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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

GESTÃO PÚBLICA PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL

DISCIPLINA: Estado no Brasil


PROFESSOR: Erick Omena
ALUNO: Leonardo de Lima

A proposição número três, debatida em sala de aula, se deu em torno da moção apresentada sobre as disputas
da (re)distribuição do poder institucional entre os entes federativos e sua fundamental importância para o
entendimento do funcionamento do Estado no Brasil. A questão federalista no Brasil é um tema sempre atual, aberto
e inconcluso, visto que toca em questões políticas, econômicas e sociais delicadas e, portanto, envolve atores e
interesses bem diversos.
Uma prova de que o tema é complexo pode ser constatada fazendo-se um na apreciação da questão
federalista na história do Brasil e, ao fazer isso, é possível encontrar sucessivos ciclos de centralização e
descentralização. O tema aparece na constituição brasileira pela primeira vez em 1891 como reivindicação do
movimento republicano e tinha como características o federalismo por segregação como uma forma de descentralizar
o poder político e o federalismo dual ou repartição horizontal de competências que criava esferas distintas, separadas
e independentes. Esse primeiro modelo federativo era altamente descentralizado, a União tinha poderes limitados e
aos estados era permitido o controle inclusive dos impostos de exportação.
A constituição de 1934 institui o federalismo cooperativo, o contexto era a revolução de 1930 onde as
oligarquias locais perderam poder, com isso o governo provisório colocou interventores nos estados e houve um
acréscimo de poder nas mãos da União que buscou, através desse poder, modernizar e industrializar o Estado
brasileiro. Novas relações intragovernamentais foram construídas, mas, dessa vez, de forma mais verticalizada,
apareceu então, pela primeira vez na história constitucional brasileira a divisão de competências concorrentes entre
estados e União.
Com o golpe de 1937 e a implantação do Estado Novo quebrou-se o federalismo cooperativo e houve uma
concentração e controle de poder nas mãos do governo central. Com o novo Estado autoritário o parlamento brasileiro
foi fechado, as eleições foram suspensas e novamente colocou-se interventores no lugar de governadores afim de
reduzir as influências regionais. O governo alegou necessidade de centralização e unidade política e administrativa
para promover a modernização do Estado.
Com a constituição de 1946, houve o retorno do federalismo cooperativo e a centralização das políticas de
planejamento, desenvolvimento e crescimento econômico sob a égide do Estado, no entanto, aparece novamente no
texto constitucional a possibilidade de legislação estadual supletiva ou complementar, dando mais autonomia política
aos estados com a previsão de repasse dos impostos de competência da União aos municípios.
Esse foi um breve período democrático, mas que teve vida curta, pois o golpe militar de 1964 novamente
instaurou um governo autoritário, então a constituição de 1946 foi descartada e em 1967 outro texto foi inserido em
seu lugar. Novamente houve uma ampliação dos poderes da União e a redução da margem de autonomia dos estados
que passaram a sofrer imposições do ente federal através de interferências, inclusive na realização das eleições locais
de governadores que passam a ser indiretas. É importante destacar, dessa época, a reforma tributária de 1966 que
centralizou recursos na esfera federal, o que levou ao aumento da dependência política, financeira e de políticas
públicas dos entes subnacionais em relação ao poder central. A política de desenvolvimento regional, que no período
anterior havia ganhado destaque com a criação de agencias importantes como a SUDENE, foi reduzida à concessão de
incentivos fiscais para atração de indústrias.
Esse período de interregno na nossa democracia só terminou em 1988 com a promulgação de uma nova carta
constitucional que restabeleceu o poder aos civis e inaugurou o atual período democrático constitucional brasileiro. A
nova carta constitucional restabeleceu o federalismo e trouxe importantes mudanças em comparação com às
anteriores, em linhas gerais, ela levou mais recursos para as esferas subnacionais, criou mais controles sobre os três
níveis de governo e inseriu universalização dos serviços sociais em seu texto.
No texto de 1988, ganhou força o federalismo estadualista e municipalista evidenciando assim a influência
dos governadores sobre bancadas parlamentares, o domínio de interesses regionais e o fortalecimento do papel dos
municípios na implementação de importantes políticas sociais. Houve uma fragmentação dos centros de poder que
passaram competir entre si, no entanto, a maior parte das competências continuou com a União que manteve uma
alta capacidade tributária e um maior poder de legislação e de definição de políticas de um modo geral.
Como já foi citado, no modelo federalista de 1988, a União destaca-se em algumas questões, entretanto, o
texto constitucional é em muitos aspectos horizontalizado na medida em que também dá a estados e municípios
competências legislativas e administrativas sobre muitas áreas. Essa complexidade, divisão e sobreposição e de
atribuições faz com que o atual modelo federalista brasileiro seja complexo e de difícil compreensão, pois ao mesmo
tempo que é um modelo cooperativo, também é competitivo pois gera disputa entre os entes locais.
A questão fiscal e tributária, por exemplo, tem sido motivo de críticas de setores da economia que têm
dificuldade compreender o emaranhado de leis e regras a que estão submetidos, mas também envolve o setor político
de várias esferas da federação, visto que há aqueles que não aceitam perder arrecadação e os que acham injusto o
modelo atual de arrecadação, taxação e distribuição. Essa situação tem dificultado uma reforma tributária tão
necessária ao aperfeiçoamento e desenvolvimento do nosso país.
A constituição de 1988 pretendia descentralizar muitas de suas atribuições de forma progressiva, mas
concentrou a arrecadação nas mãos da União. Esse alargamento da incidência dos tributos sobre o consumo dentro
da sua esfera de competência (contribuições sociais – PIS – COFINS) minou a base econômica do ICMS dos Estados.
Do mesmo modo, a aprovação da União pela renúncia de impostos cuja arrecadação deveria ser compartilhada com
estados é outro exemplo que pode ser citado. Outro fator que tem levado a muitas dificuldades é a questão da crise
fiscal dos estados e as disputas entre esses entes e a União, situação que, ultimamente, tem sido judicializada passando
a envolver então outro poder nessa disputa. A questão da autonomia de estados e municípios também foi motivo de
muitas disputas, durante a pandemia da COVID-19, e também acabou sendo judicializada já que a união, questionou
na suprema corte o quão autônomos os estados são para conduzir suas políticas visto que, em muitos casos, esses
entes de fato dependem do apoio e concordância do governo federal para estimular, prever programas e regras e
coordenar muitas de suas atividades.
Na apresentação e debate em sala de aula sobre a redistribuição do poder institucional entre os entes
federativos e a sua importância para a compreensão do estado brasileiro, houve uma inicial exposição sobre o histórico
do federalismo no Brasil onde foram apresentados os ciclos de centralização de descentralização, sendo essa, a visão
mais comum sobre o federalismo brasileiro, ou seja, a que toma essas variações de acordo com o regime político de
cada época, ora mais centralizada, ora menos centralizada, ou como uma sístole e uma diástole, na acepção
empregada por Golbery do Couto e Silva sobre os ciclos da nossa federação.
No debate, houve uma divergência sobre a importância do federalismo na compreensão do Estado brasileiro,
mas essa divergência, pareceu, na verdade, de ordem semântica visto que foram trazidos outros elementos à discussão
pelo grupo que não concorda com a afirmação sobre a importância do federalismo na compreensão do Estado
brasileiro. Elementos que apesar de relevantes, tais como a baixa participação popular pré-constituição de 1988,
individualismo, burocracia, estrutura da administração pública, problemas linguísticos, étnicos, religiosos entre outros,
nada tinham a ver com a questão central da moção apresentada. Dessa forma, o debate deslocou-se um pouco do seu
eixo central e o grupo que não concorda com a moção não se posicionou, de fato, sobre a distribuição do poder
institucional entre os entes federativos e a importância para se entender o estado brasileiro. No final do debate, o
grupo defensor da afirmação proposta na inicialmente na moção apontou esse deslocamento do tema pelo grupo
contrário e recolocou a questão do federalismo ao centro do debate.
O grupo a favor da moção trabalhou de forma adequada o tema e trouxe o exemplo já citado anteriormente
nesse texto, que foi a disputa sobre a autonomia dos estados e municípios durante a pandemia da COVID-19, o que
mostra como a questão federativa é um tema atual, aberto e extremamente relevante sobre o estado brasileiro e que
deve ser estudado em suas múltiplas dimensões como aponta Marta Arretche, que traz uma leitura alternativa sobre
a questão federativa, levando em conta não apenas a questão dos regimes políticos e sua influência sobre a questão
federativa, mas também a evolução do sistema tributário e fiscal brasileiro com fundamental para entender os
movimentos cíclicos do federalismo no Brasil.
Discussões e debates sobre questões relevantes do país são importantes e necessárias, e o grupo que acredita
que as disputas em torno da (re)distribuição do poder institucional entre os entes federativos é fundamental para se
entender o funcionamento do Estado no Brasil apresentou bons argumentos para defender a importância desse tema,
ainda que a discussão pudesse ter sido mais aprofundada. De qualquer forma, como expectador, eu corroboro a
opinião do grupo que defendeu a importância da questão federativa na compreensão do estado brasileiro me
posicionando a favor da moção proposta.

Referências bibliográficas
Arretche, Marta. Federalismo e políticas sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia. São Paulo em
Perspectiva, 18(2): 17-26, 2004.

Bonavides, Paulo e Andrade, Paes de. História constitucional do Brasil. 4ª ed. Brasília: Ed. OAB, 2002.

Souza, Celina. Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no brasil pós-1988. Rev. Sociol. Polít.,
Curitiba, 24, p. 105-121, jun. 2005.

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