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RAFAEL DE LAZARI

CESAR AUGUSTO ARTUSI BABLER


VIVIANE DE ARRUDA PESSOA OLIVEIRA
MARIA CAROLINA GERVÁSIO ANGELINI DE MARTINI

DIREITOS HUMANOS
UNIDADE 5

DIREITOS HUMANOS E
DIREITOS SOCIAIS

INTRODUÇÃO
Entre os direitos fundamentais insculpidos na Constituição de 1988, encontramos uma
categoria de direitos fundamentais classificados como sociais, previstos no artigo 6º
como os direitos a educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte,
lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência
aos desamparados. Os direitos ditos sociais têm por escopo estabelecer condições
de igualdade entre os indivíduos, garantindo-lhes o mínimo necessário para viver com
dignidade. Entretanto, o Estado não consegue adimplir as suas obrigações em relação
aos direitos sociais, o que resta por causar muito sofrimento e dissabor por aqueles que
dependem do Estado naquilo que se considera básico e essencial para a sobrevivência.

1. SAÚDE COMO DIREITO UNIVERSAL E BEM PÚBLICO


Figura 01. Saúde como direito universal

Fonte: 123RF.

Herófilo, antes de Cristo, afirmava: “quando falta a saúde, a sabedoria não se revela,
a arte não se manifesta, a força não luta, a riqueza é inútil e a inteligência inaplicável”
(HEROPHILUS apud LIMA, 2009, p. 6).

A Organização Mundial da Saúde (OMS, 1946), na Carta de Princípios de 7 de abril


de 1948 (por isso, Dia Mundial da Saúde), diz que saúde é o estado do mais completo
bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de enfermidade.

Sob o prisma jurídico, a saúde como direito social (artigo 6º) encontra-se prevista
na Constituição Federal desde a sua origem, em 1988. O artigo 196 da Carta Cons-
titucional assegura:

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A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido me-


diante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal
e igualitário às ações e serviços para sua promoção, prote-
ção e recuperação. (BRASIL, 1988, [n. p.], grifo nosso).

O princípio da universalidade da saúde prega que todos as doenças serão cobertas


e amparadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e todas as pessoas (brasileiros ou
estrangeiros, residentes ou não no Brasil) serão atendidas sem qualquer cobrança pelo
poder público. Assim, além de universal, a saúde é um sistema gratuito de política pú-
blica no Brasil.

Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Judiciário, na condição de


guardião da Constituição, tem assumido protagonismo no cenário público, consideran-
do-se a grande quantidade de decisões judiciais, cuja finalidade é implementar direitos
pelo prisma da qualidade de mínimo existencial, ou seja, determinado direito é o mínimo
para a pessoa humana viver com dignidade, como é o caso do direito à saúde.

Nesse sentido, em 12/09/2000, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o fornecimento


gratuito de medicamentos a pessoa portadora do vírus HIV sem condições de arcar
com os custos do tratamento, afirmou que o Estado é obrigado a garantir um mínimo
relacionado ao direito à saúde, decorrente do direito à vida:

[...] [ao] Poder Público [...] incumbe formular – e implementar


– políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garan-
tir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV,
o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e
médico-hospitalar. O direito à saúde, além de qualificar-se
como direito fundamental que assiste a todas as pessoas –
representa consequência constitucional indissociável do di-
reito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera ins-
titucional de sua atuação no plano da organização federativa
brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da
saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por cen-
surável omissão, em grave comportamento inconstitucional.
[...] (BRASIL, 2000, p. 1.409)

Em relação à saúde, percebe-se claramente o conceito de bem comum, no sentido de


que o objetivo da sociedade não é um bem individual ou de um único indivíduo, mas um
bem que se comunica entre todas as pessoas do grupo indistintamente. Não descarta a
existência da individualidade, mas também se projeta para o coletivo.

Tome-se como exemplo o alcoolismo e as doenças mentais, com todas as consequên-


cias que carregam na sociedade. Elas são consideradas individualmente, mas tem uma
dimensão mais coletiva do que individual no aspecto do seu cuidado e do seu tratamen-
to e prevenção. Nesse sentido, vale lembrar Sturza e Martini (2017, p. 406):
Nesse sentido, é perceptível que o direito à saúde não apenas possui um
cariz individual, mas é aquele direito que diz respeito a um quadro social,

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Direitos Humanos e direitos sociais U5

que importa a coletividade, que assume uma característica transcendente


àqueles que pertencem a determinada comunidade.

Desse ponto de vista, falar de saúde exige olhar para a sociedade: a casa comum onde
vivemos, onde os seres humanos constroem relações e suas vidas, também é o local
em que estes desenvolvem formas de adoecer e bem viver. É preciso que o Estado,
além de assegurar o direito à saúde a todos os cidadãos, assegure o respeito às diver-
sas formas de vida dos diferentes grupos sociais aqui existentes.

2. SEGURANÇA ALIMENTAR, MORADIA E TRABALHO


DECENTE
A Constituição Federal de 1988 não trouxe o direito à alimentação como direito social.
Somente em 2010, 22 anos após a publicação da nossa Constituição, mediante reforma
constitucional, é que o direito foi expressamente previsto na Carta Magna. A moradia
adequada, por sua vez, somente no ano 2000 foi internalizada e incorporada na Cons-
tituição do Brasil, no bojo do artigo 6º, qualificando-se como direito essencial à sadia
qualidade de vida das pessoas. Uma moradia inadequada repercute na saúde e nos
diversos aspectos da vida das pessoas.

2.1 DIREITO À SEGURANÇA ALIMENTAR


Figura 02. Direito à segurança alimentar

Fonte: 123RF.

Segundo Lenza (2020, p. 889), a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 re-
conheceu o direito à alimentação como direito universal do cidadão em 1993 pela quase
unanimidade (salvo EUA) dos 52 países integrantes da Comissão de Direitos Humanos da
ONU (1993), que fizeram incluir o referido direito como integrante do cidadão, passando a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu artigo 25, a estabelecer que:
Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e
à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança
em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos

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de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle


(UNICEF, 1948, [n. p.], grifo nosso).

A Lei nº 11.346/2006, regulamentada pelo Decreto nº 7.272/2010, já havia criado o


Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) com vistas a assegurar
o direito humano à alimentação adequada, nos seguintes termos do artigo 2º:
A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à
dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos con-
sagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políti-
cas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança
alimentar e nutricional da população (BRASIL, 2006, [n. p.]).

Portanto, desde 2006 o Brasil já previa a alimentação entre os direitos do cidadão. Mas, so-
mente em 2010, o referido direito adquiriu força constitucional, tendo encontrado previsão na
Constituição Federal, exigindo-se o seu cumprimento do poder público com maior ênfase.

O direito humano à alimentação adequada significa libertar as pessoas da fome e da desnu-


trição, bem como conferir a todos o direito ao acesso a alimentação adequada e saudável.

Na qualidade de direito fundamental social, o direito à alimentação adequada corres-


ponde a obrigações do poder público (União, estados e municípios). Isso significa que
caberá ao poder público promover políticas públicas que garantam o direito à alimen-
tação de toda a população, bem como, nas hipóteses de pessoas vítimas de pobreza
extrema ou nos casos de calamidades/catástrofes, prover a alimentação.

Além do poder público, têm responsabilidade por garantir uma alimentação adequada à
toda a população os diferentes atores sociais (indivíduos, famílias, comunidades locais,
organizações não governamentais, organizações da sociedade civil, empresas, etc.)
em relação à sua implementação.

Não podemos falar em direito humano à alimentação adequada sem entender o papel
fundamental que cada um de nós possui como indivíduos, agentes do Estado ou repre-
sentantes da sociedade civil no processo de promoção da realização dele como direito
passível de ser exigido em sua realidade local.

E onde o cidadão poderá exigir o direito à alimentação?

Nos postos de saúde, no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),


centros de referência de assistência social (Cras) etc. Além disso, o cidadão poderá
buscar auxílio nos órgãos do Ministério Público e da Defensoria Pública. Esses órgãos
não fazem parte diretamente do Poder Judiciário, mas podem acionar a Justiça ou co-
brar soluções diretamente dos poderes públicos, celebrando, por exemplo, termos de
ajustamento de conduta.

Além disso, o cidadão pode se valer de instrumentos judiciais e políticos, tais como
a participação de campanhas de mobilização contra os projetos de leis que violam o
direito humano à alimentação adequada, e estimular a articulação entre organizações
e movimentos sociais que desenvolvem campanhas contra leis e projetos de leis que
violam e/ou ameaçam o direito humano à alimentação, tais como: campanha contra os
transgênicos; campanha contra o uso dos agrotóxicos etc.

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Direitos Humanos e direitos sociais U5

2.2 DIREITO A MORADIA


Figura 03. Direito a moradia

Fonte: 123RF.
A habitação foi reconhecida como direito humano em 1948 na Declaração Universal
dos Direitos Humanos, tornando-se um direito humano universal, nos seguintes termos:
Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a
sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança
em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos
de perda dos meios de subsistência fora de seu controle (UNICEF, 1948, [n.
p.], grifo nosso).

O Decreto nº 591 reconheceu expressamente o direito à moradia adequada, nos se-


guintes termos:
Artigo 11. 1. Os Estados-parte no presente Pacto reconhecem o direito de
toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e para sua fa-
mília, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim
como uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados-parte
tomarão medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito,
reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação inter-
nacional (BRASIL, 1992, [n. p.], grifo nosso)

A concentração da terra nas mãos daqueles que detêm o poder econômico é uma ca-
racterística marcante da história do nosso país, e isso influencia diretamente na situação da
moradia inadequada no Brasil.

Muitas pessoas não possuem sequer saneamento básico e água potável, o que gera
doenças e infecções pela contaminação da água. São elevados os índices de déficit
habitacional, que representa a situação de moradia em condições inadequadas.

Embora a nossa Constituição também assegure que União, estados, Distrito Federal
e municípios deverão combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização,
promovendo a integração social dos setores desfavorecidos, o que vemos no Brasil, na
verdade, são pessoas morando em condições desumanas, em favelas ou até mesmo
em situação de rua.

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A origem do termo “favela”, por mais estranhamento que possa causar, decorre de
uma planta que surgia no Morro da Favela, do episódio da Guerra de Canudos. Pos-
teriormente, passou a designar habitações improvisadas, sem infraestrutura, junto aos
morros (WIKIPÉDIA, 2021, [n. p.]).

O Estado tem obrigações com relação ao direito à moradia adequada: a obrigação de


se abster de atos que ofendam tal direito, de proteger a moradia contra a intervenção
de terceiros e de atuar para sua realização. A moradia integra o direito à dignidade da
pessoa humana, razão pela qual integra o núcleo daquilo que se convenciona chamar
de mínimo existencial. O que vemos, na grande parte dos estados brasileiros, é uma
prestação insuficiente do direito social à moradia, já que as moradias irregulares au-
mentam a cada dia, atingindo o marco aproximado de 6 milhões.

O acesso à moradia adequada pode ser uma pré-condição para a realização de vários
outros direitos humanos, incluindo o direito a trabalho, saúde, segurança social, voto,
intimidade/privacidade e educação. Sem comprovante de residência, as pessoas sem-
-teto não têm condições de votar, desfrutar de serviços sociais ou de receber cuidados
de saúde. A moradia inadequada pode ter repercussões diretas sobre o direito à saúde,
por exemplo, se as casas e os assentamentos tiverem pouca ou nenhuma água potável
e nenhum saneamento, ou se estiverem em locais expostos a resíduos tóxicos em ra-
zão dos quais os moradores podem contrair graves doenças.

Se não bastasse, em muitos casos, os aluguéis correspondem a 40% da renda familiar,


o que provoca um grande contingente de inadimplência e consequentes despejos. O
trauma experimentado na sequência de um despejo também pode prejudicar a capaci-
dade de uma criança de assistir às aulas, além de interferir na sua saúde mental.

2.3 DIREITO A TRABALHO DECENTE


Figura 04. Direito a trabalho descente
Fonte: 123RF

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Direitos Humanos e direitos sociais U5

O direito ao trabalho assumiu destaque entre os direitos sociais, pois, além da sua
previsão clássica no rol dos direitos sociais (artigo 6º, Constituição Federal), também
tem previsão espalhada por diversos dispositivos constitucionais. Surpreendentemente,
logo no artigo 1º, a Constituição Federal prevê que o Brasil é um Estado democrático
de direito e tem como fundamento, dentre outros, os valores sociais do trabalho e da
livre iniciativa (artigo 1º, IV, Constituição Federal).

Além disso, o direito ao trabalho decente transcende os direitos fundamentais, pois o


trabalho constitui, também, um grande pilar de sustentação da ordem social e econô-
mica. Nesse sentido, previu a Constituição Federal (artigo 170, inciso VII) que um dos
fundamentos da ordem econômica é a valorização do trabalho humano e como um
dos seus princípios a busca do pleno emprego.

Na ordem social, a sustentação da previdência social se faz, principalmente, pelas con-


tribuições dos segurados, que são aqueles que de alguma forma exercem atividade
remunerada e que, no futuro, serão protegidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS) e terão direito aos benefícios previdenciários como aposentadoria, auxílio por
incapacidade temporária (“auxilio-doença”), entre outros.

São objetivos do trabalho descente (ONU, 2015, [n. p.]):

a. Respeito aos direitos no trabalho, especialmente aqueles definidos como funda-


mentais (liberdade sindical, direito de negociação coletiva, eliminação de todas as
formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação e erradicação de todas
as formas de trabalho forçado e trabalho infantil);

b. Promoção do emprego produtivo e de qualidade;

c. Ampliação da proteção social;

d. Fortalecimento do diálogo social.

A pandemia de covid-19 vem gerando efeitos devastadores no mercado de trabalho


mundial e também no Brasil, com maior desigualdade geográfica e demográfica, mais
pobreza e menos empregos decentes. E a previsão é de que esse cenário ocorra até
2023. Aliadas à falta de empregos, somam-se aos níveis persistentes de desemprego
a subutilização da mão de obra e as condições precárias de trabalho, situações que já
eram vivenciadas em épocas bem anteriores à crise.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) considera que a justiça social é essen-


cial para garantir a paz universal e que o crescimento econômico é importante, mas não
o suficiente para assegurar a equidade, o progresso e a erradicação da pobreza.

O trabalho decente é aquele cuja preocupação é sistêmica. Identifica-se a importância


do trabalho dos jovens e de pessoas com deficiência, da luta contra o trabalho infantil
e também da legitimidade do trabalho realizado pelos migrantes e refugiados, aqueles
que chegam ao nosso país com muitas esperanças e sonhos, tentando uma vida mais
digna, e que aqui veem sua mão de obra ser subutilizada e até mesmo exercem ativida-
des em condições análogas às de escravo.

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As Nações Unidas (ONU, 2015, [n. p.]) estabelecem os objetivos de desenvolvimen-


to sustentável (ODS). Entre as metas para o desenvolvimento sustentável prevê-se a
promoção do crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, do emprego
pleno e produtivo, e do trabalho decente para todos. Prevê-se, ainda, até 2030, al-
cançar o emprego pleno e produtivo e o trabalho decente a todas as mulheres e todos
os homens, inclusive para os jovens e as pessoas com deficiência, e remuneração
igual para trabalho de igual valor. Além disso, estabelece como programa de ação:
`  tomar medidas imediatas e eficazes para erradicar o trabalho forçado,

`  acabar com a escravidão moderna e o tráfico de pessoas

`  assegurar a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil, incluindo


recrutamento e utilização de crianças-soldado,

`  acabar, até 2025, com o trabalho infantil em todas as suas formas.

`  assegurar, por fim, a proteção dos direitos trabalhistas e promover ambientes de trabalho
seguros e protegidos para todos os trabalhadores, incluindo os trabalhadores migran-
tes, em particular as mulheres migrantes, e pessoas em empregos precários.

A viabilização dessas políticas relacionadas à proteção do trabalho depende de mudan-


ças na legislação e de políticas públicas adequadas, estas últimas com importante pa-
pel do poder local, por meio dos indicadores de trabalho decente, guias que identificam
a realização ou não dos ODS, que vão ao encontro das metas da OIT.

Assim, por exemplo, pretendemos reduzir a jornada de trabalho. Hoje temos uma jorna-
da de trabalho semanal de 44 horas, da qual almejamos uma redução para, no máximo,
40 horas. A conquista da redução da jornada de trabalho é um indicador de trabalho
decente. Outros indicadores possíveis seriam, por exemplo, a redução dos acidentes e
doenças do trabalho, a formalização do trabalho, a diminuição da rotatividade do traba-
lho, a ampliação da cobertura da previdência social, a igualdade de remuneração entre
homens e mulheres.

Se pensarmos, exemplificativamente, na meta 8.8 das Nações Unidas (IPEA, 2022),


que trata da segurança do trabalho e inclui os trabalhadores migrantes, poderíamos
pensar em indicadores que mensurassem as taxas de frequência de lesões ocupacio-
nais fatais e não fatais, de acordo com o sexo e também a situação de migração.

A transformação da realidade do trabalho é capaz de promover uma vida mais digna


dentro e fora do espaço do trabalho, mas exige a garantia de que os trabalhadores par-
ticipem da construção e da definição dos indicadores, e de que as políticas públicas se-
jam sensíveis às necessidades de proteção e implementação de medidas que venham
a coibir qualquer forma de trabalho indigno e indecente. Só assim poderemos alcançar
uma realidade próxima daquilo que nossa Constituição tem buscado para o Brasil, a
dignidade da pessoa aliada à erradicação da pobreza e à marginalização e à redução
das desigualdades sociais e regionais.

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Direitos Humanos e direitos sociais U5

CONCLUSÃO
Os direitos a moradia, trabalho decente e segurança alimentar são considerados direitos
sociais, fato esse que, incrivelmente, é o que provoca todas as injustiças e desigualdades.
Isso ocorre porque sociais são aqueles direitos para cuja implementação efetiva se exige
uma atuação estatal. Dependem de uma prestação positiva do poder público. Assim, para
haver educação, é preciso que o Estado construa escolas, realize concurso de professo-
res, faça o pagamento das remunerações, entre outros. Para que a segurança pública
seja efetiva, é preciso que o Estado construa presídios, remunere os policiais, adquira
armamentos. Para haver moradia, trabalho digno e segurança alimentar, é preciso que o
Estado assegure condições mínimas necessárias para a fruição desses direitos.

Ocorre que essa atuação estatal ativa depende de recursos financeiros e, consequen-
temente, da previsão orçamentária, já que vai implicar dispêndio financeiro pelo poder
público. Os recursos públicos, por sua vez, são limitados, razão pela qual se torna ne-
cessário fazer escolhas pelos governantes daquilo que realmente importa e deve ser
protegido e daquilo que não será amparado. Entretanto, essa escolha não é aleatória,
devendo ocorrer conforme os comandos constitucionais, garantindo-se o mínimo para
a existência das pessoas, aquilo a que se convencionou chamar de mínimo existencial.
Inobstante isso, na prática, exige-se muito mais do que um direito, é preciso haver ação,
boa vontade e solidariedade com o ser humano, em respeito à sua condição de ser hu-
mano e de igualdade aos demais.
Figura 05. Mapa mental

TRABALHO DIGNO E VALORIZADO

RESERVA DO POSSÍVEL DESEMPREGO


COMBATE TRABALHO INFANTIL
TRABALHO ESCRAVO

DIREITOS SOCIAIS ALIMENTAÇÃO NÃO À FOME E À DESNUTRIÇÃO


(ESTADO – ALIMENTAÇÃO E MORADIA
OBRIGAÇÃO DE MORADIA HABITAÇÃO ADEQUADA (VOTO,
FAZER) SAÚDE)

UNIVERSAL TODOS TÊM DIREITO


MÍNIMO EXISTENCIAL SAÚDE
GRATUITO NÃO PRECISA PAGAR

Fonte: elaborada pelo autor.

Link

https://doi.org/10.1590/S1806-64452004000100003. Acesso em: 16 nov. 2021. Artigo: Direi-


tos sociais, econômicos e culturais e direitos civis e políticos

O artigo aborda os direitos humanos sob a ótica dos direitos sociais e investiga a capacidade de
efetivação dos direitos humanos, para que assumam seu papel central na ordem contemporânea.

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Filme ou documentários:

Filme: Cidade de Deus. Direção: Fernando Meirelles, Kátia Lund

Sinopse: O filme narra a formação do crime organizado no bairro da Zona Oeste carioca en-
tre os anos 1960 e 1970. Além da desigualdade social, traz aspectos da violência do Estado
pela polícia e pela omissão do Estado no tocante as políticas públicas.

Fundamentos da Indicação: fazer o aluno entender acerca do papel do Estado na proteção


dos direitos humanos sociais, principalmente na implementação de políticas públicas de mo-
radia, emprego e outras políticas que envolvem a população. Além disso, verificar que, em
vez de garantir a segurança pública da população, o Estado abusa da violência policial sob o
pretexto de garantir a segurança para o “restante” da população.

Casos de Aplicação:
Caso Zara

No caso Zara, em junho de 2011, fiscais encontraram ao todo cerca de 50 trabalhadores


submetidos a trabalho análogo ao de escravo produzindo roupas para a marca Zara, que
pertence ao grupo espanhol Inditex. Nos termos do relatório produzido pela Repórter Brasil e
pela Somo, que acompanharam a visita in loco dos inspetores:
As oficinas em que os funcionários trabalhavam e residiam eram ambientes
extremamente degradantes. [...] As janelas eram cobertas com tecidos escu-
ros e os ambientes internos sujos, abafados, apertados e com fiação elétrica
irregular. Ademais, filhos menores dos trabalhadores transitavam livremente
pelo local de trabalho, entre máquinas de costura sem segurança nenhuma.
(REPÓRTER BRASIL)

Leitura complementar ao estudo de caso:

Zara é responsabilizada por trabalho escravo e pode entrar na “lista suja”. Disponível em:
https://economia.ig.com.br/2017-11-14/zara-trabalho-escravo.html. Acesso em: 16 nov. 2021.

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Direitos Humanos e direitos sociais U5

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Direitos Humanos 11
EDUCANDO PARA A PAZ

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