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ENSAIO | ESSAY 73

Democracia sem sentimento de república: o


SUS nos tempos da Covid-19
Democracy without a sense of republic: the SUS in the times of
Covid-19

Ronaldo Teodoro Santos1,2, Juarez Rocha Guimarães2,3

DOI: 10.1590/0103-11042020E404

RESUMO Como se tornou possível a desconstrução da autoridade sanitária do Sistema Único de Saúde
(SUS) em plena radicalização da pandemia do novo coronavírus? No presente ensaio, propõe-se a discussão
de que essa situação expressa um problema de fundação da própria democracia brasileira, que consiste
na afirmação rigorosa de direitos sem a democratização dos fundamentos do poder. Tendo em vista esse
marco analítico, sugere-se a compreensão dos processos de financeirização e mercantilização da saúde em
sua convergência com os princípios regressivos da judicialização, da comunicação oligopolizada e, mais
recentemente, da militarização. Ante os apontamentos, após o golpe de 2016, a desinstituição dos espaços
mínimo de construção e disputa da soberania popular deflagram um tempo em que as forças políticas da
Reforma Sanitária estão desafiadas a recriar os caminhos de republicanização do poder.

PALAVRAS-CHAVE Sistema Único de Saúde. Infecções por coronavírus. Democracia. Mercantilização.


Política.

ABSTRACT How did it become possible to deconstruct the health authority of the Unified Health System
(SUS) in the midst of the radicalization of the new coronavirus pandemic? In this essay, we propose the dis-
cussion that this situation expresses a problem of the foundation of Brazilian democracy itself, which consists
in the rigorous affirmation of rights without the democratization of the foundations of power. In view of this
analytical framework, it is suggested to understand the processes of financialization and commodification of
health in their convergence with the regressive principles of judicialization, oligopolized communication, and,
more recently, militarization. Considering the notes, after the 2016 coup, the deinstitution of the minimum
1 Universidade do Estado spaces for construction and the dispute over popular sovereignty sparked a time when the political forces of
do Rio de Janeiro (Uerj),
Instituto de Medicina the Sanitary Reform are challenged to recreate the paths of republicanization of power.
Social (IMS) – Rio de
Janeiro (RJ), Brasil.
ronaldosann@gmail.com KEYWORDS Unified Health System. Coronavirus infections. Democracy. Commodification. Politics.

2 Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG),
Centro de Estudos
Republicanos Brasileiros
(Cerbrás) – Belo Horizonte
(MG), Brasil.

3 Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG),
Departamento de Ciência
Política (DCP) – Belo
Horizonte (MG), Brasil.

Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative
Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer
meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja corretamente citado. SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 44, N. ESPECIAL 4, P. 73-87, DEZEMBRO 2020
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Introdução regressivos da ordem política brasileira, como


o princípio da judicialização, o princípio da
O esforço de localizar o drama do Sistema oligopolização da comunicação e, mais recen-
Único de Saúde (SUS) no interior da desagre- temente, o princípio da militarização.
gação mais ampla da democracia brasileira é Como bem formulou Paim 2, os rumos
o desafio a que se propõe este artigo. Nosso do SUS são indissociáveis dos caminhos da
entendimento é que se encontra em curso um Constituição de 1988. Assim compreendidos,
franco processo de desconstituição do poder pode-se dizer que a construção material do
sanitário do SUS, que, apesar de não ter se SUS expõe o drama essencial dos conflitos
iniciado com o golpe de 2016, conhece desde mais intensos da democracia brasileira, que
então um ponto de inédita inflexão destrutiva. consiste em atender à expectativa de expan-
A documentação do caos sanitário e econô- são de direitos sob o tacão de uma política
mico que dominam a vida pública brasileira fiscal restritiva de gastos1. Em termos polí-
no contexto da pandemia da Covid-19 forma ticos, esse não deixa ser o próprio drama da
o retrato das características mais visíveis da autoafirmação e soberania dos brasileiros e
desorganização institucional provocada pelo brasileiras como sujeitos políticos.
governo Bolsonaro. É preciso, no entanto, No pós-2016, o conteúdo regressivo do
descer à sua gênese e estrutura. estado brasileiro assume um renovado dina-
O escândalo da desinstituição da autori- mismo, aprofundando a corrosão dos espaços
dade sanitária do SUS em plena pandemia, em que a luta por cidadania buscava afirmar
por meio da cena aberrante da ocupação sua agenda sanitarista em três caminhos:
do Ministério da Saúde por militares, exige i) em uma direção, retira da deliberação
um aprofundamento da análise conceitual pública temas fundamentais da vida coleti-
e histórica dos vetores que vêm operan- va, blindando a economia da vida política.
do para minar a soberania constitucional Essa dimensão ganhou um sentido extremo
desse sistema de saúde. O projeto do SUS é com a Emenda Constitucional (EC) 95, ao
a afirmação mais alta da soberania popular definir um regime fiscal para o orçamento
que se expressou na Constituição de 1988, da União por 20 exercícios financeiros con-
entretanto, é preciso reconhecer que seu secutivos. Ao inaugurar um franco processo
longo e difícil processo de institucionalização de desfinanciamento do SUS, essa medida in-
deu-se em um cenário de soberania popular terdita sistemicamente as agendas das lutas
limitada pela transição conservadora e pela sanitárias, ao passo que fomenta propostas
ascensão do neoliberalismo nos anos 19901. de fortalecimento do setor privado; ii) em
Agora, esta vem sendo golpeada no centro outro trajeto, persegue a desregulamentação
pela fusão entre o neoliberalismo e o governo da intervenção estatal quando a legislação
de ultradireita de Bolsonaro. opera reduzindo assimetrias de poder entre
Por esse entendimento, a superação da os sujeitos políticos. Essa condição se faz
pandemia requer a reconstituição do demos, presente, por exemplo, com as reformas
do princípio da soberania popular, centro recentes na Política Nacional de Atenção
vital da gênese e da sustentação de todo o Básica (PNAB) ao fragilizar as normas de
aparato institucional do SUS. Como procura- construção de equipes multidisciplinares
remos argumentar, a afirmação de direitos na para os gestores municipais3; iii) a terceira
Constituição de 1988 não se fez acompanhar trilha das transformações políticas consiste
de uma democratização dos fundamentos na adoção de práticas que desrespeitam a
do poder e de sua reprodução. Isso implica dinâmica de funcionamento dos espaços de
reconhecer que a atuação corrosiva do ne- participação e controle social, desidratando a
oliberalismo se apoiou em outros vetores importância dessas instâncias4. Esse aspecto

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explica, em boa medida, os retrocessos nas O mercado e as três


políticas de Saúde Mental e Atenção Básica, dinâmicas de corrosão da
a desconstrução do Programa Mais Médicos
e mesmo a liberação indiscriminada de agro-
soberania sanitária
tóxicos no País5.
Esse caminho autoritário, que combina Sem considerar as dinâmicas profundas do pa-
concentração e dispersão do poder insti- radoxo neoliberal à soberania popular, não se
tucional de decisão, compõe o processo de entenderá como, em pleno pesadelo da pande-
desconstituição da autoridade sanitária do mia no Brasil, a soberania do SUS foi ‘golpeada’,
SUS, uma vez que esvazia os espaços que como bem afirmou Sonia Fleury6. Esse cenário
os sujeitos políticos da Reforma Sanitária explicita o descolamento forçado dos sujeitos
sempre buscaram ocupar. No contexto de políticos da Reforma Sanitária dos lugares de
enfrentamento da pandemia, essa mordaça disputa acerca da direção da política sanitária
imposta aos momentos de controle democrá- do País, inserido no movimento mais amplo de
tico do poder se associa à crise nas relações esvaziamento da própria democracia brasileira.
federativas na qual o governo federal sabota A Constituição de 1988 foi, com todas as suas li-
deliberadamente os esforços de estados, mitações democráticas decorrentes da transição
municípios e distrito federal, bloqueando o conservadora, a expressão mais importante de
repasse de recursos, forçando o fim prema- um princípio de afirmação da soberania popular,
turo das medidas de distanciamento social constituindo, por excelência, a mais substantiva
e desarticulando a cadeia de comandos do afirmação dos direitos humanos em toda a histó-
Ministério da Saúde. ria brasileira. O SUS, incorporando esse princípio
Na primeira seção deste artigo, discutire- em sua fundação, abrigou a participação demo-
mos a relação instituinte entre a soberania crática em sua configuração mesma, atribuindo
popular e a sustentação institucional das poderes participativos e decisórios, em regime
democracias. Na recuperação desse sentido tripartite, aos usuários, aos trabalhadores e aos
republicano da democracia, apontaremos governos eleitos.
como os movimentos de expansão do neo- Essa afirmação rigorosa de direitos na
liberalismo se associaram a outros vetores Constituição de 1988 não correspondeu,
regressivos persistentes na ordem institu- todavia, a uma democratização dos fundamen-
cional brasileira, corrompendo progressiva- tos do poder e de sua reprodução. O sistema de
mente a constituição da autoridade sanitária partidos e eleições surgido após as reformas
do SUS. Identificaremos aqui os processos da fase final da ditadura foram mantidos; o
estruturais que conduziram ao esvaziamento sistema judiciário7, elitista e autonomizado
dos espaços democráticos de realização do de controles democráticos, ficou intocado; o
conflito e da luta política. Na segunda seção, poder militar com seus braços de militarização
procuraremos documentar os momentos de nas políticas de segurança pública foi garantido
formação e o recente aprofundamento dos sem a aplicação de uma Justiça de Transição8;
impasses histórico do SUS. Na conclusão, o sistema de comunicação oligopolista não foi
serão identificados importantes movimen- alterado por novas medidas de comunicação
tos de resistência democrática que se arti- pública e novos marcos regulatórios9. Esta
culam ao campo da saúde no contexto do contradição em movimento, a afirmação alta
enfrentamento da pandemia. Nosso intuito dos direitos e a baixa aposta no imperativo
consistirá em fundamentar o argumento de de submeter o poder político a uma dinâmica
que a reconstituição do demos é a própria profunda de soberania popular, está no coração
reestruturação do centro vital de sustentação dos impasses da construção do SUS e, de resto,
institucional democrática do SUS. de toda a construção de direitos no pós-1988.

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Contra a soberania popular e sua luta pela democrática brasileira na área da saúde. O
afirmação universal do direito fundamental à diagnóstico dessa dialética negativa entre as
vida, armaram-se, ao longo do tempo da ins- frentes do interesse mercantil e os propósitos
titucionalização do SUS, os sujeitos políticos públicos e universais do SUS forjou, no campo
que buscaram mercantilizar o acesso à saúde. A da saúde coletiva, importantes estudos iden-
afirmação de direitos sem a devida democrati- tificando o subfinanciamento público e seus
zação do poder favoreceu a associação – ainda vínculos com o hibridismo público-privado
que indireta – dos interesses mercantis a outras de interesses e seus desdobramentos para o
forças desconstituidoras da soberania popular, planejamento e gestão do sistema. Em uma
como: i) a judicialização da política; ii) a oligo- perspectiva política, a persistência temporal
polização da comunicação; e iii) a militarização desses impasses deve ser compreendida como
– que recentemente se tornou mais explícita. o desafio matricial da própria afirmação da
Negociados, pactuados e permanentemente soberania popular na democracia brasileira.
disputados no âmbito da democracia brasileira, Não obstante o avanço dessas fronteiras de
esses elementos de força antirrepublicana ad- mercantilização da saúde, a Constituição de 1988
quiriram uma pulsão destruidora do SUS sem vingou, por certo tempo, como um vigoroso re-
freios após o golpe parlamentar que levou ao gulador de interesses contrários e fortemente
impeachment da ex-presidenta Dilma. A partir assimétricos. Decerto, uma arquitetura exclu-
de então, mais do que um autodenominado dente, instável e precária no processamento dos
programa de reformas, a transformação que conflitos amadurecidos em uma ordem social
se opera promove uma mudança qualitativa secularmente regressiva, mas que permitiu a
do eixo constitucional a qual vinha se dando expansão de políticas sociais mesmo contrapostas
a ‘expansão cívica’ no pós-1988. com reformas antiestado e processos de empre-
De longe, foi o princípio mercantil o que sariamento da saúde. Com todos esses percalços,
mais operou para destruir por fora e por dentro por um curto período, formou-se mesmo na
a realização plena do SUS. Externamente, o ciência política brasileira o quase-consenso de
movimento articulou estruturas de limita- que a forma histórica assumida pela democracia
ções orçamentárias drásticas e persistentes brasileira, embora limitada, havia encontrado um
do sistema, que se reconhecem nas medidas caminho adequado de equacionamento de seus
de Desregulamentação dos Recursos da União conflitos políticos por meio de eleições regulares,
(1995), na Lei de Responsabilidade Fiscal competitivas e com expectativa de rotatividade
(2000), e na EC-95 (2016). Internamente, a no poder10,11. Como se sabe, desde 2016, a es-
destruição se fez reconhecer pelo assalto ao tabilidade institucional que a ciência política
provimento público dos servidores por meio de brasileira supunha existir encontrou sua ruína
sua terceirização, e com a criação da Agência histórica patente. Na área da saúde, esse processo
Nacional de Saúde (1998), que, de fato, retirou ampliou o dinamismo das pressões mercantis
do âmbito da soberania do SUS, e do próprio existentes sobre o SUS, evidenciando que seus
Conselho Nacional de Saúde (CNS), a regula- objetivos encontravam apoio na atuação de outras
ção do mercado suplementar da saúde. vertentes políticas regressivas não superadas na
Esse sistema de articulação concorrencial Constituição de 1988.
do setor privado com o SUS se tornou, como Assim, do ambiente de incorporação precá-
sabemos, um enclave duradouro ao avanço ria dos programas progressistas, transitamos
da agenda democrático-popular da saúde1,2,5. para uma ordem de agressiva imposição de
Reafirmado na Constituição de 1988, esse fe- interesses mercantis, em que os recursos e
nômeno patrimonialista não apenas encontrou espaços institucionais que tornavam a vocali-
mutações como também ampliou sua capaci- zação da divergência política possível encon-
dade de bloquear e desestabilizar a invenção traram rápida dissolução. Em termos políticos,

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o golpe de 2016 foi um ataque revanchista monocraticamente, a Constituição, está no


contra a soberania popular e os seus lugares cerne do ‘golpe jurídico’ de 201612. Além do
de expressão na democracia. Como estamos impeachment sem caracterização adequada
formulando, mais que uma cassação do resul- de um crime de responsabilidade por parte
tado eleitoral ou perseguição a segmentos da da presidenta Dilma Rousseff, o amplo e rei-
representação político-partidária, o processo terado processo de quebra do devido processo
desencadeado alcançou a desconstrução da legal da Operação Lava Jato são evidências da
expressão política em sua forma democrática, efetiva ameaça que a judicialização da política
que, como estamos vendo com a pandemia, é representa para a democracia brasileira13.
imprescindível para a sustentação institucional No Brasil pós-constituinte, o direito co-
da autoridade sanitária do SUS. Com o golpe letivo não recebeu das instâncias judiciais o
de 2016, reiterava-se o dilema da fundação da tratamento público e universal que a saúde
democracia brasileira que consistiu na afirma- encontrou na tradição sanitarista. Pelo con-
ção de direitos sem a devida correspondência trário, o que se desenvolveu foi a judiciali-
na democratização dos fundamentos do poder zação do direito individual como forma de
de Estado e de sua reprodução. acesso a serviços e remédios particularmente
Ao encontro dos interesses do circuito em- onerosos, não raro, estimulada por indústrias
presarial na saúde, a hipertrofia do sistema farmacêuticas e de medicina diagnóstica, em
judicial brasileiro empobreceu os espaços detrimento de uma avaliação das prioridades
democráticos de decisões e conflitos políti- públicas do sistema14. O não julgamento da in-
cos produtores da cidadania e amplificou a constitucionalidade da EC-95, que desconstrói
deslegitimação dos demais poderes do sistema direitos coletivos previstos na Constituição de
político. Vista como uma tendência nas de- 1988, é outro elemento que evidencia os limites
mocracias ocidentais, a autonomização do democráticos da tradição jurídica brasileira e
judiciário em relação aos controles democrá- que contribui para a alienação da autoridade
ticos produziu uma judicialização crescen- sanitária do SUS.
te da política, variando pragmaticamente o O cotejamento das tensões estruturais que
seu juízo, progressista ou antidemocrático, a via jurídica repõe à afirmação da cidada-
segundo diferentes contextos. nia ativa como fonte soberana dos direitos
Segundo Avritzer et al.7, a judicialização é não se confunde com a desconsideração da
potencialmente mais perigosa à democracia – sua centralidade para a afirmação da própria
quanto menos democrática a organização do democracia. Ao contrário, a documentação
sistema nacional de justiça, mais alargado o seu das distorções dos fundamentos republicanos
campo da jurisdição deliberativa e precário o democráticos presentes no judiciário se ocupa
controle das instâncias democráticas eletivas de recuperar o entendimento de que, relativi-
sobre o seu funcionamento. Considerando zada a soberania popular como seu princípio
essas dimensões, é possível identificar que, fiador, restará um poder aberto à influência
no Brasil, o sistema de justiça não sofreu uma dos interesses mercantis oligárquicos.
reforma democrática profunda após o regime Outro momento em que a democratização
militar. Na verdade, ampliou suas funções do poder não se materializou na Constituição
discricionárias de controle constitucional e de 1988 e que repôs limites crescentes aos
deliberação, mantendo-se fortemente marcado propósitos do SUS se encontra no plano da
por dimensões corporativas que resistem ao comunicação15. A condição oligopolizada e
controle público. Como analisou Wanderley mercantil do sistema midiático brasileiro opera
Guilherme dos Santos, a compreensão de desde a origem do SUS como ator de veto ao
que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem reconhecimento público da sua autoridade
poderes ilimitados de interpretar, inclusive sanitária. O fosso que se pode identificar entre

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a crítica equilibrada das potencialidades e fim da ditadura militar, não houve Justiça de
limites do SUS, como o faz prestigiados centros Transição para a retomada da convivência de-
nacionais e internacionais de estudos, e a re- mocrática no Brasil, senão muito parcialmente,
presentação massiva e unilateral do ‘SUS pro- por meio da dinâmica de memória e repara-
blema’15, sempre operou como uma forma de ção dos atingidos do regime. Certamente, a
confinar a agenda sanitária a uma verdadeira perseguição reiterada ao padrão masculino,
condição de semiclandestinidade. O apren- negro e pobre que compõe a dimensão mais
dizado é que sem uma formação democrá- popular brasileira é um legado desse vetor
tica da opinião pública, com a comunicação de desagregação democrática17. As linhas de
mantendo-se como recurso concentrado de influência política da militarização no pós-1988
poder político, as campanhas pela superação vão desde a manutenção do seu controle sobre
dos gargalos financeiros do SUS sempre en- a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e o
contraram dificuldade de se enraizar no coti- Ministério da Defesa e do papel desempenha-
diano dos cidadãos. Permanecendo como um do pela Justiça Militar até a presença de uma
cidadão sem voz, o SUS seguiu até a chegada ‘bancada da bala’ no Congresso brasileiro. As
da pandemia sendo representado como caso funções assumidas pelas forças armadas na
reiterado de fracassos para boa parte dos seus manutenção da ordem interna por ocasião
próprios usuários. da ECO-92, durante o governo FHC, na re-
Ao problema tradicional da assimetria alização das Olímpiadas, no governo Dilma,
de fala e, portanto, de corrupção da opinião e a descarada intervenção militar no Rio de
pública9, soma-se a atuação dos novos cir- Janeiro decretada por Michel Temer atestam
cuitos de mídia. Ao lado dos Estados Unidos o programa repressivo na vida civil brasileira.
da América e da Inglaterra, o Brasil tem-se Neste momento de pandemia, essa ver-
destacado quanto à interferência das mídias tente da militarização chegou ao centro do
sociais em assuntos públicos16. Controlados a SUS, e abate agora o Ministério da Saúde,
partir de grandes provedores corporativos glo- desarticulando toda uma memória de gestão
balizados, as novas mídias se valem de grandes técnica acumulada em décadas de trabalho
bancos de informação sobre cidadãos mantidos dos sanitaristas. A ocupação de cargos-chave
por empresas e governos para interferir na no ministério por militares implica ana subs-
formação da opinião pública e sobre questões tituição da competência dos quadros técnicos,
políticas da vida em sociedade. comprometendo a manutenção de programas
Os sentidos mercantis da comunicação pre- e políticas amadurecidas nos duros conflitos
sentes na democracia brasileira têm produzido travados pelos sujeitos políticos da Reforma
um verdadeiro processo de silenciamento das Sanitária. Essa experiência é, sem dúvida, um
lutas populares pelo direito básico e universal caso extremado mas não externo ao impasse
à saúde. No contexto da pandemia, não deixa histórico da violência institucionalizada que
de ser revelador e trágico que seja o Jornal permaneceu atuante na redemocratização
Nacional, ao lado de um ‘consórcio das mídias brasileira. O processo de recrudescimento
tradicionais’, que se destaque como porta-voz das dinâmicas repressivas se faz pari passu
cívico da racionalidade de uma autoridade sa- ao constrangimento dos espaços de negocia-
nitária, e não as instituições da saúde coletiva. ção e pactuação democráticas vitais ao SUS,
Outro vetor de corrosão do princípio da favorecendo o espraiamento das iniciativas
soberania popular e que afeta a autoridade mercantis. A convergência de forças militari-
sanitária do SUS tem sido o da militarização, zadas com interesses de mercado no assédio
que bloqueou, desde 1988, as políticas de às democracias não é um fenômeno inédito na
segurança pública de um princípio de afir- América Latina, como bem evidencia a triste
mação cidadã de direitos humanos. Como o experiência chilena, de 1973 a 1990.

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Como estamos procurando discutir, a des- do poder, de participação direta ou semidireta


construção da autoridade sanitária do SUS de controle da representação, a formação de
– de fragilização da sua institucionalidade e uma opinião pública democrática, a regula-
capacidade técnica – expressa um problema ção da economia pelos institutos da soberania
de fundação da própria democracia brasileira: popular, a subordinação do poder judiciário às
afirmar direitos sem democratizar lugares im- suas fontes originais e populares de legitima-
portantes de reprodução do poder. Com esse ção, sempre foram fortemente relativizadas.
entendimento, a dificuldade sanitarista de se Como aponta Wendy Brown20, a maior
fazer núcleo dirigente da política de saúde no vitória do neoliberalismo tem sido a sua capa-
contexto da pandemia pode ser entendida como cidade de definir-se como caminho único aos
um problema de afirmação política da própria desafios coletivos no século XXI. O que resulta
soberania popular. O complexo cruzamento de em reconstituir a gramática da política a partir
interesses não republicanos do mercado com da sua razão econômica, distanciando radi-
os princípios do militarismo, da judicialização calmente as forças populares dos processos
da política e do silenciamento histórico da voz políticos que afetam a vida coletiva. O centro
sanitarista praticado pela mídia oligopolizada da crítica neoliberal ao chamado liberalismo
está na raiz desse processo. social ou keynesiano é que a dinâmica do sufrá-
A memória, o ideário e a prática política das gio universal levaria a uma demanda crescente
democracias são, antes de tudo, fatos políticos pela criação de novos direitos, gerando uma
em disputa. Em que pesem os registros históri- irracionalidade econômica e, pior, o aumento
cos de que o moinho das democracias sempre opressivo da presença do Estado contra a liber-
foi impulsionado pela luta de oprimidos contra dade dos indivíduos. A aceitação da universa-
os sistemas de desigualdades, no século XX, lização do direito de voto, que se consolidou
ela se projetou como uma larga evolução do no liberalismo democrático do pós-guerra, não
liberalismo oligárquico18. Essa condição, com- deveria ser mesmo confundida com a aceitação
parece, por exemplo, na influente reflexão de plena do princípio da soberania popular.
T. H. Marshall19(84), para quem os direitos de Thomas Briebricher21 identifica três argu-
cidadania seriam “instrumentos corriqueiros mentos centrais contra a soberania popular nas
da democracia moderna [que] foram aperfeiço- teorias neoliberais. A dinâmica de rent-seeking,
ados pelas classes altas e, então, transmitidos, que é intrínseca aos processos eleitorais nas
passo a passo, as mais baixas”. democracias, levaria a que os políticos, em
No seu processo de cristalização teórica, o nome de maximizar votos, operassem uma
liberalismo substituiu a noção de soberania corrida sem limites para atender às demandas
popular republicana democrática por uma de seus clientes, onerando abusivamente o
noção de soberania do poder que se autolimi- Estado. A partir daí, o melhor caminho seria
taria no plano econômico, reconhecendo como o de autarquizar as principais decisões do
legítima a desigualdade estruturante do capi- processo de soberania popular, conferindo
talismo. Além disso, a tradição liberal passou às instituições econômicas uma autoridade que
a vincular o direito à liberdade de expressão se autolegitima, eliminando, conforme propõe
cidadã ao mercado de imprensa em expan- a tradição da Escola de Chicago, o constran-
são, carente de regulação e controle social. gimento de as minorias proprietárias terem
A própria noção de um ‘Estado de direito’ que se submeter às maiorias.
resguardado por uma ordem jurídica auto- Com o neoliberalismo, consolida-se a radi-
nomizada da esfera da política deslegitimaria calização do ataque ao princípio da soberania
o constitucionalismo democrático fundado na popular, que não deve ser mais relativizada,
soberania popular. Nas democracias liberais, mediada ou negociada, mas anulada. Na ex-
enfim, o princípio da legitimidade ascendente periência brasileira, essa condição conecta o

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processo e o programa de reformas do estado de Saúde, realizada em 1986, tornou-se um


operado nos governos FHC com a estação de- momento fundador da Reforma Sanitária, por,
finitiva de transformações aceleradas após entre outros motivos, abrir-se, de forma inédita,
2016. Em essência, procuram revogar o eixo a essa participação popular ampliada. Atesta a
constitucional ao qual vinha se dando a re- relevância das lutas populares o veto inicial do
cortada expansão cívica desde o pós-1988. então presidente Fernando Collor a todos os
Na próxima seção, discutiremos como esse artigos relativos à descentralização e ao con-
processo de desidratação dos espaços políticos trole social presentes naquela que seria a Lei
de constituição de uma cidadania sanitária Orgânica da Saúde, em 199025. Já em junho de
ganhou sua forma histórica. 2014, passados 24 anos, essa reação conserva-
dora voltaria ao primeiro plano da vida pública
nacional para se colocar contra a edição do
Impactos da crise política Decreto nº 8.243 pautado por Dilma Rousseff,
na saúde que visava implementar a Política Nacional
de Participação Social. O tom de indignação
No dia 27 de maio de 1986, um segmento ex- que marcou o contraponto de deputados, se-
pressivo de moradores da Baixada Fluminense nadores, empresários, articulistas e editoriais
fechou a movimentada Rodovia Presidente jornalísticos26 revelaria novamente que as
Dutra com o objetivo de chamar a atenção das formas participativas de exercício da política
autoridades para os problemas de saúde da permaneciam enquadradas como uma ameaça à
região. No ano anterior, a fiscalização popular própria democracia. Ato contínuo, essa aversão
organizada pelos ‘Conselhos Comunitários de ao ativismo popular se consolidaria, em 2019,
Saúde’ de Caxias, Nilópolis, São João de Meriti com o Decreto nº 9.759/19, editado por Jair
e Nova Iguaçu, compostos por associações Bolsonaro. A iniciativa visava à supressão de
de moradores, médicos, igrejas e pela Ordem 35 órgãos de participação democrática, como o
dos Advogados do Brasil (OAB), já havia con- Conselho Nacional de Combate à Discriminação
seguido mudar o chefe de Medicina Social e Promoção dos Direitos de LGBT, a Comissão
do Instituto Nacional de Assistência Médica Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo,
da Previdência Social (Inamps), e levado ao o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso e
descredenciamento serviços particulares, por a Comissão Nacional de Política Indigenista.
mal funcionamento22. Mais que um desconforto, a voracidade do gesto
Essa consciência do caráter político da saúde deixava patente a demofobia da tradição política
se articulava nacionalmente com o Movimento conservadora brasileira, que, reiteradamente,
Operário Popular em Saúde (Mops), que, anos procurou reproduzi-la no plano institucional.
antes, no VII Encontro Regional de Saúde No período que separa os governos Collor e
Popular, definira a luta pela saúde “a partir de Bolsonaro, as instâncias de participação social
decisões tomadas pelo povo, sem fazer conces- se consolidaram como um modo de disputa
sões”23. A afirmação desse “poder popular” por política e ampliação dos direitos sociais. Como
meio da participação em conselhos gestores indicam diversos estudos, a partir de 2003,
se tornaria uma das principais inovações de- essas formas participativas de exercício da ci-
mocráticas da Constituição de 1988. dadania se tornariam paradigmáticas. No caso
Em 2019, existiam cerca de 36 mil Conselhos das Conferências Nacionais, 70% delas seriam
Municipais de Políticas Públicas no País, que, na realizadas pela primeira vez entre 2003 e 2011,
área saúde, alcançava 97% dos municípios24. Os somando um total de 74 edições, envolvendo
anos de formação dessa estrutura democrática aproximadamente 5 milhões de pessoas27.
participativa revelam mesmo uma estação de O contraponto às possibilidades criadas pela
lutas políticas. A VIII Conferência Nacional participação democrática desde 1988 tem seu

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enraizamento vinculado aos circuitos sociais e 5 senadores, além de 5 governadores e da presi-


sujeitos políticos orgânicos às instituições do dente da República”29(98). É parte dessa forma
mercado. Na resistência de Fernando Collor, de fazer política, o evento que reuniu mais de
a orientação tinha lastro em sua equipe eco- 20 corporações ligadas à saúde suplementar,
nômica, como destacou Paim25. Na oposição à em 2016, para fomentar a criação dos chama-
iniciativa de Dilma Rousseff, a Federação das dos planos populares de saúde30. À época, já
Indústrias do Estado de São Paulo chegou a na gestão Temer, a proposta foi formulada e
formular que a sociedade deveria “rejeitar tal encaminhada à ANS sem que nenhuma repre-
ação autoritária”28. À época, em editorial, o sentação dos conselhos gestores ou mesmo
jornal O Globo já havia afirmado que o ‘decreto que as instituições da saúde coletiva fossem
agride a democracia’ posto que se tratava de ouvidas30. Nos circuitos oligopolizados das
um ‘golpe de gabinete’26. A essa convergên- empresas de mídia, ao lado da divulgação do
cia entre grandes empresários e oligopólios ‘SUS problema’, reportagens pagas pelo setor
de mídia, somaram-se a representação de suplementar faziam o trabalho de divulgar os
parlamentares e os segmentos das camadas novos planos populares como uma boa opor-
médias, que, àquela altura, já se valiam da tunidade para os negócios31.
gramática espúria que se tornaria usual nos O contraste em termos de recursos de poder
anos seguintes. entre os sujeitos políticos que lutam pela agenda
A deslegitimação dos processos e dos resul- sanitarista e os atores articulados pelos interes-
tados alcançados pelas formas mais populares ses do mercado suplementar é historicamente
de participação, a desautorização e a crimi- notável. Sendo essa uma condição persistente
nalização dos seus resultados, tipicamente no arranjo institucionalizado pela Constituição
recepcionados na chave do aparelhamento de 1988, após 2016, o estreitamento dos canais
da máquina pública, da infiltração de grupos de construção e pactuação políticas do SUS nos
inclinados à corrupção e desmandos, devem ensina que, com o enfraquecimento da política
ser reconhecidas como uma gramática polí- cidadã e participativa, impõem-se os termos da
tica da tradição conservadora brasileira. Tal razão mercantil.
perspectiva compõe uma das estruturas que Como estamos formulando, a autoridade
atuaram decisiva, e mais intensamente, na sanitária do SUS deve ser compreendida a partir
desagregação da ordem democrática em 2016. da vitalidade política da sociedade brasilei-
A contraface dessa narrativa que procura ra. Constrangidos os sujeitos políticos e seus
deslegitimar a influência da participação am- espaços de mobilização, pactuação e conflito
pliada nas decisões políticas é a naturalização que permitem o cultivo desse poder soberano, a
dos circuitos institucionais em que os interes- capacidade institucional do SUS torna-se ainda
ses corporativos empresariais são encaminha- mais vulnerável às forças desconstituidoras dos
dos. Como atestam diversos estudos, o lobby seus princípios. No contexto da pandemia, ações
das empresas da saúde se estende a um grande como aquelas que vêm sendo desenvolvidas
espectro político-partidário dos poderes le- pela Central Única das Favelas e outras associa-
gislativos e executivo29, faz-se presente nas ções comunitárias, mobilizando comunidades,
instâncias da Agência Nacional de Saúde pensando propostas e estabelecendo redes de
Suplementar (ANS)29 e na editorialização das comunicação, materializam resistências fun-
corporações de mídia. Em 2010, as principais damentais à sustentação do SUS32.
empresas da saúde suplementar “destinaram Nessa perspectiva, além dos lugares do
R$ 11,8 milhões em doações oficiais para as controle social aqui avaliados, outros atores
campanhas de 153 candidatos a cargos ele- importantes para o enriquecimento do sentido
tivos”, contribuindo para a “eleição de 38 republicano da saúde são o CNS, o Conselho
deputados federais, 26 deputados estaduais, Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o

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Conselho Nacional de Secretarias Municipais Em 2016, em meio aos intensos protestos da


de Saúde (Conasems). A atuação desses sujei- sociedade civil, greves e ocupações estudantis
tos políticos nas principais articulações em que ocorreram nas escolas e universidades
torno do financiamento do SUS está registrada públicas de todo o País contra a ‘lei do teto
em momentos como a criação da Contribuição de gastos’, os representantes da Febraban e
Provisória sobre Movimentação Financeira do Banco JP Morgan do Brasil compunham
(CPMF), em 1997, a campanha pela EC 29, em forças contrárias no Congresso Nacional.
2000, o movimento ‘Saúde +10’, iniciado em Concomitantemente, o presidente do Banco
2012, e, mais recentemente, a ‘Marcha pela Central, Ilan Goldfjan, ex-economista-chefe
Vida’. No contexto da pandemia, uma iniciativa do Itaú Unibanco, executava uma intensa
marcante é a construção do ‘Painel CONASS agenda pública midiatizada angariando apoio
COVID-19’, que, em 2020, vem marcando um ao tema34. Em 2018, Goldfjan seria eleito o
contraponto decisivo à censura do governo melhor banqueiro entre os presidentes de
federal do número de vítimas da Covid-19. bancos centrais do mundo pela revista britâ-
As contradições internas desses espaços e nica ‘The Banker’, do grupo Financial Times35.
os limites das ações desempenhadas, decerto, No momento de fundação do SUS, é pos-
existem e não devem ser descartados33. A sível identificar que, na contraface dos movi-
título de exemplo, recentemente, foi possível mentos que almejavam a republicanização do
acompanhar o apoio do Conasems às refor- direito à saúde, atuavam distintos segmentos
mas no modelo de financiamento da PNAB, empresariais, organizados em instituições
cujos impactos negativos já se fazem presen- como a Federação Brasileira de Hospitais e a
tes na estrutura da Atenção Primária à Saúde Associação Brasileira de Medicina de Grupo.
(APS)3. Não são poucas as fronteiras; contudo, Nos 32 anos de construção do SUS, essas
o constrangimento das lutas travadas nesses frentes de exploração mercantil da saúde pas-
espaços, o desrespeito e a deslegitimação a saram por importantes mutações, operando o
seus trâmites e sujeitos políticos exprimem, movimento de enraizamento de sua agenda no
em boa medida, a natureza política do processo momento mesmo em que se expandia a assis-
de desconstituição da democracia brasileira, tência pública. Na virada dos anos 1990 aos
que se agrava aceleradamente com a eleição anos 2000, como identificado por Faleiros36,
de Jair Bolsonaro. as corporações de mercado deslocariam a tese
Na área da saúde, o movimento de contra- do confronto com os sanitaristas para o campo
ção da política e expansão da influência dos da convergência, da parceria e da colaboração
interesses mercantis ficou claramente definido entre os interesses privados e os objetivos pú-
com o teto de gastos apontado pela EC 95/16. blicos. Não obstante, como explica a autora,
Explorando seus sentidos políticos, o primeiro a agenda empresarial se mantinha articulada
entendimento é que a constitucionalização em torno de pautas como a diminuição da
desse regime fiscal expressa com precisão a carga tributária sobre produtos e serviços de
força da coalizão político-empresarial e finan- saúde, a flexibilização da legislação trabalhis-
ceira que assumiu a presidência com Temer, ta e a abertura ao capital estrangeiro. Nesse
em 2016, em meio a forte influência dos meios fluxo, Sestelo37(21) identificou ainda a atuação
jurídicos7,13. Com a referida emenda, a eco- de “grupos econômicos globais no controle e
nomia passava a se tornar imune a qualquer intermediação comercial das operadoras de
controle democrático, expressando, de forma seguros de assistência à saúde”.
bruta, que a plena realização dos interesses do A concepção fiscalista da economia, que
mercado exige a restrição e a censura das prá- opõe a organização das contas públicas à di-
ticas políticas dos trabalhadores, pensionistas, mensão social dos direitos, exige uma com-
desempregados, e outros segmentos sociais. plexa arquitetura de poder para se impor. No

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Brasil, com os governos FHC, um conjunto Covid-19, existem razões políticas para a sua
particular de circunstâncias históricas favo- expansão massiva. O caos cotidiano repor-
receu essa imersão. Nesse processo, o trabalho tado nos meios de comunicação documenta
de dogmatização da linguagem das ‘reformas’ os efeitos mais sensíveis da desconstituição
na vida nacional contou com a normalização sanitária do sistema, presente desde a falta de
de expressões como ‘gerencialismo’, ‘flexibili- respiradores e equipamentos de segurança,
zação’, ‘desburocratização’ e ‘ajuste fiscal’. No passando pela a carência de leitos públicos de
bojo das transformações que essa gramática Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e profis-
política estimulava, no ano 2000, a chamada sionais de saúde, à corrupção que comparece
Lei de Responsabilidade Fiscal abriu caminhos nas parcerias privadas para implantação dos
extraordinários à participação privada na or- hospitais de campanha.
ganização dos serviços públicos, limitando o Entre março e junho de 2020, mais de 430
quadro de pessoal e atingindo dramaticamente mil profissionais da saúde foram infectados
os municípios1. No SUS, o seu impacto é sensível. pelo novo coronavírus, dos quais 19,21% foram
Em 2016, considerando apenas o estado de a óbito. Ao todo, o Brasil já ultrapassa os 70 mil
São Paulo, 58% dos estabelecimentos públicos mortos e se aproxima da marca de 2 milhões de
de saúde eram gerenciados por Organizações infectados, desproporcionalmente concentra-
Sociais de Saúde (OSS), e as 10 maiores em- dos nas trabalhadoras e trabalhadores pretos
presas do setor já estavam presentes em 17 e pardos das periferias. Se com o ex-Ministro
estados do País38. Considerando a administra- Mandetta havia uma autoridade sanitária
ção pública estadual do Rio de Janeiro, atual- parcial, a todo momento deslegitimada por
mente existem 14 OSS responsáveis pela gestão Bolsonaro, com Nelson Teich, criou-se um
de todas as Unidade de Pronto Atendimento vácuo inoperante. Com o general Pazuello,
de Saúde e 15 hospitais. Analisando o quadro houve um verdadeiro sequestro do Ministério
de servidores da Secretária de Estado de Saúde da Saúde, em que o ato de maior impacto do
do Estado do Rio de Janeiro (SES/RJ), entre general interino tem sido o de tentar mascarar
2014 e 2020, o modelo de gestão terceirizada o número de mortos, formando os novos de-
motivou a redução em 54% do seu pessoal saparecidos políticos do novo coronavírus. Na
concursado39. Em substituição, uma variedade ausência de condições democráticas, a desins-
significativa de contratos flexibilizados e ter- tituição da autoridade sanitária do SUS abre
ceirizados de trabalho passou a predominar caminho a um genocídio – e, como tal, a morte
nessa repartição do estado. No município do evitável de cada cidadão e cidadã brasileiros
Rio de Janeiro, a flexibilização dos vínculos deve ser compreendida como crime político.
trabalhistas, proposta como virtude central
dos modelos gerenciais de gestão, favoreceu
nos últimos anos o descredenciamento de um Em busca de uma
quarto das Equipes de Saúde da Família. Em autoridade sanitária
plena pandemia, esse processo de desmonte
culminou com a desassistência de mais de 1
democrática nacional
milhão de pessoas dos serviços da APS.
O estudo das determinações políticas que O sequestro do poder instituinte do povo funda
operam na desconstituição da autoridade sani- o grande risco do SUS. Essa afirmação implica
tária do SUS contribui para compreender por denunciar que o fiador das democracias não é
que o País é o segundo em número de vítimas e não se prende aos humores do mercado, não
fatais e contaminações pelo novo coronavírus se confunde com o sistema judiciário e não
no mundo. Como estamos problematizando, emana das forças armadas ou de grandes cor-
para além da dinâmica de contágio própria da porações de mídias. Na experiência brasileira,

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os movimentos de ruptura democrática sempre Bispos do Brasil (CNBB), da OAB a Centrais e


foram, a bem da verdade, iniciativas dessas Sindicatos de diversas categorias trabalhistas,
vertentes oligarquizadas de poder. A constru- passando por dezenas de associações profis-
ção da autoridade sanitária do SUS, fruto das sionais e de lutas por direitos humanos. No
lutas ascendentes do poder nos últimos 30 anos, documento ‘Plano Nacional de Enfrentamento
coloca-se, portanto, como um movimento de à Covid-19’, encontra-se um rigoroso programa
resistência a essas forças políticas. do direito à vida do povo brasileiro. Ao encon-
As dimensões políticas que impulsionam a tro dessa força cívica sanitarista, as iniciativas
Covid-19 foram aqui compreendidas no bojo do Consórcio do Nordeste, estruturadas em
dos processos mercantis que sempre pro- torno do seu ‘Comitê Científico de Combate ao
curaram se impor sobre os espaços da luta Coronavírus’, materializam encaminhamen-
política. A esse movimento de colonização já tos e medidas que representam verdadeiras
identificado na tradição de estudos da saúde experiências políticas de resistência ao nega-
coletiva, procuramos apontar a convergên- cionismo selvagem bolsonarista. Governados
cia dos vetores regressivos não superados na por variados espectros das esquerdas e centro-
Constituição de 1988, em que destacamos a -esquerdas, o Consórcio se torna ainda mais
militarização, a comunicação oligopolizada importante por evidenciar a necessidade de se
e a judicialização da vida política. alinhar definitivamente à tradição sanitarista
Com essa perspectiva, apontamos que os no centro desses programas partidários.
efeitos mais duros da pandemia do novo coro- O terceiro movimento, particularmente
navírus denunciam uma aguda desagregação notável, tem sido a energia e a capacidade de
do demos, da fragilização da sua capacidade articulação e resistência dos diversos coletivos
de se impor como a referência legítima ao das populações de favelas no Rio de Janeiro,
exercício do poder. Dito de outro modo, a em São Paulo, em Salvador e em outras capi-
democratização do poder continua sendo o tais brasileiras. O protagonismo de institutos
mistério político que se impõe ao alargamento como o Raízes em Movimento, a Frente de
dos direitos de cidadania no Brasil. No âmbito Mobilização da Maré e o Comitê Comunitário
do SUS, esse enclave à realização do interes- de Enfrentamento da COVID-19 nos bairros
se popular se materializa com os processos populares de Salvador é referência da vita-
privatistas que interditam a realização plena lidade necessária à reconstituição histórica
dos seus objetivos públicos e universalistas. dos fundamentos republicanos do poder. O
Atualmente, o País parece se encontrar vínculo entre entidades e quadros sanitaristas,
em uma situação de impasse: não se enfrenta coalizações político-partidárias progressistas
consistentemente a pandemia, e não se retoma e ações populares estão na concepção do SUS.
as linhas vitais da economia. Mantida essa Na atual conjuntura, é fundamental fazer con-
condição, os estudos epidemiológicos projetam vergir essa dinâmica política para efetivar a
um futuro cinza, entregue à contingência que construção de uma permanente autoridade
a pandemia for capaz de ditar. No revés dessa sanitária democrática nacional, alternativa,
contra-autoridade estatal, que é hoje antis- em tudo, ao governo Bolsonaro.
sanitarista, é possível identificar caminhos Com a pandemia, o SUS veio ao centro da
vigorosos de reconstrução da democracia. Em vida nacional, tornando-se um fato político
seu centro, encontra-se o movimento Frente potencialmente desestabilizador do ethos
Pela Vida, liderado pelas principais entidades neoliberal. A expansão da sua legitimação
sanitaristas do País, e apoiado por mais de no plano dos valores públicos assenta a com-
400 organizações da sociedade civil, indo do preensão de que, sem o SUS, não superamos
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem essa pandemia. A esse sentimento público e
Terra (MST) à Conferência Nacional dos às energias políticas organizadas das forças

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que desde já disputam o futuro do SUS e da precária e provisória. Não existe democracia
democracia brasileira, não deve, no entanto, sem sentimento de república.
escapar o entendimento de que esse é um
processo de recriação, e não de recuperação
da ordem anterior. A atenção aos circuitos Colaboradores
concentrados de poder e do seu vínculo com
as exigências mercantis do neoliberalismo Santos RT (0000-0002-0125-7700)* e
constitui parte central da agenda. Como a Guimarães JR (0000-0003-0218-3405)* con-
história nos ensina, a perpetuação desses tribuíram igualmente para a elaboração do
impasses políticos fará de qualquer tentativa manuscrito. s
democrática no Brasil uma experimentação

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