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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

Jezreel Gabriel Lopes

A PRÁTICA DOCENTE MEDIADA POR MATERIAIS


DIDÁTICOS DIGITAIS INTERATIVOS
 
 
 
 
 

 
 
 
 
 
 
 
CAMPINAS,
2015
JEZREEL GABRIEL LOPES

A PRÁTICA DOCENTE MEDIADA POR MATERIAIS


DIDÁTICOS DIGITAIS INTERATIVOS

Dissertação de mestrado apresentada ao


Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas para
obtenção do título de Mestre em Linguística
Aplicada, na área de Linguagem e
Educação

Orientador (a): Prof(a). Dr(a). Roxane Helena Rodrigues Rojo

Este exemplar corresponde à versão


final da Dissertação defendida pelo
aluno Jezreel Gabriel Lopes e
orientada pela Profa. Dra. Roxane
Helena Rodrigues Rojo

______________________________
Roxane Helena Rodrigues Rojo

CAMPINAS,
2015
RESUMO

Esta pesquisa teve por objetivo analisar, por meio de pesquisa de observação
participante, uma experiência de uso de material didático digital interativo
(MDDI) para tablets a fim de verificar como se realizam os processos de
produção e condução da prática docente nessas condições. Para isso, buscou-
se, inicialmente, definir o contexto contemporâneo mediado pelas novas
tecnologias da informação e comunicação, cujas práticas sociais, nos mais
diversos âmbitos da vida humana, tornam-se cada vez mais permeadas por
multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2006 [2000]), e novos letramentos
(LANKSHEAR; KNOBEL, 2007). Por meio da definição desses conceitos,
construiu-se embasamento para orientar a produção do MDDI utilizado no
estudo. Além disso, a pesquisa evidencia os conflitos decorrentes da
coexistência de dois ethos distintos, elucidados, entre outros fatores, pela
popularização das tecnologias móveis (tablets e celulares). A inserção desses
dispositivos móveis na escola gerou conflitos entre professores, instituições e
alunos, pois rupturas nos paradigmas educacionais tornaram-se evidentes. As
abordagens teóricas para embasamento da análise da pesquisa voltaram-se
para a estruturação da aula mediada por MDDI (BAZERMAN, 2005; ROJO,
2007) e os processos de interação, por meio da constituição da interlocução
em sala de aula (BATISTA, 1997), entre professores e alunos e também os
processos de interação estabelecidos entre alunos e MDDI. Todos esses
objetos de análise foram organizados por meio de três planos de análise
constitutivos (institucional/comunitário, interpessoal e pessoal) de uma
atividade sociocultural (ROGOFF, 1995) . Ao término do estudo, foi possível
constatar que a mera disponibilidade tecnológica não é suficiente para que as
práticas de ensino englobem os multiletramentos e os novos letramentos. Faz-
se necessário, para isso, um projeto pedagógico que considere claramente os
propósitos da introdução da tecnologia em sala de aula. Além disso, o trabalho
com MDDI construído a partir do conceito de protótipo faz com que o professor
assuma um papel ativo na seleção de gêneros, escritos e/ou multissemióticos,
que constituem o material, na escolha de objetivos pedagógicos a serem
alcançados e os caminhos de estudo pelo MDDI ao longo de uma aula. Nossos
resultados apontaram também para, nesse contexto, o professor assumindo
um papel de mediador e organizador das informações constituintes do objeto
de ensino ao longo da aula. Quanto ao uso do MDDI por alunos, percebeu-se a
tendência a manter práticas de leitura linear e pouco incidência no uso dos
recursos oferecidos pelo MDDI e dispositivo móveis para pesquisa. Por fim,
embora não tenha sido o foco da pesquisa, foi possível constatar que
atividades em que alunos se engajam no contexto de ensino mediado por
MDDI podem ser conduzidas de forma a valorizar práticas colaborativas, que
fazem uso de novas tecnologias e exigem o trabalho com a habilidade de
interpretar e estabelecer relação entre as informações de gêneros constituídos
por semioses diversas.

Palavras-chave: Materiais didáticos digitais interativos, Língua Materna,


Dispositivos móveis, Multiletramentos.
ABSTRACT

This research aimed to analyze, through participant observation research, the


processes and conduct of teaching practice mediated by digital interactive
courseware (DIC) for tablets. For this purpose, we attempted to define the
contemporary context mediated by new information technologies and
communication, whose social practices in various spheres of human life,
become increasingly permeated by multiliteracies (COPE; KALANTZIS, 2006
[2000]) and new literacies (LANKSHEAR; KNOBEL, 2007). By defining these
concepts, it was built foundation to guide the production of DIC used in the
study. In addition, the survey highlights the conflicts arising from the
coexistence of two distinct ethos, elucidated, among other factors, the
popularization of mobile technologies (tablets and mobiles). Entering these
mobile devices in school generated conflicts between teachers, students and
institutions, as disruptions in educational paradigms became evident. The
theoretical approaches to the analysis of the research foundation turned to the
structuring of the class mediated DIC and interaction processes, through the
establishment of dialogue in the classroom between teachers and students and
also the processes of interaction established between students and DIC
(BAZERMAN, 2005; ROJO, 2007). All these objects of analysis were organized
through three constitutive planes of analysis (institutional / community,
interpersonal and personal) from a sociocultural activity (ROGOFF, 1995). At
the end of the study, it was found that the mere technological readiness is not
enough that teaching practices of multiliteracies and new literacies. To achieve
this, it is necessary an educational project that clearly consider the purpose of
the introduction of technology in the classroom. In addition, work with DIC built
from the prototype concept makes the teacher take an active role in the
selection of genres, whether written or multisemiotic, constituting the
courseware, the choice of educational objectives to be achieved and the ways
study over the DIC a class. Our results also pointed out, in this context, the
teacher assuming a role of mediator and organizer of the constituent
information of the object of teaching during the class. Regarding the use of the
DIC by students, it was noticed the tendency to maintain linear reading
practices and little effect on the use of resources offered by the DIC and mobile
device to search. Finally, although it was not the focus of research, it was found
that activities in which students engage in educational context mediated by DIC
could be conducted in order to enhance collaborative practices that make use
of new technologies and require working with the ability to interpret and
establish the relationship between the information of multisemiotic genres.

Key words: Digital interactive courseware, Mother tongue, Mobile technologies,


Multiliteracie
SUMÁRIO
 
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 8
CAPÍTULO 1 – UM TEMPO PARA MULTILETRAMENTOS ...................................... 17
1. MULTILETRAMENTOS, NOVOS LETRAMENTOS, TECNOLOGIAS E EDUCAÇÃO ................ 28
2. M UNDOS EM CHOQUE ............................................................................................ 35
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO EM SALA DE AULA ..................................................... 46
1. PERSPECTIVAS DE INTERAÇÃO EM SALA DE AULA ..................................................... 46
2. A ETNOGRAFIA DA COMUNICAÇÃO E A SOCIOLINGUÍSTICA INTERACIONAL .................. 47
3. AS ATIVIDADES HUMANAS COMO SISTEMAS DE GÊNEROS.......................................... 53
3.1 Fatos sociais ................................................................................................... 55
3.2. Atos de fala .................................................................................................... 56
3.3. Gêneros, conjunto de gêneros e sistema de gêneros ................................... 58
3.4. Aula como sistema de atividades e gêneros ................................................. 61
4. A AULA E SUAS INSTÂNCIAS DISCURSIVAS ................................................................ 62
4.1. A instância da aula ........................................................................................ 62
4.2. A instâncias do exercício ............................................................................... 65
5. A ANÁLISE DA ATIVIDADE SOCIOCULTURAL EM TRÊS PLANOS .................................... 67
5.1. O plano comunitário/institucional e a aprendizibilidade ................................. 69
5.2. O plano interpessoal e a participação guiada................................................ 71
5.3. O plano pessoal e a apropriação participativa ............................................... 73
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA ................................................................................. 77
1. O CAMPO DA PESQUISA E A COLETA DE DADOS ........................................................ 78
2. O MATERIAL DIDÁTICO DIGITAL INTERATIVO .............................................................. 80
3. A OBSERVAÇÃO COMO METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................. 86
3.1. A observação participante ............................................................................. 88
3.2. O olhar do pesquisador ................................................................................. 91
3.3. Recursos tecnológicos auxiliares .................................................................. 92
3.4. O processo de observação ............................................................................ 93
3.5. O impacto sobre o observado e questões éticas ........................................... 93
3.6 A observação em sala de aula ....................................................................... 94
4. MÉTODO DE ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................ 96
CAPÍTULO 4 – ANÁLISE DE DADOS ........................................................................ 98
1. ORGANIZAÇÃO DA ANÁLISE ................................................................................... 98
2. ANÁLISE DO PLANO INSTITUCIONAL OU COMUNITÁRIO ............................................... 99
2.1. O contexto sociocultural ................................................................................ 99
2.2. Infraestrutura tecnológica e usos das tecnologias na prática docente ........ 101
2.3. O material didático digital interativo ............................................................. 103
2.4. A estrutura da aula aplicada ........................................................................ 106
3. PLANO INTERPESSOAL .......................................................................................... 109
3.1. Relação professor-aluno durante as aulas .................................................. 109
3.2. Relação entre alunos e MDDI ...................................................................... 114
4. PLANO PESSOAL ................................................................................................... 118
4.1. Atividades realizadas em sala de aula ........................................................ 118
4.2. Atividades realizadas após as aulas ............................................................ 122
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 123
REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 128
ANEXO A ................................................................................................................... 138
ANEXO B ................................................................................................................... 148
  8  
 

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa propõe-se a analisar uma experiência de uso de material


didático digital interativo (MDDI) para tablets1, inserindo-a num conjunto de
reflexões acadêmicas que, guardadas suas especificidades, objetivam discutir
a constituição de elementos da prática docente nesse contexto. Esses
dispositivos móveis com telas sensíveis ao toque podem possibilitar uma maior
interatividade entre leitor e texto, reunindo recursos que vão muito além de um
simples virar de página com o toque dos dedos: é possível navegar por
hipertextos e explorar hipermídias estando-se, assim, apto a interagir com
figuras e infográficos interativos, acessar vídeos e gravações de áudio, ou seja,
vivenciar uma experiência de leitura multissemiótica que requer
multiletramentos, ou seja, práticas de letramento que envolvem multissemioses
em um contexto multicultural. Justamente por isso, tal plataforma foi escolhida
como suporte para um MDDI, desenvolvido pelo professor-pesquisador autor
deste estudo. A utilização de tablets no âmbito escolar pode confrontar práticas
educacionais fortemente estabelecidas ao longo do tempo, ao passo que
salienta a necessidade de a escola atentar para as novas práticas de
letramento oriundas do contexto cada vez mais digital, multissemiótico e
multicultural no qual se insere a sociedade contemporânea.
A convergência de semioses e discursos, acesso à informação vasta e
ilimitada, a hipertextos, a hipermídias, além da democratização da autoria e da
veiculação de discursos em diferentes semioses evidenciam um fenômeno
maior que as consequências dos avanços tecnológicos. Essas novas práticas
de letramento, segundo Rojo (2013, p. 6), “estão relacionadas a uma nova
mentalidade, que pode ou não ser exercida por meio de novas tecnologias
digitais”. Diante de tal constatação, nota-se que apenas o uso de tecnologia
nas escolas não significa necessariamente a inclusão das novas práticas de
letramento em seu currículo. Mais que isso, para que a escola se apodere
dessas novas práticas, é preciso, primeiramente, compreender que, associado
                                                                                                               
1
Podemos pensar em uma definição de tablets como dispositivos móveis em formato de
tabuletas, com telas sensíveis ao toque, que permitem a interação por gestos e aceitam
conexão sem fio à Internet (AGNER, 2011 apud STUMPF; GONÇALVES, 2012).

 
  9  
 

aos novos letramentos, encontra-se um novo ethos (LANKSHEAR; KNOBEL,


2007), ou seja, uma nova ética, uma nova mentalidade para lidar com os
discursos veiculados na sociedade contemporânea. Essa nova ética enfatiza,
como anteriormente mencionado, a colaboratividade na produção de discursos,
fator que resulta na dissolução da autoria e de relações assimétricas. Além
disso, a popularização das ferramentas digitais necessárias à criação de
conteúdos permite dispensar conhecimentos técnicos, anteriormente
necessários aos novos letramentos.
No contexto contemporâneo, por meio de serviços como redes sociais e
blogs, pessoas criam e compartilham fotos, vídeos e textos, sejam esses
materiais originais ou oriundos de outras criações que já circulam pela rede.
Por meio de tal prática, percebe-se cada vez mais a quebra do paradigma
relacionado a grandes empresas de comunicação como produtoras e
distribuidoras exclusivas de conteúdo e o emergir de questões éticas e políticas
advindas dessa transição, como, por exemplo, a propriedade de direitos de
autor. Além disso, cada vez mais as instituições públicas e privadas oferecem
serviços online, como declaração de imposto de renda, compras, contração de
serviços, além cursos superiores e profissionalizantes, fato que pressupõe que
o cidadão esteja apto para lidar com ferramentas digitais para que tenha
acesso a tais serviços. Esses poucos exemplos citados traçam um panorama
de uma sociedade cada vez mais dependente de novas práticas provenientes
das tecnologias digitais, por vezes fundadoras da nova ética descrita por
Lankshear e Knobel. A despeito dessa realidade, a escola, em muitos casos,
ainda se abstém ― por falta de profissionais capacitados ou de infraestrutura,
ou por questões políticas ― de englobar essas novas práticas como elementos
essenciais de ensino, constituindo, como dizem Almeida e Silva (2011), um
WebCurrículo.
Segundo Rojo (2006, p. 264), pesquisas situadas na área da Linguística
Aplicada devem considerar problemas com “relevância social suficiente para
exigirem respostas teóricas que tragam ganhos a práticas sociais e a seus
participantes, no sentido de uma melhor qualidade de vida”. A autora ainda
aponta para a importância de se buscar reflexões sobre as novas
possibilidades, a partir dos novos instrumentos alvos das pesquisas. Dessa

 
  10  
 

forma, ao considerar a problemática anteriormente traçada, é possível afirmar


que este trabalho apresenta questões de relevância à Linguística Aplicada,
pois busca criar inteligibilidade sobre os efeitos de materiais didáticos digitais
interativos para tablets na dinâmica de aulas de Língua Portuguesa, ao mesmo
tempo em que propõe uma forma de trabalho com tal tecnologia que se
pretende situada nesse novo ethos, constituído de novas práticas e novas
configurações de discurso.
Ao se considerarem as ações anunciadas recentemente pelo governo
brasileiro2, que visam a introduzir o uso de tablets em escolas públicas, será
cada vez mais necessário atentar à formação do professor para o uso de tal
tecnologia e de seus recursos, bem a como isso poderá alterar, ou não, as
formas de ensino-aprendizagem em sala de aula e, principalmente, quais tipos
de materiais didáticos utilizar nesses dispositivos. A falta de pesquisas sobre o
uso dessa ferramenta nas escolas e de seus impactos pode ser ilustrada pela
matéria de Breno Costa e Renato Machado, publicada pela Folha de S. Paulo,
em 01/02/2012:

O MEC (Ministério da Educação) vai gastar cerca de R$ 110


milhões na compra de tablets para serem usados em sala de
aula sem ter produzido um estudo definitivo sobre o uso
pedagógico dos aparelhos. Conforme a Folha revelou ontem, o
MEC iniciou na semana passada, sem alarde, uma licitação
para a aquisição de 900 mil tablets. ("Sem saber como usar",
Folha de S. Paulo On-line, São Paulo, 01 fev. 2012. Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/23424-mec-
gasta-r-110-mi-em-tablets-sem-plano-pedagogico-
previo.shtml>. Acesso em 19/08/2012.)

Em oposição ao veiculado na matéria acima citada, a informação


divulgada no site do MEC é de que haverá cursos sobre as novas mídias
oferecidos a professores por especialistas de universidades federais, além de

                                                                                                               
2
Segundo artigo publicado pela Folha /Uol, em janeiro de 2012, o governo anunciou a
distribuição de 600 mil tablets para alunos do Ensino Médio. (Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/23424-mec-gasta-r-110-mi-em-tablets-sem-plano-
pedagogico-previo.shtml>, acesso em 19/08/2012). Além disso, diversas escolas particulares
já adotaram a tecnologia em suas salas de aula, como reportado no artigo “Enfim, o badalado
tablet chega à sala de aula”, da Veja On-line de 14 de agosto 2011. (Disponível em:
<http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/tablets-chegam-as-escolas-de-ponta-do-brasil-
%E2%80%93-e-trazem-um-velho-desafio>, acesso em 19/08/2012).

 
  11  
 

um acervo de materiais disponíveis a todos os profissionais da educação, no


Portal do Professor3.
Até o momento, no entanto, nota-se uma tendência de utilização desses
tablets de forma restritiva, isto é, como leitores de arquivos de texto (PDF,
DOC, DOCX, TXT) sem conexão à internet, desconsiderando-se possibilidades
muito mais ricas e complexas do dispositivo em questão. Dessa forma, adota-
se ou se altera a tecnologia, mas as práticas continuam situadas no velho
ethos, deixando à margem os letramentos necessários à contemporaneidade
em seus diversos âmbitos. Sobre essa tendência, ainda na mesma
reportagem, a coordenadora do programa ministerial no Sul e no Amazonas e
pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Léa
Fagundes, alerta para o fato de as medidas governamentais não abarcarem
discussões sobre como a compra do aparelho e seu uso poderão situar ou não
a educação em um novo ethos:

A única audiência pública realizada pelo MEC para subsidiar a


compra, em agosto, envolveu só aspectos técnicos, como
sistema operacional e tamanho de tela, e não as questões
educacionais. O receio dela é que o tablet seja usado para
reforçar o padrão educacional existente. “Tenho medo é de que
os governos estejam comprando porque nele cabem 300 livros
didáticos. Então, o paradigma não muda”, diz. ("Sem saber
como usar", Folha de S. Paulo On-line, São Paulo, 01 fev.
2012. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/23424-mec-gasta-r-
110-mi-em-tablets-sem-plano-pedagogico-previo.shtml>.
Acesso em 19/08/2012.)

Tal realidade de permanência do paradigma de ensino evidencia o fato


de que a escassez de estudos acerca dos usos de materiais didáticos digitais
interativos em sala de aula faz com que escolas e professores utilizem de
forma limitada os recursos tecnológicos hoje disponíveis ou não os utilizem. E
isso não ocorre apenas na rede pública de ensino. Ao longo de minha carreira
docente, pude entrar em contato com algumas escolas, situadas na região de
Campinas, pioneiras na utilização de tablets em sala de aula. Entretanto, o uso
                                                                                                               
3
“Ministério distribuirá tablets a professores do ensino médio”, Portal MEC, Brasília, 02 fev. 2012.
Disponível
em :<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=17479>.
Acesso em 19/08/2012.

 
  12  
 

dos dispositivos em questão, nessas instituições, se dava exatamente como


apontado por Fagundes, além de haver forte restrição ao uso da internet e de
seus serviços. Em especial, a escola escolhida como campo dessa pesquisa,
na verdade um núcleo dentro de um colégio tradicional, surgiu a partir de uma
proposta de Ensino Médio voltado para novas linguagens e tecnologias.
Embora a região fosse pioneira em adotar o uso de tablets, em seu primeiro
ano de funcionamento, as práticas educacionais mantiveram-se as mesmas.
Os dispositivos móveis eram utilizados meramente como leitores de arquivos
de apostila em PDF. Assim, a despeito de a escola possuir uma excelente
infraestrutura tecnológica, não havia um projeto pedagógico voltado para
concretização de sua proposta de ensino.
Ao aliar esse contexto escolar a meu trabalho prévio com materiais
didáticos para Produção e Interpretação Textual e mídias digitais, encontrei
condições de pesquisa adequadas para empreender esforços na construção de
um material didático digital interativo voltado para multiletramentos e novos
letramentos e, assim, procurar verificar alguns dos efeitos de seu uso em
componentes da prática docente.
Diante do histórico de meu campo de pesquisa e os relatos sobre
demais situações, pode-se observar que iniciativas governamentais e/ou
institucionais de inserção de tecnologias móveis no sistema educacional ou de
TICs, quando desacompanhadas de discussões metodológicas e pedagógicas
e de capacitação do corpo docente, tendem a reduzir o aproveitamento do
potencial de tais tecnologias, no intuito da manutenção de práticas situadas
num velho ethos. Sobre essa mesma questão, Coll, Mauri e Onrubia (2010)
afirmam que

as TIC podem ser utilizadas no marco de posturas pedagógicas


e práticas de aula muito diferentes entre si; sua incorporação
na educação escolar não comporta necessariamente a
colocação em marcha de inovações profundas nos postulados
e práticas nos quais elas estão inseridas. Na verdade, o que
indicam os resultados (...) é que essa incorporação se traduz,
em geral, em mais um reforço das posturas e práticas já
existentes do que na mudança ou transformação destas.
(COLL; MAURI; ONRUBIA, 2010, p. 75)

 
  13  
 

É interessante observar que, ao redor de todo o mundo, segundo


explicam os autores, a incorporação das novas tecnologias se dá de forma
heterogênea e, sobretudo, limitada, contrariando, assim o senso comum de
que em determinados países faz-se um uso proficiente de tais tecnologias na
área educacional.

A incorporação das TIC na educação está, portanto, longe de


apresentar um panorama tão homogêneo quanto às vezes se
supõe, e seus efeitos benéficos sobre a educação e o ensino
distam muito de ser tão generalizados quanto algumas vezes
se insinua, entre outras razões porque na maioria dos cenários
de educação formal e escolar as possibilidades de acesso e
uso dessas tecnologias ainda são limitadas ou mesmo
inexistentes. [...] tanto estudos de âmbito internacional e
regional quanto os de âmbito nacional (veja, por exemplo, o
trabalho do Instituto de Avaliação e Assessoria Educacional
[2007], com dados sobre a situação na Espanha; o de Sigalés,
Mominó e Meneses [2007], referente à Catalunha; o de Conlon
e Simpson [2003], referente à Escócia; o de Gibson e Oberg
[2004], sobre a situação no Canadá; ou, ainda, os de Cuban
[1993, 2001, 2003], sobre a situação nos Estados Unidos),
coincidem em destacar dois fatos que, com maior ou menor
intensidade, conforme o caso, aparecem com frequência. O
primeiro fato guarda relação com o uso limitado que
professores e alunos normalmente fazem das TIC. E o
segundo, com a limitada capacidade que parecem ter essas
tecnologias para impulsionar e promover processos de
inovação e melhora das práticas educacionais. (COLL; MAURI;
ONRUBIA, 2010, p. 71)

Um uso adequado de novas tecnologias na educação certamente tende


a fomentar o interesse pelo estudo da língua portuguesa por parte do alunado,
aproximando-o de usos da linguagem ancorados em práticas sociais mais
amplas que o contexto escolar e presentes em seu cotidiano. Se, para a
educação sob a ótica do Fordismo, bastava que tanto professores quanto
alunos apenas seguissem os conteúdos estanques de livros didáticos para,
com sorte, revelarem conhecimento acumulado com um bom desempenho em
provas e exames (KALANTIZIS; COPE, 2008), hoje, necessita-se mais das
instituições. Espera-se que a educação seja capaz de suprir a necessidade de
capacitação de jovens alunos para a atuação efetiva em uma sociedade
globalizada, em que a circulação da informação exige o domínio de novos
multiletramentos, para que esses jovens sejam mais do que meros
espectadores. Como destacam Kalantzis e Cope,

 
  14  
 

se a imagem predominante da economia antiga era a de


fábricas e chaminés, a imagem do que se chama “nova
economia” é a de um trabalhador sentado à frente de um
computador. A informação e as tecnologias da comunicação
dominam esta “economia do conhecimento”. (KALANTZIS;
COPE, 2008, p. 199, tradução nossa)4

Como salientado pelos autores acima, as novas práticas de letramento


estão profundamente relacionadas às novas tecnologias e se o papel da
educação é formar cidadãos plenos para atuação em diversos âmbitos da vida
como o do trabalho, da cidadania e da vida privada (COPE; KALANTZIS, 2006
[2000]), a escola, instituição responsável por tal tarefa, precisa compreender as
novas regras do jogo. Tal objetivo só poderá ser alcançado quando e se a
instituição escolar abandonar sua função estabelecida ao longo dos séculos da
modernidade e já obsoleta para o mundo contemporâneo. Ao ser criada, a
escola visava, segundo Cope e Kalantzis (2006 [2006]), socializar alunos tendo
em vista formar uma identidade nacional, por meio da alfabetização para uma
norma padrão e “correta” da língua nacional, do ensino da história das origens
da nação e da geografia das fronteiras. Hoje, no entanto, num mundo em que
as fronteiras nacionais caem diante da globalização e de comunidades
multilingues com identidades cada vez mais multifacetadas e fragmentadas,
não poderia ser mais anacrônico pensar em uma educação normativa e que
dissemine uma identidade nacional.
Dessa forma, especificamente no âmbito de ensino de Língua
Portuguesa, considerando as mudanças de paradigma advindas da
emergência das novas tecnologias de informação e comunicação, este estudo,
cujo caráter é qualitativo e interpretativo, utilizando-se de observação
participante, tem por objetivo geral verificar como se realizam os processos de
produção e condução de uma aula por meio da experiência de utilização de
materiais didáticos digitais interativos (MDDI) para tablets nesse contexto.
Do objetivo geral deste trabalho, desdobram-se as seguintes perguntas
de pesquisa:
                                                                                                               
4  “If the predominant image of the old economy was the factory and the smokestack, the image
of the so-called ‘new economy’ is the worker sitting in front of a computer screen. Information
and communications technologies dominate this ‘knowledge economy’.”

 
  15  
 

• Que elementos se destacam no processo de preparação de uma aula


mediada por MDDI?
• Como contexto sociocultural e a infraestrutura escolar influenciam nos
componentes da prática docente mediada por MDDI para tablets?
• Como os alunos interagem com o MDDI?
• Quais os caminhos utilizados pelos alunos ao interagirem com o
material? Como se dá essa interação?
• Como se caracterizam a interlocução na instância da aula e na do
exercício5 (BATISTA, 1997) diante do uso de MDDI para dispositivos
móveis?

Ao questionar sobre os elementos que se destacam na preparação de


uma aula mediada por MDDI, a primeira pergunta objetiva analisar quais das
possibilidades pedagógicas oriundas da interatividade, multissemiose e
funcionalidades contidas nesses materiais e dispositivos podem ser agregadas
aos processos de ensino e aprendizagem. Entretanto, não é possível tratar de
MDDI e dispositivos móveis sem considerar a configuração do contexto
sociocultural e tecnológico no qual tais elementos estão inseridos. Por essa
razão, a segunda pergunta visa a observar a influência de tais fatores em um
contexto de inserção de MDDI para tablets.
Já a terceira e a quarta perguntas objetivam verificar se e como as
práticas de leitura dos alunos são modificadas diante das funcionalidades de
navegação pelo MDDI para tablets. Note-se que, a partir da utilização do
material em questão e dos dispositivos móveis, o aluno pode navegar pela
internet, deparar-se com gêneros discursivos em suas mais diversas
linguagens, além de estar imerso em hipertextos e hipermídias. Possibilidades
como estas inseridas e direcionadas para o ensino em sala de aula eram

                                                                                                               
5
Para Batista (1997), a produção discursiva em sala de aula se organiza em duas instâncias ―
a instância da aula e a instância do exercício. Segundo o autor, ambas oferecem “diferentes e
relacionadas condições de produção de discurso, isto é, diferentes e relacionadas
modalidades de enunciação, objetivos e estratégias discursivas” (p. 33). No capítulo 2 desta
pesquisa, detalharemos a sustentação teórica para as instâncias discursivas da aula.

 
  16  
 

impensáveis há algum tempo na ainda vigente era do quadro negro e do


caderno. Por fim, a última pergunta de pesquisa intenciona verificar se, ao se
situar o ensino nesse contexto, a interação entre professor e alunos assume
novas formas ou se ela se mantém a mesma. É preciso considerar que, em
uma sala de aula na qual os alunos utilizam dispositivos móveis com acesso à
internet, há mais “distrações” possíveis a fazer concorrência com a aula
oferecida. Assim, é possível que o papel do professor necessite assumir um
caráter cada vez mais mediador entre os alunos e a infinidade de
conhecimentos acessíveis por meio das novas tecnologias digitais.
Tais perguntas estruturam um estudo em quatro capítulos. No primeiro
deles, “Um tempo para multiletramentos”, discute-se, com base em uma
bibliografia especializada, o contexto tecnológico contemporâneo e sua
influência nas relações sociais, a emergência dos multi e novos letramentos e
conflitos resultantes da coexistência de ethos distintos. O capítulo em questão
objetiva estabelecer bases para entendimento da confecção do referido MDDI.
O segundo capítulo, “Interação em sala de aula”, revisa subsídios teóricos
propostos por Rogoff (1995), Batista (1997), Bazerman (2005) e Rojo (2007)
para análises acerca dos processos de estruturação de aula e das relações
nela estabelecidas. Em seguida, o terceiro capítulo, “Metodologia de pesquisa”,
estabelece os parâmetros metodológicos e de coleta de dados deste estudo,
além de conceituar a técnica de pesquisa observação participante. Por fim, o
quarto capítulo, “análise de dados”, apresenta os resultados obtidos por meio
da análise de uma experiência de prática docente mediada por MDDI.

 
  17  
 

CAPÍTULO 1 – UM TEMPO PARA MULTILETRAMENTOS


 

A emergência de novas tecnologias da informação e comunicação e


da hipermídia6 alterou ― e continua a alterar ― significativamente as práticas
de comunicação, bem como as relações entre os atores nelas envolvidos.
Diante desse contexto de evolução tecnológica e de
estabelecimento de novas relações e práticas sociais, em meados da década
de noventa, um grupo de especialistas em linguagem e educação, conhecido
como Grupo de Nova Londres, articulou o conceito de multiletramentos a partir
da observação e interpretação das mudanças vigentes no mundo naquela
época e ainda hoje. O termo multiletramentos foi cunhado de forma a ser
capaz de designar dois tipos de multiplicidade crescentes na sociedade, a
multissemiose dos textos em circulação e a multiplicidade de culturas em
contato no mundo globalizado.
Sobre a primeira das multiplicidades discutidas pelo Grupo de Nova
Londres (a multissemiose ou multimodalidade), pode-se dizer que a
contemporaneidade apresenta um contexto comunicacional no qual a
informação, por meio de variadas mídias 7 , materializa-se em diversas
modalidades de linguagem 8 que se combinam entre si durante o processo
comunicativo, expandindo ou limitando a significação de um determinado
discurso (LEMKE, 2011).
Na atual sociedade, embora ela ainda seja consideravelmente
grafocêntrica, nota-se a expansão de textos multissemióticos e a inversão da
relação de dominação entre texto e imagem em determinadas esferas da
sociedade (BOLTER, 2002). Essa nova relação de valorização da imagem
sobre o texto escrito fica evidente, por exemplo, ao analisarmos as páginas de
revistas e jornais atuais, nos quais encontram-se inúmeras imagens estáticas e

                                                                                                               
6
Segundo Lemke (2002) e Santaella (2007), a hipermídia consiste na integração de textos,
sons e imagens em hipertextos.
7
Mídia, de acordo com a definição de Kress (2005), é um meio de circulação de mensagens
culturalmente significativas.
8
Ainda segundo Kress (2005), modalidade é um meio de representação baseado em uma
materialidade específica, compartilhado social e culturalmente.

 
  18  
 

infográficos. Ainda que hoje haja uma explosão de modalidades de linguagem9


na comunicação, devido às possibilidades advindas com as novas tecnologias
de informação e comunicação, é importante ressaltar que a multimodalidade
sempre esteve presente na sociedade (KRESS, 2005), manifestando-se por
meio de gestos corporais e faciais, tonalidades de voz e, mesmo nos textos
escritos, através de fontes de letra, mancha da página e estilo de diagramação.
Sobre os processos de formação de sentido em textos multimodais,
é possível dizer que

a significação é construída pela integração de modalidades


umas às outras, simultaneamente consciente e
inconscientemente ou automaticamente. (LEMKE, 2011, s/p) 10

Lemke ainda explica que, ao interpretarmos uma informação na qual


há integração de modalidades, não fazemos isso de forma consciente, pois não
há sistematização dessa habilidade, não somos explicitamente ensinados a
fazer isso. Ao analisar o trabalho com a multimodalidade nos primeiros anos de
escola, Kress (2006 [2000]) aponta o fato de as crianças serem encorajadas a
produzir imagens e ilustrações sem que, contudo, haja algum parâmetro de
avaliação ou direcionamento de produção como há no trabalho com textos
escritos. De acordo com o autor, “ [as ilustrações e imagens] são vistas como
expressão pessoal em vez de comunicação – algo que a criança faz de forma
espontânea, sem planejamento” (p.16).
Conforme o indivíduo avança em sua vida escolar, o trabalho com a
produção de textos multimodais, mesmo que carecendo de parâmetros
precisos para produção e análise, desaparece gradualmente da sala de aula,
fato que, segundo o autor, apresenta uma grande discrepância com o contexto

                                                                                                               
9
Embora Kress, em seus estudos, adote a terminologia “modalidades de linguagem” ou
“multimodalidade”, o conceito de “multissemiose”, preferido por Santaella e Rojo, parece-nos
mais pertinente para lidar com enunciados contemporâneos. Em comunicação pessoal, a
autora explica que a semiose consiste em um sistema de signos. Já a modalidade refere-se
aos diferentes modos de manifestação de uma semiose, às suas materialidades, como, por
exemplo, o oral e a escrita nos sistemas linguísticos ou a imagem estática e em movimento.
10
“Meanings are made through the co-deployment of different modalities with one another, both
consciously and unconsciously or automatically”. Todas as traduções para o português de
obras em inglês nos trechos citados neste trabalho são de nossa autoria.

 
  19  
 

multissemiótico do mundo atual. Sobre a problemática relacionada a um


trabalho adequado com multissemiose, Rojo (2013, p. 22), afirma que

com um impacto tão considerável nos multiletramentos, a


questão da dita “multimodalidade”, no entanto, não tem sido,
em nossa opinião, condignamente descrita nos trabalhos que
se debruçam sobre a multissemiose dos textos/enunciados
contemporâneos. O Grupo de Nova Londres (em especial,
COPE; KALANTZIS, 2006), como muitas outras pesquisas,
toma como base, principalmente, o trabalho de “semiótica
social” de Kress (2003; 2006; 2010) e de Kress e Van Leeuwen
(1996; 2001). Esses estão, por sua vez, fortemente baseados
na linguística sistêmico-funcional de Halliday, realizando,
portanto, uma projeção de uma gramática elaborada para a
língua (falada ou escrita) para outras semioses e mídias (ou
modalidades de linguagem), como a pintura, a fotografia, o
cinema, o vídeo, a música, a dança etc. Trata-se de uma
extensão do conceito de modalidade de língua (oral e escrita) a
outras semioses, organizadas e materializadas em outras
configurações e outras lógicas, estendendo, por exemplo, o
conceito de gramática a uma “gramática visual”.

Em sua análise da proposta do Grupo de Nova Londres para trabalho


com textos/enunciados multissemióticos, Rojo (2013) afirma que o projeto dos
multiletramentos, nos textos do Grupo de Nova Londres (2006 [2000], p. 26) e
de Cope e Kalantzis (2006, p. 212-219), procura propor uma grade analítica
para cinco modalidades (linguística, visual, espacial, gestual e sonora). Tal
grade analítica baseia-se nas propostas de trabalho com enunciados
multimodais de Kress e Van Leeuwen (1996). Segundo a autora, essa
metodologia de análise tem por consequência a pulverização imediata dos
enunciados multissemióticos em seus elementos formais, sua “materialidade”,
como afirma Kress (2006). O diagrama reproduzido na página seguinte
representa esse modelo de análise proposto pelo autor (ver Figura 1).

 
  20  
 

Figura 1: Ilustrativa dos sistemas multimodais e de seus elementos a serem considerados (GRUPO
DE NOVA LONDRES, 2006[2000], p. 26)

 
Já a proposta de análise de enunciados multimodais de Cope e
Kalantzis (2006), conforme explica Rojo (2013), relaciona os elementos das
linguagens a níveis e categorias de análise, retiradas da mesma teoria
proposta por Kress (2003; 2006; 2010) e Kress e Van Leeuwen (1996; 2001),
tais como os níveis:
• Representacional: As significações referem-se a quê?
(referenciação) – relações anafóricas e dêiticas no
linguístico e sons naturalísticos e representações
icônicas no sonoro e no visual, por exemplo;
• Social: Como as significações conectam as pessoas
que envolvem? (interação) – processos,
atributos/circunstâncias e lugar do enunciador no
linguístico; tempo, tonalidade e acompanhamento na
música, por exemplo;

 
  21  
 

• Organizacional: Como as significações se conectam?


(organização formal) – mídia, entonação e gênero no
linguístico e ritmo, prosódia, altura e gênero no sonoro
(música), por exemplo;
• Contextual: Como os significados se encaixam no
mundo mais amplo da significação? (ancoragem e
remissão) – referenciação (novamente) e
intertextualidade no linguístico e motivos e refrões na
música, por exemplo;
• Ideológico: A quais interesses a significação está
destinada a servir? (relações de poder) – autoria,
contexto e responsabilidade no linguístico e
intensidade no sonoro, por exemplo.

Além de chamar a atenção para o fato de o gênero, no modelo de


análise em questão, estar ligado exclusivamente à organização formal e não
aos efeitos de sentido, Rojo (2013) ainda aponta a fragmentação, formalização
e descontextualização gerados por uma análise a partir de tais parâmetros. A
autora também salienta a inadequação em se separar em diversos níveis de
análise o “social”, o “contextual” e o “ideológico” (ROJO, 2013, p. 25). Por fim,
Rojo, tendo por base as duas formas de criação de significação
complementares sobre as quais discorre Lemke (1998) 11 ― a tipológica e
topológica ―, conclui que “não se pode analisar semioses topológicas a partir
de categorias criadas para analisar semioses tipológicas” (ROJO, 2013, p. 26).
Tal tentativa de aplicar análises tipológicas a elementos topológicos talvez seja
um dos aspectos mais limitadores na proposta do Grupo de Nova Londres.
Segundo Lemke (1998, s/p, apud ROJO, 2013, p. 11),

nossas realidades vividas não podem ser completamente


representadas de maneiras puramente tipológicas; pessoas
demais ficam sem voz quando não há outras maneiras de criar
significação. O potencial topológico dos letramentos multimídia
                                                                                                               
11
Segundo Lemke, “criamos significação de duas maneiras fundamentalmente
complementares: (1) classificando coisas em categorias mutuamente exclusivas e (2)
distinguindo variações de grau (ao invés de tipo) em vários contínuos de diferença. A língua
opera principalmente da primeira maneira, que chamo de tipológica. A percepção visual e
gestual/espacial (desenhar, dançar) opera principalmente da segunda maneira: a topológica.
Como já disse, a real criação de significação geralmente envolve combinações de diferentes
modalidades semióticas e, logo, também combinações desses dois modos gerais.” (LEMKE,
1998, s/p)

 
  22  
 

pode ajudar a dar voz, dignidade e poder a pessoas reais


híbridas. Pode minar um sistema ideológico que limita as
identidades pessoais a um pequeno número de “gavetas”
disponíveis e aprovadas socialmente e deixar que nos
mostremos e vejamos uns aos outros em um universo
multidimensional de possibilidades humanas reais muito mais
amplo.

Rojo (p. 26-27) encontra na teoria de gêneros do discurso do Círculo


de Bakhtin amparo teórico para trabalho com textos/enunciados
contemporâneos, pois o caráter multissemiótico de tais práticas de linguagem
“não parece desafiar fortemente os conceitos e categorias propostos pela
teoria dos gêneros” (p. 27). A autora explica que, segundo a teoria em questão,
as práticas de linguagem e enunciação sempre ocorrem de forma situada em
determinados contextos de comunicação, definidas pelo funcionamento das
esferas de circulação de discurso. As esferas em questão situam-se
historicamente em um tempo e lugar específicos condicionados culturalmente.
Além disso, Rojo atenta ao fato de que o funcionamento dessas esferas define
os locutores e interlocutores da enunciação, seus lugares e poderes, assim
como as possibilidades de conteúdos temáticos e de gêneros.
Entretanto, a enunciação não é definida mecanicamente pelo
funcionamento social das esferas,

pois o que vai substancialmente definir a significação e o tema


de um enunciado/texto é sobretudo a apreciação de valor ou a
avaliação axiológica (ética, política, estética, afetiva; BAKHTIN/
VOLOCHINOV, 1981[1929]) que os interlocutores fazem uns
dos outros e de si mesmos ou de seus lugares sociais e do
conteúdo temático em pauta, que, apreciado valorativamente,
transforma-se em tema (irrepetível) do enunciado. (ROJO,
2013, p. 28)

Rojo ainda explica que o funcionamento das esferas “define


maneiras específicas de dizer/enunciar, de discursar, cristalizadas e típicas
desse campo social – os gêneros de discurso” (p. 28), que são apenas
relativamente estáveis e podem variar de acordo com a situação de
comunicação na qual se encontram. Além disso, a autora chama atenção para
o fato de que os gêneros discursivos não são apenas um formato, pois, embora
eles definam as formas de composição do enunciado e seu estilo, isso se dá

 
  23  
 

“em função da composição de um tema, ou seja, de certos efeitos de sentido


visados pela vontade enunciativa do locutor e dependentes de sua apreciação
de valor sobre significações ou parceiros interlocutores.” (p. 28)
Ao aplicar a teoria dos gêneros do discurso do Círculo de Bakhtin a
textos/enunciados contemporâneos, Rojo explica que

as esferas [...] se valem de diferentes mídias (impressa,


radiofônica, televisiva, digital) para a circulação de seus
discursos e também selecionam diferentes recursos semióticos
e diversas combinatórias possíveis entre eles para atingir suas
finalidades e ecoar seus temas, provocando mudanças nos
gêneros. É o caso de uma notícia em mídia digital, que
combina livremente, à escolha do “lautor” 12 , a escrita em
hipertexto, com fotos e imagens, vídeos, álbuns fotográficos e,
por vezes, áudio em podcast. Então, as mídias e as tecnologias
são escolhas, e de caso bem pensado, das esferas de
circulação de discursos. Mas têm, de imediato, efeito nas
formas de composição e nos estilos dos enunciados, inclusive
em termos de multimodalidade. (ROJO, 2013, p. 29)

Para representar sua proposta analítica baseada no Círculo de


Bakhtin, Rojo propõe o diagrama abaixo (ver figura 2).

Figura 2: Elementos da Teoria Bakhtiniana dos Gêneros Discursivos revisitados (ROJO, 2013, p. 30)

Além da multissemiose, como afirmado anteriormente, o conceito de


multiletramentos também se relaciona à multiplicidade de culturas, expressas
por diferentes linguagens e seus usos em contextos específicos. Assim, Cope
e Kalantzis (2006, p. 166) explicam que, central à abordagem por eles
                                                                                                               
12
Neologismo proposto pela autora para indicar que, nos textos digitais, mais que nunca o
leitor e o autor se unificam, recepção e produção são concomitantes e produtores são
também consumidores (produsers).

 
  24  
 

proposta, está a crescente variedade de “linguagens sociais”, nomenclatura


proposta por que Gee (1996) 13, em grupos de interesse ou afinidade no âmbito
profissional, nacional, étnico e subcultural. Segundo os autores, a
disseminação dessas multiplicidades (culturais, de linguagens) acompanha a
reestruturação do funcionamento de três âmbitos da vida humana: o do
trabalho (diversidade produtiva), o da cidadania (pluralismo cívico) e o da vida
social (KALANTZIS; COPE, 2006 [2000]). Para Cope e Kalantzis, dessa forma,
além de considerar as multiplicidades abarcadas pelos multiletramentos, uma
educação linguística apropriada ao contexto contemporâneo precisa levar em
conta a reestruturação desses âmbitos da vida humana e suas demandas.
No âmbito do trabalho, os autores salientam suas transformações ao
explicar que a modernidade tardia não mais se organiza de maneira fordista,
ou seja, por meio da divisão do trabalho em linha de produção e da produção e
consumo de massas. No pós-fordismo, necessita-se de um trabalhador
multicapacitado, autônomo e flexível para adaptação a constantes mudanças.
Mesmo as tradicionais e rígidas hierarquias presentes no ambiente profissional
são substituídas por relações colaborativas e em moldes pedagógicos
(profissionais encarregados de agir como mentores, de treinar e de ensinar).
Quanto às reestruturações no âmbito do pluralismo cívico, Cope e
Kalantzis chamam a atenção para o declínio do conceito de ser cidadão sob a
perspectiva nacionalista e monocultural. Assim, em vez de um Estado
fundamentado em apenas uma cultura e uma língua, necessita-se de Estados
capazes de negociar a diferença e de desenvolver em seus cidadãos a

habilidade de expressar e representar identidades


multifacetadas apropriadas a diferentes modos de vida,
espaços cívicos e contextos de trabalho em que cidadãos se
encontram; a ampliação dos repertórios culturais apropriados
ao conjunto de contextos em que a diferença tem de ser
negociada; [...] a capacidade de se engajarem numa política
colaborativa que combina diferenças em relações de
complementaridade. (KALANTZIS; COPE, 2006 [2000], p.
14
271, tradução nossa)

                                                                                                               
13
Gee faz uso do mesmo termo utilizado por Bakhtin (1985[1934-35/1975]).
14
“ability to express and represent multilayered identity appropriate to the different lifeworlds,
civic spaces, and work contexts that all citizens encounter; the extension of cultural repertoires
appropriate to the range of contexts where difference has to be negotiated; [...] capacity to

 
  25  
 

Por fim, com respeito ao âmbito da vida privada, as muitas culturas


híbridas vivenciadas por cada um de nós na contemporaneidade geram uma
consciência descentrada e fragmentada. Segundo os autores, ninguém
consegue pertencer a uma única comunidade. Em vez disso, as pessoas estão
inseridas em múltiplas comunidades (comunidades de trabalho, de interesse,
de etnia, de identidade sexual) que se sobrepõem, constituindo, assim,
relações complexas entre si. Por essa razão, Kalantzis e Cope afirmam ser
necessário buscar um pluralismo integrativo, no qual a diversidade se torne a
base paradoxal da coesão (p. 145).
Concomitantemente a essa reestruturação dos âmbitos da vida
humana, as tecnologias digitais permitiram uma nova configuração nas
relações sociais, bem como das relações entre cidadãos e instituições.
Segundo Cope e Kalantzis (2009), a antiga relação hierárquica Estado-cidadão
(top-down) tem sido substituída por uma relação em que pessoas
desempenham um papel cada vez mais ativo na sociedade, passando de
meros espectadores a atores (bottom-up). Os autores explicam que, conforme
a influência do Estado diminui, presenciamos a emergência de estruturas que
governam a si mesmas na sociedade civil, a exemplo de certos espaços na
internet. A autonomia alcançada nas últimas décadas evidencia-se também ―
sobretudo nas gerações mais jovens ― no controle de seleção de informação
que chega até nós, bem como nos canais utilizados para isso:

Eles (novas gerações) buscam ser atores em vez de audiência,


jogadores em vez de espectadores [...]. Não contentes com o
rádio, essas crianças criam suas próprias playlists em seus
iPods. Não contentes com a televisão tradicional, eles leem
suas narrativas por DVDs e vídeos via internet-stream,
variando na profundidade dessa leitura (o filme, o documentário
a respeito do making-of do filme) [...]. Não contentes com uma
visão única da transmissão de jogos esportivos pela televisão
aberta, eles escolhem seus próprio ângulos, replays e análises

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   
engage in collaborative politics which matches differences in relationships of
complementarity.”

 
  26  
 

estatísticas na televisão interativa. (COPE; KALANTZIS, 2009,


p. 173, tradução nossa)15

Tal panorama de reorganização das relações sociais e


comunicacionais completa-se com a emergência da cibercultura, definida por
Lemos (2002, p. 8) como “as relações entre as tecnologias informacionais de
comunicação e a cultura, emergentes a partir da convergência
informática/telecomunicação na década de 1970”. Segundo o autor, o princípio
que rege a cibercultura é a remixagem, “um conjunto de práticas sociais e
comunicacionais de combinações, colagens, cut-up de informações a partir das
tecnologias digitais” (LEMOS, 2005, p. 8). A partir desse processo, qualquer
pessoa pode ser criadora de informação, veiculada por meio da internet nos
mais diversos gêneros discursivos e modalidades.
Juntamente à cibercultura, observa-se também a emergência de
uma cultura da convergência, definida por Jenkins (2008, p. 29) como um
cultura em que há

fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos,


cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e
comportamento migratório dos públicos dos meios de
comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das
experiências de entretenimento que desejam.

Nessa cultura, de acordo com Jenkins (2008, p. 29), “velhas e novas


mídias colidem” e “a mídia corporativa e a mídia alternativa se cruzam”. Além
disso, a autor atenta para o fato de que, nesse contexto, “o poder do produtor
de mídia e o poder do consumidor interagem de maneiras imprevisíveis”.
No mundo contemporâneo, conceitos como remixagem,
convergência e uma outra forma de interação entre empresas produtoras de

                                                                                                               
15
“They are content with being no less than actors rather than audiences, players rather than
spectators, agents rather than voyeurs and users rather than readers of narrative. Not content
with programmed radio, these children build their own playlists on their iPods. Not content with
programmed television, they read the narratives on DVDs and Internet-streamed video at
varying depth (the movie, the documentary about the making of the movie) and dip into
“chapters” at will. Not content with the singular vision of sports telecasting on mass television,
they choose their own angles, replays and statistical analyses on interactive digital TV.”

 
  27  
 

material cultural e sociedade são relativamente novos e deles emergem novas


relações e comportamentos. Assim,

em vez de falarmos sobre produtores e consumidores de mídia


como ocupantes de papéis separados, podemos agora
considerá-los como participantes interagindo de acordo com
um conjunto de regras, que nenhum de nós entende por
completo. (JENKINS, 2008, p. 30)

As questões levantadas por Jenkins reafirmam o perfil defendido por


Cope e Kalantzis de um novo cidadão cada vez menos passivo, o qual não se
contenta mais em assumir um papel de espectador, pois quer participar, ter voz
e controle.
Percebe-se que essas novas ordens e relações trazem à tona
questões éticas e legais, ainda sem delimitações claras. Tais questões
relacionam-se, por exemplo, à exposição pessoal excessiva, aos limites entre
vida pública e vida privada e aos direitos autorais dos materiais produzidos e
daqueles que serviram de matéria prima para os remixes. Cope e Kalantzis
(2009) ainda apontam o paradoxo contido nessas novas relações entre mídia e
público, pois, ao passo em que consumidores e usuários tornam-se mais
autônomos em relação ao manuseio da informação, há uma centralização de
poder por parte dos meios de comunicação, cuja posse e controle tornam-se
cada vez mais restritos. Dessa forma, os autores discutem as possibilidades
dessa interação e suposto controle sobre a informação servirem como forma
de escape da realidade em vez de preparar para ela. Além disso, ao citar o
exemplo do Google16, os estudiosos evidenciam as aberturas para o monopólio
sobre as fontes de mídia e de conhecimento disponíveis e para o uso de dados
pessoais com fins publicitários.

                                                                                                               
16
Neste caso, os autores se referem aos critérios de gerenciamento de busca de informação
do Google, os quais podem se submeter a políticas da empresa, interesses financeiros ou
questões políticas. Assim, ao utilizar o buscador pode haver, ainda que seja amplo, um
espectro delimitado de resultados obtidos, que, de uma forma ou outra, direciona os
resultados apresentados.

 
  28  
 

1. Multiletramentos, novos letramentos, tecnologias e educação

Com essas novas perspectivas, realidades e dilemas, emergem


questionamentos referentes à instituição escolar e a seu papel na formação de
cidadãos aptos a exercerem todos as posições requeridas pela sociedade
contemporânea.

O que é uma educação apropriada para mulheres, para


indígenas, para imigrantes que não falam a língua nacional,
para falantes dos dialetos não-padrão? O que é apropriado
para todos no contexto de fatores de diversidade local e
conectividade global cada vez mais críticos? (GRUPO DE
NOVA LONDRES, 2006[2000], p. 10, tradução nossa).17

Além de questões relacionadas a uma educação dirigida a uma


população cada vez mais multicultural em uma sociedade de muitas linguagens
e semioses, é preciso considerar, como defende Luke (2000, p. 141-142), a
necessidade de apoderamento de novos letramentos ligados à realidade do
século XXI, pois "os letramentos mudaram e continuarão a mudar conforme
novas tecnologias surgirem". Especificamente, diante da realidade multimodal
da comunicação atual, Rojo e Moita-Lopes (2004, p. 44) constatam que as
novas práticas de letramento exigidas pelos textos contemporâneos ampliam o
escopo do conceito “para o campo da imagem, da música, das outras
semioses que não somente a escrita". Portanto, faz-se necessário à escola
capacitar os indivíduos a interagir com tais textos. Além disso, a instituição
escolar deve levar em consideração que a multimodalidade presente nas telas
dos computadores e em muitos materiais impressos tem "transformado o
letramento tradicional (da letra/livro) em um tipo de letramento insuficiente para
dar conta dos letramentos necessários para agir na vida contemporânea"18.

                                                                                                               
17
“What is appropriate education for women; for indigenous peoples; for immigrants who do not
speak the national language; for speakers of non-standard dialects? What is appropriate for all
in the context of the ever more critical factors of local diversity and global connectedness?”
18
Sobre esse assunto, Street et al. (2009) fazem uma discussão análoga à de Moita-Lopes e
Rojo (2004), citando outros dois autores importantes na discussão sobre o estudo dos novos
letramentos. O autor defende que "o currículo escolar de hoje está fortemente focado em
letramentos impressos e tais letramentos estão sendo rapidamente suprimidos pela realidade
da comunicação contemporânea. Este argumento, para os novos letramentos, foi defendido
fortemente por Lankshear e Knobel em uma série de livros que criticam a inabilidade

 
  29  
 

Com essas novas práticas comunicacionais, novos letramentos


emergiram. Tais letramentos são intrínsecos às novas práticas sociais ― novas
necessidades requeridas para o trabalho, novas maneiras de exercer cidadania
em espaços públicos e, talvez, novas formas de constituições de identidades e
personalidades (COPE; KALANTZIS, 2009).
Por essa razão, Luke (2000) sugere que

educadores precisam estar familiarizados com as muitas


questões presentes na "revolução da informação". Assim, nós
saberemos o momento em que se deve intervir de maneira
positiva e com estratégias críticas para o ensino dos
multiletramentos e também como fazer uso adequado dos
muitos recursos multimídia disponíveis. (LUKE, 2000, p. 142,
tradução nossa)19

Diante de um mundo no qual “o forte senso de cidadania parece


ceder espaço à fragmentação local e comunidades tornam-se mais diversas e
subdivididas culturalmente” (COPE; KALANTZIS, 2006 [2000], p. 31), o Grupo
de Nova Londres propõe uma educação capaz de proporcionar aos alunos
projetos de futuro, “future designs”, considerando-se as novas organizações
nos âmbitos do trabalho, da cidadania e da vida privada (life-world)
(KALANTZIS; COPE, 2006).
Tais concepções de educação vão de encontro à organização
tradicional escolar, cujos objetivos residem na mensuração da qualidade
educacional por meio de estatísticas provindas de avaliações com foco cada
vez mais distante das habilidades de letramento e numeramento exigidas a
estudantes na nova economia20 (KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003).
A base desse antigo modelo educacional, segundo os autores, era
eficaz para a organização fordista do âmbito do trabalho e visava a padronizar
pessoas por meio de uma única língua nacional considerada apropriada e pelo
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   
curricular da escola em abranger os complexos e cada vez mais necessários letramentos
digitais." (STREET; PAHL; ROWSELL, 2009, p.197)
19
“educators need to become familiar with the many issues at stake in the ‘information
revolution’ so that we know how and where we must intervene with positive and critical
strategies for Multiliteracies teaching, and how to make the best and judicious use of the many
multimedia resources available.”
20
O termo nova economia basicamente refere-se à nova organização industrial e social que
acompanha as novas tecnologias comunicacionais (KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003, p.
20).

 
  30  
 

ato de decorar fatos sobre a história, ciência e linguagens. Além disso, leitura e
escrita eram trabalhadas superficialmente e a disciplina se demonstrava pela
mera reprodução de informações em avaliações, pela “regurgitação de
verdades rigidamente definidas” (KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003, p. 16).
Toda a rigidez intrínseca a esse modelo fordista de educação, cujas
características eram (são?) visíveis na inegociável organização em linha reta
das carteiras, na aquisição acrítica de fatos dificilmente aplicados em contextos
extraescolares e na centralização de todo o conhecimento nas mãos do
professor ― ou talvez do livro didático ― atingia seu objetivo máximo ao
produzir lotes e mais lotes de alunos passivos, educados para receberem
verdades absolutas e “aceitar uma determinada autoridade, fazendo
exatamente o que lhes era dito” (p. 20).
Esse sistema configurou uma educação para um tempo específico.
Com o advento das novas tecnologias comunicacionais e do funcionamento
sociopolítico da modernidade recente, é preciso repensar a estrutura
educacional, pois, no âmbito do trabalho,

a diversidade permeia a nova organização econômica [...]. Em


vez da afirmação de Henry Ford de que consumidores são
todos iguais, agora as organizações querem estar próximas a
eles, para descobrir o que realmente querem, atendendo,
assim, sua necessidades de forma personalizada.
(KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003, p. 20, tradução nossa)21

Ainda segundo os autores, as organizações industriais, atualmente,


investem cada vez mais na obtenção de informação a respeito de diferenças
históricas, étnicas, geográficas, sexuais e de interesses de seus clientes. Em
vez de produção em massa, fala-se em “customização em massa”. Além disso,
a diversidade está presente dentro das próprias indústrias. Quando a
diversidade cultural dos trabalhadores (orientação sexual, etnia, variação
linguística) é respeitada entre eles, quando se negocia com a diferença, ela
pode ser utilizada como fonte de criatividade e como um elo entre organização

                                                                                                               
21
“diversity is everywhere in the new economy organization [...]. Instead of Henry Ford’s
assertion in which individual customer needs are irrelevant because customers are all the
same, organizations now want to be close to customers, to find out what they really want, and
to service their needs in a way which works for them.”

 
  31  
 

e a miríade de nichos presentes na sociedade. Assim, necessita-se cada vez


mais de um trabalhador autônomo e flexível, que saiba negociar com a
diferença, transitar entre as muitas linguagens e suas formas de manifestação
dentro do âmbito do trabalho e que se adapte a mudanças constantes (COPE;
KALANTZIS, 2000).
Ao tratar das mudanças verificadas no âmbito da cidadania, Cope e
Kalantzis atentam à pluralidade cultural e ao fato de uma identidade nacional
homogênea estar em declínio.

O declínio do antigo senso cívico monocultural e nacionalista


abriu um espaço que deve ser preenchido novamente. Nós
propomos que esse espaço deve ser reivindicado por um
pluralismo cívico. Em vez de padrões relativos a apenas uma
cultura e um padrão linguístico, nós precisamos negociar a
diferença. (COPE; KALANTZIS, 2000, p. 41, tradução nossa)22

Nestes termos, as pessoas passam a ser constituídas por


identidades fragmentadas, transitando constantemente por diversas culturas.
Para os autores, nesse contexto, “negociar essas diferenças é agora um
assunto de vida ou morte” (p. 38). Cope e Kalantzis ainda afirmam que “a
diversidade cultural e linguística são agora questões críticas e centrais e, como
resultado disso, o significado da pedagogia de letramento mudou” (p. 40). A
diversidade local e interligação global não apenas descontroem a
padronização, mas criam a necessidade de desenvolver no estudante a
habilidade de negociar as diferenças dialetais, sejam elas étnicas, regionais ou
baseadas em classes sociais.
Ao se considerar o âmbito da vida privada, além de questões
referentes às identidades multifacetadas (COPE; KALANTZIS, 2006 [2000]),
podemos relacioná-lo a novas práticas e dilemas advindos da cibercultura
(LEMOS, 2002) e da cultura da convergência (JENKINS, 2008) como, por
exemplo, as fronteiras entre vida pública e privada e os limites legais para

                                                                                                               
22
“The decline of the old, monocultural, nationalistic sense of ‘civic’ has vacated a space that
must be filled again. We propose that this space be claimed by a civic pluralism. Instead of
states that require one cultural and linguistic standard, we need states which arbitrate
differences.”

 
  32  
 

práticas de remixagem. Tais assuntos estão no campo dos (multi)letramentos


e, portanto, deveriam ser concernentes também à instituição escolar.
Embora o contexto contemporâneo tecnológico e multicultural esteja na
base da definição do conceito de multiletramentos proposto pelo Grupo de
Nova Londres, é um equívoco considerá-lo como sinônimo do conceito de
novos letramentos proposto por Lankshear e Knobel (2007). Enquanto o
primeiro constrói-se com base na multissemiose e multiculturalidade, o
segundo, ainda que eventualmente acabe por abarcar esses dois aspectos,
necessita das perspectivas técnicas oriundas das novas tecnologias de
informação e comunicação juntamente a uma nova ética proporcionada por
essas tecnologias. Assim, é possível afirmar que nem toda prática social
situada nos multiletramentos é, de fato, um novo letramento. Para esta
pesquisa, consideramos importante conceituar ambos os casos, pois o material
didático digital interativo e as relações estabelecidas em sala de aula mediante
sua aplicação relacionam-se a essas duas concepções e sua distinção terá
papel importante nos resultados da análise.
Em resposta à questão acerca do que então constitui um novo
letramento, Lankshear e Knobel (2007) afirmam que “novos letramentos têm o
que se denomina de new technical stuff e new ethos stuff” (p.7, tradução
nossa)23.
Diante dessa asserção, os autores distinguem os novos letramentos em
duas categorias: os casos paradigmáticos de novos letramentos (paradigm
cases of new literacies) e os casos periféricos de novos letramentos (peripheral
cases of new literacies). Lankshear e Knobel afirmam que seu foco de estudo
reside na primeira categorização. A distinção entre as categorias levantadas é
explicada por eles da seguinte forma:

Casos paradigmáticos de novos letramentos têm relação com


novas tecnologias digitais e situam-se em um novo ethos. Casos
periféricos de novos letramentos situam-se num novo ethos, mas
não têm relação com as novas tecnologias. Em outras palavras,
se um letramento não se situa em novo ethos, não é possível
considerá-lo como novo letramento, mesmo que ele se relacione

                                                                                                               
23
(...) new literacies have what we call new “technical stuff” and new “ethos stuff”.

 
  33  
 

às tecnologias digitais. (LANKSHEAR; KNOBEL, 2007,p. 7,


tradução nossa)24

Segundo os pesquisadores, essa dupla condição, situar-se em um novo


ethos e relacionar-se a novas tecnologias (new technical stuffs), é necessária,
pois é possível utilizar tecnologias digitais para replicar práticas tradicionais de
letramento, como, por exemplo, é comumente constatado em salas de aula,
nas quais se inserem computadores, lousas digitais e dispositivos móveis, mas
mantém-se os mesmos paradigmas educacionais já consolidados na instituição
escolar.
Para que se compreenda de forma mais clara o conceito de novos
letramentos, os autores apresentam definições para new technical stuff e new
ethos stuff, ou seja, as duas condições necessárias para que esse tipo de
letramento se materialize. Segundo Lankshear e Knobel, para conceituar o que
chama de new technical stuff, é preciso considerar que há atualmente à
disposição diferentes tipos de aparatos tecnológicos, como computadores,
consoles de games, mp3 players, por meio dos quais se utilizam softwares
com aplicabilidades diversas, como, por exemplo, produção e edição de textos,
de animação e para comunicação. Alguém com acesso a tais recursos, mesmo
possuindo pouco conhecimento técnico das funcionalidades de um software,
pode criar uma gama de produções (textos multimodais, animações, imagens,
músicas) utilizando uma série de operações, tais como digitar, clicar, copiar,
colar, arrastar, em pouco tempo e com uma ou duas ferramentas. Além disso,
os softwares permitem editar imagens, músicas e vídeos e, assim, a partir de
um conteúdo original ou já editado, criar novas produções.
Para Lankshear e Knobel, um novo ethos consiste em uma nova ética,
uma nova mentalidade para lidar com os discursos veiculados na sociedade
contemporânea. Essa nova ética enfatiza uma maior participação das pessoas
e maior colaboratividade na produção de discursos, fator que resulta na
dissolução da autoria e em relações assimétricas. Além disso, dispensam-se

                                                                                                               
24
Paradigm cases of new literacies have both new “technical stuff ” (digitality) and new “ethos
stuff.” Peripheral cases of new literacies have new “ethos stuff” but not new “technical stuff.” In
other words, if a literacy does not have what we call new ethos stuff we do not regard it as a
new literacy, even if it has new technical stuff.

 
  34  
 

conhecimentos técnicos altamente especializados e recursos tecnológicos


caros na produção de tais discursos, fato que, há algumas décadas, não seria
possível. Consequentemente, evidencia-se que nesse novo ethos as regras e
normas são mais fluídas e menos formatas.
Diante desse novo ethos, Lanshear e Knobel apontam para a
emergência de uma nova mentalidade, representada a seguir:

Mentalidade 1 Mentalidade 2
• O mundo opera basicamente de acordo • O mundo opera, cada vez mais, de
com princípios e lógicas físicas/materiais acordo com princípios e lógicas não-
e industriais. materiais (ou seja, ciberespaciais) e pós-
• O valor varia em função da escassez industriais. O mundo é descentralizado e
• A produção é baseada num modelo planificado.
“industrial” • O valor varia em função da dispersão
• Produtos são artefatos materiais e • Uma visão pós-industrial da produção
mercadorias • Produtos gerados a partir dos serviços
• Produção é baseada na infraestrutura e que o requerem (customização)
em unidades e centros de produção (por • Foco no processo de alavancagem e de
exemplo, uma firma ou uma companhia) participação não finita
• Ferramentas são, em sua maioria, • Cada vez mais, ferramentas são de
ferramentas de produção mediação e tecnologias para
• O indivíduo é a unidade de produção, relacionamento
competência e inteligência • O foco é, cada vez mais, no coletivo como
• Habilidades e autoridade estão a unidade de produção, competência e
localizadas no indivíduo e nas instituições inteligência
• O espaço é fechado e obedece a • Habilidades e autoridade são distribuídas
finalidades específicas e coletivas; habilidades híbridas
• Relações sociais marcadas pela • O espaço é aberto, continuo e fluido
hegemonia do livro prevalecem; uma • Relações sociais marcadas pela
estável “ordem do texto” crescente participação das mídias digitais
são cada vez mais visíveis; textos em
mudança contínua

1
Figura 3: Algumas variações entre diferentes mentalidades (LANKSHEAR; KNOBEL,
2007, p. 11)  

Mais que apenas o domínio das tecnologias e dos novos


letramentos, uma educação linguística adequada à contemporaneidade
necessita de novas bases de aprendizagem que não se limitem a regras e a
sua correta aplicação. Além disso, é necessário dominar variados tipos de
linguagem, bem como de ferramentas (aplicativos, softwares) de edição de
texto e também de imagens e áudio. Práticas educacionais adequadas são
eficazes em preparar um indivíduo a deparar-se com textos não familiares e
buscar formas de interpretá-los, sem sentir-se imediatamente alienado ou

 
  35  
 

excluído. Novas práticas educacionais relacionam-se também à busca do


entendimento de como esses textos não familiares, seu contexto de produção
e intenção comunicacional funcionam na construção da significação.
A necessidade de flexibilidade, de autonomia, de capacidade
de trabalhar colaborativamente, de habilidades para resolver
problemas diversos e de conhecimento amplo e variado
aplicável são cada vez mais visíveis devido às mudanças nas
práticas de letramento. Os multiletramentos, no entanto, são
simples e claros exemplos de uma ampla tendência na nova
economia, que demonstra a demanda de novas orientações
para o conhecimento. (KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003, p.
23, tradução nossa)25

Kalantzis, Cope e Harvey (2003) afirmam ainda que novas bases


para educação tornarão possível às pessoas navegarem pela mudança e
diversidade, resolverem problemas de diferentes naturezas, trabalharem de
forma colaborativa, flexível e criativa. Contudo, advertem que, para promover
tais características, é necessário, juntamente com a reestruturação do ensino e
do currículo, uma mudança nos processos avaliativos. Segundo os autores,
avaliações tradicionais são capazes de demonstrar estatísticas relacionadas ao
desempenho de alunos em práticas de ensino tradicionais e inadequadas às
necessidades contemporâneas. Assim, os autores propõem parâmetros
avaliativos que considerem o desenvolvimento de projetos, nos quais se
necessite trabalho colaborativo, flexibilidade e uso de conhecimento em
resolução de problemas complexos, organização e manuseio de informação e
apresentação de resultados (p. 24).

2. Mundos em choque

A pedagogia dos multiletramentos desenvolvida pelo Grupo de Nova


Londres aponta para a necessidade de uma profunda mudança de paradigmas
no ensino. Ao se estudar o desenvolvimento da estrutura educacional,
evidencia-se que a preservação de tais paradigmas cristalizou-se há muito:

                                                                                                               
25
“The need for flexibility, autonomy, collaboration, problem-solving skills, broad
knowledgeability, and diverse intelligence are all underlined by changes to the traditional area
of literacy. Yet the trend to Multiliteracies is simply a very visible example of broader trends
within the new economy, which suggest the need for new orientations to knowledge.”

 
  36  
 

A diferença fundamental entre o aprendizado medieval e o


aprendizado escolar que se difundiu no mundo ocidental a
partir sobretudo do século XVI foi, segundo Petitat 26 , “uma
revolução do espaço de ensino, pela substituição dos locais
dispersos mantidos por professores ‘independentes’ por um
prédio único abrigando várias salas de aula”. Como
consequência e exigência dessa invenção de um espaço de
ensino, uma outra “invenção” surge: um tempo de ensino.
(SOARES, 2002, p. 155)

Como consequência da instituição de um espaço e tempo de ensino,


Soares explica que surge então a necessidade de sistematizar esse tempo por
meio do planejamento de atividades que, por fim, estende-se na sistematização
do próprio conhecimento. A partir desse momento, nasce a escola como
instituição burocrática, na qual

alunos são organizados por categorias (idade, grau, seção, tipo


de problema etc.), que determinam um tratamento escolar
respectivo (horários, gênero e volume de trabalho, saberes a
aprender, competências a adquirir, métodos de
enquadramento, processos de avaliação e de seleção).
(HUTMACHER apud SOARES, 2002, p. 156)

Se a grande diferença entre o ensino medieval e o difundido no


mundo ocidental moderno está na instituição de um espaço e um tempo de
ensino, percebe-se a permanência, em ambos os períodos, da figura de um
professor ― posteriormente a figura de um professor e a de um livro didático ―
detentor(es) do conhecimento.
O advento de novas tecnologias, por meio das quais se estabelecem
novas relações com a detenção, difusão e mesmo com a durabilidade desse
conhecimento, torna os princípios de atuação do professor estabelecidos ao
longo das eras algo sujeito a reflexões e reinvenções. Além disso, em uma
sociedade digital na qual a dimensão espacial representa cada vez menos
obstáculo, assim como, em muitos casos, a dimensão temporal, para se “estar”
em algum lugar ou interagir com pessoas, percebe-se que duas das bases
fundamentais da escola ocidental moderna tornam-se, aos poucos, sujeitas a

                                                                                                               
26
PETITAT, A. Produção da escola, produção da sociedade: Análise sócio-histórica de alguns
momentos decisivos da evolução escolar no ocidente. Artes Médicas, Porto Alegre, 1994.

 
  37  
 

ressignificações. Ressignificações também necessárias à seleção de


conteúdos e aos procedimentos metodológicos, pois, na contemporaneidade, é
permitido ao aluno fazer travessias (LEMKE, 2002), por meio do hipertexto e da
hipermídia, a partir das quais ele mergulha em uma rede de informações
materializadas em forma de textos, imagens estáticas ou em movimento e
sons.
A partir de suas travessias, o aluno poderá criar seus próprios
caminhos, sempre permeados por diversas vozes sociais (BAKHTIN,
1981[1935] apud LEMKE, 2002, p. 323), das quais emergirão significações
diversas. Essas novas formas de interação com a informação e a nova
organização de economia (COPE; KALANTZIS, 2006 [2000]) chamam atenção
também para revisões dos processos avaliativos, de forma que eles possam
avaliar o gerenciamento e aplicabilidade de determinado conteúdo e questões
relacionadas à colaboratividade.
A instituição escolar, em cada momento histórico, define-se pelo
contexto social, econômico, cultural (SOARES, 2002) e também tecnológico.
Períodos de transição como o atual, em que se discutem novas relações
culturais advindas da dissolução de fronteiras nacionais e do pluriculturalismo,
novas formas de manifestação e veiculação da informação e,
consequentemente, novas demandas educacionais e econômicas, exigem
profunda observação, reflexão e ressignificação. Dessa forma, o processo
transitório não pode limitar-se ao simples descartar e substituir, mas precisa
estar embasado em análises da realidade e pesquisas que sejam capazes de
apontar as verdadeiras demandas da educação na contemporaneidade.
Norris e Soloway (2009, p. 243) afirmaram em seu artigo A disruption is
coming que os anos vindouros seriam marcados por mudanças significativas
no contexto escolar, a ponto de gerarem uma ruptura no sistema. Segundo os
autores, a popularização e barateamento de dispositivos móveis, permitiria aos
alunos, independentemente de sua classe social, que fossem às escolas
equipados com celulares, por meio dos quais o mundo estaria literalmente em
suas mãos.
Ao se considerar a pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística entre 2005 e 2011 e divulgada em 2013 a respeito do uso de

 
  38  
 

telefones móveis e do acesso à internet no Brasil27, as projeções de Norris e


Soloway (2009) demonstraram-se precisas. Segundo os dados do IBGE, entre
os anos pesquisados, o uso de celulares por pessoas com mais de 10 anos
cresceu em 102,2%. Se em 2005, 55,7 milhões de brasileiros possuíam celular,
em 2011, esse número saltou para 115,4 milhões. O estudo ainda apontou que
o percentual de pessoas de 10 anos ou mais de idade que acessaram a
Internet passou de 20,9% (31,9 milhões) em 2005 para 46,5% (77,7 milhões)
em 2011. Desse total de internautas, 72,6% eram estudantes.
A propagação de dispositivos móveis no ambiente escolar obrigou as
instituições de ensino, inicialmente, a adotarem medidas drásticas para (não)
lidar com a situação. Em seu livro, Mobile Technology for Children, Druin
(2009) apresenta diversas experiências ao redor do mundo em que escolas
baniram o uso de dispositivos móveis da sala de aula. No Brasil, observou-se
movimento similar. Em 2008, o Distrito Federal aprovou o Projeto de Lei nº
4.131/2008 da deputada Eurides Brito que proibia o uso de celulares, mp3
players e videogames nas escolas28. A justificativa para a medida consistia no
fato de que os esses dispositivos móveis podiam gerar desatenção em sala
aula, conflito entre professores e alunos e mesmo conflito entre os próprios
alunos. Em São Paulo, em movimento similar ao do Distrito Federal, em
15/01/2008, o decreto 52.62529 também proibiu o uso de celulares em escolas
públicas estaduais. Na região de Campinas, ao longo de minha experiência
docente em escolas da rede particular de ensino, constatei nas escolas em que
lecionei uma postura similar à encontrada na Lei do Distrito Federal e ao
decreto do estado de São Paulo: proibição de dispositivos móveis, além de
restrição de acesso à internet ou restrição de acesso apenas aos
computadores do laboratório da escola [que o CETIC-Educação demonstra que
não são usados pelos professores].

                                                                                                               
27
Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/imprensa/ppts/000000129623051220132340
16242127.pdf. Acesso em: 17/05/2014.
28
Disponível em: http://www.sinprodf.org.br/wp-content/uploads/2011/03/lei-nº-4.131-de-02-de-
maio-de-2008.pdf. Acesso em: 17/05/2014.
29
Disponível em: http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/2008/decreto-52625-
15.01.2008.html. Acesso em: 28/06/2015.

 
  39  
 

Movimentos nessa direção revelam o despreparo da instituição escolar


para os novos tempos e materializam as rupturas em sua estrutura clássica de
ensino sobre as quais discorrem Norris e Soloway (2009). Rupturas originadas
a partir da emergência das novas tecnologias da informação e comunicação e
de suas possibilidades, as quais evocam um novo ethos, ainda não assimilado
pela escola.
Embora se presenciem recentemente ações que indicam uma tentativa
das instituições educacionais de inserção nessa nova ética, como a crescente
introdução de tablets nas escolas da rede particular de ensino e as intenções
do governo de estender tal ação às escolas da rede pública de ensino30, tal
inserção não depende apenas da disseminação destes dispositivos. É notável
o fato de que a adoção das tecnologias móveis afasta-se de tendências
reducionistas como a sinalizada pela Lei de Eurides Brito. Entretanto, “o
conteúdo presente nesses dispositivos é tão importante quanto o hardware em
si” (DRUIN, 2009, p. 9, tradução nossa)31. Uma vez superada, em parte, a
resistência não apenas escolar, mas de toda a sociedade, à adoção dessas
novas tecnologias móveis para o ensino, novas necessidades emergem, como
a produção de aplicativos e de conteúdo com foco em aprendizagem para
dispositivos móveis.
Segundo pesquisa do MEF (Mobile Entertainment Forum)32, no segundo
semestre de 2013, houve um aumento considerável no consumo de aplicativos
para celular e tablet no Brasil, porém, os conteúdos mais populares das lojas
de aplicativos relacionam-se a entretenimento. Druin (2009, p. 11, tradução
nossa), ao analisar essa questão, afirma que “talvez, quando comparadas às
vendas de jogos e de ringtones, as vendas de recursos educacionais não
sejam tão lucrativas. Porém, o custo de sua ausência é alto”33.
Os reflexos da ausência de conteúdo focado em educação revelam-se
no uso, por exemplo, de tablets em escolas de forma limitada, sem acesso
                                                                                                               
30
No Capítulo 3 desta dissertação, a introdução dos tablets na rede pública de ensino será
discutida.
31
“the content on these mobile technologies are as important as the hardware itself.”
32
Disponível em: http://www.mefmobile.org/activities-and-analytics/analytics/global-consumer-
survey-2013. Acesso em: 17/05/2014.
33
“Perhaps when comparing to ringtones and gaming sales, education resources are not the
most profitable. But the expense of their absence is even more costly.”

 
  40  
 

pleno à internet e reduzindo-os a leitores de arquivos de texto em PDF


(ebooks). Ou seja, muda-se o suporte, mas se mantêm as mesmas práticas de
leitura e interação observadas na utilização de livros. Dessa forma, exclui-se o
acesso à navegação, a hipertextos, à hipermídia e a ferramentas
colaborativas, que são expressões básicas dos multiletramentos tão
necessários para a vida na sociedade contemporânea.
Outras questões que devem ser consideradas no processo de inserção
de tecnologias móveis ― e que se relacionam à constatação de seu uso
limitado mencionado acima ―, é a capacitação do corpo docente para
utilização de tal ferramenta e a capacidade da infraestrutura escolar para
suportar a adoção dessas tecnologias.
Segundo pesquisa de 2013 do Centro Regional de Estudos para o
Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC.br) a respeito do uso
das tecnologias de informação e comunicação (doravante, TDIC) nas
escolas34, a presença de dispositivos móveis nas escolas da rede pública de
ensino vem crescendo desde 2010. Entretanto, a baixa velocidade de conexão
limita seu uso. Segundo o estudo, a velocidade de internet mais presente nas
escolas públicas é de 2 megabyte e apenas 71% delas apresentam conexão
sem fio à internet. Escolas que pretendam adotar o uso de dispositivos móveis
fracassarão se não planejarem melhorias e adequações em sua rede de
acesso à internet de forma que ela seja capaz de suportar um dispositivo móvel
por aluno.
Ao considerar o uso de tecnologias móveis, a pesquisa aponta que
apenas 11% das escolas pesquisadas dispõem do tablets e a porcentagem de
professores que possuem tal equipamento em seu domicílio é de 31%. Embora
esse número ainda seja baixo, ao se considerar o acesso à internet de
professores por meio de celulares, houve um aumento de 30% de 2010 a 2013.
Diante desses dados, a pesquisa revela o fato de que o professor tem aderido
à tendência de mobilidade em sua vida pessoal, ainda que a formação inicial
docente ainda não integre tais tecnologias. Embora haja iniciativas de
formação de professores em novos e multiletramentos, como o curso a

                                                                                                               
34
Disponível em: http://www.cetic.br/educacao/2013/apresentacao-tic-educacao-2013.pdf.
Acesso em: 04/07/2015.

 
  41  
 

distância Educação na Cultura Digital35, idealizado pelo Ministério da Educação


(MEC) em parceria com a Secretaria de Estado da Educação de Santa
Catarina (SED), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
(Undime) e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), percebe-se que
a incorporação das novas tecnologias digitais e suas possibilidades
pedagógicas é lenta e a rotatividade de professores nas escolas públicas
constitui-se também em um obstáculo para tal incorporação.
Se não há formação de professores para o uso de tecnologias móveis,
sua formação para o uso de computadores e internet ainda não é suficiente,
pois, segundo os dados do estudo, menos da metade dos professores de
escolas públicas cursaram alguma disciplina voltada especificamente ao uso
do computador e internet em sua formação inicial. Entretanto, diferentemente
da população geral, a internet é praticamente universalizada entre os docentes
brasileiros e apenas 2% deles afirma não saber utilizar o computador.
Quanto às práticas pedagógicas que fazem uso das TDIC, a pesquisa
aponta que o uso de computador em sala de aula é ainda instrumental e as
aulas são em sua maior parte focadas na exposição teórica, em exercícios
para fixação de conteúdo e na interpretação textual, em que as TDIC
funcionam como suporte apenas. Sem muitos dados que remetam a práticas
situadas de multiletramentos, tem-se a impressão de que as análises feitas por
Hutmacher (1992) e Soares (2002) constatando poucas mudanças na estrutura
das instituições de ensino ao longo dos últimos séculos se materializam
perfeitamente. Inserem-se computadores e internet nas escolas, mas os
paradigmas, em muitos sentidos obsoletos, permanecem e as práticas
continuam distantes daquelas necessárias ao mundo contemporâneo.
Os dados da pesquisa feita pelo CETIC sinalizam um longo caminho
para que haja uma inserção eficaz de dispositivos móveis nas escolas. Além de
capacitação docente e infraestrutura, é preciso discernir os paradigmas
instituídos pelo uso de tecnologias móveis na educação. Segundo Rogers e
Price (2009, p. 61), estamos caminhando para uma era caracterizada pela
aprendizagem móvel (mobile learning), aprendizagem contínua (seamless
learning) e aprendizagem ubíqua (ubiquitous learning). Os autores afirmam que
                                                                                                               
35
Disponível em: http://educacaonaculturadigital.ufsc.br/. Acesso em 04/07/2015.

 
  42  
 

central a tais noções encontra-se o fato de que as tecnologias


móveis permitem transitar por espaços físicos, digitais e
comunicativos sobrepostos. Essa mobilidade pode ser
alcançada de forma individual, em pares, em grupos ou mesmo
juntamente com toda uma turma de alunos (...). Assume-se que
tais tecnologias proporcionam continuidade através de várias
experiências de aprendizagens, permitindo às crianças
estabelecer conexões entre o que é observado, coletado,
acessado e pensado (...). (ROGERS; PRICE, 2009, p. 63,
tradução nossa)36

Para exemplificar tal conceito, os autores relatam o exemplo de uma


criança que, estando sentada em um ônibus, utiliza seu iPhone para conversar
com seu mentor (tutor) a respeito de biodiversidade, por meio do jogo de
simulação de vida real Second Life. Em seguida, com base na sugestão do
especialista, dirige-se até um parque próximo e se integra a uma caçada de
lesmas promovida por um website de biologia. Então, inicia sua busca às
lesmas, utilizando a câmera de seu celular. Após coletar fotos, adiciona a elas
as coordenadas da localização do animal fotografado por meio do GPS e sua
identificação. Após enviar os dados ao website, o biólogo que o monitora
checará as informações enviadas e informará o aluno sobre se estavam
corretas ou não. Por fim, o aluno, assim como outros alunos, poderá relatar a
experiência da caçada às lesmas à turma durante a aula de biologia,
apresentando os dados coletados.
Embora o trabalho de Rogers e Price tenha foco na utilização dos
dispositivos móveis na educação infantil, os paradigmas instituídos por seu
uso, e ali exemplificados, estendem-se a todos os níveis de ensino. Verifica-se,
no exemplo dos autores, o fato de que tais tecnologias propiciam a adoção de
estratégias de aula que valorizam a colaboratividade, a descentralização do
conhecimento, alterando o papel do professor – que passa a atuar com um
mediador –, o trabalho com práticas que envolvam os multiletramentos e a
superação de limitações espaciais e temporais da escola.
                                                                                                               
36
“Central to these notions is the idea that mobile technologies can be designed to enable
children to move in and out of overlapping physical, digital and communicative spaces. This
mobility can be achieved individually, in pairs, in small groups or or as whole classroom
together (...). It is assumed that mobile technologies provide continuity across various learning
experiences, enabling children to make connections between what they are observing,
collecting, accessing and thinking (...).”

 
  43  
 

A despeito das potencialidades pedagógicas dos dispositivos móveis,


eles também podem ser fato gerador de alguns problemas na prática docente.
Tais problemas motivaram, em grande parte, a inicial rejeição dessas
tecnologias sobre a qual discorremos anteriormente. Rogers e Price (2009, p.
89), com base em suas pesquisas, elencaram três desafios a serem
superados. Segundo os pesquisadores, deve-se evitar a sobrecarga de
informação, prevenir a distração em sala de aula e direcionar e estruturar as
atividades que façam uso dos dispositivos móveis. Percebe-se que o último
desafio pode ser a base para evitar os demais problemas advindos do uso
dessas tecnologias.
É importante considerar o fato de que os desafios para a incorporação
desses dispositivos à educação não se restringem à prática docente. Ching,
Shuler, Lewis e Levine (2009, p. 108) afirmam que, inicialmente, é preciso
repensar os conceitos de letramento e numeramento. A argumentação dos
autores vai ao encontro do defendido por Cope e Kalantzis (2006 [2000]), pelo
Grupo de Novas Londres e por Lankshear e Knobel (2007), abarcando
questões referentes à multiplicidade de linguagens e de culturas do mundo
contemporâneo. Além disso, os pesquisadores salientam a importância de se
buscar equidade digital, ou seja, proporcionar acesso universal às tecnologias
móveis a toda população. No Brasil, percebe-se um contexto favorável a isso,
como provam os dados anteriormente expostos das pesquisas do IBGE e do
CETIC e as iniciativas governamentais de inserção de tablets nas escolas da
rede pública de ensino, além de iniciativas de Fundações, como a Vanzolini, e
de empresas privadas como a Fundação Telefônica/Vivo, em Programas como
o Escola com Celular.
Finalmente, os autores atentam à importância de se promover uma
mudança cultural a respeito da concepção que se tem de dispositivos móveis
(p. 124). É preciso, de acordo com os pesquisadores, desvincular o caráter de
mero entretenimento que parece intrínseco a essa tecnologia. Para isso, os
autores convocam educadores, acadêmicos e a indústria a buscar evidências
científicas produzidas por pesquisas na área a respeito do potencial
educacional desses aparelhos.

 
  44  
 

Por fim, outra barreira a ser vencida apontada pelos pesquisadores, e


talvez uma das mais importantes, é a compatibilidade dos softwares e
aplicativos (apps) entre os dispositivos móveis. A falta dessa compatibilidade
entre os sistemas operacionais disponíveis no mercado dificulta a criação de
softwares e aplicativos multiplataforma e, consequentemente, sua utilização em
sala de aula. Essa realidade verificada por Ching, Shuler, Lewis e Levine
(2009) entra em conflito com o documento Futuro da aprendizagem móvel:
implicações para planejadores e gestores de políticas 37, publicado pela Unesco
em 2013, cujo objetivo é investigar e sugerir formas de uso dos dispositivos
móveis na educação. Ao sugerir a estratégia Bring you own device (BYOD), na
qual os alunos devem trazer seus próprios aparelhos para a sala de aula, a
instituição desconsidera a problemática advindas de se ter, um uma única sala,
multiplataformas com funcionalidades e compatibilidades diferentes uma das
outras. Embora o documento reconheça que, no caso de BYOD, governos e
instituições escolares precisariam subsidiar os dispositivos para alunos que não
pudessem adquiri-los, desconsidera-se a questão sobre a compatibilidade de
softwares com plataformas que podem ser tão variadas, como tablets,
smartphones e laptops, segundo a própria Unesco. Seria, nesse caso,
necessário considerar que cada uma dessas tecnologias possui funções e
funcionalidades diferenciadas, o que poderia gerar dificuldades num contexto
de ensino. Transferir aos sistemas de ensino a responsabilidade de distribuição
da tecnologia móvel a ser utilizada no ensino e aprendizagem por alunos e
professores é uma forma de uniformizar as plataformas, definindo-as de acordo
com as funcionalidades necessárias.
Assim, diante de todas as questões discutidas, evidencia-se que a
inserção de dispositivos móveis (tablets e celulares) na escola ultrapassa em
muito a questão da aquisição/distribuição dos aparelhos em si, pois ela é
perpassada por questões pedagógicas, políticas, sociais, infraestruturais e
ideológicas. Políticas públicas e privadas nessa direção precisam abarcar tal
complexidade para que resultados satisfatórios possam ser alcançados.
                                                                                                               
37
UNESCO, Futuro da aprendizagem móvel: implicações para planejadores e gestores de
políticas, Brasília: UNESCO, 2014. Disponível em:
http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/about-this-office/single-
view/news/o_futuro_da_aprendizagem_movel_implicacoes_para_planejadores_e_gestores_d
e_politicas_pdf_only/#.VUVAzdNVhBc. Acesso em: 01/05/2015.

 
  45  
 

Neste capítulo, com base nas transformações sociais decorrentes das


TDIC, buscamos descrever as demandas do século XXI para uma educação
situada no contexto cultural e tecnológico contemporâneo, ou seja, práticas
educacionais que envolvam novos e multiletramentos. Além disso, analisamos
o crescente uso de dispositivos móveis no cotidiano, a relação conflituosa entre
tais dispositivos e a instituição escolar e os resultados de algumas iniciativas
de inserção dessa tecnologia na escola. Por fim, por meio de uma breve
análise dos resultados de estudos do CETIC e do IBGE relacionados às TIDIC
e das conclusões de pesquisas de acadêmicos voltados ao estudo de
dispositivos móveis e educação, refletimos sobre as necessidades
infraestruturais, de domínio técnico e pedagógico e de conhecimento das
especificidades e funcionalidades de tais dispositivos quando pensados como
ferramentas educacionais.
Tal aparato teórico servirá como base para, no capítulo 4 dessa
dissertação, analisarmos a utilização em sala de aula de materiais didáticos
digitais interativos (MDDI) para tablets. Nessa análise, buscaremos verificar se
houve de fato uma mudança de paradigma por meio de práticas de ensino
situadas em um novo ethos ou se meramente se fez uso de novas tecnologias,
mas mantiveram-se as práticas de ensino e aprendizagem já consolidadas no
letramento da letra.
Além disso, as interações entre os participantes de uma aula em que se
utilizou o MDDI também serão foco desse trabalho. Entretanto, para a
investigação acerca da constituição dessas inter-relações, é preciso buscar
subsídio teórico em estudos que discorrem acerca de interação em sala de
aula. Assim, o próximo capítulo busca apresentar parâmetros para interações
em sala de aula, de forma que, posteriormente, possamos comparar tais
interações com aquelas estabelecidas em uma aula mediada por MDDI.

 
  46  
 

CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO EM SALA DE AULA


 

1. Perspectivas de interação em sala de aula

Pesquisas acerca do discurso em sala de aula iniciaram-se, na década


de 1950, motivadas, inicialmente, pela busca de uma avaliação objetiva da
prática docente, a fim de fornecer aos professores um feedback de suas
capacidades de ensino (TSUI, 2011, p. 274). Segundo Rojo (2007, p. 340),
desde as primeiras pesquisas de interação em sala de aula, faz-se referência à
estrutura da conversação e aos atos de fala, enquanto movimentos didáticos
ou pedagógicos. Ao longo de sua exposição acerca do desenvolvimento desse
tipo de pesquisa durante as últimas cinco décadas, a autora menciona
pesquisadores cujos trabalhos influenciaram fortemente esse campo de estudo
como Bellack et all (1966), com a instituição dos movimentos pedagógicos para
a análise da linguagem em sala de aula; Sacks, Schegloff e Jefferson (1974) e
Sinclair e Coulthard (1975), responsáveis pela incorporação de conceitos e
aparatos analíticos da Análise da Conversação ― em especial os conceitos de
turno, tópico, troca comunicativa e atos de fala ―, entre os quais se encontra o
mais famoso dos padrões interacionais configurados por troca de turnos em
sala de aula, o I-R-A (IRF) (Iniciação [do professor] - Resposta [do aluno] -
Avaliação [do professor]).
Também Gumperz (1982) e Gumperz e Hymes (1986), autores da
Etnografia da Comunicação e da Sociolinguística Interacional, impactam os
estudos da interação em sala de aula, ao introduzirem alguns construtos da
sociologia e da antropologia, tais como os de rotinas, rituais, estrutura de
participação, comunidades de fala, competência comunicativa, esquemas de
interpretação. Erickson e Mohatt (1982) e Erickson (1984; 1986) desenvolvem
consideravelmente as discussões metodológicas sobre qual seria o papel da
etnografia na escola e quais as metodologias de coleta e de análise de dados
indicadas neste tipo de investigação.
Rojo (2007) aponta o fato de que, embora haja evidentes avanços na
análise do fluxo de conversa e de interação em sala de aula,

 
  47  
 

em geral nessas pesquisas, a parte se tratar dos tópicos ou


temas que têm lugar na aula – ou seja, de seu conteúdo
temático –, pouco ou nada se diz sobre a esfera específica em
que essas interações e conversas têm lugar: a escola e suas
finalidades. Não são priorizados no enfoque nem os processos
de ensino-aprendizagem (como se ensina) nem os objetos de
ensino enquanto tais (o que se ensina) – resultantes do
processo histórico de disciplinarização de conhecimentos.
(ROJO, 2007, p. 41)

Ao longo deste capítulo, descreveremos duas perspectivas de interação


de sala de aula – aparentemente mais adequadas à análise de nossos dados –
, objetivando, posteriormente, responder à seguinte pergunta: o que muda em
termos de interação em sala de aula com o uso de tablets?
Porém, antes de adentrar as duas perspectivas escolhidas, a de
Bazerman (2005) e a de Batista (1997), é importante analisar alguns aspectos
importantes das teorias que as influenciam: a etnografia da comunicação e a
sociolinguística interacional. Na seção final do capítulo, discorremos sobre a
abordagem proposta por Rogoff (1995), por meio da qual a autora analisa
atividades socioculturais por meio de três planos de análise que se constituem
mutuamente. Ao adotarmos os princípios estabelecidos por Rogoff, visamos
utilizá-los como elemento organizador das categorias de análise definidas a
partir das perspectivas de Bazerman (2005) e de Batista (1997).

2. A etnografia da comunicação e a sociolinguística interacional

Por meio da análise de escritos autobiográficos de professores,


Gumperz (1991) atenta para a possibilidade de compreensão dos problemas
encontrados pelos docentes em sua prática diária. Além disso, tais registros
apontam que a necessidade de adaptação às demandas do sistema escolar e
às exigências estabelecidas para os testes “limita a capacidade individual do
professor para lidar com as necessidades de aprendizagem do aluno e para
acomodar diferenças no background social destes estudantes” (p. 66). Assim,
segundo o linguista, tais escritos autobiográficos evidenciam o contraste entre
descrições oficiais dos currículos e objetivos instrucionais e aquilo que
realmente é possível de ser feito.

 
  48  
 

Para Gumperz, os registros autobiográficos consideram a sala de aula


como sistemas sociais em que há mais que a mera transferência de
informações dos professores para alunos, pois o processo de aprendizado é
influenciado pelas características sociais dos estudantes. As relações entre
grupos de alunos, o relacionamento entre professores e discentes e as
exigências organizacionais do sistema social afetam a comunicação e os
produtos da aprendizagem. Para explorar e analisar o funcionamento de
ambientes interativos naturais, Gumperz volta-se para a etnografia sistemática,
que apresenta uma nova perspectiva para o estudo do uso da linguagem.
Central a essa perspectiva, está a noção de “competência
comunicativa”, proposta originalmente para “explicar o fato de que, para serem
eficientes nos ambientes sociais rotineiros, os falantes e ouvintes dependem de
um conhecimento que vai além da fonologia, léxico e estrutura gramatical
abstrata”. O uso da linguagem é regido pela “cultura, subcultura e normas
específicas de contexto, que restringem tanto a escolha das opções
comunicativas quanto a interpretação do que é dito” (GUMPERZ, 1991, p. 68).
Segundo Gumperz, os etnógrafos, descrevem a fala natural, “dentro do que é
geralmente um único grupo social na medida em que esta fala varia de falante
para falante e de situação para situação” (p. 68). Dessa forma, “a variabilidade
torna-se um fenômeno comunicativo a ser explicado como parte da análise
sociolinguística” (p. 68).
Inicialmente, a perspectiva de estudo da etnografia da comunicação era
meramente a descritiva e lidava com sociedades simples e culturas populares.
De acordo com Gumperz, com o tempo, aprofundou-se a resposta teórica às
complexidades e à variedade de opções comunicativas que os falantes utilizam
para assinalar o que pretendem transmitir, questionando, assim, a concepção
de que análises linguísticas devem ser estudadas ao nível de sentença,
concepção esta que, no passado, norteou grande parte das pesquisas em
educação. Para negros norte-americanos e demais grupos, com base em
estudos da etnografia da comunicação, foi possível revelar “regularidades ao
nível discursivo e de estilo no desempenho que sobreviveram ao transplante
forçado da África Ocidental para o Caribe e para os Estados Unidos” (p. 69).

 
  49  
 

Tais regularidades assumem a forma de rotinas de fala que ocorrem tanto no


desempenho formal como na fala diária.
Assim, falantes de dialetos de minorias poderiam avaliar o que transpira
na escola em termos de sua próprias tradições retóricas historicamente
baseadas se os currículos escolares levassem em conta outra fonte de
variabilidade linguística.
Nos estudos etnográficos, o contexto de sala de aula tem papel
determinante nas relações de ensino e aprendizagem. Para ilustrar esse fato,
Gumperz descreve uma série de estudos conduzidos em contextos escolares
de diversas comunidades, como grupos indígenas norte-americanos,
comunidades negras e brancas, além de escolas urbanas e suburbanas
destinadas a classes sociais distintas. Por meio destas pesquisas, verificaram-
se padrões interativos distintos que eram delimitados em grande parte por
elementos contextuais que influenciavam na aquisição de conhecimento, tais
como as estruturas de participação, direitos e papéis que moldam os
relacionamentos sociais, a percepção dos participantes sobre o que é
manifestado, o sistema de conhecimento e ideologia educacional.
Em um dos estudos descritos, o de Heath (1983), cuja pesquisa tem
foco em comunidades negras e brancas do sul dos Estados Unidos, defende-
se, com base na análise de padrões de discurso que afetam a transferência de
informação, “a criação de novos currículos que possam considerar variações
similares na bagagem cultural que as crianças trazem de casa” (p. 70).
Segundo o linguista, a perspectiva que une tais estudos é conhecida
como perspectiva socioecológica, na qual

a preocupação não é com o conteúdo do curso e técnicas de


instrução tais como se apresentam, mas com o ambiente do
aprendizado, isto é, aqueles aspectos do ambiente e do
background do professor e dos alunos que afetam a
transmissão do conhecimento e, portanto, restringem o que é
aprendido. (GUMPERZ, 1991, p. 70)

Segundo o autor, a concepção básica dessa perspectiva etnográfica é


que o ensino e a aprendizagem devem ser considerados como processos
interativos que demandam a participação ativa de professores e estudantes
para garantir que as informações sejam transmitidas como uma pré-condição

 
  50  
 

para o aprendizado. Além disso, Gumperz com base em estudos de Leacock


(1969) sobre o comportamento de professores urbanos e suburbanos,
argumenta que “uma vez que as salas de aula são parte das escolas e uma
vez que os professores operam dentro de um sistema de conhecimento e
ideologia educacional, esta ideologia tende a influenciar as estratégias dos
professores”. Ou seja, “as atitudes e pré-concepções socioculturais
predominantes afetam as avaliações do comportamento dos alunos em
situações específicas da sala de aula” (p. 71).
Além disso, Gumperz atenta ao fato de que, embora o comportamento
dos alunos sofra influência dos relacionamentos com colegas na escola ou em
casa, outros processos interativos estão em funcionamento dentro de cada
ambiente, em vários momentos ao longo do dia, “e é a natureza destes
relacionamentos de subgrupo (dentro destes ambientes variados) que
determina os contextos que orientam e canalizam o comportamento”. Para
ilustrar essa asserção, Gumperz recorre ao estudo de Erickson e Schultz
(1981), no qual uma professora estabelecia uma estrutura organizacional
previsível através de suas palavras, de forma que os estudantes sabiam como
e quando reconhecer um contexto, bem como os enunciados nele ancorados.
Além da análise do contexto de sala de aula, para se compreender os
processos de interação que nela ocorrem, é preciso focalizar a atenção
também sobre “o discurso, isto é, sobre como a linguagem funciona como parte
de um sistema integrado de comunicação” (p. 75).
Para isso, Gumperz fundamenta-se na tradição sociológica das análises
de conversação de tomada de turno e sequência dos movimentos nas
conversas (sociolinguística interacional). Para os analistas da conversação, as
conversas são um processo interativo em que falantes e ouvintes cooperam na
construção de condições que tornam a compreensão possível. Assim, falar não
pode ser considerado simplesmente uma questão de se dizer o que se quer
quando se quer. O pesquisador explica que “todas as conversas seguem
princípios organizacionais próprios que são, em grande parte, independentes
da estrutura gramatical dos enunciados que os compõem” (p. 76). Os princípios
em questão

 
  51  
 

são ilustrados pelos assim chamados pares adjacentes, tais


como pergunta-resposta, cumprimento-cumprimento, pedido-
atendimento 38 . Embora produzidos por diferentes, os dois
membros destes pares estão reciprocamente relacionados, no
sentido de que o primeiro membro estabelece condição para
ocorrência do segundo, enquanto o segundo é dependente da
ocorrência do primeiro. (GUMPERZ, 1991, p. 76-77)

Para exemplificar essa teoria, Gumperz utiliza o seguinte exemplo:

(1) A: Pode dar-me uma garrafa de cerveja?


(2) B: Você é maior de idade?
(3) A: Não.
(4) B: Não.

O linguista explica que a pergunta inicial foi respondida com outra


pergunta, que é interpretada não como uma resposta, mas como uma inserção
em uma sequência que permanece incompleta até que seja resolvida por uma
resposta apropriada. Além disso, os nãos do exemplo em questão podem ser
compreendidos apenas com base na sequência completa. Sem um
conhecimento sobre o que precede e o que segue não seria possível
determinar os significados. Partindo desse exemplo e com base nos estudos
de Mehan (1979), Gumperz afirma que a fala instrucional difere das conversas
comuns, pois não apresenta dois componentes, mas três: uma tréplica sempre
acompanha a resposta a um movimento inicial, resultando em um sistema
tripartido de iniciação-resposta-avaliação.
Para a análise da conversação, o discurso não pode ser visto apenas
como uma sequência de sentenças semanticamente independentes, pois
o discurso consiste em eventos de fala, isto é, sequências de
movimentos inter-relacionados e contramovimentos, com cada
evento sendo marcado por início, meio e fim, de modo que a
ordem temporal dos argumentos e a mudança de falante
restringe o que pode ser dito e maneira como é interpretado. A
confiança nestes princípios de organização possibilita aos
participantes orientar o fluxo de uma interação e criar as
condições para que ocorra uma interpretação. (GUMPERZ,
1991, p. 77, ênfase adicionada)

Gumperz salienta que, embora o foco sobre os fundamentos


organizacionais da comunicação verbal seja importante para revelar o caráter

                                                                                                               
38
Atos de fala, para Bazerman.

 
  52  
 

interativo dos intercâmbios verbais, ele não é suficiente. Segundo o autor,


necessita-se de uma teoria mais completa de comunicação para demonstrar o
que, no background linguístico e cultural dos participantes e em sua ideologia,
afeta seu desempenho em sala de aula, além de demonstrar por que
backgrounds diferentes podem levar a um aprendizado distinto em contextos
de aprendizagem similares. A abordagem necessária, para Gumperz, deve ser
orientada para o falante, de forma que seja possível observar “os processos
interpretativos que subjazem à percepção individual do que ocorre em sala de
aula” (p. 78).
Assim, o linguista volta-se para a pragmática linguística e para a teoria
dos atos de fala. Segundo Gumperz, a pragmática linguística determina que “o
significado deve ser definido em termos do efeito que um transmissor pretende
produzir por meio da mensagem". Dessa forma, “os atos de fala, em vez de
conteúdo ou referencial proposicional, tornam-se a unidade principal para a
análise”. A análise dos atos de fala baseia-se em “pressuposições
dependentes do contexto e em outros conhecimentos extralinguísticos para se
fazerem interpretações que frequentemente apresentam pouca relação com o
sentido literal” (p. 78). Em suma, tem-se como base o conhecimento de como
são as salas e quais são os objetivos do enunciado, a fim de que se chegue à
interpretação do que se pretende.
Para sintetizar os principais aspectos da abordagem sociolinguística
interacional, Gumperz atenta ao fato de que ela “focaliza o jogo de
pressuposições linguísticas, contextuais e sociais que interagem para criar as
condições de aprendizagem em sala de aula” (p. 79). Além disso, a análise tem
foco sobre as atividades didáticas fundamentais, realizadas por meio de
eventos definíveis de fala que se salientam contra o fundo das conversas
cotidianas. Vista por esta perspectiva, a linguagem na sala de aula pode ser
considerada como parte da linguagem da escola. Tal linguagem define rotinas
de falas que se associam através das práticas cotidianas de docentes e
discentes. A análise de tais rotinas demonstra que elas não constituem o total
da experiência comunicativa dos membros de uma situação de sala de aula,
pois as expectativas ou conhecimento em relação a elas exerce papel
importante em sua interpretação. Assim, é possível presumir que este

 
  53  
 

conhecimento faz parte dos esquemas ou estruturas interpretativas que


orientam a compreensão.
Gumperz afirma que o grau em que esses esquemas são conhecidos, a
forma como a informação esquemática é apresentada e aprendida e a
extensão em que o aprendizado é uma questão de background sociocultural
são cruciais para nossa compreensão sobres as dimensões comunicativas dos
processos de instrução (p. 80). Se o conhecimento esquemático não é
compartilhado, uma mensagem que em termos de conteúdo é a mesma pode
ser interpretada de formas diferentes. Dessa maneira, é possível afirmar que a
interação em sala de aula, assim como qualquer comunicação verbal, “é
orientada por um processo de inferência conversacional que se baseia na
percepção, pelos participantes, de indicadores verbais e não-verbais que
contextualizam o fluxo da fala diária” (p. 81). Tais indicadores permitem que se
reconheçam as atividades da fala com sequências mais amplas de conversas,
por meio das quais os contextos se tornam reconhecíveis. Assim, os esquemas
“são criados e sinalizados pelos participantes para agirem como estruturas
para interpretações situadas de uns e de outros”. Estes indicadores de
sinalização “criam conjuntos de nexos de significações através dos quais a
interação progride e os movimentos formam eventos específicos” (p. 81).

3. As atividades humanas como sistemas de gêneros


 
Bazerman (2005), ao traçar uma análise referente ao trabalho realizado
pelo texto na sociedade, busca
identificar as condições sob as quais esse trabalho se realiza,
para observar a regularidade com que os textos executam
tarefas reconhecidamente similares, ver como certas
profissões, situações e organizações sociais podem estar
associadas a um número limitado de tipos de textos [gêneros] e
[...] analisar como produção, circulação e uso ordenados
desses textos constituem, em parte, a própria atividade e
organização dos grupos sociais (BAZERMAN, 2005, p. 19).

 
  54  
 

Por meio desta análise, forjada a partir de conceitos como fatos sociais,
atos de fala39, gêneros, sistema de gêneros e sistema de atividades, o autor
sugere o modo “como as pessoas criam novas realidades de significação,
relações e conhecimento fazendo uso dos textos” (p.19).
Com o propósito de ilustrar suas asserções, o educador norte-americano
parte de uma típica situação acadêmica, na qual um conselho de uma
universidade decide estabelecer um regulamento que exija a aprovação em um
número específico de disciplinas de escrita intensiva para que os alunos
obtenham seu diploma. A partir de tal resolução, oficializada por meio de um
regulamento que estabelece os critérios necessários para que uma disciplina
seja considerada de escrita intensiva, diversos documentos administrativos e
orientacionais são confeccionados para que se coloque a nova regra em
prática. Em seguida, disciplinas são criadas com base nos critérios
estabelecidos, trabalhos são feitos pelos alunos, tendo em vista aprovação em
tais disciplinas para obtenção das condições necessárias à graduação.
Neste exemplo descrito por Bazerman, percebe-se que, uma vez
aprovada a resolução referente às novas exigências para um aluno obter um
diploma de graduação, uma série de eventos motivados e realizados por uma
sequência interdependente de textos passa a criar diversos fatos sociais, pois

nesse ciclo de textos e atividades, vemos sistemas


organizacionais bem articulados dentro dos quais tipos
específicos de textos circulam por caminhos previsíveis, com
consequências familiares e de fácil compreensão [...]. Temos
gêneros altamente tipificados de documentos e estruturas
sociais altamente tipificadas nas quais esses documentos
criam fatos sociais que afetam as ações, direitos e deveres das
pessoas. (BAZERMAN, 2005, p. 21)

Assim, segundo o pesquisador, é possível afirmar que cada texto


encontra-se encaixado em atividades sociais estruturadas e dependentes de
textos anteriores que influenciam a atividade e a organização social. Além
disso, tais textos estabelecem condições a serem consideradas nas atividades
subsequentes (p. 22).
                                                                                                               
39
Alguns desses conceitos, como os de atos de fala e fatos sociais, já estavam presentes na
abordagem fundante da análise de interações em sala de aula de Gumperz, com base na
Etnografia da Comunicação e na Sociolinguística Interacional (cf. Gumperz, 1982; Gumperz e
Hymes, 1986 e Cook-Gumperz, 1986; 1990).

 
  55  
 

Quando, de acordo com o autor, um texto bem sucedido cria a seus


leitores um fato social, ou seja, ações sociais significativas realizadas pela
linguagem, tal fato social é realizado por meio de formas textuais padronizadas
e típicas, ou seja, por meio de gêneros. Juntos, esses vários tipos textuais
constituem um conjunto de gêneros, que funcionam dentro de um sistema de
gêneros que, por sua vez, são parte dos sistemas de atividades humanas.
De forma a ilustrar os efeitos dos gêneros sobre os sistemas de
atividade, Bazerman afirma que, ao introduzir diferentes gêneros em
determinada situação, não se introduzem apenas diferentes tópicos, mas,
dependendo do gênero em questão, introduzem-se diferentes atividades,
padrões interativos, atitudes e relações. Segundo ele, “numa sala de aula, o
trabalho de um professor frequentemente serve para definir gêneros e
atividades e, fazendo isso, criar oportunidades e expectativas de
aprendizagem.” (p. 23)

3.1 Fatos sociais


 
Para uma compreensão plena das proposições do autor, é preciso
definir alguns dos conceitos-chave utilizados por ele. O primeiro deles consiste
nos fatos sociais. Fatos sociais são “as coisas que as pessoas acreditam que
sejam verdadeiras e, assim, afetam o modo como elas definem uma situação”
(p. 21). Bazerman exemplifica tal conceituação ao afirmar que frequentemente

fatos sociais estão relacionados com temas que são


fundamentalmente matéria de compreensão social, como, por
exemplo, se um prefeito tem autoridade para tomar certas
decisões e agir de uma certa maneira. Essa autoridade é
baseada numa série historicamente desenvolvida de
compreensões, acordos e instituições políticas, legais e sociais.
(BAZERMAN, 2005, p. 24)

Outro exemplo possível para definir fatos sociais utilizado pelo


pesquisador consiste nas exigências de uma instituição de ensino superior
para que um aluno possa efetuar sua matrícula. Ao requerer uma série de
documentos para admitir um estudante, como, por exemplo, o histórico escolar,

 
  56  
 

a universidade define exemplares textuais de fatos sociais necessários para o


ingresso do indivíduo em questão. Tal exemplo demonstra como os fatos
podem ser determinados por textos.
O autor ainda salienta que os fatos sociais têm efeito sobre as palavras
ditas, bem como sobre a força que tais enunciados possuem. Além disso, eles
podem ser interpretados distintamente por pessoas num mesmo grupo social e,
se um fato social não é compartilhado por aqueles envolvidos em determinadas
situações, conflitos podem emergir. Ao observar os fatos sociais, percebe-se
que eles, em muitos dos casos, “dependem inteiramente de atos de fala, se
certas formulações verbais foram corretas e propriamente feitas” (p. 25).

3.2. Atos de fala


 
Em sua definição de atos de fala, Bazerman faz uso do trabalho do
filósofo John Austin (1990) que, em seu livro How to do things with words,
afirma que as palavras não apenas significam, mas fazem coisas. Segundo o
professor norte-americano, os argumentos de Austin

são construídos sobre alguns exemplos como o de dois amigos


que fazem uma promessa e o de um religioso que declara
“casadas” duas pessoas. Esses atos são feitos tão somente
pelas palavras em si. Como resultado de uma série de palavras
ditas, no tempo apropriado, em circunstâncias apropriadas e
pela pessoa apropriada, alguém será obrigado a fazer alguma
coisa diante da promessa, e determinado casal mudará a
organização de suas vidas. [...] Pode-se dizer que a solicitação
de um empréstimo bancário é levada a cabo puramente pelas
palavras e números usados [...]. Da mesma forma, a aprovação
do banco é simplesmente realizada através de uma carta
emitida na qual se afirma se a solicitação foi aprovada.
(BAZERMAN, 2005, p. 26)

Assim, Bazerman conclui que

toda declaração realiza alguma coisa, mesmo que apenas


declare um certo estado de coisas como verdadeiro. Portanto,
todo enunciado incorpora atos de fala. É claro que para nossas
palavras realizarem seus atos, elas devem ser ditas pela
pessoa certa, na situação certa, com o conjunto certo de
compreensões. (BAZERMAN, 2005, p. 26, ênfase adicionada)

 
  57  
 

Além de salientar a necessidade de que certas condições, como as


citadas acima, sejam observadas para que um ato de fala se realize, o autor
ainda explica, tendo por base John Searle (1995), que os atos operam em três
níveis distintos ― o que foi literalmente dito, o ato pretendido e seu efeito real.
O primeiro deles, o que foi literalmente dito – o ato locucionário –, traz
em si um ato proposicional, uma afirmação acerca dos estados das coisas no
mundo. O ato ilocucionário – o ato pretendido – carrega uma determinada força
ilocucionária, uma intenção de reconhecimento do significado do que foi dito
em um contexto específico (p. 26). Bazerman exemplifica este tipo de ato ao
afirmar que, se uma menção acerca da temperatura de um ambiente for feita,
tal enunciado trará em si uma proposição. As palavras em questão poderiam
sugerir que o lugar estava muito frio e seria necessário aumentar a temperatura
do lugar ou significar que a conversa estaria desagradável. Assim, nesse caso,
ao falar indiretamente, um indivíduo pretende que suas palavras tenham uma
força ilocucionária específica. Em função das circunstâncias imediatas em que
a frase foi proferida, espera-se que os demais participantes da conversa
compreendam o significado pretendido. O ato que se intenciona que o ouvinte
reconheça é o ato ilocucionário. Por fim, o autor apresenta o último nível em
que operam os atos de fala. Segundo ele, “o modo como as pessoas recebem
os atos e determinam as consequências destes atos para futuras interações é
chamado de efeito perlocucionário” (p. 27).
Bazerman afirma que a análise em três níveis dos atos de fala também
permite a compreensão do status das afirmações ou representações contidas
nos textos escritos e não apenas em enunciados orais, sobre o estado de
coisas no mundo.

Muitos textos asseveram proposições, como uma nova


descoberta científica sobre o valor do chocolate para a saúde,
ou “fatos” novos sobre alguma manifestação pública ou o
“verdadeiro significado” de um poema. Assim, a força
ilocucionária é a de obter a aceitação do ato proposicional.
Porém, apenas sob determinadas condições, os leitores
acreditarão nessas asserções como fatos. No caso dos efeitos
maravilhosos do chocolate, se existirem descobertas científicas
contrárias, ou erros evidentes nos procedimentos seguidos [...],
a proposição pode não ser aceita por um número de leitores
suficientemente relevante para conquistar o status de um “fato”.
[...] Se, contudo, os autores conseguirem uma aceitação mais

 
  58  
 

ampla, novos fatos sociais sobre o valor do chocolate [...] serão


estabelecidos, até que alguém enfraqueça esses fatos ou os
substitua por novas “verdades”. (BAZERMAN, 2005, p. 28)

Diante dessa análise, o educador chama atenção para o fato de que o


problema de defender o valor verdade de proposições se torna uma questão de
satisfazer as condições necessárias para que ouvintes relevantes aceitem as
proposições como verdadeiras. Dessa forma, haverá convergência entre o
efeito perlocucionário e sua intenção ilocucionária.
Bazerman limita sua análise aos gêneros orais e escritos. Entretanto,
considerando a multiplicidade de linguagens presente no mundo
contemporâneo, é possível afirmar que a construção de fatos sociais também
se dá através gêneros compostos por outras semioses. Exemplos claros disso
podem ser vistos na construção da imagem de políticos, celebridades,
empresas e marcas feita por meio de informações veiculadas em suportes
diversos e em múltiplas linguagens.

3.3. Gêneros, conjunto de gêneros e sistema de gêneros


 
Para o autor, a concepção de gêneros deve ir além da mera tipificação
textual para que não se ignore o papel dos indivíduos no uso e na construção
de sentidos. Além disso, é preciso atentar para o fato de que os gêneros não
são atemporais e imutáveis, pois dependem do contexto no qual se inserem.
Assim, Bazerman considera que

podemos chegar a uma compreensão mais profunda de


gêneros se os compreendermos como fenômenos de
reconhecimento psicossocial que são parte de processos de
atividades socialmente organizadas. Gêneros são o que
acreditamos que eles sejam. Isto é, são fatos sociais sobre os
tipos de atos de fala que as pessoas podem realizar e sobre os
modos como elas os realizam. Gêneros emergem nos
processos sociais em que pessoas tentam compreender umas
às outras suficientemente bem para coordenar atividades e
compartilhar significados com vistas a seus propósitos práticos.
(BAZERMAN, 2005, p. 31)
Diante da definição do autor, percebe-se certa congruência com a
definição de gêneros segundo a concepção proposta por Bakhtin 2003 [1952-
53/1979] como tipos relativamente estáveis de enunciados, elaborados em

 
  59  
 

uma esfera social e caracterizados por seu tema, estilo, pela construção formal
que os compõe e pela valoração que os orienta.
Para Bazerman, “os gêneros são parte do modo como os seres
humanos dão forma às atividades sociais” (p. 31). Ou seja, por meio deles as
pessoas são convencidas a se organizarem de determinada forma, assumindo
papéis específicos em determinadas atividades. Assim,

para caracterizar como os gêneros configuram-se e


enquadram-se em organizações, papéis e atividades mais
amplas são propostos vários conceitos que se sobrepõem,
cada um envolvendo um aspecto diferente dessa configuração:
conjunto de gêneros, sistema de gêneros e sistema de
atividades. (BAZERMAN, 2005, p. 32)

O educador norte-americano define o conjunto de gêneros como a


coleção de gêneros que uma pessoa tende a produzir num determinado papel.
Assim, ao identificar, em uma determinada disciplina escolar, os gêneros com
os quais os alunos precisam se envolver para estudar, comunicar-se com os
colegas e com o professor, para se submeter ao diálogo e à avaliação, será
possível definir, por meio desse conjunto de gêneros típicos de tal contexto, as
competências, desafios e oportunidades de aprendizagem oferecidas.
O sistema de gêneros, segundo Bazerman, compreende os diversos
conjuntos de gêneros utilizados por pessoas que trabalham juntas de uma
forma organizada, além das relações padronizadas que se estabelecem na
produção, circulação e uso dos textos. Por meio de um sistema de gêneros é
possível capturar as sequências regulares com que um gênero segue outro
gênero, dentro de um fluxo comunicativo típico de um grupo de indivíduos. O
pesquisador ilustra o conceito por meio das práticas de sala de aula:

O conjunto de gêneros escritos por um professor de uma


determinada disciplina pode consistir em um programa da
disciplina, exercícios escritos, anotações pessoais sobre
leituras, anotações para dar aula e planos de aula, questões de
exames, avisos por e-mail para a turma, respostas individuais a
questionamentos e comentários de alunos, comentários e
notas sobre a produção escrita dos alunos e boletins de notas
ao final do semestre. Alunos dessa mesma disciplina teriam um
conjunto de gêneros de certa forma diferente: anotações sobre
o que foi dito nas palestras e aulas, anotações sobre as
leituras, esclarecimentos nas fichas de trabalhos solicitados e

 
  60  
 

no programa da disciplina, questionamentos e comentários


para o professor e/ou colegas de turma por e-mail, anotações
sobre pesquisa bibliográfica e coleta de dados para tarefas,
rascunhos de trabalhos e cópias finais de trabalhos, respostas
dos exames, carta de solicitação de revisão de notas. Contudo,
esses dois conjuntos de gêneros estão intimamente ligados e
circulam em sequências e padrões temporais previsíveis. [...]
No fim do semestre, o instrutor calcula através de alguma
fórmula a soma de todas as notas com a finalidade de produzir
um boletim, que é encaminhado ao funcionário encarregado,
para entrar num sistema de gêneros institucional.
(BAZERMAN, 2005, p. 33)

O autor explica que o sistema de gêneros do exemplo acima constitui


também uma parte do sistema de atividades da sala de aula. Segundo ele, ao
definir o sistema de gêneros em que as pessoas estão envolvidas, é possível
identificar as estruturas que organizam seu trabalho. Em algumas situações, os
gêneros orais serão predominantes, mas, quanto mais se avança na escala
educacional, adentrando o mundo profissional, percebe-se o crescimento da
importância dos gêneros escritos. Além disso, Bazerman atenta ao fato de que,
em algumas atividades, os aspectos físicos assumem um papel central,
relegando os gêneros orais e escritos a papéis periféricos e de suporte.
Por fim, o pesquisador afirma que levar em consideração o sistema de
atividades junto com o sistema de gêneros é focalizar o que as pessoas fazem
e como os textos ajudam-nas a fazê-lo, em vez de focalizar os textos com um
fim em si mesmos.
Estudos que levem em consideração a teoria proposta por Bazerman
devem, segundo o próprio autor, atentar às peculiaridades advindas da
extensão da proposta de atos de fala de Austin e Searle a textos escritos. Um
exemplo disso está no fato de que linguistas e antropólogos linguistas que
fizeram uso do conceito de atos de fala, o fizeram com base em enunciados
orais breves, contendo apenas um ato de fala. Entretanto, embora os textos
escritos sejam significantemente maiores que enunciados orais e contenham
muitos atos de fala, o educador norte-americano aponta que os textos escritos
normalmente têm ações dominantes que definem sua intenção e propósito.
Além da questão relacionada à modalidade de linguagem, Bazerman explica
que, diferentemente do que ocorre com os enunciados orais, a resposta do
leitor a um enunciado escrito está quase sempre separada no tempo e no

 
  61  
 

espaço do momento da escrita e é protegida pela privacidade de uma leitura


silenciosa. Outra diferença está em eventuais divergências entre a intenção
ilocucionária e o efeito perlocucionário que não podem ser solucionadas
facilmente como ocorre com os enunciados orais. Por fim, deve-se considerar
também que os textos escritos, ao contrário dos textos orais, podem viajar mais
facilmente para situações completamente novas, em que poderá servir a
propósitos não previstos.

3.4. Aula como sistema de atividades e gêneros

Rojo (2007) analisou uma aula de história utilizando a ferramenta


sinopse, proposta por Schneuwly, Cordeiro e Dolz (2005), ligeiramente
modificada ao incorporar os conceitos de Batista (1997) de sequências globais
e locais a fim de definir os níveis hierárquicos das sequências de atividades. A
sinopse tem como função observar como os objetos de ensino são abordados
no decorrer de uma aula, estabelecendo, assim, uma sequencialidade
hierárquica das atividades didáticas. Rojo (2007), em seu estudo, considerou a
sequencialidade hierárquica da aula observada como um sistema de atividades
e analisou os sistemas de gêneros, fazendo referência ao conceito proposto
por Bazerman (2005), que organiza os textos que nela circulam.
Como resultado da análise feita por meio da sinopse, a autora verifica
que “Bazerman parece ter razão ao qualificar a aula como um sistema de
atividades que convocam, cada uma delas, diferentes sistemas ou conjuntos
de gêneros e textos/enunciados na sua realização” (p.11). Rojo (2007, p. 11)
ainda explica que

os gêneros e textos não se distribuem aleatoriamente na aula,


mas formam um sistema na acepção da palavra, funcionando
de maneira complexamente relacionada à atividade em
questão: os gêneros de outras esferas que não a escolar –
científica: relato histórico; literária: poema – somente
comparecem nas atividades de leitura, a partir dos textos
escritos que circulam na aula. De resto, encadeiam-se a eles
enunciados em gêneros escolares orais (e escritos) que fazem
a sala de aula funcionar – questionário oral ou escrito, ordens,
instruções, explicações e descrições de ações, relatos, pedidos
etc. – nos quais, na maioria das vezes, verifica-se a forma
dialogal, frequentemente no padrão I-R-A.

 
  62  
 

Assim, para a análise posterior da estrutura da aula mediada por MDDI,


adotaremos o conceito de estruturação da aula como sistema de atividades e
de gêneros de Rojo (2007), embasada em Bazerman (2005).

4. A aula e suas instâncias discursivas

A partir de uma perspectiva mais enunciativa e menos etnográfica e


sociolinguística, ao longo das observações de aula que serviram de base para
sua pesquisa, Batista (1997) conclui também que “o uso da linguagem na aula
originava um conjunto diversificado de textos, produzidos e utilizados em
diferentes condições enunciativas” (p. 32). Segundo o autor, tais textos eram
heterogêneos e dispersos, mas, de algum modo, eram articulados e
homogeneizados. A análise para determinar “os mecanismos que
asseguravam àquele conjunto heterogêneo e disperso de textos a possibilidade
de se articular e de seguir construindo uma progressão discursiva” revelou que
a produção discursiva se organizava em duas instâncias ― a instância da aula
e a instância do exercício ―, que ofereciam “diferentes e relacionadas
condições de produção de discurso, isto é, diferentes e relacionadas
modalidades de enunciação, objetivos e estratégias discursivas” (p. 33).
Embora apresentem diferentes aspectos, Batista salienta que as duas
instâncias “mantêm entre si relações de constituição” e que “sua alternância
possibilita a interlocução em sala de aula, assim como sua continuidade” (p.
34).

4.1. A instância da aula

A interlocução que se realiza oralmente entre professor e turma em sala


de aula é aquela produzida sob orientações e condições da instância da aula.
Por meio da análise de tal interlocução, de acordo com o Batista (1997), é
possível depreender três conjuntos de estratégias discursivas que se
realizam na instância em questão: “aquelas por meio das quais se faz a
organização local e intermediária do discurso, aquelas por meio das quais se
constituem os polos da interlocução e aquelas por meio das quais se faz a
organização global da interlocução.” (p. 39)

 
  63  
 

Por meio do primeiro conjunto de estratégias, organiza-se localmente o


discurso, ou seja, organizam-se as unidades menores desse discurso com
base em sequências triádicas de turnos, em que “a fala do aluno se encontra
controlada e envolvida pelos turnos de pergunta e reação do professor” (p. 41).
Para ilustrar tal constatação, Batista descreve o momento de correção de um
estudo de texto feito por uma professora e sua turma. A cada questão
corrigida, a interlocução materializava-se por meio de sequências triádicas e,
assim que a professora satisfazia-se com a resposta dada por seus alunos, ela
abandonava a pergunta em que vinha se baseando e propunha uma nova
questão. O pesquisador aponta que “organiza-se, assim, também, a
interlocução num nível intermediário. Um conjunto de sequências triádicas em
torno de uma mesma pergunta retirada dos exercícios ou de atividades feitas
anteriormente formam uma unidade hierarquicamente superior. É, assim,
através desses processos que progride, de forma organizada, o discurso em
sala de aula.” (p. 42)
Batista analisa que, ao longo dos turnos, observam-se estratégias
adotadas pela professora para sempre tornar presente na interlocução um
objeto na fala dos alunos passível de correção. Entretanto, seu objetivo não
está meramente na correção, mas também em “fornecer objetos para que se
possa conhecer, avaliar e, assim, corrigir a aprendizagem dos alunos” (p. 44).
Segundo o autor, o discurso da docente pode “progredir apenas na medida em
que há objetos a serem objetivados e corrigidos”. Batista explica que tal
discurso, tendo em vista sua função corretiva, “é uma fala que se alimenta dos
erros, isto é, dos objetos objetivados pelo professor. Não havendo tais objetos,
o discurso cessa” (p. 45). Com base em suas observações, o pesquisador
afirma que, mesmo em situações em que há a introdução de novos conteúdos
e não há correção de exercícios, o discurso do professor continua organizando-
se da mesma forma: sequências triádicas permeadas pelas funções de
avaliação e correção. Tal constatação elucida o fato de que

o trabalho de transmissão de conteúdos é, assim, não


simplesmente uma comunicação, mas uma comunicação que
pretende se fazer em substituição ao conhecimento anterior do
aluno ou, pelo menos, com base na distância, maior ou menor,
que separa um e outro, objetivadas pelas perguntas do
professor. Além disso, as recorrentes contradições existentes

 
  64  
 

entre o conhecimento intuitivo dos alunos e os conteúdos


transmitidos acabam por acentuar o caráter corretivo da
comunicação. (BATISTA, 1997, p. 49)

O segundo conjunto de estratégias, aquelas que visam a constituição de


polos de interlocução, realiza-se com frequência por meio de atos de fala de
repreensão, cujo objetivo é reduzir a possibilidade de interações em sala de
aula, de forma a constituir um corpo unificado de alunos centrado pela atenção
na figura do professor.
Batista aponta que se constituem, assim, os polos da interlocução e
marcam-se os papéis daqueles que o ocupam: “o reconhecimento tácito da
autoridade do professor, promovido pela estratégia, implica ainda, o
reconhecimento tácito da posse, por ele, da dominância da interlocução, e o
reconhecimento, também tácito, do papel dominado dos alunos nessa
interlocução” (p. 54).
O pesquisador explica que a constituição desses polos de interlocução
na sala de aula, além de ser uma violência à diversidade real dos alunos e à
real multiplicidade das formas de interlocução, é provisória em sua base, pois,
em diversas ocasiões, tal configuração se desfragmentará. Além disso, o
dirigir-se à turma como um todo não implica em uma escuta homogênea. Esse
caráter provisório dos polos, segundo Batista, é acentuado quando se tem em
vista as funções de avaliar e corrigir objetivadas pela interlocução. Para que
tais funções sejam possíveis, é preciso dirigir-se a alunos específicos, o que
fragmenta os polos constituídos da interlocução. Para que haja reconstituição e
manutenção dos polos de interlocução, o professor faz uso de recursos como a
organização local da interlocução em sequências triádicas; reforço de sua
autoridade; apelo a formas de repreensão; uso de perguntas retóricas e a
aplicação das respostas dadas por alunos à turma como um todo; constituição
de subclasses de alunos e antecipação de objetos de correção.
Batista ainda estabelece uma relação entre o processo de unificação
dos alunos num único polo e os processos de seleção e distribuição escolares.
De acordo com o autor,

classificando os alunos segundo sua faixa etária, segundo uma


avaliação de seu desenvolvimento cognitivo, segundo sua
história escolar e sua origem socioeconômica, os mecanismos

 
  65  
 

de enturmação opõem e identificam grupos de alunos que


constituirão turmas “homogêneas”, “grupos iguais”, “crianças
com um mesmo tipo de interesse”: corpos unificados.
(BATISTA, 1997, p. 60)

Assim, o autor aponta o fato de que o processo de enturmação promove


a unidade entre os interlocutores do professor como constituinte de um
processo mais geral de seleção e distribuição pelos espaço e tempo escolares.
Por fim, Batista explica que as estratégias que organizam globalmente a
interlocução, ou seja, a organização global da interlocução, agem através de
dois mecanismos distintos. O primeiro deles, aplicado quando o objeto de
ensino é gramatical, constitui-se no desenvolvimento, por meio de análise, do
um objeto de ensino gramatical e a retomada, por meio da síntese da
interlocução anterior. O pesquisador explica que esse mecanismo organiza a
interlocução “como um conjunto de sequência de atividades relacionadas numa
cadeia de discurso que progride temporalmente de tal modo que seus
momentos ulteriores contêm parte dos anteriores, acumulados pelo contínuo
movimento de recuo e avanço, de síntese e de análise” (p. 67).
Segundo Batista, quando se trabalhava em sala com objetos de ensino
relacionados à leitura, escrita e linguagem oral, o mecanismo de organização
da interlocução era diferente do verificado anteriormente. Ao contrário de
objetos de ensino gramatical, objetos relacionados à leitura, escrita e
linguagem oral não podem ser trabalhados em uma sequência de progressão,
como, por exemplo, faz-se com pronomes definidos, indefinidos, relativos.
Assim, não há necessidade de síntese do objeto anterior para início da análise
do novo objeto. Para esses casos, o autor notou que se verificava a repetição
de uma estrutura de desenvolvimento organizada da seguinte forma: um texto
extraído da obra de um escritor ou de uma tradição folclórica e um conjunto de
exercícios intitulados “estudo das ideias”, “estudo do vocabulário”, “ortografia”,
“redação”, “linguagem oral”.

4.2. A instâncias do exercício

Batista explica que a instância do exercício ocorre quando o professor


interrompe o fluxo de seu discurso e indica uma atividade a ser realizada
isoladamente e em geral situada no livro didático.

 
  66  
 

Tal instância, de acordo com o autor, organiza-se em torno de um


conjunto de textos escritos e articulados entre si. Ao analisar a interlocução
estabelecida entre autores do livro didático e alunos, Batista aponta que há um
apagamento do sujeito da enunciação. Entretanto, fatores como, por exemplo,
palavras em negrito, enumerações e emprego do imperativo constroem um
sujeito didático, que faz apreender. Consequentemente, um lugar
correspondente constrói-se para o leitor: o de aprendiz. Os textos-exercícios,
de acordo com a análise do pesquisador, “forçam a aprendizagem, fazendo
com sejam postos em práticas os saberes adquiridos através de uma forma
predominantemente passiva”. Além disso, esses textos-exercícios também
objetivam permitir ao professor conhecer e avaliar a aprendizagem do aluno.
Batista elucida que, por um lado, esses textos constroem e predispõem
os interlocutores da atividade em que nessa instância se dá, suas relações,
objetivos e estratégias. Por outro lado, esses textos constroem os horizontes
da interlocução que se realiza na instância da aula, grande parte de suas
estratégias e suas formas de progressão e articulação de discurso.
Ao analisar o livro didático utilizado pela turma, Batista descreve os
mesmos mecanismos de organização da interlocução verificados na instância
da aula. Para objetos de ensino gramatical, havia, por meio de textos e
exercícios, o desenvolvimento, por meio de análise, do objeto questão, a
retomada, por meio da síntese da interlocução anterior e, finalmente, a
introdução de um novo objeto. Para o caso de objetos relacionados aos usos
da língua, havia apenas a repetição da mesma organização estabelecida pela
articulação entre um texto-base e os exercícios subsequentes.
Diante disso, Batista conclui que a organização da interlocução
realizada na instância da aula provém da organização dos textos em torno dos
quais se estrutura a instância do exercício.

Ao que tudo indica, a heterogeneidade e a dispersão da


produção discursiva da aula ― constatada inicialmente ― é
homogeneizada e articulada em grande parte,
consequentemente, por esse conjunto de textos que sustentam
a interlocução na instância do exercício. (BATISTA, 1997, p.
88)

 
  67  
 

Dessa forma, as relações entre as duas instâncias em questão podem


ser caracterizadas como relações de constituição. Para Batista, a alternância
da realização de atividades em ambas as instâncias assegura a continuidade
do discurso em sala de aula. Além disso, ao considerar a influência
predominante da instância do exercício (e do material didático, portanto) na
instância da aula, o pesquisador atribui ao professor o papel de alguém que
talvez não ensine propriamente, mas alguém que administre e gerencie o
ensino. O professor, nesse contexto, não necessita de um conhecimento
acerca do objeto de ensino, “mas do conhecimento sobre o processo de
organização de sua prática e sobre as relações dos alunos sobre esses
saberes que se ensinam” (p. 88).
O autor afirma que todo esse processo evidencia “um fosso entre a
representação do professor como aquele que domina um conjunto de
conhecimentos sobre o que ensina e a realidade de sua prática” (p. 88). Tal
fato, de acordo com Batista, constitui uma ameaça à autoridade do docente e,
consequentemente, ao processo de organização do discurso. Assim, fica
evidente a necessidade do professor “de desenvolver estratégias que,
reforçando sua autoridade e a legitimidade de suas ações, contribuam para
atenuar essa contradição” (p. 99).
Dessa forma, o subsídio teórico fornecido por Batista (1997) quanto à
constituição da interlocução em sala de aula e às interações entre professor-
aluno e aluno-material será adotado como categoria de análise para verificar se
tais aspectos se mantêm ou não no contexto de aula mediada por essas novas
tecnologias.

5. A análise da atividade sociocultural em três planos


 
  Uma vez estabelecidas as categorias de análise a partir das
conceituações de Bazerman (2005), Rojo (2007) e Batista (1997), é preciso
organizá-las mediante uma abordagem específica. Para isso, buscamos
aparato teórico na abordagem proposta pela pesquisadora neovygotskyana
Barbara Rogoff (1995) sobre a análise do desenvolvimento cognitivo em
atividades socioculturais.

 
  68  
 

Segundo Rogoff (1995), pesquisas acerca do desenvolvimento humano


comumente se limitam a estabelecer como unidade de análise ou o indivíduo
ou o ambiente em que ele se insere. De acordo com a autora, mesmo nos
casos em que ambos são considerados, há a tendência em abordá-los como
entidades separadas em vez de defini-los como mutuamente constitutivos,
impossibilitando, assim, sua decomposição em elementos ou unidades.
Partindo da perspectiva vygotskyana40, que, segundo Rogoff, parece apontar
para a preocupação em buscar uma unidade de análise capaz de manter a
essência dos eventos de interesse para uma determinada pesquisa em vez de
decompô-los em unidades que não mais podem funcionar como funcionariam
juntas, a autora adota a atividade sociocultural como unidade de análise em
sua abordagem. Essa escolha justifica-se, de acordo com Rogoff, pois, tal
unidade, constituída por contribuições ativas e dinâmicas dos indivíduos
envolvidos, seus parceiros sociais, tradições históricas, materiais e suas
transformações, permite a reformulação da relação entre indivíduos e seu meio
social e cultural, entre os quais há uma construção mútua, ou seja, não podem
existir separadamente.
Novamente com base em Vygotsky (1978, 1987), Rogoff, ao reforçar a
mútua constituição dos aspectos de uma atividade sociocultural, sustenta que o
desenvolvimento cognitivo da criança precisa ser entendido como situado nas
interações com outros membros da sociedade mais familiarizados com as
práticas intelectuais e com as ferramentas sociais (especialmente a
linguagem). Essa familiarização com práticas e ferramentas permite a tais
membros promover uma mediação no desenvolvimento da atividade
intelectual.
Assim, abordagem proposta pela pesquisadora envolve a observação do
desenvolvimento humano em atividades socioculturais por meio de três planos
de análise: comunitário/institucional, interpessoal e o pessoal. Em cada um

                                                                                                               
40
Rogoff menciona especificamente, em sua justificativa para definição da unidade de análise,
que “a ênfase atribuída por Vygotsky à interrelação de funções do indivíduo e do meio social
no desenvolvimento microgenético, ontogenético, sociogenético e filogenético inclui o
individual e o ambiental juntos em amplas e sucessivas estruturas temporais” (ROGOFF,
1995, p. 139, tradução nossa). “Vygotsky's emphasis on the interrelated roles of the individual
and the social world in microgenetic, ontogenetic, sociocultural, and phylogenetic development
includes the individual and the environment together in successively broader time frames.”

 
  69  
 

desses planos, Rogoff especifica, respectivamente, processos de


desenvolvimento: aprendizibilidade (apprenticeship), participação guiada
(guided partipation) e apropriação participativa (participatory appropriation).
Sobre as relações entre planos de análise, a autora explica que eles

não podem ser considerados separadamente ou


hierarquicamente, mas simplesmente como diferentes núcleos
que constituem a atividade sociocultural como um todo. Para
entender cada um desses planos, é necessário considerar os
demais. Quando há distinção entre eles, o objetivo, nesse
caso, é elucidar aspectos para uma discussão sobre processos
específicos de um plano que compõe tal atividade como um
todo. Ainda assim, mantêm-se os demais planos de análise
como aspectos presentes, embora secundários, na discussão,
mas nunca separados. (ROGOFF, 1995, p. 141, tradução
41
nossa)

Dessa forma, considerando a constituição mútua dos planos de análise


para a abordagem em questão, Rogoff sustenta que crianças participam de
atividade socioculturais de sua comunidade, relacionando-se com demais
crianças e também com adultos por meio de colaborações tácitas ou explícitas.
Nesse processo de participação, segundo a autora, a criança se torna mais
preparada para participar de atividades socioculturais subsequentes de uma
mesma natureza.
A seguir, encontram-se as definições de cada um dos processos que
constituem os planos de análise do desenvolvimento a partir da participação
em atividades socioculturais segundo Rogoff.

5.1. O plano comunitário/institucional e a aprendizibilidade

No plano de análise de processos de comunidade, Rogoff (1995) elegeu


o termo aprendizibilidade (apprenticeship), no sentido relacionado ao ato ou
efeito de ser aprendiz, para caracterizar o processo de desenvolvimento sobre
o qual deve residir o foco de observação no plano em questão. Segundo a
                                                                                                               
41
“I conceive of planes of focus not as separate or as hierarchical, but as simply involving
different grains of focus with the whole sociocultural activity. To understand each requires the
involvement of the others. Distinguishing them serves the function of clarifying the plane of
focus that may be chosen for one or another discussion of processes in the whole activity,
holding the other planes of focus in the background but not separated.”

 
  70  
 

autora, a aprendizibilidade relaciona-se ao “sistema de envolvimentos


interpessoais e à disposição por meio dos quais pessoas engajam-se em uma
atividade organizada culturalmente” 42 (p. 142, tradução nossa). Em tais
atividades, a partir desses envolvimentos, salienta a pesquisadora, “aprendizes
tornam-se participantes mais aptos” (p. 142, tradução nossa)43. A metáfora de
aprendizibilidade adotada pela pesquisadora amplia a ideia

do ofício da aprendizibilidade para incluir a participação em


qualquer atividade organizada culturalmente, tais como aquelas
presentes no trabalho, no ensino escolar e nas relações
familiares. A ideia de aprendizibilidade, necessariamente,
aponta para a natureza específica da atividade em questão,
bem como sua relação com práticas e instituições pertencentes
à sociedade na qual tal atividade se realiza. (ROGOFF, 1995, p.
44
141, tradução nossa)

Rogoff ainda explica que, em pesquisas cujo foco situa-se sobre o plano
de processos de comunidade, examina-se a estrutura institucional e as
tecnologias culturais da atividade intelectual. A autora explica que o contexto
social é constituído por “instituições, normas e práticas desenvolvidas e
apropriadas pelas gerações passadas” (ROGOFF, 1990, p. 138, tradução
nossa)45. Ao longo do tempo, as gerações mudam a história cultural do curso
do desenvolvimento e deixam “um legado para o indivíduo em forma de
tecnologias, tais como o letramento, o sistema numérico e computadores, tanto
quanto os sistemas de valores, “scripts” e normas para lidar com as situações
encontradas por esse indivíduo” (ROGOFF, 1998, p. 682, tradução nossa)46.
Em suma, é possível afirmar que, ao focar tal plano de análise, encoraja-se a
reconhecer que esforços empregados em uma atividade sociocultural
envolvem propósitos – que são determinados em termos institucionais ou
                                                                                                               
42
“(...) it focuses on a system of interpersonal involvements and arrangements in which people
engage in culturally organized activity (...).”
43
“(...) in which apprentices become more responsible participants.”
44
“ (...) craft apprenticeship to include participation in any other culturally organized activity,
such as other kinds of work, schooling, and family relations. The idea of apprenticeship
necessarily focuses attention on the specific nature of the activity involved, as well as on its
relation to practices and institutions of the community in which it occurs (...).”
45
“ (...) the institutions, technologies, norms, and practices developed by and appropriated from
previous generations.”
46
“ (...) a legacy for the individual in form of technologies such as literacy, number system, and
computers, as well as value systems and scripts and norms for the handling of situations met
by the individual.”

 
  71  
 

comunitários, limites culturais, recursos, valores relacionados a o que é


apropriado para alcançar o objetivo visado e as ferramentas culturais
disponíveis (ROGOFF, 1995, p. 142).
Para reforçar que os planos de análise são mutuamente constituídos,
Rogoff (1995) salienta que, embora, em determinado momento de uma análise
de uma atividade sociocultural, seja preciso considerar os aspectos referentes
ao plano comunitário e à aprendizibilidade, ou seja, os aspectos institucionais e
comunitários da atividade, isso não seria possível sem referências aos
aspectos dos planos de análise pessoal e interpessoal. Da mesma forma, para
entender os processos do plano pessoal e interpessoal em uma atividade
sociocultural, é preciso entender seu contexto histórico e institucional.

5.2. O plano interpessoal e a participação guiada

Participação guiada é o termo aplicado por Rogoff ao plano interpessoal.


Segundo a autora, esse conceito salienta o envolvimento dos indivíduos e seus
parceiros sociais, comunicando e coordenando seu envolvimento conforme
participam de uma atividade estruturada socioculturalmente (ROGOFF, 1995,
p. 145). A pesquisadora atenta ao fato de que tal conceito não é uma definição
operacional que pode ser utilizada para definir algumas interações ou
disposições e outras não. Em vez disso, explica Rogoff, a participação guiada
significa focar a atenção no sistema de relações interpessoais que estão
envolvidas na participação em atividades; participação esta que pode promover
algumas formas de envolvimento enquanto restringe outras, objetivando,
entender a aprendizagem (learning) e o desenvolvimento (ROGOFF, 1995, p.
146).
Para a autora, o plano interpessoal de análise, representado pela
participação guiada, é constituído por eventos cotidianos conforme indivíduos
engajam-se com outros indivíduos, com materiais e com planos de ação
colaborativamente direcionados por si mesmos e pelos demais. Segundo
Rogoff, a participação guiada pode envolver

interação direta com os outros, bem como ato de engajar-se


em ou evitar atividades que foram designadas, facilitadas ou
limitadas por outros, quer estejam quer não estejam presentes

 
  72  
 

em um mesmo espaço ou mesmo estejam ou não cientes da


presença uns dos outros. A participação guiada pode ser tácita
ou explícita, face a face ou distante, envolvida em esforços
compartilhados para realização de uma atividade com
familiares ou pessoas ou grupos desconhecidos (vizinhos,
irmãos, heróis distantes e mesmo ancestrais). O conceito em
questão inclui tentativas deliberadas de instrução, comentários
incidentais ou ações que são ouvidas ou vistas casualmente,
bem como materiais e experiências acessíveis, os quais
indicam direção na qual pessoas são encorajadas ou
desencorajadas a seguir. (ROGOFF, 1995, p. 145, tradução
47
nossa)

Rogoff ainda explica que a participação requer envolvimento em alguns


aspectos dos propósitos dos esforços empregados, mas não necessariamente
em uma ação simétrica ou mesmo em uma ação em conjunto. Para
exemplificar tal asserção, a pesquisadora explica que uma criança trabalhando
sozinha em um relatório está “participando de uma atividade cultural
direcionada que envolve interações com o professor, colegas de sala de aula,
membros da família, bibliotecários, autores e a indústria literária (...)”
(ROGOFF, 1995, p. 145, tradução nossa)48. Todas as relações que envolvem
tal atividade, segunda a autora, auxiliam a criança em sua tarefa, determinando
os materiais e abordagens a serem utilizadas.
Diante disso, Rogoff afirma que a participação guiada é, portanto, um
processo interpessoal no qual pessoas gerenciam suas próprias funções, e
também as dos demais, e as situações estruturadas que envolvem a atividade,
seja facilitando ou limitando o acesso. Em tais situações, os indivíduos
assumem a postura de observador e participante nas atividades culturais.
Essas ações coletivas voltadas para a realização de uma atividade constituem

                                                                                                               
47
“It includes direct interaction with others as well as engaging in or avoiding activities
assigned, made possible, or constrained by others, whether or not they are in each other's
presence or even know of each other's existence. Guided participation may be tacit or explicit,
face-to-face or distal, involved in shared endeavors with specific familiar people or distant
unknown individuals or groups - peers as well as experts, neighbors as well as distant heroes,
siblings as well as ancestors. It includes deliberate attempts to instruct and incidental comments
or actions that are overheard or seen as well as involvement with particular materials and
experiences that are available, which indicate the direction in which people are encouraged to
go or discouraged from going.”
48
“(...) participating in a cultural activity with guidance involving interactions with the teacher,
classmates, family members, librarian and authors, and publishing industry (...)”

 
  73  
 

e transformam as práticas culturais ao longo das gerações (ROGOFF, 1995, p.


145-146).

5.3. O plano pessoal e a apropriação participativa

Rogoff (1995) utiliza o conceito de apropriação participativa, ou apenas


apropriação, situado no plano de análise pessoal, para se referir ao processo
pelo qual indivíduos transformam seu entendimento de uma atividade, bem
como suas responsabilidades nelas, a partir da própria participação. A
apropriação, segundo a autora, relaciona-se aos demais conceitos de
aprendizibilidade e participação guiada. Sua noção básica, de acordo com a
pesquisadora, refere-se ao fato de que

por meio da participação, as pessoas mudam, e nesse


processo de mudança, tornam-se preparadas para engajar-se
em atividades subsequentes similares. Mediante esse
engajamento na atividade, participando em seu propósito, as
pessoas, necessariamente, fazem contribuições contínuas
(seja por meio de ações concretas seja por meio do
desenvolvimento do entendimento das ações e ideias dos
outros). Portanto, participação é em si mesma o processo de
apropriação. (ROGOFF, 1995, p. 148, tradução nossa)49

Rogoff , afirma que, em sua abordagem, ao discutir como crianças se


desenvolvem por meio do envolvimento com atividades socioculturais, os
termos “apropriação” e “participação” contrastam com o termo “internalização”
cunhado por Vygotsky. Segundo a autora, tal contraste evidencia-se, pois

a caracterização de Vygotsky sobre a internalização como


proveniente do interpessoal para o intrapessoal envolve uma
separação no tempo dos aspectos sociais e individuais da
atividade, a qual está em desacordo com minha ideia de
apropriação participativa, na qual, a participação de alguém é
de uma só vez um processo social e individual. (ROGOFF,
1995, p. 161, nota de rodapé, tradução nossa)50
                                                                                                               
49
“The basic idea of appropriation is that, through participation, people change and in the
process become prepared to engage in subsequent similar activities. By engaging
in an activity, participating in its meaning, people necessarily make ongoing contributions
(whether in concrete actions or in stretching to understand the actions and ideas of others).
Hence, participation is itself the process of appropriation.”
50
“(...) Vygotsky's characterization of internalization as proceeding from the interpersonal to the
intrapersonal involves a separation in time of social and individual aspects of the activity, which
is at odds with my idea of participatory appropriation, in which a person's participation is at one

 
  74  
 

Dessa forma, a autora explica que o conceito de internalização


pressupõe delimitação temporal (antes) das relações entre indivíduos em seu
meio social e (depois) da apropriação dos conceitos resultantes dessa relação.
Em contrapartida, a visão da apropriação participativa acerca das formas como
ocorrem o desenvolvimento e a aprendizagem, segundo Rogoff, envolve a
perspectiva de que crianças e os demais indivíduos com os quais elas se
relacionam são interdependentes, com papeis dinâmicos, em constante
mudança e “o processo pelo qual os indivíduos se comunicam ao tomar
decisões é o produto do desenvolvimento cognitivo” (ROGOFF, 1995, p. 148);
ele é a apropriação. Assim, em vez de considerar a internalização como um
processo em que há a separação entre indivíduo e meio social e em que se
assume um estado estático dos elementos envolvidos no que se refere à
aquisição de conceitos, memória, conhecimentos e de habilidades, a
abordagem de Rogoff tem foco sobre “as mudanças dinâmicas envolvidas em
eventos ou atividades ainda em desenvolvimento, no qual pessoas participam”
(ROGOFF, 1995, p. 148, tradução nossa) 51 . Para a autora, eventos ou
atividades sociais são inerentemente dinâmicos, ou seja, mudança e
desenvolvimento lhes são básicos.
A pesquisadora ainda explica que a apropriação participativa envolve a
apropriação de recursos e ferramentas culturais, tais como sistemas de
linguagem, por exemplo, por meio do envolvimento em atividades organizadas
culturalmente, nas quais esses recursos e ferramentas desempenham uma
função. Sobre essa delimitação do conceito de Rogoff, Costa e Lyra, explicam
que

a questão da transferência de um conhecimento prévio para


uma situação presente que implica em algo internalizado pelo
sujeito, passa a ser analisada focalizando a participação da
pessoa numa determinada atividade (LAVE, 1988; 1991) e
como esta participação se relaciona com a sua participação em
outra atividade. Para a autora, não são os objetos ou
conteúdos (conceitos, signos, etc.) que são transferidos de
uma situação a outra “como se eles existissem isolados na
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   
and the same time a social and an individual process.”
51
“on the active changes involved in an unfolding event or activity in which people participate”.

 
  75  
 

cabeça” (ROGOFF, 1998, p. 691). O termo apropriação é


proposto, então, para significar um processo constante de
mobilização dos conteúdos, dos sujeitos, das relações e dos
artefatos culturais que estão incluídos em uma atividade
específica. Infere-se, assim, que, o que é internalizado é a
própria atividade como um todo que permitirá ao sujeito a sua
participação em atividade similar posterior. (COSTA; LYRA,
2002, p. 641).

Inerente a essa perspectiva de apropriação participativa, salienta Rogoff,


é a mútua constituição dos processos pessoais, interpessoais e culturais, pois
o desenvolvimento envolve todos esses planos de análise na atividade
sociocultural.
Neste capítulo, discutimos três perspectivas de interação em sala aula.
A primeira delas, que influencia as demais, evidencia o peso do background
cultural dos alunos nas relações sociais construídas nesse ambiente, bem
como no processo de ensino e aprendizagem. A segunda perspectiva
caracteriza a aula como um sistema de gêneros, na qual o trabalho do
professor frequentemente define gêneros e atividades, a partir dos quais se
criam oportunidades e expectativas de aprendizagem. Por fim, a terceira
perspectiva aponta para duas instâncias discursivas complementares em sala
de aula, ao longo das quais se organizam os processos de ensino, bem como
as configurações de interlocução adequada para que haja a transmissão de
saber: a instância da aula e a do exercício (em geral, com base no material
didático).
No capítulo 4, a partir do conceito de estruturação da aula como sistema
de atividades e de gêneros de Rojo (2007), embasada em Bazerman (2005),
será possível analisar a estruturação da aula mediada por MDDI para tablets.
Além disso, o subsídio teórico fornecido por Batista (1997) quanto à
interlocução em sala de aula e às interações entre professor-aluno e aluno-
material será utilizado para verificar se tais aspectos se mantêm no contexto de
aula mediada por MDDI.
A fim de organizar as categorias de análise definidas, adotaremos a
abordagem proposta por Rogoff (1995), na qual se estabelecem os três planos
de análise: comunitário/institucional, interpessoal e pessoal.

 
  76  
 

No próximo capítulo, justificaremos a relevância social e acadêmica


deste trabalho, descreveremos a metodologia da pesquisa, além de
detalharmos os objetos de pesquisa, objetivos e questões estabelecidos.

 
  77  
 

CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA

Como dissemos na Introdução deste trabalho, esta pesquisa se propõe


a analisar uma experiência de uso de material didático digital interativo (MDDI)
para tablets 52 , inserindo-a num conjunto de reflexões acadêmicas que,
guardadas suas especificidades, objetivam discutir a constituição de elementos
da prática docente nesse contexto.
Conforme Rojo (2006, p. 264), pesquisas situadas na área da
Linguística Aplicada devem considerar problemas com “relevância social
suficiente para exigirem respostas teóricas que tragam ganhos a práticas
sociais e a seus participantes, no sentido de uma melhor qualidade de vida”.
Daí a importância de se buscar reflexões sobre as novas possibilidades, a
partir dos novos instrumentos alvos das pesquisas. Dessa forma, ao considerar
a problemática acima indicada, é possível afirmar que este trabalho apresenta
questões de relevância à Linguística Aplicada, pois busca criar inteligibilidade
sobre os efeitos de materiais didáticos digitais interativos para tablets na
dinâmica de aulas de Língua Portuguesa, ao mesmo tempo em que propõe
uma forma de trabalho com tal tecnologia que se pretende situada em um novo
ethos característico da vida digital contemporânea, constituído de novas
práticas e novas configurações de discurso.
Dessa forma, especificamente no âmbito de ensino de Língua
Portuguesa, considerando as mudanças de paradigma advindas da
emergência das novas tecnologias de informação e comunicação, este estudo,
cujo caráter é qualitativo e interpretativo, utilizando-se de observação
participante, tem por objetivo geral verificar como se realizam os processos de
produção e condução de uma aula por meio da utilização de materiais didáticos
digitais interativos (MDDI) para tablets.
Do objetivo geral deste trabalho, desdobram-se as seguintes perguntas
de pesquisa:

                                                                                                               
52
Podemos pensar em uma definição de tablets como dispositivos móveis em formato de
tabuletas, com telas sensíveis ao toque, que permitem a interação por gestos e aceitam
conexão sem fio à Internet (AGNER, 2011 apud STUMPF; GONÇALVES, 2012).

 
  78  
 

• Que elementos se destacam no processo de preparação de uma aula


mediada por MDDI?
• Como contexto sociocultural e a infraestrutura escolar influenciam nos
componentes da prática docente mediada por MDDI para tablets?
• Como os alunos interagem com o MDDI?
• Quais os caminhos utilizados pelos alunos ao interagirem com o
material? Como se dá essa interação?
• Como se caracteriza a interlocução na instância da aula e na do
exercício (BATISTA, 1997) diante do uso de MDDI para dispositivos
móveis?

1. O campo da pesquisa e a coleta de dados

De maneira a responder às perguntas de pesquisa, foi elaborado pelo


professor-pesquisador um material didático digital interativo (MDDI) para
tablets, sobre o qual discorreremos na próxima seção, para o trabalho com
leitura e produção de textos no Ensino Médio (EM) e foram ministradas e
documentadas, também pelo pesquisador-professor, duas aulas, com duração
de 50 minutos cada, em uma turma de 2º ano de Ensino Médio de uma escola
privada na região de Campinas (SP), nas quais foi utilizado o MDDI. As aulas
em questão foram filmadas, objetivando analisar sua condução na direção de
seus objetivos de ensino com uso de dispositivos móveis e MDDI.
A escola escolhida como campo dessa pesquisa, na verdade um núcleo
dentro de um colégio tradicional, teve sua gênese a partir de uma proposta de
Ensino Médio voltado para novas linguagens e tecnologias. Embora, na região,
esse núcleo fosse pioneiro em adotar o uso de tablets, em seu primeiro ano de
funcionamento, as práticas educacionais mantiveram-se as mesmas. Os
dispositivos móveis eram utilizados de forma limitada, em geral como leitores
de apostilas em PDF. Assim, a despeito de a escola possuir uma excelente
infraestrutura tecnológica, não havia um projeto pedagógico voltado para
concretização de sua proposta de ensino. Posteriormente, quando algumas
práticas educacionais passaram a se distanciar das práticas de ensino voltadas
ao currículo tradicional com foco em aprovação no vestibular, houve conflitos

 
  79  
 

entre direção e escola devido às concepções conflitantes da finalidade da


educação fornecida pelo núcleo em questão.
Ao aliar esse contexto escolar a meu trabalho prévio com materiais
didáticos para Produção e Interpretação Textual em mídias digitais, encontrei
condições de pesquisa adequadas para empreender esforços na construção de
um material didático digital interativo voltado para multiletramentos e novos
letramentos e, assim, procurar verificar alguns dos efeitos de seu uso em
componentes da prática docente, por meio do registro dessas duas aulas.
As filmagens foram feitas a partir de dois ângulos distintos. O primeiro
deles recaiu sobre os alunos, de forma a captar imagens de toda a turma e o
segundo, sobre o professor e o telão. A justificativa para a escolha de dois
ângulos distintos se deve ao fato de que
o registro de múltiplos ângulos dos acontecimentos da aula e a
possibilidade de rever infinitamente esses registros permite ao
pesquisador estranhar algo que a familiaridade tornaria
impossível de reflexão quando visto de um único ângulo ou
apenas uma vez. (CARDOSO; PENIN, 2009, p. 126)

Posteriormente às aulas, os alunos responderam a um questionário no


intuito de verificarmos suas percepções sobre as aulas e sobre o uso do MDDI
para triangulação de dados. Abaixo, segue o questionário que foi aplicado.

 
  80  
 

Já para verificar e descrever como se dá a interação dos alunos com o


MDDI por meio de telas sensíveis ao toque (tablets), uma amostragem de 15%
dos alunos da turma em questão ― 4 indivíduos ― teve contato prévio com o
MDDI e, durante esse período, suas interações com o material e com o tablet
foram gravadas para análise. Para isso, os tablets utilizados foram conectados
a um computador, por meio do qual foi gravado tudo o que os estudantes
fizeram em seu dispositivo enquanto interagiam com o material. Tal coleta de
dados buscou responder a questões como:
1. Ao interagirem com um material didático digital interativo, os
alunos o fazem de forma linear ou não-linear?
2. Quais elementos do material são priorizados: textos escritos,
vídeos, imagens, charges, infográficos?
3. Há utilização da internet para complementar as informações
presentes no MDDI?

2. O material didático digital interativo

O MDDI53 preparado para esta pesquisa visa ao ensino-aprendizagem


focado em gêneros nas aulas de Língua Portuguesa. Adotamos a concepção
de gêneros de discurso proposta por Bakhtin (2003[1952-53/1979]) como “tipos
relativamente estáveis de enunciados”, elaborados em uma esfera social,
caracterizados por seu tema, estilo e construção formal, grandemente ditados
pela valoração que os orienta.
Esse material didático foi elaborado por meio do aplicativo IBooks
Author, distribuído gratuitamente pela MacApp Store54. O aplicativo em questão

                                                                                                               
53
Ver Material completo no Anexo 1 deste trabalho. Para visualizá-lo como MDDI, acesse
https://www.dropbox.com/sh/otvoi0bym5q795c/AABpauNP_wJ2I_XmQ-Cn6OWza?dl=0 em
que estão disponíveis as versões *.ibook para ser visualizada em tablets IPad e *.pdf como
pdf navegável para outras plataformas, mas já com prejuízo de algumas funções do IBooks
tais como as galerias de imagens e os objetos digitais interativos, por exemplo.
54
Disponível em: https://itunes.apple.com/us/app/ibooks-author/id490152466?ls=1&mt=12,
acesso em 10/10/2012.

 
  81  
 

permite que se idealizem livros digitais interativos multissemióticos, que podem


incluir – além de texto, imagem estática, áudio e vídeo –, quizzes, objetos 3D,
objetos interativos, objetos <html>, apresentações .ppt, galerias de imagens,
pop-overs e barras de rolagem, maximizando as possibilidades de uso de
dispositivos digitais móveis interativos, como os tablets, em sala de aula.
Para concepção do MDDI, fizemos uso do conceito de protótipo
articulado por Rojo (2013a) segundo o qual

um protótipo de ensino seria um “esqueleto” de SD [sequência


didática] a ser “encarnado” ou preenchido pelo professor, por
exemplo, um modelo didático digital de um gênero ou conjunto
de gêneros, sem seus acervos ou bancos de textos, ou apenas
com acervos e bancos que funcionassem como exemplos e
pudessem ser substituídos no produto final. (ROJO, 2013a, p.
189)

Se o protótipo é na verdade um esqueleto, o que então o constituiria?


Segundo a autora,

justamente o modelo didático do(s) gênero(s) em questão, ou


parte dele: aquela parte que diz respeito às características e
funcionamento do(s) gênero(s), segundo as teorias e os
saberes práticos correntes, ao conjunto de princípios de
ensino-aprendizagem adotados e aos possíveis objetivos de
ensino a serem selecionados para compor os módulos de
ensino. (ROJO, 2013a, p. 190)

Assim, para essa pesquisa, criou-se um protótipo por meio do software


IBooks Author, ou seja, a estrutura do MDDI, e elegeu-se como tema os
consensos e controvérsias a respeito do aquecimento global. O foco do
protótipo em questão, devido às condições de realização desta pesquisa, foi a
leitura e não a análise de gêneros. Tanto a primeira parte do material quanto a
segunda são compostas por acervos de textos (reportagens, notícias, artigos
de opinião e artigo de divulgação científica), infográficos, imagens, galerias de
charges, vídeos e exercícios dissertativos que envolvem a interpretação de
textos em gêneros em modalidades diversas (texto escrito, imagem e vídeo) e
sua relação uns com os outros (ver Figuras 4, 5, 6 e 7).
A diferença entre as partes do material reside na temática. A primeira
metade do material didático sustenta a veracidade do aquecimento global

 
  82  
 

enquanto a segunda desconstrói tal verdade. A seção final do MDDI é


dedicada a produção de textos em gêneros como dissertação, carta de leitor e
postagem no Tumblr, embasada nas discussões previamente realizadas (ver

Figura 4: Reportagem e infográfico interativo presentes na primeira seção do MDDI

Figura 5: Galeria de charges, reportagem e infográfico da primeira seção do MDDI

Figuras 8 e 9).

 
  83  
 

 
  84  
 

Figura 6: Trecho de documentário, imagem interativa e atividade da segunda seção do MDDI

Figura 7: Atividades da primeira seção do MDDI

 
  85  
 

Figura 8: Seção de produção de textos em gêneros (dissertação) do MDDI

Figura 9: Seção de produção de textos em gêneros (carta do leitor e Tumblr) do MDDI

 
  86  
 

O MDDI em questão ainda oferece a possibilidade de acesso à internet


por meio de links presentes ao longo das seções (ver Figura 6 e 8), consulta a
dicionário, recursos organizacionais (grifar partes do material ou anexar notas
em qualquer lugar do MDDI) e um glossário que deve ser construído pelo
desenvolvedor do material. As palavras pertencentes a esse glossário ficaram,
no MDDI em questão, na cor verde (ver Figuras 8 e 9) e podem ser acessadas
a partir de um simples toque que abrirá um pop-up. Para este material didático,
o glossário foi construído para assessorar o aluno a entender as características
dos gêneros solicitados na seção de produção textual, apresentando, além da
definição, exemplos de textos no gênero em questão.

3. A observação como metodologia de pesquisa

São muitas as orientações filosóficas e tendências epistemológicas que


se inscrevem no campo qualitativo de pesquisa. Dentre as principais delas,
encontram-se a entrevista, a história de vida, o testemunho, a análise do
discurso, o estudo de caso e a observação participante. Tais orientações e
tendências qualificam as pesquisas como pesquisa clínica, participativa,
etnográfica, participante, pesquisa-ação, teoria engendrada (grounded theory)
e estudos culturais (CHIZZOTTI, 2013, p. 222).
A pesquisa qualitativa adota multimétodos de investigação para o estudo
de um fenômeno situado em um lugar específico e procura tanto encontrar o
sentido desse fenômeno quanto interpretar os significados que as pessoas dão
a ele (CHIZZOTTI, 2013, p. 221). Assim, após a coleta de dados para este
trabalho, procuramos entender, por meio da intepretação desses dados
coletados, quais foram os impactos da utilização de materiais digitais
interativos para tablets, considerando nessa interpretação a perspectiva dos
alunos envolvidos na pesquisa e também a do professor, no caso, o
pesquisador.
A compreensão do conceito de observação participante, metodologia
utilizada neste trabalho, requer, em primeiro lugar, uma conceituação prévia da
metodologia de observação, que pode ser definida como

 
  87  
 

um do métodos de pesquisa mais importantes de coletas de


dados. Em tal metodologia, o instrumento primário de pesquisa
é o próprio pesquisador que, conscientemente, coleta dados
sensoriais por meio da visão, audição, gosto, cheiro e tato em
um campo específico. (JONES; SOMEKH, 2005, p.138,
tradução nossa)55

Segundo, Vianna (2003, p. 16-17), os procedimentos de observação são


geralmente classificados ao longo de cinco dimensões:
• observação oculta e observação aberta ― isto é, definidas segundo com
a ciência ou não do observado;
• observação não-participante e observação participante ― definidas
segundo a participação ou não do pesquisador no campo a ser
observado;
• observação sistemática e observação não-sistemática ― neste caso,
são definidas de acordo com o estabelecimento prévio de um roteiro de
observação ou não;
• observação in natura e observações artificiais (laboratório);
• auto-observação e observação de outros.

As dimensões apontadas por Vianna se materializam nesta pesquisa da


seguinte forma: utilizaremos a observação aberta de duas aulas ministradas
para o segundo ano do Ensino Médio de uma escola privada da região de
Sorocaba. O pesquisador participa da observação, pois é o professor na aula a
ser observada e a observação não é sistemática.
É importante ressaltar que, embora esta pesquisa se utilize de
observação participante, esta não se caracteriza como uma pesquisa
etnográfica, mas sim como uma observação de sala de aula. Dessa forma,
devido ao fato de esta pesquisa situar-se num contexto escolar, muitas das
práticas cânones da metodologia da observação participante não são eficazes
e precisaram ser adaptadas. Discorreremos mais sobre essa questão no tópico
A observação em sala de aula.

                                                                                                               
55  “In observation the primary research instrument is the self, consciously gathering sensory
data through sight, hearing, taste, smell and touch. By various means of record-keeping, traces
of those impressions are stored for careful scrutiny and analysis after the event.”

 
  88  
 

3.1. A observação participante

Segundo Tedlock (2005, p. 467), a observação participante foi criada em


fins do século 19 como um método de campo etnográfico para o estudo de
culturas homogêneas e localizadas. Durante o processo de observação,
esperava-se que os etnógrafos vivessem em uma determinada sociedade por
um período de tempo, geralmente dois anos, ao longo dos quais participariam
ativamente da comunidade em questão. Eles vivenciariam as alegrias e
tristezas de um povo como forma de obtenção de material para estudos
científicos sociais.
Pesquisas de observação participante, de acordo com Erickson (1985),
envolvem tempo intensivo e longo de interação no campo de pesquisa, registro
cuidadoso ― escritos ou em outras modalidades ― e preciso dos
acontecimentos, além de análise posterior minuciosa dos dados coletados.
Erickson ainda afirma que os métodos de trabalho de campo são
considerados, muitas vezes, radicalmente indutivos, mas ele considera tal
caracterização equivocada, pois, apesar de algumas categorias específicas
para observação não serem determinadas previamente ao início da
observação, o pesquisador sempre identifica suas questões de pesquisa antes
de adentrar o campo escolhido. No campo de pesquisa, indução e dedução
estão em constante diálogo. Como resultado disso, o pesquisador busca linhas
de investigação enquanto estiver observando, muito embora os termos
específicos de investigação possam mudar em decorrência dos eventos
observados. Os termos específicos de investigação também podem ser
reconstruídos em resposta às mudanças das percepções e de entendimento
dos eventos e de sua organização durante o tempo passado no campo (p.121).
Para métodos interpretativos que utilizam observação participante, o
autor estabelece alguns critérios que os tornam mais adequados. Para
exemplificar cada um dos critérios estabelecidos, Erickson utiliza uma pesquisa
hipotética sobre a evasão de professores da profissão docente. Os critérios
apresentados são os seguintes:

 
  89  
 

• A estrutura das ocorrências em vez de seu caráter geral e da


abrangência de sua distribuição. Para exemplificar tal tópico, o autor
lança as seguintes perguntas: O que a decisão de deixar a carreira
docente significa para professores que assim o decidem? Quais são os
acontecimentos no campo observado que o tornam singular em relação
a outros lugares? Nesse caso, se a pesquisa indicasse que o índice de
evasão de professores é menor em um determinado lugar, o
pesquisador deveria primeiramente investigar as causas dessa evasão
nesse lugar determinado antes de investigar outros lugares com taxas
médias de evasão de professores.
• Quais as perspectivas e significados de indivíduos específicos e eventos
específicos. Ao retomar o exemplo do tópico anterior, Erickson
exemplifica esse critério da seguinte forma: Quais, especificamente,
foram os pontos de vista dos professores quando tomaram a decisão de
abandonar a carreira docente?
• Os lugares em que ocorrem naturalmente pontos de contrastes que
podem ser observados como experimentos naturais quando o
pesquisador é incapaz de, em termos logísticos ou éticos, encontrar
condições experimentais de consistência de intervenção e controle
sobre outras influências exercidas sobre o campo. Ou seja, ainda
considerando o exemplo de evasão da carreira docente, o pesquisador
não pode criar condições que influenciem o professor a abandonar sua
carreira nem forçá-lo a querer fazê-lo.
• A identificação das ligações de causas específicas que não são
identificadas por métodos experimentais e o desenvolvimento de novas
teorias acerca de causas e de suas influências sobre os padrões que
são identificados nos dados de pesquisa ou experimentos.

O autor também elabora cinco perguntas (p. 121) que, se respondidas,


podem tornar o trabalho de observação em campo mais eficaz. Segundo ele,
as questões centrais a serem consideradas em tal modalidade de pesquisa
são:
• Quais eventos no âmbito social ocorrem no campo a ser observado?

 
  90  
 

• O que esses eventos significam aos indivíduos neles envolvidos no


momento em que ocorrem?
• Como esses eventos estão situados nos padrões de organização social
e nos princípios culturalmente aprendidos para a conduta da vida
cotidiana?
• Como os eventos ocorridos no campo de observação estão relacionados
com outros ambientes internos e externos ao campo em questão? No
caso de a pesquisa ser realizada em uma escola, como o observado
nessa escola se relaciona com a comunidade escolar, o âmbito familiar,
com outras escolas da região e com o sistema nocional de educação?
• Como a estrutura cotidiana do campo de observação é organizada em
comparação como outras estruturas organizacionais da vida social
situadas em outros lugares e outros tempos?

Erickson justifica a necessidade de, em pesquisas educacionais,


responder aos questionamentos acima elencados mediante cinco argumentos.
O primeiro deles relaciona-se à invisibilidade da vida cotidiana. Tal
invisibilidade é decorrente da familiaridade do cotidiano, fator que leva pessoas
a não atentarem aos padrões de suas decisões e ações. Para ilustrar tal
argumento, Erickson cita a frase do antropóloga Clyde Kluckhohn: o peixe será
a última criatura a descobrir a água. Para pesquisas que envolvem
especificamente a observação de sala de aula, é preciso que o pesquisador
torne o familiar em algo estranho e interessante. Dessa forma, o que era
invisível passa a ser visível, e pode ser observado e documentado
sistematicamente.
O segundo argumento de Erickson reside na necessidade de, por meio
da análise dos dados recolhidos, buscar detalhes significativos nos eventos
observados. Apenas dessa forma será possível compreender, por exemplo, os
acontecimentos em sala de aula de forma eficaz.
Considerar quais significados os eventos observados têm para os indivíduos
participantes também é crucial para se obter bons resultados em uma pesquisa
de observação participante, e esse é o terceiro argumento defendido pelo

 
  91  
 

autor. Segundo ele, acontecimentos triviais ocorridos constantemente em salas


de aula adquirem significados distintos em cada caso específico.
Uma quarta razão para os cinco questionamentos centrais consiste na
necessidade de uma compreensão comparativa de diferentes campos, pois, ao
se considerar a relação entre um campo e seu amplo contexto social,
consegue-se entender de forma mais clara os eventos observados.
Por fim, o autor, apresenta o argumento a respeito da importância de se
entender e considerar o que se observa em um campo além das circunstâncias
de observação, evitando generalizações. Conhecer, por exemplo, a respeito da
organização escolar em outras sociedades, em outros tempos e mesmo o
conhecimento de outros âmbitos além do escolar amplia as possibilidades para
conceituar ensino e aprendizagem. Dessa forma, os eventos observados em
um campo especifico são colocados sob nova luz, o que pode impactar os
resultados obtidos pelo pesquisador (p.122).

3.2. O olhar do pesquisador

Jones e Somekh (2005, p.138), afirmam que um dos problemas óbvios


ao aplicar essa metodologia reside na enorme complexidade do
comportamento humano, seja ele em grupo ou individual, e na impossibilidade
de fazer um registro completo de todas as impressões do pesquisador. Os
autores ainda atentam ao fato de, somado a essa dificuldade, encontrar-se a
subjetividade do pesquisador que, ao mesmo tempo em que coleta dados
sensoriais, está ativamente engajado em atribuir significados às impressões e
interpretar os comportamentos e eventos observados.
A forma como o pesquisador entende o “ser no mundo” (ontologia) e a
natureza do conhecimento (epistemologia) irão, fundamentalmente, moldar
tanto o processo de observação quanto a análise dos dados coletados
(JONES; SOMEKH, 2005, p. 141). Ou seja, o que é observado é determinado
em grande parte por como o pesquisador vê o mundo e seu lugar nele. Assim,
é possível afirmar que, tanto o processo quanto os resultados de uma pesquisa
observacional estarão indissociavelmente atrelados à visão de mundo
(positivista, behaviorista, desconstrutivista) do pesquisador.

 
  92  
 

3.3. Recursos tecnológicos auxiliares

Com respeito ao uso de recursos tecnológicos, Jones e Somekh


ressaltam o fato de que gravação de áudio ou de vídeo alguma pode substituir
a necessidade de se fazer anotações de campo, pois a tecnologia mantém
apenas um registro parcial dos eventos. A sensibilidade do pesquisador diante
das nuances de significado e interpretação são sempre essenciais para a
observação (JONES; SOMEKH, 2005, p. 141).

Os autores enumeram os seguintes recursos tecnológicos como


auxiliares em pesquisas de observação:

• Gravações e transcrições de vídeo;


• Gravações e transcrições de áudio;
• Imagens estáticas (fotografia).

Ainda segundo Jones e Somekh, as transcrições feitas a partir de


gravações de vídeos ou áudios são extremamente trabalhosas, mas rendem
dados excelentes para análise quando aliados às percepções de campo e
sensibilidade do pesquisador .No nosso caso, os recursos e instrumentos
utilizados nas coletas foram:

• O MDDI elaborado e suas propriedades intrínsecas;


• A gravação de tela da navegação dos alunos-piloto pelo MDDI em seus
tablets;
• A filmagem das aulas ministradas pelo professor-pesquisador, a partir de
dois ângulos diversos;
• Notas de campo; e
• Questionário de avaliação pelos alunos do uso do tablet e do material da
unidade de ensino.

 
  93  
 

3.4. O processo de observação

Vianna (2013, p. 30) lembra que é necessário se estabelecer um


processo de observação. De acordo com o autor, esse processo pode ser
estruturado da seguinte forma:

• definição dos objetivos da pesquisa;


• escolha do grupo de indivíduos a ser observados;
• legitimação da presença do pesquisador diante do grupo a ser
observado;
• obtenção da confiança dos observados;
• observação e registro dos eventos no campo escolhido;
• gerenciar possíveis crises que possam ocorrer entre os indivíduos e o
observador;
• saber retirar-se do campo de observação;
• analisar os dados; e
• elaborar um relatório sobre os elementos obtidos.

No nosso caso, legitimação de presença, obtenção de confiança e


retirada de campo não são pontos pertinentes, na medida em que o
pesquisador é também professor da turma e que a matéria ministrada por meio
do MDDI é integrante do currículo regular. Quanto aos demais pontos
levantados pelos autores, todos encontram-se abordados ao longo do estudo.

3.5. O impacto sobre o observado e questões éticas


 
Observadores sempre têm algum tipo de impacto sobre aqueles que são
observados. Estes podem tornar-se tensos, ter um forte senso de estar em
uma performance ou mesmo se sentirem fiscalizados. Tais efeitos negativos
podem ser atenuados se ficarem claros os propósitos da observação, os usos
que serão feitos dos dados coletados e quais pessoas terão acesso a eles.
Fundamentalmente, todos os tipos de observação envolvem invadir o espaço
de outras pessoas e construir significados das experiências de participação em

 
  94  
 

suas atividades. Devido a esse caráter invasivo da observação, é preciso


buscar um consentimento dos participantes e negociar um código de prática
que defina questões como a posse e uso dos dados (JONES; SOMEKH, 2005,
p. 141). Portanto, nesta pesquisa, foram elaborados e assinados Termos de
Consentimento que dão base a um protocolo de ética entre pesquisador-
pesquisados (ver Anexo 2).

3.6 A observação em sala de aula

Ainda que a observação seja parte integral do repertório de pesquisa da


etnografia, segundo Dornyei (2009, p.176-177), quando utilizada em sala de
aula, tende a considerar apenas alguns aspectos específicos concernentes ao
método.
O autor ainda salienta que, embora as salas de aula constituam um
contexto distinto para pesquisa, muitas das práticas metodológicas não são
únicas para tal campo. Entretanto, tal ambiente é o campo primário de
pesquisa da Linguística Aplicada e tem grande influência sobre como se
conduz uma investigação. Isso não significa, segundo o autor, que tudo em
ambientes de salas de aula seja peculiar, mas, ainda assim, há três aspectos
únicos que requerem especial atenção:

• o método de pesquisa de observação de sala de aula é uma abordagem


avançada de coleta de dados típica para examinar ambientes de
aprendizagem.
• o uso de muitos métodos de pesquisa mistos, inclusive a combinação de
metodologias quantitativas e qualitativas, por pesquisadores de sala de
aula na tentativa de entender a complexidade do eventos ocorridos
nesse ambiente.
• fazer pesquisa de sala de aula envolve desafios especiais, pois há
dificuldades inerentes às investigações de sala de aula. Tais
dificuldades, que raramente são contempladas pelos manuais de
pesquisa, podem ser exemplificadas pela existência de diferentes
necessidades e padrões por parte do pesquisador e por parte da escola

 
  95  
 

e do professor; volatilidade do corpo estudantil; questões relacionadas a


tempo, não apenas o consumido durante a coletada dos dados, mas
também aquele utilizado na análise dos dados e em encontros e
conversas com diretores, coordenadores e pais; dificuldades eventuais
no relacionamento do pesquisador com professor e alunos; eventos
inesperados e interrupções; impacto negativo da presença do
pesquisador no ambiente de sala de aula e dificuldades técnicas e éticas
(p. 188-190).

Em razão dessas especificidades do campo de pesquisa em questão,


Dornyei (2009) considera a observação de sala de aula como uma pesquisa
não etnográfica e não experimental. Em consonância com a afirmação de
Dornyei, Cardoso e Penin (2009) afirmam que
a pesquisa de observação de sala de aula também não precisa
ter compromissos rígidos com alguns conceitos e métodos que
são canônicos para a antropologia. Por exemplo, o
estranhamento do familiar, que é fundamental para a pesquisa
antropológica, não é necessariamente uma condição de êxito
da pesquisa de observação de sala de aula. O problema do
estranhamento existe para os antropólogos desde que estes
deixaram de se dedicar exclusivamente às culturas que lhes
parecem exóticas e passaram a observar também as culturas
urbanas nas quais eles próprios estão inseridos. (CARDOSO;
PENIN, 2009, p. 116)

Os autores justificam não haver necessidade do estranhamento do


familiar, pois as experiências profissionais vividas pelo pesquisador não são
obstáculos à análise do campo. Ao contrário disso,

o confronto das experiências e vivências do pesquisador com


as do contexto de campo pode ser um elemento positivo para
observações mais argutas a respeito da sala de aula. Essas
experiências e vivências não são uma parte da subjetividade
do pesquisador que precisaria ser subtraída. Em vez de
eliminá-la, o pesquisador precisa dela para adquirir consciência
e eventualmente explicitá-la aos atores de campo com o intuito
de administrá-la. (CARDOSO; PENIN, 2009, p. 117)

 
  96  
 

4. Método de análise dos dados


 
A análise do contexto de aplicação da aula mediada por MDDI e tablets,
ou seja, os aspectos socioculturais, técnicos e infraestruturais da escola, será
feita por meio da verificação de sua influência ao longo do processo de
preparação e aplicação das aulas lecionadas. Quanto à análise da interação
individual dos alunos com o tablet, registrada por meio da gravação das telas
dos dispositivos em uso, esta será feita por meio da criação de diagramas que
retratam o passo a passo da interação dos alunos com o MDDI, ou seja, o
caminho percorrido na leitura do material e o tempo dedicado a cada etapa.
Busca-se, nessa parte da análise, verificar quais textos são priorizados, quais
caminhos são feitos ao longo da leitura do MDDI e também quais recursos do
MDDI e do dispositivo móvel são utilizados pelos alunos.
Finalmente, a análise da aula será feita por meio do subsídio teórico
descrito no capítulo 2. A partir da investigação da aula registrada em vídeo,
buscaremos analisar a estruturação da aula aplicada como um sistema de
atividade e de gêneros com base em Bazerman (2005) e Rojo (2007). Além
disso, analisaremos se os aspectos referentes à interlocução estabelecida em
sala de aula e às interações nas instâncias da aula (professor-alunos) e na
instância do exercício (alunos-material didático) presentes na aula
intermediada por MDDI e tablets são os mesmos que as verificadas por Batista
(1997) em uma aula tradicional com base em material impresso. Ainda com
relação à interação, faremos considerações sobre como ela se dá entre os
próprios alunos, considerando que as tecnologias e materiais utilizados, em
tese, favorecem a colaboratividade.
Tais categorias proporcionadas por Batista, Rojo e Bazerman serão
organizadas nos planos de análise estabelecidas por Rogoff (1995). No plano
institucional/comunitário, faremos análise do contexto sociocultural em que a
aula foi ministrada, da influência na aula da infraestrutura tecnológica
disponível e o uso tecnologias disponíveis na instituição, da estruturação da
aula dada, bem como do MDDI. No plano interpessoal, será feita a análise da
interação entre professor-aluno e alunos-MDDI. Por fim, embora não seja o
foco da pesquisa em questão, no plano pessoal, com base em notas de

 
  97  
 

campo, faremos breves considerações acerca do processo de participação dos


alunos nas atividades realizadas durante e após a aula ministrada.
 

 
  98  
 

CAPÍTULO 4 – ANÁLISE DE DADOS


 

1. Organização da análise
 
A análise e interpretação dos dados desta pesquisa será
organizada a partir dos planos de análise e de seus respectivos processos de
desenvolvimento sugeridos por Rogoff (1995). Assim, ao sistematizar os
objetos de análise nesses planos, temos a seguinte organização:

Planos de análise/processo de
Objetos de análise
desenvolvimento
* Contexto sociocultural em que as aulas foram
ministradas;
Plano institucional ou
* Infraestrutura tecnológica disponível;
comunitário/aprendizibilidade
* Material didático digital interativo;
* Estrutura das aulas ministradas.
* Interação entre professor e alunos durante as aulas;
Plano Interpessoal/participação guiada * Interação entre alunos e material didático digital
interativo em momento prévio à aula.
* Breves percepções sobre o desempenho dos alunos
ao longo de atividades durante as aulas com base em
notas de campo;
Plano pessoal/apropriação participatória
* Breves percepções sobre Desempenho dos alunos
em atividade após as aulas com base em notas de
campo.

Tabela 1: Organização da análise dos dados

Embora, ao longo da análise, o foco recaia sobre algum dos planos, é


importante reforçar que todos os eles são mutuamente constitutivos da
atividade sociocultural. Dessa forma, os planos não podem ser considerados
de forma separada ou hierárquica, mas como diferentes núcleos que
constituem a atividade sociocultural como um todo. Para entendimento de cada
plano, é necessário considerar os demais. Quando há distinção entre eles, o
objetivo, nesse caso, é elucidar aspectos para uma discussão sobre processos
específicos de um plano que compõe tal atividade como um todo. Ainda assim,
mantêm-se os demais planos de análise como aspectos presentes, embora
secundários, na discussão, mas nunca separados. Portanto, todo o processo
de análise será desenvolvido considerando a mútua constituição dos planos na
atividade sociocultural.

 
  99  
 

2. Análise do plano institucional ou comunitário


 
O foco do plano institucional ou comunitário está em reconhecer que
esforços empregados em uma atividade sociocultural, em nosso caso uma aula
de Produção e Interpretação Textual, envolvem propósitos – que são
determinados em termos institucionais ou comunitários; limites culturais;
recursos; valores relacionados ao que é apropriado para alcançar o objetivo
visado e as ferramentas culturais disponíveis. Assim, essa seção objetiva
descrever e analisar o contexto institucional em que se aplicou a pesquisa bem
como as tecnologias nele disponíveis.

2.1. O contexto sociocultural

A pesquisa em questão foi conduzida em um núcleo específico de um


colégio particular tradicional da região de Campinas. Embora essa escola
tivesse seu currículo voltado para a aprovação em grandes vestibulares, o
núcleo em questão visava, nas palavras de um de seus coordenadores 56 ,
“construir uma concepção de educação inovadora e disruptiva” em relação à
estrutura educacional tradicional vigente. Entretanto, essa concepção não
havia sido, de fato, pautada em práticas pedagógicas situadas num novo ethos
ou no conceito de multiletramentos, por exemplo, mas, sim, em marketing. O
colégio, por meio da criação desse núcleo de ensino, havia sido o primeiro na
região a aderir ao uso de tablets e, por isso, vendia seu produto propagando a
ideia de que o simples uso dos dispositivos móveis em sala de aula garantiria
uma melhoria no aprendizado e uma educação moderna. Como consequência
dessa inserção de novas tecnologias sem planejamento ou fins pedagógicos,
criou-se um núcleo com diretrizes pedagógicas vazias, em que professores não
sabiam ao certo o que ensinar e/ou como conduzir sua prática docente de
forma a fornecer aos alunos a prometida educação diferenciada. Esses
problemas, na verdade, originavam-se na dificuldade em definir o que seria
essa educação inovadora. Assim, percebeu-se, na prática, a manutenção do
                                                                                                               
56
A contextualização do núcleo em que se realizou a pesquisa foi feita com base em entrevista
com um de seus coordenadores e na experiência docente do pesquisador ao longo do tempo
em que ali atuou.

 
  100  
 

currículo definido pela apostila utilizada nas demais unidades e núcleos do


colégio em questão nesse núcleo dito inovador. Além disso, o tablet tornou-se
apenas um leitor de textos, visto que as apostilas eram disponibilizadas
digitalmente, ou seja, inseriu-se a tecnologia, mas mantiveram-se as mesmas
práticas situadas no letramento da letra, tangenciando a lógica fordista de
educação ― aquela em que a leitura e escrita, por exemplo, segundo Cope e
Kalantzis, são trabalhadas superficialmente e a disciplina se demonstra pela
mera reprodução de informações em avaliações, pela “regurgitação de
verdades rigidamente definidas” (KALANTZIS; COPE; HARVEY, 2003, p. 16),
e, portanto, distante de um novo ethos.
Embora, ao ficarem evidentes as lacunas pedagógicas na concepção e
aplicação do projeto, mudanças tenham sido feitas para tentar entender e
fornecer a educação inicialmente prometida aos alunos, quando, de fato,
passou-se a adotar práticas educacionais que se distanciavam da apostila, a
comunidade escolar e os próprios alunos passaram a olhar o núcleo com
desconfiança. Isso ocorreu porque a concepção de educação compartilhada
por aquela comunidade era a vigente, ou seja, uma educação que garanta ao
aluno um bom desempenho no vestibular e, consequentemente, o ingresso em
uma universidade pública. Mesmo ao longo das aulas, uma pergunta
recorrente dos alunos era se o que estava sendo estudado seria cobrado no
vestibular. Tal concepção entra diretamente em conflito com aquela que rege
práticas situadas em novo ethos ou com uma pedagogia para os
multiletramentos.
A despeito das adequações rumo a práticas de ensino colaborativas e
tentativas de implementação de projetos relacionados à curadoria de
informações e trabalhos com produção de material multissemiótico em mídias
distintas, o núcleo em questão foi, após três anos, descontinuado, sob a
justificativa de não gerar lucros suficientes. Tal experiência poderia ser
resumida pela afirmação

Poderíamos dizer, parafraseando o título de um conhecido


trabalho de Cuban (1993), que os computadores entram em
choque com a realidade das escolas e que, como resultado
desse choque, a realidade das escolas vence. (COLL; MAURI;
ONRUBIA, 2010, p. 74)

 
  101  
 

Nessa citação, é possível expandir o termo “computadores” para as


transformações sociais promovidas pelas novas tecnologias e os novos
paradigmas por elas estabelecidos. Diante de uma concepção utilitarista de
educação, cuja máxima reside no decorar saberes para reproduzi-los
posteriormente em situações artificiais, não é possível pensar em novas
estruturas educacionais compatíveis com uma realidade cada vez mais oposta
a essa lógica consolidada de educação.

2.2. Infraestrutura tecnológica e usos das tecnologias na prática docente

Além de contextualizar a infraestrutura tecnológica do local em que a


pesquisa foi realizada, nesta seção, faremos uma breve análise da influência
da proficiência de uso de tecnologias pelo professor em sua prática docente e
de problemas tecnológicos que podem atrapalhar ou inviabilizar o trabalho com
o MDDI com base na aula lecionada.

2.2.1. Infraestrutura tecnológica

O núcleo de ensino em questão possuía conexão sem fio à internet de 10


megabytes disponível para uso irrestrito de alunos e professores. Além disso,
tanto docentes quanto discentes utilizavam tablets da marca Apple, iPad,
cedidos pela escola. As salas eram equipadas com lousa digital e Apple TV,
dispositivo que permite espelhamento em tempo real na lousa digital da tela e
do som do iPad, sem necessidade de cabos. Estavam também à disposição
para uso laboratórios de informática com computadores de mesa. Além de
fornecer a estrutura tecnológica, a escola dispunha de uma equipe técnica em
tempo integral para auxiliar professores na instalação e uso dos equipamentos
sempre que fosse necessário.

2.2.2. Usos das tecnologias na prática docente  

Ao se trabalhar com a confecção de MDDI, é preciso definir se o


material didático será estruturado apenas por meio de links ou se textos e

 
  102  
 

mídias estarão nele contidos. No primeiro caso, ao longo de todo o processo


de navegação, o material conduz o aluno para sites na internet que contenham
os textos, vídeos, imagens a serem utilizados durante a aula. A vantagem
desse tipo de estruturação de MDDI se relaciona ao tamanho reduzido do
arquivo e, portanto, à facilidade de os alunos baixarem o material em seus
dispositivos móveis sem se preocuparem com restrições de espaço de
armazenamento. Por outro lado, para utilizar essa estruturação de MDDI, é
preciso ter certeza de que a velocidade de conexão suportará toda uma turma
de alunos acessando à internet simultaneamente.
Além disso, eventuais quedas e/ou indisponibilidade de conexão podem
inviabilizar o trabalho com o material em questão. Justamente por isso, embora
a velocidade da internet da escola em que a pesquisa foi aplicada estivesse
acima da média nacional de 2 megabytes segundo o Cetic 2014, quedas e
intermitência eram comuns. Assim, optamos por utilizar a estrutura de MDDI
em que todo conteúdo estivesse nele contido. Essa escolha gerou alguns
problemas relacionados ao grande espaço de armazenamento necessário
(cerca de 1 gigabyte) e, consequentemente, à dificuldade em distribuir o
material. Como não era possível baixar o arquivo na escola, pois a velocidade
de download não era adequada, os alunos foram orientados a fazê-lo em suas
residências. No dia da aula, alguns alunos não tinham o MDDI em seus tablets
e, por isso, foi preciso reservar parte da aula para fornecer o arquivo via cabo a
eles.
Embora a escola fornecesse os tablets, ela não os repunha ou
consertava em caso de perda ou dano. Assim, dois dos alunos não dispunham
do iPad, mas de outras marcas com softwares não compatíveis com o formato
do MDDI (.ibooks). Além disso, iPads que não estavam atualizados na versão
necessária do sistema operacional do dispositivo, ou mesmo a versão mais
atual do aplicativo iBooks, necessária para rodar o MDDI, não puderam
executá-lo. O problema da compatibilidade de softwares remete à questão
analisada por Ching, Shuler, Lewis e Levine (2009), sobre a dificuldade de
trabalho com dispositivos móveis em sala de aula devido à restrição por
compatibilidade e ao número limitado de aplicativos educacionais
multiplaforma. Além disso, a situação descrita e a análise dos autores elucida

 
  103  
 

limitações à proposta da Unesco Bring you own device (BYOD), exposta no


documento Futuro da aprendizagem móvel: implicações para planejadores e
gestores de políticas, que sugere que alunos tragam seus próprios dispositivos
móveis para a escola e que os professores os utilizem em parte das práticas de
ensino.
Mesmo com todos os textos e mídias contidos no MDDI, era necessário,
em alguns momentos, que os alunos fizessem pesquisas na internet. Além
disso, para projeção da tela do tablet do professor na lousa digital, visando
orientar a condução da aula, era necessário estar conectado à internet.
Entretanto, logo no início da aula, a conexão foi interrompida e mesmo o setor
técnico da escola não pôde resolver o problema. Foi possível, então, criar uma
conexão à internet para continuar a aula por meio do compartilhamento da
conexão 3G do celular de um aluno, que configurou o aparelho para rotear sua
internet. Situações como essa mostram a necessidade de professores e alunos
saberem utilizar as tecnologias de forma a criar meios para que, diante de
imprevistos, seja possível continuar a aula com o uso da tecnologia nos casos
em que ela é fundamental, como no caso do uso dos MDDI.

2.3. O material didático digital interativo


 
O material digital interativo foi criado para a disciplina de Produção e
Interpretação Textual. Sua concepção visava o trabalho com multiletramentos e
novos letramentos a partir de materiais de divulgação científica.
O material didático foi pensado para contrapor discursos científicos
contrastantes acerca de um mesmo assunto, por meio de leitura e
interpretação de textos em gêneros escritos e multissemióticos. Para isso,
elegeu-se como temática o fenômeno do aquecimento global. Ao longo de três
seções distintas, o MDDI caracteriza o fenômeno e amplia a discussão para
questões como o papel dos veículos de comunicação na construção do
discurso científico e a influência de fatores políticos, ideológicos e econômicos
nesse discurso. Por fim, o material apresenta três sugestões de produção
textual. É possível sistematizar os objetivos pedagógicos gerais do MDDI da
seguinte forma: (a) compreender o fenômeno do aquecimento global e as

 
  104  
 

variáveis que o envolvem; (b) analisar por meio desse fenômeno temáticas de
espectro mais amplo, tais como a neutralidade científica e o papel da mídia na
divulgação científica; (c) ler, analisar, interpretar e produzir textos em gêneros
escritos e multissemióticos. Para que se alcançasse os objetivos gerais, cada
uma das partes das seções apresentava objetivos pedagógicos específicos.
Nas tabelas a seguir encontra-se a descrição de todo o material quanto
a seus objetivos, gêneros que o compõem, sistema semiótico em que esses
gêneros se enquadram e as modalidades de linguagem presentes. Nele, há
especificações quanto aos títulos dos textos presentes no material para
orientar análises posteriores.
Gêneros que compõem a parte da
Parte da Seção Objetivos pedagógicos Sistema semiótico Modalidades
seção
*&Animação&curtametragem& *&Verbal;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Escrita;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
1.&Contextualizar&o&aquecimento&global,&definindo:
(vídeo&introdutório);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Visual. *Imagem&estática&
o,&analisando&suas&causas,&consequências&presentes&
*&Reportagem&(fatos&do& (desenhos,&pictogramas,&
e&futuras;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
aquecimento);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& fotografias&e&imagens&
2.&Identificar&recursos&linguísticos&e&demais&recursos&
*&Infográfico&(infográfico&1&e& computadorizadas);&&&&&&&&&&&&&&&&&
em&outras&semioses,&tais&como&diagramação,&
infográfico&2);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& *&Imagem&em&movimento&
escolha&de&imagens&e&cores&(em&infográficos&e&
*&Charges;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& (imagens&
charges),&que&constroem&o&caráter&de&verdade&
Fatos&do&aquecimento *&imagens&ilustrativas&da& computadorizadas).
incontestável&das&informações&apresentadas&pelos&
temática&da&parte&da&seção.
gêneros&que&compoem&a&parte&da&seção;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
3.&Analisar&e&interpretar&uma&reportagem;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
4.Analisar&e&interpretar&&infográficos;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
5.&Analisar&e&interpretar&charges;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
6.&Analisar&os&efeitos&de&sentido&construídos&pelas&
imagens&ilustrativas&da&parte&da&seção.

*&Questão&escolar;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Verbal;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Escrita;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
1.&Relacionar&o&conceito&de&adaptação,&da&Biologia&
*&Glossário;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Visual;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Imagem&em&movimento&
evolutiva,&ao&processo&de&aquecimento&global&
*&Vídeo:propaganda. *&Musical. (imagens&
motivado&pela&ação&predatória&do&homem;&&&&&&&&&&&&&&
Atividades&Seção&1&:&1 computadorizadas);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
2.&Analisar&e&interpretar&uma&vídeo:propaganda,&
*&Música&criada&por&
considerando&os&sietemas&semióticos&que&a&
Seção&1&:&O&aquecimento&global

computador.
compõem&(verbal,&visual,&músical).

*&Texto&explicativo&(CO2&=& *&Verbal;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Escrita;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
1.&Compreender&os&processos&de&produção&de&CO2& calor);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Visual. *&Imagem&estática&
CO2&=&Calor e&seus&impactos&no&meio&ambiente;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& *&Infográfico&(infográfico&3).& (imagens&
2.&Analisar&e&interpretar&um&infográfico. computadorizadas,&
gráficos&e&diagramas).
1.&Compreender&o&processo&de&tentativa&de& *&Texto&explicativo& *&Verbal;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Escrita;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
construção&de&um&discurso&científico&incontestável;& (Introdução&ao&artigo&Mitos& *&Visual. *Imagem&estática&
2.&Identificar&os&recursos&utilizados&para&a&tentativa& do&aquecimento);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& (fotografias&e&imagens&
de&construção&de&um&discurso&científico& *&Artigo&de&divulgação& computadorizadas);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
incontestável;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& científica&(Mitos&do& *Imagem&em&movimento&
Mitos&do&aquecimento 4.&Refletir&sobre&os&interesses&que&guiam&a& aquecimento);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& (imagens&
*&Imagens&ilustrativas.
construção&de&um&discurso&científico&incontestável;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&& computadorizadas).&&&&&&&
3.&Analisar&os&efeitos&de&sentido&construídos&pelas&
imagens&ilustrativas&da&parte&da&seção;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
4.&Analisar&e&interpretar&um&artigo&de&divulgação&
científica.
*&Questão&escolar;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Verbal;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*&Escrita;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
1.&Compreender&as&origens&do&CO2&e&sua&relação& *&Animação& *&Visual;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
*Imagem&estática&(imagem&
com&o&aquecimento&global;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
curtametragem(vídeo&1&das& *&Musical. computadorizada);
2.&Analisar&um&curtametragem&animado;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
atividades&2&da&seção1);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
3.&Analisar&e&interpretar&gêneros&(texto&explicativo,& *&Vídeo:propaganda(vídeo&2&
vídeo:propaganda&e&diagrama)&em&sistemas& das&atividades&2&da&seção1);&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
Atividades&Seção&1&:&2 semióticos&distintos&(verbal&e&visual),&estabelecendo& *&Diagrama&(diagrama&eco:
relações&quanto&às&suas&significações&pretendidas;&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&
ego).
4.&Analisar&e&interpretar&uma&vídeo:propaganda&e&
uma&animação&curtametragem,&considerando&os&
sistemas&semióticos&que&a&compõem&(verbal,&visual,&
musical).&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&&

 
Tabela 2: Seção 1 do MDDI.
  105  
 
Gêneros que compõem a parte da
Parte da Seção Objetivos Sistema semiótico Modalidades
seção
1.*Compreender*a*influência*de*fatores*políticos,** **Texto**introdutório*(*A*farsa* **Oral;**********************************************************************************Escrita;*************************************************************************
ideológicos*e*econômicos*na*construção*do* do*aquecimento*global)***********************************************
**Escrita;******************************************************************************************
**Imagem*estática*
discurso*científico*e*em*sua*valoração;*********************************************************************************
**Artigo*de*opinião*(A*farsa* **Visual. (fotografias*e*imagens*
2.*Perceber*a*existência*de*"verdades"*científicas* do*aquecimento);********************************************************* computadorizadas);******************************************************
cotrastantes;**********************************************************************************
**Entrevista*oral*(Jô*Soares* **Imagem*em*movimento*
Contraponto 3.*Identificar*discursos*científicos*marginais;********************************************************************************************************************************
entrevista*o*climatologista* (fotografia).******
3.*Analisar*e*interpretar*um*artigo*de*opnião;******************************************************************************************
Ricardo*Felicio);********************************************************************
4.*Analisar*os*efeitos*de*sentido*construídos*pelas* **Verbete***************************************************************************
imagens*ilustrativas*da*parte*da*seção. **Glossário;***********************************************************************
**Imagens*ilustrativas.

1.*Compreender*o*papel*dos*veículos*de* **Questão*escolar;***********************************************************
**Verbal;*********************************************************************************************
**Escrita;*************************************************************************
comunicação*na*construção*e*disseminação*de* **Reportagem*(O*Guru*do* **Visual. **Imagem*estática*
verdades*científicas;**********************************************************************************
aquecimento*Global);***************************************************************** (fotografias*e*imagens*
2.*Analisar*a*orientação*ideológica*de*um* **Infográfico**Infográfico*4)*;*************************************************************************
computadorizadas).***************************************************
determinado*jornal*impresso*em*relação*ao*
Seção*2*V*Contraponto

aquecimento*global*por*meio*da*observação*da*
abordagem*adotada*para*o*assunto*
Atividades*Seção*2*V*1
(posicionamento*explícito*e*implícito*no*texto,*tom*
da*linguagem,*escolhas*lexicais,*espaço*destinado*
ao*assunto*e*sua*localização*no*jornal);***********************************************************
3.*Contrapor*discursos*científicos*contrastantes;*************************************************************************
4.*Identificar*o*processo*de*reconstrução*de*
verdades*científicas;********************************************************************************************************************************
5.*Analisar*e*interpretar*uma*reportagem;******************************************************************************************
1.*Compreender*a*influência*de*fatores*políticos,** **Texto*explicativo;********************************************************* **Verbal;*********************************************************************************************
**Escrita;*************************************************************************
ideológicos*e*econômicos*na*construção*do* **VídeoVdocumentário*(A* **Visual. **Imagem*em*movimento*
discurso**científico*e*em*sua*valoração;*****************************************************
grande*farsa*do*aquecimento* (fotografia).******
2.*Contrapor*discursos*científicos*contrastantes;********************************************
global);*****************************************
A*Grande*farsa*do* 3.*Analisar*e*interpretar*um*vídeoVdocumentário;********************************************
**Questão*escolar.
aquecimento*global 4.*Refletir*sobre*as*consequências*para*a*sociedade*
de*um*discurso*científico*unilateral*e*incontestável.***

1.*Compreender*a*influência*de*fatores*políticos,** **Textos*explicativos;*********************************************************************************************
**Verbal;*********************************************************************************************
**Escrita;*************************************************************************
ideológicos*e*econômicos*na*construção*do* **Questão*escolar. **Visual. **Imagem*estática*
Notas discurso*científico*e*em*sua*valoração;****************************************************** (imagem*
2.*Refletir*sobre*a*relação*entre*aquecimento*global* computadorizada).******
e*desenvolvimento*sustentável.***
Gêneros que compõem a parte da
Parte da Seção Objetivos Sistema semiótico Modalidades
seção
1."Compreender"o"conceito"de"tirania"de"muitos"do" *"Artigo"de"opinião"(A"tirania" *"Verbal;"""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
*"Escrita;""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
filósofo"John"Stuart"Mill;""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
de"muitos);"""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
*"Visual. *Imagem"estática"(imagem"
2."Relacionar"o"conceito"à"questão"do"aquecimento" computadorizada);
global;""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
3."Analisar"os"efeitos"de"sentido"construídos"pelas"
A"tirania"de"muitos imagens"ilustrativas"da"parte"da"seção.
Seção"3"V"Propostas"de"produção"textual

1."Compreender"a"estrutura,"situação"de" *"Enunciado"de"proposta"de" *"Verbal;"""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""


*"Escrita;""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
comunicacional"e"intenção"de"comunicação"do" produção"textual;"""""""""""""""""""""""""*"Visual. *Imagem"estática"(imagem"
gênero"dissertação"escolar;""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
*"Glossário. computadorizada);
Proposta"de"produção" 2."Relacionar"aquecimento"global,"o"processo"de"
textual"1 construção"e"disseminação"de"verdades"científicas"
e"o"conceito"tirania"de"muitos"de"John"Stuart"Mill.""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
3."Analisar"os"efeitos"de"sentido"construídos"pelas"
imagens"ilustrativas"da"parte"da"seção.
1."Compreender"a"estrutura,"situação"de" *"Enunciado"de"proposta"de" *"Verbal."""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
*"Escrita.""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
comunicacional"e"intenção"de"comunicação"do" produção"textual;"""""""""""""""""""""""""
Proposta"de"produção"
gênero"carta"do"leitor. *"Glossário.
textual"2

1."Construir"um"Tumblr"cujo"acervo"de"informações" *"Enunciado"de"proposta"de" *"Verbal."""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""


*"Escrita.""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""""
Proposta"de"produção"
postadas"sutente"um"ponto"de"vista"específico"na" produção"textual;"""""""""""""""""""""""""
textual"3
discussão"acerca"do"aquecimento"global. *"Glossário.

Tabela 3: Seção 2 e 3 do MDDI.


 
  106  
 

A análise do MDDI a partir das tabelas descritoras revela a preocupação


do material em situar seu trabalho no conceito de multiletramentos, pois é
nítida a variedade gêneros que envolvem múltiplas linguagens e semioses.
Além disso, busca-se caracterizar a pluralidade e diversidade cultural mediante
os posicionamentos distintos que são elucidados pelas discussões promovidas
ao longo das seções.
Entretanto, nas atividades, nota-se também a tendência a manter um
trabalho individualizado, seguindo o padrão já consolidado em livros didáticos.
Há também pouca motivação para pesquisas no hipertexto e hipermídia, para
curadoria de informações e para trabalho com produção de gêneros
multissemióticos, por exemplo. Além disso, as propostas de atividade finais são
voltadas para produção de gêneros valorizados por vestibulares (dissertação e
carta do leitor), embora haja uma proposta de criação de um Tumblr. Assim,
fica evidente a tendência a manter o trabalho limitado a práticas voltadas para
um currículo situado em sua maioria no letramento da letra.
O fato de o MDDI em questão ter sido produzido dentro de um sistema
institucional que estipula e valoriza práticas de ensino específicas, direcionadas
por um currículo fruto dessa lógica, tende a reproduzir nesse material essas
mesmas práticas consolidadas. Essa reprodução de lógica estende-se também
à prática docente.
A despeito disso, é possível afirmar que, em ambos os casos, as
tecnologias disponíveis ampliam até certo ponto as possibilidades e introduzem
alguns elementos que extrapolam a lógica do currículo tradicional. Entretanto,
os limites não podem ser ampliados a ponto de abarcarem plenamente
práticas situadas em um novo ethos, pois, nesse caso, haveria uma ruptura
com o sistema vigente.

2.4. A estrutura da aula aplicada


 
O MDDI foi estruturado de forma a fornecer uma ampla gama de textos,
vídeos, imagens e atividades. Assim, tendo em vista os objetivos pedagógicos
gerais do material, é possível sistematizar, por meio dele, inúmeras estruturas
de aula. As variedades de estruturas de aula tornam-se ainda maiores quando

 
  107  
 

se considera a possibilidade de integração de navegação na internet


(hipertexto e hipermídia) de forma a complementar, aprofundar e ampliar
discussões possíveis dentro da temática do MDDI. A flexibilidade na
estruturação de aulas promovidas pelo material didático digital interativo visa
adequação do trabalho a variáveis como número de aula disponíveis, ano do
Ensino Médio em que se leciona e disponibilidade ou não de conexão com
internet, por exemplo. Assim, é possível criar sistemas de atividades que
englobem sistemas de gêneros adequados às condições disponíveis de
trabalho.
O contexto da aula sobre a qual se debruça esta pesquisa, duas aulas
de 50 minutos para uma turma de 2º ano do Ensino Médio com conexão
limitada à internet, proporcionou a transcrição da estrutura expressa abaixo
pela Tabela 4. A organização dessa Tabela segue a estruturação proposta por
Rojo (2007), baseada em Bazerman (2005), na qual se considera a
sequencialidade hierárquica da aula observada como um sistema de
atividades, composto por sua vez por sistemas de gêneros que organizam os
textos que na aula circularam. Além disso, especificamos qual seção e qual
parte da seção do MDDI foram utilizadas em cada atividade.

Atividade Seção,do,MDDI/parte,da,seção Gênero

Introdução,ao,tema __,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,, Explicação

Ativação,de,
Pedido,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
conhecimento,prévio,
__ Explicação,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
sobre,o,aquecimento,
análise
global
Reportagem,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
Leitura,de,texto Seção,1,,/,Fatos,do,aquecimento Explicação,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
Pedido
Pedido,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
Infográfico,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
Leitura,do,Infográfico,1 Seção,1,/,Fatos,do,aquecimento
Explicação,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,
análise,
Introdução,ao,
__ Explicação
contraponto
Texto,introdutório,,,,,,,,,,,,
Leitura,de,texto ,Seção,2,/,Contraponto
Explicação

 
  108  
 

Análise(da( Charges((((((((((((((((((((((((((((((
desqualificação(do( (Seção(1/(Fatos(do(aquecimento Explicação(((((((((((((((((((((((((((((
contraponto Análise
Exposição(das(
Infográfico((((((((((((((((((((((((((((
consequências(do( (Seção(1/(Fatos(do(aquecimento
Análise
aquecimento(global
VídeoEpropoaganda((((((((((
Atividade(de( Questão(escolar((((((((((((
Seção(1(/(Atividade(1
interpretação Explicação(sobre(procedimento((((
Verbete(de(glossário(((((((((((
Apresentação(de( Respostas(de(questões(escolar((
__
respostas Enunciado(explicativo
Texto(Explicativo((((((((((((((
Infográfico((((((((((((((((((((((
Explicação(((((((((((((((((((((((((((
Leitura(de(texto(e( Verbete(de(enciclopédio(online(
Seção(1(/(C02=Carbono
pesquisa(na(Web Gráfico((((((((((((((((((((((((((((((((((((
Tabela(numérica(((((((((((((((((((((((
Artigo(de(opinião((((((((((((((((
Análise
Explicação(((((((((((((((((((((((((((((((((
Artigo(de(divulgação(científica(((((
Leitura(de(texto(e(
Seção(1(/(Mitos(do(aquecimento Análise(((((((((((((((((((((((((((((((((((((((
pesquisa(na(Web
Artigo(de(opinião(((((((((((((
Comentário(em(site
Entrevista(em(talkshow(
Discussão(de(entrevista(
Seção(2(/(Contraponto Explicação((((((((((((((((((((((((((((
em(talkshow
Análise
Explicação(((((((((((((((((((((((((((((((((
Reportagem((((((((((((((((((((((((
Análise(do(papel(da(
Seção(2(/(Atividade(1 Infográfico(((((((((((((((((((((((((((((((
mídia
Análise(((((((((((((((((((((((((((((((((((((((
Questão(escolar(((((((((((((
Artigo(de(opinião(((((((((((((((
Leitura(de(texto Seção(3(/(A(tirania(de(muitos Explicação((((((((((((((((((((((((((((
Análise(((((((((((((
Explicação(de(
Seção(3(/(Propostas(de(produção(textual(
propostas(de(produção( Propostas(de(produção(textual
1,2(e(3
textual
Tabela 4: Sistema de atividades e de gêneros na aula dupla ministrada.

Dependendo dos caminhos de estudo do MDDI escolhidos pelo


professor ao longo da aula (instância da aula – Batista, 1997), o sistema de
atividades e seus respectivos sistemas de gênero podem mudar. Entretanto, o

 
  109  
 

protótipo (instância do exercício – Batista, 1997) apresenta um conjunto de


atividades e, consequentemente, possibilidades de sistemas de gêneros
limitados às escolhas de materiais feitas em sua elaboração. A despeito disso,
é possível notar que, se na ocasião de aplicação da pesquisa em questão a
conexão à internet estivesse em pleno funcionamento, seria possível ampliar,
dentro do conjunto de sistemas de atividades construídas pelo professor, os
gêneros que a compõem. Isso ocorreria pois, ao navegar pela internet, os
alunos possivelmente se deparariam com infinitas possibilidades de gêneros
cujas informações se relacionam à discussão. Assim, nota-se que, ao inserir na
aula a pesquisa em tempo real, por meio do uso de dispositivos móveis
conectados à internet, as possibilidades de ensino se expandem e os caminhos
de condução da discussão de determinado assunto, no caso da disciplina de
Produção e Interpretação Textual, tornam-se imprevisíveis e, justamente por
isso, ricos em razão das possibilidades de análise, verificação e contraposição
de perspectivas distintas proporcionadas por meio dessa estratégia.

3. Plano interpessoal
 
Para análise do plano interpessoal, será verificada como se deu a
interação em sala de aula por meio da análise das estratégias de interlocução
durante uma aula abordadas por Batista (1997). Assim, considerando a
instância da aula, analisaremos a constituição global, intermediária e local da
interlocução, além da forma como se estabelecem os polos de interlocução ao
longo da aula. Embora o trabalho de Batista investigue aulas com foco em
leitura e gramática, em nosso caso, devido à especificidade da disciplina
Produção e Interpretação textual, focaremos apenas em práticas de leitura e
interpretação.

3.1. Relação professor-aluno durante as aulas


 
Ao término de seu estudo, Batista (1997) conclui que a organização de
textos e exercícios do livro didático delimita a organização da interlocução na
instância da aula, seja para objetos de ensino relacionados à gramática seja

 
  110  
 

para objetos relacionados à leitura. Diante dessa conclusão, o autor atribui ao


professor o papel de alguém que talvez não ensine propriamente, mas alguém
que administre e gerencie o ensino. O professor, nesse contexto, não
necessitaria, segundo Batista, de um conhecimento acerca do objeto de
ensino, “mas do conhecimento sobre o processo de organização de sua prática
e sobre as relações dos alunos sobre esses saberes que se ensinam”
(BATISTA, 1997, p. 88). Embora não acreditemos que tais constatações
possam aplicar-se de forma generalizada às praticas docentes, quer sejam
mediadas por materiais digitais ou impressos, ao contrapô-las à análise das
aulas mediadas por MDDI registradas para esta pesquisa, percebe-se uma
realidade discrepante das conclusões de Batista.
Mediante a análise da experiência em questão, nota-se que, em uma
aula mediada por MDDI situado na concepção de protótipo proposta por Rojo
(2013), o professor assume um papel protagonista na elaboração do material
didático, pois é autor da seleção de textos, mídias e exercícios que
preencherão o protótipo. Tal seleção é feita de forma a contemplar os objetivos
pedagógicos inicialmente estipulados pelo docente. Além disso, ao ministrar a
aula, o professor traça os caminhos de estudo pelo MDDI que podem ser
lineares ou não. A escolha pelos caminhos de navegação é feita com base nos
objetivos pedagógicos a serem alcançados, nas condições tecnológicas
disponíveis e no nível de conhecimento da turma para qual se leciona naquele
momento.
Sem padrões estanques delimitados pela organização estrutural de um
material didático, os mecanismos de interlocução global para progressão
temática em uma aula mediada por MDDI podem ocorrer de diversas formas,
segundo as preferências do professor para alcance dos objetivos pedagógicos.
No caso da aula registrada, a escolha do professor para estruturação da
organização global da interlocução se deu por meio da introdução de
perguntas, seguidas, não necessariamente de forma linear, pela
sistematização, organização e, quando necessário, adequação das respostas
dadas pelos alunos de forma a construir uma análise e interpretação de
determinado material (texto, imagem ou vídeo) e introduzir um novo tópico.

 
  111  
 

Os tópicos sempre são organizados em torno da interpretação e análise


de texto, vídeo ou imagem ou introdução a um deles. A transcrição57 abaixo,
exemplifica essa constituição da interlocução global da aula.

Turno

1. Professor- A aula de hoje será sobre o aquecimento global. Vocês já ouviram


falar sobre isso, né? Então, nós vamos falar acerca dos consensos e
controvérsias que cercam esse tema. Então, o que vocês sabem sobre o
aquecimento global? O que é o aquecimento global para vocês?
2. Aluno 1 – Pode causar danos irreparáveis ao planeta.
3. Professor – Como?
4. Aluno 2 – Destrói a camada de ozônio.
5. Aluno 3 – inaudível
6. Aluno 1 - É, derrete as calotas polares.
7. Professor – Tá, vamo organizar a informação: destrói a camada de ozônio,
derrete as calotas polares.
8. Aluno 1 – Daí, o nível do mar sobe muito e começa a ultrapassar água. Então,
a terra vai cada vez ficar menor.
9. Professor – Certo. E o que faz esse aumento de temperatura? O que provoca
esse aumento de temperatura?
10. Aluno 4 – Os gases... CO2. Causa o efeito estufa.
11. Professor – É, os raios, né? Eles acabam ficando presos na atmosfera por
causa do efeito estufa. Vocês já viram que quando abrimos o livro tem um
vídeo que só vai mostrar o planeta sendo degradado tudo o mais. E é
basicamente a temática que segue essa questão do aquecimento global.
Então, a emissão de gases vai provocar o aquecimento do planeta e a
destruição do meio ambiente e tudo mais. Então, peguem aí primeiro texto,
Fatos do aquecimento, ele foi publicado há dois anos na revista Veja. Então
olha o que ele diz. (Professor faz a leitura do texto)

Assim, percebe-se que há a introdução de uma pergunta no turno 1. Do


turno 2 ao turno 10, encontram-se as respostas dos alunos e a sistematização
delas pelo professor. No turno 11, após a construção da análise esperada com
base na interação dos alunos, inicia-se um novo tópico com a leitura de um
texto.
Os tópicos introduzidos sempre relacionam-se com os anteriores, de
forma a criar progressão na temática da aula. Assim, as conclusões de Batista
sobre os mecanismos de progressão “como um conjunto de sequência de
atividades relacionadas numa cadeia de discurso que progride temporalmente
de tal modo que seus momentos ulteriores contêm parte dos anteriores,

                                                                                                               
57
A transcrição completa da aula pode ser encontrada nos anexos desse trabalho.

 
  112  
 

acumulados pelo contínuo movimento de recuo e avanço, de síntese e de


análise” (BATISTA, 1997, p. 67) aplicam-se à aula em questão.
No caso da organização local e intermediária do discurso, percebem-se
o uso de duas estratégias distintas: as sequências triádicas de turno e a
organização e/ou complementação das respostas do aluno de forma a construir
a informação esperada para progressão da temática e/ou introdução de novo
tema. Veja a transcrição abaixo.

Turno

12. Professor – Quando a gente lê esse texto, eu tenho uma certeza do


aquecimento global ou ele é colocado como uma possibilidade?
13. Alguns alunos – Certeza.
14. Professor – Como que vocês conseguem enxergar que é uma certeza pela
análise do texto?
15. Aluno 3 – Ah, ele fala que vai subir 4 graus até final do século.
16. Aluno 5 – E tem Ongs trabalhando para reverter isso.
17. Professor – O que mais? Mas tem um fator aí que é primordial para isso.
18. Alunos – inaudível.
19. Professor – Qual órgão?
20. Aluno 3 – IPCC.
21. Professor – É o IPCC, né? Que é o Painel Intergovernamental de mudanças
climáticas. Então ele dá como uma certeza, né? Vocês veem aí que ele fala:
não, os pesquisadores já alertavam, né? Hoje a gente não precisa mais de
alerta. A gente já sabe, né? E todo mundo já sabia que o homem era o
causador desse tipo de problema. Aí o IPCC se posicionou e confirmou isso.
Tá. Olhem aí essa imagem interativa. Abriram, pessoal?
22. Aluno – Sim.
23. Professor – Então, olhem aí, deem uma boa analisada (projeta o infográfico na
lousa). A gente tem ameaças do aquecimento. E aí a gente tem várias
consequências do aquecimento global. Então, ó: (enumera tópicos do
infográfico).

Após a leitura do texto, o professor introduz uma pergunta. Diante da


resposta vaga dos estudantes, no turno 13, há uma nova pergunta feita pelo
professor a fim de instigar os alunos a analisarem o texto da forma esperada. O
mesmo processo de repete ao longo dos turnos 15 ao 23. Nota-se que, por
meio dessas estratégias, objetiva-se a construção mútua da análise da questão
abordada. Tal constatação contrasta com os dizeres de Batista sobre o objetivo
das estratégias locais de organização em seu estudo. Segundo o autor, seu
objetivo não está meramente na correção, mas também em “fornecer objetos
para que se possa conhecer, avaliar e, assim, corrigir a aprendizagem dos
alunos” (BATISTA, 1997, p. 44).

 
  113  
 

Além disso, ele afirma que o trabalho de transmissão de conteúdos é,


assim, não simplesmente uma comunicação, mas uma comunicação que
pretende se fazer em substituição ao conhecimento anterior do aluno. Na aula
mediada por MDDI, talvez não em decorrência da mediação pelo material
digital, mas pela estratégia adotada pelo professor a fim de alcançar os
objetivos pedagógicos estipulados, há o afastamento de uma prática de ensino
do caráter corretivo e de substituição de conhecimento e a tentativa de
introduzir a mútua construção da análise da temática estudada por alunos e
professor. Nesse processo de construção mútua da análise da temática, as
capacidades exigidas pela pergunta escolhida pelo professor, bem como seu
objetivo, são fundamentais. Na transcrição acima, por exemplo, percebe-se
que a mediação feita pelo docente tinha por finalidade conduzir os alunos
alunos fazer inferência global e percepção do posicionamento do autor do texto
em discussão.
A construção de polos de interlocução verificada por Batista, em que “o
reconhecimento tácito da autoridade do professor, promovido pela estratégia,
implica ainda, o reconhecimento tácito da posse, por ele, da dominância da
interlocução, e o reconhecimento, também tácito, do papel dominado dos
alunos nessa interlocução” (BATISTA, 1997, p. 54), ocorre de forma diferente
na aula analisada. Em vez da construção de um corpo unificado de alunos
centrado pela atenção no professor, nota-se a constituição dinâmica de polos
de interlocução, em que o polo central pode ser ocupado tanto por um aluno
quanto pelo professor, embora perceba-se a predominância do professor nesse
papel. A transcrição abaixo exemplifica essa constatação.

Turno

24. Professor – Então, olha só. O que acontece aí? Se você é contrário ao
aquecimento global segundo o texto, você acaba sendo taxado como alguém
que é adepto de teoria conspiratória, alguém que defende a indústria de
petróleo e a depredação ambiental. Certo? E olha o final aí (leitura do texto).
Vocês concordam com isso?
25. Alunos – cada um fala algo diferente. Inaudível
26. Aluno 1 – Não tem como a poluição desde muito tempo não ter causado nada.
27. Aluno 7 – Não, eu acho...
28. Professor – Algum efeito tem, né?
29. Aluno 7 – Acho que a poluição tem algum efeito, mas tem aquele negócio do
ciclo do planeta: tem a era gelada.. era glacial e uma era mais quente. Acho

 
  114  
 

que isso vai variando. Não só é a poluição, a poluição pode agravar, mas acho
que ia acontecer de qualquer jeito.
30. Aluno 1 – Eu concordo porque, se você for ver, o planeta continua girando
normal, nada muda incompreensível
31. Alunos discutem entre si – incompreensível
32. Professor – Beleza. E olha aí, pessoal, pra provar, de repente, aquilo que eles
estavam falando. Olha umas charges que a gente encontra por aí. Para isso, a
gente volta lá na página 2 do livro tá? (Análise da charge projetada) Qual que é
o humor aí?

No turno 24, percebe-se o professor como polo central da interlocução.


Após a pergunta feita por ele, há discussão entre os alunos e, em seguida, o
aluno 7, no turno 29, ocupa o polo central de interlocução.
Acreditamos que, se a internet estivesse funcionando e os alunos
pudessem ter desenvolvido as atividades de pesquisa, seria possível observar
o professor assumindo com menos predominância o polo central de
interlocução. Nesse caso, ele teria agido como um mediador e organizador das
informações, de forma que fosse possível conduzir o desenvolvimento do tema
de discussão da aula. Ou seja, haveria um aluno mais ativo e um trabalho entre
professor e alunos mais colaborativo.
Quanto à instância do exercício, no início dessa seção notamos que,
como essa instância se baseia no material didático e como, na experiência de
aula mediada por MDDI, o material é confeccionado pelo próprio professor,
essa instância assume caráter diferente daquele revelado nos estudos de
Batista. Para vermos isso melhor, discorreremos, na seção seguinte, sobre as
relações estabelecidas entre alunos e material didático digital interativo e, na
seção referente ao plano de análise pessoal, descreveremos uma experiência
de engajamento de alunos em uma atividade do MDDI.
 

3.2. Relação entre alunos e MDDI

Para entender as formas de interação entre alunos e material didático


digital interativo, quatro estudantes foram escolhidos para, previamente às
aulas ministradas, interagir com o MDDI. Assim, tais alunos, individualmente,
foram conduzidos a uma sala à parte. Lá, os recursos disponíveis no material e
tablet, tais como acesso livre à internet e uso de glossário e dicionário anexos
ao MDDI, foram apresentados. Em seguida, foram dadas instruções aos alunos

 
  115  
 

para explorarem o material didático da forma como preferissem ao longo de até


no máximo 30 minutos. Enquanto interagiam com MDDI, as telas dos
dispositivos móveis foram gravadas e os estudantes foram orientados a utilizar
a técnica do protocolo verbal58, de forma a verbalizar sua navegação pelo
material.
Por meio dos dados obtidos, foi possível mapear as escolhas de
caminhos de leitura do material de cada um dos estudantes, bem como as
semioses priorizadas. Abaixo, seguem os diagramas de navegação no MDDI
que resultaram desse mapeamento.

Aluno  1  

Galeria  de   Galeria  de   •  Leitura  


charges charges •  Assistiu  ao   •  Apreciação  
vídeo  todo apenas  das   rápida
Infográ?ico  3 Vídeo  1  das  
•  Leitura   •  Leitura   imagens   atividades  2  da   •  Leitura   Artigo  
detalhada rápida ilustrativas seção  1 rápida "Tirania  de  
•  Leitura  de   •  Leitura  de   •  Leitura   muitos" Propostas  de  
Vídeo  da   detalhada
uma   todas  as   atividade  1   produção  
Infográ?ico   charges Notas  -­‐  seção  2
1 charge da  seção  1 •  Assistiu  ao   textual
Infográ?ico  2 vídeo  todo •  Leitura  rápida
Artigo  "Mitos  
do  
aquecimento"

Aluno  2  

•  Leitura  
Galeria  de   detalhada  e  
•  Leitura   Infográ?ico  1 charges Infográ?ico  3 Seção  2
•  Retorna  à   •  Leitura   apreciação  das  
detalhada leitura imagens  
•  Leitura   •  Leitura  de   detalhada •  Leitura   •  Navegou  pela   •  Leitura  rápida
detalhada todas  as   detalhada ilustrativas seção  sem  
charges fazer  leitura
Reportagem    "Fatos   Reportagem    
do  aquecimento" "Fatos  do   Infográ?ico  2 Notas
aquecimento"
Artigo  "Mitos  do  
aquecimento

                                                                                                               
58 A técnica de protocolo verbal ou think-aloud, segundo Lankshear e Knobel (2004), foi
desenvolvida para resolver o problema de como se obter dados acerca das estratégias e
processos de pensamento de pessoas no momento em que elas estão completando uma
determinada tarefa. Os pesquisadores explicam que tal método envolve o estudo da fala do
participante da pesquisa durante a realização de uma ação. Nesse contexto, o engajamento
do pesquisador por meio de perguntas e comandos é fundamental para que se obtenham
dados eficazes para o objetivo visado.

 
  116  
 

Aluno  3  

Reportagem     Artigo  "Mitos  do   Seção  2


•  Assistiu  ao   "Fatos  do   •  Leitura  rápida •  Leitura  Rápida aquecimento" •  Assistiu  ao  
vídeo  todo aquecimento" vídeo  todo
Seção  1 •  Apreciação   •  Navegou  pela   •  Navegou  pela  
apenas  das   seção  sem  fazer   seção  sem  fazer  
•  Leitura   leitura leitura
detalhada •  Navegou  por   imagens  
algumas   ilustrativas
Vídeo   páginas  da   Atividades  2  da  
Introdutório Infográ?ico  1 Infográ?ico  3 seção  1 Seção  3
seção  sem  fazer  
leitura  

Aluno  4  

•  Assistiu  ao  
Reportagem     Galeria  de   vídeo  todo •  Analisou  
Infográ?ico  2 Vídeo  das   •  Leitura   •  Leitura  
"Fatos  do   charges atividades atividades  1  da  
•  Assistiu  ao   •  Leitura   detalhada detalhada  e  
vídeo  todo aquecimento" detalhada seção  1
•  Leitura  de   •  Leitura   Infográ?ico  3 apreciação  
todas  as   Vídeo  da   detalhada Texto   de  
charges atividade  1   explicativo   ilustrações
Vídeo   •  Leitura  
detalhada Infográ?ico  1 da  seção  1 •  Assistiu  ao   =  CO2  =  
Introdutório Atividades  1  -­‐   vídeo  todo Calor •  Leitura  detalhada
Seção  1

Artigo  "Mitos  do  


aquecimento

Texto  introdutório   Vídeo  -­‐  Jô  Soares   Documentário  -­‐  A   •  Análise  


•  Assistiu  ao   Vídeo    2   "A  farsa  do   Artigo  de  opinião   entrevista  o   grande  farsa  do   rápida  da  
Atividades  2  da   •  Leitura   aquecimento   •  Pesquisou  sobre   climatologista   seção  3  -­‐  
vídeo  todo o  cientista  James   "A  farsa  do   •  Análise   •  Análise  das   aquecimento  global
seção  1 detalhada global" aquecimento   rápida Ricardo  Felicio   Propostas  
Lovelock questões de  
Vídeo    1   Global"
produção  
Atividades  2   •  Assistiu   •  Assistiu  aos  
da  seção  1 ao   Infográ?ico  1 Pesquisa  na   •  Leitura   Ilustrações  da   textual
•  Leitura   internet detalhada seção primeiros  
vídeo   detalhada •  Assistiu  aos   segundos
todo
primeiros   Atividades  1  
segundos da  seção  2 Seção  3

A análise dos diagramas revela que, majoritariamente, a navegação no


MDDI foi linear, embora os alunos soubessem que poderiam conduzir a leitura
do material de outras formas. Além disso, houve baixa incidência no uso dos
recursos do MDDI, tais como dicionário e glossário, a despeito de todos os
participantes terem sido informados acerca desses recursos e serem

 
  117  
 

proficientes no uso do tablet e do software iBooks. O aluno 3, enquanto


navegava pelo material, afirmou que o dicionário e o glossário eram funções
que facilitavam o estudo, mas, ainda assim, não as utilizou. Quanto à
funcionalidade de conexão com a internet para pesquisas, apenas o aluno 4 a
utilizou, pesquisando o nome do cientista James Lovelock. Após descobrir que
havia uma legenda no MDDI que especificava quem era Lovelock, o aluno em
questão afirmou que, se soubesse anteriormente da existência da legenda, não
teria feito a pesquisa na internet. Tanto a baixa incidência no uso dos recursos
dicionário e glossário como de pesquisas na internet ao longo da navegação
pelo MDDI, podem revelar a consolidação de uma prática linear de leitura
determinada na instituição escolar, visto que leituras não lineares no hipertexto
são cada vez mais comuns ao se navegar na internet e não foram reproduzidas
nesse caso. Ademais, pode-se perceber a possibilidade de manutenção da
lógica de que todo o conhecimento necessário para práticas de ensino e
aprendizagem está no material fornecido, não havendo, assim, necessidade
para pesquisas fora dele.
Quanto à priorização de sistemas semióticos durante a leitura, notou-se
o predomínio do visual sobre o verbal. Infográficos, vídeos e charges foram
acessados por todos os participantes, enquanto a leitura dos textos limitou-se à
leitura da reportagem “Fatos do aquecimento” por todos os alunos com
exceção do aluno 1, à leitura do artigo de divulgação científica “Mitos do
aquecimento”, pelo aluno 2 e aluno 4, e à leitura do texto explicativo
“CO2=Calor”, pelo aluno 4. Nos demais casos, os alunos apenas passaram os
olhos pelos textos escritos, dedicando alguns segundos a eles, e continuaram
com a navegação pelo MDDI.
Embora tenha havido alta incidência de acesso à gêneros pertencentes
ao sistema semiótico visual, em especial aos vídeos, é importante salientar
que, nesse caso, apenas os vídeos curtos foram assistidos. Entretanto, tal
ocorrência pode relacionar-se ao tempo limitado que os alunos dispunham para
fazer a navegação.
O padrão de navegação traçado pelos participantes desse momento da
pesquisa elucida o que Rogoff (1995) afirmou quanto à influência do plano
institucional e comunitário nos demais planos. No plano institucional, é possível

 
  118  
 

localizar valores e normas relacionados ao que é apropriado para alcançar o


objetivo estipulados durante a atividade sociocultural. Nesse caso, observou-
se, pelo menos em parte, a reprodução da lógica de leitura determinada pelo
letramento da letra nas escolas. No entanto, o predomínio da imagem sobre a
letra é patente.

4. Plano pessoal
 
O foco dessa pesquisa não reside no plano pessoal, ou seja, não foram
coletados dados para que se analisem os processos de apropriação do aluno e
seu desempenho posterior em atividades socioculturais relacionadas.
Entretanto, com base em notas de campo, será possível fazer breves
considerações acerca do desempenho dos estudantes em dois momentos
específicos de atividades: atividades em sala de aula e atividades após as
aulas.

4.1. Atividades realizadas em sala de aula

Inicialmente, os alunos haviam sido divididos em grupo para que


pudessem realizar a seguinte atividade presente no MDDI (ver Figura 10).

Figura 10: Atividade 1 da seção 1 do MDDI


 
  119  
 

Nessa atividade, após compreender o conceito de adaptação da biologia


evolutiva, cuja definição encontrava-se no glossário – bastava clicar no termo
“adaptação” para acessá-lo –, os alunos deveriam justificar a propaganda
institucional, que é basicamente uma animação sobre a evolução no planeta,
por meio de um breve texto. Para isso, os grupos tiveram cerca de 10 minutos
para pesquisarem mais sobre o conceito em questão, assistir ao vídeo e redigir
o texto.
Após terminarem a tarefa, os grupos espelharam seus textos, um a um,
na lousa digital por meio do Apple TV e avaliaram o texto uns dos outros em
termos de uso da norma culta e coerência na exposição das ideias. Ao longo
da avaliação, os grupos fizeram sugestões uns aos outros de como tornar o
texto melhor. Abaixo, segue a transcrição desse momento na aula.

Turno

33. Professor – É pouco. Pessoal, e vocês sabem que o IPCC publicou


recentemente, faz um mês, um novo relatório. A gente vai falar sobre isso
daqui a pouco, guardem essa informação. Vamos para a página 4. Vou passar
esse vídeo para vocês. (vídeo é exibido na lousa)
34. Professor – Alguém já jogou aquele jogo, Spore? Parece, né? Parece o jogo
Spore. Então olha só: lembra que eu falei para vocês que a cada aula eu vou
sempre dar atividades valendo aqueles pontinhos para vocês complementarem
depois. Essa uma das atividades. (Leitura da atividade).
35. Professor – O que é justificar a propaganda?
36. Aluno 1 – Mostrar o que ela retrata.
37. Professor – Exatamente! Você vai mostrar o que tá retratando, mas tendo por
base a discussão feita até o momento e a questão da adaptação. Se você
clicar nesse link aí, clica aí. Esse “adaptação”. Tá vendo? Aí ele vai dar a
definição de adaptação. Como que a gente vai fazer? Esses grupos que estão
reunidos, vocês vão ter uns 6, 7, minutos para poder escrever no iPad mesmo
a resposta e aí cada um de vocês vai projetar. E aí, a melhor resposta, eu
posso dar três pontos para vocês complementarem uma redação. Para o
grupo.
38. Aluno 7 – É 0,3 ou é 3 mesmo?
39. Professor – Não, são três pontos mesmo, mas aí você coloca e vai fazer toda
aquela divisão.
40. Aluno 3 – Para cada grupo?
41. Professor – Não, para a melhor resposta. Eu vou avaliar tanto
gramaticalmente quanto a coerência da resposta...
42. Aluno 2 – Por grupo?
43. Professor – Por grupo. Cada pessoa do grupo ganha três pontinhos. Então
vamo lá? Vocês têm 7 minutos para fazer isso e daí vocês só espelham a
resposta e todo mundo vai ler avaliar juntos. Agora são 11:06. Vocês têm até
11:15. (Alunos se organizam). Lembrando, só mais uma dica. Pessoal?
Pessoal? Quando a gente fez aquele questionário do autismo... vocês
lembram? Eu pedi para contextualizarem a resposta. Não é? Então não

 
  120  
 

adiante colocar “é que isso significa isso e isso”. Não. Tem que fazer aquela
contextualização. Ou seja, a propaganda acima retrata isso, isso, isso com
referências à adaptação... (Professor anda pela sala, conversando com os
grupos e auxiliando-os na formulação da resposta e em pesquisas)
44. Professor – Beleza, gente? Vamos lá então. Começa com o grupo de vocês.
Espelhem aí a resposta. Pessoal, os demais grupos já vão se preparando.
Vocês precisam se conectar na “rede carlos”, a senha é essa aqui. A senha é
nuggets. Pessoal a resposta do grupo é essa aqui então. Leia aí aluno 7.
45. Aluno 7 – A propaganda abaixo faz referência à adaptação do seres às
circunstâncias da natureza durante a evolução das espécies. Ela utiliza esse
artifício para fazer uma crítica ao pensamento das pessoas em relação ao
aquecimento global, às falta de mobilização das pessoas e aos danos
ambientais do progresso industrial. A propaganda tem como objetivo iniciar
uma reflexão individual relacionada às ações das pessoas e seu impacto no
meio ambiente.
46. Professor – O que vocês acharam?
47. Aluno 1 e Aluno 4 – Bem bom.
48. Professor – Vamo lá, ó, vamo retoma a pergunta então. Considerando, né, a
frase “não é o planeta que tem que se adaptar é você”, que é aquela frase que
chega no final do vídeo, você vai precisar considerar o conceito de adaptação
evolutiva e justificar a propaganda com base na temática discutida. Não é?
Então, você justificou dizendo que objetivo é iniciar uma reflexão individual
relacionada às ações das pessoas e seu impacto no meio ambiente. E a
adaptação do ser humano?
49. Aluno 7 – A gente colocou incompreensível da evolução das espécies.
50. Professor – É, eu imagino que poderia ter ficado um pouquinho mais claro
essa questão da adaptação entendeu? O ser humano tenta fazer o planeta se
adaptar a ele e não o contrário. Você consegue enxergar. Você, vocês,
colocaram, sim, o conceito de adaptação, mas não o elevaram a esse nível
para especificar um pouco mais. O que faltou... gera uma quebra e falha na
resposta tá? Mas ela tá muito boa.
51. Aluno 3 – Pode mandar a resposta.
52. Professor – Manda aí.
53. Aluno 3 – Como é que é? É a rede um?
54. Professor – Não, tem que entrar em “Carlos” (nome da rede).
55. Alunos – incompreensível
56. Professor- A senha é Nuggets. Olha, mas vale lembrar que a construção deles
está excelente... Foi? (há dificuldades em conectar na rede para espelhar a
resposta). Lê aí... (há dificuldades em formatar a resolução)
57. Professor – Gente é só ler. Sem complicar. Não precisa.
58. Aluno 3 – Ao longo dos milênios, os seres vivos passaram por uma série de
transformações: os dinossauros foram extintos, os mamíferos desenvolveram
pelos e anfíbios, nadadeiras. Contanto, nos últimos anos, o ser humano vem
alterando com frequência o meio ambiente, o que acarretou uma série de
mudanças no cenário do planeta. O efeito estufa, a extinção das espécies e o
aquecimento global são algumas das consequências dessa transformação. O
comercial institucional YGA retrata exatamente essa alteração: ao invés de
nos adaptarmos ao mundo, estamos querendo que o mundo se adapte a nós.
Este fato está criando um profundo desequilíbrio ambiental que pode gerar um
grande problema a todos os seres vivos.
59. Professor – O que vocês acharam?
60. Aluno 1 – Sensacional.
61. Alunos – (vários elogios à resposta).

 
  121  
 

62. Professor – Vocês conseguiram enxergar o que faltou para vocês? A


referência clara que eles fizeram? (alunos do outro grupo concordam)
Entretanto, olha: “Ao longo dos milênios, os seres vivos passaram por uma
série de transformações: os dinossauros foram extintos, os mamíferos
desenvolveram pelos e anfíbios, nadadeiras”. Se você quiser ser mais preciso
ainda na propaganda, você poderia dizer que essas transformações estão
relacionadas ao processo de adaptação que veio da biologia evolutiva, só para
você fechar o ciclo e deixar ainda mais claro. “Contanto” não pode, é contudo.
63. Aluno 1: Ah, mas incompreensível
64. Professor – Não, só estou mostrando o problema. É conjunção adversativa,
nesse caso. Mas legal, a resposta foi um pouco mais completa nesse grupo,
embora tenha pecado em caracterizar essas transformações como uma
adaptação e o errinho que vocês já corrigiram. Parabéns, muito legal. Vocês
agora (aponta para o outro grupo). Ah, um fato legal foi ter citado quem fez a
propaganda, uma referência completa ao texto motivador.
65. Aluno 5 – O vídeo retrata o fato de que as pessoas têm mudado o mundo de
acordo com suas necessidades para melhorar sua qualidade de vida. Porém,
todas nossas ações possuem consequências e muitas vezes não nos afetam
de maneira esperada. Por isso, o homem ao invés de mudar o mundo deve se
adaptar melhor a ele.
66. Professor – O que vocês acharam, pessoal?
67. Aluno 1 – Ah, tá faltando.
68. Alunos – (concordâncias)
69. Professor – Por quê?
70. Aluno 1 – Não tem uma referência, não fala os ocorridos.
71. Professor – A resposta está correta, mas tem essas quebrinhas. Entretanto,
cadê a referência direta à propaganda, né? Em vez de falar o vídeo, fala qual
nome do vídeo. E aí faltou ilustrar um pouco mais a questão da adaptação, tá
bom? Conseguiu entender? Embora, a estrutura gramatical esteja bem legal.
72. Aluno 3 – Ah, a nossa estrutura gramatical estava legal também.
73. Professor – Vocês querem a reposta agora ou no final?
74. Alunos – Agora!
75. Professor – Foi esse grupo aqui (aponta para o grupo 2). incompreensível
todo mundo concorda que eles forma melhores.
76. Aluno 7 – O nosso não teve erro gramatical.
77. Alunos – (Conversam entre si sobre os resultados).

Embora a experiência seja pontual, é possível verificar uma prática de


ensino colaborativa, que faz uso da tecnologia e exige interpretar e estabelecer
relação entre as informações de gêneros multissemióticos e escritos para a
criação de um novo gênero, um texto explicativo. Tal atividade quebrou parte
da lógica do erro e do acerto consolidada nas escolas e, fazendo uso de novas
tecnologias, permitiu aos alunos uma prática colaborativa que envolve
multiletramentos. Além disso, conhecendo os critérios pelos quais as
produções seriam avaliadas, participaram ativamente no processo avaliativo.

 
  122  
 

4.2. Atividades realizadas após as aulas

Ao término da aula dupla, os alunos puderam escolher entre as três


propostas de produção textual disponíveis na seção três do MDDI: uma
dissertação, uma carta do leitor e um Tumblr. Dentre todos os alunos da turma,
apenas um deles optou por fazer o Tumblr. Os demais optaram por fazer os
gêneros valorizados na esfera escolar e também por vestibulares. Embora não
seja o foco desta pesquisa analisar as produções em si, é possível, por meio
das escolhas feitas pelos alunos quanto ao que produzir, evidenciar a
consolidação de uma cultura escolar que valoriza apenas o letramento da letra
e, no caso da instituição em questão, buscaram também realizar aquilo que é
foco do vestibular e demais exames. Tem-se, nesse caso, a concepção vigente
de uma educação voltada majoritariamente ao desempenho em provas.
 

 
  123  
 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve por objetivo a analisar uma experiência de uso de


material didático digital interativo para tablets a fim de verificar como, nessas
condições, realizam-se os processos de produção e condução da prática
docente.
Para isso, buscou-se, por meio do primeiro capítulo desta dissertação,
definir o contexto contemporâneo mediado pelas novas tecnologias da
informação e comunicação, cujas práticas sociais, nos mais diversos âmbitos
da vida humana, tornam-se cada vez mais permeadas por multi e novos
letramentos.
Por meio da definição desses conceitos, buscou-se embasamento para
orientar a produção do MDDI utilizado no estudo. Além disso, o capítulo em
questão discorreu acerca dos conflitos decorrentes da coexistência de dois
ethos distintos, evidenciados, entre outros fatores, pela popularização das
tecnologias móveis (tablets e celulares). Justamente pelas propriedades e
funcionalidades interativas, que propiciam leituras multissemióticas e
navegação por hipertextos e hipermídias, os tablets foram escolhidos como
suporte para o MDDI desenvolvido pelo professor pesquisador autor deste
estudo. A inserção desses dispositivos móveis na escola, que, inicialmente
ocorreu de forma involuntária, gerou conflitos entre professores, instituições e
alunos, pois rupturas nos paradigmas educacionais tornaram-se evidentes.
Instituições de ensino permanecem ainda fortemente embasadas apenas em
um currículo voltado para o letramento da letra e – talvez em decorrência da
repetição automatizada e acrítica de determinadas práticas – para a formação,
no alunado, de uma identidade nacional, por meio da alfabetização para uma
norma padrão e “correta” da língua nacional, do ensino da história das origens
da nação e da geografia das fronteiras.
Hoje, num mundo em que as fronteiras nacionais caem diante da
globalização e as pessoas de comunidades multilingues com identidades cada
vez mais multifacetadas e fragmentadas, não poderia ser mais anacrônico
pensar em uma educação normativa que dissemine uma identidade nacional e
ainda preze por organizar alunos por categorias, que determinam um
tratamento escolar respectivo (horários, gênero e volume de trabalho, saberes

 
  124  
 

a aprender, competências a adquirir, métodos de enquadramento, currículo e


processos de avaliação e de seleção). Assim, é evidente que a inserção da
escola em um novo ethos pressupõe a configuração de um novo paradigma
educacional.
No segundo capítulo, caracterizamos abordagens teóricas para
embasamento da análise quanto à estruturação da aula mediada por MDDI e
os processos de interação, por meio da constituição da interlocução em sala de
aula, entre professores e alunos e também os processos de interação
estabelecidos entre alunos e MDDI. Todos esses objetos de análise foram
organizados por meio de três planos de análise constitutivos de uma atividade
sociocultural.
Uma vez estando estabelecidos os elementos da análise, no terceiro
capítulo, caracterizamos o campo da pesquisa, descrevemos os processos de
coleta de dados, com base na técnica de pesquisa observação participante, e
detalhamos os métodos de análise.
Por fim, no quarto capítulo, analisamos os dados de forma a
compreender os aspectos que consideramos essenciais em uma experiência
de prática docente mediada por MDDI. Foi possível constatar que a mera
disponibilidade tecnológica não é suficiente para que as práticas de ensino
englobem os multiletramentos e os novos letramentos. Faz-se necessário, para
isso, um projeto pedagógico que considere claramente os propósitos da
introdução da tecnologia em sala de aula.
A implementação de tal projeto, no entanto, encontra limitações ao
consideramos o peso determinante do currículo escolar na escolha do que se
ensinar ou não em sala de aula. Tal currículo, por sua vez, se estrutura
mediante as concepções sociais acerca das funções da escola. A lógica
anteriormente descrita tende limitar o uso de tecnologias e mesmo de MDDIs.
Assim, quando utilizados, acabam por replicar práticas do letramento da letra,
sem que se incorpore um novo ethos. Isso ocorre, pois consideram-se
prioridades curriculares objetos de ensino voltados a maximizar o desempenho
de estudantes em exames ou a mera “regurgitação de verdades”, o que
dificulta, mas não invabiliza, práticas de ensino colaborativas, voltadas à

 
  125  
 

pesquisa e curadoria de informação ou mesmo um trabalho adequado com


gêneros multissemióticos.
Entretanto, se os MDDIs e novas tecnologias não são suficientes para
mudar paradigmas educacionais estabelecidos, pudemos notar que eles
ampliam até certo ponto as possibilidades de ensino e introduzem alguns
elementos que extrapolam a lógica do currículo tradicional. Entretanto, os
limites não podem ser ampliados a ponto de abarcarem plenamente práticas
situadas em um novo ethos, pois, nesse caso, haveria uma ruptura com o
sistema vigente. Chama-se atenção, nesse contexto, para a propiciação do
trabalho com multiletramentos por meio de MDDIs e tecnologias móveis.
Além disso, o trabalho com MDDI construído a partir do conceito de
protótipo faz com que o professor assuma um papel ativo na seleção de
gêneros, escritos e/ou multissemióticos, que constituem o material, na escolha
de objetivos pedagógicos a serem alcançados e os caminhos de estudo pelo
MDDI ao longo de uma aula. Tais caminhos, escolhidos mediante o contexto
de docência, são estruturados por meio de sistemas de atividades, que, por
sua vez, estruturam sistemas de gêneros. Dependendo dos caminhos de
estudo do MDDI escolhidos pelo professor ao longo da aula, o sistema de
atividades e seus respectivos sistemas de gênero podem mudar. Percebe-se
que as possibilidades são muitas. Caso se utilize, na aula, estratégias de
pesquisa em tempo real por alunos em hipertexto e hipermídia, as
possibilidades de gêneros que compõem os sistemas de atividade tornam-se
ainda maiores e imprevisíveis e, justamente por isso, ricos em razão das
possibilidades de análise, verificação e contraposição de perspectivas distintas
proporcionadas por meio dessa estratégia.
As interações verificadas em sala de aula ao longo da pesquisa
apontam para a condução de uma prática docente em que a construção da
análise do objeto de estudo se dá de forma mútua entre professor e alunos. Ao
longo do estudo, verificou-se que a constituição da organização global da
interlocução se deu por meio da introdução de perguntas, seguidas, não
necessariamente de forma linear, pela sistematização, organização e, quando
necessário, adequação das respostas dadas pelos alunos de forma a construir
uma análise e interpretação de determinado material (texto, imagem ou vídeo)

 
  126  
 

e introduzir um novo tópico. As estratégias locais e intermediárias organizaram-


se por meio de sequências triádicas de turno e a organização e/ou
complementação das respostas do aluno, de forma a construir a informação
esperada para progressão da temática e/ou introdução de novo tema. Tais
resultados mostraram-se diferentes daqueles em que, segundo a bibliografia
especializada, o professor assume uma postura de detentor do conhecimento e
o ensino se baseia na correção, substituição de conhecimento e no reforço de
sua autoridade. Nossos resultados apontaram para um professor que assume
um papel de mediador e organizador das informações constituintes do objeto
de ensino. É importante, contudo, salientar que tal postura não é fruto
unicamente do uso do MDDI e dispositivos móveis, embora tais elementos
favoreçam posturas como essa, mas também de escolhas de postura do
próprio professor mediante a escolha dos objetivos e caminhos do estudo da
temática.
Quanto ao uso do MDDI por alunos, percebeu-se a tendência a manter
práticas de leitura lineares e pouca incidência no uso dos recursos oferecidos
pelo MDDI e dispositivo móveis para pesquisa. É provável que um uso
constante desses recursos em práticas de ensino faça com que os alunos
assimilem estruturas de leitura não lineares, semelhante à que se observa em
navegação na internet e passem a utilizar as possibilidades de pesquisa
oriundas dessas tecnologias para verificação e ampliação do conhecimento
trabalhado em sala de aula.
Por fim, embora não seja foco da pesquisa, foi possível constatar que
atividades em que alunos se engajam no contexto de ensino mediado por
MDDI podem ser conduzidas de forma a valorizar práticas colaborativas, que
fazem uso de novas tecnologias e exigem o trabalho com a habilidade de
interpretar e estabelecer relação entre as informações de gêneros constituídos
por semioses diversas.
Situada em um campo que necessita de mais investigações, esta
pesquisa, ao analisar questões referentes à pratica docente mediada por
MDDI, elucidou possibilidades de pesquisas que se mostram necessárias para
um maior entendimento acerca da relação entre ensino e novas tecnologias.
Entre essas possiblidades, destacam-se o estudo dos impactos do uso de

 
  127  
 

MDDI na prática docente e o estudo das habilidades e competências


necessárias aos alunos quando se insere na escola o trabalho constante de
leitura e, talvez, produção de gêneros multissemióticos e engajamento
colaborativo.
Além disso, mostram-se também necessários estudos que visem
teorizar mais profundamente os protótipos, principalmente ao considerarmos o
contexto em que há ampla variedade de materiais em semioses diversas
disponível para uso em práticas docentes. Podemos mencionar também a
pertinência de pesquisas que objetivem analisar as diferentes funcionalidades
dos dispositivos móveis (celulares, tablets, notebooks, netbooks) e suas
aplicabilidades possíveis ao ensino mostram-se pertinentes num contexto de
popularização e barateamento dessas tecnologias. Por fim, salientamos que
pesquisas que visem discutir um currículo escolar voltado para Web 2.0 e para
um novo ethos mostram-se fundamentais em um período em que se questiona
a relevância da função escolar no preparo do indivíduo para a vida em
sociedade.

 
  128  
 

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  138  
 

ANEXO A
 
Material didático digital interativo utilizado em aula.

 
  139  
 

 
  140  
 

 
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  147  
 

 
  148  
 

ANEXO B
 
Transcrição  da  aula  ministrada.  
 
1. P- A aula de hoje será sobre o aquecimento global. Vocês já ouviram
falar sobre isso, né? Então, nós vamos falar acerca dos consensos e
controvérsias que cercam esse tema. Então, o que vocês sabem sobre o
aquecimento global? Oque é o aquecimento global para vocês?
2. A1 – Pode causar danos irreparáveis ao planeta.
3. P– Como?
4. A2 – Destrói a camada de ozônio.
5. A3 – inaudível
6. A1 - É, derrete as calotas polares.
7. P – Tá, vamo organizar a informação: destrói a camada de ozônio,
derrete as calotas polares.
8. A1 – Daí, o nível do mar sobe muito e começa a ultrapassar água.
Então, a terra vai cada vez ficar menor.
9. P – Certo. E o que faz esse aumento de temperatura? O que provoca
esse aumento de temperatura?
10. A 4 – Os gases... CO2. Causa o efeito estufa.
11. P – É, os raios, né? Eles acabam ficando presos na atmosfera por causa
do efeito estufa. Vocês já viram que quando abrimos o livro tem um
vídeo que só vai mostrar o planeta sendo degradado tudo o mais. E é
basicamente a temática que segue essa questão do aquecimento global.
Então, a emissão de gases vai provocar o aquecimento do planeta e a
destruição do meio ambiente e tudo mais. Então, peguem aí primeiro
texto, Fatos do aquecimento, ele foi Publicado há dois anos na revista
Veja. Então olha o que ele diz. (Professor faz a leitura do texto)
12. P – Quando a gente lê esse texto, eu tenho uma certeza do
aquecimento global ou ele é colocado como uma possibilidade?
13. Alguns alunos – certeza.
14. P – Como que vocês conseguem enxergar que é uma certeza pela
análise do texto?
15. A3 – Ah, ele fala que vai subir 4 graus até final do século.
16. A5 – E tem Ongs trabalhando para reverter isso.
17. P – O que mais? Mas tem um fator aí que é primordial para isso.
18. Alunos – inaudível.
19. P- Qual órgão?
20. A3 – IPCC.
21. P – é o IPCC, né? Que é o Painel Intergovernamental de mudanças
climáticas. Então ele dá como uma certeza, né? Vocês veem aí que ele
fala: não, os pesquisadores já alertavam, né? Hoje a gente não precisa
mais de alerta. Agente já sabe, né. E todo mundo já sabia que o homem
era o causador desse tipo de problema. Aí o IPCC se posicionou e
confirmou isso. Tá. Olhem aí essa imagem interativa. Abriram, pessoal?
22. Aluno – Sim.
23. P – Então, olhem aí, deem uma boa analisada (projeta o infográfico na
lousa) . A gente tem ameaças do aquecimento. E ai a gente tem várias

 
  149  
 

consequências do aquecimento global. Então, ó: (enumera tópicos do


infográfico).
24. A5 - Então além de aumentar 4 graus, vai diminuir no inverno.
25. P – Sim.
26. A5 – Mais gelado no inverno e mais quente no verão.
27. P – Exatamente. Beleza, pessoal?
28. A1 - Ah, então, mais frio no inverno e mais quente no verão?
29. P – Porque (inaudível) segundo o IPCC é que o invernos se tornem
cada vez mais rigorosos.
30. A6 – Inaudível.
31. P- Sim, já ouvi isso também. Agora vamos fazer o seguinte. Vamos para
a página 7 do livro.
32. A3 – Então, tipo, quanto maior o aquecimento global maior os inaudível
33. P – Sim, como consequência as mudanças climáticas passam a ser
extremas, né? Então, verões cada vez mais quentes e invernos cada
vez mais frios. Pessoal, vamos lá para a página 7 do livro: contraponto.
Alguém lê para mim aí.
34. A1 – leitura do texto.
35. P – Então, olha só. É, vocês conseguem enxergar uma sátira a quem
defendo o aquecimento global? Nessa primeira etapa do texto aí.
36. A4 – Sim.
37. P – Como?
38. A4 – Entre aspas...
39. A1 - Os trechos em que os profetas falam...
40. P – É, tem uma comparação, né? Entre governos, ciência e mídia e os
profetas do caos, né. E aí essa linguagem (leitura do trecho). Não
parece uma coisa meio profecia, meio fim de mundo. Então, assim ó:
enquanto lá na matéria da Veja a gente viu que essa verdade do
aquecimento é incontestável, aqui a gente já vê que tem um contraponto
que diz que isso talvez seja mais um alarde caos do que realmente é.
Mas a gente vai precisar de dados para saber se isso realmente ocorre
ou não. Então vamo continuar aí. Quem continua o texto?
41. A7 – continua leitura
42. P – Então, olha só. O que acontece aí? Se você é contrário ao
aquecimento global segundo o texto, você acaba sendo taxado como
alguém que é adepto de teoria conspiratória, alguém que defende a
indústria de petróleo e a depredação ambiental. Certo? E olha o final aí
(leitura do texto). Vocês concordam com isso?
43. Alunos – cada um fala algo diferente. Inaudível
44. A1 – Não tem como a poluição desde muito tempo não ter causado
nada.
45. A7 – Não, eu acho...
46. P – algum efeito tem, né?
47. A7 – Acho que a poluição tem algum efeito, mas tem aquele negócio do
ciclo do planeta: tem a era gelada.. era glacial e uma era mais quente.
Acho que isso vai variando. Não só é a poluição, a poluição pode
agravar, mas acho que ia acontecer de qualquer jeito.
48. A1 - Eu concordo porque, se você for ver, o planeta continua girando
normal, nada muda incompreensível
49. Alunos discutem entre si – incompreensível

 
  150  
 

50. P- Beleza. E olha aí, pessoal, pra provar, de repente, aquilo aqueles
estavam falando, olha umas charges que a gente encontra por aí. Para
isso, a gente volta lá na página 2 do livro tá. (Análise da charge
projetada) Qual que é o humor aí.
51. A1 - Que eles estão considerando rever.
52. P – que ainda não...
53. Alunos - cada um fala algo diferente. Inaudível
54. P - Que a gente ainda não tem certeza de que o aquecimento global é
real.
55. A7 – Acho que a gente nunca vai ter certeza.
56. P – Será? E olha, aí a gente tem várias charges. Todas elas defendendo
a perspectiva de que o aquecimento global é real. (leitura e análise de
algumas das charges).
57. P – Leitura do infográfico 2 e explicação. CORTE NA GRAVAÇÃO
58. Aluno - incompreensível
59. P – O brasil tem pouca coisa, vocês viram?
60. A7 – Só 60% da Amazônia vai virar cerrado.
61. P – Ah, só isso.
62. A7 – Não é muito.
63. P – É pouco. Pessoal, e vocês sabem que o IPCC publicou
recentemente, faz um mês, um novo relatório. A gente vai falar sobre
isso daqui a pouco, guardem essa informação. Vamos para a página 4.
Vou passar esse vídeo para vocês. (vídeo é exibido na lousa)
64. P – Alguém já jogou aquele jogo, Spore? Parece , né? Parece o jogo
Spore. Então olha só: lembra que eu falei para vocês que a cada aula eu
vou sempre dar atividades valendo aqueles pontinhos para vocês
complementarem depois. Essa uma das atividades. (Leitura da
atividade).
65. P - O que é justificar a propaganda?
66. A1 – Mostrar oque ela retrata.
67. P – Exatamente! Você vai mostrar o que tá retratando, mas tendo por
base a discussão feita até o momento e a questão da adaptação. Se
você clicar nesse link aí, clica aí. Esse “adaptação”. Tá vendo? Aí ele vai
dar a definição de adaptação. Como que agente vai fazer? Esses grupos
que estão reunidos, vocês vão ter uns 6, 7, minutos para poder escrever
no iPad mesmo a resposta e aí cada um de vocês vai projetar. E aí, a
melhor resposta, eu posso dar três pontos para vocês complementar
uma redação. Para o grupo.
68. A7 – É 0,3 ou é 3 mesmo?
69. P – Não, é três pontos mesmo, mas aí você coloca e vai fazer toda
aquela divisão.
70. Aluno – Para cada grupo?
71. P – Não, para a melhor resposta. Eu vou avaliar tanto gramaticalmente
quanto a coerência da resposta...
72. Aluno – Por grupo?
73. P – Por grupo. Cada pessoa do grupo ganha três pontinhos. Então vamo
lá. Vocês têm 7 minutos para fazer isso e daí vocês só espelham a
resposta e todo mundo vai ler avaliar juntos. Agora são 11:06. Vocês
têm até 11:15. (Alunos se organizam). Lembrando, só mais uma dica.
Pessoal? Pessoal? Quando a gente fez aquele questionário do

 
  151  
 

autismo... vocês lembram? Eu pedi para contextualizarem a resposta.


Não é? Então não adiante colocar “é que isso significa isso e isso”, Não.
Tem que fazer aquela contextualização. Ou seja, a propaganda acima
retrata isso, isso, isso com referências à adaptação... (Professor anda
pela sala, conversando com os grupos e auxiliando-os na formulação da
resposta e em pesquisas)

74. P – Beleza, gente? Vamos lá então. Começa com o grupo de vocês.


Espelhem aí a resposta. Pessoal, os demais grupos já vão se
preparando. Vocês precisam se conectar na “rede carlos”, a senha é
essa aqui. A senha é nuggets. Pessoal a resposta do grupo é essa aqui
então. Leia aí aluno 7.
75. A7 – A propaganda abaixo faz referência à adaptação do seres às
circunstâncias da natureza durante a evolução das espécies. Ela utiliza
esse artifício para fazer uma crítica ao pensamento das pessoas em
relação ao aquecimento global, às falta de mobilização das pessoas e
aos danos ambientais do progresso industrial. A propaganda tem como
objetivo iniciar uma reflexão individual relacionada às ações das
pessoas e seu impacto no meio ambiente.
76. P – O que vocês acharam?
77. A1 e A4 – Bem bom.
78. P – Vamo lá, ó, vamo retoma a pergunta então. Considerando, né, a
frase “não é o planeta que tem que se adaptar é você”, que é aquela
frase que chega no final do vídeo, você vai precisar considerar o
conceito de adaptação evolutiva e justificar a propaganda com base na
temática discutida. Não é? Então, você justificou dizendo que objetivo é
iniciar uma reflexão individual relacionada às ações das pessoas e seu
impacto no meio ambiente. E a adaptação do ser humano?
79. A7 – A gente colocou incompreensível da evolução das espécies.
80. P – É, eu imagino que poderia ter ficado um pouquinho mais claro essa
questão da adaptação entendeu? O ser humano tenta fazer o planeta se
adaptar a ele e não o contrário. Você consegue enxergar. Você, vocês,
colocaram, sim, o conceito de adaptação, mas não o elevaram a esse
nível para especificar um pouco mais. O que faltou... gera uma quebra e
falha na resposta tá? Mas ela tá muito boa.
81. A3 – Pode mandar a resposta.
82. P – Manda aí.
83. A3 – como é que é? É a rede um?
84. P – Não, tem que entrar em “carlos”.
85. Alunos - incompreensível
86. P- A senha é Nuggets. Olha, mas vale lembrar que a construção deles
está excelente... Foi? (há dificuldades em conectar na rede para
espelhar a resposta). Lê aí... (há dificuldades em formatar a resolução)
87. P – Gente é só ler. Sem complicar. Não precisa.
88. A3 – Ao longo dos milênios, os seres vivos passaram por uma série de
transformações: os dinossauros foram extintos, os mamíferos
desenvolveram pelos e anfíbios, nadadeiras. Contanto, nos últimos
anos , o ser humano vem alterando com frequência o meio ambiente, o
que acarretou uma série de mudanças no cenário do planeta. O efeito

 
  152  
 

estufa, a extinção das espécies e o aquecimento global são algumas


das consequências dessa transformação. O comercial institucional YGA
retrata exatamente essa alteração: ao invés de nos adaptarmos ao
mundo, estamos querendo que o mundo se adapte a nós. Este fato está
criando um profundo desequilíbrio ambiental que pode gerar um grande
problema a todos os seres vivos.
89. P – O que vocês acharam?
90. A1 – Sensacional.
91. Alunos – vários elogios à resposta.
92. P – Vocês conseguiram enxergar o que faltou para vocês? A referência
clara que eles fizeram? (alunos do outro grupo concordam) Entretanto,
olha: “Ao longo dos milênios, os seres vivos passaram por uma série de
transformações : os dinossauros foram extintos, os mamíferos
desenvolveram pelos e anfíbios, nadadeiras”. Se você quiser ser mais
preciso ainda na propaganda, você poderia dizer que essas
transformações estão relacionadas ao processo de adaptação que veio
da biologia evolutiva, só para você fechar o ciclo e deixar ainda mais
claro. “Contanto” não pode, é contudo.
93. A1: Ah, mas incompreensível
94. P – Não, só estou mostrando o problema. É conjunção adversativa,
nesse caso. Mas legal, a resposta foi um pouco mais completa nesse
grupo, embora tenha pecado em caracterizar essas transformações
como uma adaptação e o errinho que vocês já corrigiram. Parabéns,
muito legal. Vocês agora (aponta para o outro grupo). Ah, um fato legal
foi ter citado quem fez a propaganda, uma referência completa ao texto
motivador.
95. A5 – O vídeo retrata o fato de que as pessoas têm mudado o mundo de
acordo com suas necessidades para melhorar sua qualidade de vida.
Porém, todas nossas ações possuem consequências e muitas vezes
não nos afetam de maneira esperada. Por isso, o homem ao invés de
mudar o mundo deve se adaptar melhor a ele.
96. P – O que vocês acharam, pessoal?
97. A1 – Ah, tá faltando.
98. Alunos –(concordâncias)
99. P – Por quê?
100. A1 – Não tem uma referência, não fala os ocorridos.
101. P – A resposta está correta, mas tem essas quebrinhas.
Entretanto, cadê a referência direta à propaganda, né? Em vez de falar
o vídeo, fala qual nome do vídeo. E aí faltou ilustrar um pouco mais a
questão da adaptação, tá bom? Conseguiu entender? Embora, a
estrutura gramatical esteja bem legal.
102. A3 – Ah, a nossa estrutura gramatical estava legal também.
103. P- Vocês querem a reposta agora ou no final?
104. Alunos – Agora!
105. P – Foi esse grupo aqui (aponta para o grupo 2). incompreensível
todo mundo concorda que eles forma melhores.
106. A7 – O nosso não teve erro gramatical.
107. Alunos – conversam entre si sobre os resultados
108. P – Pessoal, foco. Vamos lá. Pessoal, pessoal. Olha esse trecho
agora... calma, vocês terão outro exercício para recuperar depois.

 
  153  
 

Relaxa. Olha esse tópico da página 4, CO2=Calor. (Leitura do texto). E


aí, olha o infográfico. Depois vocês vão precisar olhar esse material com
um pouco mais de detalhe quando forem fazer a produção, que não vai
ser hoje. Olha só, a gente calor produz mais calor e vai mostrando como
é que acontece, como é que o CO2, ele faz que haja esse aquecimento.
E aí, se você não tem o gelo, olha a parte dois do infográfico, tão
vendo, se você não tem o gelo não tem reflexo do calor, da luz do sol.
Então, a terra retém mais e por isso acontece o aquecimento. Mas olha
só que interessante, eu ia pedir para vocês olharem, mas como a gente
tá sem internet, a gente ia fazer pesquisa.
109. Aluno – Mas já voltou.
110. Coordenador – com a senha antiga.
111. P – Então, tá. Mas esse aqui eu já tinha separado. Olha aqui ó,
dióxido de carbono. Você sabe que, aí no livro, se você grifar alguma
coisa. Tá vendo. Aí você vai em buscar, você pode ver a definição do
dicionário ou ir para a Wikipédia.
112. A1 – Que legal.
113. P – Então, vamos para a Wikipédia que é mais rápido.
114. A7 – Aonde.
115. P – Se você grifar, mas eu já vim aqui. Olha só. (Leitura do
verbete CO2). Eu tava pesquisando em uns sites americanos, vocês
sabem que a mídia lá, ao menos há um tempinho atrás, eles davam um
pouco mais de abertura para os céticos do aquecimento. E um dos
argumentos desses céticos era de que quanto mais gás carbônico você
tem na atmosfera, mais você tem atividade das plantas, elas se tornam
mais ativas e elas crescem mais. Mas olha essa parte aqui embaixo,
vamos pular para ela. (continua Leitura do verbete CO2).
116. A7 – incompreensível
117. P- É, mas vocês sabem que mesmo a Wikipédia, você precisa
citar as referência de onde vieram os dados.
118. A1 – Livros importantes de filósofos e historiadores.
119. A7 – Nem todos.
120. P- No caso aqui , é de climatologista, biólogos...
121. A1 – incompreensível
122. P – Mas a gente sempre tem que checar a informação. E olha só,
gases do efeito estufa. Se você ver isso na Wikipédia também... pera
aí... achei. A gente viu que o dado lá, era de que o carbono tinha apenas
0,03% de composição dos gases. (professor procura a informação no
verbete).
123. A7 – Aumenta um pouco aí. Aí ó, incompreensível, 99% da
atmosfera.
124. P – Pessoal, eu tinha feito a pesquisa e acabei perdendo, em
outro link que eu encontrei ele estava mostrando que é 0,039% de
composição de gás carbônico na atmosfera. E eles mostram que na
revolução industrial, acho que é em PPO a medida, uma coisa assim, a
partir de lá houve um salto de cento e alguma coisa na atmosfera. Então
era duzentos e alguma e após a revolução industrial foi para trezentos e
alguma coisa.

 
  154  
 

125. Coordenador – Você consegue o gráfico se googlear composição


da atmosfera vai vir essa página wikipídica, mas aí tem uma tabela ali
embaixo...
126. P- Foi essa que eu vi
127. Coordenador – Tem uma tabela ali embaixo com gás volume é,
proporção disso, composição disso na atmosfera.
128. A7 – atmosfera terrestre é a página? Qual o nome da página
129. Coordenador – composição da atmosfera, primeira página que
aprece. Wikipídica.
130. P – Verdade. Olha aí, 0, 039% de gás carbônico. Então, essa
informação desse verbete está de acordo com a do verbete do gás
carbônico.
131. Coordenador – Rola um pouquinho para baixo que você vai ver a
tabela..
132. P – tem as composições né
133. Coordenador – é
134. P – Estão vendo aí pessoal. Então, olha só, a mídia alardeia o
tempo todo essa questão do gás carbônico, você precisa pagar o tanto
de carbono que você uso. Tem essas empresas que você paga, não sei
o que elas fazem que elas tiram o carbono que você usa. CORTE
NO VÍDEO

135. P – Olha o número que ele coloca: 73% das emissões de gás são
dos países desenvolvidos. Houve um aumento significativo do CO2. Mas
a gente não consegue ver dados de quanto é esse aumento nessa
reportagem que também é da Veja. É um trechinho daquela mesma
reportagem que a gente viu no começo. Passem para a próxima página.
A gente tem uma artigo que está em forma de galeria. Ele é de um site
de divulgação científica chamado Hypescience. Um site é bem legal.
Depois vamos ler com mais calma isso, mas vamos para a parte dois
dele. Ele diz. (leitura do trecho do artigo). Ele diz o que a ciência diz em
relação a essa questão. Olha só que interessante. A gente sabe que
existem cientistas que são ditos céticos do aquecimento global. Eles são
cientistas também não são? Mas eles são chamados do que aqui no
artigo?
136. A7 – Céticos.
137. P – Não. Do que eles são chamados? De mito. Não é? Você
consegue ver a descaracterização do cientista que é contrário ao
aquecimento global? Então, eles são chamados de mito. (leitura do
trecho do artigo) Fazendo uma pesquisa por aí também. Olha o que
encontrei na Veja, no começo do ano. ( professor tem problemas com a
conexão). Essa notícia é de 02/01 de 2014. E ela diz o seguinte:
“Cientistas tentam provar o aquecimento global e acabam presos no
gelo”. (Leitura do artigo de opinião do blog). Vocês viram que o colunista
é contrário e, vendo os comentários, olha o quem eu achei. Esse cara a
gente vai ver um vídeo dele daqui a pouco no Jô. Ele é o Ricardo
Felício, um climatologista da USP. (Leitura do comentário). O que é
panaceia? É um remédio para todos os males. Então, ele tá dizendo que
se você cuidar do carbono no planeta, você vai salvar o mundo, quando

 
  155  
 

você pega essa perspectiva de que o CO2 é o extremo vilão do planeta,


você pode fazer a comparação como o Felício faz. E vocês conseguem
ver um jogo de interesses na pesquisa do Turney, segundo o Felício.
Vamo lá. Lá no começo do texto, quem foi liderar os cientistas que foram
ver se tinha gelo ou não foi o Chris Turney. Quando o Felício vai dar o
parecer dele ele diz: “vale lembra que o Chris Turney , o cientista
climático, montou uma empresa comercial refinadora de carbono”.
138. A8 – Nossa
139. P - Qual é a ligação?
140. A8 – Quer dizer que, tipo, o carbono é o absurdo do ruim e o cara
que tá pesquisando sobre o aquecimento global tem uma empresa de
carbono.
141. A7 – tem interesse econômico.
142. P – Então olha só, ele tava indo lá para ver se tinha aquecimento
global e se tinha derrubado as geleiras. Se ele encontra o lugar sem
gelo, ele não vai validar a tese de que o gás carbônico está fazendo com
que o planeta esquente mais e as geleiras estão derretendo. E qual a
solução para os países?
143. A7 - Comprar da empresa dele.
144. P – Não só comprar da empresa dele, mas diminuir as emissões
de carbono e a empresa dele faz isso. Então é isso que o Felício está
implicando: que a pesquisa do Turney tem um interesse por trás. E ele
diz lá, olha: “e depois dizem que a gente é financiado pelas empresas do
petróleo.
145. Coordenador – posso falar uma coisa?
146. P – Pode falar.
147. Coordenador – a ente acaba incompreensível tudo que quer
vender alguma coisa usa o selo de cientificamente comprovado para,
né, engrandecer seu produto, para dizer, olha isso é realmente um
problema, é cientificamente comprovado. Mas, na verdade, a ciência
não comprova nada , ela estabelece uma teoria e, de repente, esse
paradigma é quebrado. Isso é muito interessante, o cara cm a pesquisa
dele gera a demanda, ou seja, ele diz: precisa disso. E ele tem uma
empresa que oferece isso.
148. P – essa pesquisa é geralmente financiado com dinheiro público.
149. Coordenador – Exatamente. Essa nuance é muito interessante de
pegar no texto.
150. P – Olha só...
151. Coordenador – e agente vê isso inúmeras vezes.
152. P – E às vezes a gente tem a ciência como algo infalível...
153. Coordenador – intocável...
154. P – Até no começo da Veja a gente vê: agora os cientistas deram
a prova de que o mundo realmente vai acabar por causa do CO2.
155. A7 – E se os cientistas afirmaram então é verdade...
156. P – Então, assim, a gente precisa ficar esperto com esse tipo de
pesquisa. Quem tem financiado? Que tá fazendo? Pode ter uma
finalidade por trás. (continua a leitura do comentário) Então, olha só que
interessante, segundo o Felício, que é um climatologista, então tem uma
certa autoridade para falar disso, que nessa época do ano a gente não
tem muito gelo nessa área porque é verão lá. Então vou buscar o

 
  156  
 

derretimento das geleiras para provar o aquecimento global em uma


época que não tem gelo lá. Conseguem ver mais um pouco de
manipulação? Por quê? Eles tão indo atrás de um resultado já esperado
não estão literalmente pesquisando. Se eles tivessem verificado a
temperatura pela base climatológica francesa, eles teriam visto que a
temperatura no ártico tem baixado nessa época do ano. Conseguiram
sacar? Alguém tem algum comentário sobre isso?
157. A1 – Ah, é isso, né? Por que, os cientistas têm se preocupado
com esse esquema de incompreensível mas daí o cara fazer jogada
para promover algo é....
158. P – Complicado. Foi meio por acaso que eu encontrei o
comentário do Felício e aí já apresento o cara para vocês. (começa o
vídeo de Entrevista do Felício)
159. P – Não vai dar para assistir todo, mas é bem legal, vocês podem
assistir o resto depois.
160. A7 – Mas assim como os cientistas que ele fala que
161. P – Pessoal, o aluno 7 tá falando.
162. A7 – Ele fala naquele comentário que as pesquisas são
tendenciosas, mas ele também é um pouco tendencioso.
163. P – Mas todo mundo é meio tendencioso
164. A1 – Ele faz deboche
165. A7 – É. Ele desvaloriza total. Nem todo mundo que tá lutando
pelo aquecimento global que está sendo sustentado por uma empresa
que é dona do gás.
166. P – Entendi..
167. A7 – Tudo bem, é uma opinião válida de um cientista bem
conceituado, não sei, não conheço.
168. P – Não mais. Porque assim, se vocês pegarem um pouco mais à
frente, vai ter um caso de que o pessoal que começou a contradizer o
aquecimento global. É esse Notas, lá página...
169. A3 – Ele foi demitido também?
170. P – Ele não foi demitido. Mas você viu que ele fala que não
consegue mais verba. Né? Então, parece assim: quando você é
contrário a essa teoria, segundo os cientistas, a gente não tem certeza
de nada, porque a gente tá pegando informações de vários lados, cada
um tá defendendo o seu. Mas, segundo os cientistas, eles são cortados
de publicações, não podem publicar em tal revista, têm verba cortada.
Então é o que ele diz. Tem esse documentário da BBC, A grande Farsa
do Aquecimento Global, tem um trecho dele aí, depois você pode
assistir e tem o link para assistir ele na íntegra depois. (CORTE NO
VÍDEO). Ela vem desse cientista, o James Lovelock. O James Lovelock
tem a hipótese de Gaia. O que significa essa teoria? Gaia é o planeta
terra, vocês sabem que é referência à mitologia grega, o planeta terra é
um organismo vivo, tudo no planeta terra constitui num organismo vivo,
ele como um todo. E quando existe algo que está destruindo o planeta
terra, o planeta se autorregula para destruir aquilo que destrói o planeta.
Entendeu? Então por causa disso, com base na teoria do Lovelock
surgiu a teoria do aquecimento global. Só que, olha o que aconteceu,
isso aqui foi no dia 05/05/2012. “Guru verde renega o catastrofismo
climático”. Então quando chegou 2010, passou de 2010, as previsões

 
  157  
 

era de que o planeta deveria ter acabado, tinha os negócios dos mais
também, e daí o que aconteceu. O cara viu que não era bem assim.
Então, olha o que ele disse (leitura do trecho da entrevista com
Lovelock). Então, as previsões dele era que depois de 2010 haveria um
aquecimento absurdo. Uma das hipóteses dele era que os países perto
dos trópicos se tornariam desertos e as pessoas migrariam para os
polos e haveria muitas guerras. A gente tem um infográfico que a Folha
fez com o que ele tinha previsto, olha as bolinhas, e o que de fato
aconteceu.
171. A2 – Ele tinha previsto os esquemas?
172. P – Ele tinha previsto pelas pesquisas dele.
173. A2 – Ele viajou...
174. P – Mas, ainda hoje, o IPCC, que divulgou o estudo deles, foi há
dois meses atrás, eles deram uma abrandada nisso, mas continua esse
alarmismo. Sabe o que o Felício fala no final da entrevista dele? Vocês
não pegaram o final da guerra fria, eu também não, mas existiam vários
modelos: o que acontece se os EUA jogarem uma bomba nuclear não
sei onde, o que acontece se a Rússia jogar uma bomba nuclear não sei
onde. E aí, esse cientistas faziam esses modelos que deixavam o
pessoal assustado, e aí surgia aquelas coisas daqueles mutantes,
animais que cresceram, Godzzila e tudo mais. Segundo o Felício, os
mesmos caras que faziam essas pesquisas, começaram a fazer
projeções sobre o aquecimento global. Houve uma migração. Em vez de
falar do terror da URRS, fim do mundo, guerra nuclear, a gente fala de
aquecimento global.
175. A3 – Eles até falavam que os EUA tinham o poder de destruir o
mundo.
176. P – É. Então olha só – (chama atenção de dois alunos ao proferir
seus nomes) - isso aqui é uma folha do jornal. Vocês lembram que
quando saía algum do relatórios do IPCC as revistas, até a Veja teve
várias capas, os jornais tinham a primeira página. Isso aqui foi a matéria
que saiu quando o cara que criou o aquecimento global disso que não ia
acontecer nada. A folha de SP deu esse espaço para o cara, no caderno
de ciência, pouco mais de meia página. E eles ainda chamaram um
outro climatologista que disse que o Lovelock está velho demais e não
sabe o que está dizendo. Por que estou mostrando isso para você? Para
a gente pensar que a tendência da mídia atual é dar mais espaço para
que vertente do assunto?
177. Alunos – a favor
178. P – Isso. A favor do aquecimento. Né? Sem a gente partir para
teorias conspiratórias, mas só constatando que a presença é maior
mesmo de quem defende o IPCC e tudo mais.
179. A7 – É o interesse em comum...
180. P – É aí, eles jogam. O aluno 4 falou do Molion, que chamam os
cara de teoria da conspiração, mas ele diz que quando pede pra cortar
os gastos, as emissões de gases, você limita a produção dos países
emergentes enquanto os desenvolvidos estão caindo, vejam as crises
nos EUA, na União Europeia. Antes de a gente ir para as tarefas finais,
faltam 1o minutos, vamos para a página 13. A gente tem um texto que foi

 
  158  
 

publicado no site Big Think. O Tariq Moose escreveu esse texto: A


tirania de muitos é tão ruim quanto a tirania de um. (leitura do texto).
181. P – Qual a ditadura que a gente pode teorizar que pode existir na
contemporaneidade?
182. Alunos – muitas respostas
183. A1 – Os interesses, tipo, pessoais de pessoas poderosas
influenciam muito mais que o interesse individual de uma população
184. P – E esses interesses podem se tornar disseminados na
população, ou seja, uma maioria que aceita uma determinada teoria.
Isso não se resume ao aquecimento global. Os padrões de beleza por
exemplo.
185. A1 – Se você for ver, quanto maior a população, menos
liberdades eles têm.
186. P – Os que são contra a ideia o que essa população acredita. A
gente pode ver essa ditadura de muitos manifesta de muitas formas
(continua a leitura e intercala a explicações)
187. P – como a gente associa isso ao aquecimento global?
188. A3 – A mídia manipulando incompreensível
189. P – A gente não pode ir para esse lado de manipulação. Existem
dois pontos de vista, mas a gente vê que tem uma maior aceitação de
que o aquecimento não existe. E as pessoas que são contra essa
maioria acabam perdendo financiamento. Não tem liberdade para expor
o ponto de vista e não são levados a sério. Acho difícil a gente falar de
teoria de conspiração, a gente não sabe. Além disso, a gente não pode
usar esse argumento para esquecer que o planeta precisa se
preservado independentemente de qualquer teoria, verdadeira ou não,
se você não cuida do seu planeta, está pedindo por extinção.
190. A7 – Você cuida da sua casa , né?
191. P – Exatamente.
192. P - Então o fato de talvez o aquecimento não ser tudo isso não
tira a nossa responsabilidade de, sim, fazer o possível para ter um
planeta sustentável. Mas aí a gente precisa saber até que ponto esse
conceito de ter um planeta sustentável está sendo perpassado por
demais interesses. Então, olha aí...(leitura das propostas de produção e
instrução para entrega)

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