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Grossi, Paolo. História da propriedade e outros ensaios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

(pp. 1-42) Disponível em PDF no Drive da disciplina “História social da Propriedade”.


Link -

l. A propriedade e as propriedades: uma reconsideração teórica e seu significado


para o historiador do direito.

Pp 1 a 2 – discorre sobre o sentido do título: Propriedade e as propriedades, inspirado no


trabalho de Salvatore pugliâtti, pontuando sus diversidade, podendo ser utilizada em
outros locais e tempos históricos: até que ponto seu uso é adequado pelo historiador do
medievo e da modernidade e até que ponto ele é desisistoricizante?

P 3 a 4 – destrincha o título enquanto projeto e método para análise da propriedade, na


perspectiva da relação entre “homens e coisas” a partir de baixo, revelando então
estruturas específicas.

P 5 a 6 – para pugliâtti “propriedade” é apenas a solução histórica, colocada para dar


solução a determinada relação entre homem e coisa em termos jurídicos. Historicizando
a propriedade e retirando dela o elemento ideológico que permite sua naturalização.

“[...] resposta à questão central sobre â consistência mínima do 'meu' jurídico; soluções
e respostas que são duplamente multíplices, segundo os vários climas históricos e
segundo
os vários conteúdos que um mesmo clima histórico dá àquele invólucro aberto e
disponível que convencionalmente identificamos como propriedade.” (p. 05)

2. A propriedade e as propriedades: a cultura do pertencimento e os


condicionamentos monoculturais para o historiador do direito.

P 6 a 10 – Alerta para riscos de caráter cultural que podem ser cometidos pelos
historiadores, apesar da metodologia acima apresentada:

1 – Condicionamento monocultural: risco de uma perspectiva exclusivamente voltada


ao pertencimento individual, tendo em vista o termo propriedade, ainda que no plural.
Eixo da história jurídica europeia: luta pela propriedade e proprietários.

“não é, tanto a terra que pertence ao homem mas antes o homem à terra, onde a
apropriação individual parece invenção desconhecida ou disposição marginal.” (07)

p. 08 - propriedade coletiva na Europa ocidental: apesar das formas diferentes existe


algo em comum, o fato de ser garantia de sobrevivência para uma comunidade
plurifamiliar.

“A apropriação aqui, no sentido tradicional do termo, cai somente indiretamente sobre o


produto do fundo que serve para a sobrevivência quotidiana de um núcleo unifamiliar,
mas nunca investe o fundo.” (p.08)

P 08 - A propriedade coletiva é realmente uma propriedade? Esse seria o termo mais


adequado? Ou seriam premissas opostas, não redutíveis a propriedades, no plural?
P 09 a 10 – papel do historiador de utilizar o termo propriedades, como convenção
verbal, porém sem deixar de matizar as diversas formas históricas que a propriedade
ganha corpo.

“e não se cometa a ingenuidade imperdoável de crer que tudo se esgote no universo do


pertencimento segundo o grande rio aparente da oficialidade dominante.” (p.10)

Risco que cair em uma postura a-histórica, tomando a forma dominante como a melhor
e superior, enquanto as demais seriam meras anomalias a serem combatidas até
desaparecerem.

3. A propriedade e as propriedades: condicionamentos de arquétipos culturais. A


apropriação individual e seu modelo napoleônico-pandectístico.

p. 10 a 14 – segundo risco cultural para o historiador do direito quanto ao tema


propriedade: maniqueísmo, bem e mal, que permeia a relação homem-bem.

p. 11 – Arquétipo napoleônico-pandectístico, ou seja, propriedade não apenas na


questão da apropriação individual, mas também de conteúdos impostos a força.

p. 12 – noção de propriedade burguesa absoluta fundada por Locke: propriedade e


controle!

p. 12 e 13 – necessidade do historiador do direito historicizar tal arquétipo, derrubar a


naturalização da propriedade moderna através da evidenciação de seu processo histórico
de surgimento.

p. 13 – erro metodológico ao medir o real segundo sua correspondência com o esquema


de propriedade individual.

“Para o alto medievo um tal procedimento tem a mesma sensatez do botânico que
procura frutos tropicais nos campos mediterrâneos.” (13)

p. 13 a 14 – a efetividade da posse, efetividade econômica, que define o vínculo de


alguém sobre o bem, não aposse individual e formal. (alta Idade média)

4. A propriedade e as propriedades entre isolamentos técnico-jurídicos e


sufocamentos economicistas.

P. 15 – outros riscos culturais para os historiadores do direito ao estudar propriedade,


além da cultura do pertencimento e do modelo individualista do pertencimento.

P 15 e 16 – risco de separar o processo histórico da forma jurídica da propriedade.

“A propriedade é seguramente também um problema técnico mas nunca é somente, no


seu contínuo emaranhar-se com todo o resto, um problema técnico: por debaixo, os
grandes arranjos das estruturas; por cima, as grandes certezas antropológicas põem
sempre a propriedade no centro de uma sociedade e de uma civilidade. A propriedade
não consistirá jamais em uma regrinha técnica mas em uma resposta ao eterno problema
da relação entre homem e coisas, da fricção entre mundo dos sujeitos e mundo dos
fenômenos, e aquele que se propõe â reconstruir sua história, longe de ceder â tentações
isolacionistas, deverá, ao contrário, tentar colocá-la sempre no interior de uma
mentalidade e de um sistema fundiário com função eminentemente interpretativa.” (p.
16)

p. 17 – perigo do economicismo nas análises: enquanto o formalismo jurídico reduz


tudo a formas técnicas, o economicismo desfoca o recurso do jurídico, buscando sempre
uma solicitação de concretude. Isso tende a analisar os fatos de forma particularista,
perdendo a perspectiva historiográfica.

p. 17 a 19 – exemplo de Guido Astuti. Redução do trabalho do historiador a um


amontoado quantitativo de dados, e como se a compreensão da história passasse por
uma soma de estudos particulares.
Problemas de analises atomísticas que caem em positivismos da antiga historiografia
franco-alemã do XIX.

Não é a soma mecânica das tesselas que nos dará o sentido de um mosaico, mas a sua
fusão em um desenho. E é sobretudo sobre o desenho que se mede a intuição do
historiâdor, aquele saber intuitivo que o separa, poiobietivo e privilégio adquirido, da
falange àor.rrditor. E re há c".rn mente um desenho também no particular, os seus
trâÇos
tornam-se principalmente evidentes nas grandcs Iinhas perspectivas. (19)

5. História das propriedades e história agrária.

p. 20 a – Perspectiva importante para história agrária: situações reais não podem ser
explicadas apenas por consequências automáticas de fatos técnicos ou econômicos,
senão também pelo elemento dos costumes. (Thompson?)

“[...] até que ponto tinham poder incisivo sobre a plataforma consuetudinária à qual
estavam há séculos solidamente ancorados propriedade, direitos reais, relações de
concessão fundiária?” (p. 24)

6. A história das propriedades e seu resgate jurídico. História das propriedades e


fontes cadastrais.

p. 24 – propriedade é sobretudo mentalidade e os dados técnicos agrários podem muitas


vezes servir de elementos historiográficos desviantes.

p. 25 – o jurídico está imerso no social e deve ser reconstituído em sua especificidade.

p. 25 e 26 – a propriedade dos juristas é, principalmente, poder sobre a coisa, enquanto a


propriedade dos economistas é riqueza sobre a coisa.

p. 27 – questão das fontes cadastrais, muito utilizada na história agraria, que tem
formalidade jurídica, mas finalidade e conteúdos exclusivamente econômicos.

p. 28 – sendo genéricos as fontes cadastrais são inadequadas ao historiador do direito.


“as fontes cadastrais aparecem como descrição muito frequentemente grosseiras e
confusas.” (p. 29)

7. Uma trilha a ser percorrida: a propriedade como mentalidade jurídica.

p. 30 – a dimensão jurídica da história agrária não deve ser apagada, tendo em vista seu
caráter ôntico, pertencente ao ser da propriedade.

p. 30 – o jurídico tem suas raízes nas mentalidades.

“O historiador, habituado à corrida incessante do social, no campo das relações de


pertencimento e reais é obrigado a um reparo objetivo: mudam as paisagens agrárias,
passam as ordens sociais mas a mesma mentalidade as vezes persiste; às vezes,
frequentemente, há uma sua permanência até além daqueles que podiam parecer a um
olho não penetrante os termos naturais do seu campo de ação.” (p. 31)

p. 32 – Direito como mentalidade afundada na consciência social.

p. 33 – historiador do direito e o trabalho com as fontes, que devem de expandir para


possibilitar a historicização do elemento jurídico, porém se ajustando ao terreno das
escolhas técnicas (jurídicas?)

p. 33 a 35 – Uso dos teólogos e da filosofia política anglo francesa para o estudo das
origens das propriedades agrárias entre o medievo e a modernidade.

p. 34 e 35 – necessidade de fontes amplas e variadas.

8. A história das propriedades sob o signo da descontinuidade: 'medieval' e


'moderno’ como universos distintos.

P. 38 – História da relação jurídica sobre as coisas é marcada por uma descontinuidade,


tendo em vista que propriedade é mentalidade.

Ou seja, não se reduz nunca a uma pura forma e a um puro conceito mas é sempre uma
ordem substancial, um nó de convicções, sentimentos, certezas especulativas, interesses
rudes, tanto que seria imprudentíssimo - e até mesmo risível - quem tentasse seguir,
nesse terreno, uma história de termos, de palavras. (p. 38)

p. 38 e 39 – alerta para não se levar por identidades formais enganosas.

“Desembaraçar-se de toda abordagem formalista, desembaraçar-se do "estorvo


enganador da continuidade pode ser a única operação de limpeza intelectual para colher
e seguir o formar-se, sobre o tronco dos fatos econômico-sociais, da nova experiência
jurídica. Aqui, respeito à descontinuidade quer dizer respeito à originalidade dos fatos
históricos.” (p. 41)
p. 40 a 42 – defesa da descontinuidade no fazer do historiador do direito ao estudar as
propriedades, no plural.

p. 42 - concretização do termo moderno na propriedade apenas no século XIX, quando


o medievo já tinha sido superado há séculos, se deu, pois, só ali a cultura jurídica teve
instrumentos conscientes e inconscientes para se livrar de uma mentalidade, ainda que
já morta.

Grossi, Paolo. Mitologias jurídicas da modernidade. Florianópolis: Fundação Boiteux,


2007 (Cap 2 - pp. 47-84). Disponível em PDF no Drive da disciplina “História social da
Propriedade”. Link -

O autor busca evidenciar elementos de mitologia jurídica na formação e reprodução da


modernidade, apontando para o historiador do direito tais mitos (liberais?) retirando o
véu de maia que encobre e distorce a realidade histórica. A empreitada historicizante
tem continuidade nesse trabalho...

1. Mitologia jurídica como estratégia vencedora na modernidade.

p. 49 a 51 – longe de serem opostos (mitologia e modernidade), a sociedade moderna,


secularizada e baseada em verdades cientificas, é uma incubadora de mitos. Cita o
jusnaturalismo como grande produtor de mitos jurídicos. O iluminismo precisa do mito,
pois ele é o absoluto ao qual ele se agarra.

p. 51 a 52 – construção de meta realidade a-históricas na medida em que se força um


salto de níveis na história, tornando-se objeto de crença, mais que de conhecimento.

Por trás desse palco cênico em que tudo é idealizado, por trás desse raciocínio
realizado através de modelos, fica escondido o Estado monoclassista, o espesso extrato
de filtros entre sociedade e poder, o elitismo exclusivo das formas de representação, a
grosseira defesa de ricos interesses que todo o puríssimo teorema vinha a tutelar e a
consolidar. (p. 54)

p. 54 e 55 – lei e somente a lei aparecendo como vontade geral.

2. Projeto moderno do direito e complexidade do universo jurídico.

p. 56 a 58 – vinculação do direito ao poder durante o medievo, separando-o de sua


relação social, possibilitando a redução do direito à lei na modernidade. Direito
percebido como entidade que paira sobre a sociedade, e não como relação social
construída por seres humanos inseridos em determinada sociedade.

Debate sobre concepção de Estado liberal (iluminismo, perspectiva jusnaturalista.)

O direito, pela sua tensão a encarnar-se, antes de ser poder, norma, sistema de
categorias formais, é experiência, ou seja, uma dimensão da vida social. Urge recuperar
a juridicidade além do Estado e além do poder, urge recuperá-la para a sociedade
como realidade global, como uma recuperação
que é, antes de tudo, ofício do jurista. (p. 57)
p. 58 – empobrecimento da noção de Estado, separando-o da sociedade.

3. Reduções modernas: uma visão potestativa do direito.

p. 59 a 60 – pensar o direito como norma é continuar a pensa-lo como poder.

Resumindo, ter como referência a norma, querendo ou não, significa, sempre e de


qualquer modo, conceber o direito de modo potestativo, ligá-lo intimamente ao poder,
mesmo tratando-se de poder em que se percebe a obstinação, tornando-se, portanto, uma
realidade perigosa, difícil de ser controlada, orientada e canalizada. (p. 60)
p.61 e 62 – reflexão jurídica de Hans Kelsen.

4. Indo recuperar a complexidade: a descoberta do direito como ordenamento.

p. 63 – defesa da necessidade de conceber o direito como ordenamento, que presta


contas a uma realidade subjacente, para recuperar sua complexidade.

p. 63 – juristas como vítimas e herdeiros da simplificação iluminista.

p. 64 e 65 – redução gerando a perda dimensão coletiva da sociedade.

p. 66 – Pietro rescigno percebendo partidos e sindicatos como autênticas formações


sociais.

[...] A conclusão é certa, ou seja, a paisagem jurídica, justo por estar nos nervos do
social, é complexa por natureza. A Idade Moderna, idade de mitologias jurídicas,
encolheu-se em um constrangedor horizonte de modelos, sendo a complexidade da
experiência jurídica notavelmente sacrificada. Visão potestativa do direito, sua
estatalidade, sua legalidade, constituíram um observatório deformante, já que,
baseando-se unicamente no momento e no ato da produção, a regra jurídica se apresenta
como norma, ou seja, como comando autoritário do titular do poder. (p. 68)

5. Em direção a novas fundamentações para a positividade do direito.

p. 68 a 70 – defesa do ordenamento, tendo em vista que ela parte do real e, portanto,


tende e ser complexa, uma vez que a unidade mediante a ordem não pode ser algo
simples.

6. Interpretação–aplicação e novas fronteiras da positividade do direito.

p. 75 - hermenêutica como elemento essencial à positividade do direito.

O único meio para retirar do direito esse tradicional e repugnante esmalte potestativo e
autoritário era e é conceber a norma como um procedimento que não se cumpre com a
produção, mas que possui um momento subseqüente, o momento de interpretação, como
se ele estivesse dentro do processo de formação da realidade complexa da norma;
resumindo, a interpretação como momento essencial da positividade da norma, uma
condição ineliminável para a concretização da sua própria positividade. (p. 76)
p. 77 – direito mais como aplicação do que norma. Evidencia-se como relação social.

Com o direito-ordenamento o homem do povo também pode se reconciliar. (77)

7. Em direção ao declínio da mitologia jurídica pós-iluminista.

p. 78 – o direito como norma entrega leis com conteúdos vazios, podendo o legislador
depositar nela o conteúdo que assim desejasse.

As mitologias, que tiveram um papel fundamental no projeto jurídico burguês, não


conseguem se manter em pé diante das necessidades e das solicitações da sociedade
contemporânea, extremamente complexa sob os aspectos social, econômico,
tecnológico. Sob os esquemas formais – lineares, simples, em harmonia entre si –,
existe uma constituição material que pressiona e que urge levar em consideração, se não
queremos que se chegue a separações que podem se transformar em rupturas. (p. 81)

p. 81 e 82 – o direito não pode abrir mão de sua dimensão formal, mas deve fazê-lo
sabendo que tais formas se inserem em uma história viva.

Resumindo, devem se tratar sempre de categorias ordenantes, que pescam na realidade,


que não flutuam sobre o real, como acontece com todo fenômeno autenticamente e não
ficticiamente ordenante. (p. 82)

p. 82 e 83 – superação da noção de que o direito é feito mediante as leis.

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