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Rev. Inst.

Aâolfo Lutz
34: 29-34, 1974.

DETERMINAÇÃO DO SEDIMENTO, CASCAS E PAUS NO


CAFÉ TORRADO E MOlDO 1,

Fernando Cervifio LOPEZ **

RIAL-A/396

LOPEZ, F. C. - Determinação do sedimento, cascas e paus no café tor-


rado e moido. Reo. Inst. Aâotto Lutz, 34: 29-34,1974.

RESUMO: Neste trabalho foi descrito método para determinação


do sedimento e cascas no café de consumo, torrado e moído. Consiste
no desengorduramento parcial do material com solvente orgânico para
separar o sedimento e deixar o pó solto, penei ração para livrar a amos-
tra do pó (que não é de interesse na observação à lupa), separação
das impurezas e pesagem. No cálculo final, usou-se o fator de conversão
para reverter o peso encontrado em peso de impurezas no café verde.

DESCRITORES: café (torrado e moído), determinação do sedi-


mento e cascas.

I N T R O D U ç Ã O No Brasil, as fraudes mais freqüente-


mente cometidas no café torrado e moído
O método que ora apresentamos tem são: presença de cascas do café, paus, milho
por finalidade a determinação das impure- torrado, açúcar, cacau torrado, terra, areia,
zas provenientes do beneficiamento imper- café esgotado etc.
feito do café que deu origem ao produto A determinação de impurezas contidas
- café torrado e moído - assim como a em amostras de café torrado e moído é
determinação destas mesmas impurezas e baseada em método microscópico, no qual
de substâncias estranhas que são adiciona- a amostra é previamente tratada por sol-
das ao produto, com o propósito de frau- vente orgânico e as impurezas são separa-
dá-lo. O objetivo na elaboração do método das e pesadas. O peso obtido na determi-
não foi somente a pura e simples separação nação das cascas é multiplicado por um
e pesagem das impurezas, mas sim, na ava- fator para restabelecer o peso original das
liação das mesmas, reproduzir com fideli- mesmas, antes de torradas e moídas.
dade as diversas operações pelas quais o Das cascas são computados o epicarpo-
produto passa na indústria. mesocarpo e o endocarpo. O espermoder-
As impurezas mais comuns no café ma, ou película do café, é considerado ele-
torrado e moído são as oriundas do trata- mento natural do café torrado e moído e
mento do fruto do cafeeiro, para livrar a só é tido como fraude quando presente em
semente de seus envoltórios. quantidade excessiva.

* Realizado na Seção do Café do Instituto Adolfo Lutz, São Paulo, S.P.


ea Do Instituto Adolfo Lutz.

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LOPEZ, F.C. - Determinação do sedimento, cascas e paus no café torrado e moído. Rev. Inst. Adoljo
Lutz, 34: 29-34, 1974.

Nessa determinação, preliminarmente, o torradas em pesos de café cru e de cascas


analista deve levar em conta os caracteres cruas.
organolépticos da amostra pois, conforme o As estruturas dos componentes das cas-
caso, poderão servir de orientação. O as- cas - epicarpo-mesocarpo e o endocarpo
pecto e o aroma, por exemplo, ficam sensi- - são muito diferentes, assim como o com-
velmente alterados quando a quantidade de portamento dos mesmos quanto a torração
impurezas é grande, ou quando está presen- e moagem. Para se obter um fator de
te grande quantidade de café esgotado. conversão, no caso do café, não se pode
A homogeneização perfeita das amos- usar qualquer amontoado de cascas, pois
tras de café torrado e moído, que contém seria impossível conseguir resultados con-
cascas, é difícil devido ao formato das par- cordantes. Na elaboração do método, foi
tículas de cascas (chatas) e ao das par- usada, em cada determinação, a mesma pro-
tículas de café (arredondadas)). Portanto, porção em que os componentes das cascas
nas porcentagens baixas, onde é exigido são encontrados no café em coco.
maior rigor, quanto maior a tomada de Os paus (pedúnculos das cerejas ou
amostra tanto mais representativa ela será. fragmentos do cafeeiro), embora sejam
computados, não foram estudados, quanto
O tratamento por solvente orgânico
ao comportamento na torração e moagem,
(clorofórmio, tricloroetileno etc.) , a frio,
por representarem, em milhares de amos-
tem por finalidade: a) retirar parcialmente
tras analisadas, menos de 10% do peso das
o óleo e, assim, desprender o pó fino que
cobre as partículas tanto do café como das cascas.
impurezas; b) aumentar o contraste entre No café em coco, as cascas estão na
as partículas e as impurezas; as cascas do seguinte proporção: 65% de epícarpo-meso-
café não contêm óleo mas, como no Brasil carpo e 35% de endocarpo (base seca); o
epícarpo-mesocarpo tem, em média, 17% de
se torra excessivamente o café (torração
apertada), este chega a exsudar o óleo que, umidade e o endocarpo, 13%. Pela torra-
por contacto, passa para as cascas, deixan- ção, após retirar a umidade, o epícarpo-me-
do-as com a mesma cor do café; c) separar socarpo perde 28% e o endocarpo, 11%, em
o sedimento; o solvente deve ser de densi- peso (dados obtidos torrando-se as cascas
dade alta para permitir a perfeita separa- juntamente com o café).
ção do sedimento. Após a moagem, os cafés oferecidos ao
consumo apresentam uma variação de 30 a
Conforme o grau de torração e a gra- 70% de pó fino (tamís n,? 80) e, nesses
duação do moinho, o café e as cascas tor- limites, as cascas dão a seguinte proporção
radas oferecem maior ou menor resistência de pó fino (dados obtidos moendo, em moí-
à trituração, mas sempre dão formação de nho industrial, as cascas juntamente com
partículas mais ou menos grosseiras, e de o café):
pó fino. No exame à lupa, chamamos de
pó fino ao pó no qual é impossível, devido Café Epicarpo-mesocarpo Endocarpo
ao tamanho, separar as partículas de café
das de cascas; estão, neste caso, as partí- 30% 34% 8%
culas que passam em tamis n.v 80 USBS. 70% 39% 10%
Portanto, a finalidade de passar a amostra
em tamis n.O80 é separar o pó fino, a fim Pelos dados acima verificamos que a
de facilitar a catação das impurezas e evi- variação das cascas não é tão grande como
denciar as fraudes, quando presentes. a do café e podemos dar, como médios, os
A resolução n.O 465 do Instituto Brasi- seguintes resultados: epícarpo-mesocarpo
leiro do Café, que rege o assunto, trata 37%, endocarpo 9%.
apenas da quantidade de impurezas no café Somando-se todas essas perdas, conclue-
cru, cujo limite máximo permitido é de 1% se que o peso de cascas obtido na análise
(um por cento). Para a determinação de representa a metade do peso original (cas-
cascas no café torrado e moído impõe-se, cas cruas), daí a razão da multiplicação por
portanto, um fator de conversão que re- 2. Da mesma forma, é necessario restabe-
verta os pesos do café torrado e das cascas lecer também o peso da amostra. O café

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cru, ao ser torrado, perde 20% de seu peso Procedimento


e o café torrado e moído perde 10%, no
tratamento com clorofórmio. Portanto, o Retire a amostra por intermédio de uma
fator será 1,38. Simplificando os 2 termos colher de osso e passe a espátula nos bor-
(2 -7 1,38), teremos o fator final 1,45. dos para nivelar a superfície (peso aproxi-
No caso de altas porcentagens de cas- mado da amostra: 2 g). Em capela, trans-
cas, o fator deverá ser recalculado basean- fira a amostra da colher para um cálice
do-se nas perdas das diversas operações. cônico contendo 60 ml de clorofórmio. Com
No cálculo do fator para o sedimento a extremidade de um bastão de vidro, re-
0,25), leva-se em consideração apenas a per- volva, vagarosamente, a camada formada
da do café na torração. pelo pó de café, observando se há precipi-
tação de sedimento (areia, torrões, pedras,
terra, cristais de açúcar etc.). Em seguida,
MATERIAL E MÉTODO
agite, com o bastão de vidro, todo o conteú-
do do cálice, deixando a mistura de pó de
o material de exame é constituído por café e clorofórmio em contacto, durante 20
amostras de café torrado e moído, colhidas
minutos. Transfira a mistura para um fu-
pelo Serviço de Fiscalização do Instituto
nil com papel-filtro. O café aderente às
Brasileiro do Café e pela Divisão de Ali-
paredes do cálice, após evaporação do clo-
mentação Pública da Secretaria de Estado
rofórmio, é também transferido para o fu-
da Saúde - São Paulo, Brasil, para aná-
nil com auxílio de um pincel. Após filtra-
lise fiscal, e por amostras enviadas por par-
ção, transfira o papel-filtro com o pó de
ticulares, para análises de orientação.
café para uma placa de Petri e coloque em
uma estufa a 50°C,durante uma hora. Deixe
Preparo da amostra esfriar e, com o auxílio de espátula, retire
o pó do papel para a placa e homogeneize-o.
Espalhe a amostra em cartolina e mis-
ture bem, com movimentos da periferia
Sedimento
para o centro, com o auxílio de uma espá-
tula. Divida em 4 partes, fazendo 2 cortes
Material
perpendiculares, e misture 2 a 2 os qua-
drantes diametralmente opostos. Junte as Balança
2 metades e misture novamente, Observe Espátula de aço inoxidável
os caracteres organolépticos, pois poderão Cálice cônico de 75 ml
servir de orientação para a análise. Cilindro graduado de 100 ml
Bastão de vidro
Tratamento com clorofórmio Kitasato, 500 ml, com rolha atravessada
por tubo de vidro em forma de sifão
Material Papel-filtro qualitativo
Estufa a 50°C
Espátula de aço inoxidável
Pincel de pelo de marta
Lâmina de 12 x 2 em
Pesa filtro de 12 ml
Colher de osso, com capacidade de 2 g
Dessecador com cloreto de cálcio, anidro
aproximadamente
Lupa (aumento 20 X)
Cálice cônico de 75 ml
Lâmina de vidro de 76x 26mm
Cilindro graduado de 100 ml
Placa de Petri de 10 x 2 em Reagente
Funil de 7 em Clorofórmio
Pincel de pelo de marta
Papel-filtro qualitativo
Tubo de ensaio de 24 x 2 em Procedimento
Estufa a 50°C
Constatada a presença de sedimento,
Reagente pese 2 g da amostra homogeneizada e use,
Clorofórmio inicialmente, a mesma técnica já descrita

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no Tratamento com clorofórmio, revolvendo não atingirá o limite de 1% (levando em


com cuidado a camada de café até não haver consideração o sedimento, evidentemente).
mais precipitação do sedimento. Por inter- O analista deverá estar suficientemente
médio de um sifão de vidro, ligado em um preparado para saber, pela observação do
Kitasato, retire, usando vácuo e papel-filtro, sedimento e exame à lupa, se deverá
a camada de café sobrenadante e as par- prosseguir ou não com a análise.
tículas aderentes às paredes. Decante a No exame prévio, o analista deverá ob-
maior parte do clorofórmio do cálice, dei- servar, além das impurezas do café, as subs-
xando aproximadamente 5 ml, tendo o cuí- tâncias estranhas, como feijão, milho etc.
dade de não arrastar o sedimento. Coloque
o cálice na estufa a 50°C para evaporar o
Separação das cascas e paus
clorofórmio restante. Com o auxílio de um
pincel, transfira o sedimento para um pesa-
Quando, pelo exame prévio e pelo sedi-
filtro previamente seco em estufa, esfriado
mento formado, for observado que a amos-
em dessecador e pesado. Seque em estufa
tra poderá conter 1% ou mais de impurezas,
a 50°C durante uma hora. Deixe esfriar em
proceder-se-a à separação das cascas e paus
dessecado r e pese, Transfira o sedimento
pela técnica seguinte:
para lâmina e examine em lupa (aumento
20 X) a natureza do sedimento.
Material

Cálculo
Balança, 4." decimal
Tamis n.v 80, USBS
N X lOO
Placa de Petri
sedimento por cento (café cru) Lupa (aumento 20 X)
P X 1,25 Agulha de platina (cabo de Kolle)
N n.v de g do sedimento Lâmina de vidro (76 x 26 mm)
P n.O de g da amostra Papel-filtro
Estufa a lO5°C
1,25 = fator de conversão do peso de café tor-
rado e moído em peso de café cru
Pincel de pelo de marta
Pesa-filtro de 12 ml
Dessecador com cloreto de cálcio, anidro
Análise prévia
Procedimento
Como a grande maioria das amostras
recebidas para análise é constituída de cafés Homogeneize o pó de café tratado pelo
próprios para o consumo, convém que seja clorofórmio e pese de 0,1 a 0,5 g (a quanti-
feito um exame prévio no pó, tratado pelo
dade da amostra será inversamente propor-
clorofórmio, antes de prosseguir na análise,
cional à quantidade provável de impurezas
a fim de que seja evitada perda de tempo.
observadas no exame prévio). Transfira
Exame prévio - Junte, na parede da para um tamis n.v 80 e, com o auxílio de
placa, a amostra de 2 g de pó de café tra- um pincel, separe delicadamente o pó que
tado pelo clorofórmio, homogeneize-a e re- passa pelos crivos até não dar mancha
tire, com a ponta da espátula, uma porção sobre uma folha de papel branca.
equivalente a 0,2 g, aproximadamente, trans- Transfira o resíduo do tamis para a
ferindo-a para a tampa da placa. Espalhe tampa da placa de Petri. Espalhe as par-
em camada fina e observe em lupa com tículas e, em lupa aumento 20 X, com uma
aumento 20 X. Mude de posição as partí- agulha de platina, seca, separe dos grânulos
culas de pó, quantas vezes forem necessá- de café as partículas de cascas e paus, agru-
rias, para que a observação seja completa. pando-as em área livre da placa. Coloque
A presença de 1 ou 2 fragmentos pequenos uma gota de água destilada sobre uma lã
de cascas e paus indica que o pó de café é mina de vidro e transporte as cascas e paus,
perfeitamente normal, pois essa quantidade agrupados na placa, para a gota de água.

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Esta operação é feita molhando a ponta da muito próximo de 1%, convém repetir a anã-
agulha, a fim de se conseguir a aderência lise e dar, como resultado final, a média
necessária. Revolva a amostra e repita a dos totais obtidos.
operação quantas vezes forem necessárias,
até que todos os fragmentos de cascas e Para determinação quantitativa de frau-
paus tenham sido transferidos para a gota des, como as cometidas com feijão, milho
de água. Retire o excesso de água sobre a etc., o processo é o mesmo, variando apenas
lâmina, por absorção, com papel-filtro. Leve o fator de conversão de peso da substân-
a lâmina à lupa e separe das cascas e paus cia torrada e moída em peso da substância
os grânulos de café que foram, por acaso, crua, que deverá ser determinado para
arrastados pela agulha molhada. Transfira cada caso.
as cascas e paus para um pesa-filtro, previa-
mente aquecido em estufa a 105°C,esfriado
em dessecador e pesado. Coloque o pesa- RESULTADOS
filtro em estufa a 105°C, durante 1 hora,
deixe esfriar em dessecado r e pese.
O número de amostras analisadas pelo
método que ora apresentamos e que está
Cálculo sendo usado pela Seção do Café do Insti-
tuto Adolfo Lutz, São Paulo, Brasil, e os
N X 1,45 X 100 resultados obtidos, estão indicados na tabe-
cascas e paus por cen-
p to (café cru) Ia abaixo:

N = n.o de g de cascas e paus Até dezembro de 1971,o Instituto Brasi-


P = n.o de g da amostra leiro do Café forneceu a totalidade do café
1,45 = fator de conversão do peso do café tor- consumido pelas torrefações a um preço,
rado e moído e das cascas torradas e aproximadamente, 75% abaixo do preço nor-
moídas em peso de café cru e cascas
cruas. mal do mercado. A partir daquela data, o
IBC fornece uma quota correspondente a
60% do consumo, a um preço 60% abaixo
Determinação do total das impurezas do preço normal do mercado.

o total das impurezas por cento é o Pela tabela abaixo, caso seja suspenso o
resultado da soma das porcentagens do se- subsídio do lBC, é de se prever que o índice
dimento e das cascas e paus. Quando for condenatório suba sensivelmente.

Tabela estatística das amostras examinadas de café torrado e moído

Amostras
Porcentagem
Ano Amostras
Condenadas Aprovadas Total condenadas

1969 7 3.309 3.316 0,21

1970 74 2.311 2.385 3,1

1971 85 3.987 4.072 2,0

1972 120 3.102 3.222 3,7

1973 368 2.680 3.048 12,1

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LOPEZ, F. C. - Detection of sediment and peels in roasted ground


coffee. Rev. Inst. Aâotio Lute, 34: 29-34,1974.

SUMMARY: A method to detect sediment and peels in common


ground coffee is described in this work. The method consists in the
partial defatting of material by using an organic solvent agent, in order
to separate the sediment from the coffee powder, thus, causing the
latter to get loose-grained; sifting of material to discard the coffee
powder which is not interesting for observation through a magnifier;
separation and weighing of impurities.
In final calculation, a correction factor was used to convert the
weight obtained for roasted coffee into that appIying for raw coffee.

DESCRlPTORS: Coffee (roasted and ground) , detection of sedi-


ment and peels.

Recebido para publicação em 10 de maio de 1974.

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