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2017.1
Desta maneira, vou tentar expor a seguir alguns apontamentos que me chamaram a
atenção sobre o livro “A máquina performática”.
Mais tarde volto a Soja, e explico o motivo de tê-lo impregnado. Agora sigo para
outro “espaço”.
Muito me chamou a atenção pela forma finamente detida e elegante dos autores
sobre a performance exercida pelo autor, querendo ele ou não, quando se trata de
máscara e pose.
Evoco Roland Barthes para me clarificar um pouco nas assertivas acima: ele, ao
iniciar seu texto “A morte do autor” evocando Balzac e sua novela “Sarrasine”, nos
interroga de quem é a voz do texto, para depois afirmar que é impossível saber, pois “a
escritura é a destruição de toda voz”. Com essa afirmativa, podemos entender que ao
criar um texto – entende-se aqui por “texto” qualquer obra, tanto escrita quanto
audiovisual – perde-se a identidade de seu criador, ao mesmo tempo em que se é criada
uma nova identidade a partir de quem está “lendo” tal obra. Hoje me lembrei da grande
partida contracultural – por vezes - que aprendemos ao longo do curso de Letras: deve-
se separar autor de obra. Inclusive penso que Luiz Ruffato escreveria melhor sem seus
óculos coloridos que o deixam tão datado. Já a performance de Torquato, como vampiro
tropicalista que circula por todos os movimentos de reinvenção artística de sua época
nos fornecendo toda a gama que habita sua órbita de artista, é de fato algo louvável.
Dalton e Torquato vão ao encontro do que propõem os autores de “A máquina
performática”, cada um na sua via.
Quanto à literatura, o Estado faz com que os escritores vivam de lobby e
“tapinhas nas costas”, jantares e mesas redondas. Torquato foi um artista além de sua
literatura, além da corja midiática, ao contrário, aproveitou-se muito bem dela para
driblá-la. Já no campo performático, da performance do corpo, aí sim concordo com a
máscara e a pose. Mas reitero que no campo puramente literário isto é bem difícil de se
fazer. Juliana Frank, escritora há mais de 10 anos, conhecida por muitos Brasil afora, foi
um fiasco completo na FLIP do ano passado. Ela levou sua performance literária para
uma das mesas, incorporou suas diversas personagens femininas e a mídia, que não
entendeu lhufas do conceito de arte dela, a detonou. Ela perdeu emprego por causa disto
e diz que nunca mais escreve um livro. A pergunta, após ler o texto dos autores, que me
ficou é: Foi uma estratégia de Frank ou um desenfreamento? Conhecendo Frank, creio
que foi uma estratégia de desenfreamento, uma vez que a mídia literária e todo
burburinho em volta da cena, aqui no Brasil, está parado na idade média. Estou falando
dos escritores. Mais adiante retomo minha posição para reiterá-la ou modifica-la,
porque arte e texto crítico é assim mesmo, uma eterno vir-a-ser.
O autor cita Lucio Agra, e ele foi meu professor num passado distante. Lucio
Agra raramente enveredou-se pelo campo unicamente literário, ele é um artista da
performance, da máquina fora do corpo e pelo e através do corpo. Isto posto, já entro eu
no devir de ressignificar tudo o que disse acima, mas sem apagar nada. Tudo
permanece, eu concordo com tudo o que escrevi, entretanto, eu escrevi sobre a palavra
escrita e não o modus operandi de um autor performático. Pois bem, lá vou eu continuar
meu humilde texto crítico:
Quando Cairo Assis Trindade desenhou uma bandeira com a sigla PUTA,
Partido Universal dos Trabalhadores Anarquistas e se criaram poemas, desenhos,
manifestos, ensaios e, sobretudo, leituras sempre referentes ao ato sexual a partir deste
trabalho, engendrou de maneira mais eficaz o assunto da máquina performática no
Brasil quando se trata de política. Os modernistas eram da elite, seu Manifesto
Antropofágico embora louvado e laureado, não chegou no “povão”. Cairo Assis foi para
as ruas. Essa é a grande diferença de uma maquinaria performática funcional na vida
das pessoas e não os grandes salões e museus. Todavia não posso ser tão ingênua e
acreditar que foi só no século 20 que a arte brasileira performou dignamente: “A
primeira missa no Brasil”, de 1861, de Victor Meirelles nos mostra a eloquência da
performance, sem estar de corpo físico presente nela. O quadro hierarquiza, estratifica e
assevera o que um povo conseguiu fazer com outro, portugueses e índios, através de
rituais performáticos, de “performativos”.
Certa feita João Cabral declarou que “duas atitudes, uma objetiva e outra
subjetiva” norteiam os poetas modernos: “a necessidade de captar mais completamente
os matizes sutis, cambiantes, inefáveis de sua expressão pessoal” e “o desejo de
apreender melhor as ressonâncias das múltiplas e complexas aparências da vida
moderna”. Esses poetas modernos, em pleno 2017, estão nas ruas. E quase ninguém faz
que vê.
As táticas de ocupação estão nas ruas. Sem o binarismo de Soja e Lefebvre. Sem
labels. Por enquanto.