tudo comprimido nas re- do a linguagem como locus privilegiado para
lações sujeito-objeto (como denuncia abrir clareiras, possibilidades antes impen-
Habermas) – carente e/ou refratária à sadas de dizer o direito administrativo.
viragem lingüística de cunho pragma- A partir da chamada viragem hermenêu-
tista-ontológico ocorrida contempora- tica, perguntar o que é o direito administra-
neamente, no qual a relação ou rela- tivo importa lançar juristas e operadores do
ções passa(m) a ser sujeito-objeto” (Cf. direito para, por exemplo, problematizarem
STRECK, 2004, p. 61). a incapacidade das construções tradicional-
Os aspectos aludidos da crise de dupla mente dogmáticas, vocacionadas para as-
face do direito, com efeito, deveriam ingres- pectos metafísicos, e incapazes de transmi-
sar em qualquer problematização dos diver- tir o sentido, decorrência do ideal de especi-
sos institutos do direito administrativo, pro- alização preponderante na sua estrutura-
pondo-se melhor destacar nesse ramo do ção teórica, especialização essa calcada na
direito suas potencialidades para provocar postura formalista do conhecimento jurídi-
mudanças, criando condições de fazer acon- co e que desconsiderava outras possibilida-
tecer aquilo que vem indicado nos artigos 1 o des metodológicas senão aquelas suficien-
e 3o da Constituição Federal, obviamente, tes para a aplicação subsuntiva de regras
sem cair na ingenuidade segundo a qual a legais. Destarte, uma segunda dimensão de
instituição de textos legais ou constitucio- análise relaciona-se à posição ocupada pelo
nais é suficiente para alcançar tal mister. direito administrativo no conjunto da exis-
Destarte, a hermenêutica jurídica, de cariz tência histórico-social, ou seja, hodierna-
fenomenológico, irá desempenhar um pa- mente, em um país de modernidade tardia
pel importantíssimo, acompanhada de um como o Brasil, com um alto índice de exclu-
modo de ser mais social-solidário, uma con- são social, qual tem sido a função desse
cepção mais comunitária da atividade de- campo do conhecimento jurídico? Finalmen-
senvolvida pela Administração Pública. te, urge problematizar a questão atinente ao
Esse, ao que parece, pode ser o grande próprio fundamento do direito administra-
desafio a orientar a construção de uma nova tivo e a concepção de racionalidade científi-
teorização do direito administrativo, certa- ca que alimenta o imaginário de juristas,
mente, sem pretender inserir um novo dog- operadores do direito e administradores.
matismo, mas apenas temporalizar as di- Como aduz Martin Heidegger (1999, p. 52),
versas possibilidades de sentido desse ramo “tenemos antes que aprender a entender qué
do direito, privilegiando a compreensão a significa fundamentos de una ciência y en
partir de uma consciência histórica efeitu- qué medida la crisis de fundamentos pone
al, utilizando a referência de Hans-Georg de manifesto los limites esenciales de la ci-
Gadamer. Busca-se, assim, pensá-lo prag- encia como tal”. Há, portanto, uma tarefa
maticamente, fugindo-se da tentação objeti- originária de reconhecer que no próprio

Brasília a. 42 n. 167 jul./set. 2005 185


modo de ser característico do direito admi- des em perceber algo diferente dos paradigmas vi-
nistrativo há o inacessível e que tal é incon- gentes. O questionamento sobre os diversos insti-
tutos do direito administrativo passa por essa con-
tornável, e o dar-se conta da crise de funda- taminação, na medida em que, normalmente, as
mentos, em última análise, está relacionado análises ficam restritas a velhos conceitos, como
com a problematização da possibilidade de competência vinculada ou competência discricio-
existir do homem. nária, o princípio da separação de poderes, mar-
gem de discricionariedade, discricionariedade téc-
nica, executoriedade, legalidade, etc. No entanto,
muitas vezes, é preciso sair de um paradigma do-
Notas minante. Por óbvio, não se está querendo dizer que
os paradigmas não possuem qualquer utilidade.
Quando se fala de dogmática jurídica, é inte-
1
Pelo contrário, eles nos ajudam a resolver proble-
ressante ressaltar que tal modo de pensar é tributá- mas. O equívoco está em acreditar que há “o para-
rio da própria concepção de ciência jurídica do sé-
digma”, pois neste instante surge o que se chama
culo XVIII, formulada por Gustav Hugo, assim re- de “paralisia de paradigma”. Muitos operadores
tratada: “Ao final do século XVIII, Hugo ensinou do direito sofrem de uma espécie de paralisia de
que nossa disciplina (a jurisprudência) teria que
paradigma jurídico. No entanto, não se pense que a
responder, em sua totalidade, a três questões: (1) o elaboração de um trabalho mais crítico pode ocasi-
que é o direito? (2) é razoável que seja assim? e (3) onar a superação de um paradigma antigo. Não há
como chegou a ser direito?”(Cf. VIEHWEG, 1997,
apenas uma sucessão de paradigmas, pois o que
p. 100). Dessa tríplice concepção resultaria a divi- ocorre igualmente é um processo de interpenetra-
são em dogmática jurídica, filosofia do direito e ção.
história do direito, respectivamente. 6
O autor refere que a “realidade dominante,
2
Como ressalta Warat (1995, p. 16), o dogma- através do senso comum, passa a ser aceita como
tismo “apresenta-se como a tentativa de construir ‘realidade verdadeira’, escondendo o componente
uma teoria sistemática do direito positivo, sem for-
político da investigação de verdade”. Com efeito,
mular nenhum juízo de valor sobre o mesmo, con- a problemática maior do discurso dogmático – aque-
vertendo-a em uma mera ciência formal”. le instituidor de um dogmatismo – não está em seu
3
O autor menciona expressamente algumas
caráter político ou ideológico. Qualquer crítica em
disciplinas que entende dogmáticas, entre elas o tal sentido seria pueril, pois efetivamente parte dos
direito administrativo, aduzindo: “uma disciplina conhecimentos produzidos são ideológicos, e isto
pode ser definida como dogmática na medida em
há muito já se sabe. No entanto, é importante des-
que considera certas premissas em si e por si arbi- nudar o discurso apolítico, cujo objetivo é esconder
trárias (isto é, resultantes de uma decisão), como a ideologia oculta atrás das práticas discursivas.
vinculantes para o estudo, renunciando-se, assim, 7
O caráter dialógico do pensamento gadameri-
ao postulado da pesquisa independente”. Também ano ressalta a importância de o homem compreen-
é interessante a idéia de Vieweg (1997, p. 101) so- dedor estar aberto para a opinião do outro e do
bre a dogmática: “El pensamiento dogmático pue- texto. A abertura para a “alteridade do texto”. No
de ser llamado adecuadamente pensamiento de caso direito, pode-se dizer, lidamos fundamental-
opinión porque está caracterizado por el hecho de mente com textos, textos fatos, pré-conceitos, hábi-
que se atiene a una opinión establecida (dogma o tos lingüísticos, etc., assumindo capital importân-
dogmas); por una parte, la pone fuera de toda duda cia a postura de “alteridade”. De qualquer sorte, o
y, por otra, la desarolla de múltiple manera”. objetivo dessa teorização é fazer com que o intér-
4
Essa astúcia torna-se um mecanismo para o prete dê-se conta de que há juízos prévios na com-
enfraquecimento das tensões sociais, na medida em preensão. Dar-se conta dos juízos prévios é encon-
que neutraliza as pressões exercidas pelos proble- trar-se com a própria historicidade como aludia
mas de distribuição de poder, de recursos e benefí- Hans-Georg Gadamer.
cios escassos, assim como, poder-se-ia acrescentar, 8
Mais uma vez, é importante entender a ideolo-
da moralidade administrativa. gia como aquela manifestação que ocorre no in-
5
A adoção de paradigmas dominantes traz consciente, operando por meio do imaginário e do
conseqüências deletérias para a Ciência Jurídica, silêncio, importando a aceitação de certas práticas
pois se abandona o ideal científico de questionar o e valores como naturais, racionais, verdadeiros.
impensado, de repensar as certezas significativas Portanto, não se busca estabelecer a discussão so-
de um mundo jurídico. Adotam-se aquelas certe- bre a dimensão do ideológico, de que tal seja tido
zas nas quais uma comunidade acredita, poden- como ideológico. A grande questão reside em ad-
do-se então falar na chamada “força de um para- mitir a possibilidade de entabular um contradis-
digma”, ou seja, quando se tem grandes dificulda- curso ao sentido-comum-teórico-dominante.

186 Revista de Informação Legislativa


9
O apego dos operadores do Direito à lei é pelo fundamento das coisas do mundo da vida
revelador nesse sentido, pois não desconhecem a fosse aprisionada no âmbito da lógica formal. Ul-
inserção dos textos legais no tempo, sujeitos ao trapassar o pensar metafísico importa problemati-
processo de deterioração. No entanto, agem como zar a questão do fundamento no plano ontológico.
se não soubessem disso (razão cínica). O exame A metafísica, portanto, labora a compreensão a
poderia ir mais além. Quando se trabalha com a partir de um elemento fundante que sequer é ques-
aplicação de certas lições doutrinárias ou jurispru- tionado, problematizado, conforme será examina-
denciais, v.g., aquelas referentes à não auto-aplica- do no item no 3.
bilidade do artigo 196 da CF que estabelece o direi- 14
Estabelecendo um paralelo com o dinheiro o
to à saúde, todos reconhecem a postura política e o autor alude que, “quando os indivíduos usam o
comprometimento ideológico desse raciocínio. Mas, dinheiro, eles sabem muito bem que não há nada de
continua-se aplicando “como se não soubessem o mágico nisso – que o dinheiro, em sua materialida-
que fazem”. Qual a razão para que isso ocorra? de, é simplesmente uma expressão de relações so-
10
O grau de abstração que determinadas estru- ciais. Assim, no plano do dia-a-dia, os indivíduos
turas dogmáticas impõem na resolução dos casos sabem muito bem que há relações entre pessoas
concretos leva a um não conhecimento da realida- por trás das relações entre as coisas. O problema é
de, e que é parte da própria essência da dogmática, que, em sua atividade social, naquilo que fazem,
uma vez que a efetividade social do processo de eles agem como se o dinheiro, em sua realidade
aplicação do direito “é um tipo de realidade que só material, fosse encarnação imediata da riqueza
é possível sob a condição de que os indivíduos que como tal. Eles são fetichistas na prática, e não na
dela participam não estejam cientes de sua lógica teoria. O que ‘não sabem’, o que desconhecem, é o
própria; ou seja, é um tipo de realidade cuja pró- fato de que, em sua própria realidade social, em
pria consistência ontológica implica um certo não sua atividade social – no ato de troca da mercado-
conhecimento dos seus participantes – se viésse- ria – estão sendo guiados pela ilusão fetichista.”
mos a ‘saber demais’, a desvendar o verdadeiro 15
Logo, para o autor, “o nível fundamental da
funcionamento da realidade social, essa realidade ideologia, entretanto, não é de uma ilusão que mas-
se dissolveria” (Cf. ZIZEK, 1996b, p. 305). Como care o verdadeiro estado de coisas, mas de uma
conseqüência, tem-se um “discurso burocrático”, fantasia (inconsciente) que estrutura nossa própria
quer dizer, aquele discurso em que o silêncio é ge- realidade social”. Os operadores jurídicos não sa-
ral. Como menciona Coelho Neto (1996, p. 99), “do bem que sua própria realidade social e que sua
lado do falante, que não o é, há o silêncio do anoni- atividade são guiadas por uma ilusão, por uma
mato indispensável para evitar a instauração do inversão fetichista. Eles sabem muito bem como as
sujeito; há, em suma, o auto-escamoteamento da coisas realmente são, mas continuam a agir como
fonte no e pelo discurso – mas, por certo, ao nível se não soubessem. A fantasia ideológica permeia as
do discurso. E do lado do ouvinte, nada mais há relações do Juiz, Promotor e Advogado. Outrossim,
que o silêncio, o silêncio engendrado pelo falante, o poderia ser dito que a dogmática jurídica contribui
silêncio da alienação, o silêncio do espelho opaco para que ocorra essa inversão fetichista, por e na
que não permite a constituição do eu, do sujeito.” medida em que ela própria é fruto dessa inversão.
11
Trata-se do fetichismo da mercadoria a que 16
Nas rodas tibetanas de orações, escreve-se
se refere o autor. O valor de uma certa mercadoria uma oração em um pedaço de papel, coloca-se o
assume a forma de uma propriedade quase “natu- papel enrolado numa roda e gira-se automatica-
ral” de outra coisa-mercadoria, o dinheiro. A mer- mente sem pensar. Assim, a própria roda gira por
cadoria “A” só pode expressar seu valor em refe- mim, em meu lugar, ou seja, eu rezo por intermé-
rência a uma outra mercadoria “B”, que assim se dio da roda. O bom é que, em minha interioridade
torna seu equivalente. psicológica, eu posso ter os pensamentos mais obs-
12
No entendimento do autor, o modo dominan- cenos e isso não terá importância, pois a roda con-
te de funcionamento da ideologia é cínico. O sujeito tinuará girando e eu estarei rezando.
cínico tem perfeita ciência da distância entre a más- 17
Por meio da concepção de fundamento últi-
cara ideológica e a realidade social, mas, apesar mo, a compreensão é calcada em um determinado
disso, continua a insistir na máscara. A fórmula ponto de partida que não comporta nada que este-
ideológica seria, portanto: “eles sabem muito bem ja além dele. Com relação à compreensão auto-
o que fazem, mas mesmo assim o fazem”. referencial, somente se mostra como um conheci-
13
Adota-se aqui a crítica realizada por Martin mento válido, legítimo, aquele produzido desde os
Heidegger (1999) em relação à metafísica, ou seja, seus próprios enunciados, a partir dos quais pode-
o modo de pensar que não logrou manter-se no se determinar a verdade dos entes em sua exati-
nível da pergunta pelo sentido e do modo de ser dão. Não deixa de ser uma clara representação do
fenomenológico da compreensão. A concepção mito da caverna, pois há uma compreensão que se
metafísica foi determinante para que a indagação encontra “no fundo da caverna”, portanto, obscu-

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ra, devendo caminhar para o lado, o mundo das solver lides privadas, seria crucial. Como o Brasil
idéias, a fim de que possa realmente atingir aquilo não adota o sistema de justiça administrativa ou
que se deve compreender. No fundo da caverna há do contencioso administrativo, esse debate não
apenas sombras e no lado externo estão os entes possui similar repercussão.
jurídicos propriamente ditos, sendo imprescindível 20
Conforme Fernando Garrido Falla (1994, p.
percorrer o caminho para poder atingir esse “ver- 114), “definimos el Derecho administrativo como
dadeiro mundo”. No pensamento da dogmática aquella parte del Derecho público que regula la or-
de cunho metafísico, o seu ponto fundante repre- ganización y el funcionamiento del Poder ejecutivo
senta a direção a ser seguida para atingir-se o “ver- y sus relaciones con los administrados, así como la
dadeiro conhecimento”, o mundo no qual o homem función administrativa de los diversos Poderes y
realmente poderá ver aquilo que é exato. Organos constitucionales del Estado”.
18
A Teoria dos Indícios Formais tem sido ex- 21
No âmbito da doutrina pátria, Meirelles (1995,
posta por Ernildo Stein (2002), bem como por Le- p. 29) define o direito administrativo como um “con-
nio Luiz Streck (2004) sobre a sua aplicação no junto harmônico de princípios que regem os órgãos,
Direito. Na primeira obra, o autor traz um texto os agentes e as atividades públicas tendentes a re-
fundamental para a compreensão da Teoria dos alizar, direta e imediatamente, os fins desejados
Indícios Formais, Os Indícios Formais e a Base Não- pelo Estado”. Para Di Pietro (2002, p. 52), é “o
Inferencial para o Conhecimento, relatando que a in- ramo do direito público que tem por objeto os ór-
trodução dos existenciais pode ser feita, exatamen- gãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas
te, com a descrição dos indícios formais. Trata-se que integram a Administração Pública, a atividade
de um pensamento não objetificador, pois não há jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que
um universo pronto, chegando-se aos indícios for- utiliza para a consecução de seus fins, de natureza
mais fenomenologicamente. Descrever os indícios pública”. No entendimento de Mello (2003, p. 35),
formais, com efeito, importa buscar as diversas ca- “o direito administrativo é o ramo do direito públi-
racterísticas do Dasein e que revelam o próprio modo co que disciplina a função administrativa e os ór-
de ser no mundo (STEIN, 2002, p. 160). Assim, gãos que a exercem”.
refere expressamente, “o existencial é posto no lu- 22
A chamada Teoria dos Indícios Formais é
gar do transcendental como elemento organizador. fundamental para melhor compreender as condi-
O existencial não é uma simples remissão ao empí- ções de possibilidade de ultrapassar um modo de
rico, ao existente – os espanhóis traduzem por exis- pensar metafísico, formalista e objetificador, ou
tentivo–, mas é uma dimensão que não tem justa- seja, o pensamento que tudo quer abarcar. Refere
mente esse caráter de categoria, mas de qualidade expressamente: “Onde temos os indícios formais
existencial” (STEIN, 2002, p. 160-61). A tarefa do não temos o todo da coisa, temos os elementos
intérprete passaria pela necessária descrição dos formais que remetem a algo que pode estar disper-
indícios formais como modo de chegar ao máximo so na condição humana. Dela apanhamos aspectos
número de atos exercidos e que, dentro da perspec- limitados, mas não o todo da condição humana.
tiva fenomenológica, são as dimensões existenciais Como nunca conseguimos completar a exposição
(STEIN, 2002, p. 163). Vale aduzir, é imperioso dos indícios formais, nunca acabamos a analítica
para este pensar o que Heidegger chamou de edu- existencial. Ela é a caminho, sempre um processo
cação fenomenológica, pois esse exercício do des- em formação”. (STEIN, 2002, p. 166).
crever fenomenológico importa em possibilitar ver 23
Aliás, de uma certa maneira, Cléve (1988, p.
aquilo que normalmente está encoberto. Aqui entra 72) já destacava essa crítica, referindo, em geral, à
em jogo o caráter ambivalente do estar encoberto e preponderância de uma postura kelseniana para
aquilo que se mostra. Segundo Heidegger, a feno- compreender o direito administrativo privilegian-
menologia é o exercício de tentar mostrar, naquilo do o aspecto das normas, identificando-o mais como
que se mostra, aquilo que de si não se mostra e que, tecnologia: “o direito administrativo, então, é um
só num exercício de explicitação dos indícios for- saber, uma tecnologia, localizando-o num terreno
mais, irá mostrar-se” (STEIN, 2002, p. 164). Este, teórico que não se confunde com o território delimi-
portanto, seria o significado de ir às coisas mesmas tado das ciências. Esta tese contraria boa parte da
possibilitado pela Teoria dos Indícios Formais. produção jurídico-administrativa dominante”.
19
É importante salientar que o critério do servi-
ço público foi de grande importância para o desen-
volvimento do direito administrativo em França,
considerando a existência do Conselho de Estado,
órgão encarregado de dirimir os conflitos entre ci- Referências
dadãos e a Administração Pública. Com efeito,
determinar a competência do Conselho de Estado AMARAL, Diogo Freitas do. Curso de direito admi-
ou dos órgãos do Poder Judiciário, incumbidos de nistrativo. 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998. v. 1.

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