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Emanuella Scoz (Org.

)
Albio Fabian Melchioretto
Cibele Cristina Martins
Tatiane Melissa Scoz

A ROUPA
A evolução da Roupa em sua
Relação com a sociedade.
Do ano 1000 d.C. até o século XX

2ª Edição

Blumenau
2019
Índice
PREFÁCIO À 2ª EDIÇÃO..............................................................................4

1.1 ESTÉTICA E LINGUAGEM DAS ROUPAS .......................................... 15


1.2 REPENSANDO A ROUPA DOS TEMPOS ANTIGOS .......................... 18
1.3 A ROUPA DAS SOCIEDADES ANTIGAS ............................................ 21
1.5 A ROUPA NO CORPO ..................................................................... 26
2. A ROUPA A PARTIR DA IDADE MÉDIA..................................................32

2.1 Século XI ao XIII.............................................................................. 33


2.2 Século XIV ...................................................................................... 55
2.3 Século XV ....................................................................................... 60
2.4 Século XVI ...................................................................................... 79
2.5 Século XVII ..................................................................................... 96
2.6 Século XVIII .................................................................................. 113
2.7 Século XIX .................................................................................... 126
REFERÊNCIAS ............................................................................ 139
3. PELADO, PELADO, NU COM A MÃO NO BOLSO:................................141

REFERÊNCIAS ..................................................................................... 151


4. A MODA E O COLETIVO, A ROUPA E A INDIVIDUALIDADE:................152

REFERÊNCIAS ..................................................................................... 158


5. ROUPA PARA MODA “SEM GÊNERO”?..............................................159

5.1 ROUPA E MODA “SEM GÊNERO” ................................................. 164


Referências: ....................................................................................... 175
PREFÁCIO À 2ª EDIÇÃO

Em 2012, a primeira edição deste livro foi lançada, com ob-


jetivo de refletir sobre a Roupa. Havia como interesse lançar um
olhar histórico-cultural sobre as transformações na construção da
Roupa.

Como docente de Moda, entendia a Roupa como o mais


simbólico e corriqueiro objeto criado pelo homem. Coloco neste
livro a perspectiva da Roupa como um instrumento do nosso coti-
diano, simbolicamente construído, e socialmente estruturado.

Esta segunda edição visa engrandecer as reflexões sobre a


Roupa, como um produto inerente ao trabalho humano, para o soci-
al, portanto, contextualizado dentro das realidades de cada época, e
como um objeto simbólico, que carrega os signos incorporados da
sociedade de seu tempo.

A Roupa caminhou, durante os séculos, de objeto de utili-


dade cotidiana para objeto comunicante, justamente por, como to-
dos os objetos da nossa atualidade, incorporar elementos significan-
tes. Dessa forma, pode ser vista não só como produto consumível,
mas como produto de estudo da linguagem visual de uma época.

Neste sentido, o que é trabalhado nesta segunda edição, traz,


não somente a visão do design sobre a Roupa, na perspectiva histó-
rica e cultural, mas uma reflexão sobre gênero, moda e Roupa, a
partir da perspectiva antropológica, na autoria de Tatiane Melissa
Scoz. Traz ainda a perspectiva filosófica na autoria de Albio Fabian
Melchioretto, e uma introdução sobre a constante Moda, e sua in-
terlocução com a Roupa, de autoria de Cibele Cristina Martins.
São reflexões que nos permitem conhecer melhor as rela-
ções humanas e sociais com os objetos do cotidiano, em especial a
Roupa. Na primeira edição alguns esclarecimentos foram feitos
sobre nossa especial ligação com a Roupa, dentre eles, considera-
mos que ela é objeto cotidiano, nos acompanha em todos os mo-
mentos da vida, por todos os tempos, em nossos diversos afazeres,
simplifica e exemplifica momentos, desejos, ideias, é fruto de nossa
concepção de mundo, e, surgindo com as valorações de pudor, pro-
teção e adorno, continua sua simbiose com nossos hábitos e costu-
mes.

A Roupa inicia sua trajetória social ainda no período paleo-


lítico. Cobrir o corpo era necessário para proteger, adornar e dife-
renciar. A partir dos séculos, com as mudanças sociais, o valor atri-
buído à vestimenta foi se modificando, se tornando mais complexo,
ao passo que na atualidade a Roupa assume papel de comunicação,
referenciando interpretações semióticas.

O psicanalista John Carl Flügel e Pierre Restany, junto com


Friedensreich Hundertwasser, tratam da Roupa como manifestação
da individualidade e como uma segunda pele, pela forma como é
interligada aos simbolismos das identidades culturais e dos sujeitos.

A Roupa é vista aqui como utensílio culturalmente constru-


ído. Utensílio porque tem funções que se dividem em funções de
trabalho, lazer etc., e culturalmente construído porque depende di-
retamente da forma como o ser humano, enquanto sujeito em soci-
edade, se relaciona com tudo que o rodeia, como o clima, os ani-
mais, os outros humanos e consigo.

As ressignificações da Roupa são parte de um processo so-


cial que pode ser contextualizado a partir de suas transformações ao
longo dos séculos, motivadas por acontecimentos sociais. A pro-
posta do presente livro é refletir sobre a Roupa em seu contexto
social, histórico e humano.

Pensar na Roupa como ferramenta e como produto gerou


questionamentos acerca das modificações sofridas por ela durante
os séculos, principalmente nas estruturas de corte e costura. De
peças amarradas ao corpo, o que aconteceu durante os séculos que
permitiu a Roupa se tornar tão dinâmica e variada nos tempos atu-
ais?

A pesquisa bibliográfica buscou responder a esta dúvida,


trazendo muitas considerações sobre a Roupa em seu longo percur-
so histórico. Essa pesquisa contribuiu para entendermos que as
transformações sociais acarretaram rupturas no modo de pensar e
agir. Tais transformações modificaram a função da Roupa e foram
gradativamente alterando também as noções de estética, o aspecto e
a produção da Roupa.

Tanto o aspecto como a produção da Roupa têm relação


com os avanços da tecnologia e com o trabalho e, como demais
objetos criados pelo ser humano, possuem utilidades com funda-
mentos culturais e históricos, o que possibilita ver a Roupa como
um objeto complexo.

A Roupa representou as construções sociais ao longo dos


séculos, e continua a fazê-lo. Podemos perceber muitas delas embu-
tidas no significado de determinadas peças. Por exemplo, a saia foi
classificada como feminina, ao passo que a calça como masculina.
Muitos adereços receberam traços de gênero, raça, credo e localiza-
ção.

Esta obra buscou, em livros de história e vestuário, a justa-


posição de movimentos e acontecimentos sociais atrelados às modi-
ficações nas Roupas. Lançou olhar sobre os avanços técnicos e tec-
nológicos ao longo de mil anos de sociedade ocidental, buscando
acontecimentos marcantes, que mudaram a história da Roupa no
mundo ocidental.

Ao analisar a Roupa sob o olhar da filosofia, Albio Fabian


Melchioretto traz uma crítica sobre o vestir e o nu na sociedade
contemporânea. O autor lança um olhar sobre a Roupa como sendo
uma construção política. Nesse aspecto, o autor questiona a regra
de uso de Roupas, iniciando sua reflexão abordando a Roupa como
um artefato para cobrir o nu, e conclui propondo pensá-la como um
objeto de simbolismo político e cultural.

A partir de um olhar antropológico, Tatiane Melissa Scoz,


traz uma análise dos trabalhos mais recentes produzidos no campo
da moda sobre a relação entre gênero, roupa e moda, e propõe re-
flexões sobre a ideia de moda e roupa “sem” gênero.

Cibele Cristina Martins nos permite perceber o fenômeno


moda sobre o produto Roupa, ampliando a visão da Roupa dentro
da moda, percebendo-a sob a ótica de diversos autores que a consi-
deram desde um sistema de linguagem a um reflexo cultural. A
Roupa na visão de Martins emana simbolismos da Moda, não difere
de outros objetos do nosso cotidiano, no entanto, carrega a subjeti-
vidade do sujeito.

Refletir sobre nossa sujeição à Roupa e demais objetos do


cotidiano começa ao analisarmos o produto Roupa sobre os três
elementos principais que objetificam o surgimento dela: pudor,
proteção e adorno. A função política da Roupa na visão de Melchi-
oretto nos faz justamente refletir as questões sociais da Roupa rela-
cionadas ao pudor, ao poder, e a maquinaria social. A função dife-
renciadora da Roupa acontece primeiramente no seu uso como
adorno, que carrega os simbolismos nas cores, estruturas, modela-
gens, caimentos, texturas selecionadas ao criar um produto de Rou-
pa. De certa forma, essa função aparece no artigo de Scoz, onde
podemos perceber como os significados de gênero foram atribuídos
à Roupa ao longo do tempo, ampliando o conhecimento sobre a
linha do tempo da Roupa.

No que tange ao elemento “proteção”, imaginamos primei-


ramente a função da Roupa de cobrir o corpo, no entanto, atual-
mente, a proteção pode estar também relacionada ao sujeito, à sub-
jetividade dos sujeitos que a Roupa carrega e emana. Proteger pode
estar relacionado ao ato de pertencer a um grupo, posicionar-se
como sujeito, protegendo o self. Como a Roupa acabou sendo inse-
rida neste contexto é o tema de Martins, que ao explicar a Moda e a
Roupa no permite compreender para além das funções da Roupa
como ferramenta, mas como individualidade.

Esses três autores mencionados acima estudam o momento


da Roupa a partir do século XX até o contemporâneo, complemen-
tando as análises sobre a Roupa que foram trabalhadas na primeira
edição.

Nossa ligação com a Roupa mostrou-se antiga, no entanto, a


racionalização sobre ela pode ser considerada recente. Ao longo
dessa nova edição, serão revistos os percursos que levaram a Rou-
pa, antes feita de tecidos rudimentares e amarradas ao corpo, à
Roupa atual, maleável, flexível e tecnológica. Bem como seu per-
curso de significação ao longo dos séculos.

Nesse livro, utilizamos o termo “ruptura” para significar o


rompimento de um ciclo de pensamento sobre a Roupa. Esse termo
já foi mais amplamente utilizado desde 2012 e tornando-se um
conceito mais conhecido hoje. A ruptura é compreendida como a
reestruturação que surge após a desestruturação de um ideal.
Para a leitura desse livro, é importante questionarmos a
forma das Roupas, ou seja, cada parte que compõe uma peça de
Roupa. Esse particionamento é chamado aqui de estrutura. Como
um prédio que recebe medições e materiais estruturantes, a Roupa é
vista aqui como uma construção que, diferente dos prédios, um
corpo de prova.

É possível perceber que as modificações da Roupa, ao longo


dos séculos, transitam em volta das necessidades básicas do corpo,
como movimentos e crescimento.

A Roupa é aqui tratada como um objeto de utilidade huma-


na, particionado para melhor compreender a relação da Roupa com
o corpo. É vista também como um objeto que sofre a influência de
seu tempo histórico pois, no ato de criação de uma Roupa, estão
representados a moral, os costumes, os modos de viver, as visões
de mundo.

O ato de criar uma Roupa é compatível e entregue ao tem-


po, acompanha e modifica-se, e utiliza de todos os recursos existen-
tes para, de certo modo, ser o objeto principal. Nesse processo, é
importante salientar que o ser humano depende do que está à sua
volta para o trabalho, assim sendo, é influenciado pelos valores
morais, pelos costumes, pela sua visão de sociedade e se utiliza das
tecnologias e materiais existentes e acessíveis.

O processo de criação da Roupa está ligado às simbologias


que ela representa, e nessas simbologias está todo o processo criati-
vo que esconde, muitas vezes, o objeto principal para o aconteci-
mento de uma Roupa: o seu molde.

Caimento, cortes, comprimentos e volumes podem dizer


tanto sobre uma pessoa e uma época quanto sobre as cores e os
adornos utilizados, isso porque para a estruturação desta Roupa
houve necessidade de técnica, trabalho manual e maquinário, mar-
cas da ação do ser humano.

Os conceitos subjetivos, os que nossa mente compreende


sem necessitar ler ou escutar (aparência) são também inerentes ao
tempo. Tudo acontece ao seu tempo, e na estruturação da Roupa
tudo aconteceu em momentos próprios, que as tecnologias, a ciên-
cia, ou a religião permitiram.

A minissaia do século XX, tão comum na atualidade, não


existiu antes dos anos 1960. Período marcado pelo feminismo e
juventude. Os ideais se modificam, alguns ficam no passado, outros
surgem como novidade, mas a Roupa continua, é ressignificada e
reinterpretada.

A Roupa está interligada à tecnologia, ao modelo de traba-


lho, às novas máquinas, recursos e insumos têxteis, ciência, inova-
ções, se associando a um momento; e esse é absolutamente relevan-
te quando analisamos a construção da Roupa. Nesse processo estão
contidas informações que nos ajudarão a vê-la como um artefato,
um objeto repleto de significados que comunica um tempo e ideias.

Penso, logo existo. Já dizia Descartes (1586-1650), em seu


famoso Cogito Ergo Sum (1637). Da Roupa podemos dizer: Penso,
logo crio, logo faço com o que tenho em mãos do jeito que me é
possível! E nessa sociedade tecnológica, podemos dizer que o de-
senvolvimento da vestimenta acontece conforme as necessidades e
desejos humanos.

A Roupa age como um auxílio, uma ferramenta. Mais que


um simples cobrir o corpo, utilizar uma Roupa ocupa parte signifi-
cativa do nosso tempo de pensar. A estruturação da Roupa, portan-
to, vai além do conjunto de materiais utilizados para ela. Ela é uma
ideia.

Buscando conforto, estética e principalmente, utilidade prá-


tica, a partir dos nossos objetos cotidianos, a Roupa possivelmente
é de todos os nossos objetos, o mais importante. Porque limita, ini-
be, ou facilita nossos movimentos. Nos causa desconforto, dores,
ou conforta e nos mantém bem em qualquer situação.

Ao nosso lado, todos estão executando tarefas cotidianas e,


de alguma forma, pensaram em suas Roupas antes de vesti-las. As
Roupas, assim, racionalizaram o vestir, algo que é tão cotidiano e
comum. O vestir passa a ser automático, não percebido.

Os conceitos de design para a vestimenta consideram a ca-


pacidade de a Roupa ser vestida e retirada com facilidade, e de a
Roupa alinhar-se no corpo de tal forma que não apresente empeci-
lhos aos movimentos do corpo humano. Apesar de considerarmos a
Roupa como uma construção estética, o valor dela está muito mais
para a sua usabilidade do que para um conjunto de peças combinan-
tes entre si. Adequar-se ao estilo de vida é parte inerente da Roupa
desde seu surgimento, na antiguidade. As peles amarradas ao corpo
eram batidas e mordidas, ação feita ainda hoje em algumas socie-
dades esquimós, buscando amaciar o couro para que melhor con-
tornasse o corpo, evitando inibir os movimentos durante uma caça-
da.

Olhar o passado é a melhor forma de conhecer a trajetória


desse produto tão antigo que é a Roupa. A partir do estudo da cul-
tura aprendemos sobre desejo, consumo e técnica, pois, ainda as
Roupas na antiguidade necessitavam de utilidade, e o processo de
criação dos desejos e da estética antigos pode ser facilmente perce-
bido em tempos atuais.
Esquecer essa história de estruturas é como esquecer uma
língua. Há objetivo em toda a parte da Roupa, como um projeto
arquitetônico, a engenharia do vestir, desvestir, usar, mover-se, agir
com o meio e receber a interferência dele. Reler as antigas estrutu-
ras é como aprender a reestruturar. Conceito que cai bem nesse
momento moderno onde tudo é desestruturado e reestruturado para
a criação de algo novo.

A partir dessa análise, constituída do conhecimento dos


atributos de uma estrutura: tempo, sociedade, composição e objeti-
vo, é possível iniciar uma reflexão sobre a ação de dar objetivo para
a Roupa. Pensar a Roupa exige pensar a sociedade. As transforma-
ções sociais, a partir de choques culturais, guerras, sucessão de mo-
narca ou presidente impõe ao povo um novo modo de vida. Esse
estudo proporciona conhecer esses momentos a partir da história da
Roupa.

Esses choques culturais e momentos históricos são tratados


neste estudo como rupturas, pois trouxeram para a estruturação da
Roupa um novo olhar: transformamos a Roupa para quem a veste,
logo as transformações na sociedade implicam transformações na
Roupa.

Um homem de fraque e cartola durante o século XIX repre-


sentava mais seriedade que um monarca, pois estes vinham desde o
século XVII mostrando a falta de relacionamento com o povo, e os
interesses por frivolidades. A Roupa, no primeiro caso, era caracte-
rizada por cortes sóbrios e poucos detalhes marcantes, no segundo,
caracterizada por volumes, recortes e detalhamento extra. Essas
manifestações tornaram-se parte do senso comum na medida em
que os cortes retos foram associados à sobriedade, e os volumes e
exageros à futilidade. Essas valorações se refletem no modo como a
Roupa passou a ser percebida pelas gerações seguintes.
Esse conhecimento nos auxilia a desconstruir não apenas a
forma da Roupa, mas o signo, a ideia, o modo de ver. O fraque e a
cartola são hoje artigos de festas de época ou bailes formais, mas a
sobriedade da cor preta e dos cortes retos continua agregada a ves-
timenta masculina, delimitando, inclusive, os limites entre masculi-
nidade e feminilidade.

As rupturas, tanto antigas quanto modernas, tiveram efeito


sobre a estruturação da Roupa, que é transformada ao longo dos
anos seguindo uma série de intuitos gerados do pensamento coleti-
vo, e a cada mudança no pensamento coletivo a Roupa é adaptada.

A Roupa atual pode ser ligada a uma série de tendências de


personalidade. Mostra consumidores que buscam por algo novo,
como compreensão pessoal. A ligação entre as rupturas sociais e a
estruturação de uma Roupa é o ponto onde uma ideia passa a fazer
parte de uma Roupa. A exemplo do momento em que a sobriedade
serviu ao propósito de demonstrar o respeito exigido pelos burgue-
ses, a Roupa foi desestruturada e reconstruída com cortes simples e
cores neutras. A neutralidade representava o oposto dos exageros
monárquicos, e os cortes retos vão a desencontro dos cortes exube-
rantes das côrtes. Trata-se da criação de uma imagem que represen-
tava o oposto daquela que se buscava negativar.

O processo criativo de uma Roupa é complexo e envolve


uma série de valores, ele é ligado ao espírito humano, pois, cria
uma imagem para representar e se envolver com objetos de profun-
do significado particular. Num exercício pleno de comunicação
visual, embute os preceitos do tempo (valores e signos), e de tama-
nho envolvimento se apega profundamente.

Em todos os momentos de nossa história, estivemos interli-


gados à Roupa, e esta passou a nos suprir cada vez mais em neces-
sidades físicas e fisiológicas, mas é perceptível que os valores, a
moral, a cultura interferem tanto quanto as necessidades do corpo.
Comunicantes, as vestes são por vezes objeto de denúncia, repres-
são e protesto. Continuamos a nos proteger do frio, dos animais, a
nos embelezar, diferenciar e a cobrir nossas “vergonhas”. Vestir-se
para nós é mais que cobrir o corpo, nos vestimos com dados que
achamos importantes. Penso, logo me visto!

Flusser (2007) diz que tudo que o ser humano faz está liga-
do ao fato de querer fugir da única certeza da vida, que é a morte!
Então, vestir, além de proteger, diferenciar e adornar, está repleto
de sentimentos, moral e condutas, e pode ser o sentido de uma di-
versão, para literalmente gostar da vida.

Subjetivo ou objetivo, se vivemos para fugir da certeza da


morte, então nos vestimos para dar sentido à vida.

Emanuella Scoz
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ROUPAS

Emanuella Scoz

Aprendemos com imagens, primeiramente, e depois nelas


codificamos palavras (FLUSSER, 2007).
A aparência que a Roupa nos transmite pode ser em ponto
subjetiva, as mensagens que uma vestimenta nos transmite pode
não ter explicações decorrentes do mesmo período vivido; pode ser
decorrente de um momento histórico ou de sucessões de fatos, que
se misturam ao pensamento social dos tempos seguintes.
Assim como o terno sustenta uma imagem séria, que possi-
velmente surgiu durante a formação da burguesia, ao tornar sóbrias
as Roupas masculinas, tornando a ostentação algo impróprio ao
homem. Os signos (significações sociais cotidianas atribuídas em
imagens) são repassados em filmes e documentários, na Roupa de
cena; a construção do personagem necessita do estudo de seu tem-
po, bem como de suas particularidades pessoais.
Atualmente, na chamada sociedade líquida1 os valores se
dissolvem, são solúveis às novas formulações culturais. As tradi-
ções antigas viram representações folclóricas, deixam de ser hábito.
As desestruturas semióticas relatam novas estruturas, a própria es-
truturação da Roupa, em seus cortes, demonstra novos signos.
A estrutura é envolta por diversos signos, por exemplo: a li-
nha do ombro construída de forma mais ampla sugere domínio, isto

1
De BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar,
2001.
pode estar ligado ao fato de esta linha de ombro mais amplo ter
sido utilizada pela realeza, deixando para a sociedade o estigma de
poder, ou mesmo pela expressão de cansaço ser facilmente vista em
uma pessoa com ombros caídos.
Na Roupa feminina, os movimentos feministas da década de
1930 em Paris, e estilistas como Coco Chanel, ao libertar a mulher
trouxeram peças do universo masculino, como a calça e o cardigã.
Representando uma mostra de posse do papel antes masculino. Ao
mesmo que Christian Dior, ao final da Segunda Guerra Mundial
"resgata a feminilidade" da mulher ao devolver-lhe a saia rodada, o
corpete e o salto alto.
Esta representação de poder a partir de um corte feito na
Roupa é uma linguagem estética construída por acontecimentos que
antecedem a sociedade atual. Vivemos uma continuidade semiótica,
rompendo tradições a cada nova geração.
Os momentos de modificação da estrutura estão interligados
aos fatos históricos, momentos de mudança do pensamento coleti-
vo, avanços da ciência, que construíram também a sociedade. A
Roupa entra neste contexto em total fusão com os propósitos da
época, por exemplo, um decote poderia dizer muito sobre a pessoa
que o exibia, num local como a Espanha de 1400 d.C. que financia-
va a Santa Inquisição, onde a fé católica impunha rígida moralida-
de.
A Roupa, contextualizada historicamente apresenta repre-
sentações simbólicas estéticas diferentes, porém, percebe-se que a
estrutura inicial da peça rumou por uma única linha, evoluindo em
volta do corpo, e se aprimora a fim de melhorar a sua integração
com ele.
Na contemporaneidade, o consumidor recria sua vestimenta
e hábitos, a estrutura da Roupa também reflete os simbolismos des-
ta nova sociedade, em meio a uma ruptura de valores que pede uma
ruptura no vestir, esta desestrutura antigos conceitos, como regras
de etiqueta na vestimenta, e une várias culturas, trazendo à tona um
pouco da comunicação de cada uma, assim, a estrutura recria-se
também para uma nova comunicação. O hibridismo cultural 2, ocor-
rido também na Roupa acaba por democratizar as culturas, ao
mesmo que amplia identidades.
Com este hibridismo cultural notam-se tendências de com-
portamento, representando uma ideia ou movimento. Não raro,
produções independentes de criadores locais caracterizam-se como
luxo e explodem nos meios midiáticos virtuais. Na atualidade, faz-
se mais importante conhecer o conceito, o simbolismo, a ideia con-
tida na Roupa, do que uma tendência pronta.
As tendências atuais representam a práxis da vida humana,
o comportamento. Buscam no cotidiano sua orientação e simulam
possibilidades futuras. Estão vinculadas às formas sólidas de pes-
quisa que orientam o pesquisador a conceber uma tendência de
comportamento de massa. A tradução desta em cor, forma e textu-
ra, no entanto, deve ser pertinente ao momento e cultura vigente. O
que faz que muitas tendências sofram antecipação e não atinjam o
consumidor por não partilhar do seu momento.
Moda é cultura, nela estão inseridos os códigos de estética e
valores culturais sociais. Roupa é um objeto de uso cotidiano, que é
um de nossos artefatos de ação. Sobre a ação o design toma suas
propriedades. Sobre a cultura a moda se vincula. Não sei se é pos-
sível, no entanto, separar ambos.
Aparentemente, na atualidade, existe uma distinção entre o
que é útil e o que é estético quando pensamos em Roupas. O que é

2
Termo utilizado por Boaventura de Souza Santos em Globalização e as ciên-
cias sociais, de 2002, explica as influências entre as diferentes culturas mun-
diais em detrimento da globalização.
útil, confortável, não necessariamente é construído de forma estéti-
ca. Primeiro, porque o conforto não consegue atingir a estética do
objeto frívolo, criado em uma época em que o conforto era regido
pelas imposições morais (lembramo-nos dos espartilhos), ou onde à
ciência ainda não havia sido permitido estudar o corpo (lembramo-
nos da altura dos sapatos de salto femininos).
Segundo porque não concebe a possibilidade de recriar uma
concepção de estética baseada em outra comunicação social, como
a modificação da própria estrutura da Roupa objetivando conforto,
compreendendo que este pode adquirir simbolismos estéticos. A
linguagem para a estética, é objeto de estudo tanto quanto a estrutu-
ra para o design.

1.2 REPENSANDO A ROUPA DOS TEMPOS


ANTIGOS
Para repensar a Roupa necessitamos repensar a forma de ver
o antigo. Primitivo vem de primeiro. O fio da seda, ao ser descober-
to, impulsionou modificações nos teares e processos de fiação da
China. É até hoje um fio de tamanho força e delicadeza, cujas pro-
priedades naturais não foram substituídas por nossos materiais e
processos tecnológicos mais avançados.
No minidicionário Luft, a Roupa aparece como: pedaço de
tecido para agasalho ou cobertura. E vestir como revestir, forrar,
usar vestuário, trajar, cobrir com Roupa. Nota-se aqui a relevância
do termo cobrir. Pode unir-se aos objetivos primitivos da Roupa:
conceber o pudor, proteger o corpo, ou diferenciar as pessoas por
suas ações na dinâmica social.
De qualquer forma, desde a antiguidade a Roupa já tratava
do corpo. Habitando um corpo, a Roupa passou a ser interligada, de
modo subjetivo, à classificação da pessoa que habita, assumindo
representações de suas atitudes, ocupação social e status.
As leis suntuárias, criadas pelas monarquias absolutistas pa-
ra manter a diferenciação nos códigos sociais, incluía a vestimenta.
Tecidos e cores eram privilégios de monarcas.
A Roupa, o traje, identificavam a pessoa antes mesmo de
seu nome. É importante salientar neste contexto todo, que estrutura
representa uma parte muito importante para a Roupa, que, além de
linguagem e estética, é também o processo.
Atualmente a Roupa é construída a partir de vários proces-
sos entre a concepção do produto e sua fabricação. Para sua estrutu-
ração existe muitas técnicas e ferramentas que fazem parte dos pro-
cessos, não só da modelagem da Roupa, mas também da costura e
beneficiamento.
A moulage ou drapping, técnica comum para alta costura,
que consiste em construir um molde em tecido diretamente no cor-
po de um manequim. Muitos costureiros confeccionam os próprios
manequins, e as próprias ferramentas, garantindo sua exclusivida-
de.
Volumes e silhuetas podem ser desenhados no corpo a partir
do uso correto de medidas. Esta moulage possivelmente é o primei-
ro ofício provindo da evolução das técnicas de antigos costureiros.
Em idos de 1840 já havia uma grande quantidade de instrumentos
para a elaboração de um molde.
A postura tem grande influência na construção da Roupa;
utilizando linhas de posição para o corpo é possível analisar a me-
lhor postura, para evitar que a Roupa crie uma má impressão ao ser
vestida. Todos estes aspectos são importantes e devem ser conside-
rados como parte estimulante para a construção de uma Roupa. O
bom uso da estrutura será fundamental para seu aspecto final.
Construir é parte do processo de criação da imagem pessoal.
Durante a história, muitos fatores influenciavam no corte:
uma nova descoberta territorial, a descoberta de novos povos, ou a
sucessão de um reinado, cada um destes eventos trouxe novos ins-
trumentos, novos materiais, e novas ideias.
A estrutura da Roupa anterior ao século XI, nas comunida-
des europeias era simétrica e geométrica, o calção tinha cortes retos
da cintura ao joelho, e era amarrado à cintura por um cordão. A
vestimenta parece ter sido traçada nas formas do corpo, porém sem
curvas; após certo período as curvas aparecem, e após a construção
de métodos registrados, passa a evoluir com traços parecidos com
os atuais.
Entre os séculos XI e XII a Roupa demonstrava ser constru-
ída com base técnica e muita medição. Entre os séculos XII e XIV a
Roupa teve uma mudança relevante em seus cortes; surgiram pen-
ces e pregas que retiravam o excesso que se formavam nas curvas
do corpo; os desconfortos nas junções eram aliviados, sobretudo
nos cotovelos, com aberturas. A vinda de costureiros do oriente,
mantidos nas cortes, modificou a estrutura.
Estes costureiros tinham conhecimentos sobre técnicas de
corte e costura que contribuíram para a mudança. A tradição, não é
de hoje, dissolvida. A sociedade líquida nos demonstra algo ineren-
te a humanidade: a vontade de mudar.
A partir do início do século XXI a Roupa mais comum foi o
jeans, antes instrumento de mineradores e trabalhadores do proleta-
riado, o jeans apareceu em filmes como instrumento de revolta en-
trou no gosto popular, chegando aos desfiles de alta costura. Este
tem profundas transformações em sua estrutura.
Muitas vezes pences são feitas nos joelhos, pois estes no te-
cido de brim tendem a lacear com o tempo, e ficar com aderência
nos joelhos, estas pences nas laterais ajudam a curvar a calça na
altura do joelho, assim, com espaço para movimentação dos joe-
lhos, a calça não deforma. São detalhes que permitem que a Roupa
tenha melhor caimento e mais qualidade. Até a década de 1940 esta
construção seria vista como desleixo, porém os valores mudam e à
procura de conforto submetem-se novos valores.
A ruptura da vestimenta vem aliada a uma ruptura de con-
ceitos, novamente, do pensamento coletivo, que toma um rumo
pessoal e individual talvez nunca vista, porém comparável à busca
pela diferenciação que acontecia nas cortes europeias durante toda
a Idade Média e Renascença.
Neste novo momento, é possível analisar com mais deta-
lhamento os comportamentos, pois, a ciência cognitiva também
teve notáveis avanços em relação a comportamento e pensamento
coletivo. O consumo atualmente manifesta-se em vista de um bem-
estar, funcionalidade e prazer para o consumidor.
E, apesar de ser uma incessante busca por individualidade,
mantém todos cada vez mais conectados, discutindo pontos de vista
e opiniões, e assim criando uma coletividade, marcando este perío-
do como um momento de ruptura. Outro pensamento seria a já ci-
tada valorização da cultura, do histórico, do povo, confirmando a
importância da coletividade cultural.

1.3 A ROUPA DAS SOCIEDADES ANTIGAS


Existem registros de ossos no formato de agulhas datados de
quarenta mil anos (Köhler, 2005). Pode ter se formado ali o modo
primitivo de costurar, passando o fio pelas peles com uso destas
agulhas. As peles eram retiradas do animal morto e curtidas à base
de óleos vegetais e amaciadas por mordidas, técnicas utilizadas até
hoje pelos esquimós, depois de costuradas, o resultado é o surgi-
mento de uma vestimenta primitiva.
Além de peles, os materiais eram os que se encontravam na
natureza, raízes e sementes. O fio, acredita-se, tenha sido feito utili-
zando os tendões dos animais, durante o período primitivo, evolu-
indo até o enroscamento de fibras encontrado já na Antiguidade
Clássica.
A Roupa surge por necessidade de proteger o corpo, cobrir
as partes íntimas e diferenciar posições dentro de uma mesma soci-
edade tribal. Recebe ao longo dos milênios adaptações, incorporan-
do todo tipo de material à sua confecção.
Por volta de 600 a.C. surge no oriente a tesoura. Instrumen-
to atribuído à confecção da vestimenta, no entanto, apenas durante
o século XVIII. Em algumas referências de pesquisa, a tesoura é
citada como criação de Leonardo Da Vinci, já evidenciando seu uso
durante o século XVI, porém não há registros conhecidos deste
invento.
Antes do ano 1000 d.C. muitos povos já tinham formas de
estruturar suas Roupas, alguns povos apresentavam formas próxi-
mas das atuais, ainda que de forma mais rústica, até muito antes
deste período; antes mesmo da contagem do primeiro ano cristão,
Cretenses, Medas e Persas já tinham construído uma forma própria
de vestir.
Suas formas eram geométricas, e a vestimenta padrão tam-
bém para estes povos era a túnica, que consistia naquele momento
em um pedaço de tecido longo, por vezes com manga, mas geral-
mente enrolado sobre o corpo e preso por amarrações, a forma de
vestir, no entanto trazia elaboradas formas de enrolar e prender.
Algumas Roupas de povos anteriores ao ano 1000 d.C. eram cons-
truídas de forma bem peculiar, como a parte superior: Tratava-se de
duas peças de igual tamanho, inseridas nas laterais da pessoa e cos-
turadas ou amarradas nas costas; a frente podia ser amarrada. Após
inseriam-se as mangas em buracos feitos na área dos ombros.
As calças mais primitivas seguiam processo semelhante:
dois pedaços de tecido cortados de forma a serem mais justos na
boca da perna eram inseridos na pessoa pelas laterais, em seguida
costuravam a parte interna das penas, e após costuravam a parte
onde o tecido se unia, atrás e na frente, formando uma espécie de
gancho. Na cintura era amarrado para não cair, e utilizavam nesgas
para aumentar o espaço para movimentação.
A Roupa não tinha necessariamente conforto, se comparada
as Roupas tecnológicas e antibactericida, ou elásticas dos dias atu-
ais, mas era um artefato, produzida por artífices especializados. Por
vezes a costura poderia ser feita com a mesma linha do tecido, em
uma espécie de trama junto ao tecido, deixando-a invisível.
Pelas características artísticas no trabalho manual, a Roupa
poderia causar dificuldade no manuseio, ou mesmo ao vestir e reti-
rar, talvez por isso não houvesse a necessidade de trocar de Roupas
várias vezes ao dia como hoje. Apenas retirava-se a veste de cima,
chamada túnica, e, para dormir mantinham-se com a veste de baixo.
Este costume se manteve por toda a Idade Média no mundo ociden-
tal, cessando com as transformações políticas e as revoluções in-
dustriais a partir do século XVIII.
No Egito surge a primeira camisa, em 5 mil a.C. já apresen-
tando a tecelagem do fio de algodão e do linho. Neste período a
Grécia utiliza túnica e mantos, e Creta utiliza peças parecidas com
saias, elaboradas em escamas, cintas e uma vestimenta mais rígida,
os egípcios cultivam o shenti, um pedaço de tecido enrolado ao
quadril formando uma espécie de saiote.
A túnica romana tinha semelhança com o kalasiris egípcio,
este era quase um retângulo, onde a manga era cortada junto com o
traje, em uma peça só. No meio da peça havia um corte circular,
que permitia ser vestido pela cabeça. A estrutura em si teve poucas
alterações, a manga passou a ser separada, o decote quadrado e a
parte baixa tornaram-se mais largos, por serem também fechados
nas laterais, o que dificultava o movimento, porém, mantiveram-se
os cortes retos.
Em meados do ano 700 d.C., povos como os Citas utiliza-
vam uma vestimenta mais próxima da que surgiria depois na Euro-
pa, composta de calças bem largas e um casaco aberto na frente,
preso a cintura por um cinto. A inserção de nesgas, em geral nas
áreas que necessitavam de mais largura, como na saia dos vestidos
ou no corpo das bermudas, aconteciam porque os cortes ainda eram
retos, impossibilitando a movimentação do corpo em certas áreas.
Imagine cortar a saia de um vestido de forma reta, e costurá-
la como um cilindro, com a mesma medida da cintura até os pés, e
tentar sentar-se depois de vestida. O resultado é que a falta de ade-
quação do corte às curvas do corpo e às necessidades de movimen-
to dele poderiam criar desconforto, ou mesmo impedir o movimen-
to.
O mesmo acontece com a bermuda, que muitas vezes era
cortada em duas partes: frente e costas, sem a existência de um
gancho, por este motivo eram largas até a cintura, então necessita-
vam de uma corda para prender a Roupa na cintura, como um cinto.
A partir do ano 1000 d.C. a vestimenta passa por transfor-
mações naturais, regidas em partes pela miscigenação de culturas,
no advento das cruzadas, em partes pela necessidade, mais ainda
pelo início do comércio. Em meados do século XII, estes eventos
permitiram que povos mais distantes da própria Europa vivencias-
sem outras culturas, e o descobrimento das Roupas e materiais (te-
cidos, pedras preciosas, máquinas etc.); esta descoberta acontece
entre os povos da Europa Ocidental.
Aos poucos, as formas fluídas envoltas no corpo transfor-
mam-se em formas rígidas que procuravam contornar e afirmar o
corpo, com isso faz-se necessário o corte do tecido em pedaços que
possam, assim que unidos, cobrir as partes do corpo completamen-
te, sem deixar aberturas aparentes. Assim pode ter surgido uma
primeira concepção de cortes de frente e costas, com necessidade
das mangas, que evoluiria gradativamente, até a concepção primá-
ria da estruturação.
Utilizar Roupas elaboradas costumava ser ato restrito, os
camponeses confeccionavam sua vestimenta, com materiais do seu
meio, comumente de lã fiados à mão, o que manteve os cortes e
tecidos mais rústicos. O tecido variava seguindo o grau de civiliza-
ção das sociedades. Alguns povos, por serem nômades e por diver-
sas vezes viver em condições climáticas difíceis e de temperaturas
baixas, costumavam utilizar peles e lã de carneiro. O oriente já ti-
nha maquinário próprio para fiação e tecelagem, e compunham
tecidos com entrelaçamento de fios de ouro e seda.
A túnica do século XI não tem muitos recortes e encaixes, a
costura é lateral e abaixo das mangas, algumas túnicas tinham a
manga cortada separadamente, sendo costurada em uma cava de
cortes retos. Esta túnica já era utilizada como Roupa de baixo para
os romanos.
Durante o século XII a vestimenta já havia tido uma trans-
formação leve, a túnica feminina era mais ajustada e o corte já ti-
nha, ao menos na área da cintura, mais curvatura. No reinado de
Eduardo, no século XIII, é possível notar o uso de túnicas de diver-
sas formas, manga longa, comprimento longo ou curto. E uma túni-
ca com capa, presa por fibulae, e fitas amarradas à perna, prova-
velmente com uso de túnica sem mangas por baixo da capa. Os
camponeses amarravam faixas nas canelas, envolvendo-as em espi-
ral.
Neste período nota-se a preocupação com as formas do cor-
po. Iniciando um processo de modificação na estrutura da Roupa,
não mais apenas por meio de amarrações ou aplicações, mas pelo
corte.
As túnicas, tanto masculinas quanto femininas não tinham
forro, eram utilizadas com uma veste debaixo, que consistia na
mesma modelagem, porém de mangas curtas; tinham bainha nos
punhos, decote e barra.

1.5 A ROUPA NO CORPO


O estudo do corpo humano iniciou na Grécia antiga, as está-
tuas de mármore remodelavam um padrão de físico simétrico. Po-
rém, com os avanços da medicina o corpo foi, aos poucos, desven-
dado. Leonardo Da Vinci durante o século XVI dissecava corpos
para entender a estrutura muscular do corpo humano, aplicou os
estudos de Vitrúvio, sobre o número áureo de Fibonacci, ao corpo
humano, e destes estudos surgiu a figura humana mais detalhada. O
médico alemão Johann Sigismund Elsholtz parece ter sido o pri-
meiro médico a preocupar-se com a medida do corpo humano. Sua
tese de graduação era intitulada Antropometria, na sua primeira
edição em Pádua, em 1654. Somente no século XVIII a antropome-
tria passou a ser estudo, também por sugerir estudos importantes
acerca da saúde.
Atualmente o corpo volta a ser valorizado, as tecnologias
tornam a modelagem mais inovadora, na verdade, a partir da mes-
ma base de réguas e medidas padrão, criam-se formas e o corpo é o
novo objeto de estudo. Pela análise da função da Roupa no corpo,
novas medições surgem buscando respeitar as diferenças raciais das
medidas adquiridas com os estudos de antropometria e ergonomia,
dos quais conhecimentos sobre volumes, movimentos e crescimen-
to do corpo são transferidos para a Roupa no intuito de satisfazer
quem a veste. Pelos estudos de Vitrúvio, Da Vinci, Elsholtz, o cor-
po humano reconhecido como normal (sem deficiências, síndro-
mes, deformidades ou qualquer situação que tenha fator genético ou
ambiental que possa ter causado diferença no padrão de crescimen-
to e desenvolvimento físico) tem a altura medida por cabeças.
A busca pela medida ideal, já na Grécia, talvez, tenha influ-
enciado que, em nossa sociedade atual, a Roupa não seja adaptada,
pensada, ou projetada tendo em vista a diversidade de corpos, bió-
tipos, e condições diferentes, do ser humano, em relação a antro-
pometria e ergonomia. Estes estudos, aliados ao estudo da antro-
pometria define que o comprimento de uma pessoa tem de sete ve-
zes e meia à oito vezes a medida de sua cabeça.
Além das medidas de corpo, para que a Roupa tenha usabi-
lidade e conforto é necessário respeitar as características do materi-
al utilizado, assim como o corpo é estudado buscando suas caracte-
rísticas, o material também.
O tecido, material mais comum para a confecção de Roupas,
possui capacidades de esticar e encolher, reage de diferentes manei-
ras ao tempo e clima. O tecido vai agir e reagir de acordo com as
capacidades das fibras utilizadas nos fios de seu tecimento, e de
acordo com o formato de entrelaçamento dos fios na tecitura.
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A nomenclatura utilizada para diferenciar os tecidos, está,
comumente, ligadaa ao
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a venda que foi utilizado
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para a produção do tecido.
Todo este conhecimento influencia na composição de uma
peça de Roupa. E, na sua estruturação, pois, modificam as proprie-
dades esperadas com a Roupa, tanto estéticas quanto físicas. A As-
sociação Brasileira de Normas Técnicas- ABNT, atualmente, pos-
sui tabelas que auxiliam a verificar as medidas do corpo humano,
separadas por sexo e idade, e igualmente normatiza os ícones utili-
zados para descrever os cuidados necessários com cada tipo de te-
cido e fibra.
Mas, na criação da Roupa, empresas e criadores são livres
para determinar medidas ou materiais, de acordo com as necessida-
des específicas que o consumidor requer do produto.
Claramente qualquer empresa ou criador pode ter sua tabela
de medidas, podendo também graduar para mais ou menos números
do manequim. Atualmente as medidas presentes no manequim se-
guem um padrão de medidas que procuram dar simetria ao corpo.
Isto é conseguido por uma série de estudos de altura e massa, massa
óssea e musculatura, as partes são medidas do lado esquerdo e
comparadas ao lado direito.
O manequim ainda, feito de material sólido, em geral plásti-
co, coberto por fino enchimento e envolto em linho rígido, existin-
do nas medidas infantis e adultas para feminino e masculino, pode
ainda ser moldado de acordo com a forma desejada.
O molde foi a representação planificada das formas do cor-
po, para que a Roupa tenha bom caimento e bom corte, é extrema-
mente necessário que o molde tenha medidas exatas, e que cada
parte que se encontra no molde, não permita sobras nem excessos,
uma vez que este representa o corte a ser feito no tecido.
A modelagem atual segue uma série de medidas de orienta-
ção para construção do molde que utilizam as medidas do corpo
como base. Há formulações matemáticas que evidenciam onde a
cava deve iniciar, onde ela termina e o grau de curvatura essencial,
a altura da cintura e quanto deve ser descido para criar o compri-
mento desejado.
A divisão do corpo, no estudo da antropometria (que utiliza
medidas de crescimento do corpo humano) e da ergonomia (que
estuda os movimentos cotidianos do corpo) levaram a repartir a
Roupa em lados: superior e inferior, com corte na cintura; frontal e
traseiro, com cortes nas laterais do tronco e dos membros; e uma
divisão que reparte o corpo em lado esquerdo e direito, indicando o
posicionamento de materiais como botões e zíperes, que auxiliam a
vestibilidade.
Esta orientação de divisão do corpo humano auxilia na
compreensão dos pontos de movimento do corpo, onde são comu-
mente posicionados os aviamentos e as costuras. Destes pontos de
divisão são utilizadas as medidas do corpo humano, divididas em
medidas de circunferência e medidas de comprimento. São me-
didas de circunferência: o pescoço, busto, cintura e quadril, bem
como circunferência dos membros no início, meio e fim de cada
membro.
As medidas de comprimento mais comuns são de tronco,
onde se mede a altura do ombro até o umbigo. Altura de seios, que
é a medida do ombro até o final dos seios, linha de costura do om-
bro, que procura medir a extensão do ombro do decote até o início
da cava, analisando o caimento do ombro, cintura medindo a altura
do umbigo até o pescoço. Para a cava, que é a união das mangas
com o corpo da peça, na divisão entre tronco e membros, mede-se
frente e costas, da altura do ombro até o final da axila, a estas me-
didas são adicionadas na confecção do molde centímetros a mais
para permitir o movimento. São medidas de comprimento, ainda,
comprimento dos membros, e do gancho, que é a parte que une as
calças no meio do corpo na parte frontal e traseira.
Para o gancho mede-se a altura da cintura até o final do
quadril, com a pessoa sentada, para o comprimento do braço tira-se
a medida do cotovelo ao pulso, com o braço dobrado em 45°. As
técnicas de medição do corpo ou do manequim são baseadas nos
movimentos cotidianos do corpo, visando permitir as ações de sen-
tar-se, andar, vestir, despir, correr, suar, dentre outras ações cotidi-
anas.
Os sistemas de medição, ampliação de gradações de moldes
ou mesmo a estruturação das Roupas tiveram modificações no sé-
culo XIX. A produção massificada das Roupas teve início com o
surgimento da máquina de costura, no início século XIX.
O corte de moldes e a gradação destes são recentes na in-
dústria de vestuário, sem datas precisas, pode ter acontecido grada-
tivamente após o surgimento das primeiras máquinas elétricas, em
1921, que impulsionaram a produção em maior quantidade, fazen-
do emergir a necessidade de modificar os antigos moldes da alfaia-
taria para peças mais geométricas, deixando-as mais fáceis de en-
caixar num enfesto e gerando menos desperdício de tecido.
Todo o contexto do século XIX impulsionou transformações
em relação a produção e trabalho, que alteraram o formato das
Roupas.
A revolução industrial marcou grandes mudanças para o co-
tidiano do século XX, mais tarde, na Segunda Guerra Mundial,
grande parte dos insumos e materiais têxteis passou a ser utilizado
na geração de suprimentos para a Guerra, confecção de uniformes,
em brim e sarja, e paraquedas, que eram produzidos com nylon.
Todo material têxtil ficou suprimido ao extremo necessário e du-
rante este período.
As transformações da Roupa durante a revolução industrial
aliadas ao novos meios e necessidades de vida do período da Se-
gunda Guerra Mundial trouxeram para as Roupas peças mais justas
ao corpo, e cortes mais retos. Detalhes antes feitos com guarnições
de renda ou bordado são trocados por pregas e outros detalhes de
menor custo, como costuras diferenciadas.
Se retrocedermos na análise histórica, em linha contínua a
partir da Idade Média, poderemos constatar que, apesar de profun-
das mudanças na estética e métodos de produção, a Roupa segue
em evolução baseada no corpo e nas antigas modelações, mantendo
a máxima de Lavoisier3: "nada se cria, tudo se transforma", e a má-
xima de Chacrinha4: "nada se cria, tudo se copia".

3
Antoine Laurent de Lavoisier, considerado o pai da química moderna.
4
José Abelardo Barbosa de Medeiros, comunicador de rádio e televisão no Bra-
sil, tendo sucesso da década de 1950 até a década de 1980.
2. A ROUPA A PARTIR DA IDADE
MÉDIA
No período que data a Idade Média, Baixa Idade Média, no
início do milênio passado, a veste principal era a túnica. Antes do
período da Idade Média, na Antiguidade Clássica, Gregos, Egíp-
cios, Etruscos, depois Romanos e Bizantinos utilizaram a túnica
como sua principal veste.
No início da Idade Média esta peça já estava bem difundida,
do Kalasiris dos Egípcios a outros modelos de túnicas abertas nas
laterais, mais pareciam um camisolão. No início da Idade Média a
túnica mais comum era até os joelhos, ou tornozelos, fechada nas
laterais por amarração e com mangas.
Desde seu surgimento, no período primitivo, a Roupa culti-
vava signos, pelos séculos seguintes agregou valores e representa-
ções do pensamento coletivo; a partir do século XI, no entanto, a
Roupa ganha uma significação especial. A individualização dos
signos expressos na Roupa torna-se mais evidente ao passo dos
séculos.
A veste da nobreza era muito representativa, podia represen-
tar o humor, situação política, ou mesmo mostrava sensualidade
nos grandes bailes da corte, e foi com os nobres que a Roupa pas-
sou a ter significados diferentes, representar situações, tornou-se
uma comunicação pessoal, não mais apenas coletiva.
É pela vestimenta dos nobres, representadas em iluminuras
e pinturas que podemos observar as transformações sociais da Rou-
pa. Isto porque os nobres podiam investir representativa quantia
neste objeto, enquanto os plebeus teciam seu próprio tecido, de lã,
ou juta, ou vestiam-se com Roupas de peles de animais, e Roupas
feitas com os sacos das batatas.
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Antes do século XI o comércio, incluindo comércio de têx-


teis, era forte do lado muçulmano para a Europa, passando pela
Sicília e Espanha, porém em pequenas quantidades que eram desti-
nadas apenas aos reis. Com a conquista da Sicília em 1060, os
Normandos agregaram muito em sua cultura, pois era o Oriente
muito superior em termos de conhecimentos e artesanato.
Viviam em meio a um luxo e requinte visual. Ali, muitos ar-
tesãos permaneceram, criando costumes, tecelagens e ourivesaria
até a corte de Frederico de Hohenstaufen, coroado imperador de
Roma em 1220. Em seu reinado a arte teve um papel importante.
Foram assimilados aos costumes da época não apenas os te-
cidos, mas as próprias Roupas e a técnica do corte. As vestes supe-
riores, que eram as Roupas colocadas por cima da túnica, começa-
ram a ajustar-se e moldar-se ao corpo, fechadas por abotoamento
lateral que possibilitava uma Roupa mais justa mantendo a movi-
mentação do corpo. As mangas iniciam a estender-se e ampliam-se
no punho.
Nas Cruzadas os povos criaram certa singularidade de ves-
tir, e, em vez de descartar a cultura do povo invadido ou conquista-
do, a Roupa era agregada, alterada ou alterava-se o modo vigente.
Esta reestruturação das silhuetas ajustou o traje, tanto para homens
quanto para mulheres, contribuindo para uma sexualização 5 da apa-
rência, o que tornaria o traje um símbolo também de sedução. Esta
movimentação marcou um passo para a valorização da Roupa. An-
tes usada pela necessidade de se cobrir, como diferenciação de pa-
péis e status sociais, e para proteger o corpo das ações da natureza,
a Roupa começa a representar uma imagem pessoal, não mais ape-
nas coletiva.
Assim como num desenho de corpo a postura e os volumes
passam mensagens, acontece com a Roupa vestida sobre o corpo,
ela determina posturas morais, como masculinidade ou feminilida-
de, maturidade, imaturidade, submissão, inteligência, conformismo,
riqueza, saúde, idade, rebeldia e ocupação.
Apesar de, entre os camponeses e comerciantes, as Roupas
ainda representarem uma construção rudimentar que levaria séculos
em transformação, as monarquias e o clérigo, mostravam, ao evolu-
ir do comércio com o oriente, mudanças estéticas e na construção
do traje, são estas Roupas que podemos observar na maior parte das
obras artísticas datadas da Idade Média. E é a partir destas peças
que será discutido aqui, os formatos de modelagem e os eventos
que permitiram que as novas formulações das Roupas surgissem.
Durante o século XII a túnica ainda é uma veste importan-
te, no entanto ela começa a ajustar-se ao corpo, alongar-se nos pés e
nas mangas, e apresenta guarnições e pregueados que diferenciam
as peças mais simples das mais ricamente ornadas.
Os tecidos são de grande importância na diferenciação de
um traje, enquanto os tecidos como a seda eram importados, por-
tanto muito caros, tecidos de algodão ou lã com tramas mais largas
eram mais amplamente encontrados.
Ao passar dos reinados alguns países europeus, como a
França, no século XVI, sob a regência do Rei Henrique IV, passam
a investir na tecitura, o que os torna em pouco tempo, uma rota de
comércio de tecidos finos na Europa.

5
Este termo trazido aqui significa que a Roupa começou a ser diferenciada em
função do sexo da pessoa, tornando-se notável as diferenças entre o feminino
e o masculino.
A partir de imagens de obras de arte e iluminuras datadas a
partir do século XI é possível perceber os detalhes nos cortes e na
produção das peças. Detalhes que nos orientam a observar os mo-
mentos de possíveis rupturas, como desenvolvimento tecnológico,
guerras e mudanças políticas.
Na figura seguinte representando a Primavera, apesar de
ser de um período posterior ao relatado neste capítulo, representa
bem a vestimenta do século XIII. A Veste superior aparece com
costuras laterais e frontais, nesta pintura pode haver alusão à gravi-
dez por conta da costura abrindo na frente, mais próximo do baixo
ventre, o que não era comum na Roupa do cotidiano, deixando à
mostra a veste inferior (túnica).
É interessante notar que, nesta veste superior, já existe a
divisão dos lados do corpo, em direito e esquerdo, diferente das
peças anteriores, que eram inteiras. Podemos ver na lateral da man-
ga, na parte exterior do antebraço, a túnica aparente, que por sua
vez mostra uma costura mais fina aparente. Esta manga, chamada
manga bufante, mostra-se bem justa no punho, poderia possuir,
além da amarração, abotoamento, e a sobreveste puxada para fora
muitas vezes representava um costume de diferenciação, evidenci-
ando a riqueza do tecido ou guarnições da Roupa de baixo.
Primavera. 1455-60. Cosimi di Domenico di Bonaventura Tura. Extraído do
livro 1000 obras primas da pintura, 2007.

No corte da manga, representado a seguir, nota-se a cava como um


semicírculo, que era comum neste período, este modelo de corte
não é muito anatômico para peças justas e Roupas coladas ao corpo
como vemos na atualidade, mas representava para o século um cor-
te da nobreza.
Corte da Manga:

Fonte: da autora.

Era comum durante o século XIII, o uso de mangas amarra-


das ao corpo da Roupa, por vezes também abotoadas, deixando a
parte das axilas abertas. Esta forma de construir a Roupa era feita
por conta do uso de tecidos grossos como veludo e brocados, e do
uso de vestes inferiores, que davam volume ao conjunto de vestes.
Seria muito difícil movimentar-se caso este modelo de cava de
manga fosse totalmente costurado ao corpo do tecido.
Com o feudalismo surgem conflitos entre comerciantes e
senhores feudais, os comerciantes, em suas rotas de comércio ti-
nham de pagar aos senhores feudais quantias pelo direito de passa-
gem pelas terras. Pesos, moedas, leis e medidas mudavam de feudo
para feudo, com fim de impedir grandes senhores feudais de ter
poder maior que o Estado os reis tomam para si leis de proteção.
Este é o momento das grandes invenções agrícolas, os moi-
nhos de água, melhorias nos maquinários agrícolas, e da evolução
do comércio.
Apesar do costume feudal da cobrança de impostos dificul-
tar o acesso de certas regiões aos tecidos e aviamentos, houve in-
tensa expansão mercantil durante o século XIII, o que possibilitou
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maior acesso gratuita
a estes produtos pelas camadas mais ricas da popula-
ção.
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os nobres completa
do ano 1150,ainiciava-se
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uma vestimenta
que perdurou durante todo o período Gótico, cessando com a Re-
nascença. Este estilo Gótico trazia representações dos dogmas cris-
tãos, todos os motivos católicos eram enaltecidos, símbolos e histó-
rias. Deste estilo vemos as abóbadas, longas torres e um estilo pe-
culiar de arquitetura, trazendo uma nova luz, denominada lux nova.
Felipe II, transformou Paris na capital da Europa Gótica,
com a pavimentação de ruas, as muralhas, e o Louvre, que abrigava
a família real. Foi a mudança de um estilo rudimentar para um no-
vo, com altos padrões e ornamentação e arquitetura que privilegia-
vam o espaço e a luminosidade.
Na vestimenta, esta movimentação para um novo olhar do
mundo causou requinte sóbrio, o luxo era representado com uso de
adereços e tecidos, mas não com cores.
Para a estrutura, o anseio das formas voltadas para o céu
trouxe longos vestidos, longas mangas com acabamentos em pon-
tas, utilizados com sapatos de altíssimos saltos plataforma, chegan-
do a medir quarenta centímetros.
Na próxima imagem vemos a tela proveniente da primeira
renascença cultural europeia (ainda no período Gótico), vê-se pin-
tado, de túnica de cor branca com barrado de pele nas mangas, o
cliente que solicitou o quadro. Este está na pintura, de joelhos à
esquerda.
Há a túnica com mangas de pele, o prolongamento da man-
ga, mais ou menos no cotovelo, que vai quase até no chão. No cen-
tro a virgem, cercada por Maria Madalena, Santa Bárbara e Santa
Catarina. Denota a religiosidade vigente, fortemente católica.
Virgem e Menino com santos e doador. 1505-10. Gerard David. Extraí-
do do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Na figura acima percebemos à esquerda, de vermelho e so-


bre um dos joelhos, vestimenta com traços do estilo Gótico do sé-
culo XIII, mangas iniciam a alongar sentido ao chão, estas chega-
ram a arrastar-se no chão. Ainda o uso da capa, presa por broches e
o vestido com costura frontal e lateral, aparecendo a sobreveste. No
colo, provavelmente aparente o tecido da veste de baixo.
O corte da manga, vista a seguir, seria conseguido, muito
provavelmente, pelo uso de formas geométricas, ainda mais simpli-
ficado. A imagem da manga demonstra na esquerda a cava, arre-
dondada, e a manga, alargando-se até passar do punho, e formando
a ponta. A costura da manga é feita no mesmo local onde é feito
atualmente, para que fique mais escondida. As costuras eram por
vezes cobertas com passamanaria. O costume de cobrir as costuras
perdura até a atualidade na chamada alta Moda.
Corte da manga da sobreveste da dama ajoelhada:

Fonte: da autora.

Este estilo Gótico faz parte de um momento em que iniciam


os processos da Santa Inquisição, logo, o sagrado passa a ser repre-
sentado nas vestes, principalmente pelo alongamento dos cortes,
pela sobriedade das cores e adereços, e pela cintura marcada por
um cinto próximo ao baixo ventre, que evidenciava a fertilidade da
mulher.
Outros modelos de mangas, no caso das túnicas, como a uti-
lizada pelo personagem de túnica de cor branca na imagem, poderi-
am ter o corte da cava reto, para facilitação dos processos de corte e
costura.
A divisão da Roupa em tronco e membros auxilia, não so-
mente para manter a movimentação da pessoa que utiliza a peça,
mas também diminui o desperdício dos tecidos no momento da
confecção da peça. Ao observar a túnica de cor branca, dá a enten-
der que o corte da peça é inteiro, em um retângulo de tecido, com
abertura apenas para as mãos, no local das guarnições de pele. Con-
forme o desenho a seguir:
Corte da túnica do cavalheiro de joelhos:

Fonte: da autora.

A obtenção de fios para a tecelagem era um processo demo-


rado, após a tosa as fibras eram separadas, depois unidas e passadas
numa fiandeira, que era acionada por pedaladas, o fio era torcido
com ajuda manual, não ficava homogêneo, e tinha aspecto mais
grosso e solto que o atual, era comum também desde o Egito antigo
o uso de linho e algodão.
As máquinas de fiação e tecelagem eram manuais, e com
auxílio das mãos, o fio da trama era passado entre os fios de urdu-
me, veludos e brocados tem uma fiação ainda mais complexa, utili-
zando gabarito, em máquinas originalmente orientais. O que fazia
com que uma peça de Roupa fosse um artigo de luxo. Estes materi-
ais eram trazidos do Oriente por comerciantes, destinado ao comér-
cio para os nobres, outros materiais de menor feitio destinavam-se
aos comércios. O padrão de exclusividade dos materiais utilizados
evidenciava a classe social de quem vestisse a Roupa.
As Roupas da realeza alemã do século XI eram de estrutura
elaborada, vários cortes e costuras localizadas davam ar de algo
arquitetado, para ogratuita
Versão momento, os cortes ainda cultivavam o formato
geométrico, a não ser na cintura, onde eram curvados.
A base da Roupa
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a versão semelhante à túnica
a venda masculina, porém
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há a inserção das mangas, que com corte arredondado na parte de
baixo e afunilamento próximo à barra criam aspecto bufante.
Alguns trajes da realeza, utilizados em cerimônias de coroa-
ção tinham estrutura mais complexa, com a barra maior, provavel-
mente de tecido duplo dobrado, e inserção de triângulos de tecido
nas laterais, são as nesgas, para dar amplitude ao volume da saia do
traje. Por volta deste período, para a nobreza surgem as meias de
seda, de estrutura pouco convencional, eram costuradas na parte de
trás e ainda eram unidas ao calção por baixo da Roupa. As meias de
seda foram utilizadas até idos de 1750 tanto por homens quanto por
mulheres.
Durante o século XII, as Roupas femininas ficaram um lon-
go tempo sem alterações, ainda se utilizava o cotte hardie, uma
sobreveste longa e bastante larga, que era presa por um cinto, basi-
camente uma túnica mais larga, terminando mais larga nos pés com
ajuda das negas laterais, longas no comprimento, com nesgas por
vezes frontais. O corte geométrico era aplicado em todo o traje, até
a cintura ou até o decote.
Outros tinham a sofisticação de ter decote e cintura curva-
dos.
Visualização de uma nesga (parte escura).
Na maior parte dos trajes
femininos nota-se a amplitude das
saias. Isto devido a amplitude do
vestido, que iniciava a alargar-se da
cintura, com uso de nesgas abaixo
da cava, que iniciavam menos largas
terminando extremamente largas na
barra. A manga, a inexistência do
caimento de ombro e da curvatura
necessária para a cava, que na ima-
gem é arredondada e muito cavada
para o peitoral, são comuns nas ves-
tes deste momento.
Fonte: Da autora

As mangas atuais têm a parte que une do ombro até o meio


da cava em curvatura para fora, e do meio até a parte que une
abaixo da cava a curvatura da axila é para dentro, o que permite que
a manga tenha caimento para baixo, dando movimentaçao natural
ao braço.

Cava de manga medieval x Cava de manga atual.

Fonte: Da autora.
A costura da manga é feita na parte de baixo das axilas,
aos poucos avança para trás do braço, a cava torna-se mais curva
em direção às costas, fazendo-se necessário aumento da curvatura.
Representação de uma sobre veste cotte hardie.

Frente Costas

Fonte: Da autora.

O cotte hardie é a veste superior, muito comum ao século


XIII.
Versão gratuita
Tríptico: Retábulo de São João. 1446-53. Rogier van der Weyden. Ex-
traído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.
Conheça a versão completa a venda na amazon.com
Com vários estilos de mangas, como as retratadas a seguir:

Manga com ponta:

Fonte: Da autora

Manga reta:

Fonte: da autora.

Nas imagens acima, a cava é a parte curva à esquerda da


imagem, o fechamento era por amarrações laterais até o punho ou o
meio da manga, deixando o restante caído.
Vestes longas e até os adornos de cabeça eram pontudos, em
direção ao céu; uma possibilidade para o uso das pontas e do moti-
vo pelo qual não somente os adornos de cabeça, mas a silhueta
mais esguia e longilínea.
Durante o século XII acontece o primeiro Renascimento
cultural da Europa Ocidental. A aproximação dos centros Islâmicos
e do mundo Árabe possibilitou que a Europa conhecesse muito
acerca de todas as ciências, do alfabeto e da escrita. Foi momento
de grande evolução cultural, da poesia e da música, onde a Europa
passa por transformações culturais significativas. Também surgem
as primeiras universidades.
Neste período a vestimenta fica mais romântica, inicia o
processo transformador que é parte do século XIV, trazendo o
Classicismo para as Roupas, drapeados e requinte nos cortes e mis-
tura de tecidos. De certa forma, a Roupa teve de ser reelaborada em
sua estrutura para poder ter mais praticidade, melhor confecção e
conforto, em virtude dos materiais utilizados, como tecidos de ce-
tim com bordado de fios de ouro. A Roupa da Idade Média fazia
parte, sem dúvida, das heranças de família.
Podemos citar no século XIII o trabalho de Santo Tomás de
Aquino, eclesiástico, que mostra a força da igreja católica neste
momento, São Francisco de Assis, fundado da ordem religiosa dos
franciscanos, também Dante Alighieri, que buscava pelo etéreo e o
eterno. A Itália se tornou berço da poesia e literatura, também as-
sim a França. Guido Guinizeli criador da escola Dolce Stil nuovo
trouxe muitas evoluções no campo da poesia, trabalhando campos
da filosofia e não tão somente teologia, surgem os cânticos e os
trovadores, as canções e rimas de amor e com outros poetas como
Guido Cavalcanti as rimas do cotidiano.
Um momento sem dúvida mais humanístico no qual é criada
a Magma Carta, considerada posteriormente como o texto fiador
dos direitos humanos para todos. Também durante o reinado de
Eduardo I, é criado o Parlamento, na Inglaterra.
Versão gratuita
Ao mesmo que as tradições literárias e a natureza poética do
momento influenciam
Conheça a versãoa completa
vestimenta, os conhecimentos
a venda fundamen-
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tais sobre movimento do corpo humano, antropometria e ergonomia
ainda não eram conhecimentos difundidos, assim como a medicina
e a saúde pública.
A higiene da época é conhecidamente precária na maioria
das cidades europeias, dejetos sanitários eram jogados na rua, sem
saneamento, uma vez que a medicina era uma prática ligada aos
conhecimentos cristãos e proibia-se atos comuns hoje, como a
exumação de cadáveres.
Muitas situações, durante o século XII, dentre elas pode-se
considerar o início das rotas marítimas e do comércio, foram favo-
ráveis para que explodisse em 1340 e se espalhasse com rapidez a
peste bubônica por toda a Europa, matando um terço da população,
isto perdurou até o século XVIII.
Esta rotina causava proliferação de ratos, e o grande vilão
da peste bubônica foi a pulga dos ratos, que possuíam o bacilo.
Somente em 1185, em Paris foram pavimentadas as primeiras ruas
e em 1236, Londres começou a trazer água para a cidade em aque-
dutos.
Nas cidades medievais era comum castrações, enforcamen-
tos e amputações em praça pública, muitas vezes a cabeça ou o
morto inteiro eram deixados a apodrecer nas ruas, para servirem de
exemplo e seus crimes não caírem no esquecimento, eram também
frequentes os incêndios, pois as casas eram construídas com madei-
ra e galhos, e o teto de palha ou junco, totalmente inflamável. Ape-
sar de ruim, ajudava a eliminar um pouco as condições de sujeira
que provocavam as doenças. O comprimento das vestes em nada
auxiliava na higienização das casas. Este era, na verdade, um con-
ceito inexistente.
A Grécia era fonte de sabedoria, artes, ciências e desenvol-
vimento humano, Roma de lá tirou muitos dos elementos que com-
põem ainda hoje a sociedade. A medicina iniciou lá como uma
forma de reflexão: do corpo, da vida e da morte. Há a mitologia do
Deus Asclépio, representando a vitória da vida sobre a morte; a
pouca compreensão acerca do corpo foi aos poucos sendo preen-
chida.
O retorno da vestimenta ao Classicismo é, de certa forma,
influenciado pelo retorno cultural a filosófica grega. Hipócrates, na
Antiguidade Clássica, possibilitou que a medicina fosse mais racio-
nal, mas ainda sem renunciar às crenças mitológicas, analisando
mais profundamente, de forma filosófica, os males que afetavam os
homens.
A medicina escolástica grega, auxiliou as descobertas cien-
tíficas em um momento em que, poucos conheciam a língua dos
antigos tratados gregos, tendo muito se perdido após a queda do
império Romano.
Durante a Idade Média, no entanto, o diploma de médico
era conseguido apenas em escolas católicas, após completar o estu-
do teológico. Portanto, muitas doenças eram diagnosticadas levan-
do em consideração a doutrina. A moralidade, por muitos séculos,
impediu a transformação das Roupas para cortes mais curtos, que
evitariam trazer a sujeira das ruas para dentro das casas.
Assim, por um longo tempo a medicina esteve contida. Du-
rante o século XIV eram populares as universidades para o estudo
da matemática e letras, para os que se interessavam em trabalhar
nos bancos ou no comércio, era um pouco difundido o conhecimen-
to da matemática e da física. Neste momento Galileu Galilei já en-
sinava seus estudos acerca da velocidade, neste momento também
se difunde entre os estudiosos o heliocentrismo, em queda ao teo-
centrismo difundido pelo catolicismo, nota-se porque talvez este
tenha sido um momento de mudanças na vestimenta. Um momento
de rupturas.
À medida que o comércio exterior se fortalecia, após as
grandes navegações, as Roupas tornam-se mais complexas. Havia o
acesso à seda do oriente e aos cortes concebidos pelos costureiros
das cortes. No entanto, cada civilização diferenciava-se, também,
pela vestimenta, que era uma forma rápida de demonstrar valores.
Na figura, o retrato da Virgem, de veste ampla, retrata a
Roupa anterior ao período do renascimento europeu do século
XVII. Nota-se a manga da sobreveste aparente, ricamente ornada, e
os debruns na barra da manga e das saias. Acima da sobreveste
utilizando o vestido longo e amplo de manga curta.
Sobre o vestido utiliza a capa com capuz. As vestes de bai-
xo eram em geral feitas de tecido e cor diferentes que as vestes su-
periores, tendo ornamentos no punho, que ajudavam a dar acaba-
mento ao traje cobrindo as costuras. As Roupas deste período ne-
cessitavam de grandes quantidades de tecido, pois, além das costu-
ras, havia as amarrações e o uso das vestes inferiores, que além de
dar volume, apareciam na sobreveste, necessitando de guarnições.
Isto dava à sobreveste a função de guarnecer a Roupa, uma vez que
as artes aparentes eram ricamente bordadas e ornadas, além de uti-
lizar cores contrastantes.
São Lucas desenhando a Virgem. 1440. Rogier van der Weyden. Ex-
traído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

A túnica foi acrescida de capuz, para proteger nos dias frios


e chuvosos. Este capuz era cortado juntamente com o restante do
casaco, era pontudo, havia um corte oblíquo na frente do capuz
para impedir que este cobrisse o rosto. Pelo retorno do uso da capa
com capuz os decotes ficaram menores, agregando uma fenda no
colo, podendo ser fechada com abotoamento ou colchetes. Neste
mesmo período surgiu o sobretudo, semelhante aos casacos comuns
na época, porém mais folgados e mais curtos.
O capuz era cortado em lateral esquerda e direita, tendo cor-
te mais curvado na frente, e ponta na parte de trás da cabeça. Para
estruturar um capuz é necessário imaginar que ele necessitará ter
caimento na cabeça, para isso precisa obedecer às curvaturas.

Representação da capa da figura:

Fonte: Da autora.

Se o corte da frente for todo reto, e não houver curvatura pa-


ra dentro, o capuz cobrirá o rosto, é necessário também que a cur-
vatura que envolve a cabeça, passando por cima até a parte de trás
dela seja levemente curva no topo, e seguindo (com uso de régua) a
mesma curvatura atrás. Pois, se o capuz for curvo demais ficará
com sobras nas costuras, e se for curvo de menos as laterais ficarão
apertadas.
Outra forma possível para fazer o capuz da capa seria um
corte inteiro, que necessitaria ser costurado ou amarrado à gola da
capa, como eram utilizados muitos metros de tecidos para uma ves-
te, esta possibilidade é válida neste período, pois, o capuz ficaria
bem largo e caído sobre o rosto, com sobras nas laterais.
Na estruturação de uma peça, qualquer parte curva tende a
“trazer” o caimento do produto para uma determinada área. No
caso da cava o caimento fica aparente no busto, e no decote. No
caso do gancho o caimento é sentido em toda área do quadril, com
sobras na parte dianteira e traseira se a curvatura for muito peque-
na, ou com as partes do quadril justas demais se a curvatura for
muito grande. É importante o uso do manequim para a estruturação
e provas no corpo humano, pois nele a curvatura é mais livre, tem a
possibilidade de adaptar-se de diferentes maneiras. Onde há uma
curvatura o tecido irá segui-la, adaptando-se ao volume da curva.
Um exemplo seria a saia, que na parte de trás é sempre mai-
or, pois, ao ser vestida, a curvatura de trás irá encurtar a saia em seu
comprimento, por isso, ao fazer a estrutura de uma peça que será
vestida nas curvas do corpo, o interessante é assimilar como a peça
ficará ao ser vestida, no caso da saia, o comprimento é aumentado
pela parte de cima, e jamais pela barra. Imagine, se alongar a saia
para baixo, depois de costurada e vestida ficará aparente o aumento
(como uma cauda), mas se o fizer na parte de cima, mais no meio
da parte traseira, ao olhar para a barra da saia ela parecerá retinha
com a frente, e seu comprimento ficará na mesma medida; o au-
mento necessário foi colocado na parte de cima da estrutura.
Enquanto as túnicas e sobrevestes tornam-se menos popula-
res, sendo utilizadas para cerimônias, torna-se mais popular o Le
pourpoint, casaco
Versão feito de vários estilos, diferentes no tecido, corte
gratuita
ou ornamento, ficando cada vez mais curto e justo, até transformar-
se no final do século em um traje apenas para parte de cima. A
Conheça a versão completa a venda na amazon.com
manga do Le pourpoint é muito semelhante à atual, representou
para a época um avanço em termos de conforto e de alguns concei-
tos de vestir. Isto porque esta manga apresentava curvatura, onde a
parte de trás era mais curvada que a da frente, desta forma, respei-
tava a curvatura do corpo, uma vez que a curva menor na frente
deixava uma sobra de tecido para o busto.
Durante este período a vestimenta teve a infusão das calças,
até então se utilizavam meias, uma em cada perna, ligadas à parte
de cima por amarrações, no entanto agora alfaiates e autoridades
eclesiásticas faziam o possível para colocar em voga o uso destas
calças, tratava-se de uma peça de cortes retos com costuras no gan-
cho e entre pernas, e cobriam da cintura até os pés, presas à cintura
por um cinto.
Tentativas de calções já havia sido feitas do século I até o
século IV, na Alemanha, porém não existia costura de gancho, so-
mente entrepernas, feitos de couro ou lã, e raramente de lona, de
forma rudimentar e sem apresso visual, eram presos aos tornozelos
por amarração. O surgimento destas calças foi um passo importante
para a evolução da vestimenta masculina.
As autoridades eclesiásticas colocavam a vestimenta anteri-
or como indecente. Era muito comum estas autoridades agirem co-
mo condutores de costumes, das leis, dos negócios e até mesmo da
política, isto se deve muito ao fato de, ainda naquele momento as
escolas serem raras, e para poucos, a igreja mantinha algumas esco-
las a fim de manter a ordem eclesiástica e conseguir formar suces-
sores; desta forma representavam a cultura, o conhecimento, e os
mantenedores de uma ordem abençoada.
A Roupa teve, de certa forma, um papel importante na dife-
renciação do homem e da mulher civilizados, em relação aos bárba-
ros. O conhecimento matemático e tecnológico, era inserido na
construção da Roupa. Servindo esta como uma mostra de poder de
quem a vestia.

2.2 SÉCULO XIV

O século XIV foi marcado pelas revoltas de serviçais feu-


dais contra seus senhores e o trabalho feudal. Em 1439 uma lei
promulgada pelo rei da França proíbe qualquer forma de coibição
comercial, seja atacando trabalhadores e lhes confiscando bens,
como atacando propriedades burguesas de comércio e impedindo a
continuidade do comércio, o que contribuiu para o fim do processo
feudalista.
Durante o século XIV iniciava-se um processo que teve êxi-
to no século XV, com o fim do estilo de arte bizantina, que predo-
minou até o século XIV: o humanismo. Com o fim do império bi-
zantino muitos se refugiaram na Europa, em especial na Itália, que
foi neste momento berço de todas as culturas.
As pinturas começam a ser mais realistas, perde-se o traço
tridimensional do estilo bizantino, que pode ser notado ainda hoje
em pinturas bíblicas, e inicia o processo multidimensional.
Esta valorização da arte se deve em partes à revolução soci-
al do período, onde banqueiros, comerciantes e fabricantes ficaram
mais inseridos no contexto cultural, mas muito ao humanismo, que,
podemos dizer: ser caracterizado pela fé nas capacidades infinitas
do ser humano em todo seu esplendor intelectual.
A peça principal da vestimenta feminina era o vestido, já
demarcando a divisão da veste por um corte na cintura. As mulhe-
res até o período da revolução industrial vestiam-se em geral menos
extravagantes que os homens, principalmente durante a I Renas-
cença cultural.
A partir do século XIV houve algumas inovações na vesti-
menta, o surgimento do decote profundo, a exploração do esparti-
lho, ainda como um corpete mais apertado, endurecido, conhecido
como plackard.
Entre as vestes masculinas, o gipon, também chamado de
gibão passa a ser acolchoado na frente para realçar o peitoral. Mais
curto na cintura, a ponto de ser considerado indecente por eclesiás-
ticos católicos, tinha fechamento por abotoamento na frente e era
preso por um cinto na cintura. Sem mangas, era como um colete,
usado junto com a sobre túnica. A sobre túnica se tornara mais de-
cotada e mais justa, abotoada na frente. Para as classes de baixa
renda era mais larga, sem botões, vestida pela cabeça.
O gibão podia ser feito de vários tecidos, em geral de couro,
veludo ou cetim, não tinha ornamento algum. A sobreveste, comu-
mente utilizada sobre o gibão foi se tornando, assim como o Len-
dener, cada vez mais curta e justa, até que só diferiam do gibão por
serem mais longas, mais largas e com mangas. Apesar de esta pin-
tura de Andrea Del Sarto datar de 1517, representa bem o gibão do
século XIV, de três partes: costas inteiras, e frente dividida em lado
esquerdo e direito, decote quadrado e decote das costas mais cava-
do, este sem mangas.
A frente podia ser fechada por botões ou colchetes. Este
gibão aparenta utilizar tecido rígido, e provavelmente seu compri-
mento terminava na cintura, ajustava-se em direção à cintura, ter-
minando bem rente ao corpo.
Retrato de um Jovem. 1517. Andrea del Sarto. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

No chemise6 de cor branca utilizada abaixo do gibão, a


manga é bem bufante, nota-se que não há costuras na parte de cima,

6 A chemise é uma peça que evoluiu das túnicas utilizadas como veste inferior. Modifi-
cando-se até chegar as atuais camisas (sociais, de botão). Diferentemente da camiseta (de
malha e mangas curtas) cujo corte evoluiu dos cortes simples das túnicas, mas foi repagi-
estas eramVersão
costuradas abaixo do braço até o punho, bem largas até
gratuita
o cotovelo, com volume levado à parte de baixo do braço, parte de
cima, na estrutura
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a versão reta. a venda na amazon.com
A partir do cotovelo a manga ajustava-se, fechando a cur-
vatura da manga aos poucos, esta manga é provavelmente cortada
em duas partes, devido ao franzido encontrado na altura do cotove-
lo.
A manga presunto é característica por ter a parte bufante
maior, já a manga bufante pode ter o volume maior localizado entre
o meio do braço e o cotovelo.

Representação da manga presunto:

Fonte: Da autora.

O uso de mangas bufantes esconde um pouco a falta de


caimento do ombro, que era traçado em ângulo reto. Na modelagem
contemporânea, o ombro tem uma queda, de forma que a peça se
ajeita no trapézio formado pela musculatura do ombro, porém, se

nada durante a revolução industrial, sendo confeccionada de Jersey, e utilizada como


roupa de baixo.
esta queda não existe, a parte “de fora” dos ombros, onde é unida à
manga, fica mais alta causando sobra de tecido.

Representação da manga bufante:

Fonte: Da autora.

As cidades da era medieval eram construídas em volta do


castelo, e, em volta destas cidades construíam-se os muros que iso-
lavam as mesmas. Dentro destas cidades ou em volta dos muros
estabeleciam-se os comércios. Portanto, o conhecimento das técni-
cas para o ofício da costura, como em outros ofícios, era passado de
geração em geração, e muitos locais não disporiam de um artífice
alfaiate.
Durante este período a Europa passou pela terrível peste
bubônica, surto de peste bubônica que matou um terço da popula-
ção europeia e estendeu-se ainda por quase um século, ainda pela
guerra de cem anos travada entre Inglaterra e França e pela grande
fome. Com o declínio do feudalismo houve grande concentração de
pessoas nas cidades, o campo não abastecia mais o necessário para
as grandes cidades e a burguesia (o comércio) não abastecia sufici-
entemente em empregos.
A expansão marítima foi a solução encontrada para arre-
cadar mais fundos e restabelecer a ordem nos grandes centros. Nes-
te momento entram em cena os golpeados, que são cortes feitos na
veste, que deixavam à mostra a veste de baixo, eram como golpes
de machadinha, nos trajes alemães eram usados com exagero, por
vezes na veste toda. Seu uso foi introduzido pelos Landsknecht, ou
soldados mercenários.
As extremidades e pontos de costura destas Roupas com
tantos golpeados provavelmente recebiam reforços, seja por inser-
ção de passamanaria ou por duplicidade de tecido, caso contrário,
dificilmente durariam após o primeiro uso.
Na parte superior é comum o uso do pourpoint, semelhante
ao casaco dos soldados, com acolchoamento e abas (cortes de teci-
do aplicados abaixo da cintura, que podiam ser longos ou curtos). A
capa comum na época recebia essa parte fronteira de pele, acomo-
dada sobre os ombros e estendendo-se diante do corpo.

2.3 SÉCULO XV

É durante o século XV que inicia a revolução comercial,


que vai até o século XVIII. A abertura para o mercado exterior pos-
sibilitou a entrada de capital para melhoria na produção. A Europa
passou a fazer trocas com África, Ásia e Américas, isto levou a
uma radical alteração nas formas de produzir de alguns países. O
interesse por este comércio gerou o início do processo comercial
organizado; ali ainda primário, foram-se criando máquinas necessá-
rias e organizando as primeiras oficinas, surgindo então as casas de
ofícios.
Também tem fim no século XV a Guerra dos Cem anos, que
perturbava toda a Europa. Foi o auge do capitalismo europeu, vindo
à tona nomes como os Médici de Florença e os Van der Breuse, do
qual surgiu a palavra bourse, e assim denomina-se até hoje o nome
bolsa de valores. O comércio internacional garantiu para alguns
países grandes fortunas, foi também período para descobrimento de
novas rotas marítimas de comércio, novos territórios e o início de
novas colônias, Cristóvão Colombo chega às Américas em 1492 e
Pedro Álvares Cabral em meados de 1500 chega ao Brasil.
Neste momento florescem várias artes, entre elas as ilumi-
nuras. As artes tinham grande apreço, nobres de toda a Europa en-
comendavam quadros e iluminuras para suas casas. Estes eram
muito úteis, num momento em que ainda existiam os casamentos
por conveniência, eram em muitos casos, a partir destes quadros
que os noivos se conheciam.
Durante este período o humanismo está bem forte, princi-
palmente na Itália, este humanismo evoca o resgate da filosofia, das
línguas, do pensamento grego, e a admiração por sua arte, acarreta
o resgate do pensamento Grego. Ali, além das artes, medicina e
literatura tiveram grande evolução. Foi um momento áureo para a
cultura, este momento foi denominado Renascimento, marcando
fim de um tempo chamado de idade das trevas. A Idade Média se-
gue até o século XVIII, após tem-se o começo de uma Idade Mo-
derna.
O humanismo, que marca o fim da Idade Média, buscava
enaltecer as virtudes do ser humano, como a razão. A aplicação da
razão era enaltecida no desenvolvimento de maquinários, processos
em larga escala, a exemplo de uma forma melhorada na maneira de
fazer a impressão dos livros, criada por Johan Gutenberg, mais rá-
pida e econômica.
O século XV é o século da reforma protestante e da França
libertada por Joana D’Arc, e dos grandes nomes conhecidos até
hoje, Michelangelo, Leonardo Da Vinci, Galileu Galilei, Boccaccio
etc. A medicina passa da escolástica para empírica, na busca nas
Versão gratuita
observações e nos dados, explicações, que, por ser baseadas em
pesquisas, deram início a um período de dúvidas e descobertas.
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Para a Roupa é o momento de experimentação e libertação, onde
alguns caprichos passam a ser essenciais.
Durante o século XV já se pronuncia uma espécie de sa-
queira, popular no reinado de Luíz XV, a saqueira é a parte inserida
na frente do gibão. Trata-se de uma estrutura simples, duas meias-
luas costuradas na curvatura, a parte reta era costurada junto à aba
do gibão. Esta representava virilidade, e por vezes aparecia com
fitas e outros adereços e para ter o aspecto bem bufante era utiliza-
do enchimento.

Representação do molde com localização de costura da saqueira e sa-


queira de Henrique VIII.
Retrato de Henrique VIII. 1539. Hans Holbein, o jovem. Extraído do
livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Fonte: Da autora.

Nesta época homens vestiam-se de forma exuberante, muito


mais que as mulheres. Em 1480 os sapatos tinham ponteiras, por
vezes tão erguidas que chegaram a ser proibidos. Assim como a
saqueira, o comprimento da ponteira dos sapatos remetia, para os
eclesiásticos, pensamentos pecaminosos, ao expor a virilidade.
As proibições relativas aos hábitos de consumo, buscavam
coibir extravagâncias, dentre vários hábitos, na vestimenta, proibi-
am o uso de certas Roupas, materiais e iguarias.
Utilizadas também para coagir ou valorizar o comércio de
determinados fins, como pele de Mink, seda dentre outros, e assim
valorizar a produção e comércio internos. Estas leis, chamadas leis
suntuárias, promulgadas pelo monarca, obrigava com que fossem
mantidos certos privilégios exclusivos aos monarcas, o que era es-
tendido à vestimenta, até como forma de manter a figura de poder.
Durante este período já estão em uso o pourpoint (espécie
de casaco), que utilizava agora enchimento no peito, acentuando a
cintura. O fato do enchimento transformou o corte da peça, a parte
de traseira inteira e recebia pregas na área da cintura para ajustar-se
ao corpo, a parte da frente necessitava ser maior e recebia uma cur-
va no corte localizado na frente do peito, as duas partes eram uni-
das nos ombros e nas laterais, a cava da manga manteve a forma
oval, e as mangas passaram a ter formas diferentes e enchimento. A
vestimenta masculina era muitas vezes uma modificação das Rou-
pas de guerra, específicas para montar a cavalo e proteger o corpo
de golpes de espada.
Já a Roupa feminina, apesar de apropriar-se dos adereços,
não tinha as necessidades de uso masculinas. O que gerou uma di-
ferenciação nítida de gêneros nas Roupas, que perpetuou cultural-
mente até o século XX. A gola do pourpoint é reta, por causa da
acomodação da capa, ou de uma espécie de colete. Na imagem,
pourpoint (sobreveste) e gibão (espécie de colete abaixo do pour-
point). As vestes de batalha e de ocasiões eram diferenciadas mais
pelos apliques, guarnições e adereços aplicados a ela que pelos cor-
tes. Os tecidos também eram diferentes, sendo necessário tecidos
grossos para proteger o corpo, permitindo a seda seu papel como
tecido fino em trajes de cerimônia.
Francisco I, rei de França. 1530. Jean Clouet. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

A gola era alta e arredondada na ponta; pela imagem do re-


trato supõe-se que a gola seja de estrutura muito similar à atual,
com a curvatura seguindo sentido do decote da jaqueta e a partir da
cintura forma-se o que em alguns casos chegava a parecer um saio-
te, porém é a aba da jaqueta, esta longa e justa, tinha a parte de trás
e por vezes ambos os lados com fendas, da cintura até o quadril.
Representação da manga presunto com comprimento até o punho, e
gola, comum ao le pourpoint:

Fonte: Da autora.

Este traje é proveniente da veste dos soldados. Como o len-


dener, túnica de couro grosso, mas flexível, por vezes sem manga,
e quando com mangas, estas eram curtas e amarradas ou abotoadas
na cava, na parte da frente da peça. Estas foram se tornando cada
vez mais curtas, até quase não cobrir o tronco.
Os debruns localizados na gola são provenientes da sobre-
veste, que denota uso de tecido fino e ornamentação em renda ou
voil.
As mangas acolchoadas também eram denominadas mahoí-
tres. O pourpoint da imagem é fechado por cordões que formam
fitas finas, na parte frontal.
Para que as Roupas contornassem o corpo ou ficassem mais
justas, pregas, pences e nesgas eram inseridas em todas as curvas e
junções da peça. O uso dos golpeados e destas nesgas além de se-
rem decorativos tinham função de possibilitar mais os movimentos
do corpo, que eram muito vetados pelas inúmeras camadas de teci-
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dos e sobreposição de Roupas.
Durante este período o vestido passa a ser quase sempre
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cortado em duas partes, Le corsage, ou o corpete, e a La jaupe, ou
saia, juntando-os com costuras duplas na cintura, isso devido ao
surgimento do corpete durante o século XIV.
Na figura do vestido a seguir, nota-se amarração frontal
feita por cordões, a sobreveste aparecendo abaixo do decote amplo.
Nota-se a abertura na manga, exatamente na dobra do cotovelo, é o
golpeado.
A manga da imagem tem o efeito bufante provocado pro-
vavelmente por enchimento, esta estrutura é mais difícil de conse-
guir, uma vez que a manga não é inteira em comprimento, mas tem
diversas nesgas inseridas na manga para provocar o alargamento
que possibilita a esta ser bufante, por este motivo também a manga
tem o drapeado na cava, provocado pela costura da manga excessi-
vamente larga na cava, que contornava a região de ombro e axila.
Esta ainda possibilita que sejam feitos menos drapeados, pois, a
cava tem caimento para sobre o braço, afastando-se do ombro, o
que aumenta o tamanho da cava.
Algumas saias eram cortadas enviesadas, este costume me-
lhora o caimento da Roupa, uma vez que ao costurar a saia nas late-
rais, o peso da saia distribui-se de forma homogênea. Este mesmo
costume era empregado em algumas Roupas de baixo.
Lucrécia. 1530-32. Lorenzo Lotto. Extraído do livro 1000 Obras pri-
mas da pintura, 2007.

No entanto, há um gasto muito maior de tecido, e uma sobra


de partes que não podem, dependendo da largura do tecido, ser
aproveitadas em partes inteiras, como uma manga ou uma parte
frontal de peça.
Talvez por isso sejam percebidos muitos recortes de outras
cores, meramente decorativos, bem como laços e passamanarias.
A peça da imagem de Lucrécia pode ser chamada de vesti-
do, pois, não é mais uma peça inteira como a túnica, há um corte
separando a saia do corpete. A jaqueta deste período, proveniente
do gibão, antigo wams, tinha as cavas largas, criando mangas com
certo excesso de tecido no braço, mas ajustavam-se no antebraço.
Alguns costumes duravam séculos e ainda aqui nota-se o uso de
golpeados, ainda que agora formando desenhos geométricos. A
parte de trás era maior que o normal, então recebia pregas nas late-
rais, franzindo a cintura; a parte da frente tinha um corte amplo que
recebia enchimentos, fechado com abotoamento.
Surge o tappert, tappers ou traphart, evoluído do traje fe-
chado guarnecido com mangas de pele. Assumiu várias formas, o
mais comum era comprido e largo, era um traje de cerimônia, o
mais curto, com capuz e aberto nos lados servia de sobretudo. Na
imagem é possível ver a diferença da Roupa deste momento para a
Roupa do início da Idade Média.
Há um requinte notável no corte das Roupas, no detalha-
mento das costuras, e nos materiais utilizados para fechamento,
bem como nos tecidos e aviamentos utilizados. Requinte notado
também na mobília das casas, não só dos monarcas, mas aristocra-
tas e alguns comerciantes.
Em diversos momentos as pinturas retratam símbolos, nes-
ta imagem há o cachorro, o par de sapatos, o espelho centralizado
onde é refletido o casal de costas.
O casal está no quarto, a cores vermelhas remetem à vida e
no lar, segurança, paixão; esta pintura retrata que os figurantes irão
se casar, ou se casaram, a esposa faz menção a uma criança, é pos-
sível ver o que é valorizado durante este momento da história: a
maternidade. O casamento e o requinte, o amor, segurança, também
aparecem como figuras importantes.
O casal Arnolfini. 1434. Jan van Eyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da
pintura, 2007.
Representação da manga do vestido da figura:

Fonte: Da autora.

Este traje substitui quase por completo a capa. Com ele


utilizava-se uma espécie de túnica, mais curta, com decote baixo e
mangas longas e abertas em quase todo o comprimento do lado
superior. Neste período a veste ganha o que seria o princípio da
construção do rufo, do século XVI, tratam-se partes triangulares,
costuradas nas laterais, formando tubos. Estes tubos eram dispostos
lado a lado, feitos de couro rígido, a barra da Roupa (onde eram
inseridos) necessitava ser cortada em pontas que tinham o exato
tamanho dos tubos, estes eram então costurados lado a lado destas
pontas. Mediam cerca de 3x15centímetros ou 4x18centímetros.
O processo de costura iniciava do meio de trás para os la-
dos, os tubos eram costurados em camadas e por último havia um
forro de linho grosso costurado entre cada um dos pares de tubos.
Uma verdadeira obra de artesanato.
Os alfaiates começam a fazer as meias de tecido, em geral
de scharlach, ou escarlate, feitas da mais fina lã, tinham proprieda-
de elástica e era muito apreciada pelos nobres cavaleiros e burgue-
ses. As meias eram
Versão compridas até o tronco e unidas entre as pernas,
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quadril e gancho, como as calças atuais.
Outro tipo de
Conheça vestimenta
a versão foi adotado
completa pelas
a venda na classes altas, o
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robe, longo e largo, usado com um cinto acima da cintura, em geral
feito com os melhores damascos, tinha mangas largas, ou muito
justas com golpeados, e o decote recebia uma gola de pele, muitos
homens preferiam utilizar sem gola.
Nas sociedades aristocráticas, ser bem-educado incluía
uma rígida educação religiosa, e para as moças a castidade era fun-
damental. Os trabalhadores não sabiam ler, portanto, eram conside-
rados aculturados, e não pertenciam às classes de posses, as moças
aristocratas sabiam ler grandes escritores e poesias, e os rapazes
faziam contas, e liam também poesias.
Era comum entre os nobres o uso do Damasco, tecido gros-
so cujo nome deriva de Damasco, capital da Síria, onde foi encon-
trado originalmente. De composição diversa, com motivos florais
ou geométricos ou qualquer tipo de relevo em sua estrutura, que
denota um tipo elaborado de construção do tecido.

Natividade Mística. 1500. Sandro Botticelli. Extraído do livro 1000 Obras primas
da pintura, 2007.
Na segunda metade do século XV, a capa entrou novamente
na moda, mas com forma totalmente diferente, pequena, feita de
veludo, seda, feltro leve ou mesmo couro macio de boa qualidade.
Raramente chegava até os quadris, corte semicircular, era feita para
manter-se firme nos ombros, sendo preso, novamente, como nos
períodos anteriores, na frente, por uma pequena fivela. A capa as-
sumiu vários tamanhos, fechamentos, ornamentos e cores, porém
seu corte sempre se utilizava da mesma estrutura, formato circular,
ou semicircular. As capas circulares necessitavam de abertura cir-
cular no meio do molde, por onde vestiria a peça. Por vezes estas
recebiam um corte reto na parte que seria a frente da veste, passan-
do seu volume para trás prendia-se com fivela no peito, mantendo a
forma original, poderiam receber gola e fechamento por botões. A
capa semicircular, mais simples, em geral era presa por broche.

Representação da capa da figura:

Fonte: Da autora.

Na imagem do corte da capa, a área frontal, fechada por


botões, está representada na parte baixa da figura, bem como a par-
te reta representa a gola.
A Roupa passa a ter outro aspecto, tanto na Alemanha quan-
to na Itália, porém na última com ar mais romântico devido à in-
fluência da literatura e das artes. Aparentemente, as maiores trans-
formações deste século se passaram nas mangas, agora eram lon-
gas, tipo saco, com pontas, guarnecidas, curtas e justas ou largas,
algumas arrastavam no chão.
A libertação cultural era visível na Roupa, as moças por ve-
zes ostentavam decotes tão grandes que descobriam os seios, estes
recebiam uma tira de véu, passando pelo pescoço e prendendo-a ao
corpete, o fichu.
Havia outra forma de alargar os vestidos, abrindo uma fenda
entre o busto e a barra e colocando uma nesga de tecido, antes de
ser costurada ao busto era pregueada ou plissada, com costura du-
pla.
As damas da alta sociedade utilizavam também caudas, sch-
leppen ou scweifen, tão longas que precisavam ser carregadas. So-
bre estes exageros na vestimenta, fazem parte de uma diferencia-
ção, na busca pelo requinte; por mostrar-se acima de um padrão,
nobres e cortesãos buscavam cada vez mais a elaboração das Rou-
pas, e os excessos normalmente vinham da nobreza, e então toda a
corte copiava, buscando igualar-se ao rei e rainha, e o rei e rainha
por sua vez as faziam para diferenciarem-se dos demais comuns.
Esta necessidade gerou uma reformulação constante nos tra-
jes, nos hábitos e costumes, que, apesar de durar bem mais que na
atualidade, esse modo de vestir passou a representar diretamente, e
ser difundida como as modas da corte.
Sobre os comprimentos, as longas saias dos vestidos eram
utilizadas também para cobrir a distância entre o chão, causadas
pelo sapato, que, em épocas de cheias, principalmente na Itália,
inundavam as ruas, as mulheres então colocavam altíssimas plata-
formas para andar, porém, as longas saias eram comuns em toda
Europa. As cavas eram pequenas, tanto quanto possível, geralmente
com formato ovoide, onde a parte mais fina ficava no ombro.
As vestes de baixo tinham mangas por vezes curtas, por ve-
zes tão longas que se estendiam além da mão, com o uso da sobre-
veste, larga, a capa era utilizada somente em dias de mau tempo,
podia ser semicircular ou ter forma de um arco, franzidas em inú-
meras pregas bem próximas entre si.
Na próxima imagem há uma vestimenta peculiar, originária
da Renascença. A sobreveste com decote ovoide, sutil, o vestido
tem mangas bufantes dispostas quase suspensas, golpeados e en-
chimento.
Na cintura é franzida junto com a nesga de tecido fino. As
mangas seguem a linha das mangas bufantes, com grande quanti-
dade de tecido, porém agora mostra construção mais elaborada, não
apenas o corte bidimensional visto anteriormente, esta já revela
proporções para interagir com o caimento.
Muito provavelmente a manga da imagem A Escrava Tur-
ca seja inserida no vestido por esta cava que aparenta ter uma do-
bra, logo abaixo da linha do ombro.
A Escrava Turca. 1530-31. Parmigianino. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

Na veste da próxima figura, a manga ajusta-se em direção


ao braço, de forma a deixar os franzidos com a inserção das péro-
las, nos cotovelos nota-se que não há este aperto, e sim uma parte
bufante, que permitia movimentação.
Maria Madalena. 1530. Jan van Scorel. Extraído do livro 1000 Obras
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primas da pintura, 2007.

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N
Neste momento, não apenas o corte das Roupas, mas tam-
bém as costuras e acabamentos como bordados em pedrarias ou
pérolas, como na imagem anterior, inspiravam mais cuidado, tanto
no feitio quanto no uso cotidiano, para vestir, desvestir, lavar e
guardar.
Esta manga, em vez de ter a parte bufante cortada no pró-
prio molde, como as anteriores, tem uma inserção de tecido mais
larga, sendo costurada a primeira parte da manga, que se localiza
no braço, e é ligada por costura também à segunda parte da manga,
localizada no antebraço, é possível notar este trabalho pelos drape-
ados da peça, possíveis desta forma somente com a costura.
Esta estruturação permite mais movimento na área próxi-
ma da cava e nos cotovelos, onde não há a inserção das pérolas. A
veste representada na imagem utiliza tecido aparentemente, como
um musseline ou seda. Leve, preso abaixo do busto por um cinto
deixa todo o vestido drapeado no busto e fluído do busto para bai-
xo, o drapeado é mantido no busto pelo bordado do decote. A veste
de baixo é de tecido muito fino, provavelmente com terminações
em voil ou tricoline, vistos no busto e na barra da manga.
A Itália, no século XV também tinha criado uma enormida-
de de modelos, tanto quanto franceses, ingleses e alemães, porém,
as Roupas italianas detinham maior profusão nos detalhes, trans-
formando-as em verdadeiras riquezas, tinham também tecidos de
muito requinte, finos e fluídos, até rijos, que necessitavam de corte
preciso, e acima de tudo costura perfeita.
O cuidado com as sedas e demais tecidos provenientes do
Oriente era maior, o que necessitava também de uma série de me-
lhorias na estruturação das Roupas e nas técnicas de costura.
O vestido à direita da figura "o noivado" é o cotte hardie,
com a sobreposição que termina com formato V na cintura. A man-
ga da imagem é a manga presunto, com plissados feitos na costura
à barra.
O noivado. 1527. Hans Holbein, o jovem. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

Há uma sobreposição de tecidos na manga, a sobreposição


de cor branca, formula um corte mais aberto, de comprimento até o
cotovelo, parece duplo, pois, a imagem não apresenta costuras de
barra e não há tecido interno aparente, esta duplicidade de tecido
daria o peso da manga, e seu efeito mais maleável. Há também o
uso do fichu.
Os pintores deste período, devido ao movimento humanista,
procuravam retratar ao máximo o realismo das imagens, da dimen-
são dos corpos e das Roupas, portanto é seguro retratar o que se vê
nas imagens deste período.
Durante o século XV já é evidenciado o trabalho do costu-
reiro real, mantidos nas cortes. Existem evidências de tabelas de
medidas da alfaiataria. O conjunto de técnicas de alfaiataria foi
utilizado durante a revolução industrial, ao fim do século XIX, re-
duzindo a complexidade dos trajes e modificando a modelagem.
De fato, a alfaiataria foi o passo inicial para a construção
completa da vestimenta, onde o desenho do corpo foi sendo com-
preendido. De todas estas evoluções na forma de estruturar, tam-
bém no imaginário popular da significação da Roupa, esta passa a
tecer o conceito moda, que é marcado neste momento pelo fascínio
pela diferenciação e pelo significado que a Roupa estabelece.

2.4 SÉCULO XVI

Durante o século XVI a Europa passava por transformações


econômicas favoráveis, estipula-se que nenhum país poderia ter
uma economia forte se não tivesse uma balança comercial forte,
criada por mais exportação e menos importação, neste contexto, o
mercantilismo teve seu apogeu. Também é o século da Reforma de
1517, onde Martin Lutero, na Alemanha, escreve as Noventa e cin-
co teses, um momento conturbado pela divisão religiosa, e por ten-
tativas de reforma da Igreja Católica, que reagiu com a “Santa In-
quisição”.
Na Inglaterra, O Rei Henrique VIII decide divorciar-se de
sua esposa, a Rainha Catarina de Aragão, ato proibido pela igreja
católica, o que causa rompimento da Inglaterra com a igreja e o
surgimento da igreja anglicana. O rei, então, divorcia-se e casa-se
com Ana Bolena.
Após o divórcio, Ana Bolena torna-se Rainha e dá ao rei
uma filha, Elisabeth I, que se tornaria sucessora do trono depois de
Maria I, considerada herdeira legítima do Rei Henrique, filha deste
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com sua primeira esposa, Catarina.

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Retrato de Henrique VIII. 1539. Hans Holbein, o jovem. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

Henrique VIII reinou uma Inglaterra rica, cheia de reformas,


e tinha o grande sonho do Renascimento, o qual viu aflorar. Sua
Roupa traduz o Renascimento. Nesta imagem utiliza uma jaqueta
com diferentes tamanhos e golpeados, fechada com botões de pe-
drarias, e com marcação um pouco abaixo da cintura tinha a saia
um tanto longa, e inteiriça.
O sobretudo é mais robusto, gola virada, de pele, mangas
bufantes com barra longa. Uma vestimenta menos elaborada, mas
que apresenta extremo cuidado no processo de costura. Notam-se as
pregas na barra da manga, não plissados como os feitos anteriores.
A Roupa da próxima imagem é um tanto diferente das de-
mais, há a marcação forte na cintura feita por um cinto, com fivela,
que tem as cores e provavelmente é feito no mesmo tecido da Rou-
pa.
O traje de Anne de Cleves, na próxima imagem, é composto
do corpete, em dourado, com decote quadrado, indo até a cintura, e
o vestido, que circunda o corpete no busto e transpassa após o cin-
to. Anne de Cleves foi também esposa de Henrique VIII. A veste
inferior, de cor branca, é visível pelo busto, com bordados e nas
mangas, é provavelmente mais justa.
Vestidos e corpetes justos necessitavam de vestes mais jus-
tas, quando mais fluídos, ou com plissados, eram utilizados com
vestes debaixo mais largas, para salientar o volume e os plissados.
A manga desta veste é uma manga que se alarga profunda-
mente a partir da cava, chegando à barra a ter abertura de aproxi-
madamente 40 centímetros.
Retrato de Anne de Cleves. 1539. Hans Holbein, o jovem.
Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Esta manga segue o padrão da manga gótica mostrada an-


teriormente. Na altura do braço, um pouco acima dos cotovelos
recebe estas guarnições bordadas, como fitas presas à manga, que
apertam, deixando acontecer a protuberância de tecido na parte
superior, formando uma manga balonê, embora não arredondada,
pois sem o enchimento, tende a cair, este provavelmente é um teci-
do pesado, como um veludo, a manga mais larga da veste debaixo
ajuda a manter um pouco o efeito balonê, mas ela pesa para baixo
formando esta manga totalmente diferente.

Representação da manga, semelhante à manga utilizada pela rainha


Anne de Cleves:

Fonte: da autora.

A manga do vestido debaixo tem construção parecida, sendo


presa na barra e drapeada com uso de galão ou fita decorativa, fi-
cando com aspecto de manga presunto. No caso de mangas demasi-
ado largas no punho, o aperto provinha destas fitas, no entanto, no
caso de mangas mais justas, era feito um estreitamento no corte
próximo à barra, de cerca de vinte centímetros.
Dentro deste contexto, Maria I, por ser católica, procurava
Roupas sóbrias, o que refletiu nas Roupas durante seu reinado, a
ausência de decotes exacerbados, e esta nova vestimenta, com a
manga em aspecto duplo, maleável e larga, segue fechado até o
quadril, onde abre, com curvaturas para as laterais deixando à mos-
tra o vestido debaixo, a veste superior tem a gola alta, faz referên-
cia, um pouco, ao efeito produzido pelo rufo, com a leve curvatura,
produzida pelo comprimento e pelos bordados da barra.
Na imagem a seguir, representando Maria Tudor, o vestido
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debaixo tem manga presunto, afunilando-se aos poucos até chegar à
barra, esta, diferente da manga anterior, tem uma passamanaria em
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vez de uma barra dupla, e a parte da manga que passa por esta pas-
samanaria recebeu grandes pregas.

Maria Tudor. 1554. Anthonis Mor van Dashorst. Extraído do livro 1000 Obras
primas da pintura, 2007.

Não como plissados, mas como pregas simples, tendo o cui-


dado de o plissado da barra ficar perfeitamente distribuído. A cava
do vestido é extremamente pequena, termina logo abaixo do braço,
o que comprime o busto logo acima, empurrando para baixo.

Caso a cava fosse um pouco mais abaixo, comprimiria o


busto na parte central, o que criava a estética do busto saltado, er-
guido para fora do corpete. O resultado era uma nova rigidez e hau-
teur na etiqueta rigorosa da corte, muito religiosa. Acabaram-se as
linhas fluídas das Roupas do início do século, quando pareciam
expressar a personalidade do ser humano e até a própria fantasia.
O aspecto que o rufo representava era de uma pessoa altiva,
um portador de muitas virtudes, para a época um aristocrata esnobe
e várias revoltas se iniciam neste momento por parte do povo, re-
voltado, entre alguns dos motivos, com a riqueza não dividida; este
era o momento das grandes cortes e dos grandes bailes, e da criação
das taxas e impostos.
É um século de luzes, a reforma criada pelo rei Henrique
VIII aproxima o Renascimento. A física aflora, astronomia e Leo-
nardo da Vinci, com patrocínio do rei Francisco I, da França, pôde
colocar em prática seus estudos. Neste contexto de grandes refor-
mas e apreciação das artes e ciências, as Roupas tornam-se mais
irreverentes, muito surge em termos de estruturas. Galileu Galilei
defende a teoria do heliocentrismo, baseado nos estudos de Nicolau
Copérnico, mas desiste de sua tese por ameaças da Santa Igreja
Católica.
Veludo e peles eram comuns, também pelo clima frio rigo-
roso dos invernos europeus. A Roupa era preciosa, passando como
herança para as descendentes, era costume em momentos difíceis
queimar os vestidos, o que restavam eram fios de ouro e muitas
pedras preciosas.
Alguns calções eram justos ao corpo, com uso extremo de
golpeados, nestes o uso das saqueiras tornou-se mais cômodo, uma
vez que o calção inteiriço dificultava os movimentos, estes calções
eram forrados com um tecido fino, o forro era mais largo que o
calção, e formava pufes de tecido que apareciam pelos golpeados
do calção.
Aos poucos a saqueira é substituída por uma abertura fecha-
da com botões, o que possibilita também mais alterações nos cal-
ções, que se tornam calças, mais longas chegando até quase os tor-
nozelos, franzidas na extremidade.
Havia também os calções largos, com aspecto quase balonê,
reforçados pelo efeito dos golpeados, agora maiores, os próprios
pufes que ficavam na parte interna do calção começam a ter golpe-
ados, estes calções eram presos à veste pela parte interna do gibão
ou pelas extremidades inferiores, no caso de utilizar meias inteiras,
elas eram presas sob o calção por fivelas, algumas eram presas ao
joelho, com amarrações, no caso de calções mais longos.
A Roupa da figura é utilizada por um menino, as Roupas
infantis até este momento não sofrem alterações das Roupas de
adultos.
Em “O Moço” nota-se o gibão com abotoaduras, a manga,
na cava percebe-se que a parte de cima, localizada no ombro tem
caimento, e já salienta-se para fora, que indica ser um corte de cava
bem próximo do existente hoje para camisas e casacos em geral,
agora era cortado também em duas partes verticais, a parte superior
até a cintura, e a barra, que media entre oito a quinze centímetros
no início do século, e ao final já estava com comprimento de doze a
trinta centímetros, esta poderia ser uma faixa reta dupla, pois
costurando-a ao corpo do gibão com as pregas não necessita ter
circunferência, sendo unida na frente em corte enviesado.
Luís XIII quando criança.1611. Frans Pourbus, o Moço.
Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

O gibão era
repartido em duas
partes na frente, a
parte esquerda e a
direita. Como
acontece nos
moldes dos
casacos atuais. No
entanto, na
alfaiataria, o corte
frontal (central)
poderia ser reto ou
curvo. Se curvo,
assentava melhor
em pessoas com
barriga mais
saliente, ficando
justo e sem
excessos de
tecido.
Se reto, ficaria justo, e, assentava melhor em pessoas de
corpo mais magro e barriga menos saliente, pois, as peças eram
feitas na medida do corpo, estruturadas para que não houvesse
sobra ou escasses de tecidos nas partes do corpo.
Representação do gibão com centro reto:

Fonte: da autora

Nem sempre os gibões tinham estes enchimentos, por vezes


eram sem forro, então a função de segurar o enchimento ficava a
cargo das jaquetas, no caso dos gibões sem manga, estas tinham a
frente dupla, uma se recostava ao corpo, a outra circundava e pren-
dia o enchimento, que tinha de ser rígido para não cair, era geral-
mente de pelo de bezerro ou estopa.
As Roupas de couro necessitavam de corte diferenciado,
porque o couro tinha espessuras desiguais, os gibões de couro nun-
ca tinham mangas, os ombros e as cavas eram largos, fechado na
frente por cordão, era transpassado, imagine a dificuldade em cos-
turar botões a um traje de couro, à mão.
As forrações utilizadas eram feitas de palha ou crina de ca-
valo, no primeiro tipo poderiam ser incômodas, e no segundo tipo
eram quentes, então
Versão muitas peças passam a ter uma forração de
gratuita
tecidos há mais, principalmente em períodos quentes, como os gi-
bões, os corpetes e espartilhos.
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O short, demasiado bufante, provavelmente utiliza
enchimento de tecido, comum neste período, e não apresenta os
golpeados. É preso à barra do gibão. Este gibão aparenta ser rígido,
o que denota o possível uso de enchimento. O gibão espanhol não
tinha mangas, por baixo dele era utilizada a jaqueta, com pequenos
golpeados.
O calção necessita de grande quantidade de tecido, este tipo
de calção deveria ter na perna uma parte mais justa, uma espécie de
barra, onde costurava-se o corpo do calção, criando os drapeados e
assim a parte bufante. Este tipo de construção era muito comum
neste período também para as Roupas debaixo, esta barra, ajustava-
se na circunferência da perna e daria o efeito desejado à Roupa.
Estes calções tinham seu corte e costura ordenados pelo ta-
manho do enchimento, se a profusão de volume ficasse na parte
inferior, os golpeados, feitos no calção, eram dispostos próximos
entre si, sobre o enchimento na parte mais larga do calção, se o
calção tivesse volume no centro, o enchimento era mais espesso e
os golpeados eram menores, e em menor quantidade, de forma a
cobrir o forro, que se encontrava mais saliente, este era costurado
em cima e embaixo do calção, nas extremidades.
Na imagem do menino, já se percebe o uso do rufo, ou le-
chugilla. Estes eram golas rígidas e eretas, possíveis pela utilização
de uma armação interna de ferro flexível, tratava-se de uma grande
nesga de tecido, de linho ou algodão, dobrada até formar os roli-
nhos, que eram sobrepostos então formando a gola, esta gola final
era costurada a uma parte de tecido mais fina, que tinha a finalidade
de permitir a amarração ao pescoço.
Percebe-se também o uso de meias, que poderiam ser de se-
da ou lã e já tem o corte parecido com o corte das futuras calças. O
corte das meias podia ser inteiro até o tornozelo, onde a parte dos
pés, cortada em outro pedaço de tecido era costurada, ou ter a parte
dos pés cortada junto com a perna, porém, neste caso, uma nesga de
tecido era colocada do tornozelo até a ponta dos pés, formando a
sola.
Posteriormente estas meias eram cortadas enviesadas, assen-
tando melhor ao corpo, pois, na forma do fio (risco imaginário no
tecido) oblíquo, o tecido toma mais peso e assenta ao corpo.

Representação da meia:

Fonte: Da autora.

Inicia o ciclo do espartilho, de início feito por sarrafos finos,


arrumados por fitas, que se prendiam ao corpete mantendo a estru-
tura rija e firme. As saias eram ajustadas por anáguas em forma de
sinos, ou por anquinhas. A Roupa mostra-se rígida na Espanha, as
mangas eram mais largas e costumavam ser acolchoadas.
Neste momento já é comum o uso do chemise, uma camisa
masculina utilizada por baixo das Roupas, e da jaqueta, que se ajus-
ta e encurta ficando mais próxima da vestimenta atual.
O corte da jaqueta tinha algumas diferenças e particularida-
des; o casaco para montaria era aberto frontalmente e tinha uma
abertura atrás, o casaco militar tinha o fechamento lateral, geral-
mente feito por colchetes, sendo por vezes também frontal, o casa-
co para casa tinha uma aba larga costurada à barra, em toda a volta,
os ombros dos casacos podiam tanto ser exatamente na linha do
ombro quanto passá-la cerca de dez centímetros.
Havia o kittel, casaco sem abas ou saias, feito de uma única
peça para frente, e uma única peça para trás, que aumentava a lar-
gura dos ombros, de frente e costas exatamente iguais, em alguns
casos colocavam-se pregas na altura dos rins para controlar a largu-
ra do traje; esta vestimenta era utilizada por qualquer classe social.
A partir da segunda metade do século XVI na França, são
promulgadas várias leis suntuárias, a fim de evitar a importação de
tecidos caros. Esta ação visava permitir que a produção interna fos-
se desenvolvida, ao proibir o comércio de tecidos luxuosos vindos
de outros países que não a França, obrigada a produção interna.
Durante este período o corpete era dos mais diversos mate-
riais, tecidos eram mantidos rijos com uso de barbatana de baleia,
de metal, osso, madeira e corpetes inteiros de metal. Passa a ser
bem justo, até o colo, e cria uma ponta abaixo da cintura, na parte
da frente, os de decote baixo eram inteiriços, costurados em várias
partes e presos por ombreiras, outros, com decote mais alto, eram
inteiros graças a duas nesgas largas que se fechavam nas costas e
nas laterais.
O corpete era acolchoado, mais macio de vestir e não criava
rugas, uma vez que o vestido seria justo até a cintura. Eram tam-
bém forrados com tecido estruturado.
Na figura seguinte nota-se que o corpete tem acolchoamen-
to, é rijo, esta estrutura é percebida pelo visual transferido a parte
superior do vestido. Abaixo do corpete, sob o vestido, era utilizado
o espartilho, que moldava o corpo feminino.
Retrato de Eleonora da Toledo com seu filho Giovanni de Médici.
1545. Agnolo Bronzino. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

As mulheres de
classes inferiores
não tinham acesso
a estas peças,
também não havia
necessidade de
utilizá-las para o
trabalho.
A saia utiliza aná-
guas, não apresen-
ta ainda a estrutu-
ra rija que faz
parte do século
XVII, com uso
das anquinhas e
armações.

A manga é interessante, nota-se ser composta de tiras de te-


cido com ornamentos para acabamento nas laterais, presas pelas
pedras bordadas na manga, que deixam a abertura saliente e mostra
a veste debaixo.
Inicia o uso das várias anáguas de tecidos encorpados, a
saia do vestido era mais curta e sem cauda. A parte superior deste
vestido tinha decote até o meio do busto, sendo costurado frente e
verso nas laterais, um pouco antes da linha central de perfil (incli-
nados para a parte da frente do corpo, que mostra que aqui as Rou-
pas já têm a parte de trás mais larga). A parte de trás tratava-se de
duas partes de igual tamanho costuradas no meio, no sentido do
comprimento.
Há uma diferença no fechamento das vestes femininas das
classes superiores em relação as mulheres trabalhadoras. As mulhe-
res bem-nascidas tinham os abotoamentos e amarrações na parte de
trás da peça, as trabalhadoras e camponesas tinham suas vestes fe-
chadas na frente, assim poderiam vestir-se sem o auxílio de empre-
gados.
A diferenciação, por meio das Roupas era exposto não
apenas pelas joias bordadas na vestimenta, bordados manuais em
fio de ouro ou nas mais diversas técnicas exclusivas, ou tecidos
ornamentais, diferenciavam-se uns dos outros, na questão da classe,
também pela escolha dos materiais e meios de vestir mais adequa-
dos à postura que a pessoa ocupava no meio social. Portanto, algu-
mas vezes, o papel da Roupa foi, também, dificultar o movimento,
o caminhar, o sentar e o vestir, exemplificando que, seu usuário
necessitava de empregados.
Mas a principal diferenciação durante o século XVI era mo-
ral. As peças robustas para as mulheres contrastavam com as peças
masculinas, que por sua vez buscavam salientar a força e a virilida-
de masculinas.
Ao final do século XVI o renascimento entra em declínio, a
reforma cristã e uma série de descontentamentos fazem surgir o
protestantismo. Neste momento, a Igreja Católica estava passando
por diversas dificuldades desencadeadas por corrupção dentro do
clero, e vai perdendo suas forças de influência na política.
Antes do fim do século XVI finda o reinado de Elisabeth I,
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filha de Henrique VIII com Ana Bolena. Com ela finda a era dos
Tudors na Inglaterra. Elisabeth I restabelece a religião Anglicana na
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Inglaterra e torna a Inglaterra o país mais rico da Europa.
Os trajes de Elisabeth I seguiam um padrão religioso, golas
altas, o rufo, exorbitante e rígido. Mangas estilo presunto e muitas
pedras preciosas por toda a veste.
Por trás da veste superior passava uma capa de tecido mui-
to fino, provavelmente voil engomado, que circundava as costas
indo de um lado ao outro. Aqui é possível ver o rufo em sua forma
mais rígida. O mink, animal utilizado para fazer as capas de pele.
Assim, após a morte de Eduardo VI, único filho homem de
Henrique VIII, aos quinze anos, e a morte de Maria I, Elizabeth
assume o poder e reina por sessenta anos. Esta história é mais con-
turbada do que parece, o rompimento com a igreja católica fez esta
fortificar-se em outros reinos, instaurando novamente a “Santa In-
quisição”.
Elizabeth I,1585. Nicholas Hilliard. Extraído do livro 1000 Obras
primas da pintura, 2007.
2.5 SÉCULO XVII

A vestimenta da figura representa o fim do século XVI


ainda até o início do século XVII. Nota-se o uso do corpete em
ponta, descendo abaixo do ventre.

A Infanta Isabela Clara Eugênia. 1570. Alonzo Sánchez Coello. Extra-


ído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

N
Nesta imagem é difícil definir se o vestido é inteiro ou se foi
recortado seguindo as aplicações de pedrarias. Comumente, as pe-
drarias, bordados e passamanarias eram aplicadas para cobrir as
costuras. Neste caso, o local de aplique das pedrarias dá a entender
que o vestido seria repartido na vertical, no centro do corpo, e na
cintura formando a ponta, o que permite uma modelagem que me-
lhor se adapta aos movimentos do corpo.
As pedrarias aplicadas na vertical, na linha do seio entre o
ombro e a cintura estão localizadas onde, atualmente, fazemos nos-
sas pences para afinar a cintura e reduzir excesso de tecido no om-
bro.
Atualmente muito destes recortes são embutidos, feitos
anatomicamente já no molde, evitando que apareçam costuras na
peça, no entanto, durante o século XVII não há indícios que com-
provem o uso desta técnica. Revelando-nos, portanto, a possibilida-
de de haver pences no vestido, coberta pelas pedrarias.
O uso do rufo rijo e os acabamentos ricamente ornados
marcam a Roupa das monarquias do século. Nota-se a manga, as-
sim como a capa, unidas por dentro da cava, abaixo de uma aplica-
ção bufante que, serviria tanto como ornamento, quanto para es-
conder as amarrações da manga junto ao corpete.
Durante o século XVII é notável as influências políticas no
estilo das Roupas de cada reinado. Na Alemanha, devido à guerra
dos trinta anos, motivada por questões religiosas da reforma e polí-
ticas, a vestimenta é rija, fazem parte dos materiais o couro e metal,
e muitas propriedades das Roupas dos soldados é incorporada à
vestimenta casual. Na Espanha, o abandono do gibão acolchoado e
o alargamento das mangas deram às Roupas ares menos espalhafa-
tosos.
A figura retratando a infanta Margarida, da família do rei
Filipe IV, da corte espanhola, mostra uma veste mais elaborada nos
cortes, o que pode ter auxiliado na diminuição do uso de apliques.
O volume das saias caminha para as laterais, feito conseguido por
meio de armações, as anquinhas, cobertas por várias saias chama-
das anáguas, e, na saia do vestido, o uso de tecidos encorpados co-
mo veludo, cetim e jacquard auxiliavam a conseguir este caimento
rígido.

As Meninas. 1656. Velázquez. Extraído do livro 1000 Obras primas da


pintura, 2007.
OVersão
corpetegratuita
é rijo, e a parte superior do vestido tem as mangas
mais largas. É possível notar que a parte superior do vestido tem o
ombro invadindo a manga, sem corte, formando uma manga curta
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no próprio corpo do vestido, a manga inicia separadamente, logo
após este recorte.
As damas de companhia, uma à direita e outra à esquerda
utilizam o mesmo tipo de vestimenta. O decote é estilo canoa. A
saia é lisa e termina antes do chão, não mais com os espalhafatosos
drapeados. A aba da parte superior do vestido cai sobre a saia, pos-
sibilitando acabamentos diferenciados para as saias, uma vez que
são escondidos pela aba.
Esta aba, medindo entre vinte e trinta centímetros é costu-
rada na cintura por dentro, provavelmente seu corte seja igual ao de
uma saia inteiriça, um geométrico ovoide, devido a saia ter mais
extensão para os lados, e ao meio um círculo onde seria costurado
ao corpete, com corte frontal para abertura da peça ao vestir.
As saias espanholas que, apesar de deixar a anquinha para
as ocasiões da corte, utilizavam de oito a dez anáguas, de tecido
nobre. A saia necessita ser cortada em duas partes, sendo traseira e
dianteira, tendo alargamento brusco da cintura até a parte mais lar-
ga da saia, logo abaixo da aba. Dali até a barra segue com leve
abertura.
Muito provavelmente existisse uma forma de fechamento
para esta saia, por amarrações, para que pudesse ser vestida; este
fechamento faz-se necessário; imagine esta saia com alargamento
da cintura de modo que pudesse ser vestida pelas pernas ou pelos
ombros, necessitaria de um alargamento maior, o que provocaria
certo volume ao ser estreitado, volume este que seria escondido
pela aba do corpete.
A Itália mantém a veste mais solta, motivada pelo Renasci-
mento, e pelo romantismo proveniente do Barroco, patrocinado
pelo catolicismo, que apesar de forte em toda Europa, menos na
França, é mais forte na Itália.

Luíz XIV. 1701. Hyacinthe Rigaud. Extraído do livro 1000 Obras pri-
mas da pintura, 2007.

É dado o início dos tempos modernos. Na França é o mo-


mento conhecido pelo absolutismo dos reis, com Luís XIV, conhe-
cido como o Rei Sol, precursor do luxo.
Na imagem anterior, além da capa forrada, Luiz XIV usa o
calção curto bufante e a meia de lã. O volume do calção é conse-
guido por vários plissês na barra e na cintura, além do enchimento,
a barra do calção tem uma faixa mais justa de tecido onde são cos-
turados os plissês.
Os calções curtos, trousses, comuns em toda Europa e vistos
na imagem representando o Rei Luíz XIV iam até o meio das co-
xas, ganhavam menos enchimento, até quase não ter nenhum. O
volume é conseguido a partir de inúmeros franzidos na parte supe-
rior, próximo a cintura e na parte inferior, que se localizava perto
dos joelhos.
Na cintura, provavelmente acontece o mesmo sistema, já
com fechamento por botões. Aqui o calção já tem a costura central,
no gancho, embora, devido ao volume dos calções este gancho ain-
da não tivesse o corte curvo como o atual, que é feito para dentro,
mas sim um corte feito para fora, levemente curvo, seguindo a linha
abaloada do calção.
É possível ver um rufo caído tanto na gola de Luíz XIV,
quanto na imagem de Frans Hals. Este, posteriormente substituído
pelos laços e gravatas.

O cavalheiro sorridente. 1624. Frans Hals. Extraído do livro 1000 Obras primas
da pintura, 2007.
O rufo caído é plissado, não mais em cones como o rufo an-
terior.
Este rufo, de rendas sobrepostas terminadas em pontas ainda
tem um plissado leve, na circunferência da gola, abrindo-se até as
pontas. Anterior ao século XVII, o rufo era utilizado com uma ar-
mação de metal, a invenção da goma proporcionou que fosse utili-
zado sem armação, passa a se transformar na gola caída, com tama-
nhos diversos, mas do mesmo material, em geral renda de cor bran-
ca, linho ou algodão.
Tanto homens quanto mulheres tiveram forte influência da
gola caída, tendo maior evidência entre a ascensão de Luís XIII,
após o assassinato de Henrique IV. Com as leis dificultando a im-
portação de tecidos, a burguesia passou a utilizar Roupas de lã,
cortesãos ainda utilizavam a seda, porém com menos adornos de
fios de ouro e prata.
Neste momento, a sociedade europeia está próxima de trans-
formações culturais, passa por momentos áureos de arte e música,
tem um comércio bem elaborado e os burgueses já são história con-
creta, os reinados são mais organizados, existe legislação, e as auto-
ridades eclesiásticas, apesar de ainda respeitadas, não são mais tão
predominantes nas decisões gerais.
Isto tudo traz para a Roupa mais sensualidade, novos teci-
dos e cores, variedade, e sua confecção mais requintada e um pouco
mais veloz. Também é neste momento que acontece a guerra dos
trinta anos, da qual participa a maior parte dos países da Europa
Ocidental, travando a luta ente católicos e protestantes, vista duran-
te a sucessão de Maria I por Elizabeth I.
A vestimenta da corte francesa era mais rija e enfeitada,
tem a armação para as laterais. Na França o traje feminino era for-
mado por corpete, agora mais confortável, anágua e beca. O corpete
costumava ser extravagantemente decotado e amarrado com fita de
seda na frente, por vezes tão decotado que cobria o busto a partir
das auréolas do seio, em formato quadrado.
A técnica de franzir conhecida até hoje é conseguida pela
engomagem, com auxílio de ferro quente, e a costura das pregas na
veste. Já a técnica para mais comum utilizada para plissar o tecido é
conseguida por meio de um molde onde o tecido é sobreposto, plis-
sado junto com a base do molde e guardado por algumas horas (a
quantidade de horas depende da tenacidade da fibra). Este método
na Idade Média utilizava bases de madeira, atualmente pode utilizar
vapor e prensa para apressar o processo.
Na imagem, cavalheiro ao centro utiliza a gola caída, o gi-
bão terminado em ponta na frente, apesar de inteiro ainda tem mar-
cação da cintura, conseguida pelo estreitamento dela no molde, de
forma reta.
Havia calções mais longos, na Espanha, juntamente com o
gibão mais comprido na frente em relação as costas, e as abas, antes
costuradas separadamente agora eram cortadas no molde, formando
um traje de peça única.
Graças aos processos de curtimento da camurça, o gibão fi-
ca mais maleável, a parte traseira passa então a ser inteiriça. As
abas tinham duas camadas, ficando longas, também para servir co-
mo armadura, protegendo as coxas de golpes.
Ainda assim era rijo e necessitava ser fechado com fivelas.
As abas por vezes eram costuradas ao corpo do gibão após ele estar
todo montado, ou recebia as abas inteiras até os braços, criando
uma pala superior na frente e costas.
A Rendição de Breda. 1634. Diego Velázquez. Extraído do livro 1000
Versão gratuita
Obras primas da pintura, 2007.

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As ombreiras, vindas da Espanha do século XVI tornam-se


mais comuns, no gibão são costuradas junto à cava e aos ombros. O
mesmo gibão tinha agora orifícios para que os calções, por meio
das fitas (Aigletes) fossem amarrados ficando fixos. No século pas-
sado o mecanismo era parecido, porém os calções eram amarrados
interiormente.
Também, devido ao encurtamento da cintura dos gibões, os
calções passaram a não mais ser presos neles, recebiam agora um
cordão que passava pelas costuras de cima do calção, um fecha-
mento comum hoje, este era atado acima dos quadris.
Em meados de 1630 já se utiliza uma espécie de meia, as
polainas, de camurça ou tecido colorido, com pés, eram utilizadas
sobre as meias longas, sob as botas. O século XVII foi palco do
Iluminismo, que foi palco para a derrota do absolutismo e fez surgir
um governo baseado no parlamento. No Iluminismo encontram-se
René Descartes, Isaac Newton que durante este momento davam
grande impulso para estudos matemáticos, formulando seus estudos
da teoria da gravitação e leis de movimento, e Leibniz, filósofo e
matemático alemão, ao mesmo momento que Newton, inventando
também a máquina multiplicadora.
Também durante o século XVII a Inglaterra começou a po-
voar a América do Norte. Estes eventos históricos possibilitaram,
aos povos europeus conhecer novas fronteiras e novas culturas, ao
mesmo que necessitavam de investimento em navegação e logística
para transporte de novas mercadorias. São momentos como estes
que representam rupturas na forma de pensar, modificando radi-
calmente a cultura de um povo. Naturalmente, as ferramentas, ins-
trumentos, meios de trabalho e convívio afetam e são afetadas nes-
sas novas formas de viver e agir, e pelas diferentes necessidades
que surgem destes eventos. Assim é que, podemos perceber a Rou-
pa caminhando para a sobriedade, para os cortes precisos e anatô-
micos, para o conforto do corpo e a maleabilidade dos movimentos.
Ainda que as frivolidades dos costumes monárquicos fos-
sem aplicadas nas vestimentas, estes foram abandonando timida-
mente os exageros, mantendo a diferenciação pelos tecidos raros,
cores e materiais de uso exclusivo e a aplicação de curvaturas aos
moldes das Roupas, pences, costuras embutidas e técnicas de mo-
delagem, o que os diferenciava de quem fazia suas Roupas em casa.
A Guerra dos Trinta Anos acaba com o Tratado de Vestefá-
lia, em 1648, este proporciona a liberdade religiosa que dá início a
alguns novos Estados nacionais, entre eles a República Holandesa.

A Aula de anatomia do Dr. Tulp. 1632. Harmensz van Rijn Rem-


brandt. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Já é comum a prática mercantilista, também o uso da conta


bancária, instituída pelo Banco de Amsterdã em 1609. Nas univer-
sidades já se iniciavam os estudos de anatomia humana, a partir da
dissecação de corpos. Prática pouco comum na maior parte dos
países ocidentais onde a crença católica ainda tinha influência polí-
tica.
Nota-se na imagem anterior, a existência concomitante do
rufo e da gola caída, e, no homem que realiza o estudo, uma gola
menor. Pelas proporções do homem que serve de estudo, era pro-
vavelmente um anão. Era comum que indigentes condenados pela
justiça tivessem seus corpos liberados para estudos.
Prática ainda condenada pela igreja católica. Ao final do
século XVIII a inquisição condena um estudante de medicina, por
não se arrepender de estudar os órgãos do corpo. Ele foi cozido em
praça público num líquido composto por óleo e água rás.
A restauração de Carlos II em 1660 trouxe o que muitos
historiadores citam como a decadência do esplendor: Roupas femi-
ninas estáticas, masculinas em verdadeira revolução, cujas conse-
quências finais ainda podem ser vistas nos trajes modernos, como o
início da construção do casaco e das calças.
Foi Carlos II que inseriu o costume de utilizar as perucas
brancas. Em 1670 torna-se comum para a realeza e aristocracia
empoar os cabelos e branquear o rosto, a partir deste momento as
mulheres começam a usar as pintas no rosto. Estas pintas se torna-
riam símbolos, transmitindo mensagens como, por exemplo, o gos-
to político, utilizando desde pintas comuns até figuras estranhas
como nuvens e até carroças.
A Companhia de Frans Banning Cocq e Willem van Ruytenburch. 1642.
Harmensz van Rijn Rembrandt. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura,
2007.

Com destaque no cavalheiro que


veste casaco até o meio da coxa, apesar de
não estar usando o fechamento por botões
utiliza uma tira de tecido como cinto.
O calção, já mais justo até os joe-
lhos, este calção já apresenta fechamento
frontal feito por botões, o que faz necessá-
rio, juntamente com o fato de ser um cal-
ção mais justo, do uso do gancho mais
elaborado. Mais próximo à forma como
temos hoje.
O casaco está abaixo da túnica, que é esta veste parecida
com colete, aberta na frente, este provavelmente está colocado den-
tro dos calções, muitos o utilizavam por fora dos calções, como era
mais comprido que a túnica ficava aparente nas pernas.
NaVersão
imagem nota-se as costas do calção que a parte à direita,
gratuita
representando o gancho, é para fora, o que dava movimentação
também ao sentar uma vez que não havia tecidos tão elásticos, além
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da lã e do veludo, porém também representa que a Roupa teve evo-
lução estrutural lenta, de acordo com a evolução social.

Estrutura do calção:

fr co

Fonte: Da autora.

Surge a faixa, amarrada ao pescoço por grandes fitas que


desciam até o peito, formando uma espécie de gravata, de nó mais
simples e mais soltas. Substituíram as golas caídas e evocavam ao
plastron.
Eram faixas retas, tinham trinta centímetros de largura por 1
metro de comprimento, e recebiam nós de vários tipos. O plastron
que, ao final do século XVII, havia se tornado uma fita estreita de
musselina ou cambraia era mostra de valores, seu laço denominava
muitas coisas, entre elas o grau de instrução da pessoa, quanto mais
complicado o laço, mais instruído.
Esta é a parte mais interessante quando analisamos a histó-
ria, pois, a matemática se iniciou com os muçulmanos já no mundo
antigo, mas ainda no século XVII era dominada por poucos, mos-
trar conhecimentos fazia-se necessário, a Roupa foi um porta-voz,
assim como foi a arte! A Roupa passou a incorporar, desde seu sur-
gimento, representações culturais, até chegar na sociedade moder-
na, carregada de simbolismos e identidade.
Havia um modelo de casaco até os joelhos, aberto na frente
e fechado com botões, comum entre cavaleiros e militares. Este tipo
de casaco muitas vezes tinha uma abertura que ia da barra de trás
até a cintura, o que possibilitava a cavalgagem, ou inteiro, tendo
apenas o corte frontal. O corte tem grande semelhança com o corte
dos casacos atuais.
Alguns casacos recebiam cortes verticais próximo às laterais
do casaco, na parte de trás, de forma a melhorar o caimento, isto
para casacos de tecido mais rijo e grosso tal como é ainda feito atu-
almente nas jaquetas de couro justas e nos blazers.
Ao final do século é possível ver o uso da gola. Esta, no
formato de uma gola de camisa, mais longa, até o meio do pescoço,
e por baixo ou por cima dela o plastron, por vezes até abaixo do
queixo, com as pontas, na frente, muito separadas. Estas golas eram
do mesmo tecido do rufo, engomados, sem qualquer tipo de prega
ou volume. Estes costumes perduraram até o século XVIII, assim
como as mangas ¾ e 7/8.
O concerto. 1675. Gerard ter Borch, o Moço. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

Na vestimenta feminina deste período foi comum o uso de


jaquetas, semelhante à masculina, porém com abotoamento até o
decote, que não recebia golas. Também fazia parte da vestimenta a
robe, de veludo ou seda encorpada, era justa. O espartilho substitui
o corpete da veste de baixo, sendo este fechado por cordões fron-
talmente. O que possibilitou uma vestimenta mais solta e leve.
Esta imagem caracteriza a veste no final do século XVII, a
garota utiliza a jaqueta, com mangas até o cotovelo, bufantes, não
há muitas pregas, portanto, o volume desta manga provavelmente
foi provocado por enchimentos.
Para isto, a cava da manga é mais longa na parte superior
vista na imagem, avançando no espaço corpete, a cava deste é mais
arredondada na região do ombro, esta segue neste tamanho até a
barra, onde seu corte ajusta-se gradativamente até a barra.

Autorretrato. 1622. Antoon van Dyck. Extraído do livro 1000 Obras


primas da pintura, 2007.

Pelo ajustamento do traje podemos concluir que esta é uma


jaqueta com duas partes frontais e uma traseira. A cava é mais bai-
xa e invade o braço, para isso, a partir da linha vertical do meio do
tronco, a Roupa deve ser estendida para as laterais. A parte de trás
da cava é menos profunda que a parte da frente.

Esta imagem mostra uma vestimenta mais liberal, que re-


vela também a sutileza da veste italiana durante o renascimento,
esta é a vestimenta de um pintor.
O casaco de cetim, inteiro, sem demarcação forte de cintura
e mangas extremamente bufantes, conseguidas a partir dos enchi-
mentos, aparece a chemise, de tecido fino. Aqui já se nota o uso da
ombreira, que alarga o ombro e salienta para acima do braço, o que
não é facilmente percebido devido ao volume da manga. O casaco é
fechado por uma fita, este, apesar de a imagem não permitir visua-
lização, está provavelmente usando um calção longo, até abaixo
dos joelhos, meias e sapato de salto.
Os exageros da corte foram aos poucos sendo repudiados
pelo povo, até a queda dos reis absolutistas, nos séculos que se-
guem, com diversas revoltas pela Europa e execuções de monarcas
e suas famílias.

2.6 SÉCULO XVIII

Apesar de que, ainda no início do século as saias respeitam


as proporções iniciadas no século XVII. Foi por Maria Antonieta
que as anquinhas passaram a crescer ainda mais para as laterais,
sendo as mais retas possíveis na frente e atrás.
Maria Antonieta desposou Luiz XVI, da França, ainda
muito jovem. Na corte tratou de preocupar-se mais com as vesti-
mentas, instituiu um novo olhar sobre a Roupa e a partir deste mo-
mento surge a figura do costureiro criador.
Maria Antonieta. 1783. Élisabeth Vigée-Lebrun. Autorretrato. 1622.
Antoon van Dyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

A saia já apresentava corte diferenciado, devido a quanti-


dade enorme de tecido necessária, esta recebia o tecido no sentido
horizontal, funcionando como os golpeados, a primeira fileira de
tecido éVersão
unida gratuita
à segunda pelas fitas, deixando à mostra o tecido
debaixo, que muito provavelmente recebia enchimentos.
OConheça
século XVIII atingiu
a versão requinte
completa nos na
a venda trabalhados e bordados
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das Roupas, também fez surgir novos modelos de Roupas, inspira-
dos nas antigas estruturas. Detinha linhas sóbrias, notadas ao final
do século XVII. Agora, toda a Europa se rende ao requinte francês,
e Roupas elegantes significam pelo menos para as classes altas,
Roupas francesas. As vestes entoavam requinte visual, dignidade,
uma riqueza que não era declarada de forma espalhafatosa, mas
“sentida” nos detalhes.
Durante o século XVIII o empirismo florescia, e o pensa-
mento científico, as teorias possíveis de comprovação, seja científi-
ca ou filosófica, o que trouxe ao traje um requinte sensível. Foi
momento de aperfeiçoamento pessoal, acreditavam que a humani-
dade se aperfeiçoaria mediante o progresso de ideias, vindo à tona
um ar de exuberância moral. Surge o Neoclassicismo, que compõe
este pensamento vigente.
Existia agora um número enorme de técnicas para confec-
ção de Roupas, inclusive já é possível o uso de réguas de medidas
próprias para modelar, nos ateliês de costura.
A armação era feita de ferro, com um centímetro de largura
por um milímetro de espessura, envolvidas em couro. Durante estes
períodos as crianças também utilizavam este tipo de anquinha. Com
a proximidade da revolução Francesa, quando Napoleão tomou
grande parte dos reinados, as anquinhas ficaram aos poucos restri-
tas às festas.
As saias dos vestidos podiam medir cento e vinte e cinco
centímetros nas costas e cento e vinte e dois centímetros de cauda,
costuradas em sete nesgas de quarenta e sete centímetros cada uma.
A saia era presa à armação por cordões que havia nas hastes da
anquinha. Possibilitando que ela fosse levantada facilmente; caso
necessário, apesar do peso.
O espartilho do século XVIII era utilizado por todas as clas-
ses, o surgimento das indústrias e do início do comércio cria o uso
de Roupas de massa, a própria vestimenta massifica e o uso das
modelagens dos nobres passa a ser utilizada, com menos requinte,
pelos operários.

A Apresentação. 1740. Pierro Longhi. Autorretrato. 1622. Antoon van


Dyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Na figura acima é comum o uso das armações que levam os


volumes para os lados, na mesma imagem é possível notar uma
mulher utilizando um vestido claro, ainda tem o uso somente de
anáguas, oVersão
que confere
gratuitaà saia caimento comum. Nota-se que a saia
é um pouco mais reta na frente, tendo seu volume transferido aos
poucos para trás com o uso de anquinhas. Mais tarde os volumes
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são transferidos levemente para trás, criando uma silhueta ainda
menos rígida que a anterior.
Em 1791 a constituição francesa ficou pronta, jurada por
Luís XVI, quando se ini-
ciam as assembleias, onde
podiam votar os cidadãos
ativos. A Revolução Fran-
cesa e a queda da monar-
quia vigente em meados
de 1788 auxiliaram na
austeridade das Roupas e
na expansividade dela,
indo até as classes mais
pobres. A Roupa se trans-
forma ao gosto dos novos
ricos. Tornando-se sóbria
para os homens, e menos
volumosa para as mulhe-
res.

Condessa Mary Howe. 1760.


Thomas Gainsborough. Au-
torretrato. 1622. Antoon van
Dyck. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

A anquinha, utilizada na saia, bem abaixo da cintura na par-


te de trás do vestido, era uma armação com enchimento, muitas
pareciam almofadas, feitas de crina de cavalo ou estopa. Aos pou-
cos estas foram sendo substituídas por armações de madeira, osso e
até ferro, pois, a crina de cavalo e a estopa eram muito quentes.
Criando uma estrutura inteligente: que se dobrava de forma maleá-
vel, acompanhando o movimento do corpo, principalmente ao sen-
tar-se.
Na figura anterior a proporção da cintura torna-se minúscu-
la, é o momento de os espartilhos modelarem o corpo, deixando as
cinturas com a largura de um palmo. O volume da saia já foi total-
mente transportado para trás, e a silhueta começa a se transformar
na silhueta em S, que será mais evidente durante todo o século
XIX.
Durante o século XVIII, as transformações na estrutura fo-
ram mais visíveis na Roupa masculina, que se tornou mais anatô-
mica, também pelo fato de esta ter se ajustado. A Roupa feminina
continuou a ser composta pelo vestido, utilizando as estruturas já
criadas em períodos anteriores.
Ainda no século XVII surge o diretório, tendo fim com o
golpe de dezoito de Brumário, em 1799, onde Napoleão efetua a
demissão dos membros do Diretório e a transferência dos Conse-
lhos para Saint-Cloud, sendo dispersos pelas forças armadas. Assim
inicia o Consulado, dando retorno a Napoleão, que toma o reinado
da França, como Imperador.
Com Napoleão a França entrou em grandes reformas, na po-
lítica e no comércio, chegando mais próxima às políticas atuais,
com divisão dos poderes de estado e cidades, gerando prefeitos, e
com a reforma tributária. Em Waterloo Napoleão e a França per-
dem para a Inglaterra dando fim ao apogeu do reinado francês.
As vestes passam a ter influência das Roupas utilizadas pelo
exército de Napoleão, e da imperatriz Josefina, sua esposa. A figura
mostra uma vestimenta mais leve e foi adotada na ascensão de Na-
poleão, não só por sua esposa, mas por todos, sendo visível o corte
império, que tinha marcação logo abaixo do busto, sem uso de ar-
mações ou anquinhas.
Imperatriz Josefina, 1805. Pierre-Paul Prud’hon. Autorretrato. 1622.
Antoon van Dyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

Aparece o fichu,
tecido colocado
no busto para
cobri-lo, era
costurado abai-
xo do decote e
sobre ele era
sobreposto a ele.
Apesar de já
terem registros
de formas como
sutiãs durante o
império romano,
até este momen-
to na Europa a
única forma de
modelar e prender os seios era utilizando o espartilho e estas nesgas
de tecido cobrindo os seios. Durante o império romano estes “suti-
ãs” consistiam em uma faixa de tecido que era fechada por sobre-
posição, utilizados para esportes.
A Roupa masculina é descrita pelo uso do colete, durante
o início do século no mesmo comprimento que o casaco, com uma
ou duas fileiras de botões frontais, o casaco era fechado até os qua-
dris, então se abria, deixando totalmente à mostra a parte da frente
dos calções, e terminava logo abaixo dos quadris na parte de trás.
Este tipo de casaco é muito semelhante ao traje dos oficiais de in-
fantaria.
As costas do colete eram feitas de tecidos mais baratos.
Calções até os joelhos eram fechados abaixo dos joelhos com qua-
tro ou cinco botões, na cintura utilizavam-se cintos ou suspensó-
rios. A partir de 1735 começam a ser fechados abaixo dos joelhos
com fivelas ornamentais, utilizados a partir daí por cima das meias.

Josef de Jaudenes y Nebot. 1794. Gilbert Stuart. Autorretrato. 1622. Antoon van
Dyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

O plastron continuou sendo utilizado na sua versão final, do


fim do século XVII, com algumas variações: o stock, um pedaço de
linho ou cambraia, às vezes entretelado com papelão fechado com
uma fivela atrás, que era utilizado pelos mais jovens com a gravata
‘solitária’, feita de uma tira de cetim de cor preta, em que se dava
um nó tipo fita.

Representação do casaco:

Fonte: Da autora.

Quando aberto esta estrutura permite que o casaco se mova


para frente do corpo, como observado na imagem. O casaco já toma
a dimensão de um casaco moderno, a manga tem a parte traseira
mais profunda que a dianteira, embora ainda lhe falte a curva em S
das mangas atuais, mais profundas na parte superior.
Na representação do casaco tem curvaturas peculiares, a ca-
va é extremamente curvada e a parte frontal tem curvatura acentua-
da para fora, esta estrutura estufa o peito e na parte inferior possibi-
lita que o casaco se abra elegantemente.
Os homens adotam de vez a moda campestre inglesa, muito
também pelo cultivo da caça à raposa, usam botas resistentes, abo-
lindo as meias de seda, retiram das golas e punhos os babados e
rendas, retiram os bordados dos bolsos, e passam a vestirem-se me-
Versão gratuita
nos esplendorosos que as mulheres.

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Representação de manga e gola:

Fonte: Da autora.

Nesta manga nota-se que a parte que vai ao encontro do co-


tovelo é curvada, necessitando ser um pouco mais larga, e a esta
altura já não se utilizavam mais tantos casacos embaixo de um
principal.
Este calção já tem a perna mais justa, proporcionada pela
curvatura para dentro na estrutura da perna do calção. Notam-se os
botões e caseados, que já recebem lapelas.
Representação do calção.

Fonte: Da autora.

A partir de 1760 as Roupas de campo inglesas começam a


ter perceptível influência na vestimenta, devido à prática da monta-
ria, os casacos eram lisos, os punhos mais estreitos. Em meados de
1770 as Roupas passam por certas mudanças, os arcos utilizados
abaixo das saias dos vestidos transformam-se em anquinhas, que
salientaram mudanças no vestuário, uma vez que a estrutura rumou
dos lados para trás.
O aumento das anquinhas, que tomam proporções gigantes-
cas, traz novas alterações à Roupa, as saias passam a não ser mais
abertas na frente, são totalmente rodadas, cortadas como um círcu-
lo, e o volume e a contensão do excesso de tecido são dados pelas
amarrações de fitas.
A sociedade no século XVIII apresentava o princípio de
uma grande transformação, com o início da Revolução Industrial,
tratando de unir em um só lugar a massa trabalhadora, e organizar
para rapidez o trabalho antes gerado de forma artesanal, com o tra-
balho da indústria rural e da indústria de produção nacional. Na
Inglaterra, o primeiro ramo da indústria a ser mecanizado foi o da
fiação e tecelagem de algodão.
Surgem pequenas bolsinhas: a retícula ou ridícula, que era
utilizada em qualquer situação. Em 1767 James Hargreaves cria a
máquina de fiar, abolindo os métodos manuais, que foi rapidamente
absorvida pela indústria rural e indústria de produção nacional. Em
1769 Richard Arkwright cria a máquina de tecer. Também em 1769
surge a máquina a vapor, criada por James Watt, que proporciona
avanços incontestáveis na estruturação da sociedade, com o início
da era das máquinas, aos quais se encontram as ferrovias, em 1760
transita o primeiro barco a vapor.
Ao final do século XVIII a Roupa masculina fica mais aus-
tera. Ainda assim tiveram certas extravagâncias, principalmente
durante 1790, após a execução de Robespierre (membro da Con-
venção, político Francês, morreu no cadafalso junto com seu ir-
mão), coletes curtos e colarinhos altíssimos, por vezes até cobrindo
a boca juntamente com os lenços de colarinho, é o princípio do
estilo dândi, explorado por Brummel, o mais famoso dândi (costu-
mava trazer tipos de amarrações cada vez mais mirabolantes, de um
requinte extremo), utilizavam casacos justíssimos na cintura, e cal-
ças.
Os lenços com laçarotes, provindos do stock. A gola dos ca-
sacos é bem semelhante as atuais, desta vestimenta definiu-se um
corte mais próximo do atual, sendo aperfeiçoado durante o século
XIX pelos ateliês de costureiros que surgiam. Brummel refugiou-se
na França para fugir dos credores Ingleses, morreu na miséria. Mas
havia seguidores. O dândi era muito aprumado com suas vestes, e
reconhecido principalmente pelo uso do lenço no pescoço.
O colarinho da camisa era virado para cima com as pontas
projetadas sobre o rosto, já evidenciando a gola tal qual é hoje, po-
rém mais engomada, comprida e a parte frontal, onde seria a termi-
nação da ponta era mais curva, não reta como a atual. Com a parti-
da de Brummel, em 1819, a moda dândi perdeu seus ares de sobri-
edade total, as golas aumentadas até quase os olhos, plastrons e
stock rígidos casacos com ombreiras e cintura afinada com auxílio
de espartilho. Nota-se um período extremamente político, e ser um
dândi representava pertencer a um partido revolucionário.
Este homem dandista é caracterizado com vestimenta pró-
pria, composta por botas, calça, casaco estilo militar e o lenço. A
calça aparece aqui com quadril mais largo, cintura alta, e com abo-
toamentos na parte superior, apenas para ajustar a cintura. As calças
eram compridas, até os pés. Algumas calças deste período tinham
uma faixa que passava por baixo do pé, estas eram mais justas em
direção à barra. O casaco apresentava gola, como as golas dos pale-
tós atuais, mais largas, para o uso do lenço, e com abas grandes.
A Roupa feminina passa por consideráveis e extravagantes
mudanças. As Roupas femininas criam certa variedade, devido às
atividades diversas que também passam a executar. As Roupas de
uso diurno também são diferentes das Roupas de uso noturno, em
geral as diurnas são menos ostentosas e mais práticas, as Roupas
noturnas passam a ter cinturas mais apertadas, penteados mais tra-
balhados, e saias muito rodadas, rodados que chegam a um metro
de diâmetro, o que transforma a arquitetura dos salões, alargando
portas e escadas. Neste momento a Roupa passa a ser dividida não
só por estações, mas por ocasiões.
O comércio toma evidência, muitas monarquias têm fim, a
burguesia começa a fazer parte da sociedade de forma mais aparen-
te, assim, passam a fazer parte também das rodas da alta sociedade,
antes mais frequentadas pelos nobres.
Neste momento os homens utilizam fraque, ao qual é se-
melhante ao casaco, com a fenda atrás e utilizado com o colete sob
o casaco, e a faixa de cetim na cintura; o casaco tem uma grande
lapela frontal, assim como o fraque, e recebe caseados falsos, pois
tem seu fechamento por colchetes, semelhante ao fechamento dos
casacos de oficiais. Neste momento, o comércio têxtil de tecidos
era muito rentável.

2.7 SÉCULO XIX

O século XIX inicia com a promessa de ser o século das lu-


zes, pela evolução dos maquinários e indústrias do comércio e pelo
fim de muitas elites monárquicas, que mantinham o poder passan-
do-o de geração em geração. A meritocracia surge como ideal de
que o pobre, mesmo nascido pobre e sem sobrenome, poderia as-
cender socialmente pelo trabalho. É neste século que nasce as ciên-
cias sociais e o estudo das culturas, pragmatizando o pensamento
religioso.
É, no entanto, um momento tenso politicamente, antes de
Napoleão o diretório reprimia ideias revolucionárias, após a queda
do diretório eram reprimidas ideias não revolucionárias, e então
Napoleão perde para a Inglaterra na batalha de Waterloo, e os anti-
gos regimes voltam a reinar.
Após a queda de Napoleão jornais são fechados, livros
queimados, partidários perseguidos, algumas ideias inovadoras,
como a luz nas ruas de Roma e a vacina, foram proibidas por serem
consideradas revolucionárias. O Rei da Espanha, Fernando VII res-
taura a Inquisição, antes proibida por Napoleão.
Teve por fim vinte e cinco mil pessoas condenadas por pe-
nas diversas e 1500 pessoas queimadas nas fogueiras, entre elas
principalmente judeus e judeus convertidos ao catolicismo contra
sua vontade. Eclesiásticos procuravam suprimir atos de magia e
feitiçaria, dos quais muitos equívocos e perseguição política acon-
teceram.
Foi o Marquês de Pombal que enfim reduziu consideravel-
mente o poder dos inquisidores. A inquisição só foi extinta por
completo em 1821. No início do século a sociedade tem influência
do romantismo, num momento que se priva do realismo. Este ro-
mantismo trouxe à veste a predominância de tecidos leves, a falta
de rigidez, apesar do uso do espartilho. O romantismo trouxe tam-
bém o resgate do passado, das Roupas exuberantes dos séculos an-
teriores, ao menos para as Roupas femininas. As mangas eram li-
geiramente bufantes.
Havia também as mangas-presunto, utilizadas para vestidos
de tecidos opacos. Esta vestimenta da figura representa o período
do romantismo, italiano, onde as vestes caminham em parte para
um resgate do passado, com traços gregos nas cores e tecidos; nota-
se a manga-presunto, diferente das anteriores, apesar de armada
pelo enchimento tem traços muito leves.
Paolo e Francesca. 1864. Anselm Feuerbach. Autorretrato. 1622. An-
toon van Dyck. Extraído do livro 1000 Obras primas da pintura, 2007.

O corpete deixa os seios quase descobertos, sendo cober-


tos por um tecido leve que lembra muito o fichu. O corpete tem
agora os dois lados, dianteiro e traseiro iguais, costurados nas late-
rais e fechados na frente ou atrás, por botões ou amarração.
Para utilização do corpete sob o vestido era necessário que
houvesse muitas pregas no vestido, principalmente na parte do bus-
to, que ficava larga sobre o corpete.
Ainda, era costume aumentar a largura das saias com uso
de nesgas, tantas quanto fosse necessário, a cauda de trás do vestido
por sua vez era o prolongamento da nesga de trás. A manga podia
ser totalmente costurada na cava, o que a tornou mais arredondada,
uma vez que não havia enchimentos e a peça deveria cair bem so-
bre os ombros, também a parte de trás da manga tinha algumas pre-
gas.
A saia, ampla e longa resgata o século anterior, muito pro-
vavelmente armada pelo uso de anáguas. A veste masculina mostra
um resgate maior, este provavelmente não pertencia à classe bur-
guesa, mas a um resquício da classe nobre.
A antiga estrutura de valores modificava-se com o avanço
tecnológico e a noção de novos rumos que a sociedade agora toma-
va; com a chegada de novos ricos vindos do sul da África e de di-
versos outros lugares, tomando as cidadelas da aristocracia. Este
período é chamado na Inglaterra de era Eduardiana, na França foi
denominado La belle époque, anos que pareceram reviver o século
passado, como extensão de uma era que estava terminando gradati-
vamente, a época das ostentações.
Logo no início do século surge a máquina fotográfica, uma
na França, patenteada por Louis J.M. Deguerre, que representou
importância enorme para os estudos químicos, porém, reproduzia
apenas uma foto por vez.
Na Inglaterra, patenteada por Henry Fox Talbot, surge a
máquina utilizando filme, que possibilitava que fosse feita mais de
uma cópia da mesma imagem. Em 1825 na Inglaterra surge a pri-
meira estrada de ferro. Junto com a invenção de máquinas têxteis
vieram as máquinas a vapor, que potencializaram um extremo cres-
cimento industrial.
Este caracteriza o primeiro momento da revolução industri-
al, potencialmente entre 1760 e 1860, na Inglaterra, França e Bélgi-
ca. O segundo momento, iniciado em 1860 nos EUA, Alemanha,
Itália, Rússia e Japão é marcado pelas grandes companhias. A partir
daí surgem as energias derivadas do petróleo e carvão.
É no século XIX, que a partir dos estudos de Charles Dar-
win e da nova fotografia documental procura-se catalogar e dividir
as medidas do corpo humano. A ciência da antropometria surgia a
partir da divisão do corpo em partes simétricas.
Em 1830, após a abertura de algumas escolas de alfaiataria
que surge o conceito básico de moldar, com auxílio da antropome-
tria, a partir do estudo do corpo humano. Aos poucos aparecem as
medidas básicas para uma graduação universal.
O surgimento da fita métrica e do busto do manequim con-
tribuiu para o surgimento de novas técnicas de facilitação, remode-
lando a anterior. Os ateliês de costura se expandem, os costureiros
herdeiros do legado de costureiros reais passam a ensinar seus aju-
dantes, que possibilita que a profissão se mantenha, fazendo do
século XIX um divisor de águas. É neste século que, com Charles
Worth, surgem as Roupas prontas, que eram exibidas em desfiles
incorporando as diferenças sazonais.
Surge em 1829 a primeira máquina de costura revigorada
em 1859 por Isaac Singer com uso de pedal. O século XIX traz as
primeiras indústrias e o início da produção em série, a alta costura
estava se formando, mas somente no século XX é formada de fato.
As produções em série trouxeram tabelas de medidas padrão, utili-
zando os mesmos conceitos da tabela de medidas de alfaiataria,
porém para peças mais básicas, produzidas aos montantes, por téc-
nicas simplificadas e com o auxílio de máquinas, que produzem
com rapidez, mas são mais limitadas que o homem em trabalhados
e acabamentos; este processo foi possível também graças ao surgi-
mento da trama da malha.
Estas inovações e o surgimento de todo maquinário têxtil
permitiu que babados e aplicações de passamanarias fossem co-
muns. OVersão
séculogratuita
XIX presenciou o surgimento do motor elétrico,
dos primeiros carros, do telefone e do projetor de cinema, além do
telégrafoConheça
sem fios. Cotrimcompleta
a versão (1994, p.a venda
259) cita: “que a história das
na amazon.com
invenções é uma sucessão de desenvolvimentos tecnológicos, não
existindo invento que não se possa ligar a contribuições anteriores e
posteriores”.
Apesar de ser uma década marcada por inovações tecnoló-
gicas, como o surgimento de ferrovias, e por ser também o ano das
revoluções, 1840 ainda era antigo nas vestes, o número de anáguas
utilizado pelas mulheres impossibilitava que fizessem qualquer
atividade sem fadiga.
A montaria era uma prática muito elegante entre as mulhe-
res, porém nesta época ainda não se imaginava uma mulher usando
duas vestes; as Roupas eram masculinizadas até a cintura, na parte
superior, utilizando-se gravata, paletó, cartola com um véu frouxo e
colete masculino, porém com saia muito ampla, tanto que chegava
a encostar-se ao chão quando a mulher estava montada.
Durante este período a Roupa passa por transformações
mais aceleradas, a saia das mulheres é longa em um momento, en-
curtando-se em outro, e por questões morais, em vez de anáguas
utilizavam um calção bufante debaixo da saia, que tinha armação.
Mas também por questões morais a saia novamente volta a ser
comprida, não mais deixando à mostra as vestes inferiores ou os
tornozelos.
A estrutura da Roupa toma aos poucos forma mais atual: as
calças passam a ter uma lapela frontal que esconde o fechamento
feito por botões. Após este período as saias ficam mais rodadas, o
efeito é obtido pelo número extensivo de anáguas, o peso fica into-
lerável e é trocado em idos de 1856 pela crinolina de armação, ou
anágua de arcos, desta vez mais confortáveis e fáceis de vestir, a
tecnologia permitiu que esta armação fosse feita separada, com
arcos flexíveis, era presa nas saias ou utilizada solta debaixo delas.
A crinolina começa a se deslocar para trás em 1864. Surge
por volta de 1874 o cuirasse, um corpete com peitilho de tecido,
muito apertado que moldava os quadris, passou a ser necessário o
uso do espartilho comprido, muito apertado. A anquinha cai em
desuso, e retorna mais tarde, feita em trançado de arames, mais leve
e segundo anúncios da época, esquentava menos.
Em 1851 um homem chamado Mr. Bloomer foi à Inglaterra
tentar convencer as mulheres a utilizarem um traje mais sensato,
seria um corpete simplificado sob uma espécie de túnica, saias até
os joelhos e sobre elas calças amplas presas ao tornozelo por ren-
das. Após este episódio a luta pelo uso das calças iniciou-se entre
as mulheres, porém naquela época, onde mulheres jamais havia
utilizado calças, era ultrajante, um ataque à posição masculina.
O movimento de Bloomer não teve sucesso, algumas mu-
lheres aderiram, mas a calça feminina entrou mais em voga somen-
te cinquenta anos mais tarde para a prática do ciclismo, ainda assim
pareciam mais saias com costuras entre as pernas.
Os vestidos de ancas largas sempre significaram fertilidade,
cinturas marcadas e decotes presunçosos eram marco de feminili-
dade e sensualidade, de forma que mulheres bem-nascidas não dei-
xariam de ocupar seus lugares no lar para utilizar o do marido,
usando assim suas calças. Poderia ser um momento de ruptura, po-
rém, estes conceitos ao qual tentaram quebrar, somente foram de
fato rompidos após o século XX.
As cidades mais civilizadas eram Londres e Paris. Londres
como marco industrial e de grandes frotas para navegação, a cidade
era grande e a população se atrelava em vielas. Paris era conhecida
como a cidade da noite, point dos boêmios. Toda esta estrutura
permitiu a disseminação do pensamento social, alguns com o intui-
to de justificar a organização da sociedade industrial. Assim sur-
gem as teorias do socialismo e capitalismo.
Com a Revolução Industrial, a indústria se consolida para
criar meios de produção e distribuição mais eficientes, reduzindo
custos em meio a falta de condições ou leis trabalhistas. O trabalho,
com a revolução industrial, não era mais executado do início ao fim
por uma pessoa, o artífice, assim, nas fábricas, para que as Roupas
pudessem ser produzidas nos maquinários existentes, pelos traba-
lhadores contratados (não mais artífices) a estrutura delas passa a
ser em cortes geométricos, sem os acabamentos da Roupa sob me-
dida, em tecidos como o Jersey (malha), populares e mais simpló-
rios. Assim surge a T-shirt, o mais famoso modelo da indústria têx-
til.
Com isso surge o conceito de trabalho por peça, ou trabalho
por seção, comum até hoje, onde divididas, cada costureira executa
a costura de uma ou duas partes da peça, passando adiante até ser
terminada. Esse modelo ficou conhecido como modelo fordista, em
alusão ao modelo de trabalho de montagem dos carros na marca
Ford.
A industrialização toma força com a queda das monarquias
e ascensão do positivismo, adquirindo considerável avanço inclusi-
ve entre as colônias europeias, como o Brasil. É em meados do sé-
culo XIX que Karl Marx lança O Capital, auxiliando na transfor-
mação das estruturas de trabalho nas fábricas para o respeito ao ser
humano, assim, com o início das jornadas fixas de trabalho, com
respeito ao tempo necessário de descanso, inclusive para crianças,
surge o ensino fundamental para as massas.
A França passou por diversas tribulações na monarquia, e a
Itália passa por um processo de Unificação, marcado por Guerras
que, mesmo após seu fim, mantiveram seu ideal político até em
meados de 1850.
A estrutura da Roupa neste período vem da alfaiataria. Nas
mangas, os cotovelos eram cortados seguindo uma leve curvatura
que respeitava o movimento do braço em posição de descanso. Esta
modelagem com aspectos da alfaiataria foi, com a revolução indus-
trial e a produção em larga escala, substituída por modelagens mais
retas, menos atraentes, porém, com menor desperdício de tecido. A
Roupa industrial não era estruturada para a estética, mas sim para a
melhor produtividade, menor desperdício, e menor custo. A ocor-
rência de Roupas industrializadas ao mesmo tempo que as Roupas
sob medida desencadeiam, durante o século XX, na expansão do
Pronto para vestir.
A mesma curvatura é vista nas costas dos casacos, fazendo
quase um S, obrigando uma postura extremamente ereta nos om-
bros e “empinada” nos quadris. As calças eram também curvadas
para frente do corpo. A curvatura para fora, da frente dos casacos
acompanhava esta postura. Vários recortes eram necessários para
garantir caimento à Roupa, não mais as nesgas e pregas de outrora,
ou os laçarotes e fitas, agora a estrutura se torna mais arquitetada,
esta estruturação migra para um negócio chamado até hoje de haute
couture, patenteado pela França no século XX em função da Se-
gunda Guerra Mundial.
Houve em meados de 1881 o movimento traje racional, que
idealizava formas mais soltas, sem o uso de anquinhas e esparti-
lhos, alertando que o espartilho deformava os corpos e criava uma
moda superficial demais. O movimento começou a fazer parte do
consentimento geral quando as mulheres começam a ter uma vida
mais ativa, espartilhos rígidos caem novamente em desuso.
O traje masculino toma forma mais atual, o fraque era utili-
zado somente à noite, adornado com lapelas de seda de cor preta e
para o dia o uso da sobrecasaca; havia o casaco para manhã, corta-
do em curvas nos quadris com abotoamento no alto do peito. Entre
os jovens entra em voga cada vez mais a jaqueta curta, sendo di-
fundida nas universidades. A calça toma forma moderna e está
pronto o modelo atual de molde. Havia o smoking jacket, jaquetas
de fumar, utilizadas nas salas de fumar e salas de jogos, que eram
exclusivamente para homens, também eram utilizados nos salões
quando as damas se retiravam, tratava-se de um dinner jacket acol-
choado, aparentemente para aquecer, pois os locais citados não
utilizavam aquecimento.
Saem de moda as anquinhas, os vestidos passam a ser afuni-
lados com saias cortadas enviesadas, terminando abertas, em sino, e
possivelmente com cauda, o corpete continua e a moda se recicla
neste final do século, abrindo novas oportunidades para o século
XX. O casaco ganha bolsos com lapelas e bolsos também nos for-
ros. Podemos lembrar o costume de guardar o relógio nos bolsos,
em que ficava aparente a corrente dele.
Os tecidos preferidos eram crepe da China, chiffon, musse-
line de soie e tule. As blusas tinham muitas pregas, entremeios,
babados e aplicações de musselina muito trabalhadas. As Roupas
feitas por costureiros eram do gosto pessoal de suas clientes.
A jaquete zuavo é mais uma interessante peça deste período,
utilizada sobre os vestidos; tratava-se de uma peça de costas inteira,
frente em duas partes sendo abotoada frontalmente, e mangas com
recortes, de onde apareciam as mangas do vestido (muito semelhan-
te ao golpeado).
Na figura o homem aparece de traje comum e casaco, mais
longo, este casaco com comprimento até o meio da coxa é o fraque,
utilizado com traje completo na imagem.
Colete, calça, camisa de botão e gravata borboleta. Diferen-
te das mulheres, no século XIX. Com a ascensão da burguesia in-
dustriária, os homens vestiam-se com trajes completos, mesmo para
passeio. Sem diferença de traje para passeio e traje para trabalho,
como havia na vestimenta feminina: o traje de campo, o traje de
chá, de primavera etc.

Rua de Paris, dia chuvoso. 1877. Gustave Caillebote. Extraído do livro 1000
Obras primas da pintura, 2007.

Na figura, Roupa para o dia, o vestido de forma afunilada,


ampliando-se apenas na barra, isto pode ser conseguido cortando a
saia em duas partes, no sentido horizontal, inserindo na parte de-
baixo uma parte maior que a de cima, porém este ao ser costurado
cria efeito de drapeados.
A cartola, utilizada pelo homem da imagem, foi desenvol-
vida para lembrar as chaminés das fábricas. A revolução industrial,
e os avanços tecnológicos, filosóficos e científicos do final do sécu-
lo XIX trouxeram os ideais de progresso positivistas, que perdura-
ram, não sem conflito, durante todo o século XX.

Mulher de Azul. 1874. Jean-Baptiste Camille Corot. Extraído do livro 1000


Obras primas da pintura, 2007.

A imagem da mulher de
azul, com vestido sem mangas
caracteriza uma veste para noite.
A saia vai alargando-se na medida
em que chega à barra. A parte de
trás da saia de baixo necessita ser
feita em um corte reto, semelhan-
te ao utilizado nos vestidos de
gala e festa atuais, para que se
forme a cauda naturalmente.
Também nesta imagem nota-se o uso de uma saia posta à
saia do vestido, esta é mais como um enfeite para criar o volume
proporcionado pelas anquinhas, mas sem utilizá-la.
Desenho do corte
da saia inferior:
REFERÊNCIAS

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São Paulo: Edições de Ouro. S.d.
3. PELADO, PELADO, NU COM A MÃO NO BOLSO:

UM OLHAR PARA A ROUPA INSPIRADO POR


QUESTÕES FILOSÓFICAS

Prof. Me. Albio Fabian Melchioretto

A proposta deste texto será pensar a questão da roupa ou


da nudez a partir da filosofia. Para dar conta da provocação recupe-
ro a letra da música Pelado, interpretada pela banda de rock por
Ultraje a rigor. Ela faz uma crítica àquilo que nos prende, a censu-
ra, a moral e ao decoro. Para a música há uma beleza que existe por
debaixo da etiqueta. A verdadeira indecência não está em mostrar
as “vergonhas”, mas sim na ausência de conhecimento, de reflexão,
e daquilo que vulgarmente chamamos de cultura. Da roupa, a músi-
ca pouco fala, mas usa do vestir e do estar nu como metáfora para
uma crítica social. Mas o refrão dela cabe muito bem para esta re-
flexão e aquilo que o texto quer pensar. O que significa estar vesti-
do em nossos dias?
Pensar a roupa e o permanecer vestido é um desafio, pelo
objeto em si e pela própria filosofia, com o caminho histórico que
ela percorre e o intermezzo que forma esta reflexão. As linhas que
pretendo seguir para pensar este encontro são três. Primeiro, parto
de uma reflexão do cotidiano; segundo, passo brevemente pela obra
1984 de George Orwell, e concluo com o terceiro passo onde penso
a noção de biopolítica – ação política, onde o Estado coloca a vida
biológica em seu centro, pensado a partir das ideias do filósofo ita-
liano Giorgio Agamben (1942). Dito isto e contextualizado, vamos
ao caminho proposto, mas lembro que esta é apenas uma leitura
frente as muitas leituras possíveis sobre o tema da roupa e de suas
representações no dia a dia.
Ao primeiro passo, a leitura do cotidiano a partir de uma
fábula. Ela, ou as reflexões do cotidiano, constituem uma forma de
saber interessante para considerar a construção cultural. Por exem-
plo, vejamos a discussão da fábula judaica entre a mentira e a ver-
dade e a herança conceitual que carregamos deste conto, aparente-
mente, inocente. Contam que em determinada ocasião, a Mentira e
a Verdade se encontraram a beira de um riacho e dialogaram.
- Bom dia, senhora Verdade, diz a Mentira ao iniciar a
conversa.
Antes de responder, a Verdade foi conferir se realmente
era um bom dia. Olhou para o alto, não viu nuvens de chuva e per-
cebeu até pássaros cantando. Ao constatar que realmente tratava-se
de um bom dia, respondeu:
- Bom dia, senhora Mentira.
A Mentira, sem pestanejar, muito menos conferir, respon-
deu:
- Sente o calor que está hoje?
A Verdade percebendo que a Mentira estava certa ficou
tranquila. A Mentira então a convidou para banhar-se no rio. Despi-
ram-se de suas vestes e pularam na água. Sorrateiramente, a Menti-
ra saiu da água, vestiu-se com as roupas da verdade e foi embora. A
Verdade, ao perceber, recusou-se a colocar-se nas roupas da Menti-
ra e ficou nua. E por não ter do que se envergonhar, saiu sem rou-
pas pelo caminho: a verdade está nua.
Quero explorar a moral da história subvertendo a lógica
textual. Não vou pensar a verdade e a mentira em seu sentido, mas
na virtualidade das vestes. A roupa traz um sentido de mentira? Ela
encobre? Esconde? Penso que sim, porque ela deixa de mostrar
muitas coisas. Vejam que a ideia de nudez é combatida. No dia a
dia, o senso comum, não aceita a nudez como fonte de verdade. É
proibitivo, é pecaminoso, em alguns momentos até criminoso, di-
zem, “um atentado violento ao pudor”, ou ainda, vide a vestimenta
quando é da ordem religiosa, pouco do corpo é mostrado. Em con-
trapartida, há espaços de reclusão onde a nudez é regra, como
praias de nudismos ou comunidades de vida, mas algo bem especí-
fico e fora da normalidade, fechando a nudez entre muros. O que
fizemos, enquanto sociedade organizada, foi introduzir no corpo
um senso de mentira para dar conta das nossas necessidades, mas a
verdade, é submetida onde ninguém pode ver. A verdade da nudez,
causa espanto e ojeriza, no campo privado ela é aceita, mas no pú-
blico passa por um controle rígido e direcionado. Mas tudo isso
pode serVersão
dito segratuita
desconsiderar a roupa como um elemento funda-
mental na sociedade do consumo. O sistema capitalista de ordem
neoliberal trabalha com a imagem ofuscada da realidade, como
também Conheça
força uma expropriação
a versão da acomunicação.
completa Então questiono,
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como o homem faz sua própria verdade?
O senso de regramento da roupa me leva para o segundo
passo. Na obra 1984 de George Orwell (1903 – 1950), publicado
aqui no Brasil pela Companhia das Letras, onde a roupa é vista
como um elemento essencial na formação e na organização do es-
tado de controle. A verdade não importa, ela sucumbe diante do
controle permanente. Orwell escreve e publica a obra nos primei-
ros anos após o término da Segunda Guerra e expõe um universo
distópico onde a esperança foi quase aniquilada pela vivência das
duas grandes guerras. O universo descrito na obra é regido por um
governo totalitário que tudo controla e governa. O Estado, chamado
de Grande Irmão, observa todos os cidadãos, controla seus passos e
inclusive o desejo através de câmeras e estruturas panópticas. As
roupas são todas uniformizadas, como também a comida, os meios
de comunicação, o ir e vir de cada partícipe da Oceania, como é
chamado o lócus da história. Pelas ruas a propaganda oficial do
governo é sempre visível. Nela encontra-se diversos slogans, como
“o Grande Irmão zela por ti” que dá o tom de um estado que age
em nome da estabilidade. Governa cada cidadão, limitando por
exemplo, o número de peças de roupa de cada qual possui e que
tipo de roupa a classe social que ele pertence vestirá. A distopia de
Orwell prevê o controle como um elemento essencial para estabili-
dade. O mundo que o autor viveu, ressurgiu das cinzas da guerra. A
estabilidade parece ser um anseio da população que sobreviveu ao
período cinza, porém, o elemento estabilizador não nasce da liber-
dade, nem do desejo, mas sim do controle permanente, de um go-
verno para si e para os outros.
O discurso político é importante na reflexão para entender
o lugar da roupa na sociedade distópica de Orwell. A população
dividida em castas sociais vestia-se de acordo com sua faixa social.
Por exemplo, a classe mais pobre, trabalhadora, vestia-se com um
macacão azul, e assim por diante cada classe com uma cor diferen-
te. Poucas peças para cada um. Não havia fartura, pelo contrário a
escassez se fazia presente. As cores formavam uma identidade visí-
vel. A padronização facilitava o olhar do Grande Irmão e, em qual-
quer espiada, todos eram facilmente identificados, então, o desen-
volvimento de cada papel era facilmente marcado. A roupa unifor-
mizada era usada como caracterização de classe e com o passar do
tempo tornava-se precarizada pela escassez. A caracterização é uma
forma de linguagem construída com intenções políticas, como
qualquer forma de linguagem o é. Palavras, jeitos e trejeitos desve-
lam uma ação política moldada pelo sistema cultural. Portanto a
caracterização tem um teor político forte, pois a luta pela caracteri-
zação além dos padrões dados, é também uma luta pela verdade. A
aceitação do uniforme, no enredo de 1984 é a aceitação do controle
do Estado sobre as populações. A luta por uma caracterização pró-
pria, além dos ditames do Estado, seria também a luta pela verdade.
Que lutas pela verdade são evidenciadas na maneira como
nos vestimos? Ponho a questão diante da forma como realizamos a
exposição da nossa roupa. Via de regra seguimos o imperativo de
uma ordem pré-estabelecida. Alguns chamarão isso de moda, ou-
tros de padrão, outros ainda de tendência, o nome aqui não é o foco
da discussão, mas sim, o apontamento de um padrão. E parece,
olhando desta maneira, que fora deste padrão não há verdades. O
sujeito está fora da moda, deslocado no tempo e espaço. Já imagi-
nou uma moçoila com um espartilho medieval participando de um
baile funk? Uma atitude, um tanto paradoxal, quando comparada a
fábula judaica. A verdade estaria no fluxo público desconsiderando
o intermédio e o que este fluxo pode significar.
Os viventes da obra ficcional 1984 viviam no estado pere-
ne de controle. Oceania passa longe de um estado de liberdade de
direitos sociais adquiridos. O acesso aos objetos, alimentos, bem
duráveis e não duráveis eram controlados pelo Estado. Outro slo-
gan político é o lema “guerra é paz; liberdade é escravidão”. Assim
sendo, o acesso as roupas também sofriam controle. Como pouco,
ou quase nenhum acesso, os macacões deveriam durar um bom
tempo, com o passar do dia a roupa surrada tornava-se comum en-
tre os viventes. O corpo através da roupa é um objeto moldado, não
pelo desejo, não pelo despertar de intenções ou da vontade, mas
pelo desejo do Grande Irmão. Liberdade é escravidão, o lema esta-
tal deixa claro e evidente o lugar da roupa neste tempo e nesses
espaços. Mas em meio a tanto controle percebemos a roupa como
estabilidade e a nudez como o caos. Na nudez dos protagonistas
Winston Smith e Júlia transgridem as regras, burlam o olho do Es-
tado e vivem a paixão. No dia a dia, vestidos com o macacão re-
primem suas intenções e seus desejos e são observados pelo contro-
le da Polícia das Ideias – como é chamada na obra o órgão repres-
sor do governo. Permanecem vestidos, estáveis frente ao olho. Os
encontros marcantes e fervorosos da paixão entre os personagens
são, na sua maioria marcados pela nudez que há debaixo da etiqueta
que é precedida pela fuga da Polícia das Ideias.
Por que a nudez em público nos causa tanta estranheza ou
tanta ojeriza? Uma resposta mais apressada poderia supor que fo-
mos educados para manter as “vergonhas” cobertas. O encobrir das
vergonhas – lembrando a carta de Pero Vaz de Caminha (1450 –
1500) – faz parte de um processo educacional que tornou os corpos
disciplinados. A descrição do escrivão português dizia, “todos nus,
sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas” ou ainda “nem
estimam de cobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta
inocência como em mostrar o rosto”. A palavra vergonha, provém
do latim, verecundia (ae) que significa pudor. No dia a dia usamos
vergonha como um sentimento penoso causado por uma situação de
inferioridade. Os portugueses aproximavam a ideia de vergonha aos
órgãos sexuais humanos. Com esta leitura percebemos que o senti-
do de nudez, é opróbrio, humilhante e de certo modo, indecente.
Mostrar as vergonhas é mostrar muito mais do que moralmente
pudesse ser mostrado. Há uma carga moralizante nesta situação.
Então, se aproximarmos a verdade pós-banho da fábula judaica
com a carta de Caminha teremos a verdade como indecência a ser
combatida. A lógica da roupa vai além do aparente problema, ela
está para uma formação dos corpos, como ficou evidente na obra de
Orwell – uma política sobre os corpos, a ausência dessa política
entre os nativos da terra que Caminha descreve, talvez causasse
mais espantes que pênis e vagina a mostra.
Com isso chego ao terceiro passo que é o pensar o corpo
vestido a partir a da leitura de Agamben. Tomo a seguinte definição
que em certo grau, são corpos dóceis, aqueles que são úteis e pro-
dutivos dentro de uma lógica mercantil – própria do capitalismo
liberal no espaço que chamamos de mundo ocidental. Pensar a do-
cilidade comportamental dos corpos vestidos, e devidamente uni-
formizados, sugere uma aproximação com o conceito de biopolíti-
ca. A biopolítica é um olhar para o mundo construído a partir dos
pensadores Michel Foucault (1926-1984) e Giorgio Agamben. Para
pensar estas questões, volto meu olhar, especialmente para o pen-
Versão
sador italiano gratuita
Giorgio Agamben, como já citado, e através dele, me
permitirei uma leitura livre do autor, afinal de contas, ele mesmo
afirmou, a Conheça
partir da leitura
a versãodecompleta
Walter Benjamin,
a venda naque as ideias de um
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autor só podem ser expostas legitimamente na forma de uma inter-
pretação, eis que proponho, uma interpretação das ideias de biopo-
lítica de Giorgio Agamben.
A biopolítica é algo próprio da política, é aquilo que acon-
tece sobretudo a partir do século XVII no mundo ocidental. É o
tempo das grandes transformações impulsionadas pela Revolução
Industrial, é um tempo de ver a política para além da ideia de “ani-
mal político” de Aristóteles. A política, dada a partir da moderni-
dade é uma questão das influências sobre a vida a ser vivida. Para
Agamben, a biopolítica é o exercício do Estado no controle da vida
das pessoas. A atividade do Estado é uma ação de governo sobre a
vida biológica dos indivíduos, sobre uma população da espécie
humana. Ao fazer esta análise, o pensador tem sempre presente que
o Século XX é marcado por grandes estruturas totalitárias que fa-
zem da verdade um revés ideológico. De certa forma uma marca
desse tempo é o atual triunfo do financeiro sobre qualquer aspecto
da vida social, a despolitização do social em torno de uma gestão
de produção. Ou ainda, uma forma de controle que vai além dos
corpos propriamente ditos, mas um controle exercido como um
todo, que promove a vida desses indivíduos e dessas populações
com uma condução norteadora dirigida pelo próprio Estado. Em
1984 a descrição dos uniformes é um exemplo claro de uma estra-
tégia biopolítica, não é apenas sobre o corpo, mas sobre a forma de
pensar também. A instituição de uniformes é marcada por um con-
trole que vai além do próprio corpo. Controla também ações do
indivíduo dentro de um espaço de coletividade através de marcação
sobreposta ao corpo. Para promover o bem-estar coletivo, na visão
do Estado, os indivíduos pagam um preço sobre isto, vivem com
excesso de governamento, entretanto esta ação, segundo Agamben
dilui-se em todos os espaços da vida, e não apenas na ficção.
A questão do vestir-se, de maneira geral, evidencia o
quanto somos controlados e governados, seja pela educação para a
roupa, pelo poder coercitivo das verdades moralizadoras que atra-
vessam nosso corpo ou pelo poder do Estado que transforma a nu-
dez em crime. A independer do motivo, o que salta aos olhos é
aceitação coletiva da roupa como uma necessidade. Por que nos
vestimos? A roupa sobre o corpo marca que vivemos, deste o de-
senvolvimento das diversas fases da Revolução Industrial, um ex-
cesso de obediência. Agamben chama atenção disto como um pro-
blema. Olhamos para a obediência como uma virtude, como tam-
bém é virtuoso falar a verdade e repudiar a mentira, e como é virtu-
oso trabalhar. São todos conceitos que atravessam nossos corpos
para além dos panos que cobrem nossas vergonhas. São verdades
assumidas que nos conduzem a uma obediência inquestionável. Por
que tudo isso?
É interessante, a partir da leitura do pensador italiano, per-
ceber que, especialmente na modernidade, o indivíduo não se cons-
titui sujeito moral por si mesmo ou por rodeios tribais, mas ele o
faz, pela convivência dentro de instituições. O processo de indivi-
dualização foi institucionalizado, como o processo de criação das
roupas, de alimentos, o padrão de consumo, o modo de viver e rela-
cionar-se com o mundo de maneira geral. O padrão coletivo institu-
cionalizado por práticas individuais. Ao citar as sociedades tribais,
a primeira imagem que vem a minha cabeça, são indivíduos nus,
pelados, com tudo a mostra, sem sentir vergonha das “vergonhas
alheias”. O processo histórico não cobre apenas o corpo, mas tam-
bém a moralidade e nos faz obedientes considerando a nudez em
público como feio. Um bom exemplo, para pensar esta questão é a
desobediência proposta pelo grupo contestatório feminista FEMEN.
Para conhecê-lo, ele é um grupo que nasceu na Ucrânia, tem em
seus protestos um grupo de mulheres que chamam a atenção pelas
causas quem protestam nuas ou seminuas, e corpos pintados com
frases de efeito. Surgem como uma forma de transgredir a morali-
dade diante da transgressão sofrida pelo excesso de governamento,
um duplo jogo. O grupo nasce com inspiração ideológica de August
Bebel (1840-1913) que, ainda no século XIX alertava que a luta das
mulheres se faz para além de todo controle político que vivem. O
grupo Femen luta contra assimetrias existentes nas diversas rela-
ções de poder institucionalizadas a partir do próprio corpo nu dian-
te de uma moralidade do pudor. Protestar seminua é um ato de li-
bertação. Nessa lógica, a roupa, marca um controle.
O processo institucionalizado do indivíduo vem carregado
de controle dos desejos. Estratégias de biopolítica determinam um
pensar coletivo sobre o que devemos fazer e aquilo que devemos
repudiar. O sujeito humano, como animal, não nasceu em socieda-
de, nem é grupal e muito menos vestido. O processo histórico, pe-
los mais diferentes fatores, o fizera passar do estágio primitivo para
um estágio grupal, rodeado de um conjunto normativo pautado na
obediência e o processo civilizador diz, vestido. Vestir-se é um
estágio de obediência. Vide a necessidade de uniformes em vários
espaços de convivência. No mundo hodierno não há indivíduo sem
Estado, sem sociedade e ele convive com regras e com vestimentas,
tal qual a Mentira, na fábula judaica ou os habitantes de Oceania. O
tempo inteiro mendigamos o controle do Estado. Mal nascemos e já
somos vestidos para na sequência, através da Certidão de Nasci-
mento, ser apresentados ao Estado como um indivíduo pátrio. Do
nascimento a morte, as ações institucionalizadas do indivíduo acon-
tecem com o aval do Estado. Da certidão de nascimento a certidão
de óbito e devidamente uniformizados. Sepultar um ente nu? Ja-
mais! Ao solicitar o aval o Estado pede-se a ele o exercício do con-
trole sobre a vida e do corpo.
Toda a manutenção da vida é feita às custas de se evitar a
morte. A medicina de nosso tempo é construída por meio de para-
digmas de extensão da vida a fim de burlar a morte. Mas a vida de
uns implica na morte de outros. Isso sempre aconteceu, vide as di-
versas facetas de histórias de governos e imposição de soberania.
Toda política, é um confronto entre o soberano que exerce um po-
der e os cidadãos, que cedem ao soberano o poder de controle sobre
as decisões de seu bem-estar, o poder é uma relação entre seres
livres, mas a manutenção desta liberdade, não é um movimento
leve e tranquilo. É um confronto permanente, Agamben chama esta
composição de Vida Nua. Esta expressão refere-se à experiência de
desproteção e ao estado de ilegalidade de quem é acuado em um
terreno vago, submetido a viver em estado de exceção, nem uma
vida humana, nem uma vida animal, mas uma vida nua, vida a qual
o homem foi reduzido, ou como o autor fala no texto A imanência
absoluta – escrito pela ocasião do falecimento de Gilles Deleuze –,
vida nua e crua como tal. Como uma estrutura de biopoder sobre
ele, nada deixa, senão a vida nua. Tudo é captura, estratégias de
biopoder tomam a vida e a morte como um objeto. Sem liberdade
de ser, vestir ou qualquer outra, tudo capturado e o homem é redu-
zido a uma vida nua. A figura da nudez como contraposto aquilo
que está dado. Mas me preocupa pensar que o estado de exceção,
em nosso tempo, tornou-se a regra, quando penamos pela política
organizacional.
A questão da roupa entra aqui, como uma estratégia de bi-
opolítica para garantir determinas ações do Estado sobre o indiví-
duo que abnegou, em nome de um governante, da própria liberdade
ou do autogovernar-se. Um movimento um tanto paradoxal, onde o
indivíduo é livre, porém sem auto governança. Na medida que ele
abandona o governo de si, para submeter-se ao governo de outrem,
ele cobre suas vergonhas e passa a considerar, aquilo que lhe é na-
tural, um movimento imoral.
A questão da roupa é algo para além do visível. A Verdade
e a Mentira na fábula judaica, se constituem o que são em si, para
além das vestimentas. A Verdade pós-banho, mesmo nua, continua
sendo a verdade. A Mentira, mesmo com as roupas da Verdade,
não se transvestiu com a verdade, mantiveram uma essência. A
Verdade e a Mentira neste caso passaram por um ordenamento mo-
ral, eis o que a indumentária neste caso significa. O peso dos cons-
tructos morais sobre cada qual, a ação moralizadora que determina
também o que é belo e feio. O que é aceitável e o rejeitável. E
transportamos isso também para os tipos de roupas que são ade-
quados ou inadequados a depender do espaço. Algo que está in-
trínseco no visível, mas transcende, tranquilamente esta barreira.
Mas, não ultrapassa o muro do controle. O controle está sempre
presente, como foi descrito no texto de George Orwell.
O controle que existe sobre o que vestir, na obra 1984
marca um controle sobre as ideias, sobre os estratos sociais, sobre
as decisões e os desejos. Romper esta lógica é romper a estabilida-
de que o sistema prega. Romper a lógica de ordenamento das rou-
pas é ir contra uma moralização dada pelo controle perene organi-
zado como uma estratégia de biopolítica.
E aqui fechamos com a reflexão de Agamben, pois vive-
mos hoje em formas de controle e obediência, diferentes da obra de
ficção de Orwell, mas controlados. A roupa, aquilo que está acima
da etiqueta, é um exercício de controle de marca, de argumentos
sociais, de tipos de consumo, de lugares onde a presença pode ser
aceita ou rejeitada. Ações de biopolítica continuam a agir sobre os
corpos que são marcados por macacões atualizados. Mesmo em
ambientes uniformizados, como escolas, pequenos adereços, ou as
mochilas ou ainda os calçados revelam algo sobre os sujeitos. Este
revelar não é algo tranquilo, senão uma manifestação cultural de
um grupo. Pelados, sim, mas ainda nu com as mãos no bolso.
REFERÊNCIAS

AGAMBEN, Giorgio. Il volto. In: Mezzi senza fine. Note Sulla


politica. Bollati Boringhieri: Torino, 1996, p. 74-80.

BARBOSA, Jonnefer F. Vida nua e formas-de-vida: Giorgio


Agamben, leitor das fontes grego romanas. Revista Hypnos, n30,
São Paulo, jan.- jun. 2013, pg. 79-97. Disponível em
http://www.hypnos.org.br/revista/index.php/hypnos/article/viewFil
e/175/177. Acesso em 27.12.2018.

CÔRREA, Murilo Duarte Costa. A vida nua como conceito ético-


político: uma genealogia. pp. 377-381. In: Captura Críptica: direito
política, atualidade. Revista Discente do Curso de Pós-Graduação
em Direito, v.2, n.2, Florianópolis, jan.- jun. 2010. Disponível em
https://www.academia.edu/5159068/A_vida_nua_como_conceito_
%C3%A9tico-pol%C3%ADtico_uma_genealogia. Acesso em
3.01.2019.

FOUCAULT, Michel. Nascimento da biopolítica: Curso dado no


Collège de France (1978-1979). Tradução Eduardo Brandão. São
Paulo: Martins Fontes, 2008.

GIANLUCA SACCO. Da teologia política à teologia econômica.


Roma, Rivista online
Scuola superiore dell’economia e delle finanze, 2004. Tradução
portuguesa de Selvino José Assmann. In: Revista Internacional
Interdisciplinar Interthesis. V.2, n.2, Florianópolis, jul.-dez. 2005.
Disponível em
https://periodicos.ufsc.br/index.php/interthesis/article/view/54686/3
5728. Acesso em 10.12.2018.
Agradeço primeiramente a Deus por seu amor e amparo na
minha vida, à minha querida amiga Emanuella Scoz, pelo convite
para fazer parte deste momento tão importante em sua vida, mas
principalmente por seu carinho, dedicação e paciência ao longo de
todos esses anos, ao meu professor, mentor e amigo, Rafael Haen-
dchen Mendes, bem como à minha amiga Nadine Alves de Siqueira
e à minha irmã Eliane Gorete Martins.

4. A MODA E O COLETIVO, A ROUPA E A


INDIVIDUALIDADE:

Cibele Cristina Martins

Teria a Moda apenas um caráter efêmero, sendo um aglo-


merado de superficialidades, cujo único propósito é levar o indiví-
duo a renunciar a seus recursos financeiros, ou seria o resultado do
todo, estando intrinsicamente ligada à história, à cultura e a socie-
dade?
Vinda da palavra latina modu, podendo ser traduzida como
modo, significando uso, hábito ou costume, a Moda influencia e é,
indubitavelmente, influenciada pelas sociedades e culturas, assim
como a história tem mostrado. Desta forma, Ela é reflexo do meio
no qual está inserida. Podendo-se afirmar que a história se baseia
nos fatos transcorridos ao longo do tempo, enquanto a Moda nos
fala dos indivíduos que construíram essa história.
Sendo o indivíduo o artífice articulador da história, e sendo
a partir dele que a Moda se expressa, escolhendo o vestuário, a
Roupa, como a principal forma de traduzir o meio ao qual pertence,
sua cultura, personalidade e até mesmo seu gênero, é seguro asse-
verar que a Roupa é um símbolo, um ícone, um signo. Para a se-
miótica, que segundo Santaella (2012, p. 19) "é a ciência que tem
por objeto de investigação todas as linguagens possíveis", e que
tem como unidade de expressão o signo, tendo por conceito ser
tudo aquilo que representa algo para alguém, sob quaisquer cir-
cunstâncias ou forma, pode-se dizer que a Roupa é, neste caso, usa-
da como uma forma de linguagem, como um meio de comunicação.
E transpondo este contexto para a Moda, por conseguinte pode-se
afirmar que ela, a Moda, é inicialmente, comunicação.
Sendo a moda símbolo na essência, parece certo
afirmar que a ela se aplica perfeitamente a transfe-
rência de significados, visando à comunicação inte-
grante de sociedades, onde tudo comunica, sendo as-
sim, o vestuário é comunicação. (MIRANDA et al.,
2003, p.3).
Mas a Moda como conhecemos hoje passou por diversas
mudanças, tendo surgido no final da Idade Média e começo da Ida-
de Moderna, segundo Braga (VASONE, 2005, s.p.), na França, em
1492, tem-se a primeira definição da palavra Moda como “maneira
coletiva de vestir” sendo considerada um fenômeno ocidental ad-
vindo do capitalismo, há séculos vem sendo usada como instrumen-
to de distinção, tanto social quanto economicamente. À exemplo da
burguesia, que surge por volta dos séculos XII e XIII, enriqueceu a
partir do comércio e da prestação de serviços, e apesar de possuir
poder monetário, estava ainda muito longe de desfrutar do prestígio
da nobreza, que era a classe social dominante daquela época. Por
esta razão imitava o modo de vestir dos nobres, que logo buscavam
um novo estilo, cujo qual também seria copiado, e assim sucessi-
vamente. Desta forma surge o conceito de sazonalidade, que poste-
riormente viria a ser o marco a partir do qual a Moda é pontuada.
Com a Revolução Francesa, em 1789, começa uma brusca
mudança social, onde a nobreza é deposta e a burguesia ascende,
sendo ela agora a detentora do prestígio e poder. E com essa trans-
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formação da sociedade o conceito de Moda também começa a mu-
dar, ou seja Ela, como uma forma de comunicação, e sendo em si, a
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mudança, passa a ser sistematizada e organizada a partir de ciclos
sazonais, modelo iniciado com Charles Frederick Worth, que cria
em 1858 um diferencial para a Roupa: a assinatura. A Roupa passa
a ser difundida a partir de desfiles, dando início à Haute Couture,
ou a Alta Costura, recebendo ele o título de pai dela.
A Haute Couture é um termo patenteado internacionalmen-
te. Em 1868 foi criado O Sindicato da Alta Costura em Paris, com a
principal função de preservar técnicas artesanais de corte e costura,
onde as peças são confeccionadas sob medida, modeladas a partir
da técnica da moulage e costuradas a mão. Um modelo bastante
elitista, pois, apenas pessoas com grandes fortunas, ou muita noto-
riedade, de preferência ambas, tinham acesso a ele.
Perdurando por pouco mais de um século, a Haute Couture
tinha além de Worth, com o espartilho e a silhueta em S, Paul Poi-
ret, que além de libertar a mulher da repressão do espartilho, de-
terminando a silhueta feminina no século XX, mas travando suas
pernas com a famosa saia entraveé, inicia o conceito da criação a
partir de inspiração dada por um tema. Gabrielle "Coco" Chanel,
com o tailleur, Elsa Schiaparelli, com o chapéu em forma de sapato
e o vestido esqueleto, sendo ela a primeira a desenvolver coleções,
propriamente ditas, com temas específicos. Dior com as linhas H, Y
e A, mais conhecidas como New Look e Yves Saint Laurent com o
smoking feminino, como seus principais representantes.
Até então a Moda só poderia ser acessada por indivíduos do
mais alto escalão social, mas com a Revolução Industrial ocorrida
na Inglaterra em meados do século XVIII, a invenção da máquina
de costura, no século XIX, entre outros, o acesso à maiores e me-
lhores recursos, como tecidos e insumos se simplifica, facilitando a
confecção de diversos produtos, dentre eles a Roupa.
Mas foi apenas em 1949, justamente após o fim da Segunda
Guerra Mundial, com o estilista francês J. C. Weill, que para desas-
sociar a maneira elitista com que a confecção era vista, ligando seu
uso ao cotidiano, nasce o Prêt-à-porter, ou o pronto para vestir, que
se constitui da produção em série, em escala industrial da Roupa.
Embora, neste momento, ainda não possua caráter de Moda, este é
o começo da mudança, e o início de uma nova Era para a Moda: a
sua democratização. A partir da qual podemos perceber uma nova
perspectiva do relacionamento entre a Roupa e o indivíduo. E den-
tro deste novo contexto, a Roupa passa a não apenas diferenciar
classes sociais ou culturas, mas também a comunicar a própria in-
dividualidade do ser.
Pouco mais de oito anos após a sua criação, mais precisa-
mente em 1957 ocorre o primeiro salão de Prêt-à-porter, em Paris,
neste momento a Moda entra em cena, se aliando ao Prêt-à-porter,
por meio de uma nova geração de estilistas, unidos para trazer valor
estético aos produtos. Dá-se início ao conceito da Moda aberta,
onde ela começa a ser acessada pelo cidadão comum, a partir da
criação de coleções sazonais, a princípio, uma para o verão, e outra
para o inverno.
Os signos efêmeros e estéticos da moda deixaram de
aparecer nas classes populares, como um fenômeno
inacessível reservado aos outros, tornaram-se uma
exigência de massa, um cenário de vida decorrente
de uma sociedade que sacraliza a mudança, o prazer,
as novidades. A era do prêt-à-porter coincide com a
emergência de uma sociedade cada vez mais voltada
para o presente, euforizada pelo Novo e pelo consu-
mo. (Lipovetsky, 2003, p. 115).
A partir de 1960, com boa parte dos filhos do pós-guerra, os
Baby Boomers, e seu desejo inato de mudar o mundo, que, então,
estão entrando no mercado de trabalho, começa uma nova mudança
social, que embora burguesa, faz com que o poder econômico deixe
de ser o único pilar de sustentação, dividindo espaço com o poder
cultural. Ou seja, não basta mais ter, é preciso ser. Assim o mundo,
e tudo aquilo que o cerca, comece a acelerar, com isso, na década
de 1990, surge um novo conceito de Moda, o Fast Fashion, ou,
moda rápida, criado por grandes marcas como uma estratégia co-
mercial, vinculada, principalmente, às grandes lojas de departamen-
tos, permite a rápida disseminação de tendências e estilos a partir
de vários meios de comunicação, encurtando a sua sazonalidade e
dando assim acesso a seus produtos aos consumidores à um preço
muito mais módico.
Fast Fashion é uma tendência industrial que foca na
praticidade. Refere-se ao conceito de encurtar o pra-
zo de entrega (produção, distribuição etc.) oferecen-
do novos produtos ao mercado o mais rápido possí-
vel. Hoje em dia, esse fenômeno é comumente ado-
tado no vestuário de moda (por marcas como Zara,
Topshop, H & M, etc.), assim como em eletrônicas
de consumo fashion (por exemplo, iphone). (CHOI,
2014, p. 18, TRADUÇÃO NOSSA).
A partir do final dos anos 1960, com as missões espaciais e
a implantação de um sistema de satélites para o monitoramento da
Terra à distância, sendo possível observar seus vários processos
atmosféricos e climáticos, a humanidade pôde permitir-se uma me-
lhor compreensão da dinâmica terrestre, nascendo assim a necessi-
dade da criação de um programa de conservação ambiental, a partir
do conceito de sustentabilidade. Desta forma, com o passar do tem-
po e este conceito sendo amplamente difundido, e inspirando-se em
outra área de atuação, o slow food em oposição ao fast food (FLE-
TCHER; GROSE, 2011, p. 129, tradução nossa), surge, em 2004 o
Slow Fashion, o mesmo que moda lenta, denominado assim por
Angela Murrills, com o intuito de opor-se ao consumo excessivo e
o descarte rápido do Fast Fashion, defendendo a ideia de uma mo-
da sustentável e consciente, a partir de um consumo mais responsá-
vel e moderado, com peças mais duradouras e versáteis, trocando a
quantidade pela qualidade, aumentando sua sazonalidade.
Slow Fashion representa uma descontinuidade evi-
dente com as práticas atuais do setor, uma ruptura
dos valores e objetivos do Fast Fashion (baseada em
crescimento). É uma visão do setor da moda alicer-
çada a partir de um ponto de partida fundamental-
mente diferente. (FLETCHER; GROSE, 2011, p.
129, TRADUÇÃO NOSSA).
Como visto ao longo da sua trajetória e apesar do seu cará-
ter efêmero, pode-se afirmar que a Moda está longe de ser superfi-
cial. Tendo no indivíduo o seu artífice, e ocorrendo a partir dele as
mudanças, tanto sociais, quanto culturais, e sendo o vestuário, a
partir da Roupa, o seu principal signo e sua principal forma de co-
municação e difusão, ela é marcada por um sistema sazonal e cícli-
co, que move a economia e pontua a história, sendo um reflexo do
meio no qual está inserida.
REFERÊNCIAS

CHOI, Tsan-Ming. Fast fashion systems. Theories and applications.


London: Taylor & Francis Group, 2014.

FLETCHER, Kate; GROSE, Lynda. Fashion & Sustainability. De-


sign For Change. London: Laurence King, 2012.

LIPOVETSKY, Giles. O Império do Efêmero: a moda e seus desti-


nos nas sociedades modernas. Tradução de Maria Lúcia Machado.
1ª. Ed., 6ª. Reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

MIRANDA, Ana Paula Celso de et al. Influenciadores e hábitos de


mídia no do consumo de moda. ECA. Universidade de São Paulo:
São Paulo, [s.d]. Disponível em
http://www.eca.usp.br/associa/alaic/chile2000/13%20GT%202000
ComPublicitaria/Anapaulacelso.doc. Acesso em 01/04/2019.

SANTAELLA, L. Leitura de imagens: como eu ensino. São Paulo:


Melhoramentos, 2012.

VASONE, Carolina. "Estar na moda é não estar na moda", diz o


historiador de moda João Braga”. 2005. Disponível em
https://mulher.uol.com.br/moda/noticias/redacao/2005/11/12/estar-
na-moda-e-nao-estar-na-moda-diz-o-historiador-de-moda-joao-
braga.htm?cmpid=copiaecola. Acesso em 19/02/2019.
5. ROUPA PARA MODA “SEM GÊNERO”?
Tatiane Melissa Scoz

Nesse texto pretendo colaborar com a discussão empreendida


nesse livro sobre a Roupa, tratando de uma questão mais específica
que é sobre o que vem sendo chamada de moda “sem gênero”. O
que é gênero? Como a ideia de moda “sem gênero” tem sido signi-
ficada pelos profissionais da moda e estudiosos do tema? É possí-
vel a existência do “sem gênero”? Gênero neutro e “sem gênero”
são a mesma coisa? Essas são algumas questões norteadoras que
irão acompanhar o leitor nas reflexões que seguem.
Viver em sociedade significa, entre outras coisas, comparti-
lhar cultura. A cultura é constituída por regras, hábitos, costumes,
valores morais, etc. O conteúdo disso varia conforme os contextos
sociais e os períodos históricos. As expressões culturais influenci-
am as visões de mundo e os comportamentos das pessoas. Muitas
vezes, as pessoas naturalizam elementos culturais, ou seja, os con-
sideram naturais, pois raramente questionam por que as coisas são
como são. Dito de outro modo, geralmente, as pessoas não perce-
bem que as regras, os hábitos, os costumes, os valores, os compor-
tamentos que possuem, são construídos pela sociedade e apreendi-
dos pelos indivíduos desde a infância, de acordo com o meio social
em que vivem (LARAIA, 2001).
As noções do que é tido por feminino e masculino são um
exemplo de elementos culturais cujos significados foram elabora-
dos ao longo da história. Tais significados se transformaram ao
longo do tempo, mas foi preservada essa distinção binária para de-
signar homem/macho e mulher/fêmea. Geralmente, as característi-
cas e os papéis sociais atribuídos ao que se entende por feminino e
masculino são considerados como naturais, no entanto, são constru-
ídos socialmente. Essas são constatações obtidas a partir de pesqui-
sas realizadas no campo das Ciências Humanas e que se dedicam a
estudar as implicações sobre gênero na sociedade. Algumas impor-
tantes contribuições para a construção de um campo de estudos de
gênero marcaram época, tais como os trabalhos de Margareth Mead
(1935), Simone de Beauvoir (1980, publicado pela primeira vez em
1949), Gayle Rubin (1975), Joan Scott (1986), Judith Butler
(1999).
Os estudos de Butler se tornaram referência para as pesquisas
na área, e são bastante utilizados para fundamentar a proposta do
que tem sido chamado de “moda sem gênero”, que será debatido no
próximo tópico. Por esse motivo, é importante apresentar aqui,
mesmo que brevemente, as análises da autora sobre gênero.
As reflexões de Butler sobre gênero perpassam a noção de
sexo biológico. Butler (2013) questiona a ideia já estabelecida de
que o sexo é dado biologicamente, definindo se alguém é homem
ou mulher, e de que o gênero é o que possui dimensão cultural.
Para ela, o sexo não pode ser compreendido como sendo natural ou
definido biologicamente, pois tanto o sexo como o gênero são cons-
truídos socialmente, e a classificação binária masculino/feminino
ou macho/fêmea também.
Ocorre que, em nossa sociedade, é feita a distinção masculino
e feminino que caracteriza os corpos em um ou outro. Tal distinção
é determinada por causa de um discurso que entende o sexo como
biológico, natural. Dessa forma, existem normas que imperam co-
mo padrões, definindo os corpos tal como as pessoas aprendem
como sendo homem ou mulher. Aqueles que fogem ou não se reco-
nhecem nessas normas, são discriminados, colocados à margem
como pessoas que não se “encaixam”. Como bem argumenta Butler
em uma entrevista concedida à revista Le Nouvel Observateur, e
republicada paragratuita
Versão o português na revista Geledés (2015), pesam so-
bre nós as normas heterossexuais, que
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de nossos pais, nós as perpetuamos a partir de nossos
fantasmas e nossas escolhas de vida. As normas nos
dizem o que devemos fazer para ser um homem ou
uma mulher. (GELEDÉS, 2001, p.01).

Nesse sentido, somos socializados nessas normas, pois elas


estão presentes nos contextos sociais que partilhamos. E é a partir
da interpretação da nossa cultura que definimos o que é ou não na-
tural (BUTLER, 2013).
Nesse aspecto reside uma das grandes contribuições de Butler
ao propor pensar o sexo e o gênero como performativos e produzi-
dos discursivamente. Com isso, a autora mostra que é possível ou-
tras formas de identificação para além da lógica binária “masculino
e feminino” tão consolidada como padrão na sociedade. Nos pará-
grafos que seguem busco explicar esse raciocínio.
A argumentação de que o sexo e o gênero são produzidos
discursivamente quer dizer que eles são efeitos do discurso. Ou
seja, os corpos são interpretados por meio de significados culturais.
Por exemplo, o bebê ao nascer, ou durante a gestação, é definido
como sendo menino ou menina a partir do órgão sexual que possui.
O discurso cultural em nossa sociedade define caraterísticas do que
é ser menino ou menina que vão desde as brincadeiras, as cores das
Roupas, ao que é permitido ou não fazer. Quem essa criança se
tornará ou desejará ser é um efeito desse discurso construído
(FIRMINO e PORCHAT, 2017).
Tendo em vista que a norma admitida socialmente como pa-
drão, portanto, a “correta”, é ser homem ou mulher, a expectativa
em torno da criança é a de que ela internalize e represente os com-
portamentos e a maneira de ser homem ou mulher. Não “só” isso, a
expectativa social é a de que se o corpo possui vagina, desempe-
nhará o papel social de mulher, e se possui pênis desempenhará o
papel social de homem. Segundo Butler (2013, p.37) “as pessoas só
se tornam inteligíveis ao adquirir seu gênero em conformidade com
padrões reconhecíveis de inteligibilidade de gênero”. Por “gêneros
inteligíveis” a autora se refere àqueles que estão em conformidade
com a norma padrão instituída de sexo, gênero, prática sexual e
desejo.
Ocorrem casos em que a criança não se identifica com o pa-
pel social atribuído de acordo com seu órgão genital. Por exemplo,
crianças que nasceram com uma vagina, possuem os demais atribu-
tos físicos reconhecidos como femininos, são tratadas como meni-
nas, mas se identificam com o papel social masculino. Dessas cri-
anças, aquelas que conseguem agir e se vestir como menino, assu-
mindo, assim, uma identidade de gênero masculina, que é diferente
de seu sexo biológico - definido pela sociedade como feminino -,
continuam sendo classificadas em um gênero inteligível, porque é
um dos gêneros aceitos como norma, nesse caso, o masculino. Po-
rém, por causa dos significados culturais da nossa sociedade, essas
crianças podem ser descriminadas, sofrer todo tipo de violência,
porque sua identidade não corresponde ao sexo.
Pela possibilidade de sujeitos serem identificados como ho-
mem ou mulher a partir do modo como se comportam e estão ves-
tidos, mesmo quando o sexo que possuem não corresponde à apa-
rência, como no caso da travesti, Butler argumenta que gênero não
é algo somos, e sim algo que fazemos, por isso é performativo. Por
exemplo,
Tanto a travesti quanto a mulher desempenham atos
que tem como efeito a produção de uma identidade
considerada feminina. Em vez de ser uma cópia ou
imitação da mulher original, a travesti ou a drag, ao
revelar o caráter da performatividade do gênero em
seus atos, gestos e atuações apontam para o fato de
que também a mulher dita original tem sua identida-
de produzida pela repetição estilizada desses mes-
mos atos, gestos e atuações, considerados em nossa
cultura como femininos. Assim, a existência de um
“ser” que descontinua a sequência habitual entre se-
xo anatômico e gênero aponta a descontinuidade que
há na aparente unidade e solidez da mulher original:
os elementos de sua identidade contínua – sexo e gê-
nero – passam a ser vistos como separados: o sexo
não necessariamente determina o gênero e, assim
como a drag ou a travesti, a mulher “de verdade”
precisou tornar-se mulher, em um processo que nada
tem de natural e automático. A inscrição de signos
de feminilidade se fez por um esforço normatizante
no contexto da heterossexualidade compulsória e sua
compulsão por binarismos. (FIRMINO e POR-
CHAT, 2017, p. 58-59).

As identidades de gênero acontecem e são formadas a partir


de atos realizados repetidamente, culturalmente significados como
masculinos e femininos. Tal realização repetida de atos implica que
gênero é algo que fazemos, portanto é performativo, e não se pode
dizer que ele é decorrente de um sexo. Se gênero não decorre do
sexo, “homem e masculino podem, com igual facilidade, significar
tanto um corpo feminino como um masculino, e mulher e feminino
tanto um corpo masculino como um feminino” (BUTLER, 2013, p.
25, GRIFOS DA AUTORA).
Dessa forma, a produção de outras identidades de gêneros é
possível. Mas, para tanto, é preciso subverter a norma da heterosse-
xualidade. Vejamos: conforme explicado anteriormente, gêneros
são construídos no seio de uma cultura que compreende que o sexo
é biológico e que o gênero é derivado desse sexo. Nessa cultura, a
norma é a heterossexualidade, e os gêneros são masculino e femi-
nino. Logo, as concepções de gênero passarão por essa norma. Se-
gundo Butler (2013, p. 28) há limites estabelecidos “sempre nos
termos de um discurso cultural hegemônico, baseado em estruturas
binárias que se apresentam como a linguagem da racionalidade
universal”. Assim, algumas identidades de gênero que não se con-
formam às normas hegemônicas, acabam por serem classificadas
como algo que está “errado”. Entretanto, argumenta Butler (idem,
p. 39), a persistência e proliferação dessas identidades de gênero
“criam oportunidades críticas de expor os limites e os objetivos
reguladores desse campo de inteligibilidade e, consequentemente,
de disseminar, nos próprios termos dessa matriz de inteligibilidade,
matrizes rivais e subversivas de desordem do gênero”. Podemos
entender, então, que, segundo Butler, a subversão ao dualismo se-
xual é possível, mas deve ocorrer no interior da própria norma. Isso
não quer dizer que essa subversão implique na anulação do gênero
ou na sua falta. Butler (2015, p. 02) explica: “eu nunca pensei que
precisaríamos de um mundo sem gênero (...) nós não podemos ig-
norar a sedimentação das normas sexuais”. E continua ao concluir
que “Nós precisamos de normas para que o mundo funcione, mas
nós podemos procurar aquelas que melhor nos sirvam”. Nesse sen-
tido, reside a ideia de subversão às normas hegemônicas de identi-
dades de gênero.
Vimos até aqui as percepções de sexo e gênero segundo Ju-
dith Butler, e como a autora analisa a possibilidade de subversão à
norma de gênero instituída. Passaremos agora a analisar o que vem
sendo chamado de “moda sem gênero”, para compreender o que se
entende por “sem gênero” e como as propostas de Roupa para essa
moda são relacionadas por alguns pesquisadores aos estudos de
Butler sobre gênero.

5.1 ROUPA E MODA “SEM GÊNERO”

Ao longo da história, a sociedade passou a representar as di-


ferenças binárias de gênero também a partir da Roupa. Como o
leitor pode perceber
Versão neste livro, Roupas para homens e para mulhe-
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res receberam, e ainda recebem características diferentes relativas
aos valores sociais
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no. Já estudamos um pouco sobre essa diferenciação quando fala-
mos sobre o gênero enquanto uma construção social.
As Roupas, os acessórios, enfim, o conjunto de elementos
que formam a vestimenta. Segundo Santos (2018), são marcadores
identitários. Eles são “modos de produzir-se, marcar-se e distin-
guir-se no espaço social. Nesse caso, há um conjunto de modos e
maneiras, Roupas, acessórios e mudanças corporais que, quando
unidas e de alguma maneira visibilizadas, são tratadas por ‘moda’”
(idem, p.22).
Filho (2015) diz que a moda pode ser entendida como um sis-
tema e como um fenômeno. Como um sistema porque compõe uma
cadeia criativa, produtiva e comunicacional. E como fenômeno
porque compreende a “circulação de produtos e serviços no meio
social e cultural, criando cadeias de significados” (idem p. 04).
Grossi e Santos (2017, p. 242) buscam pensar a moda como lingua-
gem, “como um discurso que se materializa nos corpos, uma co-
municação que extrapola a pessoa mesma num misto de subjetivi-
dade e movimento coletivo”.
As noções de moda apresentadas acima trazem perspectivas
diferentes, mas parecem concordar num aspecto: o da moda como
comunicação e produtora de significados. A moda é elaborada pela
cultura, mas também reflete e reproduz elementos culturais. Logo,
numa cultura em que há normas de gênero instituídas como pa-
drões, a moda reproduzirá tais padrões. Entretanto, quando esses
padrões são questionados, a moda pode também ser um meio de
tentar repensá-los.
Para Filho (2015), a moda faz gênero e o gênero faz moda.
Segundo o autor (idem, p. 02), “falar de uma Roupa sem gênero
pressupõe a desconstrução de ideias e ideais marcadamente hetero-
centrados, que afetam de alguma forma, a maneira pelas quais os
indivíduos devem se comportar, que tipo de Roupas devem usar em
cada ocasião e, até mesmo, para onde devem direcionar os seus
desejos”. Para o autor, a Roupa “sem gênero” pode ser um meio de
desconstrução da norma heterossexual que limita gênero a masculi-
no e feminino. Mas quando o autor considera que a moda faz gêne-
ro, e o gênero faz a moda, como é possível a existência de Roupa
“sem gênero”, visto que a Roupa é um dos elementos da moda? O
objetivo aqui é trazer reflexões sobre o que tem sido chamado de
moda “sem gênero”, possivelmente não haverá respostas para todas
as perguntas.
A ideia de moda “sem gênero” é recente, e parece não haver
um consenso sobre seu significado. Há estudos, como o de Pereira
e Freitas (2017), que designam a moda “sem gênero” como “agêne-
ro”, ou “gênero neutro”. Segundo os autores,
[...] esta proposta pode ser entendida como a criação
de uma terceira categoria unissex ou ainda, como a
unificação do masculino e feminino. Para se encai-
xar na categoria, o produto deve possuir uma lingua-
gem na qual dificilmente se identifiquem caracterís-
ticas de um único gênero, e principalmente, que es-
sas peças possam ser usadas por pessoas de todos os
gêneros e orientações sexuais” (IDEM, p. 02).

Nessa definição, moda “sem gênero” seria aquela que busca a


unificação dos gêneros masculino e feminino, de modo que não
seja possível identificar as características de um único gênero, e as
Roupas poderiam ser usadas por pessoas com as mais diversas
identidades de gênero.
Em outro estudo (PORTINARI, COUTINHO e OLIVEIRA,
2018), encontramos os termos “plurissex”, “genderless”, “gender-
bender”, “agênero” para se referir à moda “sem gênero”. De acordo
com as autoras, é uma proposta “que pretende se desvincular de
estereótipos sociais sobre masculino e feminino, vestindo homens e
mulheres de forma igual, de modo que dificilmente serão identifi-
cáveis pelos marcadores normatizados de gênero (idem, p. 145 –
146).
Aqui, os autores relacionam moda “sem gênero” com a pro-
posta de desvincular estereótipos, vestir de forma igual. Tal como
na definição de moda “sem gênero” do estudo de Pereira e Freitas,
nesse também aparece a ideia de Roupas sem marcadores de gêne-
ro.
O trabalho de Perlin e Kistmann (2018, p. 10) traz percepção
semelhante sobre a ideia de moda “sem gênero”. Segundo as auto-
ras, “a moda sem gênero questiona as imposições de cores, formas,
modelagens, modelos e estruturas das Roupas como determinadas
pelos sexos, e estimula a mistura e o uso desprendido das peças”.
As autoras refletem sobre o conceito do “sem gênero”, argumen-
tando que
[...] refere-se a uma privação do gênero, o que é
alheio a esse. O prefixo a- em agênero sugere um
afastamento, um estranhamento [...] Portanto, o
“sem” gênero não precisa ser uma negação, necessa-
riamente, ele condiz com a neutralidade e pode ex-
pressar os anseios de pessoas que não se identificam
com gênero algum e de todas as outras multiplicida-
des como o transgênero, o andrógino, o queer, o
pangênero, masculino, feminino, etc. (IDEM)

Nesse sentido, para as autoras, moda “sem gênero” não tem a


ver, necessariamente, com a negação ou inexistência do gênero,
mas sim com a ideia de neutralidade do gênero, e com a tentativa
de atender todas as pessoas que não se identificam com nenhum
gênero.
A partir dos estudos de Butler, podemos inferir que sempre
haverá algum gênero que fará parte da identidade do sujeito, pois o
gênero é uma construção cultural que é elaborada no seio de uma
sociedade que identifica o sujeito dessa forma. O que pode aconte-
cer é haver outras identidades de gênero que não as já instituídas
como padrão.
Outra questão que aprece como relevante nas definições de
moda “sem gênero” apresentadas até aqui é a ideia de gênero neu-
tro ou neutralidade do gênero. Além dos estudos citados acima,
essa ideia está presente em Basso (2016), Schneid e Barreto (2017),
e em reportagens como a de Albuquerque e Turci (2017), para citar
alguns.
Como bem coloca Zambrini (2016), a ideia de neutralidade já
foi bastante discutida e criticada no campo das ciências humanas,
incluindo aí os estudos de gênero. Segundo a autora,
Do ponto de vista sociológico, as práticas do vestir
podem ser entendidas como práticas culturais. Por-
tanto, o design e a moda envolvem comunicar certo
olhar sobre o mundo. No entanto, esse olhar não é
neutro nem abstrato, porque qualquer objeto projeta-
do é inserido no contexto social cheio de valores e
história. As Roupas têm cargas simbólicas e repre-
sentações de gênero construídas historicamente e se
referem a um conjunto de crenças sobre o feminino e
o masculino. Como a maioria dos campos sociais, o
campo da moda tem uma herança histórica e cultu-
ral” (IDEM, p. 55).

A partir da interpretação da cultura damos significados tam-


bém às identidades de gênero, assim, não há neutralidade possível.
A noção de uma identidade “sem gênero” é imbuída de significa-
dos, e isso não é neutro. Para Zambrini (2016, p. 59), “um dos mai-
ores desafios atuais para o campo do design é superar os discursos
e legados do movimento moderno e o pensamento binário sem re-
cair em uma reprodução da falsa neutralidade”, pois a moda é im-
buída de significados culturais. Sendo assim, é possível a prática e
a produção de uma moda “sem gênero”, conforme a definição desse
termo dada pelos autores acima?
Passaremos agora a conhecer algumas marcas que apostaram
na ideia de moda “sem gênero” e se, de modo geral, elas alcançam
essa proposta.
Existem muitas propostas de moda “sem gênero”, elaboradas
por algumas marcas e estilistas. Portinari, Coutinho e Oliveira
(2018) mencionam que foi a partir do trabalho de Alessandro Mi-
chele, para o desfile da grife italiana Gucci, que se propagou a ideia
de moda “sem gênero” para outras campanhas publicitárias e edito-
riais de revistas, como Vogue, Elle Magazine, Harper’s Bazaar, W
Magazine e InStyle. Essa tendência foi seguida por coleções de
etilistas como a inglesa Vivienne Westwood, e grifes como Given-
chy. No Brasil, dentre outros, podem ser citados os trabalhos dos
estilistas Alexandre Herchcovitch e João Pimenta.
Schneid e Barreto (2017, p. 11) apontam que

Umas das primeiras ações impactantes acerca da


moda sem gênero aconteceu na semana de moda de
Londres – Inverno 2013, quando o estilista Jonathan
Anderson desfilou homens de vestidos, tops e shorts
de lã com babados [...]. Depois disso, o debate acer-
ca da divisão entre masculino e feminino explodiu
no circuito da moda. Uma das primeiras ações que
atingiram diretamente o público foi realizada no
primeiro semestre de 2015, pela multimarca londrina
Selfridges. A loja dedicou uma seção inteira à moda
chamada de Agender (termo em inglês para “sem
gênero”), nela não havia distinção entre Roupas
masculinas ou femininas. Nas passarelas o movi-
mento apareceu em desfiles de grandes marcas como
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Giorgio Armani, Givenchy, Gucci e Prada, onde fo-
ram apresentados homens e mulheres vestidos de
forma bem semelhante, independentemente da de-
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de gênero do naevento
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em questão.
(SCHNEID E BARRETO, 2017, p.11).

Em relação ao que Schneid e Barreto (2017) chamam de fast


fashion, as autoras mencionam que a rede Zara foi uma das primei-
ras do segmento com proposta de moda “sem gênero”, com o lan-
çamento da linha “genderless”. No entanto, desagradou clientes e
houve críticas à proposta da marca, porque “as Roupas eram apenas
moletons, camisetas e calças jeans - peças há anos usadas por ho-
mens e mulheres. Neste caso não houve novidade para a moda sem
gênero, foi apenas o uso inadequado de um termo para fins de mar-
keting” (IDEM, p.11).
Outra marca que apostou na ideia de moda “sem gênero” foi
a PANGEA, para seus criadores Nilo Lima e Yágda Hissa, “quem
usa a peça é quem dita qual gênero ela terá. O objetivo é que elas
não tragam modelagens trabalhadas para vestir melhor em corpos
femininos ou corpos masculinos, que ela seja uma modelagem feita
para todos os tipos de corpos” (ALBUQUERQUE e TURCI, 2017,
p. 01). Além dessa, outras marcas brasileiras como Beira, Another
Place, LED, Bem e Ocksa procuram desenvolver a proposta de
moda “sem gênero” (PERLIN e KISTMANN, 2018). É provável
que existam outros estilistas e outras marcas produzindo a ideia de
moda “sem gênero”, mas o objetivo aqui é apresentar algumas para
que tenhamos uma noção do que tem sido desenvolvido até o mo-
mento.
De modo geral, há muitas críticas sobre o sucesso na aplica-
ção da proposta “sem gênero” na produção e design de Roupas tan-
to para a moda que acontece nas passarelas de grandes desfiles,
como para a moda vendida pelas chamadas fast fashion. Nesse as-
pecto, Sampaio e Araújo (2016, p. 03 - 04) argumentam que as
Roupas produzidas com foco na moda “sem gênero”, em sua maio-
ria, são “Roupas sem modelagem, sem estampas e com cores neu-
tras, cores estas que na maior parte das vezes compõem tanto cole-
ções especificamente femininas como coleções especificamente
masculinas”. As autoras também explicam que as lojas de departa-
mentos brasileiras não eliminaram as seções masculina e feminina,
apenas acrescentaram as Roupas da proposta “sem gênero” no de-
partamento. Isso demonstra a dificuldade que muitas marcas possu-
em em compreender o que é moda “sem gênero”. Talvez, isso pode
acontecer pelo fato de não haver um conceito que seja consensual
sobre essa ideia, ou ainda, por não haver um entendimento mais
elaborado sobre gênero.
Sampaio e Araújo (2016) questionam:

Promover uma coleção de Roupas em cores neutras


seria construir moda além dos gêneros? Ou seria
buscar dentre preferências medianas uma forma de
harmonizar as preferências entre todas as pessoas?
Até que ponto abrir uma terceira seção nas lojas de
departamento pode ser considerada uma maneira de
quebrar padrões impostos? (SAMPAIO E
ARAÚJO, 2016, p. 03 - 04)

São questões bastante relevantes que, de certa forma, as auto-


ras também respondem. Para elas, não se atende a proposta de mo-
da “sem gênero” quando se propõe a “acreditar que a adoção das
cores neutras e da quebra da silhueta seja por si só uma maneira de
promover condições para as pessoas transitarem confortavelmente
entre as categorias existentes” (SAMPAIO e ARAÚJO, 2016, p. 03
- 04). Ainda segundo as autoras, as Roupas pensadas dessa forma
não atendem as diferenças presentes na diversidade social.
Perlin e Kistmann (2018, p. 10) fazem uma observação seme-
lhante quando afirmam que, no tocante à moda “sem gênero”, “a
maioria das Roupas é desenvolvida seguindo uma modelagem, em
geral, oversized, que pode ser única para os diferentes corpos, ou
com peças iguais”. Para as autoras, há desconhecimento por parte
também de blogs e revistas ou uma noção distorcida dessa proposta
de moda, porque sugerem que mulheres usando camisetas masculi-
nas e homens usando calças skinny femininas estariam de acordo
com a moda “sem gênero”, e não concebem a ideia de Roupas que
se modelem a cada tipo de corpo nem promovem a subversão das
normas binárias de sexo/gênero vigentes.
Assim, cabe questionarmos se a denominação de moda “sem
gênero” é a mais adequada para designar uma proposta que busca a
ruptura do binarismo de gênero normativo. Portinari, Coutinho e
Oliveira (2018, p. 154) levantam reflexões nesse aspecto, elas se
perguntam “em que medida a Moda pode ser desviante em relação
a norma? Até que ponto consegue efetivamente atuar como crítica
ou desconstrução da normatividade?”. As autoras também questio-
nam se a ideia de moda “sem gênero” não seria “mais uma ação
mercadológica da indústria, visando oferecer aos consumidores
uma oferta mais abrangente de escolhas como forma de ampliar as
possibilidades de mercado” (IDEM) servindo, portanto, aos interes-
ses da indústria da moda que se apropriou das reflexões de gênero.
Há tentativas de alguns estilistas em conceituar as Roupas
com outras significações do que seja masculino e feminino. Ou
seja, rompem os padrões do que está estabelecido no imaginário
social como Roupas de homem e de mulher, mas continuam vestin-
do corpos que são entendidos pela sociedade como masculino e
feminino, e chamam isso de moda “sem gênero”. Parece, assim,
que não quebram os padrões de gênero dominante. Pois, a estética
do corpo masculino continua sendo vista como tal, se modificam
apenas as Roupas que o vestem e que irão ser incorporados à ideia
de masculino, e ele se aplica ao feminino.
Sempre haverá um conjunto de significados atribuídos à
Roupa e aos corpos que elas vestem. Conforme Arcoverde (2015),
a Roupa pode funcionar como mecanismo de subversão, mas ela

Serve também (e talvez ainda com maior destaque)


ao propósito da manutenção da cultura dominante –
a aparente. Desde seu surgimento como o fenômeno
ao qual nos referimos hoje, a moda produz e repro-
duz discursos indumentários alinhados aos valores
morais, culturais e políticos de sua época (IDEM, p.
06)

Assim, é difícil pensar em uma categoria de existência “sem”


gênero. Talvez, o que seja possível é a construção social de outros
gêneros além do feminino e masculino, mas isso não faz do gênero
um “sem”, um “agênero”, ou algo neutro. Retomando Butler
(2013), a identificação das pessoas pelo gênero acontece conforme
os padrões reconhecíveis de inteligibilidade de gênero presentes na
sociedade. Para que sejam possíveis outras identidades de gênero
para além do feminino e masculino, é preciso subverter a norma da
heterossexualidade, mas isso não implica na anulação do gênero ou
na sua falta, implica na construção de outros gêneros. Nesse senti-
do, conforme já argumentado, é possível que haja sempre alguma
identidade de gênero.
Muitos estudos sobre moda “sem gênero” introduzem o con-
ceito de gênero utilizando as reflexões de Butler, mas seguem a
defender a proposta de moda “sem gênero”. Diante do exposto
acima, isso parece ser contraditório. Basso (2016, p. 57) sugere que
a moda “sem gênero” deveria ser renomeada por moda democrática
ou inclusiva, “em que os mesmos que estão sendo representados e
que sofrem preconceito, tenham oportunidade de trabalho, sendo à
frente da marca, ou na construção do vestuário”. A autora também
argumenta que a proposta de criar a ruptura no padrão binário de
gênero deve ir além da produção de Roupas, deve compreender
todo o sistema de mercado, caso contrário, essa proposta não será
bem-sucedida.
Apesar das dificuldades de compreensão das reflexões sobre
gênero e das tentativas não muito bem-sucedidas de produção de
Roupas para a denominada moda “sem gênero, o campo da moda
trouxe o debate sobre a construção de diferentes identidades de
gênero e da necessidade de buscar atendê-las a partir da demanda
de mercado.
Iniciamos esse texto com algumas perguntas, também termi-
narei dessa maneira. O capitalismo absorveu mais um ativismo so-
cial, mas será que as minorias não devem se ver representadas nas
lojas de vestuário também? Como romper ou transgredir padrões de
gênero sem também tomar esses espaços?
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