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INTRODUÇÃO
“O imaginário urbano tem uma ligação muito forte com os destinos da contemporaneidade” (LIPPOLIS, 2006,
p.6).
“O triste destino do mundo contemporâneo parece estar fatalmente contido na dialética entre a descrição de
uma distopia catastrófica já em curso, levada a cabo por intelectuais, filósofos, sociólogos urbanos,
romancistas e cineastas, e a vontade dos artistas de encontrarem um triste refúgio em heterotopias urbanas”
(LIPPOLIS, 2006, p.8).
1. DISTOPIA
“a distopia, entendida como a descrição de um mundo em ruínas, é o gênero literário, surgido ao mesmo
tempo que a globalização pós-fordista dos anos 70, que melhor representa uma época em que o
capitalismo, levando a melhor sobre qualquer outra hipótese de sistema de vida e de organização
econômico-social, não pode deixar de ter como espelho o pesadelo da sua própria demolição” (MUZZIOLI
apud LIPPOLIS, 2006, p.12).
“O modernismo perdera qualquer aspecto de crítica social. O seu programa pré-político e utópico, baseado
na transformação de toda a vida social através da transformação do espaço, falhara, e o estilo moderno
acabara por se encontrar estreitamente ligado à acumulação do capital, num projecto de modernização
fordista caracterizado por racionalidade, funcionalidade e eficiência. Em 1972 [ano da demolição do conjunto
habitacional Pruitt-Igoe e marco na história da arquitetura e urbanismo] a arquitectura modernista estava
sufocada e bloqueada, exactamente como o poder das grandes empresas multinacionais que representava.
A estagnação-inflação na arquitectura avançava paralelamente à do capitalismo: não foi por acaso que
Venturi, Scott-Brown e Izenour publicaram Learning from Las Vegas precisamente em 1972. Na realidade, os
críticos do moderno estavam em circulação havia anos (...) e de certo modo o movimento revolucionário e
cultural dos anos 60 representara uma crítica à racionalidade, à funcionalidade e à eficiência. Mas foi
necessário que a crise de 1973 abalasse a relação entre arte e sociedade, para que o pós-moderno fosse
aceite e institucionalizado” (HARVEY apud LIPPOLIS, 2016, p.13).
“Hoje, como veremos nos próximos parágrafos, a metrópole ocidental é cada vez mais vista como efeito, mas
também como causa, de uma distopia em curso e de um apocalipse no futuro próximo” (LIPPOLIS, 2006,
p.18).
“A cultura de massas, em particular a literatura e o cinema de ficção científica, permite perceber a trama das
percepções colectivas de um momento histórico preciso e as mudanças sofridas por determinadas
instâncias. É o que tentaremos fazer através da análise de uma certa percepção literária e cinematográfica
da arquitectura e da vida urbana, que traduz uma sensibilidade apocalíptica do presente” (LIPPOLIS, 2006,
p.21).
“Desde o início, a ficção científica enquanto gênero, explorando a relação entre humanidade, ciência e
tecnologia, admitiu a hipótese de uma degeneração social e tecnológica de tipo catastrófico ou totalitário”
(LIPPOLIS, 2006, p.21).
“Se a cidade, enquanto expressão social do progresso, foi muitas vezes protagonista da história de ficção
científica, com o passar do tempo a metrópole distópica foi invadindo progressivamente o território antes
ocupado pelos lugares gratificantes e inovadores imaginados pela utopia positiva” (LIPPOLIS, 2006, p.22).
“Se a organização do espaço representa uma concepção de vida, Ballard descreve a condição existencial
pós-moderna a partir da vida da multidão solitária que habita a cidade vertical. Depois de ter esvaziado de
senso comum a vida social, a abstração, a fragmentação e a artificialidade impostas pelo capitalismo tardio
produzem uma intolerância esquizofrênica que faz o homem regressar a um estado primitivo, às suas
pulsões básicas. Ballard condena definitivamente aquele projecto do estilo moderno representado pela
máquina para habitar de Le Corbusier, que desejava anular a componente humana da experiência, a favor da
pretensão de construir uma linguagem - as cidades, os seus edifícios - que fosse integralmente
transparente e normalizada. Este sistema de controlo integral dos corpos e das mentes, herdado da fábrica e
da prisão e embelezado pelas amenidades tecnológicas e consumistas, a longo prazo só pode gerar
mal-estar, instabilidade, ruptura da solidariedade social, e guerra. Ballard, numa das poucas referências ao
exterior do arranha-céus, descreve o horizonte urbano circundante como um mundo prisional, e os actos de
vandalismo como uma forma de resistência, ‘um apelo contra a morte cerebral’. O arquitecto que projectou o
arranha-céus assiste com assombro à desagregação da estrutura social no seu interior. Julga que o futuro
depende da capacidade de impor uma rígida organização hierárquica, ‘como a de um formigueiro’”
(LIPPOLIS, 2016, p.30-31).