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FILOSOFIA

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

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EXPEDIENTE

DIREÇÃO UNICESUMAR
Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor de Administração
Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva
Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi

NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


Diretoria Executiva Chrystiano Mincoff, James Prestes, Tiago Stachon Diretoria de Design Educacio-
nal Débora Leite Diretoria de Graduação Kátia Coelho Diretoria de Pós-Graduação Bruno do Val
Jorge Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane
Yoshie Fukushima Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de
Curadoria Carolina Abdalla Normann de Freitas Gerência de Contratos e Operações Jislaine Cristina
da Silva Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais
Daniel Fuverki Hey Supervisora de Projetos Especiais Yasminn Talyta Tavares Zagonel

FICHA CATALOGRÁFICA
Coordenador(a) de Conteúdo
Maria Cristina Araújo de Brito
Cunha
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ.
Projeto Gráfico e Capa Núcleo de Educação a Distância. MARIANO, Rubem Almeida.
Arthur Cantareli, Jhonny Coelho
Filosofia.
e Thayla Guimarães Rubem Almeida Mariano.
Editoração
Bruna Stefane Martins Marconato Maringá - PR.: UniCesumar, 2020.
Design Educacional 240 p.
Ivana Cunha Martins “Graduação - EaD”.
Kaio Vinicius Cardoso Gomes 1. Filosofia 2. Conhecimento 3. Sociedade . EaD. I. Título.
Revisão Textual
Carla Cristina Farinha
Fotos
Shutterstock CDD - 22 ed. 101
CIP - NBR 12899 - AACR/2
Impresso por:
ISBN 978-65-5615-095-6

Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679

NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Av. Guedner, 1610, Bloco 4Jd. Aclimação - Cep 87050-900 | Maringá - Paraná
www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360
BOAS-VINDAS

Neste mundo globalizado e dinâmico, nós tra-


balhamos com princípios éticos e profissiona-
lismo, não somente para oferecer educação de Tudo isso para honrarmos a nossa mis-

qualidade, como, acima de tudo, gerar a con- são, que é promover a educação de qua-

versão integral das pessoas ao conhecimento. lidade nas diferentes áreas do conheci-

Baseamo-nos em 4 pilares: intelectual, profis- mento, formando profissionais cidadãos

sional, emocional e espiritual. que contribuam para o desenvolvimento


de uma sociedade justa e solidária.
Assim, iniciamos a Unicesumar em 1990, com
dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje,
temos mais de 100 mil estudantes espalhados
em todo o Brasil, nos quatro campi presenciais
(Maringá, Londrina, Curitiba e Ponta Grossa) e
em mais de 500 polos de educação a distância
espalhados por todos os estados do Brasil e,
também, no exterior, com dezenas de cursos
de graduação e pós-graduação. Por ano, pro-
duzimos e revisamos 500 livros e distribuímos
mais de 500 mil exemplares. Somos reconhe-
cidos pelo MEC como uma instituição de exce-
lência, com IGC 4 por sete anos consecutivos
e estamos entre os 10 maiores grupos educa-
cionais do Brasil.

A rapidez do mundo moderno exige dos edu-


cadores soluções inteligentes para as neces-
sidades de todos. Para continuar relevante, a
instituição de educação precisa ter, pelo menos,
três virtudes: inovação, coragem e compromis-
so com a qualidade. Por isso, desenvolvemos,
para os cursos de Engenharia, metodologias ati-
vas, as quais visam reunir o melhor do ensino
presencial e a distância.

Reitor
Wilson de Matos Silva
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL

Me. Rubem Almeida Mariano


Doutorando em História pela Universidade Estadual de Maringá (2019) e mestre
em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo – UMESP (1997).
Possui Graduação em Teologia - Seminário Teológico de Londrina da Igreja Presbite-
riana Independente – STL (1990); em Filosofia pela Universidade do Sagrado Coração
– USC (1999); e em Psicologia pelo Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR
(2009). Professor Universitário com experiência nas disciplinas do Curso de Psicolo-
gia: Filosofia, Psicologia Social, Introdução à Psicologia, Ética Profissional, Fenomeno-
logia, Psicologia da Saúde, Gestalt-terapia, Avaliação Psicológica, Orientação e Elabo-
ração de TCC e nas disciplinas do Curso de Teologia: Filosofia da Religião, Educação
Cristã, Teologia da Comunicação, Aconselhamento e Capelania Cristãs e Orientação
e Elaboração de TCC. Professor de pós-graduação com experiência nas disciplinas
de Metodologia de Ensino e Científica, Filosofia, Ética Profissional, Ensino Religioso,
Aconselhamento Pastoral, Psicologia Aplicada à Saúde, à Educação à Comunicação.
Ministra palestra sobre os seguintes temas: Sociedade, Filosofia, Ética Profissional,
Aconselhamento Pastoral, Religião, Assédio Moral. Livros e textos produzidos nas
áreas da Ciências da Religião, Teologia, Filosofia e Psicologia. Psicólogo Clínico na
Abordagem da Gestal-Terapia e Perito - Assistente Técnico na área da Saúde Mental.

http://lattes.cnpq.br/0634102403900329
A P R E S E N TA Ç Ã O DA DISCIPLINA

FILOSOFIA

Olá caríssimo(a), seja muito bem-vindo(a) aos estudos sobre Filosofia.

Antes, de qualquer comentário mais específico, relacionado à proposta teórico-pedagógica


sobre essa disciplina, quero, primeiramente, parabenizá-lo(a) pela iniciativa de se valorizar,
investindo em você mesmo(a) nessa necessária e ambiciosa empreitada que é a sua própria
formação e capacitação profissional. O cuidado consigo mesmo(a) é um testemunho vigoroso
de respeito a si mesmo e de saúde emocional.

Em segundo lugar, a disciplina, que ora inicia, faz parte do currículo do seu curso e foi aprovada
pela Unicesumar sob o olhar atento do Ministério da Educação e Cultura – MEC. Desde o início
do novo século, circulam as Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação que tem como
objetivo fortalecer a formação de profissionais competentes, críticos e comprometidos com o
exercício da profissão. Especificamente, a Resolução CNE/CES n. 15, de 13 de março de 2002,
do MEC (BRASIL, 2002) assinala um perfil profissional que ressalta uma atuação competente,
promotora, criativa e propositiva como profissional do Serviço Social, no conjunto das relações
sociais e no mercado de trabalho.

Nesse sentido, ainda, exigem-se competências e habilidades na formação profissional, que, de


forma geral, são: compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento
sócio-histórico , nos cenários internacional e nacional, desvelando as possibilidades de ação
contidas na realidade; identificação das demandas presentes na sociedade, visando a formular
respostas profissionais para o enfrentamento da questão social.

Não se assuste caríssimo(a). Diante disso, não há milagres. Não há atalhos. Não há fórmulas
mágicas ou a aquisição do conhecimento por osmose (transmissão material do conhecimen-
to). Aprender, conhecer e se desenvolver não tem outro método, a não ser: estudando, lendo
e aprendendo. Essa parte é sua. A nossa é oferecer uma proposta curricular que atenda às
diretrizes nacionais para a sua formação de maneira excelente. A disciplina de Filosofia está
presente como disciplina propedêutica, ou seja, como disciplina nas áreas humanas que pre-
cede, como fase preparatória e indispensável, do seu curso para a sua formação profissional
ou intelectual.
A P R E S E N TA Ç Ã O DA DISCIPLINA

Logo, a tarefa não é simples, mas é, absolutamente, desafiadora. Como é desafiador fazer
uma viagem para um novo mundo. Nesse sentido, quero convidá-lo(a) para fazer uma viagem
ao mundo maravilhoso da Filosofia. Aprender a pensar de uma maneira muito especial e
imprescindível para os nossos dias: organizar o pensamento, sistematizar as ideias e saber
fazer a boa crítica que se torna uma verdadeira bússola na construção do conhecimento e
na desconstrução do não conhecimento, por exemplo, as Fake News.

Nessa perspectiva, caríssimo(a), estruturamos as cinco unidades com temas clássicos, inte-
ressantes e atuais que o(a) levarão para lugares que esperamos que você queira, novamente,
visitá-los, em outras viagens que você fizer sozinho(a). Ressaltamos que, das cinco unidades
que tem este livro, em quatro, abrimos com a aula sobre o porquê, ou seja, quais razões
ou motivos da filosofia, do conhecimento, da ética, da moral e da política. O objetivo é bem
simples, ensinar fazendo, ou seja, enquanto você estuda filosofia, já vê como se constrói o
pensamento crítico e a autocrítica na perspectiva filosófica.

Estruturalmente, portanto, são cinco unidades temáticas: pensar filosoficamente; introdução à


filosofia; conhecimento e antropologia filosófica; ética, moral e sociedade; e, por fim, política e
sociedade. Como você pode perceber, caríssimo(a), a nossa proposta é fazer um cruzamento
entre os aspectos históricos e temáticos, sem perder o foco e a qualidade das discussões, mas
também não cair na vala comum dos manuais de filosofia que repelem e tipificam concepções
preconceituosas sobre a disciplina.

Do ponto de vista da aprendizagem, caro(a) aluno(a), temos em cada uma das cinco unidades,
os seguintes objetivos: (1) justificar a importância do pensamento filosófico crítico e fazer as
primeiras aproximações sobre a forma de pensar e elaborar ideias, à luz da metodologia filo-
sófica; (2) introduzir conhecimentos elementares sobre a História da Filosofia, que abordam
da antiguidade ao tempo contemporâneo, sempre primando pelas características principais
de cada período; (3) analisar a importância do conhecimento (epistemologia) humano para
os nossos dias e a sua importância no incremento crítico do ato criativo, transformador e
dignificante do ser humano, por meio do trabalho; (4) conhecer, de forma crítica, os funda-
mentos e as teorias filosóficas sobre a ética e a moral bem como as suas importâncias para o
desenvolvimento da convivência social; (5) analisar os fundamentos teóricos e as concepções
políticas clássicas e as suas implicações na formação dos estados e dos governos nacionais
bem como as relações de poder que se estabelecem na sociedade por meio de ações polí-
ticas, por exemplo, a valorização dos direitos humanos e das políticas públicas, como forma
de enfrentamento dos conflitos existentes na questão social.
A P R E S E N TA Ç Ã O DA DISCIPLINA

Caríssimo(a) aluno(a), volto a lembrá-lo(a) de sua excelente escolha, mas ela se concretizará
quando, no silêncio das noites ou das madrugadas, nos intervalos do seu almoço ou do jantar,
nos finais de semana (quando os seus amigos e amigas começarem a chamá-lo(a) para as
diversões e as baladas), você estudar. Como lhe disse no início, não existe outro método a não
ser o estudo atencioso da matéria a ser compreendida. Posso lhe antecipar que esse tempo
passará e você, pode não acreditar, sentirá saudades do tempo da faculdade. Do nosso lado,
estamos preparados para ficar com você nesse tempo.

Assim, seja bem-vindo(a) mais uma vez e vamos iniciar a nossa viagem ao mundo maravi-
lhoso da Filosofia propriamente dita. Acomode-se, sente-se, aperte os cintos e vamos partir.
Vamos lá?
ÍCONES
pensando juntos

Ao longo do livro, você será convidado(a) a refletir, questionar e


transformar. Aproveite este momento!

explorando ideias

Neste elemento, você fará uma pausa para conhecer um pouco


mais sobre o assunto em estudo e aprenderá novos conceitos.

quadro-resumo

No fim da unidade, o tema em estudo aparecerá de forma resumida


para ajudar você a fixar e a memorizar melhor os conceitos aprendidos.

conceituando

Sabe aquela palavra ou aquele termo que você não conhece? Este ele-
mento ajudará você a conceituá-la(o) melhor da maneira mais simples.

conecte-se

Enquanto estuda, você encontrará conteúdos relevantes


online e aprenderá de maneira interativa usando a tecno-
logia a seu favor.

Quando identificar o ícone de QR-CODE, utilize o aplicativo Unicesumar


Experience para ter acesso aos conteúdos online. O download do aplicativo
está disponível nas plataformas: Google Play App Store
CONTEÚDO

PROGRAMÁTICO
UNIDADE 01
10 UNIDADE 02
62
PENSAR INTRODUÇÃO
FILOSOFICAMENTE À FILOSOFIA

UNIDADE 03
106 UNIDADE 04
154
CONHECIMENTO ÉTICA, MORAL
E ANTROPOLOGIA E SOCIEDADE
FILOSÓFICA

UNIDADE 05
194 FECHAMENTO
234
POLÍTICA E CONCLUSÃO
SOCIEDADE GERAL
1
PENSAR
FILOSOFICAMENTE

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

PLANO DE ESTUDO
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • O porquê da Filosofia hoje • A
presença da Filosofia na vida cotidiana • As características do pensar mítico • As características do
pensar filosófico • Os tipos de conhecimento humano presentes na sociedade atual.

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Entender o porquê da Filosofia nos dias de hoje • Compreender a presença da Filosofia na vida coti-
diana • Entender as características do pensar mítico • Estudar as características do pensar filosófico •
Compreender os tipos de conhecimento humano presentes na sociedade atual.
INTRODUÇÃO

Estimado(a) aluno(a), pensar filosoficamente é um modo interessante de


se comunicar no mundo e, em especial, nos dias de hoje. O conhecimento
se torna, a cada dia mais, uma moeda poderosa de status e de sobrevivên-
cia da espécie humana, quer no sentido individual ou coletivo. Hoje, o
conhecimento filosófico-científico, uma das formas conjugadas de pensar,
tem obtido um significativo valor na e para a sociedade e o mercado pro-
fissional. Contudo o poder de pensar filosoficamente vai além, isto é, não é,
apenas, o de ter as condições para o desenvolvimento de um determinado
tipo de pensamento que esteja em alta, em um dado momento ou lugar.
O conhecimento não pode ser entendido, apenas, como uma tecnologia,
pois, apesar dessa concepção ser importante, ela não é suficiente; sendo
assim, é imprescindível aprender a pensar meta-filosoficamente, pois esse
modo de pensar desenvolve a capacidade de elaboração e de compreensão
do ato de conhecer, isto é, saber discutir a sua natureza e como se dá a sua
produção. Ainda, nesse sentido, o pensar meta-filosoficamente possibilita
a você a oportunidade única de se constituir como ser autônomo social-
mente, sujeito de sua própria história de vida e participante da sociedade.
Para atender a pretensão citada anteriormente, que é aprender a pensar
meta-filosoficamente, esta unidade tem como objetivos: conhecer os fun-
damentos do pensar filosoficamente, diferenciar os tipos de conhecimen-
tos humanos presentes na sociedade e ressaltar a importância do pensar
filosófico na formação pessoal, acadêmica e profissional. Para tanto, nesta
unidade, trataremos, nas seguintes aulas: o porquê da Filosofia hoje; a pre-
sença da Filosofia na vida cotidiana; as características do pensar mítico;
as características do pensar filosófico e os tipos de conhecimento humano
presentes na sociedade atual. Por fim, caro(a) aluno(a), aproveite ao máxi-
mo os estudos desta unidade, a qual considero uma breve introdução do
nosso livro de Filosofia, pois ela oferece condições básicas e necessárias,
epistemologicamente, para que você possa acompanhar as discussões não
somente deste livro, mas de outros livros e assuntos pertinentes à sua for-
mação acadêmico-profissional. Bons estudos!
1
O PORQUÊ
UNIDADE 1

DA FILOSOFIA
hoje

Olá, caro(a) aluno(a), seja bem-vindo(a)! A partir de agora, iniciaremos uma


viagem ao mundo maravilhoso da Filosofia. Diante dessa saudação e convites
iniciais, você pode “pensar com seus botões”, logo nesta largada dos seus estudos
sobre filosofia: “esse professor já chega chegando e se achando”,“viagem ao mundo
maravilhoso da Filosofia?”. Não é nada disso, espere um pouco, caro(a) aluno(a)!
Não tire conclusões precipitadas e, também, não me entenda mal, certo? Não
sei o que você pensa, mas, longe de mim, achar que estudar filosofia nos dá um
atestado de inteligência superior vitalícia (para a vida toda), pois isso, soa pura
arrogância. Pelo contrário, quando estudei e conheci esse mundo maravilhoso
da Filosofia aprendi a valorizar o espírito da humildade, dentre outras coisas
boas. Lembro-me de ensinamentos muito necessários que utilizo até hoje: como
refletir criticamente sobre os meus próprios atos, diante de mim mesmo e dos
meus amigos e familiares, bem como desenvolver uma forma de pensar argu-
mentativa para escrever com mais confiança, coerência e coesão textuais; outros
ensinamentos sempre que necessito, visito os livros em que estão as ideias sobre
o ato de pensar filosoficamente. Tenho consciência e isso quero partilhar com
você, meu caro(a) aluno(a). Quando a questão é a defesa da vida humana, diante
das inúmeras situações que podem afligi-la, e que eu e você estamos sujeitos, a
Filosofia pode ajudar, e muito. E isso não é conversa fiada de professor de Filo-
sofia. Você vai ver, vem comigo!
12
Pense na seguinte questão que apresentaremos, seguida imediatamente de

UNICESUMAR
uma pergunta: quando a gente se propõe a fazer uma viagem, seja ela de média ou
de longa distância, temos que levar acessórios e equipamentos que são importan-
tes e necessários tê-los em nossa mala ou mochila. Que acessórios e equipamentos
costumamos levar em uma viagem? Além de roupas de uso pessoal, de banho,
de higiene e medicamentos, temos de levar, também, um aparelhinho chamado:
“celular”. Acredite, se quiser: hoje, ninguém, neste mundo de meu Deus, viaja sem
levar consigo um celular; e se for um iphone, claro que é melhor. Brincadeiras
à parte, hoje, um celular é tão necessário quanto, ou melhor, levar a boa e velha
cadernetinha de anotações e, até mesmo, a nossa cabeça. Eu sei, estou exagerando
um pouco, porém veja essa história e se não tenho um pouco de razão: esses dias,
eu conversava com uma motorista de aplicativo e ela me dizia: “moro aqui, mais
de 20 anos, e conheço bem a nossa cidade; mas, hoje, por causa do uso diário
do aplicativo de localização, eu não sei mais como chegar em um local, mesmo
que tenha estado várias vezes nele. Confesso, que, sem o aplicativo, fico perdida”
afirmou com um sorriso largo e desconcertada. Essa conversa está parecendo
uma conversa de loucos. Nada disso! Não é loucura, mas é a mais pura realidade
em nossos dias.
Você pode estar se perguntando: “aonde ele quer chegar?”. Veja só! Quando
comparo a importância de um celular com a nossa cabeça, nada mais faço do
que constatar, a partir da realidade social e tecnológica atual, que esse equipa-
mento está tomando o lugar da nossa cabeça. Pense comigo: o que temos dentro
da nossa cabeça? Fisicamente, um cérebro, nosso hardware! Verdade, isso nós já
sabemos. Mas você sabe o que tem dentro de um cérebro? Hoje, os cientistas têm
estudado mais o nosso cérebro; sendo assim, existe uma área de conhecimento
chamada Neurociência, que se dedica muito para conhecê-lo, além de ter nos
ajudado a viver melhor, principalmente, em nosso cotidiano. Uma informação
que já temos é que, além de comandar, neurologicamente, todas as nossas ações
e comportamentos, o cérebro tem a capacidade de armazenar e buscar informa-
ções que precisamos para a realização das nossas atividades cotidianas. O celular,
também, tem um cérebro cheio de informações, que são armazenadas nas cha-
madas “memórias”, e uma delas é a memória interna. Porém esse cérebro que o
celular possui consegue, de uma forma muito mais eficiente e rápida do que um
cérebro humano, buscar e apresentar, na palma da nossa mão, as informações
que precisamos, apenas, em um click sobre um assunto que temos interesse ou
urgência. Além disso, hoje, o celular pode acessar muitas informações sobre os
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mais diversos assuntos na internet; principalmente, informações sobre objetos,
UNIDADE 1

lugares ou como nos locomovermos de forma rápida e segura para chegar no


destino que almejamos, como dar nó em gravata ou colocar cadarço em tênis,
dentre tantos outros assuntos.
Possivelmente, você já sabe quem fez o celular. Não sabe? Não me refiro, aqui,
especificamente, ao seu inventor, mas chamo a sua atenção para o ser humano.
Foi ele quem criou e continua desenvolvendo o celular com as suas percepções
diante das necessidades que vive, ao longo do tempo. De tal maneira, que o celular
já pode ser considerado uma extensão do nosso corpo e do nosso próprio cérebro
(BORBA; LACERDA, 2015). Tendo um cérebro para armazenar as informações
fora do nosso próprio corpo, como um tipo de HD externo, que nos acompanha
para onde formos. Você, certamente, não acha tudo isso uma loucura, pois você
é um nativo deste mundo tecnológico, mas a minha geração, certamente, acharia
pura piração. O celular é muito útil como instrumento de comunicação, pois não
nos deixa esquecer as informações e podemos tê-las sempre que desejamos, apenas,
acessando com alguns comandos; e, claro, dependendo, também, da capacidade da
internet, podemos buscar, muito mais rapidamente, informações de lugares, países
e continentes, em um instante. Nesse sentido, hoje, temos condições de acessar
muito mais informações e notícias, basta que utilizemos o celular. Pronto, temos a
informação que precisamos. Isso é, sem dúvida, espetacular demais! Torna a vida
um pouco mais leve e cômoda. Por fim, nesta parte, para não perder o hábito de
filosofar, o celular está se transformando em um tipo de entidade, isto é, a cada dia,
precisamos mais dele. Isso pode ser fantástico e, também, aterrorizante, pois já se
fala em dependência do aparelhinho como transtorno emocional, mas isso não
vem ao caso, neste momento.
Agora, convido você a pensar sobre a admiração humana, fazendo o seguinte
questionamento: assim como o mundo tecnológico da informação, é fascinante,
também, termos a capacidade natural de admirar o mundo em que vivemos; por
exemplo, não ficamos admirados quando vemos, sentimos e experimentamos as
águas salgadas do mar pela primeira vez? Ou quando voamos de avião, também,
pela primeira vez e contemplamos do alto céu a imensidade da terra, das florestas,
montes, montanhas e das mais diversas cores da fauna e da flora, dos rios e suas
silhuetas e da imensidão dos mares e oceanos que se estendem e se perdem no ho-
rizonte do céu azul anil? Além disso, há muitas perguntas que nos deixam engasga-
dos quando estamos diante de algo que nos fascina e nos arrebata pela curiosidade
de conhecer. Logo nos vem o ato de perguntar: “o que é isso? De onde vem? Para
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onde vai? Alguém fez tudo isso? Quem fez? Para que serve isso ou aquilo?”. Todas

UNICESUMAR
essas perguntas ou questionamentos que surgem são frutos da nossa admiração.
Elas podem parecer muito natural, quando você se depara com o desconhecido.
Contudo “perguntar” da maneira como perguntamos, hoje, não é uma atitude na-
tural do ser humano, como se fosse um fenômeno físico, químico ou bioquímico,
como as águas de um rio que correm por meio de um leito em meio às matas e
florestas, ou como a chuva que cai suavemente no início de uma manhã. O quê?
O ato de perguntar foi criado? Feito por alguém? Sim, isso mesmo. Perguntar foi
uma criação do ser humano, há mais de 2,5 mil anos, pelos gregos, por meio de
um jeito de pensar, de articular o pensamento. O nome dado para esse jeito de
pensar foi batizado de filosofar, e, assim, surgia a Filosofia, no mundo a partir do
Ocidente (CHAUÍ, 2015).
No título desta aula, aparece a palavra: “porquê”, e Ferreira (2004) nos informa
que essa palavra, escrita dessa forma, é um substantivo masculino que pede explica-
ção sobre um determinado fato, razão ou motivo sobre alguma coisa. Nesse sentido,
pode-se fazer a seguinte pergunta: “quais os fatos, razões ou motivos que tornam a
filosofia importante para quem estuda na universidade, como você e seus colegas?”
Nessa mesma direção, surgem outras perguntas, como: “o que é filosofia? Para que
ou para quem ela serve? Como pensar filosoficamente?”, e as possíveis respostas
serão encontradas ao longo desta nossa viagem que, apenas, está se iniciando. Mas,
agora, temos que terminar este primeiro tópico, minimamente, cientes do porquê
da filosofia hoje. Então, listaremos os motivos, ou dito melhor, as finalidades da
filosofia para quem vive e quer viver melhor em nosso tempo não como objeto de
outros seres humanos, mas como sujeito de sua própria história. Ninguém gosta
de ser tratado como se fosse um fantoche ou marionete. Por isso, estudar é um ato
libertador, como já dizia Freire (2011), e, muito mais, é quando essa aprendizagem
tem, como base, uma formação filosófica adequada e consistente, vejamos:
1. Aprender a interpretar as atitudes das pessoas, suas intenções e disposições.
2. Aprender a ler além da palavra o mundo, o seu contexto.
3. Buscar sentido no seu pensar e no seu agir na sociedade.
4. Desenvolver as diversas inteligências humanas, a sua relação consigo mes-
mo, o seu meio e outras formas de vida existentes.
5. Saber viver consigo mesmo e em meio as outras pessoas, saber se calar
e se manifestar, saber discernir o bem do mal, mesmo quando este se
transforma, aparentemente, naquilo que é bom e justo como vemos as
chamadas fake news.
15
6. Olhar e ver as palavras e ações daqueles que estão à margem ou esqueci-
UNIDADE 1

dos, ou, ainda, não são ouvidos pela maioria da sociedade como sendo,
também, importantes.
7. Poder interpretar as ações, falas e intentos dos que estão longe, mas, tam-
bém, daqueles que estão perto e não são vistos nem notados.
8. Entender e diferenciar o que vem a ser ética, moral, imoral e amoral bem
como distinguir entre querer, dever e poder das nossas ações em sociedade.
9. Buscar a liberdade e a felicidade, não só com o coração ou com a vontade,
mas, também, com a razão.
10. Respeitar a si mesmo e ao outro ser humano não, somente, em palavras,
mas em gestos e atitudes concretas.
11. Entender como se dá as elaborações epistemológicas do conhecimento e
suas mais diversas construções e utilidades para a humanidade.
12. Compreender a linguagem humana e suas mais diversas manifestações
por meio da fala, da escrita, da expressão corporal, pictórica, espiritual,
dentre tantas outras manifestações culturais.
13. Discernir os conflitos humanos e se posicionar diante deles com autono-
mia e ciência de sua posição.
14. Ler e interpretar a história da humanidade e seus ensinamentos, bem
como tirar as devidas lições para a vida pessoal e social, a partir daqueles
que viveram no passado e vivem na atualidade.
15. Adentrar no mundo da interioridade e da subjetividade humana e nas
suas relações com os outros seres vivos do nosso ecossistema.
16. Olhar a cultura humana e ver nela as expressões de diversidade, das aspi-
rações e anseios dos povos vivos ou já extintos.
17. Compreender a questão do poder e as suas formas de expressão política,
de governo e de sistemas organizacionais, ao longo do tempo e em nosso
cotidiano.
18. Saber diferenciar o ser humano nos aspectos individuais e sociais e vice-
-versa.
19. Perceber o sentido das teorias e sistemas filosóficos, sociológicos, teoló-
gicos, psicológicos, antropológicos, dentre tantos outros.
20. Ler o que não está escrito, dito ou falado nas falas e nas produções cultu-
rais e artísticas do ser humano.

16
21. Saber ouvir o silêncio e entender o que se diz, da maneira que está sendo

UNICESUMAR
dita, bem como saber diferenciar o ato do “silêncio” do ato de “ser silen-
ciado” na vida individual ou coletiva da humanidade.
22. Caminhar pelos mundos da paixão, do amor, da dor, do sofrimento, da
paz, da alegria, dos conflitos e, assim, enxergar a si mesmo e o outro, em
uma relação EU-TU-NÓS e não, de forma espúria, EU-TU-ISSO.
23. Perceber os diversos momentos da humanidade e as suas mais expressivas
necessidades e ações, que, de alguma forma, deixaram heranças funda-
mentais para os povos de todo o mundo.
24. Compreender as diversas formas de comunicação e discernir entre os
seus conteúdos e intentos: por que isso está sendo divulgado agora e desta
forma e não o foi antes ou daquela outra maneira?
25. Ler uma biografia de alguma personalidade conhecida, badalada, ou, sim-
plesmente, anônima, e ver não somente aquilo que seu autor quer trans-
mitir sobre a personagem bibliográfica, mas aquilo que você, por meio
do saber filosófico, apreende única e exclusivamente, mediante a relação
que se dá cognitiva, afetiva e espiritualmente da sua leitura.
26. Compreender e distinguir as epistemologias sob a direção da razão, da fé
ou da vontade humana.
27. Ver o belo ou o estético nas manifestações culturais e artísticas das perso-
nalidades consagradas ou anônimas, estas últimas que não caem no gosto
estético de pessoas poderosas ou de uma, duas ou três gerações, mas que
fala, silenciosa e contundentemente, ao coração, mesmo que seja de um
único ser humano solitário.
28. Ser um meio, uma ponte ou um instrumento de acesso ao ser humano e
sua realidade onde vive, bem como saber lançar sobre essa realidade as
suas próprias ideias e ações, para que haja diálogo com outras pessoas
e, dialeticamente, seja influenciado (constituído) e influenciar (consti-
tuidor) sua própria subjetividade e as intersubjetividades (outros seres
humanos), que se relacionam em seu tempo e espaço.
29. Cuidar da própria saúde, do próximo e da humanidade, por meio do
pensar instrumental ou tecnológico.
30. Fomentar saberes necessários para a formação do ser humano como tal.
31. Resistir as aventuras e os modismo beligerantes que tanto tentam contra
a própria existência humana, como ato de autodestruição.

17
32. Poder dizer o que bem quiser, mesmo que ninguém note ou escute você,
UNIDADE 1

no momento.
33. Sentir e interpretar a letra ou a melodia de uma música, consagrada ou não.
34. Compor música, poesia, prosa ou qualquer outra coisa que se possa pen-
sar, falar ou escrever.
35. Brincar com os pensamentos e com as palavras no seu interior ou com
pessoas próximas ou distantes que se interligam, por meio das redes so-
ciais ou dos mais diferentes ambiente virtuais que se fazem presentes.
36. Expressar o seu amor ou raiva, bem como saber interpretar o amor de
quem o quer bem ou aquele que o odeia.
37. Adentrar, silenciosamente, nos mais diversos mundos dos seres huma-
nos, como: nos mundos dos religiosos, dos neuróticos, dos psicóticos,
dos artistas, dos políticos, dos tímidos, dos depressivos, dos bipolares, dos
ansiosos, dos perversos, dos psicopatas, dos socialistas, dos comunistas,
dos liberais, dos fascistas, dos antissociais, dos trabalhadores, dos servi-
dores públicos, dos profissionais liberais, dos mártires, dos monstros, dos
abusadores, dos abusados, dos assediados, dos assediadores, das crianças,
dos jovens, dos gays, das lésbicas, dos heterossexuais, dos bissexuais, dos
pobres, dos miseráveis, dos ricos, dos machos, dos brancos, amarelos, ín-
dios e negros, dos milionários, dos donos da mídia, dos falidos, dos bem
sucedidos, dos poderosos do capital financeiro, dos empresários, das mães
que sofrem a perda de um filho, dos cientistas, dos pesquisadores, dos
analfabetos, do doutores, dos sábios, dos que meditam, dos que vivem só,
dos que vivem acompanhados, dos que moram nas periferias dos grandes
centros ou nos lugares mais longínquos dos grandes centros urbanos, dos
estudantes universitários, bem como dentre tantos outros mundos, que
independem do poder da escrita ou da comunicação. A filosofia serve
para o ser humano se aproximar e entender a si mesmo e as mais diversas
formas de sua humanidade, as quais podem ser criadas, ou afirmadas, ou
negadas, ou combatidas, vorazmente.
38. Dar condições ao ser humano na árdua missão de distinguir a diferença en-
tre uma notícia ou imagem verdadeiras ou das fake news nas redes sociais.
39. Buscar entender o significado e o sentido do que é feito e produzido pelas
mãos humanas, em todos os tempos, como a descoberta da roda, do fogo,
da chave, da bola, dentre tantos outros inventos.

18
40. Aprender a distinguir, preservar e conservar o que é necessário, essencial

UNICESUMAR
e durável do que é desnecessário, secundário e efêmero.
41. Ter a capacidade de usar as palavras na escrita ou na fala com o sentido e
tom que bem quiser ou desejar, bem como saber se defender do outro ser
humano quando esse lhe impõe, nas suas palavras, outros sentidos que
não aqueles pretendidos por você mesmo.
42. Ter condições de criar, elaborar e desenvolver um projeto desde as pri-
meiras pinceladas, elaborações de sua produção textual até o seu desen-
volvimento teórico e prático.
43. Escolher o que quer, deseja ou imagina como sendo bom e justo para si
ou para as pessoas que vivem ao seu lado e que partilham a existência
com você.
44. Desenvolver o autoconhecimento por meio da análise de si, das suas ca-
pacidades, habilidades e limites cognitivos, afetivos e comportamentais.
45. Por fim, em minha lista, é claro, como diria Aristóteles, buscar a felicidade
(ARISTÓTELES, 2000). Porém, para não perder o hábito filosófico, o que
é felicidade? Qual a sua natureza? É ter bens materiais ou espirituais? Um
historiador dos nossos tempos, Harari (2018), disse que filósofos, religio-
sos e poetas chegaram a uma conclusão mínima de que a felicidade está
implicada com os fatores sociais, éticos e espirituais.

Você está vendo, caro(a) aluno(a), o que é ser capaz de pensar filosoficamente?
Modestamente, podemos lhe afirmar que essas finalidades da filosofia vão lon-
ge, é só para você ver que podemos continuar essa lista. Que tal você, também,
acrescentar outras finalidades da importância da filosofia para o ser humano,
após você estudar um pouco mais de filosofia? Está feito o desafio, como aqueles
desafios que as pessoas fazem umas para as outras nas redes sociais, você topa?
Agora, para finalizar esta aula, o que você entende desta ideia: a filosofia, utiliza
um tipo de pensamento que chamamos de crítico, serve sempre para ajudar o ser
humano na compreensão de si mesmo e do outro bem como agir em prol de si
mesmo e do meio onde vive, para garantir a sua vida e existência. Uma questão de
sobrevivência da nossa espécie. O que você acha disso? O que você percebeu dessa
aula? O que destacaria como importante? O que faltou abordar, neste início dos
seus estudos? Pois bem, continuaremos a nossa viagem ao mundo maravilhoso
da Filosofia, indo para a segunda aula desta Unidade 1.

19
2
A PRESENÇA DA
UNIDADE 1

FILOSOFIA NA
vida cotidiana

Meu caro(a) aluno(a), continuamos a nossa viagem ao mundo maravilhoso da


Filosofia. Agora, tenho uma pergunta para lhe fazer: você já viajou de ônibus, en-
trando nele no meio do caminho, entre os pontos inicial e final do seu itinerário?
Isso mesmo, você já pegou um ônibus entre esses dois pontos? Acho que sim. Mas
suponhamos que, se você nunca foi ao ponto inicial de um ônibus ou nunca foi ao
seu ponto final, certamente, você não conhece as paisagens, os lugares e o itinerário
total que ele faz. Isso, também, quer dizer que você só conhece o itinerário a partir
de um determinado ponto, ou seja, onde você entrou nele e até o seu destino onde
você vai descer. Nesse sentido, assim, também, somos nós em relação à história da
humanidade ou da nossa própria história de vida.
Quando a gente nasce, a história está acontecendo e aí entramos nela. Por
exemplo, eu entrei na história da humanidade no ano de 1966, no Brasil, no
estado do Amazonas e, mais especificamente, no município de Boca do Acre; na
época, um seringal do norte do nosso país. Com essas brevíssimas informações,
do ponto de vista histórico, eu peguei o ônibus andando na história da huma-
nidade, entendeu? Particularmente, conheço muito bem os caminhos, lugares
e paisagens que passei e que passo, ainda hoje. Contudo, hoje, continuo minha
viagem, conhecendo novos caminhos, lugares e paisagens. Posso lhe dizer que não
conheço quase nada, quando relaciono os lugares que conheço com o mundo;
mas, em relação ao Brasil, conheço uma boa parte dele. Contudo, por meio do

20
mundo da leitura, conheci e posso conhecer a história da humanidade de outros

UNICESUMAR
lugares, mesmo sem nunca ter pisado neles. Isso porque estudei ao longo do
tempo e estudo o dia a dia, com isso conheço melhor a história da humanidade
e a minha própria história de vida.
Você pode me responder onde você se encontra agora, neste instante? Você
tem consciência plena sobre tudo que você faz? É comum a maioria das pessoas,
acredito que você esteja dentre essas, responder “sim” para a primeira pergunta,
e um grandíssimo “não” para a outra. Respondemos dessa forma por causa dos
conhecimentos advindos da psicanálise, da teoria do inconsciente, em especial. Po-
rém, também, você pode dizer “sim” e “sim”, ou “não” e “não”, ou “não” e “sim”,“talvez”
e “não”,“sim” e “talvez”, ou, ainda, “talvez” e “talvez”. Enfim, você pode responder das
mais diversas maneiras essas duas questões. Dito diferente, você pode responder
da maneira que quiser. O que quero dizer com isso é que nós pensamos de um
determinado jeito que é comum, na maioria das vezes, apresentar justificativas e
argumentos que consideramos plausíveis para as nossas respostas. Essa forma de
pensar nem sempre foi assim, mas veremos isso em outra oportunidade. Agora, o
importante é você observar que a maneira, de uma forma geral, que pensamos nos
ajuda a viver a nossa vida, tanto pessoal quanto profissionalmente. Nesse sentido,
a forma que pensamos, hoje, possui elementos do pensar filosoficamente, e isso só
é possível observar se você tem a sua formação, principalmente, no mundo oci-
dental, onde pensa-se, na maioria das vezes, preservando uma determinada lógica.
Nessa direção, ainda, é muito comum respondermos às situações ou problemas
que enfrentamos, utilizando argumentos e razões. O filósofo Gramsci (1978, p. 45)
afirma que “não se pode pensar em nenhum homem que não seja também filóso-
fo, que não pense, precisamente porque o pensar é próprio do homem como tal”.
Isso sugere que, de alguma maneira, todas as pessoas utilizam um certo senso da
filosofia no dia a dia. Sobre essa questão da filosofia no cotidiano, são comuns os
filósofos e as filósofas atuais, ao escreverem, argumentarem que a filosofia, como
é um conhecimento que já tem mais de 2.500 anos, influencia, culturalmente, o
modo das pessoas pensarem e agirem, mesmo que, muitas vezes, elas não estejam
cientes dessa maneira de pensar. Especificamente, sobre o pensamento filosófico
como elemento cultural, a partir de Cotrim (2006), pode-se depreender que a
filosofia é adquirida pela aprendizagem, transmitida de geração em geração por
meio da linguagem; é uma criação exclusiva dos seres humanos e é múltipla e
variada no tempo e no espaço, de sociedade para sociedade. Vejamos, a seguir,
por sua vez, dois exemplos de filósofas brasileiras, sobre a relação da filosofia
21
com o nosso cotidiano. Aranha e Martins (2013) observam que existem questões
UNIDADE 1

filosóficas presentes em nosso dia a dia:


1. Quando alguém decide votar em um candidato por ser de um determi-
nado partido.
2. Quando troca de um emprego por outro não tão bem remunerado, mas
que é mais de seu agrado.
3. Quando alterna a jornada de trabalho com a prática de esporte ou com a
opção de ficar em casa assistindo à tevê.
4. Quando investe na educação dos filhos.

A outra filósofa, que observa a relação da filosofia com o cotidiano, é Chauí, no


que ela chama essa relação de “as evidências do cotidiano”. Assim, argumenta de
antemão que nós afirmamos, negamos, desejamos, aceitamos ou recusamos coisas,
pessoas, situações. A partir dessa compreensão, Chauí (2015, p. 5-8) afirma que:


Utilizamos perguntas como “que horas são?”, ou “que dia é hoje?”;

Dizemos frases como “ele está sonhando”, ou “ela ficou maluca”;

Fazemos afirmações como “onde há fumaça, há fogo”, ou “não saia


na chuva para não se resfriar”;

Avaliamos coisas e pessoas, dizendo, por exemplo, “esta casa é mais


bonita do que a outra” e “Maria está mais jovem do que Glorinha”;

Numa disputa, quando os ânimos estão exaltados, um dos conten-


dores pode gritar ao outro: “Mentiroso! Eu estava lá e não foi isso
o que aconteceu”, e alguém, querendo acalmar a briga, pode dizer:
“Vamos ser objetivos, cada um diga o que viu e vamos nos entender”;

Também é comum ouvirmos os pais e amigos dizerem que somos


muito subjetivos quando o assunto é o namorado ou a namora-
da. Frequentemente, quando aprovamos uma pessoa, o que ela diz,
como ela age, dizemos que essa pessoa “é legal”;

Cremos no espaço, no tempo, na realidade, na qualidade, na quan-


tidade, na verdade, na diferença entre realidade e sonho ou loucu-
ra, entre verdade e mentira; cremos também na objetividade e na
diferença entre ela e a subjetividade, na existência da vontade, da
liberdade, do bem e do mal, da moral, da sociedade.
22
Como você pode ver, caro(a) aluno(a), o nosso cotidiano está cheio

UNICESUMAR
de situações que têm relação com a filosofia. Logo, surge uma ques-
tão muito comum quando se adentra ao mundo da Filosofia: útil ou
inútil para o conhecimento o agir humano? Essa questão da utilidade
da filosofia é estudada e respondida pelas filósofas Aranha e Martins
(2013) e Chauí (2015). Elas partem do modo de pensar filosófico.
Perguntam: o que é útil? O que é inútil? Para que serve a filosofia
em minha vida? Elas concordam, também, que o conhecimento que
reina, na atualidade, está muito voltado para o que é prático e ime-
diato. Assim, se sou advogado, engenheiro ou fisioterapeuta, eu não
vejo lugar para a filosofia na minha profissão, a qual é influenciada,
fortemente, por uma filosofia chamada de “pragmatismo”, ou seja, útil
é aquilo que me serve e me dá retorno imediato do que preciso. As
filosofas citadas concordam que, se for tomar como referência essa
concepção, de fato a filosofia não é útil, mas, sim, inútil. Como você
sabe, porém, a história da humanidade não começou com o seu nas-
cimento e nem com o nascimento do pragmatismo filosófico, antes ou
até mesmo, no próprio período do surgimento da filosofia, já haviam
outras compreensões filosóficas que fundamentaram a importância
da filosofia para a humanidade. Aranha e Martins (2013) observam
que há uma ideia que a filosofia não serve para nada. Assim qual seria
a sua utilidade? Nessa perspectiva, se levar em conta o pensamento
dominante, na sociedade, ela seria inútil, pois útil é o que dá retorno
imediato ou o que vai “cair” no vestibular ou para que estudar filosofia
se não vou utilizar na minha vida profissional.
Ainda, sobre esse tema, mas em uma direção, totalmente, opos-
ta, a filosofia seria útil como forma de pensar diferente, ajudando a
ver a partir de outro ângulo ou perspectiva, quando estamos, total-
mente, mergulhados ou com uma visão estreita da realidade. Ainda,
as autoras compreendem que a filosofia é perigosa, pois possibilita
desestabilizar o status quo (“o estado das coisas”), ao se confrontar
com o poder estabelecido. Já Chauí (2015, p. 18) procede o seguinte
questionamento filosófico: “não poderíamos, porém, definir o útil de
outra maneira?”. A resposta dada é um sim. Em seguida ela apresenta
a utilidade da filosofia para os filósofos clássicos:

23

Platão definia a Filosofia como um saber verdadeiro que deve ser
UNIDADE 1

usado em benefício dos seres humanos;

Descartes dizia que a Filosofia é o estudo da sabedoria, conheci-


mento perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar
para o uso da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas
e das artes;

Kant afirmou que a Filosofia é o conhecimento que a razão adquire


de si mesma para saber o que pode conhecer e o que pode fazer,
tendo como finalidade a felicidade humana;

Marx declarou que a Filosofia havia passado muito tempo apenas


contemplando o mundo e que se tratava, agora, de conhecê-lo para
transformá-lo, transformação que traria justiça, abundância e feli-
cidade para todos;

Merleau-Ponty escreveu que a Filosofia é um despertar para ver e


mudar nosso mundo;

Espinosa afirmou que a Filosofia é um caminho árduo e difícil, mas


que pode ser percorrido por todos, se desejarem a liberdade e a
felicidade (CHAUÍ, 2015 p. 18).

Objetivamente, qual seria, então, a utilidade da Filosofia? Chauí (2015, p. 19)


responde mais uma vez:


Abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum;

Não se deixar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos po-


deres estabelecidos;

Compreender a significação do mundo, da cultura, da história;

Conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e


na política;

Dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem


consciente de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade
e a felicidade para todos for útil.

24
Diante do que foi apresentado e estudado, nesta aula, você acha que a filosofia faz

UNICESUMAR
ou não parte do nosso cotidiano? Outra questão, a filosofia é útil ou inútil? Tudo
bem, não precisa me responder agora. Mas, pelo que pude observar, a filosofia faz,
sim, parte da vida cotidiana do ser humano moderno, bem como é um conheci-
mento bem tipificado, característico, peculiar, o qual apresentaremos melhor nas
próximas aulas, e, ainda, é bem próprio do modo de pensar filosófico a criticidade,
que pode enriquecer os saberes humanos sempre com o fino e determinado ob-
jetivo de dar ao próprio ser humano a condição de ser autônomo e senhor de sua
própria história contra os possíveis enganos que lhe são próprios também, afinal
quem não erra ou se equivoca; principalmente, quando o ser humano se utiliza,
apenas, do senso comum e de simples opiniões pessoais abandonando, por sua
vez, o bom senso que deve nutrir um pensamento crítico e fundamentado, no
mais que puder, em argumentos sólidos.

3
AS CARACTERÍSTICAS
DO PENSAMENTO
mítico

Meu caro(a) aluno(a), em nossa viagem para o mundo da Filosofia, temos que dar
uma breve parada. Vamos fazer pit stop. O objetivo, dessa parada, é, justamente,
para você entender melhor o mundo maravilhoso da Filosofia. E, assim, seguir-
mos a nossa viagem. Farei comparações e apresentarei características do jeito de
25
pensar mítico. Didaticamente, nosso cérebro registra melhor quando fazemos
UNIDADE 1

atividades de comparação. Assim, pode-se precisar melhor as especificidades do


que se propõe, em nosso caso principal, como pensar filosoficamente. Portanto,
o objetivo dessa aula é estudar as características do pensamento mítico. Essa
forma de pensar, por sua vez, foi uma das primeiras maneiras que o ser humano
desenvolveu para se comunicar com o outro socialmente. Então vamos lá!
Possivelmente, você já saiba: a história da humanidade e seus ancestrais mais
remotos datam, provavelmente, há cerca de 2,5 milhões de anos, mas, somente,
há 70 mil anos, segundo Harari (2018, p.11), que “os organismos pertencentes à
espécie Homo sapiens começaram a formar estruturas ainda mais elaboradas cha-
madas culturas”. E a filosofia, como você já sabe, só veio a surgir bem mais recente,
há, apenas, 2,5 mil anos, na Grécia Antiga. Guarde essa informação! Entre 70 mil e
30 mil anos atrás, já se tem registros da invenção de barcos, lâmpadas a óleo, arcos
e flechas bem como agulhas para costurar roupas. Ainda, entre esses períodos,
já se sabe que foram criados os primeiros objetos de arte e joias, bem como os
primeiros indícios de religião, comércio e estratificação social (HARARI, 2018).
Portanto, entre 70 mil e 30 mil anos, ocorreu a Revolução Cognitiva, em
que os nossos ancestrais começaram a desenvolver novas formas de pensar e se
comunicar, possivelmente, devido a uma mutação genética em nossa raça ou a
uma evolução de partilhamento social, de informações (teoria da fofoca) sobre
o mundo e tudo que nele existe. Logo, em relação às outras espécies de seres vi-
vos, como elefantes, macacos, formigas, dentre outras, nós desenvolvemos uma
linguagem, incrivelmente, versátil devido às condições cerebrais e/ou as nossas
habilidades sociais (HARARI, 2018). Nesse sentido, entre esses períodos, o ser
humano começa a se comunicar, pela primeira vez, por meio de lendas, mitos,
deuses e religiões. Utiliza uma linguagem muitíssimo peculiar e distintiva dos
outros seres vivos.
O Homo sapiens pode fazer referência ou se comunicar com os outros de
sua espécie coletivamente, por meio de uma linguagem ficcional, representativa
e simbólica. Sobre essa condição ímpar do ser humano, em poder se comunicar
por meio da linguagem ficcional, dos mitos, Harari (2018, p. 33), assim, observa
que “Podemos ter mitos partilhados tais como a história bíblica da criação, os
mitos do Tempo do Sonho dos aborígenes australianos e os mitos nacionalistas
dos Estados modernos. Tais mitos dão aos sapiens a capacidade sem precedentes
de cooperar de modo versátil em grande número”.

26
Segundo Aranha (2012), a palavra “mito”, em grego mythos, significa “pala-

UNICESUMAR
vra”, “o que significa dizer”, “narrativa”. A consciência mítica é predominante em
culturas de tradição oral, quando ainda não há escrita, ou seja, é uma narrativa
na qual a palavra é usada para transmitir e comunicar, coletivamente, a tradição
oral, preservando sua memória e garantindo a continuidade da cultura (MA-
RIANO, 2007).


[...] para os gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido
para ouvintes que recebem como verdadeira a narrativa, porque
confiam naquele que narra; é uma narrativa feita em público, basea-
da, portanto, na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador
(CHAUÍ, 2015, p. 33).

Os mitos são usados para explicar a origem do mundo ou da espécie humana


sobre a face da Terra. Serve para explicar, também, o início da história de uma
comunidade. Na verdade, os mitos têm a ver com a existência real e vivida de
cada ser humano, e, mais, os mitos expressam a capacidade inicial do ser humano
compreender o mundo que o cerca. Na visão de Aranha (2012), os mitos têm como
função principal garantir a tradição e a sobrevivência do grupo, por exemplo, o
mito indígena tupi, o qual diz que a mandioca nasceu do túmulo de uma criança
chamada Mandi. Isso assinala a importância do alimento como sendo sagrado
para a tribo.
Além disso, o mito tem a função de tranquilizar diante de um mundo de
incertezas, ou seja, o desejo de afugentar a insegurança, os temores e a angústia
diante do desconhecido, do perigo e da morte. E, ainda, os mitos são sustentados
pela crença em forças superiores que protegem ou ameaçam, recompensam ou
castigam. Ainda, para Aranha (2012, p. 87), o mito não pode ser entendido como
uma “lenda”, em absoluto, mas é uma verdade sustentada pela crença. “A verdade
do mito resulta de uma intuição compreensiva da realidade, cujas raízes se fun-
dam na emoção e na afetividade. O mito expressa o que desejamos ou tememos
e representa como somos atraídos pelas coisas ou como delas nos afastamos”.
Nessa perspectiva, pode-se dizer que os mitos têm uma regra muito própria e
peculiar, eles são marcados pela não racionalidade moderna, como a lógica de
causa e efeito. Não se funda, portanto, em uma consciência lógico-racional, mas
funda-se na crença, em uma consciência emocional-afetiva por meio da fé, como
verdadeira e aceita, sem nenhum questionamento.
27
Caro(a) aluno(a), veja, a seguir, um exemplo de mito grego: os raios que caiam
UNIDADE 1

sobre a terra provêm todos de Zeus e eram aceitos como sendo uma verdade
absoluta e não havia a mínima necessidade de comprovação dessa afirmação (IN-
CRONTRI; BIGHETO, 2010). Assim, os mitos são um sistema simbólico oficial,
bem como uma conduta verbal de significados que tem um sentido próprio de
confiança, acima de tudo, sem ter o crivo da racionalidade crítica à moda como
conhecemos. Conforme Incrontri e Bigheto (2010, p.16),“o mito é um pensamen-
to acrítico, pois não explica nem analisa sua maneira de conhecer ou o processo
pela qual chega ao saber. O mito é inquestionável e incontestável”. Tal status de
sagrado deve-se à crença de que quem narra ou conta um mito é o escolhido e
enviado dos deuses. Sobre isso, Chauí (2015, p. 33) esclarece que “Quem narra o
mito? O poeta-rapsodo. Quem é ele? Por que tem autoridade? Acredita-se que o
poeta é um escolhido dos deuses, que lhe mostram os acontecimentos passados
e permitem que ele veja a origem de todos os seres e de todas as coisas para que
possa transmiti-la aos ouvintes. Sua palavra - o mito – é sagrada porque vem
de uma revelação divina”. Curiosidade! Você tem? Dizem que todo mundo tem
curiosidade. Deve ser por isso que faz tanto sucesso os programas de reality show
nas tevês no mundo inteiro. Você tem curiosidade de saber como ou quando o
mundo foi feito? Quem o fez? Particularmente, eu tenho. Nesse sentido, uma das
funções do mito era, justamente, narrar um tipo de explicação da época, a origem
do mundo e de tudo o que nele existe. A filósofa Chauí (2015, p. 32-34) nos infor-
ma que os mitos, nos tempos antigos, tinham três maneiras principais de tratar
esses assuntos por meio do que chamamos, hoje, de cosmogonias e teogonias:


Encontrando o pai e a mãe das coisas e dos seres, isto é, tudo o que
existe decorre de relações sexuais entre forças divinas pessoais. Essas
relações geram os demais deuses: os titãs (seres semi-humanos e se-
midivinos), os heróis (filhos de um deus com uma humana ou de uma
deusa com um humano), os humanos, os metais, as plantas, os animais,
as qualidades, como quente-frio, seco-úmido, claro-escuro, bom-mau,
justo-injusto, belo-feio, certo-errado, etc. A narração da origem é, assim,
uma genealogia, isto é, narrativa da geração dos seres, das coisas, das
qualidades, por outros seres, que são seus pais ou antepassados, por
exemplo: observando que as pessoas apaixonadas estão sempre cheias
de ansiedade e de plenitude, inventam mil expedientes para estar com a
pessoa amada ou para seduzi-la e também serem amadas, o mito narra
a origem do amor, isto é, o nascimento do deus Eros (que conhecemos
28
mais com o nome de Cupido): houve uma grande festa entre os deuses.

UNICESUMAR
Todos foram convidados, menos a deusa Penúria, sempre miserável e
faminta. Quando a festa acabou, Penúria veio, comeu os restos e dormiu
com o deus Poros (o astuto engenhoso). Dessa relação sexual, nasceu
Eros (ou Cupido), que, como sua mãe, está sempre faminto, sedento e
miserável, mas, como seu pai, tem mil astúcias para se satisfazer e se
fazer amado. Por isso, quando Eros fere alguém com sua flecha, esse
alguém se apaixona e logo se sente faminto e sedento de amor, inventa
astúcias para ser amado e satisfeito, ficando ora maltrapilho e semi-
morto, ora rico e cheio de vida.

Encontrando uma rivalidade ou uma aliança entre os deuses que


faz surgir alguma coisa no mundo. Nesse caso, o mito narra ou uma
guerra entre as forças divinas, ou uma aliança entre elas para provocar
alguma coisa no mundo dos homens. O poeta Homero, na Ilíada,
que narra a guerra de Tróia, explica por que, em certas batalhas, os
troianos eram vitoriosos e, em outras, a vitória cabia aos gregos. Os
deuses estavam divididos, alguns a favor de um lado e outros a favor
do outro. A cada vez, o rei dos deuses, Zeus, ficava com um dos par-
tidos, aliava-se com um grupo e fazia um dos lados - ou os troianos
ou os gregos - vencer uma batalha. A causa da guerra, aliás, foi uma
rivalidade entre as deusas. Elas apareceram em sonho para o prín-
cipe troiano Paris, oferecendo a ele seus dons e ele escolheu a deusa
do amor, Afrodite. As outras deusas, enciumadas, o fizeram raptar a
grega Helena, mulher do general grego Menelau, e isso deu início à
guerra entre os humanos.

Encontrando as recompensas ou castigos que os deuses dão a quem


os desobedece ou a quem os obedece. Como o mito narra, por exem-
plo, o uso do fogo pelos homens? Para os homens, o fogo é essencial,
pois com ele se diferenciam dos animais, porque tanto passam a co-
zinhar os alimentos, a iluminar caminhos na noite, a se aquecer no
inverno quanto podem fabricar instrumentos de metal para o traba-
lho e para a guerra. Um titã, Prometeu, mais amigo dos homens do
que dos deuses, roubou uma centelha de fogo e a trouxe de presente
para os humanos. Prometeu foi castigado (amarrado num rochedo
para que as aves de rapina, eternamente, devorava seu fígado) e os
homens também. Qual foi o castigo dos homens? Os deuses fizeram
uma mulher encantadora, Pandora, a quem foi entregue uma caixa
que conteria coisas maravilhosas, mas nunca deveria ser aberta. Pan-
29
dora foi enviada aos humanos e, cheia de curiosidade e querendo dar
UNIDADE 1

a eles as maravilhas, abriu a caixa. Dela saíram todas as desgraças,


doenças, pestes, guerras e, sobretudo, a morte. Explica-se, assim, a
origem dos males no mundo.

Os mitos não são coisas do passado. Hoje, os conhecimentos especializados, como


Antropologia, Filosofia, Sociologia, Psicologia, História, Arqueologia, dentre ou-
tros, compreendem que a sociedade contemporânea continua a produzir mitos
incorporados ao seu cotidiano, que traduzem entendimento e formas de orga-
nizar e estruturar a sua existência. Nesse sentido, Malinowski (1984 apud MAY,
1992, p. 3) diz sobre o que vem a ser mito:


[...] considerando-o vivo, o mito... não é uma explicação que respon-
da a um interesse científico, mas uma renovação narrativa de uma
realidade primordial, contada como resposta a desejos religiosos
profundos, a ânsias morais [...] um mito é um modo de dar sentido
a um mundo sem sentido. Mitos são padrões narrativos que dão
significados a nossa existência.

O próprio May (1992, p. 3), ainda, explica que


[...] se o sentido da existência é apenas o que colocamos na vida por
nossa própria força individual, como Sartre defendia, ou se existe
um sentido que precisamos descobrir como afirmava Kierkegaard,
o resultado é o mesmo: os mitos são os nossos modos de encontrar
esse sentido e esse significado.

Acredito, meu caro(a) aluno(a), que é necessário, neste momento, fazer uma ob-
servação, em nosso estudo, sobre as características do pensar mítico. Diria que é
importantíssimo fazer a seguinte ressalva: há dois sentidos para o que vem a ser
mito: o sentido negativo, como algo falso, ilusório e não verdadeiro; e o sentido
positivo, como algo que expressa uma determinada verdade sobre a realidade e a
existência humana dos povos e das civilizações por meio dos contos, dos folclores,
das lendas, das histórias, dentre outros, que se transmite e se ramifica em um pro-
cesso, extremamente, complexo e dialético de geração à geração, de comunidade à
comunidade e de pai ou mãe para filho(a). Diz-se que algo ou alguém é mito, no
30
sentido negativo, quando se acredita pia e cegamente em uma determinada coisa

UNICESUMAR
ou pessoa, sem o mínimo, ou nenhum, questionamento, por exemplo, acreditar na
ciência como a única forma ou maneira de se explicar a vida humana. Ou, ainda,
acreditar, cegamente, em uma “explicação” dada por um político, a partir de um
fórum legislativo, sobre um processo de impeachment de um chefe do executivo
federal, estadual ou municipal, sem considerar o contexto ou as razões políticas
do momento, bem como os questionamentos dos fundamentos jurídicos sobre
uma devida matéria.
No sentido de questionamento da ordem estabelecida das coisas, do status
quo, a filosofia, desde os gregos, contribuiu para a busca do entendimento de
nossas atitudes. Hoje, por meio do pensar filosófico dos questionamentos do
que vem a ser/porque fazemos de uma determinada maneira e não de outra (ou
seja, em outras palavras, o que/por que vemos de uma determinada maneira
ou de outra, ou o que/por que falamos de uma determinada maneira e não de
outra) certamente, o pensar filosófico ajuda-nos a desmistificar ideias que não
têm amparo na realidade.
O sentido positivo, por sua vez, de mito é observado por diversos autores
e autoras, em diversas perspectivas, destaco dois, como Aranha (2012) e May
(1992), e ressalto, principalmente, o último. A primeira observa a importância
do mito para a significação social das relações entre as pessoas, segundo Aranha
e Martins (2013, p. 23), “até hoje o mito permanece na raiz da inteligibilidade
humana. A função fabulosa persiste nos contos populares, no folclore, mas não
só. Por exemplo: palavras como lar, amor, pai, mãe, paz, liberdade, morrer não se
esgotam com explicações racionais”. Já o segundo, May (1992), apresenta a função
imprescindível do mito e sua importância para a sociedade atual, como fator
estruturante mental e emocional diante de um tempo de mudanças significativas
e profundas que tem possibilitado instabilidades nos mais diversos campos da
vida, como no político, social, cultural, artístico, religioso, dentre outros, atingin-
do, assim, a Psique humana. Para May (1992, p. 3), “criar mitos é essencial para
se obter saúde mental”. Nessa mesma direção, este último autor defende a tese
que os mitos eram e são vitais bem como fortes para proporcionar uma socie-
dade saudável e não patológica, como se tem observado por meio de números
expressivos de doenças e transtornos mentais que atingem a humanidade, como
taxas altíssimas de suicídio, depressão e ansiedade. Assim, caro(a) aluno(a), fica
a distinção e observação sobre esses dois aspectos negativo e positivo de mito.

31
4
AS CARACTERÍSTICAS
UNIDADE 1

DO PENSAMENTO
filosófico

O pensamento filosófico é uma outra maneira que o ser humano desenvolveu,


como o pensamento mítico, para se comunicar e apreender o mundo que o cerca,
caro(a) aluno(a). É importante fazer, aqui, um registro, mesmo que breve sobre
a importância das condições históricas recentes para o pensar filosófico. É im-
portante ressaltar, ainda, que essas observações a serem feitas sobre as condições
históricas só são possíveis, pois a maneira de se elaborar o pensamento, o qual
mais se sobressai, hoje, nos estudos e na pedagogia aplicada nas escolas e nos
círculos acadêmicos, só é exequível porque existe, na realidade brasileira, os co-
nhecimentos filosóficos e científicos. O primeiro surgiu há mais de 2500 anos e
o segundo há mais de 300 anos. Repito, mais uma vez, para que fique registrado
mesmo: ambos os conhecimentos tiveram seus próprios contextos sócio-his-
tórico-culturais que oportunizaram todas as condições para o surgimento e o
desenvolvimento como conhecimento humano. Destaque-se que, nem sempre, o
ser humano, intelectualmente, considerou, como fator importante ou necessário,
as condições histórico-culturais para entender a sua forma de pensar e de agir
ou de se interrogar a si mesmo; mas tudo isso só foi executável pelo fato de o ser
humano ter desenvolvido esse modo de pensar filosoficamente, ou seja, olhar, de
maneira racional, o mundo a sua volta.
Como você já sabe, o ser humano, como ser social, foi se desenvolvendo sobre
a face da terra, há milhões e milhões de anos, graças a uma das suas principais ha-
bilidades que é a socialização (HARARI, 2018). Mais recentemente, em especial,
32
há alguns séculos, os conhecimentos da área de humanas foram se desenvolvendo

UNICESUMAR
e valorizando as condições materiais de vida, e um dos principais filósofos, já no
Período Moderno, que defendeu essa ideia foi o alemão Karl Marx (1818-1883).
Assim, o aspecto social, histórico e cultural foram e são, hoje, essenciais para en-
tender como o ser humano se desenvolveu no mundo. Essa ideia das condições
históricas e culturais pode parecer para você muito simples, mas investigue e
procure saber mais e você verá que, nem sempre, o ser humano pensou assim.
Você nunca se pegou dizendo: “nossa, nunca pensei ou imaginei isso ou aquilo
dessa maneira!” ou “oh meu Deus, como, hoje, eu posso ver essas coisas tão dife-
rentes do meu passado”. Assim, devido às condições materiais da vida, surgiram
os conhecimentos, a universidade, os cursos, as pesquisas e as profissões que
temos, como os filósofos, matemáticos, astrônomos, químicos, psicólogos, ad-
vogados, cientistas, professores, assistentes sociais, dentre tantas outras. Por isso,
hoje, quando estudamos o conhecimento humano, no caso, aqui, as características
do pensamento filosófico, estamos dizendo que as condições históricas, as quais
serão melhores estudadas nas próximas unidades, possibilitam entender melhor
o surgimento e, consequentemente, o desenvolvimento dessa forma específica de
pensar, ou seja, o pensar filosófico, bem como outras formas também.
“Filosofia” é uma palavra composta que vem da língua grega: philo e sophia.
A primeira significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais, e a segunda
quer dizer sabedoria (ABBAGNANO, 1982). Chauí (2015, p. 19) faz o seguinte
comentário: “[...] filosofia significa amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo
saber... filósofo é o que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber.
Assim, filosofia indica um estado de espírito, o da pessoa que ama, isto é, deseja o
conhecimento, o estima, o procura e o respeita”.
Aqui, há uma observação que tem de ser feita sobre o preconceito que se tem,
muitas vezes, contra a filosofia. Tal observação o faço em nome do bom senso
para quem está iniciando o conhecimento do mundo maravilhoso da Filosofia:
quando uma pessoa ou um(a) aluno(a) diz: “a filosofia é muito chata — ‘aff ’ —,
por isso, eu não gosto dela”, devemos entender melhor essa indignação e repulsa
bem como colocá-la em seus devidos termos. Então, vejamos: agora que você
está conhecendo, de forma introdutória, a origem da palavra “filosofia”, você já
tem uma ideia de quem estuda filosofia não é um deus ou uma pessoa melhor do
que a outra, mas, apenas, e tão somente, uma pessoa igual a você, um ser huma-
no que, apenas, gosta do saber, é um amigo da sabedoria, somente. Outra coisa
importantíssima é que quem buscar a sabedoria ou conhecimento irá se deparar
33
com a sua própria miserabilidade intelectual, isso porque, cada vez que procura
UNIDADE 1

e acha algo que lhe dá melhor entendimento, a própria pessoa se descobre como
ignorante; por isso, já dizia o velho e bom filósofo Sócrates, “Só sei que nada sei”
(CORTELLA, 2019, p. 23).
Caro(a) aluno(a), é claro que Sócrates não era um “burrão”, mas ele, também,
não se compreendia como um “sabichão”. Ele, realmente, aprendia com as pessoas e
acreditava que o conhecimento do mundo era maior do que ele. Diante disso, peço
que leia bem devagar: o único caminho moral e ético de quem estuda, principal-
mente, filosofia, é o caminho da humildade e do autoconhecimento. No entanto
acredito que, se você teve essa infeliz experiência de estudar filosofia e concluiu
que ela é chata e o fez com que não gostasse de filosofia, possivelmente, é porque
você deva estar se referindo a uma determinada situação ou pessoa com quem
estudou ou que as pessoas, com quem conviveu, não se interessavam em conhecer
as coisas de forma mais aprofundadas; sendo assim e dessa maneira, o que pôde
ter ocorrido é que você, caro(a) aluno(a), teve contato com a filosofia por meio de
pessoas que não se interessam, não têm curiosidade e se acham donas do saber,
são pessoas arrogantes e prepotentes, que não tem nada a ver com o espírito de
quem estuda filosofia ou quer conhecer mais e melhor as coisas. Portanto, lembre-
-se sempre do sentido original da palavra “filosofia”: pessoas iguais, amigos, que
buscam o saber, a sabedoria. Entendeu? Ficou bom? Dessa forma, continuaremos
nossa aula, buscando identificar as características do pensar filosófico.
Quando dizemos que Edson Arantes do Nascimento, vulgo Pelé, é o rei do fu-
tebol, queremos dizer que essa pessoa, Pelé, é um excepcional jogador, o melhor de
todos, mas, em hipótese nenhuma, diz-se que ele é o único ou que não há outros
jogadores que não sejam muito bons ou bons jogadores, bem como não se afirma
que Pelé é o fundador do futebol. Assim, também, ocorre quando estudamos sobre
o surgimento da filosofia. Há vários personagens e figuras que se constituem como
importantes na história do pensamento filosófico; na filosofia, um tipo de Pelé foi o
filósofo Sócrates e este era tão importante, que sua vida e obra se tornaram um marco
divisor da cronologia da história da filosofia. Assim como Jesus Cristo é, em especial,
para o Mundo Ocidental, um marco divisório da história, antes e depois de Cristo
(a.C. e d.C.), na filosofia, também, ocorre essa distinção dos filósofos que existiram
antes e depois da existência de Sócrates, ou seja, recebem a alcunha de os Pré-socrá-
ticos (antes de Sócrates) e os Pós-socráticos (depois de Sócrates) (ARANHA, 2012).
Confere-se, por sua vez, ao filósofo grego Pitágoras de Samos (V a.C.) por ter
criado a palavra “filosofia”. Ele teria dito que a sabedoria plena e completa pertence,
34
somente, aos deuses, mas que os homens poderiam desejá-la ou, até mesmo, amá-

UNICESUMAR
-la, tornando-se filósofos. Chauí (2015) nos informa que Pitágoras teve um pensa-
mento bem objetivo e claro sobre o papel do filósofo. Esse filósofo disse, certa vez,
comparando as pessoas que iam aos jogos olímpicos de sua época, esses mesmos
que assistimos até hoje pelos meios de comunicação: os comerciantes, que faziam
negócios; os competidores, que disputavam os jogos; e os contempladores, que as-
sistiam aos jogos, que esses últimos, portanto, iam para contemplar os jogos, avaliar
o desempenho e julgar o valor dos que ali se apresentavam. Chauí (2015), compa-
rando esse público observado por Pitágoras, como se fosse filósofo, comenta que
ele não age como um comerciante ou proprietário que tenha algo para comprar ou
possuir, bem como não age pela adrenalina de um competidor; por fim, não utiliza
das ideias como condição para vencer seus opositores, mas age pelo simples desejo
de observar e contemplar, de forma avaliativa, a vida, ou seja, pelo simples prazer
do saber das coisas.
Segundo, Aranha e Martins (2013), a filosofia nasceu por volta dos séculos VII
e VI a.C., na Ásia Menor, na cidade de Mileto. Considera-se que o primeiro filósofo
foi Tales de Mileto (ARANHA; MARTINS, 2013). A filosofia tratava, inicialmente,
do conhecimento cosmológico, denominado cosmologia, ou seja, o estudo racional
sobre o mundo ordenado da Natureza. Para você fazer uma ideia, caro(a) aluno(a),
tudo era muito rudimentar em relação aos nossos dias, que temos estudos avança-
dos em astronomia com potentes equipamentos tecnológicos de altíssima precisão
e alcance. Assim, a maneira encontrada pelos primeiros filósofos para conhecer o
mundo e tudo que nele havia, foi fazendo perguntas, por exemplo:“por que os seres
nascem, crescem, desenvolvem, envelhecem e morrem?”, “por que a vida está em
constante mudança?”,“por que há coisas que mudam mais rápido do que as outras?”.
Quem faz um excelente estudo sobre as características peculiares da filosofia,
desde o seu surgimento e desenvolvimento, é a filósofa brasileira Marilena Chauí,
professora aposentada da Universidade de São Paulo (USP), quando se debruça
em buscar as possíveis definições do que possam vir a ser “Filosofia”. Assim, ela
nos informa que há, pelo menos, quatro definições gerais do que seria a Filosofia,
vejamos: (1) visão de mundo de um povo, de uma civilização ou de uma cultura;
(2) sabedoria de vida; (3) esforço racional para conceber o Universo como uma
totalidade ordenada e dotada de sentido e (4) fundamentação Fundamentação
teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. Sobre essa última definição, a
própria Chauí (2015, p.15) faz o seguinte comentário:

35

A Filosofia, cada vez mais, ocupa-se com as condições e os princí-
UNIDADE 1

pios do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a


origem, a forma e o conteúdo dos valores éticos, políticos, artísticos
e culturais; com a compreensão das causas e das formas da ilusão e
do preconceito no plano individual e coletivo; com as transforma-
ções históricas dos conceitos, das ideias e dos valores.

Outra questão importante para se caracterizar o pensar filosófico e para que ele
não se confunda com outras formas de pensamento bem como para que você,
também, não pague “mico” por aí, é a seguinte: distinguir filosofia de outras ati-
vidades do pensar humano. Assim, Chauí (2015, p. 16) enfatiza essa diferença:


A Filosofia não é ciência: é uma reflexão crítica sobre os procedi-
mentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão crítica
sobre as origens e formas das crenças religiosas. Não é arte: é uma
interpretação crítica dos conteúdos, das formas, das significações das
obras de arte e do trabalho artístico. Não é sociologia nem psicologia,
mas a interpretação e avaliação crítica dos conceitos e métodos da
sociologia e da psicologia. Não é política, mas interpretação, com-
preensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas do poder.
Não é história, mas interpretação do sentido dos acontecimentos
enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio
tempo. Conhecimento do conhecimento e da ação humanos, co-
nhecimento da transformação temporal dos princípios do saber e
do agir, conhecimento da mudança das formas do real ou dos seres,
a Filosofia sabe que está na História e que possui uma história.

Sobre o que vem a ser filosofia e sua distinção, em especial, de outras formas de
pensar, como ciência, Cortella (2019, p. 23) afirma que “Filosofia é um modo de
pensar – sistemático, organizado e método com questões precisas daquilo que
se faz – para indagar sobre os porquês. E por que não é como. Quem pergunta
pelo como é a ciência”. Mariano (2007, p. 38-39) ressalta que há características
do pensar filosófico, como a reflexão filosófica, que podem ser compreendidas
por meio de três atitudes, sendo elas: a criticidade, a radicalidade e a totalidade.
Vejamos, uma a uma, então:
1. Criticidade: a palavra “crítica” tem vários sentidos, como a arte de julgar o
valor, de examinar, discernir, construir critérios ou, ainda, colocar o objeto
observado em crise para ver se é falso ou verdadeiro. Portanto, a criticida-
36
de chama a atenção para uma atitude de questionamento minucioso com

UNICESUMAR
critério. Por isso, é necessário ter o cuidado de estabelecer critérios que
definam falsidade ou veracidade. Exemplo típico disso é quando vemos
um crítico de cinema comentar um determinado filme, ou seja, ele critica
não de qualquer maneira, mas o faz usando critérios, previamente, esta-
belecidos; portanto, a crítica feita sempre a partir de um ponto de vista.
2. Radicalidade: outra característica da filosofia é buscar a origem do pro-
blema, e esse ato é chamado de radicalidade, não no sentido popular, como
os adolescentes usam: “cara irado, radical demais”, mas como sentido de
buscar as origens ou as causas primeiras de uma determinada questão
estudada. Portanto, buscam-se as raízes, os fundamentos, os princípios de
um objeto pesquisado. Veja o exemplo: diante de um problema que ocor-
reu no trabalho, buscam-se as causas que geraram tal situação-problema,
ou seja, o ato de radicalidade é identificar o que originou ou ocasionou
tal situação-problema.
3. Totalidade: por fim, a totalidade é uma marca bem clara da filosofia, e ela
é diferente da ciência. Preocupa-se com o particular, o específico, é aquela
que se volta para a totalidade das coisas, pois a filosofia compreende que
a realidade é sempre multifacetada. A filosofia está interessada, portanto,
na reflexão sobre a totalidade e a abrangência da questão observada ou
estudada. Pode-se fazer os seguintes questionamentos que nos levem a
refletir sobre outros aspectos mais abrangentes, como: quais as causas?
Quais são as áreas? Quais as implicações? Quais as relações que podem
ser feitas ou estarem implicadas?

Nesse sentido, Chauí (2015) corrobora quando explica que uma das caracterís-
ticas peculiares e fundamentais da filosofia é a atitude filosófica, ou seja, uma
atitude de perguntar pela natureza das coisas é, por exemplo, perguntar: o que
é o tempo?”, ao invés de perguntar: “que horas são ou que dia é hoje?”. Assim,
utilizando esse raciocínio, a Filosofia é “a decisão de não aceitar como óbvias e
evidentes as coisas, as ideias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos
de nossa existência cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado
e compreendido” (CHAUÍ, 2015, p. 9). Logo, nessa atitude filosófica, tem-se a
atitude de criticidade, de questionamento, de indagação, de reflexão. Sobre essa úl-
tima atitude, de reflexão, muito importante para todos nós seres humanos, Chauí
(2015, p. 13) comenta que:
37

Reflexão significa movimento de volta sobre si mesmo ou movi-
UNIDADE 1

mento de retorno a si mesmo. A reflexão é o movimento pelo qual


o pensamento volta-se para si mesmo, interrogando a si mesmo. A
reflexão filosófica é radical porque é um movimento de volta do
pensamento sobre si mesmo para conhecer-se a si mesmo, para in-
dagar como é possível o próprio pensamento. Não somos, porém,
somente seres pensantes. Somos também seres que agem no mundo,
que se relacionam com os outros seres humanos, com os animais,
as plantas, as coisas, os fatos e acontecimentos, e exprimimos essas
relações tanto por meio da linguagem quanto por meio de gestos
e ações. A reflexão filosófica também se volta para essas relações
que mantemos com a realidade circundante, para o que dizemos e
para as ações que realizamos nessas relações. A reflexão filosófica
organiza-se em torno de três grandes conjuntos de perguntas ou
questões: 1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que di-
zemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões
e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dize-
mos, fazermos o que fazemos? 2. O que queremos pensar quando
pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos
fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que
pensamos, dizemos ou fazemos? 3. Para que pensamos o que pen-
samos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual
é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?

Por fim, Cortella (2019, p. 23) ressalta a preocupação atual da filosofia:


A Filosofia se preocupa em pensar as razões da existência. Pensar
aquilo que, de fato faz com que o ser humano tenha sentido. Por
exemplo, do que é feita a realidade? Por que é deste modo e não de
outro? Qual o propósito que as pessoas dão à vida? Qual o lugar
do mal dentro disso? A felicidade existe ou é uma ilusão? Por que
existe alguma coisa, em vez de nada existir? Por que as coisas são
como são? Por que eu estou nessa rota? Qual a origem do mal? Por
que nós somos finitos? Para que existimos para depois deixarmos de
aqui estar? Será que essa ideia de amizade em que chamamos todo
mundo de “amigos” não é superficial?

38
Caro(a) aluno(a), para finalizar essa aula, espero passar para

UNICESUMAR
você as características do pensamento filosófico da melhor ma-
neira. Espero, sinceramente, que você não esteja entendendo
que o pensar filosófico é um mero amontoado de ideias, mas,
se você ler e reler esta aula, perceberá que a filosofia é um co-
nhecimento que se caracteriza, fundamentalmente, como uma
atitude e não, apenas, uma mera reação, e isso é muito impor-
tante, pois, quando temos atitude, temos, na realidade, uma
consciência que nos possibilita tomar decisão, agir a partir dos
nossos próprios propósitos e intentos. Contudo, quando temos
a ideia de, apenas, reagir, revelamos nossas possíveis vulnera-
bilidades e somos conduzidos a caminhos que, muitas vezes,
não queremos trilhar, assim como o grão de área é levado pelo
vento ou quando nos sentimos à deriva.

Não é sempre, mas, muitas vezes, utilizamos ou-


tras formas de pensar, como o religiosamente,
para justificar a nossa falta de entendimento
mais preciso das coisas: assim diz a letra da mú-
sica cantada por Zeca Pagodinho, em agradeci-
mento pela possível boa vida que leva o perso-
nagem da música apesar dos pesares: “Deixa a
vida me levar”. Assim diz o refrão dela: “Deixa
a vida me levar (Vida leva eu), Deixa a vida
me levar (Vida leva eu), Deixa a vida me levar
(Vida leva eu). Sou feliz e agradeço por tudo
que Deus me deu. Só posso levantar as mãos pro
céu” (VAGALUME, [2020], on-line)1. Portanto,
as atitudes, por exemplo, de curiosidade, de in-
dagação, de reflexão, de criticidade, dentre ou-
tras, assinalam, fundamentalmente, essa maneira
muito peculiar de pensar que tem atravessado
alguns séculos e promovido, de forma contribu-
tiva, ao ser humano condições existenciais, de
vida teórica e prática, de sua manutenção e do
seu desenvolvimento na face da terra.
39
5
OS TIPOS DE CONHECIMENTO
UNIDADE 1

HUMANO PRESENTES
na sociedade atual

Caro(a) aluno(a), estamos chegando ao final da nossa primeira unidade. Agora,


estudaremos os tipos de conhecimentos humanos e demonstraremos que há
razões que explicam a razão das pessoas terem maneiras diferentes de falar, en-
tender e agir na sociedade. Acredito que você já tenha percebido que um mesmo
assunto ou tema, um acidente automobilístico, como uma batida, por exemplo,
pode provocar opiniões ou versões totalmente diferentes umas das outras. E isso
não vai longe, essa situação pode ocorrer dentro da nossa própria casa, ou seja,
em uma mesma família, pode haver diferentes formas de ver, pensar e se posicio-
nar, diante dos mais diversos assuntos ou situações que acontecem no dia a dia,
por exemplo, a famosa “trinca das discórdias”, no bom sentido, é claro: futebol,
política e religião.
É importante ressaltar que, ao utilizarmos o termo “tipos” no plural e não no
singular, temos como objetivo lembrar que não existe, mesmo que haja muita
gente querendo acreditar, uma única maneira ou único modo de ver as coisas.
Essa crença é fruto do dogmatismo filosófico; na realidade, o ser humano co-
nhece, de forma variada, sua realidade, sua existência e o mundo que o cerca,
por isso, pensa e age diferentemente. Em uma perspectiva pedagógica, estudar
os tipos de conhecimento humano é imprescindível para que você obtenha, logo
de início, em seus estudos acadêmicos, a formação necessária em uma ou duas
formas de pensar, como sendo importantíssimas para o seu desenvolvimento
profissional; assim, referimo-nos em conhecer e aprender sobre os conhecimen-
40
tos filosóficos e científicos. Esses conhecimentos possibilitam, a meu ver, uma

UNICESUMAR
formação acadêmica mais adequada, sólida e humana. Os efeitos positivos dessa
formação, certamente, não serão sentidos, apenas, durante o período dos seus
estudos universitários, caro aluno(a), mas acredito que esses efeitos benéficos
serão sentidos, também, ao longo de sua vida profissional e pessoal, no sentido
de ter uma boa e justa serventia.
Para entendermos porque o ser humano tem mais de um tipo de conheci-
mento, explicaremos a partir do ponto de vista do comportamento humano, à luz
do conhecimento da antropologia filosófica. Dessa forma, as pessoas pensam e
agem de forma diferentes, porque elas conhecem ou apreendem o mundo, no seu
desenvolvimento físico e mental, a partir de suas primeiras experiências culturais
e, assim, quanto se tornam adultas e começam a se locomover, mudar de lugar
e se relacionar com outras pessoas, revelam suas posições e entendimentos, os
quais têm influência advinda de sua criação, formação e experiências vividas da
família, da escola e do cotidiano.
Mais adiante, trataremos os aspectos da antropologia filosófica que aborda,
especificamente, a questão cultural. Por ora, é importante saber que essas expe-
riências, adquiridas ao longo do desenvolvimento humano, dão-se no tempo e no
espaço. Período e momento são palavras sinônimos que nos remetem ao conceito
de tempo. Todo e qualquer ser humano está sujeito ao tempo, nascemos, vivemos
e morremos durante um determinado tempo, assim, pensa a maioria das pessoas.
Por sua vez, ambiente, meio e lugar são palavras sinônimas que nos remetem ao
conceito de espaço. Nessa direção, é comum falar, não sei se você já disse isso,
conversando com um amigo ou amiga: “você não é daquele tempo” ou “aquele
tempo que era bom!”, referindo-se a um determinado período e lugar vividos,
bem como emitindo um juízo de valor sobre eles. São frases que nos remetem
aos conceitos de tempo e de espaço, respectivamente. Por exemplo, hoje, o tempo
da criança é diferente do tempo do adulto, no sentido de qualidade existencial
do tempo não quantitativo, mas qualitativo.
Em nossa cultura, há o tempo do adulto, o do trabalhar, e o tempo da criança,
o do brincar; este, por conseguinte, para a criança, é um momento que se presen-
tifica, que se inicia e se encerra nos próprios acontecimentos, que são esperados,
ansiosamente, para acontecer. Nesse sentido, o tempo revela, também, o espaço,
o ambiente, um determinado contexto: o tempo de jogar bolinha de gude, burca,
burquinha, peteca, bila, dentre tantos outros nomes, ou soltar ou empinar pipa,
papagaio, pandorga ou raia, dentre, também, tantos outros nomes, que são uti-
41
lizados pelo povo em nosso país. Essas eram algumas das atividades de criança
UNIDADE 1

(naquela época, a maioria que brincava com essas atividades era os meninos,
as meninas brincavam de boneca e de casinha) que ocorriam em um determi-
nado tempo e espaço. Dizia-se, naquela época, assim: “agora é tempo de soltar
papagaio”, “agora é tempo de jogar bolinha ou brincar de patinete ou carrinho de
rolimã” etc., aí, todo mundo fazia o que era o tempo de fazer. Engraçado, não é?
É verdade, porém, que há crianças que crescem e não deixaram de ser crianças;
como adultas, essas pessoas continuam brincando de bolinha de gude, soltando
pipa ou empurrando carrinho de rolimã ladeira abaixo ou, mais recentemente,
jogam videogames com os seus filhos e filhas, sabe por quê? Porque essas pes-
soas viveram em um tempo/espaço determinado, que as marcou afetivamente
e, assim, compreenderam que esse tempo/espaço lhes foram muito bom e lhes
fizeram muito bem o fato de pensar sobre o tempo e o lugar em que viveram como
crianças. Assim, quando essas pessoas, hoje, agora, adultas emitem seus juízos
ou se manifestam sobre qualquer tema, as brincadeiras do seu tempo/espaço
de criança são referências, conteúdos, princípios éticos, morais, costumes, que
pautam as suas atitudes no hoje e a sua formação, por meio do seu pensamento
e, assim, reproduzem aos seus filhos, netos e bisnetos.
Outra característica de tempo/espaço é que ambos podem mudar. Podemos
percebê-los de forma diferentes como o ato de comunicar uma determinada
situação, um evento vivido. Vamos exemplificar: quem tem mais de 50 anos de
idade nasceu antes da criação da internet, a qual ocorreu em 1969, nos Estados
Unidos. Em um passado recente, quando, ainda, era rudimentar o desenvolvi-
mento do mundo virtual e a internet não havia ganho o mundo, como hoje, as
pessoas pensavam e agiam em um tempo/espaço que parecia, repito, parecia, que
era mais longo, no sentido negativo mesmo, demorado, custoso, mas as pessoas,
naquela época e naquele espaço, não sentiam o que, possivelmente, sente-se, hoje,
quando se fala daquele tempo como sendo: “tempo difícil”, “tempo bom”, “lugar
difícil de viver”, “como tenho saudade daquele tempo e lugar” ou a famosa frase:
“éramos felizes e não sabíamos”.
Agora, veja essa comparação sobre a mudança da nossa percepção do tempo/
espaço e as formas qualitativa e quantitativa de tempo e espaço: quando morreu
Getúlio Vargas, presidente do Brasil, em 24 de agosto de 1954, o qual se suicidou
(COSTA, 2019), as pessoas ficaram sabendo de sua morte, por exemplo, em uma
cidadezinha do interior do Paraná, Santa Fé, três dias depois do ocorrido. A notícia,
segundo um senhor morador que viveu na época de Vagas, o qual eu o conheci,
42
chamado Lourival, disse-me que a notícia chegou a cavalo na cidade dele; isso

UNICESUMAR
mesmo, naquela época ou naquele espaço, a notícia chegava às pessoas por meio
de mensageiros que utilizavam cavalos como veículos para se comunicarem, para
levar e trazer as notícias e informações. Três dias depois da morte de Vargas, con-
siderando que a notícia saiu de uma cidade vizinha, muito conhecida no Brasil, a
cidade de Londrina, ambas do Norte do Paraná, no Sul do Brasil. Agora, veja essa
comparação, mais recentemente, sobre a comunicação, também, de uma outra
personalidade que morreu já neste novo século, 2009, o cantor americano Michael
Jackson, o rei da música Pop. Você pode imaginar quanto tempo o mundo todo
ficou sabendo da morte de Michel, inclusive, a cidade de Santa Fé no Paraná?
Em menos de 60 minutos. Isso mesmo! Em menos de 1 hora. Você sabe quantos
quilômetros tem Santa Fé à Londrina? Segundo dados aproximados, veiculados
na internet, a distância corresponde a 99,6 Km. E dos Estados Unidos ao o Brasil?
Segundo dados aproximados, veiculados na internet, a resposta é 7.300 Km. Nes-
se sentido, o tempo muda, pois as condições e as tecnologias utilizadas mudam
também, ou seja, a mudança do tempo e do espaço está relacionada às mudanças
culturais, no caso, as mudanças tecnológicas associadas à comunicação, à informa-
ção e às condições materiais e culturais de viver e de conhecer. Fantástico, não é?

O que é Conhecimento?

Pois bem, agora, ao responder esta pergunta que apresentamos, neste subtópico,
nosso objetivo é lhe proporcionar um melhor entendimento sobre a forma que
o ser humano faz para compreender o mundo que o cerca e, paulatinamente,
conhecer, também, a si mesmo. Este último objetivo, conhecer a si mesmo, é
mais complexo e demorado, portanto, é preciso que você tenha persistência. Sem
nenhum eufemismo, e sendo bem objetivo e direto, é mais difícil conhecer a si
mesmo do que quaisquer outras coisas, mas não é impossível fazê-lo; você verá!
Popularmente, conhecimento é entendido como prática de vida, experiência,
noção, discernimento das coisas, consciência de si mesmo. No sentido acadêmico,
conhecimento é um ato ou efeito de conhecer um objeto; no sentido metafórico,
como o pensamento se debruça sobre um determinado objeto, como definição,
percepção, apreensão completa, análise etc. (FERREIRA, 2004). Se você prestar
bem a atenção, perceberá que, no ato de conhecer, estão presentes dois elementos
muito importantes e indissociáveis: o primeiro refere-se ao sujeito que conhece, o
43
qual é ser humano, você; e o segundo refere-se ao objeto, o qual é conhecido pelo
UNIDADE 1

ser humano, que pode ser qualquer coisa passiva de ser observada e apreendida;
assim, pode ser um objeto material (uma empresa, um órgão do corpo humano,
uma sociedade ou um determinado povo) ou um objeto ideal (os números ou
as figuras geométricas).
Pergunto a você, mas já aviso que é uma brincadeira pedagógica: você já viu
andando por aí, em uma calçada das ruas onde você mora, o número “2”, isso
mesmo, o número “2” de mãos dadas com uma “raiz quadrada” ou uma “equação
do segundo grau”? Certamente, não! Mas eu e você dizemos que, tanto uma
raiz quadrada quanto uma equação do segundo grau, existem, são reais dentro
da nossa cabeça, de forma ideal, fazem parte, somente, do mundo das ideias, do
pensamento, porém esses objetos não são objetos materiais, como, por exemplo,
uma cadeira. Independentemente, os objetos ideais, também, fazem parte da vida
de qualquer estudante seja ele do ensino médio, seja superior, não é? Uma coisa
que já sabemos, hoje, é que ambos (sujeito e objeto) estão em constante relação.
O sujeito, o ser humano, é aquele que apreende informações a respeito do objeto
graças à capacidade intelectual e racional (HESSEN, 2003).
Para Luckesi (2002), o conhecimento é a compreensão inteligível da realidade
que o sujeito humano adquire por meio de sua confrontação com essa mesma rea-
lidade vivida. Portanto, conhecimento consiste na condição intelectual ou racional
que o ser humano tem para compreender a realidade material ou ideal que vive;
além disso, ele tem como uma das finalidades principais utilizar o conhecimento
para seu benefício próprio ou da coletividade. Essa ideia, a qual é dominadora, é
uma herança do conhecimento científico, o qual veremos mais adiante.

Os tipos de conhecimento

Ao longo dos tempos, o ser humano desenvolveu diferentes tipos de conhecimen-


to. Alguns deles têm uma estrutura bem diferente uns dos outros, cada um tem
uma maneira própria e peculiar de ser, pois eles foram construídos e constituídos
em um dado tempo e contexto social, cultural, político e econômico que os fez
ser da maneira que são. Contudo, filosoficamente, compreendemos que eles têm
um finalidade em comum: o ato de conhecer. Qualquer tipo de conhecimento,
sempre, é fruto ou resultado de uma complexa relação, no tempo e no espaço, em
um dado momento e contexto histórico próprio que os fazem surgir, um exemplo
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atual é o conhecimento tecnológico, o qual tem se desenvolvido associado ao

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nosso tempo, ao mundo capitalista e aos avanços científicos obtidos.
Desse modo, você, caro(a) aluno(a), verá alguns dos tipos de conhecimento que
mais se tem registro na sociedade e que se estuda até hoje, porém, não quer dizer
que eles sejam os únicos conhecimentos existentes. Isso não é uma mera afirmação
especulativa, mas uma pura inferência, uma vez que, hoje, constatamos a diversi-
dade, por exemplo, de seres vivos, em nossa fauna e flora, que não foram, ainda,
identificados; logo, por isso, a inferência: pode-se ter tipos de conhecimento que não
se tem informação e que circula nas sociedades, em nosso planeta. Nesse sentido,
para limitar os nossos estudos, por meio dos assuntos que trataremos, que não deixa
de ser um ato político sobre isso, estudaremos outros tipos de conhecimento, como
o tecnológico, o artístico ou político, também, mais adiante, quando tratarmos so-
bre filosofia política. Agora, veremos os cinco tipos de conhecimentos: o mítico,
o religioso, o senso comum, o filosófico e o científico. Alguns já tratamos mais
aprofundadamente, como são os casos do conhecimento mítico e filosófico.

Conhecimento Mítico

Segundo o Ferreira (2004), mito, do grego mythos, significa “fábula”. É uma nar-
rativa na qual a palavra é usada para transmitir e comunicar, coletivamente, a
tradição oral, preservando sua memória e garantindo a continuidade da cultura.
Como já abordamos anteriormente, mas é sempre importantíssimo lembrar, entre
70 mil e 30 mil anos atrás, tem-se as primeiras informações de invenção de uten-
sílios, adereços e equipamentos de uso pessoal e coletivo da Era Homo sapiens,
como locomoção, joias, armas e roupas, bem como os primeiros indícios de reli-
gião, comércio e estratificação social (HARARI, 2018). Portanto, o conhecimento
mítico é uma das formas mais elementares do pensar humano do Homo sapiens.
Segundo Harari (2018), essa forma se iniciou com a “Revolução Cognitiva”.
Naquele tempo, o ser humano começou a pensar e a se comunicar, pela primeira
vez, utilizando lendas, mitos, deuses e religiões. Pode-se dizer que a maneira que
os mitos foram utilizados revelou uma espécie de linguagem ficcional, representa-
tiva e simbólica muitíssima peculiar e distinta dos outros seres vivos (você já sabe
que os outros seres vivos se comunicam também, não sabe? Muito bem, vamos
continuar). Isso quer dizer, então, que os mitos foram e, ainda, são utilizados para
“explicar” a origem do mundo, da espécie humana, dos povos e das comunidades
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existentes sobre a face da terra, por meio de uma linguagem simbólica, que se
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iniciou em um passado distante de forma oral e, depois, ganhou os espaços, res-


pectivamente, da grafia pictórica e da escrita. Na verdade, os mitos têm a ver com a
existência real e vivida de cada ser humano, as formas diversas de coletividade que
se desenvolveram e a capacidade inicial do ser humano de se autocompreender e
se manifestar sobre e diante do mundo.
Os mitos têm uma regra própria que não se relaciona, qualitativamente, com a
racionalidade. Eles são marcados por uma relação afetiva intrínseca e necessária à
existência humana. Transmite-se algo que se acredita como verdade inquestioná-
vel. Neste conhecimento, não há questionamentos, como ocorre no conhecimento
filosófico ou científico, via de regra. Nesse sentido, os mitos são um sistema sim-
bólico oficial bem como uma conduta verbal de significados que objetivam dar
sentido existencial à vida, ao longo do tempo; assim, compreende May (1992, p. 14)
ao afirmar que “o mito é a verdade eterna em contraste com a verdade empírica.
Esta varia a cada manhã com as manchetes dos jornais ao publicarem as mais
recentes descobertas científicas. Contudo o mito transcende o tempo”.
Por fim, os mitos não são coisas do passado. A sociedade contemporânea
continua a produzir mitos incorporados ao dia a dia que traduzem, em parte,
entendimento da existência humana, ao longo dos tempos. Apesar de aqui e/ou
acolá se tentar negar a presença dos mitos, eles se apresentam como sendo de
extrema importância, como afirma Nietzsche (1872 apud MAY, 1992, p. 11) em o
Nascimento da Tragédia do Espírito da Música, ao dizer: “Eis aí nossa era atual...
curvada sobre o extermínio do mito. O homem hoje, despojado de mitos, perma-
nece esfomeado em meio a todo seu passado e precisa cavar freneticamente por
raízes, estejam estas na mais remota antiguidade”.

Conhecimento Religioso

Caro(a) aluno(a), inicialmente, esta forma de conhecer a dimensão religiosa ou


espiritual do ser humano nos remete ao tema da religião. De imediato, surge uma
pergunta: a religião é tão antiga quanto o ser humano na face da terra? Conforme
Harari (2018), tem-se indícios da presença da espécie humana há mais de 2,5 mi-
lhões de anos, contudo não se tem nenhuma informação ou especulação que se
remontam a essa datação sobre a vida cultural, social, econômica, política e, muito
menos, religiosa dos nossos ancestrais mais distantes. Por volta de 70 mil anos, é
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que se tem informações que circulam no mundo acadêmico, como hipóteses e

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especulações sobre o modo de vida do ser humano. Um dos estudiosos da socio-
logia, chamado Émile Durkheim, estudou a religião ao longo do tempo. Dentre
as características fundamentais, ele defende a tese de que toda e qualquer religião
apresenta dois elementos: primeiro, o sagrado em contrapartida ao profano; e o
segundo, o aspecto coletivo, social da religião (DURKHEIM, 2010). Sendo assim,
a religião produz o conhecimento religioso, ao longo do tempo, para capacitar,
intelectualmente, religiosos e seguidores de seus deuses e divindades. Exemplos: os
deuses gregos e romanos, o Deus dos hebreus, do Cristianismo e do Islamismo e as
divindades, como o deus Sol, a Natureza, além de seres humanos que se tornaram
entes sagrados, como, no Budismo, Buda e, no Cristianismo, Jesus Cristo, por meio
de seus ensinamentos e conhecimentos deixados oralmente e que, posteriormente,
foram organizados e se tornaram escritos e livros sagrados até hoje, como o Tripi-
taka, no Budismo, e a Bíblia, no Cristianismo.
Nesse sentido, o conhecimento religioso é dogmático, é inquestionável, em
que os valores e os fins são objetivos, dados, todo baseado na autoridade revelada,
por meio da tradição escrita (a Bíblia, no Cristianismo), ou, na autoridade pessoal,
por meio da tradição oral (tradição indígena) (LAKATOS; MARCONI, 2011).
Este conhecimento utiliza símbolos e ritos para ensinar sobre os ensinamentos
e as doutrinas. Um bom exemplo é o simbolismo, que representa o altar para as
religiões, o espaço de adoração da divindade. Ele afirma a majestade da divindade.
Assim, todas as religiões têm seus símbolos e ritos, e esses símbolos, por sua vez,
podem ser objetos ou pessoas. Na religião muçulmana, temos o Alcorão, um livro;
no Cristianismo, o padre e o pastor, como autoridade religiosa; no Candomblé, a
mãe e o pai de santo, como guias espirituais. Esses são símbolos de autoridade e res-
peito, os quais têm toda a confiança e são os representantes legítimos da divindade
na face da terra. Portanto, o conhecimento religioso busca, ainda, dar “explicações”
para os fenômenos naturais, humanos e espirituais e oferecem modelos de com-
portamento e de entendimento integradores do mundo e da vida, dando, assim,
sentido e segurança ao ser humano para viver e agir diante do presente e do futuro.

Conhecimento Filosófico

Caro(a) aluno(a), como já abordamos, detalhadamente, o pensamento filosófico,


salientaremos uma das principais características desse conhecimento: a racionalidade
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com destaque para o uso de argumentos racionais e lógicos. Sendo assim, a atividade
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filosófica é, tipicamente, argumentativa, e, para que isso ocorra, é necessário criar ou


criticar argumentos (LUCKESI, 2002). Nessa direção, a ação propriamente dita da
Filosofia é pensar de maneira reflexiva e crítica, retomando, por meio do pensamento,
acontecimentos que já ocorreram e os colocando em um estado de questionamento
o que ocorreu, para poder agir da melhor maneira. E essa atitude é chamada de
reflexão. A Filosofia gera, portanto, um conhecimento que busca o entendimento,
de maneira mais precisa possível, sobre o ser humano e o mundo. O caminho que o
conhecimento filosófico trilha é o da razão, por isso ele é racional, reflexivo e crítico.

Conhecimento Científico

O conhecimento científico busca compreender a realidade de maneira racional,


usando experimentos científicos, descobrindo, por sua vez, relações universais e
necessárias entre os fenômenos pesquisados, o que permite prever acontecimentos
e, consequentemente, também, agir sobre a natureza observada, a partir de provas
(ARANHA; MARTINS, 2012). Este conhecimento tem o seguinte procedimento
básico: primeiro, faz-se observação, e, a partir dessa observação, levanta-se hipó-
tese(s), que é uma(s) ideia(s) que são submetidas às experimentações para ver se
ela é falsa ou verdadeira; aqui, podem surgir as provas verdadeiras ou falsas. Desse
procedimento, são tiradas, por fim, das provas verdadeiras as leis ou teorias que
servirão de orientação para as próximas ações da ciência. Portanto, o conhecimen-
to científico possui três elementos fundamentais, sendo eles: a observação, a razão
e a experiência (no sentido de fazer experimento de provas). As principais carac-
terísticas do conhecimento científico são, conforme Lakatos e Marconi (2011):
■ Factual: o conhecimento científico é factual, pois aborda ou trata de ocor-
rências da realidade.
■ Contingente: quando as proposições têm veracidade ou falsidade testada
por meio da experimentação.
■ Sistemático: é quando há um saber lógico, formando um sistema, uma
teoria, e não conhecimentos dispersos ou amontoados de ideias, como
se vê no conhecimento senso comum.
■ Verificável: no sentido de que um conhecimento só é válido quando esse
pode ser comprovado com provas balizadas cientificamente.

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■ Falível: o conhecimento científico é falível, pois este não é absoluto ou

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final, mas progressivo.

Conhecimento Senso Comum

Caro(a) aluno(a), para que você compreenda melhor o conhecimento senso co-
mum, peço que você o relacione com o conhecimento científico, que acabamos
de estudar, no subtópico anterior. O conhecimento senso comum, por sua vez,
também, é conhecido como empírico; é um tipo de conhecimento que não é
regido pelo rigor metodológico nem pela racionalidade científica, mas, sim, ba-
seia-se na experiência pessoal. Nesse sentido, os ditados populares, por sua vez,
são exemplos típicos desse tipo de conhecimento, assim sendo, veja os exemplos:
■ A saliva de uma pessoa que sofre de epilepsia pode transmitir a doença.
■ Comer manga com leite faz mal.
■ Grávidas perdem dentes, pois o bebê absorve todo cálcio do organismo delas.
■ Reumatismo é doença de velho.

Portanto, o senso comum é um conjunto de concepções aceitas como verdadeiras,


como os exemplos citados anteriormente. Muita gente, realmente, acha que essas
concepções são verdades absolutas, pois entendem que, se ocorreram com elas,
também, ocorrem com todas as pessoas e todas as vezes.
Historicamente, segundo Santos (2002), o conceito filosófico de senso comum
aparece no século XVII, com a burguesia, em dois momentos e sentidos, diame-
tralmente, opostos. Olhar o contexto social da época nos ajuda a entender melhor,
vejamos: no primeiro momento, o sentido de um conhecimento positivo era dado
por uma burguesia que defendia o conhecimento senso comum como conheci-
mento importante e necessário, pois interessava a ela sua ascensão ao poder. Nesse
sentido, o conhecimento senso comum é compreendido como natural, razoável,
prudente. No segundo momento, o sentido de um conhecimento negativo era
dado por uma burguesia que combatia seus opositores, afirmando que os seus
entendimentos, conhecimentos sobre ela estava balizada pela irracionalidade,
e esses opositores eram, intelectualmente, inferiores, ou seja, utilizavam de um
conhecimento senso comum. Atualmente, vigora uma compreensão negativa
do conhecimento senso comum, ele é visto como um conhecimento superficial,

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ilusório, falso, mitificado e mistificador. Santos (2002, p. 56), porém, difere dessa
UNIDADE 1

compreensão, entende que há:


[...] uma aproximação do conhecimento do senso comum ao conhe-
cimento científico com a da descrição de algumas características do
próprio senso comum, tais como causa e intenção; prática e prag-
mática; transparência e evidência; superficialidade e abrangência;
espontaneidade; flexibilidade; persuasão.

É importante, no entanto, ressaltar que o conhecimento senso comum é um co-


nhecimento diferente do científico, que não é especializado; no sentido científico
do termo, portanto, não há sistematização e organização metódica. Uma relação
entre conhecimento senso comum e o científico pode ajudar a entender melhor essa
questão, veja o exemplo: o conhecimento do senso comum advém da experiência de
vida transmitida oralmente, de geração a geração, por meio do contato pessoal ou via
internet, enquanto o conhecimento científico, por seu turno, advém do experimento
realizado sistemática e metodologicamente construído. Sendo assim, a experiência
origina-se da relação empírica que se dá na relação comum das pessoas. Portanto,
pode-se diferenciar o experimento da vivência do experimento da ciência, ou seja, o
primeiro procede das percepções cotidianas ocasionais e, daí, resulta à experiência,
enquanto o segundo procede do experimento (ou experimentação), do plano da
pesquisa científica, associado ao experimento que pode ser realizado, também, em
um trabalho de laboratório ou de campo. Veja, a seguir, as principais características
desse conhecimento, segundo Lakatos e Marconi (2011, p. 45-46):


Assistemático – não há uma ordem sistemática ou organização de
conjunto. Este conhecimento nasce da tentativa do ser humano resol-
ver os problemas do dia a dia; Empírico – a base deste conhecimento
está na simples experiência pessoal das pessoas; Ingênuo – Não há
questionamento ou problematização da realidade de maneira objetiva
e crítica; Presa fácil das aparências – Este conhecimento fica preso
à aparência e não aquilo que é real. Por exemplo, parece que o sol
gira em torno da terra, que permanece parada ao centro do univer-
so. Contudo, sabemos hoje cientificamente que é a terra que gira em
torno do sol; Fragmentado – Não há uma percepção mais elaborada
e complexa como estabelecer conexões onde estas poderiam ser veri-

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ficadas sistematicamente. Por exemplo: para a pessoa comum é difícil

UNICESUMAR
fazer ligação entre combustão e a respiração; Particular – este conhe-
cimento tem um método restrito. A partir de uma parcela restrita da
realidade faz generalizações muitas vezes apressadas e imprecisas, não
considerando a realidade com um todo. Subjetivo – este conhecimen-
to é subjetivo quando se avalia a partir de um único sujeito sem se
preocupar com os demais, por exemplo, temperatura, valor e juízo a
respeito das coisas: moda, costumes, sabor, beleza, etc.

Caro(a) aluno(a), os tipos de conhecimento humano estão presentes na socie-


dade humana, desde o passado até o presente, de forma distinta e misturada,
por exemplo, a figura de uma pessoa que se considera e se diz um(a) filósofo(a)
cientista crente, como uma relação ou síntese de conhecimentos apreendidos, não
somente individualmente, mas como um símbolo coletivo. Portanto, a presença,
em alta ou não, de um determinado conhecimento, por sua vez, está relacionada,
especificamente, a uma conjuntura política, social e cultural de tempo e de espaço,
ou seja, a um contexto histórico.

explorando Ideias

A neuropsicologia é uma ciência do século XX, que se desenvolveu, inicialmente, a partir


da convergência da neurologia com a psicologia, no objetivo comum de estudar as modifi-
cações comportamentais resultantes de lesão cerebral. Atualmente, podemos situá-la em
uma área de interface entre as neurociências (neste caso, ela, também, pode ser chamada
de neurociência cognitiva) e as ciências do comportamento (psicologia do desenvolvimen-
to, psicolinguística, dentre outras), entendendo que o seu enfoque central é o estudo da
relação sistema nervoso, comportamento e cognição, ou seja, o estudo das capacidades
mentais mais complexas, como a linguagem, a memória e a consciência.
Fonte: Pinheiro (2005).

pensando juntos

Para o desenvolvimento da vida acadêmica e profissional, são necessários o domínio da


língua materna e o pensar crítico e argumentativo. Assim, para se expressar bem, é ne-
cessário pensar melhor ainda.

Em geral, assim como os conhecimentos mítico e religioso estão presentes, de


forma mais intensa e determinante, nas sociedades anteriores ao surgimento
51
da filosofia e da ciência, a identificação do conhecimento senso comum, como
UNIDADE 1

conhecimento de valor inferior, tornou-se mais perceptivo a partir do domínio


político-econômico do conhecimento científico, após a revolução científica, na
Europa, e os constantes avanços da ciência em nossos dias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), a nossa viagem ao mundo maravilhoso da Filosofia só está


começando. Vamos que vamos! Esperamos, sinceramente, que os temas e assun-
tos estudos, até agora, nas aulas abordadas, sobre o porquê da Filosofia hoje; a
presença da Filosofia na vida cotidiana; as características do pensar mítico e do
pensar filosófico; e os tipos de conhecimento humano presentes na sociedade
atual, tenham contribuído para a sua aproximação intelectual e para seu interesse
sobre o conhecimento da Filosofia. Assim, esperamos que tenhamos alcançado os
nossos objetivos, nesta unidade, que foram: conhecer os fundamentos do pensar
filosófico; diferenciar os tipos de conhecimento humano presentes na sociedade;
e ressaltar a importância do pensar filosófico na formação pessoal, acadêmica e
profissional.
Acredito que o pensar filosófico é um modo necessário e oportuno em uma
sociedade que é aberta ao conhecimento, como temos observado em nosso país,
com todas as suas limitações e contradições sociais e políticas, porém com marcas
imprescindíveis, como a democracia, as liberdades e a socialização do conheci-
mento, que são, ao mesmo tempo, ponto de partida e de chega para à formação
da nossa cidadania. Pense nisso! Reflita! Por isso, insistimos, caro(a) aluno(a):
continue estudando, não pare! Mantenha seus olhos fixos em seus objetivos de
vida pessoal e profissional, pois seu patrimônio intelectual é um dos poucos bens
inalienáveis que se torna inerente a você, a partir de sua aquisição. Aproprian-
do-se do patrimônio intelectual, você se fortalecerá, desenvolverá, a cada dia, e,
assim, reunirá as forças necessárias para o seu próprio crescimento.
Posteriormente, nas próximas unidades, em nossa viagem, abordaremos as-
suntos de extrema relevância, como o surgimento e o desenvolvimento da Fi-
losofia, bem como assuntos relacionados ao conhecimento humano, ideologia,
cultura, trabalho, mercado, ética, moral, sociedade, política, direitos humanos e
políticas públicas.

52
na prática

1. O ato de perguntar é fruto da nossa admiração diante do mundo e dos fenômenos


que nos acometem. Perguntar da maneira como perguntamos não é uma atitude
natural do ser humano, pois ela foi criada a partir de um determinado povo. Que
povo foi esse que criou a Filosofia? Assinale a opção verdadeira.

a) Persas.
b) Incas.
c) Chineses.
d) Gregos.
e) Maias.

2. A Filosofia faz parte do nosso cotidiano. Segundo Aranha e Martins (2013), existem
questões filosóficas presentes em nosso dia a dia. Leia os exemplos cotidianos de
cunho filosófico a seguir:

I - Quando alguém informa que horas são como forma de ser educado.
II - Quando troca de um emprego por outro, não tão bem remunerado, mas que
é mais de seu agrado.
III - Quando alterna a jornada de trabalho com a prática de esporte ou com a opção
de ficar em casa assistindo à tevê.
IV - Quando alguém decide votar em um candidato por ser de um determinado
partido.

Assinale a alternativa correta em relação aos exemplos que fazem menção às


questões filosóficas:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

53
na prática

3. Uma das formas mais antigas do pensamento humano é a forma de pensar miti-
camente. O mito tem relação com histórias, contos e lendas dos povos antigos e
atuais. Algumas dessas histórias, por exemplo, remontam a períodos muito distantes
e tinham, como principal meio de comunicação, a oralidade e não a escrita. Assinale
Verdadeiro (V) ou Falso (F) sobre as características do pensar mítico:

I - É fator estruturante mental e emocional diante de um tempo de mudanças


significativas e profundas que tem possibilitado instabilidades nos mais diversos
campos da vida.
II - É um sistema simbólico oficial bem como uma conduta verbal de significados
que tem um sentido próprio de confiança, acima de tudo, sem ter o crivo da
racionalidade crítica, à moda como conhecemos hoje.
III - É um discurso pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem como não
verdadeira a narrativa, pois confiam naquele que narra.
IV - Têm como função principal garantir a tradição e a não sobrevivência do grupo.

Assinale a alternativa correta:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

4. Pensar filosoficamente tem um modo bem peculiar de ser. Do ponto de vista histó-
rico, em seu surgimento e até hoje, segundo Chauí (2015), a filosofia tem uma tarefa
a ser cumprida. Leia as opções a seguir e assinale a alternativa verdadeira sobre
duas das principais características do pensar filosófico, desde o seu nascimento,
que o autor valoriza:

a) O pensamento científico e tecnológico.


b) O pensamento artístico e estético.
c) O pensamento crítico e argumentativo.
d) O pensamento empírico e a experimentação.
e) O pensamento religioso e a espiritualidade.

54
na prática

5. A história da humanidade é testemunha que o ser humano conhece o mundo e os


objetos que existem nele de forma diferente, e uma dessas formas é por meio do
conhecimento científico. Sobre este, leia as afirmações a seguir:

I - Usa somente a razão, o que lhe confere suas características críticas e argumen-
tativas.
II - As proposições ou hipóteses têm sua veracidade ou falsidade conhecida por
meio da experimentação.
III - É um saber ordenado logicamente, formando um sistema de ideias (teoria).
IV - A base deste conhecimento está na simples experiência pessoal das pessoas.

Assinale a alternativa correta:


a) Apenas, I e II estão corretas.
b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

55
aprimore-se

A FILOSOFIA NO MUNDO
1. Seja a filosofia o que for, está presente em nosso mundo e a ele necessariamente
se refere. Certo é que ela rompe os quadros do mundo para lançar-se ao infinito.
Mas retorna ao finito para aí encontrar seu fundamento histórico sempre original.
Certo é que tende aos horizontes mais remotos, a horizontes situados para além do
mundo, a fim de ali conseguir, no eterno, a experiência do presente. Contudo, nem
mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar à existência
do homem, aqui e agora. A filosofia entrevê os critérios últimos, a abóbada celeste
das possibilidades e procura, à luz do aparentemente impossível, a via pela qual o
homem poderá enobrecer-se em sua existência empírica. A filosofia se dirige ao in-
divíduo. Dá lugar à livre comunidade dos que, movidos pelo desejo de verdade, con-
fiam uns nos outros. Quem se dedica a filosofar gostaria de ser admitido nessa co-
munidade. Ela está sempre neste mundo, mas não poderia fazer-se instituição sob
pena de sacrificar a liberdade de sua verdade. O filósofo não pode saber se integra a
comunidade. Não há instância que decida admiti-lo ou recusá-lo. E o filósofo deseja,
pelo pensamento, viver de forma tal que a aceitação seja, em princípio, possível.
2. Mas como se põe o mundo em relação com a filosofia? Há cátedras de filosofia
nas universidades. Atualmente, representam uma posição embaraçosa. Por força
da tradição a filosofia é polidamente respeitada, mas, no fundo, objeto de desprezo.
A opinião corrente é a de que a filosofia nada tem a dizer e carece de qualquer utili-
dade prática. É nomeada em público mas - existirá realmente? Sua existência se pro-
va, quando menos, pelas medidas de defesa a que dá lugar. A oposição se traduz em
fórmulas como: a filosofia é demasiado complexa; não a compreendo; está além de
meu alcance; não tenho vocação para ela; e, portanto, não me diz respeito. Ora, isso
equivale a dizer: é inútil o interesse pelas questões fundamentais da vida; cabe abs-
ter-se de pensar no plano geral para mergulhar, através de trabalho consciencioso,
num capítulo qualquer de atividade prática ou intelectual; quanto ao resto, bastará
ter “opiniões” e contentar-se com elas. A polêmica torna-se encarniçada. Um instinto
vital, ignorado de si mesmo, odeia a filosofia. Ela é perigosa. Se eu a compreendesse,
teria de alterar minha vida. Adquiriria outro estado de espírito, veria as coisas a uma
claridade insólita, teria de rever meus juízos. Melhor é não pensar filosoficamente.

56
aprimore-se

E surge os detratores, que desejam substituir a obsoleta filosofia por algo de novo
e totalmente diverso. Ela é desprezada como produto final e mendaz de uma teolo-
gia falida. A insensatez das proposições dos filósofos é ironizada. E a filosofia vê-se
denunciada como instrumento servil de poderes políticos e outros. Muitos políticos
veem facilitado seu nefasto trabalho pela ausência da filosofia. Massas e funcioná-
rios são mais fáceis de manipular quando não pensam, mas tão somente usam de
uma inteligência de rebanho. É preciso impedir que os homens se tornem sensatos.
Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo entediante. Oxalá desapare-
cessem as cátedras de filosofia. Quanto mais vaidades se ensine, menos estarão os
homens arriscados a se deixar tocar pela luz da filosofia. Assim, a filosofia se vê ro-
deada de inimigos, a maioria dos quais não tem consciência dessa condição. A auto
complacência burguesa, os convencionalismos, o hábito de considerar o bem-estar
material como razão suficiente de vida, o hábito de só apreciar a ciência em função
de sua utilidade técnica, o ilimitado desejo de poder, a bonomia dos políticos, o
fanatismo das ideologias, a aspiração a um nome literário - tudo isso proclama a
antifilosofia. E os homens não o percebem porque não se dão conta do que estão
fazendo. E permanecem inconscientes de que a antifilosofia é uma filosofia, embora
pervertida, que, se aprofundada, engendraria sua própria aniquilação.
3. O problema crucial é o seguinte: a filosofia aspira à verdade total, que o mun-
do não quer. A filosofia é. portanto, perturbadora da paz. E a verdade o que será? A
filosofia busca a verdade nas múltiplas significações do ser-verdadeiro segundo os
modos do abrangente. Busca, mas não possui o significado e substância da verdade
única. Para nós, a verdade não é estática e definitiva, mas movimento incessante,
que penetra no infinito. No mundo, a verdade está em conflito perpétuo. A filosofia
leva esse conflito ao extremo, porém o despe de violência. Em suas relações com
tudo quanto existe, o Filósofo vê a verdade revelar-se a seus olhos, graças ao inter-
câmbio com outros pensadores e ao processo que o torna transparente a si mesmo.
Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, obser-
vam que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar, com
seus concidadãos, do destino comum da humanidade. Eis por que a filosofia não se
transforma em credo. Está em contínua pugna consigo mesma.
Fonte: Jaspers (2001, p. 138).

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eu recomendo!

livro

Filosofia: e nós com isso?


Autor: Mario Sergio Cortella
Editora: Vozes Nobilis
Ano: 2019.
Sinopse: Mario Sergio Cortella, nesta nova obra, “Filosofia: e nós
com isso?”, aborda um assunto profundo e necessário bem como
explica porque a Filosofia é tão importante para nossa vivência.
Segundo Cortella, a principal contribuição da Filosofia é criar obstáculos, de modo
a impedir que as pessoas fiquem prisioneiras do óbvio, isto é, que circunscrevem
a sua existência dentro de limites estreitos, de horizontes indigentes e de espe-
ranças delirantes. Em outras palavras, a Filosofia estende a nossa consciência e
fortalece nossa autonomia.
Comentário: aluno(a), a leitura desse livro possibilitará a você refletir, filosofi-
camente, sobre temas atuais, como trabalho, liderança, ética, ecologia, política,
mundo digital, dentre outros. Vale a pena, ter uma verdadeira conversa filosófica
ao se ler essa obra. Boa leitura!

58
anotações



































anotações



































anotações



































2
INTRODUÇÃO
À FILOSOFIA

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

PLANO DE ESTUDO
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • Preocupações da Filosofia pré-
-socrática • O legado da Filosofia Clássica • A Filosofia Medieval • A Filosofia Moderna e suas conquistas
• As marcas da Filosofia contemporânea.

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Apresentar as principais preocupações da filosofia pré-socrática • Distinguir entre os clássicos os seus
principais temas filosóficos abordados • Diferenciar os tipos de produção filosófica no Período Medieval
• Precisar, além das principais filosofias, os momentos distintos que podem ser compreendidos como
modernidade • Listar as principais marcas da filosofia contemporânea.
INTRODUÇÃO

Conhecer a história da filosofia é imprescindível para preservação da me-


mória cultural e intelectual dos povos do Ocidente, em especial, de um país,
como o nosso. Uma das grandes damas da televisão, Fernanda Montenegro,
no ano de 1992, fez uma peça publicitária sobre a preservação da memória
de um país. A vinheta televisiva era um monólogo de, apenas, um minuto,
mas que levava o telespectador(a) a uma profunda reflexão: o país que não
tem memória identitária de sua própria história — de seus cidadãos, de sua
cultura, de seus símbolos ou de seus lugares —, é um país, na realidade, sem
identidade do seu passado, do seu presente e do seu futuro; por isso, ao final
da vinheta, a atriz exclama em profundo tom de desespero: que país é esse?!
Quando se estuda um tema como o da filosofia, na condição de dis-
ciplina, necessariamente, caro(a) aluno(a), deve-se contemplar, em algum
momento, a história da filosofia, pois ela é um dos grandes bens da huma-
nidade, a filosofia expressa uma das nossas mais importantes competências
humanas, que é a capacidade cognitiva de pensar; sendo assim, a filosofia
tem “nome”,“sobrenome” e “endereço”. Por isso, estudar a história da filosofia
é um bem inestimável para a preservação da nossa própria humanidade.
Sabemos que nem todos podem gostar de filosofia, mas toda e qualquer
pessoa, de uma forma ou de outra, hoje, pode pensar filosoficamente. Nessa
direção, o conhecimento da história da filosofia, ou seja, o conhecimento
das condições e como foram constituídas as mais diversas filosofias e seus
filósofos, é um ato de preservação identitária da nossa humanidade na terra.
Assim, esta unidade tem como objetivos: apresentar as principais preo-
cupações da filosofia pré-socrática; distinguir, entre os clássicos, os seus
principais temas filosóficos abordados; diferenciar os tipos de produção
filosófica no Período Medieval; precisar, além das principais filosofias, os
momentos distintos que podem ser compreendidos como modernidade;
e listar as principais marcas da filosofia contemporânea.
1
PREOCUPAÇÕES DA
UNIDADE 2

FILOSOFIA
pré-socrática

Caro(a) aluno(a), a pergunta que surge imediatamente e tem de se responder é


a seguinte: por que o nome “pré-socrático”? Significa o quê? Significa que foram
os primeiros filósofos que fundaram a forma de pensar filosoficamente. Esta ex-
pressão – pré-socráticos” nos remente ao período anterior ao período clássico, ao
período primevo. Dessa forma, na próxima aula, estudaremos sobre as principais
marcas da Filosofia Clássica. Isso quer dizer que estudaremos alguns filósofos
que são compreendidos e valorizados pela História da Filosofia, como sendo
pensadores muito importantes até os dias de hoje. Eles marcaram não somente as
pessoas de seu tempo, mas muitas outras, mundo afora, e Sócrates foi um desses
filósofos, junto a outros dois, Platão e Aristóteles.
Sócrates, contudo, foi especial; mas esses dois últimos foram aqueles que, me-
diante o registro de seus escritos, legaram a seus leitores reflexões sobre os mais
diversos temas que se apresentaram como sendo importantes e valorizados pelos
concidadãos desses filósofos, bem como, ainda, pela humanidade dos nossos dias.
Desse modo, esses dois filósofos, Platão e Aristóteles, exercem uma forte influên-
cia em nosso jeito de pensar, agir e conceber as coisas; veja o seguinte exemplo:
você já ouviu falar sobre amor platônico? Certamente, sim! É quando a menina
ou o menino tem um amor que fica só no mundo das ideias, das fantasias, como
acontece com os colegiais que ficam apaixonados pelos seus professores. Essas
pessoas chegam a suspirar, sentem o estômago cheios de borboletas voando e os
olhos brilharem, quando seus amores entram em sala de aula: “que lindinho!”,
64
UNICESUMAR
exclama a enamorada platônica. Segundo Hobuss (2014), o Período Pré-socrático
inaugura a Filosofia, no século VI a.C., em Mileto, cidade da Jônia, colônia grega
da Ásia Menor. Nessa datação, temos o surgimento de cinco Escolas: Milesiana,
Heráclito, Pitágoras, Eleática e os Físicos Posteriores. Barnes (1997, p. 20-24), por
sua vez, ressalta que, ao longo do Período Pré-socrático, são quatro os conceitos
fundamentais que foram tratados e advogados pelos esses pensadores:


Kosmos (Universo): esse conceito pressupõe que o universo é um ser
totalmente ordenado, composto de beleza e harmonia. - Phusis (Na-
tureza): a natureza possui dois aspectos fundamentais. Em primeiro
lugar, é a natureza que subjaz a todas as coisas. Os pré-socráticos
estudam qual é a natureza das coisas, isto é, aquilo que lhe é próprio,
que lhe pertence a si mesma. - Archê (Princípio): é o princípio origi-
nário de todas as coisas, de onde todas provêm. - Logos (Razão): é o
caráter distintivo da filosofia antiga, sua característica fundamental.
Devemos dar razões, explanar, o porquê das ocorrências do mundo.

Diante disso, é importante ressaltar que os pré-socráticos foram os primeiros


pensadores a filosofar, usando as rédeas da razão, como conhecemos hoje, isso
quer dizer que eles começaram a fazer a “roda” do pensamento filosófico girar,
ou seja, foram eles que começaram a utilizar o pensamento racional ou a lógica
para explicar as coisas de forma coerente e sistemática, como fazemos hoje; isso
porque, antes deles, a explicação do mundo e de tudo que havia nele se dava, até
então, por meio das narrativas míticas, os contos e os mitos. Os pré-socráticos,
porém, começaram a explicar sobre a origem, o princípio do mundo e como era
constituída ou formada a natureza, usando uma explicação diferente, racional,
ou seja, utilizavam a razão e não mais os mitos. Era o início de tudo, se, assim,
posso chamar. Era o início de um estudo racional do universo, coisa que antes
não se tinha registro, por isso que se diz que a filosofia é uma criação, senão
completamente grega, mas tem muita coisa criada e com a marca original do
povo grego. Então, reflita sobre o seguinte exemplo: você está vendo pessoas ten-
tando explicar porque uma determinada coisa é da maneira que é, por exemplo,
“por que a grama é verde?” ou “por que ela é verde e, depois, com o tempo, ela
se torna amarela?”; você saberia me explicar por que a grama é verde e não azul
ou por que a grama de verde passa para a cor amarela com o tempo, e não azul?
65
Coisa de louco? Não! De maneira nenhuma, pelo contrário, hoje, temos a ex-
UNIDADE 2

plicação biológica vinda da ciência, resultado do pensamento filosófico construí-


do ao longo dos tempos; antes, explicavam-se essas coisas, apenas, acreditando e
ponto. Reflita: os seres humanos que assumem a responsabilidade de cuidar de
outros seres humanos, como médicos, enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas,
nutricionistas, assistentes sociais, dentre tantos outros profissionais da saúde ou
do serviço social, por exemplo, têm de conhecer o mais que puderem sobre a
vida humana e todas as coisas que estão relacionadas a esta, por exemplo, a so-
ciedade. Assim, temos que buscar conhecer, constantemente, o corpo humano e
a sociedade, pois, caso contrário, certamente, seríamos presas fáceis das doenças
e das intempéries da vida social, as quais estamos sujeitos, como a violência, a
desorganização social, os conflitos entre grupos, as contaminações, as intoxica-
ções, as epidemias, as infecções, os vírus, as bactérias, os fungos, os transtornos,
dentre outros.
Agora, você pode entender porque uma pessoa, como um médico ou um
enfermeiro, que estuda em nível superior, tem de saber bem direitinho as coisas,
mesmo que, para determinadas pessoas, isso não seja importante saber, mas,
certamente, é imprescindível para quem cuida do ser humano. Assim, podemos
constatar que o conhecimento é de suma importância para a sociedade e hu-
manidade. Os filósofos de todos os tempos, inclusive os de hoje, sempre fizeram
e fazem as suas teorias e elaborações filosóficas, a partir das preocupações que
emergem do cotidiano, assim, como já fizemos registro e estudamos na Unidade
1, o filósofo é filho de seu tempo, ele produz filosofia tendo, como ação motriz, as
suas próprias adversidades e necessidades do seu tempo, ele é, na realidade, uma
fonte de seu próprio tempo.
Nesse sentido, Chauí (2015) nos informa que os pré-socráticos faziam diver-
sas perguntas sobre o mundo natural, as existências das coisas e de seus respecti-
vos destinos. Foi, daí, que surgiu, possivelmente, as três principais perguntas que,
ainda hoje, ecoam para boa parte das pessoas, sendo elas: de onde eu vim? Para
onde eu vou? Que sentido tem a minha vida, aqui e agora? Se você nunca fez essas
perguntas, quem sabe você nunca ficou angustiado ou aflito com algo, o que acho
difícil; mas se você já ficou, certamente, já fez essas perguntas, um dia, para si; caso
não tenha ficado, pergunte para quem já ficou angustiado. Para Heidegger (1986
apud COTRIM, 2006), a angústia é uma característica da existência humana, ela

66
é efêmera e finita. Essas indagações dos primeiros filósofos, ainda, são as nossas

UNICESUMAR
mesmas perguntas, claro, diante de situações, totalmente, novas dos nossos dias.
Quem sabe eles identificaram, de forma profunda, as necessidades da alma hu-
mana. Fica a questão para você pensar!
Vamos continuar a nossa viagem? Então, as perguntas que os pré-socráticos
se faziam eram tais como essas, a seguir:


Por que os seres nascem e morrem?
Por que os semelhantes dão origem aos semelhantes?
Por que os diferentes também parecem fazer surgir os dife-
rentes?
Por que tudo muda? A criança se torna adulta, amadurece,
envelhece e desaparece.
Por que as coisas se tornam opostas ao que eram?
Por que nada permanece idêntico a si mesmo?
De onde vêm os seres?
Para onde vão, quando desaparecem?
Por que se transformam?
Por que se diferenciam uns dos outros?
Por que tudo parece repetir-se? (CHAUÍ, 2015, p. 27).

É importante registrar que, no Período Pré-socrático, havia, como ainda há hoje,


com menos intensidade é claro, explicações dadas pela religião, pelas tradições e
pelos mitos sobre todas as coisas que nos acontecem e nos preocupam, como a
morte, nosso destino, o amanhã. Veja o quadro comparativo a seguir, apresentado
por Chauí (2015), que assinala três diferenças principais entre o jeito de pensar
mítico e o jeito de pensar filosófico, este, por sua vez, foi colocado em prática
pelos primeiros filósofos gregos:

67
PENSAMENTO MÍTICO PENSAMENTO FILOSÓFICO
UNIDADE 2

Pretendia narrar o passado ime- Preocupa-se em explicar como e por


morial, longínquo e fabuloso. que as coisas são como são.

Narrava a origem dos mundos e


dos seres que neles habitam por Ao contrário, explica a produção natural
meio de genealogias e rivalidades das coisas por elementos e causas natu-
ou alianças entre forças divinas rais e impessoais.
sobrenaturais e personalizadas.

Ao contrário, não admite contradições,


Não se importava com contra-
fabulação e coisas incompreensíveis,
dições. Criava, cegamente, sem
mas exige que a explicação seja coeren-
duvidar.
te, lógica e racional.

Quadro 1 - Pensamento Mítico e Pensamento Filosófico / Fonte: Chauí (2015).

Como nos informam Aranha e Martins (2013), contudo, essas explicações mí-
ticas haviam perdido sua força, pois não convenciam nem satisfaziam a quem
desejava conhecer, mais a fundo, a verdade sobre o mundo e as coisas que há nele.
Por que não mais satisfazia as pessoas daquele tempo? Essa é uma boa pergunta
filosófica. Curioso? Continuemos, então! Portanto, ressaltaremos, aqui, uma das
marcas muito importante para seu conhecimento e entendimento do por que
surgem os mais diversos questionamentos, em um dado momento, sobre um
jeito de pensar, (como o pensar mítico, que já havia, praticamente, conquistado
ou dominado a mente das pessoas), isto é, como se, de repente, mas não é, sur-
gissem questionamentos a essa determinada forma de pensar, como se nunca ela
fosse tida como um pensamento da maioria. Intrigante, não é? Mas como assim?
O que aconteceu? As pessoas não sabem o que pensar? Não sabem o que fazer?
Nada disso. A resposta desses questionamentos vem das ciências sociais e das
condições históricas de cada época. São as condições históricas de cada época,
que produz e se torna constituinte um determinado jeito de pensar. Esse jeito
que os filósofos pré-socráticos começaram a pensar, eles chamaram de “filosofia”;
esse jeito, por sua vez, segundo Chauí (2015), tinha estas características: racional,
lógico e sistemático. Outras marcas ressaltadas por Chauí (2015), sobre o jeito de
pensar pré-socrático, eram as formas originais de tratar as próprias mudanças que
eles viviam na época deles, como, por exemplo: em relação aos mitos, eles eram
racionalizados, os deuses eram humanos; em relação aos conhecimentos, eles
eram universais e não, somente, práticos, para o uso direto na vida; em relação
68
à organização social e política, os Pré-socráticos criaram, além da Ciência ou da

UNICESUMAR
Filosofia, também, a política, e, por fim, em relação ao pensamento, inventaram
a ideia ocidental da razão como um pensamento sistemático que segue regras,
normas e leis de valor universal. Sobre, ainda, as condições históricas, propria-
mente ditas da época, Chauí (2015) apresenta as seguintes condições:


• As viagens marítimas.

• A invenção do calendário.

• A invenção da moeda.

• O surgimento da vida urbana.

• A invenção da escrita alfabética.

• A invenção da política.

• A ideia da lei como expressão da vontade de uma coletividade


humana.

• O surgimento de um espaço público.

• A política estimula um pensamento público, que se ensina, trans-


mite, comunica e discute.

Então, o que faz as pessoas pensarem como pensam é uma relação de duas vias:
uma via, a qual chamaremos de “prática, vivência cultural” e a outra via, chama-
remos de “pensar e refletir sobre aquilo que se faz”. Assim, temos o surgimen-
to, sempre, de um jeito de pensar novo, porque o ser humano, nesse sentido,
sempre, se renova, justamente, porque lhe surgem novas situações, sempre, que
lhe preocupam, e ele precisa pensar sobre para resolver tal situação. Portanto, o
pensamento filosófico foi um jeito que os gregos encontraram para encontrar
solução as suas preocupações, e que, ao longo dos tempos, esse jeito foi renova-
do e transformado pelos muitos pensadores, que, hoje, chamamos “pensadores
clássicos”. “Da Grécia até a contemporaneidade, a filosofia é dividida em escolas
filosóficas, organizadas de acordo com o período histórico e as principais carac-
terísticas de pensamento” (CRUZ, 2018, on-line)2. Sendo assim, veremos as escolas
pré-socráticas, os filósofos que compunham essas escolas e seus pensamentos, de
forma sintética, conforme Hobuss (2014).
69
Filósofos da Escola Jônica: Tales de Mileto, Anaxímenes de Mileto, Anaxi-
UNIDADE 2

mandro de Mileto e Heráclito de Éfeso.


■ Na região da Jónia, no século VII a.C., pode-se dizer que é o local onde
se tem as primeiras elaborações racionais de descrição e explicação da
natureza do mundo, e, neste lugar, tipicamente central, em que há o en-
contro entre povos diversos e suas respectivas culturas, era necessário um
pensamento estruturado e racional para dar conta de explicar a natureza
e seus fenômenos, por exemplo.
■ Essa escola se desenvolveu em Mileto, na Jónia, e teve Tales de Mileto,
como um dos seus principais representantes.
■ Os filósofos desta escola tinham, como foco de observação, a natureza.
O que lhes interessava, essencialmente, era o problema cosmológico; o
homem era, apenas, um ser, entre os outros, que constitui a natureza.

É importante ressaltar que as preocupações sobre o ser humano, questões antro-


pológicas, só iriam aparecem, como objeto da filosofia, de fato e propriamente
dito, a partir de Sócrates.
Filósofos da Escola Itálica: Pitágoras de Samos, Filolau de Crotona e Ár-
quitas de Tarento.
■ Na região de Itálico, em Samos, a escola de Pitágoras, um centro de for-
mação, tinha, como objetivo, a formação e dedicação do filósofo na busca
da sabedoria com rigor e muita disciplina.
■ Essa escola valorizava muito o estudo da matemática. Os números eram
os princípios de todas as coisas e não a substância que advinha da nature-
za, como a água, o infinito, o ar, o fogo, os átomos, as sementes indivisíveis
ou qualquer outro elemento.

Filósofos da Escola Eleata: Parmênides de Eléia e Zenão de Eléia.


■ Essa escola tem o seu nome derivado da cidade de Eleia, ao sul da Itália.
■ A explicação do mundo natural não se encontra, portanto, na própria
natureza, mas, sim, no mundo abstrato e apresenta o primeiro sopro de
uma lógica e de uma metafísica.
■ Os filósofos defendiam a existência de uma realidade única, eram consi-
derados como monistas.

70
■ Diferentemente da escola jônica, especificamente a de

UNICESUMAR
Heráclito de Éfeso, não acreditavam na existência da
pluralidade do real, ou seja, a realidade sempre estaria
em constante movimento, dinamicidade, como profes-
sava Heráclito. Portanto, para essa escola, a realidade era
imóvel, única, eterna, imutável, sem princípio ou fim,
contínua e indivisível.

Filósofos da Escola da Pluralidade: Empédocles de Agrigento,


Anaxágoras de Clazômena, Leucipo de Abdera e Demócrito de
Abdera.
■ Essa escola admitia que não há um princípio único que
explique todo o universo, mas este foi originado pela
composição de diversos princípios.
■ Para Empédocles, são quatro os elementos fundamentais:
terra, fogo, água e ar.
■ Para Anaxágoras, a origem do Universo está, em um
agregado de partes infinitas, em cada um.
■ Os filósofos Leucipo e Demócrito atribuíram a junção de
partículas invisíveis e indivisíveis de átomo.

Diante do que vimos anterior-


mente, nesta aula, pode-se listar
as principais marcas da filosofia
pré-socrática, conforme advoga
Chauí (2015), sendo:
■ Racionalidade.
■ Verificação.
■ Ideias Universais.
■ Recusa de explicações
pré-estabelecidas.
■ Generalização.

71
2
O LEGADO
UNIDADE 2

DA FILOSOFIA
clássica

Agora, você se deparará com as principais marcas do Período denominado “Clás-


sico” da filosofia. É importante que você sempre se lembre: toda e qualquer ideia
ou ação, que se possa estudar sobre o passado ou presente, sempre, há um deter-
minado contexto, pretexto e conjuntura. É isso aí: repita quantas vezes necessário
for; caso haja necessidade, tome essa frase como se esta fosse um verdadeiro
“mantra”. É importante ressaltar que o surgimento de ideias, pensamentos ou
ações, na história, sempre, está relacionado a uma realidade histórica multiface-
tada, que envolve as áreas culturais, sociais, antropológicas, políticas, econômi-
cas, religiosas, artísticas, dentre tantas outras. Portanto, o contexto desse período
ocorre com uma datação entre os séculos VI e IV a.C. Esse período, também, é
denominado “Período das Hegemonias”.
Do ponto de vista político, esse período assinala o domínio dos gregos, me-
diante as suas duas maiores cidades: Atenas e Esparta. Por exemplo, já no século
VII a.C., Atenas detinha grande poder econômico, mediante o desenvolvimento
do comércio e da utilização da escravidão na produção agrícola, bem como um
sistema de governo conhecido como democracia. O que isso quer dizer? Ou, dito
de uma forma diferente: por que isso é importante para os seus estudos, caro(a)
aluno(a)? Porque, tanto Sócrates quanto Platão e Aristóteles, certamente, contri-
buíram para o desenvolvimento e construção desse domínio grego na época de
então; todavia esses filósofos, também, só puderam se constituir como filósofos
ditos clássicos da Grécia Antiga porque a realidade histórica (uma determinada
72
economia e forma de governar), em que eles viveram e estavam inseridos, pos-

UNICESUMAR
sibilitou o surgimento das preocupações, das elaborações, das fertilizações e das
consagrações de suas ideias; e essas ideias, por sua vez, marcaram e proliferam,
significativamente, não somente o mundo grego, mas também o mundo romano;
assim, foram sendo transmitidas essas ideias até aos mais diversos rincões do
nosso planeta chegando até você, nos dias de hoje.
O Período Clássico, se assim pudéssemos imaginá-lo, como um grande guar-
da-chuva, pode ser denominado “Período Antropológico”. Portanto, antropolo-
gia quer dizer estudo sobre o ser humano. Se, antes, com os pré-socráticos, as
preocupações estavam relacionadas à origem e à constituição do universo com
os clássicos, as preocupações estão voltadas, intensamente, para os “ântropos”
(ser humano). Consequentemente, foi com Sócrates, apesar de não ter deixado
registros escritos, que ocorreram as primeiras ideias sobre as questões humanas
envolvendo os temas da ética, da política e das técnicas; e, posteriormente, com
Platão e Aristóteles, na tentativa de sistematizar o pensamento filosófico como
um todo, à luz dos critérios da verdade e da ciência sobre a cosmologia e a an-
tropologia (CHAUÍ, 2015).
Naquele tempo, os olhares dos gregos estavam voltados para uma determi-
nada política, educação, economia e religião. Na política, apesar de cada cidade
tivesse a sua própria organização social, por exemplo, Atenas, que admitia a escra-
vidão por dívida ou guerras, enquanto Esparta possuía os servos estatais ligados
ao governo, ambas as cidades eram governadas pela oligarquia de proprietários
das terras cultiváveis, contudo buscavam e defendiam a democracia. Na educação,
Atenas e Esparta cultivavam a beleza e a virtude mediante o desenvolvimento das
artes, música, pintura, arquitetura, escultura, ou seja, de uma boa educação para a
formação de cidadãos. Na economia, por sua vez, a Grécia se baseava em produtos
artesanais, a agricultura e o comércio e, na religião, os gregos valorizavam muito
a religiosidade como forma de integração cultural. Eram politeístas e, de alguma
forma, abertos às mais diferentes experiências religiosas que se caracterizavam
entre eles pelo, então, processo expansionista e de desenvolvimento do seu do-
mínio, no mundo antigo. Conforme Soares (2011, p. 33),


[...] a época helenística se caracterizou por um conjunto de impor-
tantes transformações em diversos domínios da sociedade, incluindo
o das representações e dos sistemas simbólicos, dada a importância
dos fatores de natureza religiosa para os homens do Mundo Antigo.
73
Nesse sentido, também, a relação dos gregos com as diversas etnias, que eram
UNIDADE 2

por eles dominadas e escravizadas, eram marcadas com as suas digitais culturais
e politeístas, mas eles não ficavam ilesos, pois, também, eram atingidos pelas cul-
turas e religiosidades dos não-gregos. Quem retrata, de forma objetiva, o aspecto
religioso entre os gregos, neste período, é Soares (2011, p. 34), quando diz que:


No que concerne à religião, podemos observar uma tendência à
individualidade dos princípios religiosos (LÉVÊQUE, 1987, p. 144).
A religião helênica sempre ocupou uma posição central na pólis,
exercendo um papel de integração do indivíduo à comunidade, a
partir do cumprimento diário dos ritos (GRIJALVO, 2008, p. 122).
Não que a devoção às divindades ancestrais, como Zeus, Hera, Apo-
lo, Héracles e tantas outras pertencentes ao panteão políade tenha se
tornado repentinamente obsoleta (LÉVÊQUE, 1987, p. 147; PETIT,
1987, p. 63; SILVA, 2009, p. 89). Todavia, os gregos estavam abertos a
novas experiências religiosas (KOESTER, 2003, p. 414). Em virtude
dos novos desafios a que foram submetidos, eles não hesitaram em
experimentar outras vias de acesso às manifestações do sagrado
como forma de conforto frente aos novos rumos da vida cotidiana e
de revelação do sentido oculto das súbitas reviravoltas que atingiam
o seu mundo (BURKERT, 1991, p. 27).

Portanto, o objetivo, de uma forma geral, era garantir o crescimento, desenvolvi-


mento e domínio dos cidadãos e das cidades gregas no mundo antigo.
Nesse contexto, também, de pujança cultural, política, econômica e social, que
estão presentes os sofistas, professores ambulantes, que ensinavam aos cidadãos
a se preparar para se comunicar, pensar e se manifestar de forma qualificada na
polis, ou seja, por meio da retórica e das artes, saber se posicionar na ágora (praça
pública), espaço de disputa das ideias e assuntos de interesses dos cidadãos ate-
nienses, era essencial para a sobrevivência da vida de um cidadão.
De forma didática e objetiva, portanto, juntos, estudaremos os principais le-
gados dos três principais filósofos denominados, de forma geral, como sendo
filósofos, tipicamente, clássicos da filosofia grega: Sócrates, Platão e Aristóteles.

74
Sócrates (470 – 399 a.C.)

UNICESUMAR
Você sabia que há outra semelhança entre este Sócrates da filosofia
e Jesus Cristo? Ambos não escreveram uma única linha. Nenhum
sequer! Acredita? Mas os divulgadores e escritores de suas ideias e
pensamentos foram seus principais primeiros discípulos; no caso de
Jesus Cristo, temos a informação que foram Mateus, Marcos, Lucas,
João, Paulo, dentre outros; de Sócrates, por sua vez, o principal deles
foi Platão, e este é considerado um dos grandes intérpretes e divulga-
dor das ideias e pensamentos socráticos. São dois os temas que Platão
confere aos conhecimentos socráticos: um sobre o ser humano e o
outro sobre os sofistas, professores ambulantes da época antiga.
Um dos primeiros temas que Sócrates tratou foi a virtude; dessa
forma, para Sócrates, segundo Hobuss (2014), a virtude é conhe-
cimento, e este, por seu turno, deve ser entendido como ciência e
sabedoria, que orienta e faz com que o ser humano pratique o que é
bom e belo; assim, os homens sábios (os quais conhecem, praticam
ações belas e boas) e os que não são sábios não as fazem e, mesmo
que o tentassem fazer, não conseguiriam: “o saber é um bem, e a
ignorância é um mal”, isto assinala que o saber pode nos possibilitar
a felicidade e, assim, conduzir-nos, corretamente, ao uso dos bens,
pelo fato de possuir a ciência (ou conhecimento, ou sabedoria), que
nos proporciona tal virtude (HOBUSS, 2014). Um outro tema que
Sócrates abordou foi o método socrático, conhecido como método
dialético socrático. Esse método consistia em um exercício dialó-
gico com o interlocutor, que tinha, como característica básica, um
intercâmbio de perguntas e respostas a partir de uma proposição
inicial, posta pelo seu emissor, que deveria sustentar sua posição
diante dos questionamentos contínuos de seu interlocutor, o que,
normalmente, não ocorria, conforme Sócrates (HOBBUS, 2014).
Dessa forma, o referido método apresenta três momentos, segundo
Hobuss (2014), veja-os, caro(a) aluno(a):
I - A ironia – dissimulação do não saber – “só sei que nada sei”.
II - A refutação – desconstrução da tese do oponente.
III - A maiêutica - como um parteiro da verdade.

75
Platão (427 – 347 a.C.)
UNIDADE 2

Platão é um dos nomes fundamentais da História da Filosofia. Seus textos são,


deverasmente, ricos e de significativo teor filosófico bem como valor literário. O
exemplo mais expressivo deste filósofo é o Mito da Caverna, história alegórica
retirada de sua obra “A República”, que aborda o conhecimento humano. O refe-
rido filósofo valorizou as doutrinas escritas e as não escritas e, em relação a esta,
afirmara, certa vez, que “A escritura não aumenta a sabedoria dos homens, mas a
aparência de saber, e não reforça a memória, apenas oferece meios para “trazer à
memória” coisas que já se sabe” (HOBUSS, 2014, p. 93). Em relação às doutrinas
escritas, podemos citar os diálogos platônicos cujas doutrinas conheceram um
desenvolvimento que pode ser dividido em três períodos, segundo Hobuss (2014):
a) os diálogos socráticos, ou da juventude.
b) os diálogos da maturidade.
c) diálogos tardios.

Observa-se, nesses diálogos, que são verdadeiros diálogos, um rigor analítico


significativo sobre a teoria das ideias e os problemas relativos às questões episte-
mológicas, ou seja, sobre a natureza do conhecimento. Mais uma vez, O Mito da
Caverna é um bom exemplo; assim, segundo Chauí (2015, p. 47), esse mito tem
os seguintes elementos e respectivas representações:


O que é a caverna? O mundo em que vivemos. Que são as sombras
das estatuetas? As coisas materiais e sensoriais que percebemos.
Quem é o prisioneiro que se liberta e sai da caverna? O filósofo. O
que é a luz exterior do sol? A luz da verdade. O que é o mundo ex-
terior? O mundo das ideias verdadeiras ou da verdadeira realidade.
Qual o instrumento que liberta o filósofo e com o qual ele deseja
libertar os outros prisioneiros? A dialética. O que é a visão do mun-
do real iluminado? A Filosofia. Por que os prisioneiros zombam,
espancam e matam o filósofo (Platão está se referindo à condenação
de Sócrates à morte pela assembleia ateniense)? Porque imaginam
que o mundo sensível é o mundo real e o único verdadeiro.

Nessa mesma direção, ainda, Platão trata o tema da dialética. O filósofo entendia
que dialética é o instrumento que, a partir do qual, pelo diálogo, pode-se definir,
essencialmente, algo, como o ato de dialogar, ou seja, saber “interrogar e respon-
76
der” (HOBUSS, 2014). Outro tema abordado, ainda, é a ética e a política. Sobre a

UNICESUMAR
ética, Platão se baseou na relação felicidade e virtude. A felicidade é considerada
como a meta mais alta a ser atingida, e as virtudes são condições dessa ética que
se constitui necessariamente no contexto da pólis. Em relação à política, é clássica
sua posição sobre o governo, o qual deve ser centrado no filósofo e na ordem
estabelecida pela natureza do homem, conforme Hobuss (2014):
I - Apetitiva (os agricultores).
II - Irracionais (escravos).
III - Racionais (os filósofos, governantes).

Portanto, observa-se a filosofia da vocação natural do ser humano em Platão,


quando ressalta que: os que pensam, que são os filósofos, devem governar, e os
que trabalham e usam a força física devem produzir ou auxiliar a produção, como
os agricultores e os escravos.

Aristóteles (384-322 a.C.)

Assim como Platão, Aristóteles é um filósofo sistematizador. Diferentemente de


seu mestre Platão, ele se dedicou a explorar os mais diversos campos do conhe-
cimento humano. Na realidade, ele é o pai de quase tudo que conhecemos, hoje,
sobre conhecimento especializado: da Física à Biologia, da Zoologia à Física, da
Lógica à Retórica, da Psicologia à Ética, da Política à Metafísica. Do ponto de
vista filosófico, poderíamos dizer que Aristóteles é um dos grandes elaborado-
res do conhecimento e da ciência. Acreditava empiricamente que todos os seres
humanos têm, por natureza, o desejo de conhecer. Ele elaborou o processo do
conhecimento com os seguintes passos, conforme Hobuss (2014):
1. Os sentidos.
2. A memória.
3. A experiência.
4. A arte.
5. A ciência.

Outro tema muito importante que Aristóteles abordou foi a Filosofia Política.
Com Aristóteles tem-se os fundamentos do pensamento político que nos influen-
cia até hoje, por exemplo, os próprios vocabulários que utilizamos para tratar o
77
tema da política e do político, como: tirania, monarquia, oligarquia, aristocracia,
UNIDADE 2

plutocracia, democracia, as ideias aplicadas à pólis e à cidade-estado, por exemplo.


Com a sua obra, “Ética a Nicômaco”, ele constrói o pensamento da vida em socie-
dade e da importância à política como nova forma de organização comunitária
entre as pessoas na pólis. É dele a expressão conhecidíssima, que já foi vista em
posts de Facebook e WhatsApp bem
como em para-choque de caminhão:
“o homem é, por natureza, um politi-
kon zôon”, isto é um “animal político”
(CHAUÍ, 2015).
Aristóteles estava convencido
que, se o ser humano, naturalmente,
buscava viver na pólis, isso era ex-
pressão da sua natureza, ou seja, um
ser político. Assim, outra expressão e
afirmação clássica ficou gravada nos
anais da história: “um homem que
não vive na cidade, na comunidade
política – por ser autossuficiente ou
não ter necessidade – é uma besta ou
um deus” (HOBUSS, 2014, p. 118).
Por fim, para Aristóteles, a ética não
está divorciada, definitivamente, da
pólis e, muito menos, da política,
pois ética, política e cidade estão, na-
turalmente, relacionadas. Por isso, o
fim último da felicidade, que tanto o
ser humano almeja, conforme com-
preende o filósofo, está relacionada
sempre à vida em sociedade, ao bom
cidadão (cumpridor das normas co-
letivas estabelecidas) e ao cidadão
de bem (que busca viver as virtudes
necessárias para viver em sociedade).

78
3
A FILOSOFIA

UNICESUMAR
MEDIEVAL

Caro(a) aluno(a), agora, em nossa viagem ao mundo maravilhoso da filosofia,


vamos dar mais uma paradinha, antes de discorrer sobre as principais marcas
da Filosofia Medieval. O objetivo desta parada é refletir sobre uma ideia que,
infelizmente, ainda, está na moda, no mundo e, em especial, no Brasil: o “precon-
ceito”. Essa atitude, infelizmente, está muito presente na sociedade e não há um
tipo só, pelo contrário, há vários tipos preconceitos, por exemplo, quanta à raça,
status social, religião, orientação sexual, gênero, inclusive, temos o preconceito
linguístico-cultural. Não há como negar a existência desses tipos e/ou outros que
existem, basta olharmos para o mundo da realidade social com as evidências que
se apresentam, por meio dos fatos e de números estarrecedores. Contudo o que
merece importância quanto ao assunto “preconceito”, principalmente, para você, é
o foco é manter o foco nos conhecimentos que temos abordado em nosso estudo
sobre filosofia, os quais lhe servirão, certamente, de valores fundamentais para
a sua formação humana-intelectual. Nesse sentido, chamo a sua atenção para a
Declaração Universal dos Direitos Humanos que tem, como grande promotora, a
Organização das Nações Unidas (ONU), a qual afirma, no preâmbulo da referida
declaração, “que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros
da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da
liberdade, da justiça e da paz no mundo” (ONU, 2009, p. 1).

79
Por que abordamos o assunto “preconceito” quando se estuda o período me-
UNIDADE 2

dieval na história da filosofia? Porque existe, também, infelizmente, o preconceito


intelectual sobre esse período. Isso mesmo; você sabia que existe, também, o pre-
conceito histórico? Tem isso? Sim. Infelizmente, pode-se observar a partir da rea-
lidade, do nosso cotidiano, comportamentos preconceituosos dos mais diversos.
Você sabia que uma das atitudes principais da pessoa preconceituosa é que
esta não verifica se há ou não algum fundamento ou verdade sobre o que se pensa,
fala ou faz? Por exemplo: o que você, realmente, sabe sobre o Período Medieval?
Pense comigo: se você estivesse conversando com pessoas tidas como sendo “me-
dievais” e utilizasse a expressão “Idade Média”, elas ficariam “boladas” ou “confu-
sas” com você e ficariam pensando: “que ideia esse cara está falando de mim?”
Sabe por quê? Porque todas as pessoas de todos os períodos históricos, inclusive
você e eu, sempre se consideram pessoas para frente, modernas ou atualizadas.
Não julgue sempre as coisas a partir de você; essa ideia que, ainda, usa-se, por
força, somente, do hábito, como “Idade Antiga”, “Idade Média”, “Idade das Trevas”
ou “Idade Medieval”, é, na realidade, um rótulo negativo que se deu, depois que
passou esse período da história. Esse jeito de se chamar foi pronunciado pela
primeira vez no século XVI e o sentido dado foi de um certo desprezo, desdém,
em relação aos séculos localizados entre a Antiguidade Clássica e o próprio século
XVI, sentido de algo perdido, que só está, ali, no meio, sem nenhuma ou qualquer
contribuição para a história da humanidade (FRANCO JUNIOR, 2001).
Agora, desenvolve comigo essa ideia: algo que só está ali para cumprir a uma
mísera tabela. Isso mesmo! Você conhece a linguagem do futebol? O time tem
que cumprir tabela. Boa! O sentido é que, quando um time joga só para cumprir a
tabela, quer dizer o seguinte: o jogo que ele vai fazer não tem mais nenhum valor,
sem importância nenhuma para o torneio ou campeonato. Assim é essa ideia de
não importância dada à “idade média” para história da humanidade. Por isso,
para que possamos entender o que, realmente, ocorreu nos referidos períodos, o
indicado é que nos dediquemos aos estudos para que, assim, possamos identificar
como as coisas são de fato, por exemplo, se as informações, veiculadas nas redes
sociais hoje, são verídicas ou falsas sobre um determinado assunto ou pessoa,
pois, quando algo não é verdadeiro nas redes sociais, pode gerar uma infinidade
de transtornos e problemas, as chamadas fake news.
Agora, continuando a nossa viagem, abordaremos a vida das pessoas nesse
período; sendo assim, apresentaremos essas informações de forma panorâmica,

80
pois, desse modo, você poderá ter elementos para entender melhor a filosofia

UNICESUMAR
desta época e julgar, se, realmente, o mundo dito “medieval”, é, tão assim, negativo
como se diz dele. Quando nos referimos a um determinado lugar, como espaço
físico, logo vem à cabeça o espaço geográfico e as condições de vida, pois estes
revelam como as pessoas eram. Inicialmente, em relação ao lugar que se refere ao
Período Medieval, ele está relacionado, de forma geral, aos três atuais continentes:
Ásia, Europa e África. Você sabia que existe uma área de estudo da Geografia que
estuda as geografias do passado e a forma que um local ou região muda através
do tempo, a chamada geografia histórica?
Bauab (2007), comentando um trecho determinado sobre a geografia me-
dieval, atesta que há uma clara delimitação das possibilidades de conhecimento,
ou seja, como de fato era, geograficamente, esse período, pois este era limitado
pelo dogmatismo religioso da fé cristã. Isso porque trechos ou perícopes oficiais,
gerados dentro da sociedade medieval, sempre, eram recontados pelo que já ha-
via sido revelado pela religião de verdades atemporais. Nesse sentido, pode-se
entender que esta perspectiva, sempre, carregava consigo a impossibilidade do
conhecimento mais pleno do novo ou da ideia moderna de conhecimento cientí-
fico. O próprio Bauab (2007) observa que obras importantes, como a “Geografia”
de Ptolomeu (Séc. I e II d.C.), sempre estiveram em um segundo plano, pois o
que se proliferavam era uma geográfica com base em mitos antigos e explicações
religiosas.
Do ponto de vista demográfico (populacional), por sua vez, a Idade Média
apresentava números expressivos de natalidade e mortalidade. Tal situação ocor-
ria devido às questões relacionadas ao clima e ao meio ambiente, como os fatores
de estiagens, enchentes e doenças. Do ponto de vista econômico, se tomar os
séculos IV-X, tem-se a informação de “escassez endêmica” (quando atinge uma
população numa dada região), ou seja, uma baixa produtividade agrícola e arte-
sanal gerava, também, uma baixa disponibilidade de bens de consumo e, conse-
quentemente, um recuo do comércio e da economia monetária. Já o crescimento
que ocorrem nos séculos XI-XIII, que, segundo Bauab (2007), alguns chamam
de “Idade Média Central”, conheceu importantes mudanças nos elementos que
tinham caracterizado a fase anterior. Do ponto de vista político, segundo Chauí
(2015), o tempo é de domínio da Igreja Romana na Europa. Ela mandava e des-
mandava, fazia e desfazia,“ungia e coroava reis, organizava Cruzadas à Terra Santa
e criava, à volta das catedrais, as primeiras universidades ou escolas” (CHAUÍ,
2015, p. 55).
81
Nesse sentido, a Filosofia Medieval, principalmente, durante os séculos V-XV,
UNIDADE 2

assinala, também, crescimento, expansionismo e consolidação do Cristianismo,


em especial, na Europa Ocidental. Nessa direção, a filosofia desse período objetiva
conciliar religião e filosofia, ou seja, a consciência cristã com a razão filosófica e
científica. Algumas das principais marcas, mais gerais, na metade desse período,
podem ser, segundo Incontri e Bigheto (2010), inspiração na filosofia clássica
(Greco-romana); união da fé cristã e da razão; utilização dos conceitos da filosofia
grega ao Cristianismo; e busca da verdade divina. Outra questão que é importante
ressaltar, que acreditamos que o(a) ajudará a compreender melhor este período
que estamos estudando são os outros períodos filosóficos relacionados à Filosofia
Medieval (séculos VIII-XIII).
A questão é a seguinte: quando se estuda entre o Período Clássico e Medieval,
tem-se uma filosofia mais específica chamada “patrística” (séculos I-VII), e, quan-
do se estuda entre o Período Medieval e Moderno, tem-se uma outra filosofia
denominada “Renascença” (séculos XIV-XVI). Observa-se, nos livros didáticos,
que a Filosofia Patrística (séculos I-VII), também, é estudada na primeira parte
da Filosofia Medieval; assim, também, ocorre, por sua vez, quando se estuda a
Filosofia da Renascença (séculos XIV-XVI), ela também, tem sido abordada na
Filosofia Moderna. É isso! O importante é que você veja, de uma maneira ou
de outra, todos essas filosofias e que elas são importantes para entender o pen-
samento humano, inclusive entender o nosso próprio jeito de pensar hoje. Isso
é importante para que você veja que, de uma maneira ou de outra, todas essas
filosofias são importantes para entendermos o pensamento humano e, inclusive,
o nosso próprio jeito de pensar hoje. Então, em nosso estudo, abordaremos as
filosofias patrística e medieval e, quando estudarmos a Filosofia Moderna, estu-
daremos a Filosofia da Renascença.

Filosofia Patrística (séculos I-VII)

Incontri e Bigheto (2010) afirmam que a Filosofia Patrística, a qual, também, pode
ser denominada Filosofia Cristã, devido à forte relação que havia entre filosofia
racional e a fé do Cristianismo, na época. Pode parecer contraditório? Dependen-
do do ponto de vista, sim. É verdade que, nem sempre, há muita lógica ou coe-
rência histórica, à primeira vista, nas ações humanas, isto é, a Igreja, por sua vez,
utilizava-se da filosofia como forma de sustentar seus dogmas com argumentos
82
filosóficos. Um tipo de filosofia muito utilizado pela Igreja foi o neoplatonismo,

UNICESUMAR
que se originou em Platão; nesse sentido, surgiram, também, no início da patrís-
tica, movimentos apologistas, ou seja, de defesa da fé cristã contra as chamadas
“heresias” (doutrinas falsas) nos debates internos da Igreja. É importante lembrar
que a Igreja era, ainda, uma instituição em vias de formação, dava os primeiros
passos e, também, tinha objetivo pretensioso de conquistar novos seguidores.
A Filosofia Patrística tem o seu início com os escritos paulinos e joaninos e seu
término no século VIII, com o início a Filosofia Medieval, assim compreende
Chauí (2015, p. 120) e, ainda, faz o seguinte comentário:


A patrística resultou do esforço feito pelos dois apóstolos intelec-
tuais (Paulo e João) e pelos primeiros Padres da Igreja para conciliar
a nova religião – o Cristianismo - com o pensamento filosófico dos
gregos e romanos, pois somente com tal conciliação seria possível
convencer os pagãos da nova verdade e convertê-los a ela. A Filo-
sofia patrística liga-se, portanto, à tarefa religiosa da evangelização
e à defesa da religião cristã contra os ataques teóricos e morais que
recebia dos antigos. Divide-se em patrística grega (ligada à Igreja de
Bizâncio) e patrística latina (ligada à Igreja de Roma) e seus nomes
mais importantes foram: Justino, Tertuliano, Atenágoras, Orígenes,
Clemente, Eusébio, Santo Ambrósio, São Gregório Nazianzo, São
João Crisóstomo, Isidoro de Sevilha, Santo Agostinho, Beda e Boé-
cio. A patrística foi obrigada a introduzir ideias desconhecidas para
os filósofos greco-romanos: a ideia de criação do mundo, de pecado
original, de Deus como trindade una, de encarnação e morte de
Deus, de juízo final ou de fim dos tempos e ressurreição dos mortos,
etc. Precisou também explicar como o mal pode existir no mundo, já
que tudo foi criado por Deus, que é pura perfeição e bondade. Intro-
duziu, sobretudo com Santo Agostinho e Boécio, a ideia de “homem
interior”, isto é, da consciência moral e do livre-arbítrio, pelo qual
o homem se torna responsável pela existência do mal no mundo.

Portanto, um dos filósofos e teólogos mais proeminente da patrística foi Santo


Agostinho; como foi bem citado por Chauí (2015), ele era um bispo africano,
viveu entre os anos 354-430 da nossa Era Cristã. Escreveu vários livros, mas, em
“Confissões”, Agostinho tratou de suas próprias angústias e sofrimentos existen-
ciais relacionados a sua vida e fé. Assim, deixou para a literatura mundial e para a
83
história da filosofia um dos textos que seria considerado clássico e que revelaria,
UNIDADE 2

dentre outras ideias, a forma como as pessoas pensavam (no mundo de Agosti-
nho, estas estabeleciam-se os conflitos entre matéria e espírito, e corpo e alma).
Assim, por sua vez, Agostinho, também, concedeu à tradição cristã os mais novos
e duradouros fundamentos para a doutrina cristã de todos os tempos.

Filosofia Medieval (séculos VIII-XIII)

Sobre a Filosofia medieval propriamente dita, sabe-se que os pensadores mais


notórios eram europeus, árabes e judeus. Você se lembra dos três continentes que
citamos anteriormente? É comum estudar, hoje, a Filosofia Medieval ou Escolás-
tica, a partir do século XII. Essa filosofia teve, como influências principais, Platão
(por meio do neoplatonismo, como já citamos anteriormente), Aristóteles (as
primeiras informações do pensamento aristotélico vieram por meio dos árabes,
Avicena e Averróis) e Santo Agostinho, o bispo africano, como um dos grandes
filósofos e teólogos da Igreja. Porém, além de abordar os problemas já tratados
na Patrística, a Filosofia Medieval se voltou para questões relacionadas aos estu-
dos ontológicos dos universais; desse forma, a expressão “ontológico” está para o
âmbito do discurso, que se refere à estrutura geral da realidade existente ou, mais
precisamente, da existência das coisas, então, o problema dos universais pode ser
definido como aquele que investiga sobre a possibilidade da existência ou não
existência dos universais como coisas ou meras palavras, conforme informam
Incontri e Bigheto (2010).
Segundo Chauí (2015), é, nesse período, que se estabeleceu a Filosofia Cristã
propriamente dita, que para alguns é o surgimento e o coroamento da Teologia
Cristã. Nesse clima, surgiu um dos temas mais brilhantes da época, as provas
da existência de Deus e da alma, tendo, como grande elaborador, São Thomas
de Aquino (1225-1274), que pretendia, com isso, demonstrar, racionalmente, a
existência do infinito criador e do espírito humano imortal (CHAUÍ, 2015). Nesse
sentido, quem faz um comentário oportuno e que pode nos ajudar a entender
esse período é Chauí (2015, p. 56), veja:


A diferença e separação entre infinito (Deus) e finito (homem, mun-
do), a diferença entre razão e fé (a primeira deve subordinar-se à

84
segunda), a diferença e separação entre corpo (matéria) e alma (es-

UNICESUMAR
pírito), O Universo como uma hierarquia de seres, onde os supe-
riores dominam e governam os inferiores (Deus, arcanjos, anjos,
alma, corpo, animais, vegetais, minerais), a subordinação do poder
temporal dos reis e barões ao poder espiritual de papas e bispos: eis
os grandes temas da Filosofia medieval. Outra característica mar-
cante da Escolástica foi o método por ela inventado para expor as
ideias filosóficas, conhecida como disputa: apresentava-se uma tese
e essa devia ser ou refutada ou defendida por argumentos tirados da
Bíblia, de Aristóteles, de Platão ou de outros Padres da Igreja. Assim,
uma ideia era considerada uma tese verdadeira ou falsa dependendo
da força e da qualidade dos argumentos encontrados nos vários
autores. Por causa desse método de disputa - teses, refutações, defe-
sas, respostas, conclusões baseadas em escritos de outros autores -,
costuma-se dizer que, na Idade Média, o pensamento estava subor-
dinado ao princípio da autoridade, isto é, uma ideia é considerada
verdadeira se for baseada nos argumentos de uma autoridade reco-
nhecida (Bíblia, Platão, Aristóteles, um papa, um santo). Os teólogos
medievais mais importantes foram: Abelardo, Duns Scoto, Escoto
Erígena, Santo Anselmo, Santo Tomás de Aquino, Santo Alberto
Magno, Guilherme de Ockham, Roger Bacon, São Boaventura. Do
lado árabe: Avicena, Averróis, Alfarabi e Algazáli. Do lado judaico:
Maimônides, Nahmanides, Yeudah bem Levi.

Portanto, caro(a) aluno(a), pode se compreender que o Período Medieval nos


traz diversas marcas como sendo uma filosofia que serviu de sustentação às dou-
trinas da fé cristã, ao produzir pensamentos fundamentados na razão, como, na
patrística, com as doutrinas sobre o livre-arbítrio, o bem e o mal, a fé interior, o
poder iluminador de Deus à raça humana, o tempo e a soberania de Deus; e, na
medieval, com a hegemonia da fé cristã em fazer da filosofia a sua serva, como
um dos fundamentos racionais para provar a existência de Deus, com as grandes
elaborações dos universais da soberania e da majestade de Deus. Leia-se a Igreja
como dominadora na face da terra, sobre todas as coisas, todas as pessoas e todos
os povos. A senhora absoluta, a Igreja, comandou seu tempo como idealizadora
e administradora da vida na terra e, assim, foram fundadas as primeiras uni-
versidades no mundo, as quais se tornaram celeiros e fontes dos mais diversos
conhecimentos humanos necessários para a sobrevivência da nossa espécie.

85
4
A FILOSOFIA
UNIDADE 2

MODERNA E
suas conquistas

Nesta aula, estudaremos as principais marcas da filosofia moderna. Aqui, faremos


uma reflexão sobre o que se vai estudar, pois nosso objetivo é possibilitar um
melhor entendimento e facilitar, assim, a aprendizagem do assunto. A palavra
“moderna”, que tem a função de adjetivo da palavra “filosofia”, é uma palavra ti-
picamente polissêmica, ou seja, possui muitos sentidos, vejamos, conforme Dicio
([2020], on-line)3:


1. Que pertence ao tempo presente ou a uma época relativamente
recente; hodierno, atual.

2. Que tem pouco tempo, por oposição ao que é velho novo, recente:
comprei um carro moderno.

3. Que está à frente de seu tempo: minha avó é super moderna.

4. [História] Posterior ao fim da Idade Média até à Revolução Francesa.

5. Que apareceu depois da antiguidade greco-romana.

Na atualidade, é necessário sempre chegarmos as origens das fontes de informa-


ções que recebemos, para que tenhamos certeza se as estas são ou não verdadei-
ras e, assim, não cairmos nas chamadas fake News. Da mesma forma, também,
devemos verificar os sentidos de uma palavra, como a palavra “moderna”, para
86
termos uma melhor compreensão e precisarmos o que ela significa para os nos-

UNICESUMAR
sos estudos aqui, uma vez que essa palavra é polissêmica, tem vários sentidos e
significados. Segundo Abbagnano (1982), o referido adjetivo foi introduzido pelo
latim pós-clássico e significa, literalmente, “atual” (de modo = agora). Portanto,
o mesmo “foi empregado pela Escolástica a partir do século XIII para indicar a
nova lógica terminista, designada como via moderna em comparação com a via
antiqua da lógica aristotélica”. (ABBAGNANO, 1982, p. 679).
Diante do exposto, caro(a) aluno(a), estamos usando o termo “filosofia mo-
derna” para tratar, de alguma forma, das seguintes filosofias e respetivos períodos:
Filosofia da Renascença (do século XIV ao século XVI); Filosofia Moderna (do
século XVII a meados do século XVIII); e Filosofia da Ilustração ou Iluminismo
(meados do século XVIII ao começo do século XIX). Como você pode ver são
muitos assuntos e um tempo, significativamente, elástico. Contudo o importante,
mais uma vez, é você estar ciente dos conhecimentos que estão sendo tratados e
discutidos para qualificar o seu conhecimento sobre a nossa disciplina, que estou,
ludicamente, chamando-o de “uma viagem ao mundo maravilhoso da filosofia”.
Posso lhe dizer, caro(a) aluno(a), que um dos principais objetivo dessa nossa
viagem não é, apenas, chegar ao mundo maravilhoso da filosofia, mas também
desfrutar do próprio caminho como processo, que ocorre e se torna, assim, uma
grata felicidade de crescimento e amadurecimento, intelectual e humanístico, pois
uma das idiossincrasias da modernidade é, justamente, o desenvolvimento do
espírito humanístico que brota do estudo sobre os lugares que temos abordado,
em especial, os continentes Africano, Asiático e Europeu, que, posteriormente,
incluirá às Américas do Norte e Latina e, assim, o nosso país, a nossa atual Re-
pública Federativa do Brasil. Outra observação importante é que, nesta aula, não
daremos muita atenção a um ou outro filósofo (isso faremos depois, nas outras
unidades que serão temáticas), pois Período Moderno é, deverasmente, rico e
repleto de filosofias e filósofos. O que pretendo, ao longo desta aula, é precisar
essas filosofias — da Renascença e do Iluminismo — que citei anteriormente e,
assim, precisar as marcas da Filosofia Moderna como um todo.
Inicialmente, conforme Aranha (2012), a Renascença é um tempo em que
ocorreram grandes transformações, as quais já se iniciaram na Idade Média, por
exemplo, o surgimento da burguesia, a revolução comercial, o desenvolvimento
da economia capitalista, a formação das monarquias nacionais, a Reforma Pro-
testante e as grandes navegações, que levaram às descobertas do Novo Mundo.
Nessa mesma direção, para tratar, ainda, sobre a Renascença, tomaremos as ideias
87
de Chauí (2015), como roteiro da nossa viagem, pois, como você já deve ter no-
UNIDADE 2

tado, esse período é, historicamente, riquíssimo. A Renascença pode ser identifi-


cada pela revisitação ao mundo clássico da filosofia, a grosso modo; há um certo
giro epistemológico do teocentrismo ao antropocentrismo. Contudo esse giro,
certamente, passa, também, pelas tradições elaboradas na própria Idade Média:
as obras de Platão, quase totalmente, desconhecidas, até então; as novas obras de
Aristóteles, que, ainda, não eram, também, conhecidas, mais profundamente, pelo
grande público, bem como as obras de outros grandes autores e artistas gregos e
romanos da época. Essa revisitação pode, portanto, constituir três grandes linhas
de pensamento que podem expressar o que estamos chamando de Renascença,
a partir de Chauí (2015, p. 55), vejamos:


1. Aquela proveniente de Platão, do neoplatonismo e da descoberta
dos livros do Hermetismo; nela se destacava a ideia da Natureza
como um grande ser vivo; o homem faz parte da Natureza como
um microcosmo (como espelho do Universo inteiro) e pode agir
sobre ela através da magia natural, da alquimia e da astrologia, pois
o mundo é constituído por vínculos e ligações secretas (a simpatia)
entre as coisas; o homem pode, também, conhecer esses vínculos e
criar outros, como um deus.

2. Aquela originária dos pensadores florentinos, que valorizava a


vida ativa, isto é, a política, e defendia os ideais republicanos das ci-
dades italianas contra o Império Romano-Germânico, isto é, contra
o poderio dos papas e dos imperadores. Na defesa do ideal repu-
blicano, os escritores resgataram autores políticos da Antiguidade,
historiadores e juristas, e propuseram a “imitação dos antigos” ou
o renascimento da liberdade política, anterior ao surgimento do
império eclesiástico.

3. Aquela que propunha o ideal do homem como artífice de seu


próprio destino, tanto através dos conhecimentos (astrologia, ma-
gia, alquimia), quanto através da política (o ideal republicano), das
técnicas (medicina, arquitetura, engenharia, navegação) e das artes
(pintura, escultura, literatura, teatro).

Assim como no Período Clássico da filosofia, a Renascença foi embalada por


um clima de efervescência teórico-prático sobre o mundo que se descortinava,
88
alimentado pelas grandes descobertas marítimas, as quais tiveram repercussões

UNICESUMAR
nunca vistas até aquele momento. Críticas mais duras e profundas eram feitas
à Igreja Romana. Essas críticas, de alguma forma, possibilitaram um expressivo
abalo às estruturas institucionais de poder (a exemplo do que foi a Contrarrefor-
ma e o recrudescimento do poder da Inquisição), diante da Reforma Protestante,
em que, ali, hoje, pode-se dizer, estavam presentes as primeiras ideias de um libe-
ralismo nascente: a defesa da liberdade de expressão, de pensamento e de crença.
Alguns nomes mais importantes desse período são, segundo Chauí (2015):
Dante Alighieri, Marcílio Ficino, Giordano Bruno, Campannella, Maquiavel,
Montaigne, Erasmo de Rotterdam, Tomás Morus, Jean Bodin, Kepler e Nicolau
de Cusa. Sobre a Filosofia moderna (do século XVII a meados do século XVIII)
propriamente dita, Aranha (2012) faz uma
exposição que precisa esse período, ao afir-
mar que o paradigma da racionalidade que
se delineava era o de uma razão que buscas-
se libertar crenças e superstições, fundan-
do-se na própria subjetividade e não mais
na autoridade, seja ela política ou religiosa.
Cada vez mais, o giro epistemológico ia con-
solidando, em que se evidencia uma razão
antropocentrista. Por isso, é que sobressai o
racionalismo cartesiano de René Descartes
(1596-1650), que será considerado o pai da
Filosofia Moderna. Nessa mesma direção
ainda, A Renascença é conhecida, também,
como o Grande Racionalismo Clássico; as-
sim, segundo Chauí (2015, p. 57) são três as
grandes mudanças intelectuais ocorridas
nesse período:


1. Aquela conhecida como o “surgimento do sujeito do conheci-
mento”, isto é, a Filosofia, em lugar de começar seu trabalho conhe-
cendo a Natureza e Deus, para depois referir-se ao homem, começa
indagando qual é a capacidade do intelecto humano para conhecer
e demonstrar a verdade dos conhecimentos. [...] Como pode conhe-
cer os corpos da Natureza?

89
2. A resposta à pergunta acima constituiu a segunda grande mu-
UNIDADE 2

dança intelectual dos modernos, e essa mudança diz respeito ao


objeto do conhecimento. Para os modernos, as coisas exteriores (a
Natureza, a vida social e política) podem ser conhecidas desde que
sejam consideradas representações, ou seja, ideias ou conceitos for-
mulados pelo sujeito do conhecimento. Isso significa, por um lado,
que tudo o que pode ser conhecido deve poder ser transformado
num conceito ou numa ideia clara e distinta, demonstrável e ne-
cessária, formulada pelo intelecto; e, por outro lado, que a Natureza
e a sociedade ou política podem ser inteiramente conhecidas pelo
sujeito, porque elas são inteligíveis em si mesmas, isto é, são racio-
nais em si mesmas e propensas a serem representadas pelas ideias
do sujeito do conhecimento.

3. Essa concepção da realidade como intrinsecamente racional e


que pode ser plenamente captada pelas ideias e conceitos preparou
a terceira grande mudança intelectual moderna. A realidade, a partir
de Galileu, é concebida como um sistema racional de mecanismos
físicos, cuja estrutura profunda e invisível é matemática. O “livro
do mundo”, diz Galileu, “está escrito em caracteres matemáticos.” A
realidade, concebida como sistema racional de mecanismos físico
matemáticos, deu origem à ciência clássica, isto é, à mecânica, por
meio da qual são descritos, explicados e interpretados todos os fatos
da realidade: astronomia, física, química, psicologia, política, artes
são disciplinas cujo conhecimento é de tipo mecânico, ou seja, de
relações necessárias de causa e efeito entre um agente e um paciente.

Nota-se, nesse período, o predomínio de uma ideia de conquista científica e téc-


nica de toda a realidade. As explicações partem dos conhecimentos da mecânica,
matemática, do Universo e da invenção das máquinas, associadas às experiências
da física e da química. Nesse sentido, as pretensões eram de que a razão humana
seria capaz de conhecer e dominar a origem, as causas e os efeitos das paixões
e das emoções bem como orientar o racionalismo político; a razão seria capaz
de definir o melhor modelo de regime político e mantê-lo racionalmente. Chauí
(2015, p. 57) sintetiza o que pode ter representado a Filosofia Moderna e seus
principais filósofos para a História da Filosofia:

90

Nunca mais, na história da Filosofia, haverá igual confiança nas ca-

UNICESUMAR
pacidades e nos poderes da razão humana como houve no Grande
Racionalismo Clássico. Os principais pensadores desse período fo-
ram: Francis Bacon, Descartes, Galileu, Pascal, Hobbes, Espinosa,
Leibniz, Malebranche, Locke, Berkeley, Newton, Gassendi.

O último assunto que trataremos, caro(a) aluno(a), é sobre a Filosofia da Ilus-


tração ou Iluminismo (que se dá a partir de meados do século XVIII ao começo
do século XIX). Aranha (2012) ressalta que esse período foi tomado por um
profundo otimismo em reorganizar o mundo humano, por meio do poder da
razão. Pode-se dizer que foi o período das grandes revoluções, conforme Incon-
tri e Bigheto (2010), como a Americana, a Francesa e a Industrial. Nesse sentido
ainda, Aranha (2012) lista algumas das principais razões desse otimismo todo:
a revolução científica comandada pelo racionalismo e empirismo; a revolução
industrial com a mecanização e a máquina a vapor; a revolução burguesa que se
opunha ao poder absolutista dos reis; o surgimento da religião sob a orientação
deísta onde não havia espaço para dogmatismos ou fanatismos religiosos. Chauí
(2015, p. 58) compreende as seguintes afirmações que podem advirem da Filo-
sofia Iluminista:


1. Pela razão, o homem pode conquistar a liberdade e a felicidade
social e política (a Filosofia da Ilustração foi decisiva para as idéias
da Revolução Francesa de 1789);

2. A razão é capaz de evolução e progresso, e o homem é um ser per-


fectível. A perfectibilidade consiste em liberar-se dos preconceitos
religiosos, sociais e morais, em libertar-se da superstição e do medo,
graças as conhecimento, às ciências, às artes e à moral;

3. O aperfeiçoamento da razão se realiza pelo progresso das civili-


zações, que vão das mais atrasadas (também chamadas de “primi-
tivas” ou “selvagens”) às mais adiantadas e perfeitas (as da Europa
Ocidental);

4. Há diferença entre Natureza e civilização, isto é, a Natureza é o


reino das relações necessárias de causa e efeito ou das leis naturais
universais e imutáveis, enquanto a civilização é o reino da liberdade
e da finalidade proposta pela vontade livre dos próprios homens,
em seu aperfeiçoamento moral, técnico e político.

91
Por fim, e a partir do exposto, esse período marca três grandes interesses: pelas
UNIDADE 2

ciências, artes e bases econômicas. O primeiro estava relacionado, em especial, à


biologia pelos interesses nos estudos sobre o evolucionismo; o segundo por ex-
pressar os grandes anseios de progresso civilizatório; e o terceiro interesse guiado
pelo interesse na vida social e política das riquezas das nações. Como conseguir
tal riqueza? Isso suscita posições adversas, como aqueles que acreditavam na
corrente fisiocrata (a agricultura é a fonte principal das riquezas), e outros que
entendiam que seria a corrente mercantilista (o comércio é a fonte principal
da riqueza das nações). Por fim, Chauí (2015, p. 58) informa que foram esses
os principais pensadores desse período: “Hume, Voltaire, D’Alembert, Diderot,
Rousseau, Kant, Fichte e Schelling (embora este último costume ser colocado
como filósofo do Romantismo)”.

5
AS MARCAS
DA FILOSOFIA
contemporânea

Nossa viagem, na Unidade 2, está chegando ao final: juntos, fazemos um giro


histórico de caráter panorâmico, no seu sentido mais estrito do termo: uma visão
geral. Contudo esse olhar, do ponto de vista histórico, oferece condições básicas
para os nossos estudos que são: de localização espaço-temporal de algumas das

92
principais ideias e filósofos que marcaram a história da filosofia e da humanidade.

UNICESUMAR
Esta aula tem o objetivo, portanto, de abordar as principais marcas da filosofia
contemporânea. Nessa direção, esse adjetivo “contemporânea” carrega diversos
sentidos, tais como:


1. Que habitou ou teve seu início na mesma época: prefiro ler auto-
res contemporâneos de Clarice Lispector.

2. Que acontece ou tem seu início no presente (tempo atual): lite-


ratura contemporânea.

3. [História] Que pode se referir ao período que, convencional-


mente, teve seu início com a Revolução Francesa (DICIO, [2020],
on-line)4.

Chauí (2015, p. 58), quando abre os estudos sobre filosofia contemporânea, em


seu livro, “Convite à Filosofia”, faz uma advertência que, também, deve ser reite-
rada como importante para a nossa aprendizagem, vejamos:


[...] Esse período, por ser o mais próximo de nós, parece ser o mais
complexo e o mais difícil de definir, pois as diferenças entre as várias
filosofias ou posições filosóficas nos parecem muito grandes porque
as estamos vendo surgir diante de nós.

Hoje, já se pode dizer, a partir do que a História testemunha para nós, nos séculos
XX e XXI, que a humanidade, de uma forma geral, foi do céu ao inferno, da glória
ao fracasso, da riqueza à miséria, do otimismo ao pessimismo, da paz à guerra.
Nesse sentido, sempre, deve-se valorizar o entendimento do que significa esse
período ou recorte histórico, isto é, as mais diversas ideias ou filósofos que se
destacaram, que são estudados na história da filosofia recente.
Incontri e Bigheto (2010), ao datar esse período da filosofia, fazem uma ponde-
ração, no mínimo pertinente, sobre a caracterização da datação tida como contem-
porânea. Os referidos autores ressaltam que, desde o século XIX até o presente sécu-
lo XXI, pode-se observar um clima histórico de prolongamento do entusiasmo do
progresso e da ciência. Por exemplo, os avanços tecnológicos com a comunicação
de massa e a revolução digital, em especial, na esteira da invenção do computador

93
e da internet, assinalam as exuberâncias desse nosso tempo. Contudo, em especial,
UNIDADE 2

o século XXI não é somente rosas e flores, símbolos das utopias revolucionárias,
mas, também, há espinhos, símbolos das guerras mundiais ocorridas.
Por isso, caro(a) aluno(a), a filosofia contemporânea traz, em uma de suas
marcas principais, a expressão de ideias e filósofos que podem ser considerados,
aparentemente, contraditórios, mas que se explicam pela realidade histórica que
as formou, por exemplo, o Idealismo Dialético de Hegel; o Positivismo de Comte;
o Materialismo de Marx; o Niilismo de Nietzsche; a Fenomenologia de Husserl; o
Existencialismo de Sartre; a Psicanálise de Freud; e a Indústria Cultural de Adorno
e Horkheimer (ARANHA, 2012). De uma forma especial, da passagem do século
XIX para o XX, devido ao impacto, deverasmente, frustrante das expectativas do
domínio da natureza e de tudo aquilo que poderia atingir o ser humano, como
as doenças, o mundo sofreu significativo abalo com as duas guerras mundiais, a
primeira de 1914-1918 e a segunda de 1939-1945.
A participação do Brasil, nessas duas guerras mundiais, deu-se de uma forma
coadjuvante aos grandes aliados; na primeira, auxiliou no envio de medicamentos
e pessoal médico; e, na segunda, no envio de tropas brasileiras para se juntarem
aos aliados na Itália (COTRIM, 2006). Mais exemplos das principais marcas desse
período, do ponto de vista da produção filosófica, de ideias e de filósofos, caro(a)
aluno(a), há duas grandes tendências que dominam esse período: o ceticismo e
subjetivismo. A primeira alimenta a produção e o desenvolvimento de filosofias
estruturadas na desconfiança e na inutilidade, onde surgiram as filosofias pragmá-
ticas e anti-humanistas, como o estruturalismo. A segunda tendência, subjetivismo,
proporciona filosofias para a busca do interior do ser humano, para dentro, para
o particular ou para o ensimesmamento, ainda, é onde surgiram as filosofias hu-
manistas existencialistas e fenomenológicas, como a Fenomenologia e o Existen-
cialismo (COTRIM, 2006). Por fim, trataremos, agora, sobre a filosofia no Brasil.
Caro(a) aluno(a), inicialmente, há uma questão a se colocar: há uma filosofia
tipicamente brasileira? Segundo Incontri e Bigheto (2010), essa questão está em
aberto, ou seja, há estudiosos que não consideram pertinente essa questão; outros
afirmam que, apesar de não haver uma filosofia, originalmente, à moda brasileira,
há uma originalidade na interpretação das filosofias advindas dos grandes centros
filosóficos, como da Grécia, Alemanha, França, Inglaterra, Estados Unidos, União
Soviética, dentre outros. Caro(a) aluno(a), apesar de se estar tratando, somente

94
agora, nesta aula, sobre a filosofia no Brasil, é importantíssimo registrar que, desde

UNICESUMAR
o século XVI, tem-se, de forma embrionária, o pensamento intelectual brasileiro
(INCONTRI; BIGHETO, 2010). Do século XVI ao século XVII, sob o comando
dos jesuítas que seguiam a filosofia escolástica tomista (você se lembra de São
Thomas do Aquino?), foram eles os grandes catequizadores e educadores em solo
nacional que influenciou, significativamente, aqueles que, aqui, estiveram. Dessa
forma, Incontri e Bigheto (2010, p. 413) comentam que:


No final do século XVIII, a elite intelectual brasileira, a exemplo
da portuguesa, começou a se modernizar. Os pensadores tomaram
contato com as ideias filosóficas e cientificas do mundo moderno.
Entre os séculos XVII e XVIII, o Brasil passou por transformações
internas que geraram impactos na vida intelectual dos brasileiros.
A população do país nesse período chegou a quase três milhões de
habitantes; surgiram centros urbanos que favoreceram as atividades
intelectuais. Os pensadores brasileiros voltaram-se para as questões
científicas e técnicas do pensamento moderno. Os que iam estu-
dar em Portugal voltavam ao Brasil impregnados do pensamento
iluminista, como foi o caso de Francisco Jose Lacerda e Almeida
(geólogo), Alexandre Rodrigues Ferreira (médico e naturalista), Jose
Bonifácio de Andrada e Silva (naturalista e mineralogista) e Jose
Joaquim de Azeredo Coutinho (fundador do seminário de Olinda).
Esses intelectuais defendiam a filosofia natural, ou seja, o estudo
científico-racional da natureza. A elite pretendia renovar o pensa-
mento brasileiro e trazer prosperidade e civilização ao país, para
colocá-lo em consonância como o modelo filosófico e científico
europeu.

É importante ressaltar, por fim, que, durante todo transcorrer do século XX, em
especial, conforme nos informa Incontri e Bigheto (2010), o Brasil esteve conec-
tado com todos os movimentos mais importantes que passaram na Europa e
nos Estados Unidos, com as suas mais diversas filosofias e modas, como a onda
irracionalista comandada pelas ideias de Nietzsche, Deleuze, Foucault e Guatarri.
Essas filosofias foram, devidamente, contextualizadas à realidade nacional, por
exemplo, o positivismo, neopositivismo, marxismo, cientificismo e sua crítica,
fenomenologia, existencialismo, crítica à razão instrumental, dentre outras.

95
UNIDADE 2

explorando Ideias

Como todas as outras criações e instituições humanas, a Filosofia está na História e tem
uma história. Na História, a Filosofia manifesta e exprime os problemas e as questões
que, em cada época de uma sociedade, os homens colocam para si mesmos, diante do
que é novo e, ainda, não foi compreendido. A Filosofia procura enfrentar essa novidade,
oferecendo caminhos, respostas e, sobretudo, propondo novas perguntas, num diálogo
permanente com a sociedade e a cultura de seu tempo, do qual ela faz parte. A filosofia
tem uma história: as respostas, as soluções e as novas perguntas que os filósofos de
uma época oferecem tornam-se saberes adquiridos que outros filósofos prosseguem ou,
frequentemente, tornam-se novos problemas que outros filósofos tentam resolver, seja
aproveitando o passado filosófico, seja criticando-o e refutando-o. Além disso, as transfor-
mações ocorridas nas compreensões epistemológicas e metodológicas de aquisição do
conhecimento humano podem ampliar e diminuir os campos de investigação da própria
Filosofia.
Fonte: Chauí (2015).

pensando juntos

“O único progresso humanamente relevante é o que contribui de fato para o bem-estar


de todos, e os automatismos do crescimento econômico não bastam para assegurá-lo”.
(Sérgio Paulo Rouanet)

96
CONSIDERAÇÕES FINAIS

UNICESUMAR
Caro(a) aluno(a), pudemos voltar a atenção para como a filosofia surgiu, ao lon-
go da história da humanidade, como constituída ou como constituinte de seu
tempo e de sua própria história, como conhecimento. A ideia básica, esperamos
que tenha nos entendidos, não é, simplesmente, enaltecer o passado por meio de
uma delimitação rígida de datas, eventos, filosofias ou condições históricas “a” ou
“b”, até porque, quando se trata de temas ou assuntos da história, sempre, existem
possibilidades de se fazer novas leituras, interpretações ou delimitações. Nosso
modesto intento, portanto, foi localizá-lo, muita mais, aos temas e aos persona-
gens filósofos, como forma de orientação propedêutica. Acreditamos que isso
ocorreu, quando, em diversos momentos, na maioria das vezes, no início de cada
uma das aulas, pudemos tratar temas de cunho pedagógico, linguístico, conceitual
e social, que, de alguma maneira, estão relacionadas à unidade que ora se estuda.
Na primeira aula, vimos a importância dos conhecimentos relacionados ao
ser humano; na segunda, apresentamos que toda ideia ou ação tem um contexto,
pretexto e conjuntura; na terceira, abordamos o preconceito, que se apresenta
de várias maneiras ou tipos, inclusive, como preconceito histórico; na quarta,
demonstramos o sentido polissêmico da palavra “moderna”, que revelou que essa
palavra foi dita, pela primeira vez, no Período Medieval; e, por fim, na última aula,
vimos a importância da visão panorâmica.
Esperamos, mais uma vez, que os temas e os assuntos estudados, nesta uni-
dade, por meio das aulas sobre as marcas principais das filosofias pré-socrática,
clássica, medieval, moderna e contemporânea, tenham ajudado você a ter uma
visão geral da história da filosofia bem como possibilitado uma melhor localiza-
ção no tempo e no espaço das produções e correntes filosóficas. Acreditamos que
esta unidade possa contribuir para que as outras três unidades futuras possam
ser estudadas com mais proveito e riqueza de conhecimento.

97
na prática

1. Do mito à filosofia, observa-se algumas condições, como: sociais, políticas e econômi-


cas, no surgimento da filosofia. Contudo essa passagem, também, evidenciou novas
questões ao ser humano, em que os primeiros filósofos, chamados pré-socráticos,
buscaram formular e responder. Tal era a importância que eles davam aos ques-
tionamentos que se formaram escolas de pensamento, conforme estudamos na
primeira aula desta unidade. Os pré-socráticos, segundo Barnes (1997), detiveram-se
em quatro conceitos fundamentais. Assinale a opção verdadeira.

a) Universo, Moral, Princípio e Razão.


b) Moral, Natureza, Princípio e Razão.
c) Universo, Natureza, Princípio e Ética.
d) Universo, Natureza, Princípio e Razão.
e) Universo, Natureza, Política e Ética.

2. Se, no período anterior aos clássicos, as perguntas estavam relacionadas ao univer-


so e à natureza, a busca do seu sentido, unido ou não, entre os clássicos, voltou-se
para as questões sobre o próprio ser humano, antropológicas e sociológicas. Temas
como cidadania, ética, moral e conhecimento, sempre, estão relacionadas ao ser
humano e as suas condições de desenvolvimento e aquisição. Leia, atentamente,
as afirmações a seguir:

I - O saber é um bem, e a ignorância é um mal.


II - A ironia – dissimulação do não saber – “só sei que nada sei”.
III - A escritura não aumenta a sabedoria dos homens, mas a aparência de saber
não reforça a memória, apenas, oferece meios para “trazer à memória” coisas
que já se sabe.
IV - O homem é, por natureza, um “animal político”.

Assinale a alternativa correta sobre o pensamento do filósofo Sócrates:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

98
na prática

3. Na terceira aula, vimos o encontro da razão e da fé. Duas disposições importantes e


fundamentais, junto às emoções, presentes no ser humano. Contudo, do ponto de
vista histórico, ou seja, na trama da história, essa relação não foi tão simples assim.
Questões de ordens políticas, sócias e econômicas apontavam o desenvolvimento
e a soberania da religião cristã. Nesse sentido, a filosofia tornou-se um instrumento,
como conhecimento racional, para expressar e manifestar os conteúdos da fé cristã
na defesa e na missão de aquisição de novos adeptos. Leia, atentamente, as afirma-
ções a seguir e assinale a alternativa correta sobre a Filosofia Medieval:

a) Segundo Chauí (2015), é, nesse período, que a Filosofia Cristã tem o seu principal
abalo e declínio.
b) Resultou do esforço feito pelos dois apóstolos intelectuais (Paulo e João) e pelos
primeiros Padres da Igreja para conciliar a nova religião, o Cristianismo, com o
pensamento filosófico dos gregos e romanos, pois, somente, com tal conciliação
seria possível convencer os pagãos da nova verdade e convertê-los a ela.
c) Nesse clima, surge um dos temas mais brilhantes da época, as provas da exis-
tência de Deus e da alma; com isso, poderia ser demonstrado, racionalmente, a
existência do infinito criador e do espírito humano imortal, segundo Chauí (2015).
d) Inicia-se a introduzir ideias desconhecidas para os filósofos greco-romanos: a
ideia de criação do mundo, de pecado original, de Deus, como trindade una, de
encarnação e morte de Deus, de juízo final ou de fim dos tempos e ressurreição
dos mortos etc.
e) Um dos principais teólogos e filósofos desse período é Santo Agostinho, que
introduz a ideia de “homem interior”, isto é, da consciência moral e do livre-arbí-
trio, pelo qual o homem se torna responsável pela existência do mal no mundo.

99
na prática

4. A filosofia moderna é um período muito expressivo da história da filosofia, pois


irrompe novos tempos que floresceram, em meio às adversidades sociais, políticas
e econômicas. Contudo o desenvolvimento vigoroso que esse período se mostrou
produziu significativas filosofias sobre o conhecimento humano, por exemplo, as de
Descartes e Kant. Leia as opções a seguir e assinale a alternativa verdadeira sobre as
marcas principais da filosofia moderna propriamente dita (do século XVII a meados
do século XVIII), conforme informa Aranha (2012).

a) O paradigma da irracionalidade busca o libertar de crenças e superstições.


b) O paradigma da racionalidade busca o afirmar de crenças e superstições.
c) O paradigma da racionalidade busca o libertar de crenças e superstições.
d) O paradigma da irracionalidade busca o afirmar de crenças e superstições.
e) O paradigma da racionalidade busca o libertar da verdade e dos fatos.

5. A história da humanidade é testemunha que o ser humano conhece de forma dife-


rente, e uma dessas formas se dá por meio do conhecimento científico. Sobre este
conhecimento, leia as afirmações a seguir:

I - É o tempo em que se confirma, de maneira vigorosa, o domínio absoluto de toda


a natureza e de todos os males e doenças que atingem o ser humano.
II - Há um clima histórico de entusiasmo do progresso e da ciência. Por exemplo,
os avanços tecnológicos com a comunicação de massa e a revolução digital em
especial, na esteira da invenção do computador e da internet.
III - No Brasil, surgiram as filosofias pragmáticas e anti-humanistas, como o estru-
turalismo.
IV - É o período em que se estabelece a paz no mundo, porque Estados Unidos e
União Soviética assinam o tratado de cooperação, conhecido como o fim do
armamento nuclear.

Assinale a alternativa correta:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, I, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

100
aprimore-se

INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DA FILOSOFIA

Sob vários aspectos pode a história da filosofia suscitar interesse. Quem quiser des-
cortinar o ponto central, deve buscá-lo no nexo essencial que liga os tempos aparen-
temente passados com o grau atualmente alcançado pela filosofia. Tal nexo não é
um fato exterior suscetível de ser descurado na história desta ciência; exprime, pelo
contrário, o caráter íntimo da filosofia; e as vicissitudes desta história, perpetuan-
do-se nos seus efeitos, como qualquer outro acontecimento, são produtivas de ma-
neira que lhes é peculiar: outra coisa não pretendemos senão ilustrar isto mesmo o
mais claramente que nos seja possível.
A história da filosofia representa a série dos espíritos nobres, a galeria dos heróis
da razão pensante, os quais, graças a essa razão, lograram penetrar na essência das
coisas, da natureza e do espírito, na essência de Deus, conquistando assim com o
próprio trabalho o mais precioso tesouro: o do conhecimento racional.
Na história política, o indivíduo, na singularidade da sua índole, do seu gênio,
das suas paixões, da energia ou da fraqueza de caráter, em suma, em tudo o que
caracteriza a sua individualidade, é o sujeito das ações e dos acontecimentos. Na
história da filosofia, estas ações e acontecimentos, ao que parece, não têm o cunho
da personalidade nem do caráter individual; deste modo, as obras são tanto mais
insignes quanto menos a responsabilidade e o mérito recaem no indivíduo singular,
quanto mais este pensamento liberto de peculiaridade individual é, ele próprio, o
sujeito criador. Primeiramente, estes atos do pensamento, enquanto pertencentes
à história, surgem como fatos do passado e para além da nossa existência real. Na
realidade, porém, tudo o que somos, somo-lo por obra da história; ou, para falar
com maior exatidão, do mesmo modo que na história do pensamento o passado é
apenas uma parte, assim no presente, o que possuímos de modo permanente está
inseparavelmente ligado com o fato da nossa existência histórica. O patrimônio da
razão autoconsciente que nos pertence não surgiu sem preparação, nem cresceu só
do solo atual, mas é característica de tal patrimônio o ser herança e, mais propria-
mente, resultado do trabalho de todas as gerações precedentes do gênero humano.

101
aprimore-se

Como as artes da vida externa, o complexo de meios, de habilidades, de institui-


ções e de hábitos no convívio social e na vida política são o resultado da meditação e
da invenção, das privações, ou de acidentes da sorte, da necessidade e da perícia, do
querer e do poder da história na sua evolução até o presente atual. Se alguma coisa
somos no domínio da ciência e da filosofia, devemo-lo à tradição, a qual, através do
que é caduco, e por isso mesmo passado, forma, segundo a expressão de Herder,
uma corrente sagrada que conserva e transmite tudo quanto o mundo produziu
antes de nós.
Mas esta tradição não é apenas uma ama que conserva fielmente o patrimônio
recebido para o manter e transmitir invariável aos vindouros, como o curso da na-
tureza que, através de infinitas variações e atividades de formas e funções, sempre
se conserva fiel às suas leis originais sem progredir; não é estátua de pedra, mas é
viva, e continuamente se vai enriquecendo com novas contribuições, à maneira de
rio que engrossa o caudal à medida que se afasta da nascente. O conteúdo desta
tradição é formado por tudo quanto o mundo espiritual produziu, e o espírito uni-
versal nunca permanece estacionário. Ora, é do espírito universal que nos devemos
ocupar aqui. É possível que em determinada nação se dê uma pausa na cultura,

102
aprimore-se

na arte, na ciência, nas capacidades intelectuais em geral. Parece ter sido o que
sucedeu com os chineses que, vai para dois mil anos, teriam estacionado no atual
grau de desenvolvimento. Mas o espírito do mundo não pode cair neste repouso
indiferente, como se deduz do simples conceito essencial do espírito, pois que o seu
viver é o seu agir. Ora, a ação pressupõe uma matéria preexistente sobre a qual se
exerça, não só a fim de a aumentar com o acréscimo de novos materiais, senão prin-
cipalmente para a elevar e transformar. Deste modo, aquilo que todas as gerações
produziram como ciência, como patrimônio espiritual, constitui uma herança acu-
mulada pelo trabalho de todos os homens que nos precederam, um templo onde
todas as gerações humanas, gratas e alegres, depuseram o que as ajudou a viver e o
que elas conseguiram extrair da profundidade da natureza e do espírito. A recepção
desta herança equivale ao exercício da posse dela. Ela forma a alma das sucessivas
gerações, a sua substância espiritual e como que um hábito transmitido, os seus
princípios, prejuízos e riquezas; e, ao mesmo tempo, tal herança degradou-se ao
ponto de servir de matéria para ser transformada e elaborada pelo espírito. Desta
maneira se vai modificando o patrimônio herdado, e simultaneamente se enriquece
e conserva o material elaborado.
Fonte: Hegel (1980, p. 327-328).

103
eu recomendo!

livro

O Mundo de Sofia
Autor: Jostein Gaarder
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2012
Sinopse: Cartas anônimas começam a chegar à caixa de correio
da menina Sofia. Elas trazem perguntas sobre a existência e o
entendimento da realidade. Por meio de um thriller emocionan-
te, Gaarder conta a história da filosofia, dos pré-socráticos aos pós-modernos, de
maneira acessível, a todas as idades.
Comentário: a leitura desse livro tem o singelo atrativo de possibilitar a você,
caro(a) aluno(a), revisitar temas e discussões filosóficas que advém do nascimen-
to da filosofia, como os pré-socráticos até aos nossos dias, em um estilo clássico
de romance, que proporciona, além da identificação com as discussões, o ensejo
para o desenvolvimento do pensamento criativo e o aprofundamento reflexivo do
ponto de vista existencial. Uma excelente leitura para que gosta de certo tom de
ficção misturado à realidade histórica.

104
anotações



































3
CONHECIMENTO E
ANTROPOLOGIA
filosófica

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

PLANO DE ESTUDO
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • O porquê do conhecimento
humano hoje • Os modos de conhecer e suas implicações no fazer humano e na vida social • Co-
nhecimento e ideologia • Antropologia filosófica, cultura e sociedade do conhecimento • Trabalho,
Alienação e Mercado.

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Analisar a importância do conhecimento humano na atualidade • Apresentar os modos de conhecer e
suas implicações no fazer humano e na vida social • Relacionar o conhecimento da tradição filosófica
e as suas implicações com o tema “ideologia” • Tratar, de maneira introdutória, a inter-relação entre
antropologia filosófica, cultura e sociedade do conhecimento • Abordar, de forma conceitual, os temas:
Trabalho, Alienação e Mercado.
INTRODUÇÃO

Quem diria que um dia o ser humano se daria conta que poderia haver
“algo” entre ele e o objeto observado? E o mais surpreendente é que esse
“algo” não é na forma-substância “material”, mas na forma-substância
“ideal”, ou seja, o conhecimento. Hoje, este é mais do que um dos ele-
mentos necessários, ele é o próprio produto dessa nova sociedade que ir-
rompe, em uma, impressionante, velocidade criativa. Contudo, e de igual
maneira, também, surgem significativos problemas advindos da condição
estruturante dessa sociedade, que se organiza em redes e sistemas de novas
tecnologias que, por sua vez, encontra, na informação (por exemplo, nas
notícias), a sua matéria prima e, assim, forma uma complexa rede que,
paradoxalmente, quando atingida, pode gerar problemas de magnitudes
nunca antes ocorridas, como as fake news.
Assim, nesta unidade, teremos como objetivos: analisar a importância
do conhecimento humano na atualidade; apresentar os modos de conhecer
e suas implicações no fazer humano e na vida social; relacionar o conheci-
mento da tradição filosófica e as suas implicações com o tema “ideologia”;
tratar, de maneira introdutória, a inter-relação entre antropologia filosó-
fica, cultura e sociedade do conhecimento; e, por fim, abordar, de forma
conceitual, os temas: Trabalho, Alienação e Mercado. Nesse sentido, nesta
unidade, trataremos as seguintes aulas: o porquê do conhecimento humano
hoje; os modos de conhecer e suas implicações no fazer humano e na vida
social; conhecimento e ideologia; antropologia filosófica, cultura e socie-
dade do conhecimento; e trabalho, alienação e mercado. Por fim, espero
que a ementa proposta nesta unidade qualifique, cada dia mais, você com
os estudos que compreendemos como pertinentes para a sua formação
acadêmico-profissional.
1
O PORQUÊ
UNIDADE 3

DO CONHECIMENTO
humano hoje

Caro(a) aluno(a), iniciamos, agora, mais uma aula, desta vez, a primeira da Unida-
de 3, a qual abordaremos o conhecimento e a antropologia filosófica. Em filosofia,
esses dois temas são considerados cruciais, porque ambos implicam em duas
disposições grandiosas e significativas do ser humano: o ato do conhecimento
e o ato da produção. A primeira disposição aponta para o ato do conhecimento,
ela assinala a capacidade cognitiva do ser humano de conhecer e de apreender o
mundo à sua volta. Aristóteles (1991) compreendia que a racionalidade do ser hu-
mano era o diferencial em relação aos outros seres vivos da natureza. A segunda
disposição, por sua vez, aponta para o ato da produção, ela assinala a capacidade
criativa do ser humano de transformar os elementos presentes na natureza em
prol de seus interesses e desejos: o poder transformador do trabalho.
Assim, conhecimento/racionalidade e produção/trabalho têm possibilitado,
ao longo dos tempos, condições ao ser humano de viver na face da terra, pois
ambas as disposições promovem, simultaneamente, as condições de segurança
e de sobrevivência do ser humano (diante de outros seres vivos, fenômenos e
de eventos ameaçadores ou de seus próprios semelhantes) bem como atuam,
propriamente, no conhecimento/produção de bens e artefatos culturais. Nesse
sentido, a palavra “porquê”, observada no título desta aula, aponta, também, para
os motivos da importância de um conhecimento atual que se faz e refaz por meio
das críticas constantes entre os filósofos, conforme testemunha a própria história
da filosofia.
108
Segundo Dicio ([2020], on-line)5, a palavra “porquê” é um substantivo mas-

UNICESUMAR
culino que pede explicação sobre um determinado fato, razão ou motivo sobre
alguma coisa. Nesse sentido, faremos a seguinte pergunta: quais razões ou motivos
que tornam o conhecimento humano tão importante e necessário para quem faz
um curso superior, como você e seus colegas estão fazendo? A resposta é que se
possa ter certeza do que irá fazer como profissional. Portanto, o motivo que nos
leva a estudar o conhecimento humano, nesta disciplina, é a busca do verdadeiro
conhecimento, da certeza do que, eu e você, como profissionais, por exemplo,
estaremos pensando, falando ou fazendo, ou seja, saber fazer o correto e não o
incorreto; o verdadeiro e não o falso; o certo e não o errado, o real e não o irreal;
o adequado e não o inadequado; o preciso e não o impreciso; o necessário e não
o desnecessário; o útil e não o inútil; o bom e não o ruim; o bem e não o mal; o
valor e não o desvalor; o importante e não o desimportante; o prioritário e não o
secundário, dentre tantas outras situações que são necessárias responder diante
das mais diversas situações que se apresentam na vida pessoal, profissional e social.
Caro(a) aluno(a), em relação à certeza do que temos de saber, exemplifica-
remos a importância e a encruzilhada que nos encontramos na atualidade: por
exemplo, diferenciar uma notícia verdadeira de uma falsa ou vice-versa, da real
de uma falsa, estamos nos referindo à questão das fake news na internet. Desse
modo, essas falsas notícias têm um imenso poder viral, espalham-se muito rá-
pido. As pessoas, tomadas pelo apelo emocional das informações falsas, fazem
com esse tipo de material “noticioso” passe como sendo verdade, sem verificar
ou confirmar se os conteúdos desses materiais são verdadeiros. Assim, o mundo
vive e acredita, nem que seja num raio de um instante (o qual faz muita diferença
no mundo virtual), em uma determinada notícia ou informação veiculada como
sendo a mais absoluta expressão da verdade ou realidade, mas que de fato é uma
notícia falsa, a qual não tem nenhuma evidência no mundo real. Assim, a questão
das fake news, conforme Carvalho e Mateus (2018), ganham notoriedade, a partir
de pequenos boatos da internet, ao tratar de diversos assuntos, dentre eles, os re-
lacionados à política, como as supostas acusações de influências de informações
manipuladas em redes sociais, nas campanhas eleitorais dos EUA e da Alemanha.
Podemos acrescentar, ainda, as eleições, também, ocorridas no Brasil no ano de
2018, quando, durante o processo eleitoral junto ao Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), foram abertos processos de denúncia e julgados recursos de um partido
contra o outro, alegando o uso das fake news no processo eleitoral. Diante disso, o

109
mundo tem reagido, segundo Carvalho e Mateus (2018), de forma crescente, com
UNIDADE 3

início na Europa, com o movimento denominado fact-checking. Na Inglaterra,


por exemplo, formou-se uma comissão para investigar, detectar e impedir pu-
blicações falsas na internet. Nessa direção, a Alemanha foi mais incisiva, além de
criar órgãos para identificar as feke News, criou leis para regulamentação no país.
Após as eleições nos EUA, em 2016, o Facebook criou ferramentas para detec-
tar as notícias maliciosas. No Brasil, tivemos, na mesma época desses escândalos,
a criação da primeira agência de fact-checking, a Lupa. Basicamente, o trabalho
dessa agência é a checagem de notícias em que se verifica a veracidade mediante
o uso de informações públicas e fontes consideradas confiáveis. Portanto, caro(a)
aluno(a), acreditamos que o exemplo das fake news, no mundo, revelam a impor-
tância que sempre a filosofia tem dado à busca dos fundamentos e das condições
do ato de conhecer. Sendo assim, ter certeza é uma questão simples? De maneira
nenhuma, em absoluto! Contudo não se preocupar com as condições e os fun-
damentos da certeza do conhecimento, isto é, do que se pensa, fala ou se faz, é
uma atitude inconsequente dos desatentos e desavisados, pois o conhecimento
racional crítico observa que não é tão simples assim ter certeza das coisas.
Descartes, no passado, já havia chamado a atenção que os nossos sentidos
(audição, visão, tato, olfato e paladar) nos enganam; por isso, hoje, ainda, herdeiros
dessa tradição filosófica, é, sempre, pertinente estudar os fenômenos e os funda-
mentos do ato de conhecer, principalmente, porque vivemos em uma sociedade
do conhecimento que tem, na informação, sua principal matéria prima. Nesse
sentido, o tema da certeza deveria ser o grande objetivo, pois, se a sociedade é uma
sociedade do conhecimento, nada mais nada menos, do que ter certezas; contudo
a pós-verdade, um tema totalmente adverso, ganhou espaço. Você já ouviu falar
sobre esse tema? Sabe do que se trata? Segundo o Priberam ([200], on-line)6, por
pós-verdade, pode-se entender:


Conjunto de circunstâncias em que é atribuída grande importân-
cia, sobretudo social, política e jornalística, a notícias falsas ou a
versões verossímeis dos factos, com apelo às emoções e às crenças
pessoais, em detrimento de fatos apurados ou da verdade objetiva
(ex.: a mentira e os boatos alimentam a pós-verdade; o tema do
momento é o pós-verdade nas redes sociais).

110
Informação que se divulga ou aceita como fato verdadeiro devido à

UNICESUMAR
forma como é apresentada e repetida, mas que não tem fundamento
real (ex.: estas pós-verdades negam anos de evidências científicas).
= FATOIDE

Que atribui mais importância a notícias falsas ou não fundamen-


tadas do que à verdade objetiva (ex.: era pós-verdade; política pós-
-verdade).

Um exemplo desse tema é tratado, de forma ficcional, no livro “1984” de George


Orwell. Sendo assim, o livro trata de uma sociedade governada por um Estado
supremo (onisciente, onipresente e onipotente) que consegue oprimir aqueles
que divergem de suas ordens, penetrando em suas mentes e os controlando por
meio de informações falsas que são divulgadas pelo Ministério da Verdade desse
governo, em que a mentira passa pela verdade e a verdade pela mentira, com o
único intuito de governar; assim, o líder do partido, o Grande Irmão, controla a
vida de todos e de todas.
Nessa direção, na filosofia, caro(a) aluno(a), há uma área especializada que
estuda o conhecimento humano, denominada Teoria do Conhecimento. Não
sei se você sabe, mas a teoria do conhecimento é, na realidade, um estudo crítico
sobre o conhecimento humano. Lembra o que nós estudamos na Unidade 1? A
filosofia é um pensamento crítico. Pois bem, esse tema do conhecimento é trata-
do desde os clássicos até hoje. Nesse roteiro, os Períodos Clássico e Moderno da
filosofia se destacam com valiosas contribuições que alavancaram e mudaram
os rumos da humanidade, por exemplo, concedendo, em muitos lugares, avanços
significativos nas tecnologias de promoção da saúde humana e da produção de
uma forma geral, proporcionando longevidade à espécie humana.
Para refletir, portanto, sobre o conhecimento humano, faremos, metodolo-
gicamente, uma abordagem fenomenológica. Por abordagem fenomenológica,
queremos dizer: fazer uma descrição do fenômeno do conhecimento, um tipo
de uma anatomia do conhecimento, como se fôssemos dissecar, mais detalha-
damente, o conhecimento humano. Nesse sentido, o objetivo é compreender a
lógica, os fundamentos e a dinâmica e, assim, apreender a estrutura básica do
conhecimento, que possibilitará o entendimento dos fundamentos filosóficos do
ato de conhecer. Conforme Aranha e Martins (2005, p. 99),

111

[...] dá-se o nome de conhecimento à reação que se estabelece en-
UNIDADE 3

tre um sujeito cognoscente (ou uma consciência) e um objeto. O


conhecimento pode ser definido como a apreensão do objeto pelo
sujeito. Todo conhecimento, portanto, pressupõe dois elementos – o
sujeito que conhece e o objeto que é conhecido, os quais se apresen-
tam dentro dessa relação.

Portanto, o conhecimento humano, basicamente, é a relação que se estabelece


entre o sujeito (a partir de agora, representado pela letra “S”) e o objeto (a partir
de agora, representado pela letra “O”). O “S” é sempre o ser humano, e o “O” é
tudo aquilo que for passivo da observação humana; nessa perspectiva, os objetos
podem ser reais ou ideais. Os reais dizem respeito, por exemplo, a uma cadeira;
a uma substância química, que se encontra numa fórmula, como H2O; e a um
ato humano bem tipificado, como ficar de luto por causa da morte de um ente
querido, um problema social, como a miséria, a fome, a dependência química, os
conflitos sociais, o racismo, a política, as políticas públicas e sociais, a violência,
dentre tantas outras.
Os ideais, por sua vez, referem-se, por exemplo, aos elementos da geometria
e da matemática, como os números, conjuntos, raízes ou equações. É importante
destacar que os objetos ideais existem, mas eles existem, somente, dentro da nossa
cabeça, no nosso pensamento, eles não têm existência material, somente, ideal.
Acompanhe o meu raciocínio: acredito que você nunca viu um número “2” e
um número “3” de mãos dadas ou abraçados, em uma rua, indo fazer compras
no shopping center de sua cidade, contudo se eu lhe perguntar se eles existem,
você me responderá, sem titubear, que eles existem. Isso porque a existência dos
números só ocorre no mundo ideal, no mundo da matemática; eles não têm
existência material como uma mesa, cadeira ou carro. Portanto, os números, são
realidades ideais e se assemelham aos objetos racionais que os cientistas sociais
constroem para expressar a realidade social, por exemplo, a respeito da violência.
Teoricamente, sabemos, hoje, que a violência pode ser: urbana, doméstica, no
trânsito, nas grandes cidades, nas periferias, dentre outras. Assim, a violência é um
bom exemplo de um objeto que se vive (real) e, também, um elaborado racional
(ideal) sobre a vida social.
Agora, veremos dois tipos de problemas muito importantes sobre o conhe-
cimento humano: a possibilidade e a origem do conhecimento. Segundo Hessen
(2003), o tema da possibilidade do conhecimento humano aborda a seguinte
questão: é possível o ser humano conhecer? Diante disso, é possível o ser humano
112
acessar a realidade e apreendê-la como ela é? Pode o “S” apreender, realmente, o

UNICESUMAR
“O”?; já o tema da origem do conhecimento humano estuda o ser humano que
conhece. A tradição filosófica compreende que o ser humano é um “S” cognoscen-
te (inteligente). Este sujeito, segundo a observação fenomenológica, revela uma
estrutura dualista: espiritual e sensível, ou seja, ideal e material.

A possibilidade do conhecimento

Antes de iniciar, retomemos: é possível o ser humano conhecer? Pode o sujeito


apreender, realmente, o objeto? Assim, veremos que o estudo sistemático da filo-
sofia, por meio da teoria do conhecimento, responde a essas perguntas, com as
seguintes possibilidades, vejamos: a primeira possibilidade refere-se ao conhe-
cimento sob a perspectiva do Dogmatismo (doutrina fixa). Hessen (2003) com-
preende que o dogmatismo é a posição para a qual não existe, ainda, o problema
do conhecimento, ou seja, ele não vê a função do conhecimento. O dogmatismo
tem, por supostas, a possibilidade e a realidade do contato entre o sujeito e o
objeto. Para ele, é evidente que o “S” apreende o “O”, e tal posição se assenta em
uma confiança, na razão humana, que, ainda, não está enfraquecida pela dúvida.
O dogmatismo não confere ao conhecimento, ou seja, a relação “S” – “O’, ou, ainda,
a correlação “S” – “O” = “I” (imagem) ou “S” – “I” – “O”.
A obra da função intermediária do conhecimento é a imagem, ou seja, esta
não existe como produto da percepção e do pensamento humano. O dogmático
é aquele que acredita que os objetos da percepção e os do pensamento são dados,
diretamente, na sua corporeidade. Ele não considera o sujeito e suas funções
(percepção e pensamento), ou seja, a nossa subjetividade como um dos gran-
des e significativos elementos determinantes do conhecimento humano; assim,
também, procede da mesma forma o conhecimento valorativo com relação ao
sujeito como ente epistemológico. Ainda, o dogmático acredita que os valores
são dados de maneira pura e simples, não há uma consciência avaliadora (algo
que determine como se dá o valor das coisas). Há três tipos de dogmatismos, o
teórico, o ético e o religioso, conforme Hassen (2003). Vejamos:
• Dogmatismo teórico: refere-se ao conhecimento teórico. Por exemplo: a Terra
é plana.
• Dogmatismo ético: diz respeito ao conhecimento moral. Por exemplo: a felici-
dade é o único fim de todo e qualquer comportamento moral.
113
• Dogmatismo religioso: trata do conhecimento religioso. Por exemplo: só há
UNIDADE 3

uma forma de batizar os que aceitam ao Cristianismo que é por meio da imersão
nas águas correntes, segundo a Bíblia.

Por fim, como atitude ingênua, o dogmatismo possui uma atitude tanto psicoló-
gica quanto historicamente, e um bom exemplo disso é a filosofia grega, com os
Pré-socráticos. Estes estavam tão voltados para a questão do ser, que não sentiam
que o próprio conhecimento era um problema. Contudo, com os sofistas, deu-se
um novo momento na filosofia, eles abordaram, pela primeira vez, o problema
do conhecimento; e, com Kant, tivemos a crítica ao dogmatismo metafísico, e os
principais exemplos de filósofos desse dogmatismo metafísico são: Descartes,
Leibnitz e Wolff; assim, ele afirmava que dogmatismo é o proceder dogmático da
razão pura, sem a crítica do seu próprio poder (HESSEN, 2003). Contudo é bom
observar que a crítica kantiana se ajusta a um dogmatismo metafísico e não lógico.
A segunda possibilidade refere-se ao conhecimento sob a perspectiva do
Ceticismo (enganar, examinar). Este nega a possibilidade de o “S” apreender
o “O”. Para o cético, o conhecimento real do objeto é impossível. Diante disso, não
se vê formular qualquer juízo, mas, sim, abster-se, totalmente, de julgar. Para o
ceticismo, o objeto não existe, e sua atenção volta-se para o sujeito (meio, círculo
cultural), na função do conhecimento, que ignora, completamente, a significa-
ção do objeto. Há quatro tipos de ceticismos: o lógico, o metafísico, o ético e o
religioso. Vejamos:
a) Ceticismo lógico: é absoluto e radical, pois dúvida de tudo e de todos.
b) Ceticismo metafísico: nega-se a existência do conhecimento.
c) Ceticismo ético: nega-se a existência de um conhecimento moral.
d) Ceticismo religioso: nega-se a possibilidade do conhecimento religioso.

Dito de outra maneira, pode-se, também, classificar o ceticismo em duas varie-


dades bem distintas, ainda, conforme Hessen (2003):
1. Ceticismo metódico: designa um método; utiliza-se como um meio para
se obter um saber absolutamente seguro.
2. Ceticismo sistemático: é uma questão de princípio, ou seja, sempre dú-
vida, nunca chega a acreditar.

O ceticismo encontra-se na antiguidade com Pirrón (360-270). Este dizia que era
impossível o sujeito apreender o objeto, portanto, não há conhecimento. De dois
114
juízos contraditórios, um é, finalmente, tão, exatamente, verdadeiro como o outro.

UNICESUMAR
Contudo temos, com Arcesilao, Carneades e Bayle, um ceticismo intermédio
ou acadêmico; segundo essa compreensão, é impossível um saber rigoroso que
aponte e expresse a, mais plena e absoluta, verdade das coisas.
Nesse sentido, nunca temos certeza que os nossos juízos concordam, totalmen-
te, com a realidade, mas pode-se dizer que parecem ser verdadeiros ou prováveis
que tenham relação entre si. Não há certeza rigorosa, somente, probabilidade.
Observa-se, de alguma forma, que há marcas desse ceticismo na atualidade, como
o conhecimento cientifico. A pesquisa cientifica ocorre por meio de teorias que se
estabelecem a partir da verificação de hipóteses entre o que se prediz e a realidade
observada. Podemos citar, ainda, um ceticismo especial, na modernidade, com
Montaigne (1592), que é o ceticismo ético; o metafísico, com David Hume e Au-
gusto Comte; o metódico, com Descartes; e o ceticismo religioso (agnosticismo),
com Herbert Spencer, o qual afirma a impossibilidade de conhecimento absoluto.
A terceira possibilidade refere-se ao conhecimento sob a perspectiva do
Pragmatismo (ação). O pragmatismo é um aspecto novo do ceticismo, pois o
pragmatismo abandona o conceito da verdade no sentido da concordância entre
pensamento e o ser, ou seja, ele estabelece um novo conceito de verdade; sendo
assim, para o pragmatismo, verdadeiro é o que significa útil, valioso, fomentador
da vida. O pragmatismo parte não da concepção que o ser humano é teórico, mas
prático, o seu intelecto está a serviço da sua vontade e da sua ação. O verdadeiro
fundador e criador do termo pragmatismo foi William James (1910). Temos, ainda,
Schiller que nomeou o pragmatismo de humanismo. Nessa perspectiva, Nietzsche,
outro defensor do pragmatismo, dizia que “[...] a verdade não é um valor teórico,
mas apenas uma expressão para designar a utilidade, para designar aquela função
do juízo que conserva a vida e serve a vontade do poder” (NIETZSCHE, 1918 apud
HESSEN, 2003, p. 50). Por fim, Hessen (2003, p. 50) dizia que o “[...] intelecto não
foi dado para conhecer a verdade, mas sim para atuar”.
Certamente, os conceitos de verdadeiro e útil são distintos, contudo é notório
o ceticismo nessa posição pragmática, uma vez que essa posição não está interes-
sada em valores absolutos ou abstratos, mas práticos ou materiais, que podem
ser verificados pela própria experiência individual ou particular. Nada de valores
universais ou lógicos. Assim, o pragmatismo, assemelha-se ao ceticismo, quando
nega a esfera lógica em desconhecer o valor próprio, a autonomia do pensamento
humano. O pragmatismo nega a esfera lógica em desconhecer o valor próprio, a
autonomia do pensamento humano.
115
A quarta possibilidade refere-se ao conhecimento sob a perspectiva do Cri-
UNIDADE 3

ticismo (examinar). Este é uma posição intermediária entre o dogmatismo e


o ceticismo. No dogmatismo, ele partilha a confiança fundamental na razão hu-
mana, o criticismo está convencido que o conhecimento humano é possível, há
uma verdade. No ceticismo, o dogmatismo partilha da dúvida a toda confiança
dogmática que aceita, despreocupadamente, a todas as afirmações da razão hu-
mana e não reconhece limites do poder do conhecimento humano. Na realidade,
o comportamento do criticismo não é dogmático ou cético, mas reflexivo e crí-
tico; é um meio termo entre ambos. Podemos dizer que há, ao longo da História,
marcas do criticismo com Platão, Aristóteles, Estoicos, Descartes, Leibnitz, Locke
e Hume. O verdadeiro fundador do criticismo foi Kant, ele criou essa concepção
com maestria. Como o método filosófico, consistia em investigar as fontes das
próprias afirmações e objeções bem como as razões em que essas fontes se as-
sentam, o criticismo dá esperança de chegar à certeza.

A Origem do Conhecimento

Conforme Hessen (2003), a origem do conhecimento discute e investiga a estru-


tura do sujeito cognoscente, ou seja, o ser humano é um ser racional e sensível. A
fonte do primeiro (racional) é a razão e do último é a experiência (sensível); veja
o exemplo: diante do juízo “o sol aquece a pedra”, pode-se elaborar esse juízo a
partir da experiência ou do pensamento. O primeiro assinala, por meio da per-
cepção, da experiência; e o segundo, por meio da lógica, de uma relação íntima,
uma relação causal do pensamento. É a razão ou a experiência a fonte e a base
do conhecimento humano? Qual destes dois fatores é decisivo? Hessen (2003)
apresenta as seguintes fontes do conhecimento, as quais se dividem em disposi-
ções racionais e sensíveis, na experiência. Vejamos:
Primeira fonte: refere-se ao Racionalismo, ou seja, a posição epistemológi-
ca que vê, no pensamento, na razão, a fonte principal do conhecimento humano
chama-se racionalismo (de ratio = razão). Segundo esta concepção, um conhe-
cimento só merece, na realidade, este nome quando é, logicamente, necessário e
universalmente válido; por exemplo: “o todo é maior do que a parte” ou “todos os
corpos são extensos”. Esses juízos possuem, pois, uma necessidade lógica e uma
validade universal rigorosa. Portanto, todo o verdadeiro conhecimento, segundo

116
o nacionalismo, funda-se deste no pensamento. O conhecimento matemático

UNICESUMAR
serviu de modelo à interpretação racionalista; assim, nesse modelo, o pensamento
impera com absoluta independência de toda a experiência, seguindo, somente,
as suas próprias leis. Quase todos os grandes representantes do racionalismo
provêm da matemática: Platão (racionalismo transcendente); Plotino e Santo
Agostinho (racionalismo teológico); Malebranche e Gioberti (racionalismo teog-
nosticismo); Descartes e Laibnitz (racionalismo imanente); e o racionalismo ló-
gico (a última forma de racionalismo), segundo Hessen (2003).
Segunda fonte: refere-se ao Empirismo (experiência). Para este, a única
fonte do conhecimento humano se dá por meio da experiência. Na opinião do
empirismo, não há qualquer patrimônio a priori da razão. A consciência do sujei-
to não tira os seus conteúdos da razão, mas, sim, da experiência. Segundo o empi-
rismo, a consciência humana está vazia, como se esta fosse uma tábua rasa, uma
folha de papel, totalmente, em branco, e quem escreve é a experiência. Todos os
nossos conceitos, incluindo os mais gerais e abstratos, procedem das experiências,
sendo assim, o empirismo parte dos fatos concretos, por exemplo: a criança nasce
sem ter nenhuma informação registrada, e, a partir de suas experiências, essas
informações são registradas, desde experiências mais elementares até conceitos
gerais e universais. Os defensores do empirismo, quase sempre, são das ciências
naturais, vejamos: na Antiguidade, temos os sofistas, os estoicos e os epicuristas;
na Idade Moderna, temos John Lock (1632-1704), com a teoria das experiências
externas e internas; David Hume (1711-1776), com a teoria das impressões; Con-
dillac (1715-1780), com a teoria do sensualismo; e John Stuart Mill (1806-1873),
com teoria que reduz à matemática e a lógica à experiência.
Terceira fonte: refere-se ao Intelectualismo. Este está entre o racionalismo
e o empirismo. O intelectualismo defende que ambos os fatores tomam parte na
produção do conhecimento. O intelectualismo sustenta, junto ao racionalismo,
que há juízos, logicamente, necessários e, universalmente, válidos não, apenas, so-
bre os objetos ideais (isto é, também, admitido pelos principais representantes do
empirismo), mas também sobre os objetos reais. O intelectualismo deriva o fator
racional do empírico; todos os conceitos procedem, segundo ele, da experiência.
Para o intelectualismo, o conhecimento humano tem, como base, a experiência e
o pensamento. Portanto, na Antiguidade, temos, como representante do intelec-
tualismo, Aristóteles, o qual diz que as ideais são as formas essenciais das coisas; e,
na Idade Média, temos São Tomás de Aquino, o qual diz que se começa recebendo

117
das coisas concretas imagens sensíveis. O intelecto age, extraindo delas (coisas) as
UNIDADE 3

imagens essenciais gerais, as espécies inteligíveis. Portanto, o intelecto possibilita


receber em si estas imagens e julgar, assim, sobre as coisas.
Quarta fonte: refere-se ao Apriorismo. Este é uma segunda tentativa para
se compreender a origem do conhecimento, a partir da relação entre o raciona-
lismo e o empirismo, conforme Hessen (2003). Contudo o apriorismo define a
relação entre a experiência e o pensamento em um sentido, diretamente, oposto
ao intelectualismo. Ele afirma que o nosso conhecimento apresenta, no sentido
desta corrente, elementos a priori independentes da experiência. O apriorismo
está na dimensão formal (não são conteúdos, mas formas do conhecimento su-
jeito), contudo estas formas recebem o seu conteúdo da experiência e é, nisto,
que o apriorismo se afasta do racionalismo e se aproxima do empirismo. O fator
a priori não procede, segundo ele, da experiência, mas, sim, do pensamento, da
razão. O princípio do apriorismo, conforme Hessen (2003, p. 63), diz que “os
conceitos sem as intuições são vazios, as intuições sem os conceitos são cegas”.
Para o apriorismo, o conhecimento humano tem, como base, o pensamento e a
experiência. O fundador do apriorismo foi Kant. Ele dizia que a matéria do co-
nhecimento procede da experiência, e que a forma procede do pensamento. As
formas da intuição são o espaço e o tempo.
Diante do exposto, caro(a) aluno(a), esperamos que tenha compreendido a
importância do conhecimento humano. Como você viu, o ser humano, desde o
nascimento da filosofia, deu importância para entender o conhecimento, mesmo
que de forma ingênua; contudo, em especial, a partir dos clássicos e da moderni-
dade, como mencionamos anteriormente, a filosofia fez elaborações mais sofisti-
cadas e precisas que possibilitaram os avanços que tivemos na humanidade. Isso
é importantíssimo registrar: apesar das contradições ou problemas que, também,
vieram com o desenvolvimento, o conhecimento filosófico foi base fundamental
de sustentação para diversos tipos de conhecimentos específicos que temos hoje,
mas todos, de alguma maneira, estão assentados em um dos principais produtos
teóricos da tradição filosófica: o conhecimento científico e, consequentemente,
o conhecimento tecnológico atual.

118
2
OS MODOS DE

UNICESUMAR
CONHECER E SUAS
implicações no fazer
humano e na vida social

Na filosofia, caro(a) aluno(a), do ponto de vista da antropologia filosófica, o tema


do conhecimento tem relação muito próxima e rica com o tema cultural. Conhe-
cimento e cultura se entrelaçam, portanto, no fazer e na vida social do ser huma-
no, pois o ato de conhecer e o ato de fazer são atividades comuns ao ser humano,
em que se nota a produção dos mais diversos bens e artefatos necessários para a
sobrevivência humana. Tais atividades ocorrem, impreterivelmente, em um dado
contexto social que expressa a riqueza e a diversidade organizacional da vida
social, por exemplo, a urbana (cidades e metrópoles), a rural (sítios e fazendas),
a indígena (tribos, aldeias e esquimó), a comunitária (quilombola, hippie, ribei-
rinha, ciganos, alternativa e da floresta), dentre outras.
Nessa direção, eu e você estudamoso ato de conhecer e fazer humano, em
uma perspectiva social. Mais uma vez, dizemos: esses dois atos são inseparáveis.
Aranha e Martins (2005) advertem que a condição humana guarda, de forma in-
separáveis, o pensar e o agir. Assim, o ser humano (homo sapiens) age porque tem
consciência e tem consciência porque é capaz de agir e transformar a realidade
(homo faber). Diante disso, de que maneira nós conhecemos uma determinada
realidade? Como nós apreendemos o que observamos? Segundo a tradição filo-
sófica, são duas as formas de conhecer: a intuição e o conhecimento discursivo.
No entendimento de Aranha e Martins (2005), o verdadeiro conhecimento
se dá em uma relação contínua e dialética entre essas duas formas que observa-
mos, o abstrato, que é o conhecimento discursivo e o concreto, que é a intuição.
119
Assim, a primeira forma, a intuição, é uma maneira de conhecer de forma direta
UNIDADE 3

e imediata, sem mediação; é um pensamento presente, como o próprio nome,


por sua vez, “intuição”, sugere pensar: uma visão direta. Essa forma aponta para
um tipo de conhecimento sensível que ressalta a sensação e a percepção. Aranha
e Martins (2005, p. 100) observam que “[...] as sensações nos dão as qualidades
das coisas, como quente e frio, vermelho e azul, doce e amargo, perfumado e mal-
cheiroso [...] A percepção é mais complexa, pois elabora a síntese das sensações”.
Veja, ainda, esse exemplo, em forma de comentário, a seguir: quando você está
diante de um objeto de cor vermelha, não precisa de informações científicas ou
teorias para ajudá-lo a identificar a cor vermelha que está vendo, pois ela está,
imediatamente, diante de você. Você conhece ou reconhece a cor vermelha e,
para isso, usa, apenas e tão somente, a sua visão, não é? Você não precisa fazer
uma faculdade para saber que a cor que está vendo, diante de você, no caso, é
a cor vermelha. Nessa perspectiva, Aranha (2012, p. 135), ainda, observa que a
intuição pode se expressar de diversas maneiras, vejamos, de uma forma mais
sistemática, cada uma destas:


A intuição empírica – é o conhecimento imediato baseado em uma
experiência que independe de qualquer conceito; essa intuição po-
de-se dá através da experiência sensível (pelos órgãos dos sentidos)
e psicológica (pela experiência interna das percepções, emoções,
sentimentos e desejos).

A intuição inventiva – é a do sábio, do artista, do cientista quando


descobrem soluções súbitas a partir de uma hipótese fecunda: diag-
nóstico médico.

A intuição intelectual – procura captar diretamente a essência do


objeto, como ocorreu com Descartes quando chegou à consciência
cognoscente, do “penso, logo existo”.

Outra forma de conhecer, bem diferente dessa primeira, é a forma ou maneira de


um conhecimento mediado ou mediatizado; esse conhecimento se dá por meio
da mediação da linguagem, por isso pode ser chamado, também, de conhecimen-
to discursivo. De forma mais simples, esse conhecimento discursivo nos diz que
há algo entre uma coisa e outra, ou seja, entre o “S”, que conhece, e o “O”, que é
conhecido, há uma ideia, um pensamento, uma teoria, uma abordagem ou con-
cepção que faz o papel de mediar. Essa mediação, segundo a filosofia, dá-se pela
120
força da razão humana. Portanto, é uma abstração, por exemplo, a teoria clássica

UNICESUMAR
freudiana do “id”, “ego” e “superego” no funcionamento psíquico humano, apesar
dessas elaborações serem, universalmente, aceitas, ninguém, até hoje, achou ne-
nhum desses elementos teóricos dentro do ser humano ou das disposições neu-
rológicas e mentais fisicamente. Desse modo, os conceitos, abstrações racionais,
orientam determinados conhecimentos sobre o que se observa, analisa ou estuda.
Nessa direção, para compreender o mundo cheio de conflitos, a razão supera a
multidão de situações e informações, organizando, em conceitos e ideias gerais, o
fim de chegar a determinadas conclusões que possibilitem o agir humano (ARA-
NHA; MARTINS, 2013). Veja esse outro exemplo: quando um médico (sujeito)
examina uma pessoa doente (objeto), a razão ajuda o profissional, oferecendo
conceitos e ideias das possíveis doenças (patologias) que se relacionam aos sin-
tomas apresentados pela pessoa examinada. Para que o médico tenha certeza
do seu diagnóstico, ele pode pedir exames auxiliares (sangue, urina, radiografia
etc.) que o ajudam em seu diagnóstico ou em sua avaliação final. Essa forma de
conhecer, portanto, é discursiva, pois usa a linguagem racional, a razão, ou seja, os
conhecimentos, devidamente, ordenados, servem de mediação para determinar
ou influenciar o que se observa. Veja que esta forma de conhecer é bem diferente
da intuição que conhece o objeto de modo direto, sem nenhum tipo mediação.
Por fim, caro(a) aluno(a), trataremos, ainda, o ato de conhecer, como ato da
consciência, no fazer humano na vida social. Essa ideia é muito interessante e
pertinente para os nossos estudos. Chauí (2015) advoga que nós, seres humanos,
somos seres racionais conscientes, e isso quer dizer que o ser humano é dotado
da capacidade para conhecer, para saber o que conhece e para saber o que sabe
que conhece. Calma! Não é mero trocadilho, mas questões importantes. Vamos
estudando! Leia atentamente e, se não entender, leia novamente com calma. Co-
nhecer algo novo sempre precisa de atenção e foco, afinal, passa pela nossa cabeça
milhares de pensamentos e ideias em frações de segundo e, quando estamos
ansiosos, essas ideias ou pensamentos aumentam ainda mais de forma cúbica.
Recapitulemos, então: estudamos o ato de conhecer como ato de consciência;
nesse sentido, é um ato de conhecimento sobre as coisas e sobre si mesmo, do
mundo externo e do mundo interno a nós, seres humanos, não necessariamente
nessa ordem, porque tudo é importante, mas, primeiro, ao observar o mundo
externo, o ser humano conhece um determinado objeto fora de si e observa a
formação de colônias de fungos, por meio de um microscópico, ou observa o
seu próprio mundo interno, por meio das sensações e percepções que têm em
121
determinada situação vivida. Agora, em segundo lugar, a consciência conhece
UNIDADE 3

esse conhecimento que é produto desse ato de observação externa e interna tam-
bém; o nome que chamamos para esse tipo de conhecimento, produzido pela
consciência, é reflexão, ou seja, é o ato de pensar o que se pensa ou pensou, do
que sentiu ou do que se sente ou do que se fez ou faz. É um recurso espetacular
da nossa consciência!
Ainda sobre o ato de conhecer, nessa mesma linha que estamos estudando,
como o ato de consciência, afirmamos que há graus de consciência, ou seja, as-
sim como sabemos, mais ou menos, sobre um mesmo assunto, assim, também, a
nossa consciência aprende a realidade em que nós seres humanos vivemos mais
ou menos; assim, ela depende da nossa própria condição humana, pois a nossa
consciência não faz parte do nosso corpo, ela é o nosso corpo; assim, por exem-
plo, quando ela é atingida fisicamente (por exemplo, quando uma pessoa sofre
um traumatismo craniano), é, também, atingido o que ela produz, o conhecer.
Explicaremos melhor: segundo Chauí (2015), apesar de sabemos, por exemplo, se
é dia ou noite, que horas são, dia da semana ou onde estamos precisamente, isso
revela, plenamente, a nossa capacidade de senso percepção temporal e espacial
sobre si mesmo, porém isso não significa, necessariamente, que a nossa consciên-
cia esteja sempre alerta e atenta a tudo e a todos. Seria maravilhoso, mas isso não
é um ato humano, mas, sim, divino; a nossa humanidade é cheia limitações e o
não desenvolvimento sobre esse autoconhecimento sobre nós mesmos tem nos
levado, muitas vezes, a sofrermos consequências, não poucas vezes, fatais.
Assim, portanto, o ato de conhecer, como ato de consciência, também, implica
no fazer humano socialmente, pois todo e qualquer ser humano, quando ciente
dos seus deveres ou responsabilidades, não age como se espera que aja, ou seja,
pode ser que esta pessoa não tenha consciência do seu papel, mesmo sabendo o
que tem de fazer. Portanto, conferimos ao estado de consciência algumas condi-
ções físicas e mentais para servir de critérios para se fazer o julgamento se uma
pessoa está ou não ciente do que faz ou do que fez.
Complexo né, caro(a) aluno(a)? Concordo, por isso, também, que desenvol-
vemos estudos sobre o nosso conhecimento, nossa cognição ou inteligência, pois,
por exemplo, no mundo do trabalho, realizamos diversas atividades, desde as mais
simples às mais difíceis, complexas e perigosas, que envolvem a vida de pessoas,
inclusive a sua, e de organizações e corporações também. Há outros assuntos que
envolvem o conhecer, como relacionamentos afetivos, familiares, profissionais,
sistemas e formas de governos, políticas no sentido geral e específico, economia,
122
arte, forma de organização do ambiente de trabalho e da forma como a sociedade

UNICESUMAR
se organiza e da relação que se dá entre os seus diversos agentes sociais.
Por fim, os atos de conhecer implicam, sem dúvida nenhuma, no fazer humano
e na vida social. Desde a forma como apreendemos o mundo e o organizamos até
o uso do conhecimento que temos para aplicarmos em nosso própria vida pessoal
e social. Por isso, pensar filosoficamente deve ser um ato crítico não no sentido de
se tornar uma pessoa chata ou “do contra”, mas empregar essa condição fantástica
do conhecimento para a proteção da vida, dentre elas, da vida social, em que o
fazer humano ocorre e expressa sua capacidade racional, cognitiva e intelectual.

3
CONHECIMENTO
E IDEOLOGIA

Não para não! Vamos, vamos! Agora não é hora de beber água: ouço essa fala do meu
counting quando estou fazendo crossfit. Isso não quer dizer que não se tenha hora
para parar e beber água, pelo contrário já passei por situações que ele me dizia: “pare,
sente e descanse e depois você volta, beleza”. Primeiro, aprendi que há momentos de
continuar e de parar quando se faz crossfit. Ambas as atitudes estão relacionadas ao
autoconhecimento das minhas condições físicas especificamente. Contudo o meu
counting tem formação em educação física e conhece o corpo humano fisicamente
como poucos, por isso ele pode me ajudar mesmo que o objeto que estamos nos
123
referindo seja o meu próprio corpo. Lembrou do conhecimento discursivo, abstra-
UNIDADE 3

to, racional. O meu counting conhece mais o ser humano do ponto de vista teórico
do que eu; claro que eu posso me sentir e me perceber mais do que qualquer outra
pessoa, por isso deve haver o bom senso entre a intuição, que é o conhecimento que
temos de nós mesmos e o conhecimento discursivo teórico, no caso especifico, sobre
o corpo humano que o meu counting tem formação. Tranquilo!
Portanto, neste tópico precisamos continuar estudando e refletindo sobre o co-
nhecimento. Contudo, agora, vamos entrar numa zona cinzenta. Voando em céu de
brigadeiro (expressão para dizer que o céu está totalmente limpo sem nuvens ou azul)
e de repente à frente surgem nuvens CB – Cumulonimbus, ou seja, as nuvens mais
perigosas da Terra. Isso mesmo! Em um dia ensolarado, é muito gostoso ver as nuvens
no céu como se fossem bolas de algodão flutuando no ar, mas quando surgem essas
nuvens “CBs”, elas estão avisando que “o mar não está para peixe” (expressão popular
para dizer que a frente a situação não é nada boa). As nuvens CB são causadas pelos
ventos em linha reta em altitudes mais elevadas, que cortam o topo da nuvem, e tam-
bém por uma inversão sobre a tempestade, causada pelo aumento da temperatura
acima da troposfera (ECHER, MARTINS; PEREIRA, 2006), isso quer dizer que se
um avião entrar nessas nuvens há perigo e risco real dele cair.
Caro(a) aluno(a), toquei nesse assunto, como exemplo, não para colocar medo
em você e assim você parar de andar de avião, nada a ver; hoje, já sabemos que voar
de avião é muito, mas muito mais seguro do que andar de carro nas rodovias. Fiz essa
comparação para assinalar que devemos ter os devidos cuidados quando se estuda
“conhecimento e ideologia”. Esses temas, ambos relacionados, são muito importantes,
contudo a imensa maioria das pessoas não dá atenção a eles e, como, na maioria das
vezes, não são da área da filosofia ou da área das humanidades, compreendem que
tudo termina em ideias ou qualquer tipo de pensamento, simples assim. Mas não é
isso que se nota quando se estuda esses temas, vamos lá! Recapitulando, em nossa
viagem ao mundo maravilhoso da filosofia, o objetivo de conhecer é ter certeza
do que se sabe, pensa, sente e faz. Assim, o conhecimento está associado à busca
da verdade. Como já vimos, a filosofia, também, estuda o que é verdade, se esta
existe e quais as condições de aprendê-la. Assim, quando estudamos conhecimento
e ideologia, estamos, realmente, em uma área cinzenta, porque pode confundir, e
nós, também, podemos não perceber o que estamos comunicando a você. Por isso,
todo o cuidado é pouco. Não podemos ser ingênuos como foram os Pré-socráticos,
devemos dar a devida atenção e medida para entender e, assim, saber nos colocar,
da melhor maneira, sobre todo e qualquer assunto que se coloca, assim como uma
124
questão importante como essa. O que significa ideologia? Segundo Dicio ([2020],

UNICESUMAR
on-line)7, ideologia é um:


Substantivo feminino.

Reunião das certezas pessoais de um indivíduo, de um grupo de


pessoas e de suas percepções culturais, sociais, políticas etc.: sua
ideologia é fazer bem ao próximo.

[Política] Reunião das ideias características de um grupo, de um


período, e que marcam um momento histórico: ideologia capitalista.

Ciência da origem das ideias; estudo das ideias de modo abstrato;


doutrina das ideias.

[Sociologia] Organização de ideias fundamentadas por um deter-


minado grupo social, caracterizando seus próprios interesses ou
responsabilidades institucionais: ideologia cristã; ideologia funda-
mentalista; ideologia nazista etc.

[Filosofia] Marxismo. Aquilo que abarca o sistema de ideias, tanto


autorizadas pelo poder econômico da burguesia, quanto àquelas
que expressam as preocupações revolucionárias do proletariado;
consciência social.

[Filosofia] Atribuição da origem das ideias às noções sensoriais do


indivíduo a partir de sua compreensão do mundo externo.

Realmente, é muito interessante as primeiras aproximações que fazemos sobre


esse tema, mas, caro(a) aluno(a), queremos dedicar nossos estudos, nesta aula, a
dois grandes filósofos dos nossos tempos, a brasileira Marilena Chauí (2015) e o
esloveno Zizek (1996); acreditamos que ambos nos ajudam a compreender um
pouco melhor a relação entre conhecimento e ideologia e suas implicações para o
conhecimento e vida do ser humano como ser social. Chauí (2015) inicia o estudo
para explicar o que vem ser ideologia, fazendo uma pergunta (afinal, ela é filósofa
e todo e bom filósofo que se preza faz perguntas para instigar o conhecimento):
a consciência pode conhecer tudo?
A Psicologia e a Sociologia dizem que não, pois a primeira diz que a cons-
ciência é inconsciente, e a segunda diz que ela é alienada. Assim, Chauí (2015)
aprofundou o referido tema ao abordar os temas da alienação e projeção. Segundo
125
a referida autora, Feuerbach, filósofo alemão, investigou e desenvolveu uma teoria
UNIDADE 3

filosófica, a qual diz que o ser humano, por meio das religiões, constrói explica-
ções projetivas sobre a origem e a finalidade de tudo que esteja relacionado ao
mundo. Portanto, a origem do termo alienação, segundo Chauí (2015), faz parte
do pensamento advogado por Feuerbach, o qual afirmava que o ser humano é
o criador da sua existência e realidades; contudo passa a não acreditar em suas
próprias criações como não sendo obras de suas mãos, como criador.
Para Chauí (2015), o surgimento, a implantação e o fortalecimento da ideo-
logia se dá por causa de três grandes formas da alienação, as quais são: alienação
social, econômica e intelectual. Nessa direção, a função principal da ideologia é
ocultar e dissimular as divisões sociais e políticas e dar a essas divisões aparência
de união completa e forte, bem como fazer acreditar que há diferenças. Mas elas
são, absolutamente, naturais, quer entre os seres e as relações políticas e sociais,
quer entre as pessoas em sociedade. Portanto, a finalidade da ideologia, no en-
tendimento de Chauí (2015), é proporcionar a naturalização das condições de
vida, como se estas fossem, absolutamente, normais, corretas e justas, ou seja,
sem nenhum tipo de contradição ou interesse político. Agora, apresentaremos
os procedimentos da ideologia, segundo Chauí (2015), vejamos:
■ Inversão: coloca os efeitos no lugar das causas e transforma estas últimas em
efeitos.
■ Imaginário social: a segunda maneira de operar da ideologia é a produção, por
meio da imaginação reprodutora.
■ Silêncio: a coerência e a unidade do imaginário social ou ideologia vêm, por-
tanto, do que é silenciado.

Outrossim, é importantíssimo, sempre, buscar entender a origem e os intentos


que estão na gênese de tudo aquilo que se relaciona à produção social, política
e cultural referentes às crenças, opiniões, comportamentos ou ideias do ser hu-
mano. Portanto, nesse sentido, há uma relação entre ideologia e inconsciente no
sentido que as representações e regras, saídas da experiência imediata, são com-
preendidas como verdades absolutas, e isso só é possível por meio da massificação
de ideias-imagens e da inversão de causas e efeitos das ações dos seres humanos
em sociedade, segundo Chauí (2015). Por sua vez, Zizek (1996), quando trata
do conceito de ideologia, diferentemente do que vimos anteriormente, afirma
que uma ideologia não é, necessariamente, algo “falso”, ou seja, para o referido
filósofo, a ideologia pode até ser “verdadeira” do ponto de vista do conteúdo. O
126
que importa, ao analisar o aspecto ideológico, é a maneira que esse conteúdo se

UNICESUMAR
relaciona com a postura subjetiva envolvida em seu próprio processo de enun-
ciação. Explicaremos melhor, caro(a) aluno(a): o ideológico está relacionado ao
aspecto funcional, com respeito a alguma relação de dominação social (explo-
ração), de maneira, intrinsecamente, não transparente; para ser eficaz, a lógica
de legitimação, da relação de dominação, tem de permanecer, necessariamente,
oculta. O próprio Zizek (1996, p. 14) dá um exemplo oportuno:


Quando, uma potência ocidental intervém num país do Terceiro
Mundo em decorrência de violações dos direitos humanos, pode
ser perfeitamente “verdadeiro” que, nesse país, os direitos humanos
mais elementares não tenham sido respeitados, e que a intervenção
ocidental irá efetivamente melhorar o quadro desses direitos. Mes-
mo assim, essa legitimação é ideológica, na medida em que deixa
de mencionar os verdadeiros motivos pela intervenção (interesses
econômicos etc.). O modo mais destacado dessa “mentira sob o dis-
farce da verdade”, nos dias atuais é o cinismo: com desconcertante
franqueza,“admite-se tudo”, mas esse pleno reconhecimento de nos-
sos interesses não nos impede, de maneira alguma, de persegui-los; a
fórmula do cinismo já não é o clássico enunciado marxista do “eles
não sabem, mas é o que estão fazendo”; agora, é “eles sabem muito
bem o que estão fazendo, mas fazem assim mesmo”.

Portanto, ideologia não deve ser entendida como simples “ilusão” ou “falsa cons-
ciência”, mas como uma ação funcional em prol de algo que pode estar rela-
cionado ao verdadeiro; ela não manifesta as reais intenções que são guardadas
pela esfinge da dominação e do poder, pois ambas sob a capa de uma causa ou
razão verdadeira. Zizek (1996) expõe os possíveis sentidos associados ao termo
“ideologia”, assim, ele afirma que ideologia como um complexo de ideias (teorias,
convicções, crenças, métodos de argumentação); a ideologia em seu aspecto ex-
terno, ou seja, a materialidade da ideologia, os Aparelhos Ideológicos de Estado,
e, por fim, o campo mais fugidio, a ideologia “espontânea” que atua no cerne da
própria “realidade” social.
Por fim, não menos importante, caro(a) aluno(a), Zizek (1996) observa a
inversão da não-ideologia em ideologia, ou seja, mesmo que se empregue uma
conscientização do próprio gesto (teórico ou prático) de sair da esfera ideológi-
ca, ao negar o caráter ideológico, na realidade, essa negação conduz ao próprio
127
cerne fundamental da ideologia como tal. Nesse sentido, ainda, toda e qualquer
UNIDADE 3

afirmação peremptória contra um determinado pensamento, tido como sendo,


estritamente, ideológico, revela, por sua vez, inversamente, o aspecto ideológico
da própria crítica, o qual pode se apresentar como manifestação, e assim o é me-
lhor, legitima e relacionada à mais absoluta verdade dos fatos sociais e políticos
existentes, mas, mesmo assim, resguarda intentos e interesses fundamentais que
se encontram na gênese do discurso e da ação política e social entre os atores
sociais, do ponto de vista do conteúdo ou da realidade social e não falsa.

4
ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA,
CULTURA E
sociedade do conhecimento

Caro(a) aluno(a), estudaremos, nesta aula, três temas correlatos, isto é, que têm
relação entre si, sendo eles: Antropologia Filosófica, Cultura e Sociedade do Co-
nhecimento. É importante ressaltar que abordaremos os referidos temas, de forma
elementar e introdutória, nos seus aspectos conceituais. Inicialmente, a grosso
modo, o ser humano é o ponto de contato entre esses três temas, pois o ser hu-
mano é produtor e produto dele mesmo dialeticamente. Explicaremos melhor: o
ser humano é determinado pelo meio ou cultura onde vive e, assim, determina a
cultura como sujeito que a constrói. Logo, Cultura pode ser compreendida como
substrato filosófico da inteligência humana; como ser racional, o ser humano é
128
capaz de elaborar, compreender as suas necessidades e, ao mesmo tempo, utili-

UNICESUMAR
zá-las como produto e, assim, autodeterminar-se, por meio dos costumes, pelos
próprios bens e produtos que ele mesmo os produz; por isso e a partir de um
determinado contexto de necessidades, utiliza o que foi produzido por ele mes-
mo, como se fosse uma necessidade imperiosa, a ponto de ser entendido como
absolutamente “natural”. Contudo o mundo para nós, seres humanos, sempre é
cultural, no sentido que é o ser humano cria e recria a sua vida, realidade, no seu
sentido mais amplo possível.
Atenção! Uma ressalva, caro(a) aluno(a): essas elaborações que fizemos an-
teriormente, sobre os temas desta aula, não as tome como devaneios bestiais
ou meras elucubrações, as quais são popularmente conhecidas como: “viajar na
maionese”. Nunca subestime o ato do conhecimento. Nunca! O crescimento in-
telectual, também, vem pelo ouvir o outro. Por isso, agora, é a hora de você con-
siderar tudo que você estudado, por meio de uma leitura atenta e crítica.
A partir do momento em que o ser humano começou a perceber que tem
capacidade cognitiva, que pode conhecer e problematizar o próprio ato do co-
nhecimento, como sendo um ato crítico, ele tem proporcionado a si mesmo con-
dições intelectuais mais sofisticadas (no sentido de elaborações complexas) para
poder não somente contemplar (como afirmavam os antigos filósofos sobre o
objetivo do conhecimento), mas, fundamentalmente, extrair todas as riquezas
(uma cultura da exploração e da conquista), tanto do mundo exterior quanto
interior do ser humano.
Não é por acaso que, atualmente, os conhecimentos das áreas biológicas e
humanas estão em alta e revelando funcionamentos e disposições que, possivel-
mente, estejam nas causas ou se relacionado com as condições das produções
dos mais diversos transtornos que acometem o ser humano na atualidade, como
a depressão, a ansiedade e o suicídio. Portanto, pode parecer um pensamento
sem nexo, mas continue a estudar, a ler e a refletir sobre tudo que você pode ler e
estudar, além disso empregue, honestamente, suas disposições para entender, pois
o que estamos tratando, aqui, modestamente, é a fonte do conhecimento, como
um olho d’água. Vivemos um tempo em que o conhecimento é uma riqueza e a
informação a sua matéria prima (sociedade do conhecimento), quanto mais você
domina e entende o conhecimento e os mais diversos temas que estão relaciona-
dos a ele, mais você ganha melhores condições para viver a sua própria existência
e, assim, pode fazer suas próprias escolhas movidas de forma mais racional pos-
sível e que tenham justificativas plausíveis, especialmente, que atendam às suas
129
necessidades bem como contribuam socialmente para atender as necessidades
UNIDADE 3

do meio social onde você vive. Para concluir a introdução desta aula, registre,
caro(a) aluno(a), nessa direção, que esses temas (antropologia filosófica, cultura
e sociedade do conhecimento) não são meros produtos ou resultados do ato de
conhecer, são temas que produzem o próprio conhecimento, pois quem fomenta
essa produção somos nós mesmos, o ser humano. Logo, quando se diz que os
referidos temas têm relação entre si, surgem algumas perguntas: um tema é mais
importante do que os outros dois? Por qual tema começar a estudar? Quais os
critérios para saber quando um tema é mais importante do que o outro ou não há
nada disso? Um tema é a base do outro e assim sucessivamente? Qual tem maior
importância no momento, ou não existe uma hierarquia entre eles? Que tipo de
momento pode explicar esses temas? Lembre-se, caro(a) aluno(a), quem estuda
utiliza o pensamento, assim como quem faz academia utiliza o corpo. Você possi-
velmente já fez academia e deve ter sentido um pouco de indisposição para fazer
os exercícios físicos iniciais; mas, quando você começou a perceber os resultados
obtidos, foi pegando gosto em fazer, ainda mais, os exercícios da academia; dessa
forma, também, é estudar, você está usando uma disposição, “seu pensamento”,
que é um produto do seu cérebro, ou seja, quando você pensa ou raciocina, está
exercitando o seu cérebro e, no começo, pode surgir uma certa indisposição, mas,
se você continuar e se motivar em querer conhecer e aprender a fazer o que deseja
como profissional, certamente, terá mais disposição em conhecer. É isso! Agora,
vamos ao que interessa, aos temas e seus conteúdos elementares e introdutórios
para os nossos estudos nesta nossa viagem ao mundo maravilhoso da filosofia.
A Antropologia Filosófica, segundo Abbagnano (1982), refere-se a uma
exposição sistemática dos conhecimentos que se têm a respeito do ser humano.
A partir de Kant, já na modernidade, o termo ganha sentido diversos, como:
1. Aquilo que a natureza faz do ser humano.
2. Em uma perspectiva pragmática, aquilo que o homem faz como ser livre
ou então o que pode ou deve fazer de si mesmo.
3. Na perspectiva da antropologia física, que considera o ser humano como
ser biológico, isto é, em sua estrutura somática, em suas relações com o
ambiente e em suas classificações raciais.
4. Do ponto de vista da antropologia cultural, a qual considera o ser humano
como ser social a partir das suas características que derivam das suas mais
diversas relações sociais.

130
Nesse sentido, Chauí (2015) observa que o olhar da antropologia para a cultura

UNICESUMAR
tem um prisma que procura entender em que momento e de que maneira os
seres humanos se afirmam como diferentes da Natureza, fazendo, assim, surgir
o mundo cultural. Desse modo, há um certo consenso filosófico que os humanos
diferem da natureza, devido à linguagem e à ação por liberdade. Do ponto de vista
antropológico, pode-se definir a Cultura como tendo três sentidos principais,
segundo Chauí (2015):
1. Criação da ordem simbólica da lei, isto é, de sistemas de interdições e
obrigações, estabelecidos a partir da atribuição de valores a coisas (boas,
más, perigosas, sagradas, diabólicas), a seres humanos e às suas relações
(diferença sexual e proibição do incesto, virgindade, fertilidade, puro-im-
puro, virilidade, diferença etária e forma de tratamento dos mais velhos e
mais jovens, diferença de autoridade e formas de relação com o poder etc.)
bem como aos acontecimentos (significado da guerra, da peste, da fome,
do nascimento e da morte, obrigação de enterrar os mortos, proibição de
ver o parto etc.).
2. Criação de uma ordem simbólica da linguagem, do trabalho, do espaço,
do empo, do sagrado e do profano, do visível e do invisível. Os símbolos
surgem tanto para representar quanto para interpretar a realidade, dan-
do-lhe sentido pela presença do ser humano no mundo.
3. Conjunto de práticas, comportamentos, ações e instituições pelas quais
os humanos se relacionam entre si e com a natureza e dela se distinguem,
agindo sobre ela ou por meio dela, modificando-a. Este conjunto funda
a organização social, sua transformação e sua transmissão de geração a
geração.

Por fim, em uma perspectiva antropológico, há culturas e não cultura, no singular,


pois a lei, os valores, as crenças, as práticas e as instituições são relativas à forma-
ção social; dessa maneira, o que se tem, no mundo, são culturas que expressam e
manifestam forma de vida que apontam, inicialmente, para as origens do homo
sapiens na face da terra. Contudo, antropologicamente, caro(a) aluno(a), tem-se
a informação de que, além do homo sapiens, há outras humanidades guardadas
nos mistérios da nossa formação e constituição como seres vivos. Segundo Ha-
rari (2018), os humanos (isso mesmo humanos, no plural) surgiram na África
Oriental, há cerca de 2,5 milhões de anos, sendo eles: homo rudolfensis (homem
do lago Rudolf - África Oriental), homo hectus (homem ereto - Ásia Oriental),
131
homo neanderthalensis (homem do vale Neander - Europa e Ásia Ocidental),
UNIDADE 3

homo soloensis (homem do vale do solo), homo floresiensis (homem da Ilha de


Flores) e homo ergaster (homem trabalhador). Ainda, deve ser considerado, por
fim, que uma mesma sociedade, ao longo do tempo e da História, passa por trans-
formações culturais internas significativas e amplas. Conforme Chauí (2015), são
dois os significados iniciais da noção de Cultura:
■ Vindo do verbo latino colere, que significa cultivar, criar, tomar conta e
cuidar, Cultura significava: o cuidado do homem com a Natureza. Donde:
agricultura. Significava, também, cuidado dos homens com os deuses.
Donde: culto. Significava, ainda, o cuidado com a alma e o corpo das
crianças, com sua educação e formação. Donde: puericultura (em latim,
puer, que significa menino; puera, menina). A Cultura era o cultivo ou a
educação do espírito das crianças para tornarem-se membros excelentes
ou virtuosos da sociedade pelo aperfeiçoamento e refinamento das qua-
lidades naturais (caráter, índole, temperamento)
■ A partir do século XVIII, Cultura passou a significar os resultados da for-
mação ou educação dos seres humanos, resultados expressos em obras,
feitos, ações e instituições: as Artes, as Ciências, a Filosofia, os Ofícios, a
Religião e o Estado. Assim, vindo a se tornar sinônimo de civilização, pois os
pensadores julgavam que os resultados da formação-educação aparecem,
com maior clareza e nitidez, na vida social e política ou na vida civil (a pala-
vra civil vem do latim cives, que significa cidadão; civitas, a cidade-Estado).

Logo, pode-se observar a cultura, no primeiro sentido empregado anteriormente,


como sendo o aprimoramento da natureza humana, por meio de uma formação
educativa no sentido amplo, como ocorre na formação das crianças não só me-
diante o letramento, contudo, também, por meio da inserção na vida social, por
meio da aprendizagem pela dança, música, poesia, ginástica, história, retórica, gra-
mática, filosofia etc. Nessa direção, Aranha e Martins (2005, p. 21) compreendem
que “[...] cultura é o modo como indivíduos e comunidades respondem às suas ne-
cessidades e aos seus desejos simbólicos.” Nessa mesma perspectiva, surge uma das
perguntas mais simples, mas que é difícil responder: o que é o ser humano? Essa
pergunta não nasceu hoje, ela já nos acompanha desde o tempo do surgimento da
filosofia. As ideias, a seguir, estão alinhavadas a algumas informações de Incontri
e Bigheto (2010) sobre as mais diversas posições filosóficas sobre o que é o ser
humano, isto é, o que o distingue, o especifica ou o diferencia como tal, vejamos:
132
■ Os Pré-socráticos respondiam, em sua maioria, que o ser humano era

UNICESUMAR
um ser constituído de matéria, puramente, física, desvinculado de qual-
quer concepção religiosa. Os autores desse pensamento foram Leucipo
e Demócrito.
■ Os clássicos, como Sócrates e Platão, compreendiam que o ser humano
é um ser espiritual no sentido que a razão é o poder da racionalidade
e, por meio do diálogo, é possível o ser humano conhecer a si mesmo e
ao outro no convívio social; logo, o ser humano é um ser de moralidade
imanente, ou seja, nasce com ele e que deve se expressar no convívio com
outros seres humanos no desenvolvimento dessa potencialidade, o que,
para Platão, seria a alma a responsável pelo pensar e amar, a essência do
ser humano. Dessa maneira, a alma é superior e o corpo inferior. Nessa
mesma direção, no início da modernidade, Descartes afirma que o ser
humano é uma substância pensante e não dependente de nada que seja
material, isto é, uma alma pensante.
■ Nos períodos em que a Igreja se tornou hegemônica, as ideias de Agostinho
(influenciado por Platão) e São Tomás de Aquino (influenciado pelas ideias
de Aristóteles) se apresentaram como grandes sínteses entre o pensamento
clássico. Agostinho defendia a ideia de que guardamos, na alma, uma lem-
brança da nossa origem divina e do obstáculo do pecado original e Aquino,
filósofo e teólogo, defendia a ideia de que o ser humano é, ao mesmo tempo,
corpo e alma, ambos pertencendo a uma mesma substância.
■ No período iluminista, são avivadas as duas posições: os materialistas e os
humanistas. De um lado, como Voltaire ou Diderot, a matéria estática ou
em movimento dava legitimidade à existência de uma inteligência natural
e, assim, não religiosa, como acreditavam alguns; de outro lado, como Con-
dillac e Rousseau, com concepções humanistas, defendiam a concepção de
que o ser humano é composto de corpo e alma; esta dá características ao
corpo e é imortal; assim, principalmente, Rousseau afirmava à existência
de Deus e da natureza humana como sendo algo social e política.
■ Para os filósofos Marx e Engels, o ser humano é um ser material, em que
a realidade é que o determina e, assim, ele produz sua própria existência e
o mundo; além disso, é, por meio da existência do homem, que o mundo,
também, é constituído e formado. Dessa maneira, o ser humano não é um
ser espiritual, ideal ou qualquer coisa parecida que seja, mas é material,
um resultado dinâmico do seu tempo e espaço social, cultural e histórico.
133
■ Para Cassirer, neokantista, o ser humano é um ser complexo. O referi-
UNIDADE 3

do filósofo observa que o ser humano é o único que tem as condições


criadoras da formação do sistema simbólico, por exemplo, criar cultura.
Portanto, o que há de mais característico no ser humano é ser fazedor
de cultura da criação do mundo simbólico, como: o mito, a religião, a
linguagem, a arte, a filosofia, ciência, dentre outros.
■ No século XIX, diversos filósofos, como Nietzsche, Schopenhauer e Es-
pinosa, afirmam que o ser humano é, essencialmente, um ser de desejos
e vontades. Este último filósofo afirmava a vontade como categoria im-
perativa ao ser humano: vontade da eternidade (de busca) ou o saber o
que deseja ser (conhecer).

Por fim, do ponto de vista da história da filosofia, podemos observar que o ser hu-
mano é um ser complexo e que vai se revelando, ao longo dos tempos, como ser
estático ou dinâmico, como ser único, diverso ou universal ou, ainda, como ser ma-
terial, regional, existencial, social, político, cultural, artístico e religioso bem como se
mostra e se esconde de si mesmo, devido às suas próprias condições e capacidades
conscientes e inconscientes. Portanto, o conhecimento sobre o que é o ser humano
está mais do que nunca aberto, uma vez que o entendimento de uma boa parcela
da humanidade o vê como um ser que, independentemente de cada uma das con-
cepções existentes, do ponto de vista dos estudos antropológicos e históricos, revela
uma diversidade instigante e curiosa.
Quanto à Sociedade do Conhecimento, segundo Burch ([2020], on-line)8,
a noção do termo “sociedade do conhecimento” (ou como alguns preferem cha-
mar: sociedade da informação) aparece, pela primeira vez, no final da década de
90, principalmente, nos círculos acadêmicos. Outro aspecto desse termo é que este
está relacionado à contemporaneidade, conforme afirma Tünnermann (2008, p.
7): “[...] uma das características da sociedade contemporânea é o papel central do
conhecimento nos processos de produção, ao ponto do qualificativo mais frequente
hoje empregado ser o de sociedade do conhecimento”. Esse termo já é empregado
por organizações internacionais como UNESCO e a própria ONU, conforme Burch
([2020], on-line)8, que, assim, informa e comenta:


A UNESCO, em particular, adotou o termo “sociedade do conheci-
mento” ou sua variante “sociedades do saber” dentro de suas políticas
institucionais. Desenvolveu uma reflexão em torno do assunto que
134
busca incorporar uma concepção mais integral, não ligada apenas

UNICESUMAR
à dimensão econômica. Por exemplo, Abdul Waheed Khan (subdi-
retor-geral da UNESCO para Comunicação e Informação), escreve
[3]: “A Sociedade da Informação é a pedra angular das sociedades
do conhecimento. O conceito de “sociedade da informação”, a meu
ver, está relacionado à ideia da “inovação tecnológica”, enquanto o
conceito de “sociedades do conhecimento” inclui uma dimensão de
transformação social, cultural, econômica, política e institucional,
assim como uma perspectiva mais pluralista e de desenvolvimento.
O conceito de “sociedades do conhecimento” é preferível ao da “so-
ciedade da informação” já que expressa melhor a complexidade e o
dinamismo das mudanças que estão ocorrendo. (...) o conhecimento
em questão não só é importante para o crescimento econômico, mas
também para fortalecer e desenvolver todos os setores da sociedade”.

Diante disso, observa-se que a ideia de “sociedade do conhecimento” é um modo de


vida social e cultural que valoriza o próprio conhecimento humano como elemento
produtivo estruturante e não mais como um dos elementos para a produção e de-
senvolvimento, como bem afirma Burch ([2020], on-line)8: “[...] pela primeira vez
na história, a mente humana é uma força produtiva direta, não apenas um elemento
decisivo do sistema de produção”. Assim, portanto, a sociedade do conhecimento
tem-se constituído como elemento fundante de uma nova cultura propriamente
dita, pois cria e dissemina necessidades como sendo estas necessárias para dar conta
de incrementar a vida desse tipo de sociedade, que se forma diante de nós, por meio
de novos bens e artefatos, que os denominamos, dentre outros nomes, como sendo
expressões das novas tecnologias da sociedade do conhecimento.
Por fim, é importante compreender e ressaltar que a sociedade do conhecimento
não é um produto de si mesma, mas uma construção social que incrementa e pos-
sibilita atender novas necessidades que surgem e que necessitam serem atendidas.
Contudo, quem gera ou alimenta a produção dessas necessidades? Nesse sentido, a
partir dos nossos estudos realizados sobre ideologia, por exemplo, possibilita-nos
entender que a sociedade do conhecimento é constituída pelos valores culturais já
existentes e que promovem, assim, a construção de novas formas de vida em so-
ciedade, de interesses dentro do espectro capitalista. Quem, de uma forma crítica,
aborda o tema da sociedade do conhecimento é Tünnermann (2008, p. 7), ao analisar
o significado da sociedade do conhecimento e da sociedade da informação como
forças produtivas atuais:
135

[...] ao se tornarem forças produtivas, o conhecimento e a informa-
UNIDADE 3

ção se integram ao próprio capital, que começa a depender desses


fatores para a sua acumulação e reprodução. À medida que a hege-
monia econômica pertence ao capital financeiro e não ao capital
produtivo, a informação prevalece sobre o conhecimento propria-
mente dito, pois o capital financeiro funciona com a riqueza pura-
mente virtual, cuja existência corresponde a própria informação.
Essa situação produz, entre outros efeitos, um bastante preciso: o
poder econômico que se fundamenta na posse de informação que,
em consequência, se torna secreta e, por fim, constitui um terreno
de competição econômica e militar sem precedente, bloqueando
necessariamente, ao mesmo tempo, as forças democráticas, que se
baseiam no direito à informação – tanto o direito a obtê-la como
o de produzi-la e disseminá-la. Em outras palavras, do ponto de
vista da informação, a sociedade do conhecimento é governada pela
lógica do mercado (sobretudo o financeiro), de tal modo que não
é propícia nem favorável à ação política da sociedade civil e à pro-
moção efetiva da informação e do conhecimento necessários para
a vida social e cultural.

Diante do exposto, caro(a) aluno(a), observa-se que, ao longo dos tempos, o ser
humano tem se apresentado como um ser híbrido, claro que no sentido figura-
do, que se caracteriza como sendo um ser composto por elementos diferentes
culturalmente. Dessa maneira, o ser humano é atingido pela força das culturas
estabelecidas, as quais são constituídas por ele próprio dialeticamente. Como
criador de culturas, por meio das diversas ações que emprega, quer, no convívio
social com outros seres humanos ou em sua relação à biodiversidade, revelar,
portanto, suas qualificações e habilidades que o diferenciam dos outros seres
vivos na busca do atendimento das suas questões existenciais e, também, de suas
necessidades básicas e fundamentais de sobrevivência, alimentando, consequen-
temente, a sua vida, no sentido mais amplo e profundo do que possa vir a ser a
existência humana.

136
5
TRABALHO,

UNICESUMAR
ALIENAÇÃO E
mercado

Caro(a) aluno(a) chegamos à nossa última aula desta Unidade 3. Quem disse que
seria fácil? Pode até ser para quem já conhece, de alguma forma, os temas, aqui,
abordados nesta disciplina, mas mexer com o pensamento e, principalmente,
fazer a gente pensar sobre si mesmo, de forma individual ou coletiva, não é uma
das coisas mais simples que se possa fazer. Mas lhe afirmo que estudar filosofia
é um bem necessário, principalmente, para quem vive nesta nova sociedade que
se descortina dia a dia: a sociedade do conhecimento. Cada vez mais, o conhe-
cimento é a própria fonte, riqueza ou produto de valor e subestimá-lo é assinar
seu próprio atestado de óbito.
Agora, abordaremos os temas clássicos dos estudos das humanidades, princi-
palmente, da Filosofia, Sociologia, Ciências Sociais e História, que são: trabalho,
alienação e mercado. Por isso, procuraremos ser o mais objetivo possível, mas
também queremos construir com você os elementos básicos e necessários para
o seu próprio entendimento e desenvolvimento. Seguimos, então, nessa viagem
ao mundo maravilhoso da filosofia. Antes de colocar as questões conceituais dos
termas (trabalho, alienação e mercado) que estudaremos, queremos que você
reflita sobre a seguinte informação: quando uma pessoa se torna adulta, hoje, do
ponto de vista econômico, ela também se torna uma força de trabalho. A ciên-
cia estatística, assim, chama-nos de capital humano, dentro da lógica capitalista,
como uma mercadoria que temos o nosso valor. Não, não fique chocado(a)!

137
Agora, é hora de você estudar um dos termos que, de alguma forma, você vi-
UNIDADE 3

verá diariamente: o seu trabalho. Por isso, um adulto e, muito mais, um adulto que
tem uma formação universitária tem de conhecer o que é sua natureza e como se
dá a relação de sua própria condição com as determinações e as condições de um
sistema que, devidamente, estruturado do ponto de vista legal, cultural e social
exige de todos nós que somos, de alguma forma, mão de obra o devido enten-
dimento. Por isso, é importante salientar que estudar o tema “trabalho” é muito
importante, pois este representa a sua própria vida; conhecê-lo é poder fazer as
suas escolhas da melhor maneira, como temos dito. Então, sigamos o cortejo do
conhecimento às definições de trabalho, alienação e mercado.
Por trabalho entende-se, inicialmente, como substantivo, então, vejamos seus
sentidos, segundo Dicio ([2020], on-line)9:


O emprego, o ofício ou a profissão de alguém: “não tenho trabalho!”

Grande dificuldade; trabalheira: “isso meu deu um enorme trabalho!”

Responsabilidade: “seu trabalho é ajudar os jogadores de futebol.”

Conjunto das atividades realizadas por alguém para alcançar um


determinado fim ou propósito.

Os mecanismos mentais ou intelectuais utilizados na realização de


algo; lugar em que são aplicados esses mecanismos: viver perto do
seu trabalho.

Atenção empregada na realização ou fabricação de alguma coisa;


esmero.

Desenvolvimento ou a elaboração de algo; fabricação: trabalho de


marcenaria.

Resultado dessa fabricação: este bolo foi um belo trabalho de con-


feitaria.

Lição ou exercício destinado à prática de: trabalho escolar.

Produto fabricado a partir do funcionamento de algo: o trabalho


de um carro.

Ação intermitente de uma força vinda da natureza acrescida ao seu


efeito: o trabalho excessivo da chuva atrapalha certas plantações.
138
[Biologia] Quaisquer fenômenos realizados numa matéria ou subs-

UNICESUMAR
tância, possibilitando uma alteração de seu aspecto ou forma.

[Política] Exercício humano que configura um elemento fundamen-


tal na realização de bens e/ou serviços.

[Política] Reunião dos indivíduos que fazem parte da vida econô-


mica de uma nação.

[Física] Grandeza obtida a partir da realização de uma força e a ex-


tensão percorrida pelo ponto de sua execução em direção a mesma.

[Medicina] Processo orgânico de recuperação realizado no interior


de certos tecidos: trabalho de cicatrização.

[Religião] Aquilo que é oferecido para receber proteção dos orixás.

Assim, caro(a) aluno(a), você já pode ver a riqueza dessa palavra que nos remete,
certamente, a importância dessa atividade humana na atualidade. Para Cotrim
(2006), trabalho é entendido, por sua vez, como atividade em que o ser humano
coloca sua energia para satisfazer necessidades ou atingir determinado objetivo.
Uma das principais atividades humanas, o trabalho, revela a condição de um
projeto mental que dá sentido a uma conduta a ser desenvolvida para se chegar
a um determinado objetivo. Logo, nessa perspectiva, o trabalho é um meio de
transformação do mundo natural para o mundo cultural, de forma bem elemen-
tar; assim, exemplificaremos: a partir do feijão (alimento natural), podemos fazer
uma feijoada (um prato típico); do arroz e carne seca (especiarias naturais), o ar-
roz carreteiro (um prato típico); da madeira cedro (uma das espécies de madeira
natural), uma mesa para uma sala de jantar (um móvel de utilidade coletiva).
Aprofundando, ainda mais, sobre esse termo, Dallago (2010, p. 1) afirma que:


[...] assim, Engels (1985) afirma que na medida em que o homem
coloca seu corpo, sua consciência a serviço de algum objetivo, vai
travar relação com a natureza e com outros homens. Neste sentido,
a atividade do trabalho é o elemento de desenvolvimento do próprio
homem, sendo este indispensável à sua existência. A relação ho-
mem e natureza só existem em função do trabalho, pois este trans-
forma a matéria vinda da natureza em riquezas ao mesmo tempo
em que transforma a si mesmo. Desta forma, se compreende que

139
as transformações ocorridas no modo de produção e nas relações
UNIDADE 3

de trabalho têm importância fundamental para a compreensão do


movimento histórico que determina as relações entre os homens,
com particularidades econômicas, sociais, políticas e culturais em
cada contexto histórico.

Portanto, o trabalho deve ser entendido como um bem cultural e de valor, pois
observa-se seu espaço significativo como elemento cultural estruturante da vida
humana em sociedade, em nosso caso, em uma determinada sociedade capitalista
como força de trabalho, sobrevivência, ou seja, uma atividade, absurdamente,
relevante do ponto de vista social, envolvendo diversas estruturas do aparato
jurídico-administrativo e econômico da sociedade e, não menos importante, os
diversos conflitos sociais que se estabelece envolta dessa atividades na cidade e no
campo. Segundo Dicio ([2020], on-line)10, alienação, pode ser entendida como:


• Transferência de propriedade ou de direito: alienação de bens.

• Resultado do abandono ou efeito da falta de um direito: alienação


paternal.

• [Informal] Desinteresse por questões políticas ou sociais: aliena-


ção política.

• [Psicologia] Perda da razão; loucura: alienação mental.

• [Psicologia] Estado da pessoa que, tendo sido educada em con-


dições sociais determinadas, se submete cegamente aos valores e
instituições dadas, perdendo assim a consciência de seus verdadei-
ros problemas.

• [Psicologia Patologia] No desenvolvimento de um sintoma clíni-


co algumas pessoas ou situações comuns tornam-se estranhas ou
perdem sua natureza familiar.

• [Filosofia] Segundo o hegelianismo, momento em que a consciên-


cia se torna desconhecida a si própria ou a sua própria essência.

• Ação ou efeito de alienar: alienação de uma propriedade.

140
Caro(a) aluno(a), estamos diante de um termo polissêmico, e você sabe o que

UNICESUMAR
é polissemia? Você viu duas questões fundamentais que você tem de empregar,
aqui, para estudar não somente esse termo, mas qualquer termo que seja polis-
sêmico. Desse modo, primeiro, do ponto de vista linguístico, polissemia significa
a existência de um grande número de significados, e, segundo, que o significado
dependerá do contexto em que a palavra está inserida. Viu? Isso quer dizer que o
termo “alienação” possui sentido, principalmente, filosófico ou psicológico. Quem
fez um excelente estudo sobre esse termo e que abordou o sentido do ponto de
vista filosófico e psicológico foi Chauí (2015). Segundo a referida autora, aliena-
ção é o fenômeno criado pelo próprio ser humano; quando este cria e, ao longo
do tempo, passa a acreditar como se ele tivesse vida por si mesmo, independente
dele próprio, assim, não o reconhece como uma criação social ou cultural de
suas próprias mãos. Diante disso, a autora, ainda, observa que o ser humano não
se reconhece como ser histórico ou político do seu próprio espaço social. Para
responder a essa questão, Chauí (2015) desenvolveu sua exposição, utilizando
outro filósofo, Marx, o qual observou o modo de produção econômico das so-
ciedades, ou seja, como os seres humanos construíam a sua própria realidade
econômica e social.
Assim, Marx trata da divisão social do trabalho, ou seja, na luta pela sobre-
vivência, os seres humanos se agrupam para explorar os recursos da Natureza e
dividem as tarefas: família, comércio, trabalho servil (escravidão), o poder po-
lítico (Estado), religião e guerra. Nessa direção, sobre o desenvolvimento social,
para Marx, a sociedade se constitui mediante as condições materiais da vida
social e política; ele observou mudanças nas condições históricas e materiais,
ainda, paralelamente, observou, também, as mudanças no modo de produção,
por exemplo, no sistema feudal para o capitalista. Assim, a mudança não se dá
por vontade livre da natureza, mas estão relacionadas às condições econômicas,
sociais e culturais em que o ser humano está inserido (CHUAÍ, 2015).
É muito importante, porém, entendermos, neste momento, caro(a) aluno(a),
os conhecimentos que o senso comum tem sobre a sociedade. Sabemos que a
maioria das pessoas pensam orientadas pelo senso comum, por isso trataremos
disso agora. Chauí (2015), em relação ao senso comum, dá o seguinte exemplo:
quando evoca a pobreza como determinada pela condição individual e não como
consequência da estrutura social estabelecida em que a pessoa se encontra.
No entendimento de Chauí (2015), há três formas da alienação: a alienação
social, quando o ser humano não se vê como agente das instituições sociais e
141
políticas; a alienação econômica, quando o ser humano não se identifica como
UNIDADE 3

aquele que cria ou é afetado, economicamente, pela sua própria produção; e, por
fim, a alienação intelectual, quando o ser humano não reconhece a falsa dico-
tomia entre trabalho material e intelectual. Diante do exposto, a alienação social
pode ser entendida, também, como desconhecimento das condições histórico-so-
ciais concretas, vividas e produzidas pela ação humana, bem como, também, sob
o peso de outras condições históricas anteriores e determinadas. Diante disso, há
uma dupla alienação; por um lado, os homens não se reconhecem como agentes
e autores da vida social, mas, por outro lado e ao mesmo tempo, julgam-se indiví-
duos, plenamente, livres, capazes de mudar suas vidas individuais como e quando
quiserem. Cotrim (2006), por sua vez, observa que o tema da alienação pode estar
associado, também, ao consumo e ao lazer.
Alienação do consumo: antes, porém, deve ser observado que há uma
grande e absoluta concentração de renda, em especial no Brasil, mas também
no mundo onde, apenas, 15% da população mundial consome, enquanto 85%
são alijados, mesmo que participem de alguma forma, de usufruir dos bens e
das riquezas produzidas pela sociedade. Nesse sentido, é que se dá o fenômeno
da alienação no consumo, quando, objetivamente, consumir significa participar
de um patrimônio construído pela sociedade, além de atender às necessidades
individuais, como produtos de primeira necessidade, e, ainda, observa-se que
esse fenômeno está associado às necessidades não das pessoas, mas da expansão
do sistema capitalista, de busca permanente de lucratividade. Nessa perspectiva,
Baudrillard (2007 apud COTRIN, 2006) considera que a lógica do consumo se
baseia, exatamente, na impossibilidade de que todos consumam.
Alienação do lazer: o lazer, aqui abordado, será compreendido como uma
mercadoria; assim como ocorre na alienação do trabalho e do consumo, as pes-
soas não usufruem das riquezas e dos bens produzidos, assim, também, não usu-
fruem do seu tempo livre e, muito menos, dos bens e produtos artísticos produ-
zidos pela indústria cultural. Nesse sentido, o lazer alienado tem duplo sentido; o
primeiro refere-se quando a escolha é determinada da indústria cultural, a partir
dos bens de consumo, propagandeados pela publicidade; o segundo refere-se
quando a pessoa é excluída por não ter as condições de usufruir as riquezas
produzidas pela sociedade.
Agora, caro(a) aluno(a), trataremos do nosso último tema: mercado. A palavra
“mercado”, também, é uma palavra polissêmica, isto é, tem diversos sentidos.
Vejamos, conforme Dicio ([2020], on-line)11:
142

Lugar público, ao ar livre ou em recinto fechado, onde se vendem e

UNICESUMAR
onde se compram mercadorias.

Cidade que se notabiliza pela compra e venda de determinados


produtos.

Referência convencional em relação à compra e à venda.

Designação que se dá à oferta e à procura de mercadorias.

Bom mercado, preço que se considera conveniente ou, também,


lugar, cidade ou país onde é fácil vender qualquer coisa.

Conjunto de consumidores, encarados como futuros compradores


de uma mercadoria ou beneficiários de um serviço.

Economia de mercado, sistema de organização econômica no qual


os próprios mecanismos naturais asseguram, independentemente
de qualquer intervenção do Estado ou dos monopólios, o equilíbrio
permanente da oferta e da procura.

Estudo ou pesquisa de mercado, análise das possibilidades de venda


de determinado produto, feita com base em levantamentos estatís-
ticos.

Mercado financeiro ou mercado de capitais, conjunto das pessoas


ou empresas que procuram capitais de terceiros para financiar seus
negócios ou que buscam aplicações para os recursos de que dis-
põem em negócios alheios.

Mercado firme, característica das operações da Bolsa em que ven-


dedores e compradores se mantêm em suas posições, isto é, sem
alterações.

Mercado livre, condição ou local em que as partes negociam livre-


mente as mercadorias, os valores mobiliários ou moedas, não ha-
vendo cotação ou tabelamento oficial.

Mercado negro ou paralelo, comércio ilícito ou clandestino, pra-


ticado principalmente quando há racionamento, tabelamento ou
cotação oficial, sendo as transações feitas a taxas mais elevadas do
que as oficiais.

143
Mercado oficial, local ou condição em que as mercadorias, as moe-
UNIDADE 3

das e os títulos são negociados conforme os regulamentos estabele-


cidos e dentro dos limites dos tabelamentos ou cotações impostos.

Mercado a termo, compra e venda de mercadorias ou valores para


entrega e pagamento em data futura pré fixada, mas ao preço cotado
no dia da transação.

Mercado de trabalho, situação da oferta, da procura de mão-de-obra


em determinado lugar, em uma região ou em um país.

Mercado futuro, diz-se da bolsa de mercadorias em produção, ainda


não existentes no mercado.

Do ponto de vista da antropologia filosófica, é necessário você considerar outro


conceito importantíssimo, a sociedade burguesa, liberal e capitalista, para com-
preender melhor o que significa “Mercado”. Dessa forma, esse conceito de socie-
dade burguesa, liberal e capitalista, caro(a) aluno(a), deu-se com a consolidação
da burguesia como classe, por volta do XIV, e isso só foi possível, quando o, então,
sistema dos senhores feudais implodiu diante da epidemia de peste bubônica que
atingiu o mercado agrícola feudal. Nesse momento, pela fragilização dos senhores
feudais e o surgimento dos burgueses, que eram compostos por banqueiros e ricos
comerciantes, diferentemente dos pequenos comerciantes e jornalistas, então, o
eixo financeiro, paulatinamente, foi se alterando do campo para as cidades (bem
como das alianças dos reis com a nova classe que surgia, a burguesia) e promovia
uma nova economia denominada mercantilismo. Dessa forma, essa nova econo-
mia, gradualmente, foi se constituindo e criando condições para um novo modo
de produção, o capitalismo.
Por volta do século XVIII, portanto, o capitalismo se consolidou em diversos
países da Europa, dando início à Revolução Industrial que atingiu amplos setores
da economia, como a produção de manufaturas, a agricultura, o comércio, os
transportes etc. (COTRIM, 2006). É importante ressaltar que, diante do término
do Antigo Regime da Monarquia, houve a consagração da propriedade privada
como direito natural dos indivíduos, desfazendo a imagem do rei como “marido
da terra”, ou seja, senhor dos bens e das riquezas do reino, e surgindo a ideia de um
estado republicano impessoal. As decisões sobre impostos, tributos e taxas foram
tomadas por um parlamento constituído pelos representantes dos proprietários
privados. Nessa direção, as teorias republicanas afirmam que o indivíduo é a
144
origem e o destinatário do poder político. Essas concepções afirmam, também, a

UNICESUMAR
existência de uma esfera de relações sociais separadas da vida privada e política.
O Estado, por meio da lei e da força, tem o poder para dominar e para reprimir,
pois seu papel é garantir a ordem pública, tal como defendida pelos proprietários
e seus representantes (INCONTRI; BIGHETO, 2010).
Diante do exposto, o sentido de “Mercado” está sob o guarda-chuva do modo
de produção capitalista e amparado por um robusto sistema jurídico-econômi-
co-social liberal, isto é, diferentemente das sociedades tradicionais, a economia
liberal de corte capitalista tem uma lógica que é acumular capital, suas riquezas e,
cada vez mais, bens de produção. Nessa direção, a economia é que vigora “o sistema
de mercado”, ou seja, o coração da economia é “o Mercado”. Nesse sentido, a pessoa
passa a ser um cliente ou consumidor e deixa de ser uma pessoa hospitalizada ou
uma pessoa que estuda em uma escola particular, por exemplo. A lógica estabeleci-
da é de mercado e não da cidadania, na concepção mais abrangente possível. Nessa
lógica, as pessoas, por sua vez, têm valor, conforme suas condições financeiras, ou
seja, quando elas fazem parte da classe social consumista.
Conforme Mariano (2007), na lógica de mercado, há um jogo que faz as pes-
soas competirem entre si, denominado concorrência; esse jogo exalta os melhores
e exclui os que não conseguem atingir as metas previstas. Como todo jogo que
envolve disputa; esse, principalmente, advoga um espírito individualista em que
o importante é cuidar de si e se proteger dos outros. As pessoas, ou melhor, os
concorrentes passam a ser vistos como alvo da fúria e do desejo de vencer; aqui,
novamente, estabelece-se o “custe o que custar” ou, ainda, a compreensão dita
maquiavélica: “os fins justificam os meios”.
Segundo Smith (2007 apud MARIANO, 2007), em nome da sobrevivência
no Mercado e do Mercado, o ser humano deve agir por interesses e não pela
cooperação. Nessa linha de raciocínio, as pessoas valorizam, muito mais, algo que
lhe interessa do que o espírito fraterno e religioso de ajudar. Isso quer dizer, por
exemplo, que não é o coração da boa vontade do padeiro ou do açougueiro que
proporciona bons produtos para as refeições de seus clientes, mas é, justamente,
o interesse financeiro que os faz agir positivamente nessa relação. Por fim, por
exemplo, dentro do sistema de mercado, a natureza é a fonte de recursos ilimitados
(será?), e o Brasil é um grande celeiro, ainda, de recursos inesgotáveis (será?); como
se vê, a disputa atual sobre a exploração da biodiversidade e riquezas minerais na
Amazônia, dentre elas, o tão falado e propalado, “nióbio”, que tem sido motivado
e “vendido”, internacionalmente, pelo atual governo brasileiro.
145
UNIDADE 3

explorando Ideias

A linguagem, o mito, a arte, a religião e a ciência são elementos e condições constitutivas


desta forma superior de sociedade (humana). São os meios pelos quais as formas de vida
social, que encontramos na natureza orgânica, desenvolvem para um novo estado, o da
consciência social, que depende de um duplo ato, de identificação e discriminação. O
homem não pode encontrar-se, não pode ter consciência de sua individualidade, senão
por meio da vida social. Para ele, contudo, esse meio significa mais que uma força externa
determinante. Como os animais, o homem se submete às regras da sociedade, mas, além
disso, participa, ativamente, da produção e da mudança das formas da vida social.
Fonte: Cassirer (1972).

pensando juntos

Ao longo do livro, você será convidado(a) a refletir, questionar e transformar. Aproveite


este momento!
Fonte: PMI (2017, p. 5).

146
CONSIDERAÇÕES FINAIS

UNICESUMAR
Os temas tratados, nesta unidade, são, realmente, muito importantes, mesmo
sendo conteúdos densos e, não poucas vezes, complexos. De um lado, estuda-
mos o conhecimento e, de outro, o estudo filosófico sobre o ser humano, em
antropologia filosófica. Ambos têm uma complexidade inerente, ou seja, estão
relacionados ao ser humano, mas não é, somente, isso. Ambos os temas estão
relacionados, também, à necessidade de entendimento, e isso não é tão simples
assim. Seja sincero com você mesmo, é fácil falar de si mesmo, sobre suas virtudes
ou defeitos? Não é, e você sabe disso. Agora, imagine essa questão, no âmbito da
ciência, em que a exigência e rigor são maiores ainda. Por isso, abordamos todos
os temas tratados com o máximo de cuidado para que não se perdesse a qualidade
da discussão e o conteúdo apresentado, ainda, de forma elementar, introdutória
e sempre com a preocupação de deixar o mais claro possível para você entender
o que se estava tratando e quais os objetivos dos temas apresentados.
Esperamos, sinceramente, ter conseguido comunicar o máximo de informa-
ções e possibilitar as condições para você entender os assuntos, os quais são de
fundamental importância para a sua formação. Esperamos, ainda, que os temas
e assuntos estudados, nesta unidade, tenham possibilitado, além do conheci-
mento, despertar em você a curiosidade sobre os seguintes temas: o porquê do
conhecimento humano hoje; os modos de conhecer e suas implicações no fazer
humano e na vida social; conhecimento e ideologia; antropologia filosófica, cul-
tura, sociedade do conhecimento, trabalho, alienação e mercado.

147
na prática

1. Como você viu, caro(a) aluno(a), na primeira aula, abordamos as possibilidade do


conhecimento. Sobre a possibilidade do conhecimento “Dogmatismo”, assinale a
opção verdadeira.

a) É evidente que “S” apreende “O”.


b) É impensado que “S” apreende “O”.
c) É evidente que “O” apreende “S”.
d) É evidente que “I” apreende “O”.
e) É evidente que “I” apreende “S”.

2. Conforme vimos, na segunda aula, que há duas formas de o ser humano apreender
a realidade, ou seja, por meio da intuição ou do conhecimento discursivo. Para Ara-
nha e Martins (2005), o verdadeiro conhecimento se dá em uma relação contínua e
dialética entre essas duas formas. Leia atentamente as afirmações a seguir:

I - É um conhecimento mediatizado.
II - Utiliza a linguagem como meio de conhecimento.
III - O conhecimento se dá de forma evidente.
IV - Nada se coloca entre o “S” e o “O”.

Assinale a alternativa correta sobre a forma do conhecimento discursivo:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

3. Na terceira aula, estudamos o tema “conhecimento e ideologia” e vimos que um


dos objetivos da filosofia é ter certeza do que se sabe, pensa, sente e faz. Assim, os
temas do conhecimento e da ideologia estão associados à busca da verdade. Assim,
a filosofia, também, estuda o que é verdade, se ela existe e quais as condições de
apreendê-la. Nessa direção, estudamos dois filósofos, Chauí (2015) e Zizek (1996).
Leia atentamente as afirmações a seguir e assinale a alternativa correta sobre o
pensamento de Zizek sobre ideologia:

148
na prática

a) A função principal da ideologia é ocultar e dissimular as divisões sociais e políticas,


dar-lhes a aparência de indivisão e de diferenças naturais entre os seres.
b) É fazer com que todas as classes sociais aceitem as condições em que vivem,
julgando-as naturais, normais, corretas, justas, sem pretender transformá-las ou
conhecê-las realmente, sem levar em conta que há uma contradição profunda
entre as condições reais em que vivemos e as ideias.
c) Ideologia não deve ser entendida como simples “ilusão” ou “falsa consciência”,
mas como uma ação funcional em prol de algo que, podendo estar relacionado
ao verdadeiro, não manifesta as reais intenções que são guardadas pela esfinge
da dominação e pelo poder, ambas sob a capa de uma causa ou razão verdadeira.
d) O surgimento, a implantação e o fortalecimento da ideologia se dá por causa de
três grandes formas da alienação (social, econômica e intelectual).
e) Ideologia e inconsciente operam por meio do imaginário (as representações e
regras saídas da experiência imediata) e do silêncio, realizando-se, indiretamente,
perante a consciência.

4. Quando, na quarta aula, abordamos o tema da cultura, um dos assuntos tratados


foi sobre a natureza humana. Nessa mesma perspectiva, surge a seguinte pergun-
ta: o que é o ser humano? Como dissemos, ao longo dos tempos, os mais diversos
filósofos têm respondido a essa pergunta. Diante disso, assinale a alternativa correta
sobre a compreensão Pré-socrática da natureza humana:

a) O ser humano é, essencialmente, um ser de desejos e de vontades.


b) O ser humano é um ser material e a realidade é o que o determina; assim, ele
produz sua própria existência e mundo, ainda, é, por meio da realidade, consti-
tuído e formado.
c) O ser humano é, ao mesmo tempo, corpo e alma, ambos sendo de uma mesma
substância.
d) O ser humano é uma substância pensante e não dependente de nada que seja
material.
e) O ser humano é um ser constituído de matéria, puramente, física, desvinculado
de qualquer concepção religiosa.

149
na prática

5. Na última aula, estudamos o tema da alienação em uma perspectiva, principalmente,


filosófica, a partir das ideias de Chauí (2015) e os conceitos marxistas sobre a divisão
social do trabalho. Sobre o tema da alienação, leia as afirmações a seguir:

I - A alienação do consumo ocorre quando, objetivamente, consumir é negado


participar de um patrimônio construído pela sociedade, atender às necessida-
des individuais, como produtos de primeira necessidade e, ainda, não atender
às necessidades das pessoas, mas, sim, à expansão do sistema capitalista, de
busca permanente lucratividade.
II - Na alienação social, os humanos não se reconhecem como produtores das
instituições sociopolíticas.
III - Na alienação econômica, os produtores não se reconhecem como produtores
nem nos objetos produzidos por seu trabalho.
IV - A alienação intelectual é resultante da separação social entre trabalho material
(que produz mercadorias) e trabalho intelectual (que produz ideias).

Assinale a alternativa correta sobre as ideias apresentadas pela filósofa Chauí (2015):

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

150
aprimore-se

POSSIBILIDADES PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HUMANO

O ser humano constrói as suas teorias para explicar experiências realizadas e dis-
cutir conceitos a partir de observações e análises feitas, sistematizando, assim, o
seu conhecimento. Suas abordagens teóricas são constituídas de valores e culturas
sociais que também podem ser chamadas de filosofia de vida ou visão de mundo. As
teorias que o homem organiza para sistematizar o conhecimento são pautadas em
conceitos e princípios usados para explicar algo que foi experimentado e analisado.
Da mesma forma que o homem tem sua filosofia de vida, ele utiliza-se da filo-
sofia como ciência do conhecimento para resolver os problemas da vida, tentando
buscar explicações para a realidade na qual se insere. A história cultural do homem
revela que ele sempre esteve ligado à construção do conhecimento, expressando-o
como práxis social. Seria insuficiente demonstrar aqui os vínculos existentes entre
o desenvolvimento humano e as práticas sociais, hoje imprescindíveis no campo
da produção do conhecimento. Esse vínculo apresenta grande relevância em cons-
truções teóricas dos seres humanos, pois contribui para re-estruturar a visão de
homem, mundo, sociedade, cultura, do valor e dos diversos saberes. Conhecer o
mundo, a sociedade com seus valores culturais e a realidade de que faz parte é
transcender o conhecimento [...].
[...] A humanidade, ao longo dos tempos, reuniu muitas informações que foram
armazenadas e esquematizadas como conhecimento. Essas informações, experiên-
cias e concepções despertaram o desejo de conquistar a liberdade de pensamento,
abrindo caminhos para registros dos fenômenos que estavam ao alcance da inteli-
gência humana. O homem, ao relacionar-se com o mundo e com os diversos modos
de vida que o rodeia, passa a desenvolver diferentes formas de conhecimentos e faz
evoluir o meio em que se insere, trazendo muitas contribuições para a sociedade.
Fonte: Almeida e Alves (2009, p. 68-69).

151
eu recomendo!

livro

1984
Autor: George Oewell.
Editora: Companhia das Letras.
Ano: 2005.
Sinopse: o livro 1984 tem como cenário uma sociedade governa-
da por um Estado supremo (onisciente, onipresente e onipoten-
te), que consegue oprimir aqueles que divergem de suas ordens
e penetrar em suas mentes. Esse Estado se expressa por meio do Partido, que
trabalha, incessantemente, para conseguir controlar os cidadãos, o que faz pri-
vando-os de sua liberdade. A todo o momento, pessoas são expostas ao controle
do Estado, o detentor absoluto dos meios de comunicação. Com isso, os cidadãos
são forçados a viver cercados de todos os tipos de propaganda com informações
manipuladas. As cidades são cheias de cartazes impressos com o Grande Irmão, o
líder do partido, e sua frase: “Big Brother is watching you”, lembrando à população
que o Partido estava sempre vigiando suas vidas.

152
anotações



































4
ÉTICA, MORAL
E SOCIEDADE

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

PLANO DE ESTUDO
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • O porquê da ética e da moral hoje
• Compreendendo os termos “moral” e “ética” em Filosofia • Os tipos de éticas: da Grécia à atualidade
• A moral e suas teorias bem como seu caráter sócio histórico • Ética, moral e sociedade.

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Assinalar a importância da ética e da moral na atualidade. • Diferenciar, filosoficamente, os termos:
“ética” e “moral” • Abordar os fundamentos e as concepções de ética • Apresentar as principais teorias
e fundamentos da moral • Analisar a relação entre ética, moral e sociedade.
INTRODUÇÃO

Há alguma relação entre ética, moral e sociedade? Sim, a ética é o funda-


mento teórico da moral, e esta é a expressão daquela, em um dado espaço
e tempo, na sociedade. Assim, do ponto de vista da sociedade, seres huma-
nos de princípios e valores parciais ou totalmente divergentes, não poucas
vezes, entram em conflito; faz-se necessário, por sua vez, normas, regras e
leis que mediem as relações sociais, institucionais e organizacionais para
o estabelecimento da convivência; as quais nem sempre são possíveis. En-
tão, seria uma utopia? Pode até ser; contudo, a partir das experiências das
sociedades ocidentais em especial, podem ser observados significativos es-
forços na busca de consensos ou da convivência, principalmente, por meio
dos mais diversos interesses em jogo: econômico, social, político, religioso,
dentre tantos outros. Assim, cabe à ética e à moral, pelo fato do ser humano,
em uma visão aristotélica, ser um animal racional, atuarem na constituição
de comportamentos morais necessários para que se estabeleça a associação
dos seres humanos entre si na sociedade.
Assim, caríssimo(a) aluno(a), esta unidade tem como objetivos: assina-
lar a importância da ética e da moral na atualidade; diferenciar filosofica-
mente os termos: “ética” e “moral”; abordar os fundamentos e as concepções
de ética; apresentar as principais teorias e fundamentos da moral e analisar
a relação entre ética, moral e sociedade. Logo, caríssimo(a), nesta Unidade
4, trataremos as seguintes aulas: o porquê da ética e da moral hoje; com-
preendendo os termos “moral” e “ética” em Filosofia; os tipos de éticas: da
Grécia à atualidade; a moral e suas teorias e seu caráter sócio-histórico e
ética, moral e sociedade. Estimado(a), espero que a presente proposta de
estudo sobre ética, moral e sociedade, qualifique-o(a) para seus estudos
nesta disciplina de formação humanística, tão necessária neste tempo de
extremos, de falta de coerência e de entendimento para o diálogo.
1
O PORQUÊ DA
UNIDADE 4

ÉTICA E DA
moral hoje

Olá, caro(a) aluno(a), vamos continuar a nossa viagem? Já completamos cerca de


60% do nosso trajeto. Vimos alguns temas muito importantes, principalmente,
relacionados aos fundamentos teóricos da filosofia. Agora, paulatinamente, es-
tamos em direção dos temas do mundo prático (denominação filosófica), sendo
eles: moral, sociedade, política, estado, forma de governo, dentre outras. São temas
que contemplaremos nesta e na próxima unidade.
Nesta unidade, caro(a) aluno(a), abordaremos as razões da ética e da moral
para os nossos dias. Quero assinalar essas razões e motivos em duas dimensões,
uma planetária e a outra em uma dimensão mais intimista, no sentido que ela tem
mais a ver com a nossa vida cotidiana e prática: uma dimensão socioambiental e
desenvolvimento humano. Em cada uma dessas dimensões, listaremos algumas
reflexões que consideramos importantes e que se encontram na tradição filosófi-
ca; sendo assim, seus fundamentos são importantes na defesa da vida, em especial,
da vida humana na Terra e de sua relação com a nossa biosfera. Vamos continuar?

Numa dimensão planetária

No final do século XX, Srour (2005) já observava que o mundo vivenciava, entre
avanços e consequências, a era das revoluções científicas e tecnológicas nunca

156
vista. Nesse sentido, o físico e escritor Sagan (2009, p. 22) sintetizou e precisou,

UNICESUMAR
de forma brilhante, o cenário mundial do século passado, ao dizer:


[...] o século XX será lembrado por três grandes inovações: meios
sem precedentes de salvar, prolongar e intensificar a vida; meios sem
precedentes de destruir a vida, inclusive pondo a nossa civilização
global pela primeira vez em perigo; e percepções sem precedentes
da natureza de nós mesmos e do universo. Todos esses três desen-
volvimentos foram realizados pela ciência e tecnologia, uma espada
de dois gumes afiados.

Sem dúvida, as três grandes inovações, citadas anteriormente, apontam para o


cuidado e a preservação com a vida (bios), no seu sentido mais amplo, expres-
sando, assim, a sociobiodiversidade e os socioecossistemas existentes.
1. Primeira razão: impõe-se ao ser humano e às muitas outras espécies e varieda-
des de vida, necessariamente, o convívio e a relação eco social no planeta Terra.

Nessa direção, é revelada, de forma singular, uma dependência imposta que o


ser humano possui, ou seja, de um lado, os ecossistemas e, de outro, consequen-
temente, o atendimento às necessidades básicas e fundamentais que garantam a
biodiversidade, como exigência sine qua non (“indispensável”), para a sua própria
sobrevivência.
2. Segunda razão: há uma crescente preocupação da sociedade, que, infe-
lizmente, não vem de hoje, com os temas da ética, da moral e da vida em
nosso planeta. Essas preocupações são originárias, dentre outras questões,
dos constantes problemas que atingem a vida e a sua manutenção em seu
sentido amplo e crucial, como, por exemplo, a gestão dos bens públicos
e privados, os transgênicos, a genética humana e a física nuclear (MA-
RIANO, 2007).

No final, também, do século passado, as declarações de Vancouver (1989) e a do


Rio-92 (1992) já davam conta dessas e outras preocupações em âmbito planetário,
em relação ao desenvolvimento socioeconômico e ao meio ambiente do planeta
Terra. A primeira conferência, que ocorreu na cidade Vancouver, no Canadá, em
1976, abordou o tema “A Ciência e a Cultura para o Século XXI: Um Programa De

157
Sobrevida”, que chamava atenção para as preocupações e preservação da vida em
UNIDADE 4

nosso planeta bem como cobrava das autoridades competentes medidas urgentes
para possibilitar as condições de vida para as futuras gerações e povos. Por sua
vez, a segunda conferência ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, em 1992,
a qual foi denominada Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento, ou, mais conhecida, “Conferência Rio-92”, reafirmando as
decisões adotadas em Estocolmo, 1972, declarava a necessidade urgente dos paí-
ses associados promoverem acordos e parcerias globais para a criação de novos
níveis de cooperação para o cumprimento dos contratos e, assim, garantirem a
preservação integral do meio ambiente no planeta. Face a essa realidade.
3. Terceira razão: observa-se a necessidade de critérios que sirvam de parâ-
metros para auxiliar no julgamento ético das ações dos países em relação
ao meio ambiente. Assim, reafirmamos, de antemão, a vida como critério
ético-moral (MARIANO, 2007).

Portanto, o problema crucial é a manutenção da vida, diversidade e ecossistemas


existentes, ou seja, a vida animal e vegetal dos diversos organismos e culturas
bem como a vida planetária, como alertava o filósofo e escritor Boff (2004 apud
MARIANO, 2007). Você pode estar se perguntando: o que isso tem a ver com
os meus estudos e a minha formação acadêmico-profissional? Dessa forma, res-
pondemos que tem tudo a ver, pois somos os corresponsáveis pelo nosso tempo.
4. Quarta razão: recebemos a vida de outras gerações e temos que deixá-la
para as próximas; isso é um imperativo ético, em uma concepção kantia-
na, ou seja, são valores fundamentais que temos de assumir e transfor-
má-los em estilo de vida prático necessariamente.

Assim, o que estamos tratando, aqui, caro(a) aluno(a), não é uma mera conversa
de ambientalistas, que são contra, por exemplo, ao desenvolvimento em detri-
mento da vida naturalista (os quais, diga-se de passagem, têm argumentos plau-
síveis como alternativa de defesa do planeta Terra), mas sobre o comportamento
humano, e isso quer dizer que o nosso objetivo é tratar sobre os comportamentos
éticos ou morais do ser humano, hoje, em sua relação com o meio onde vive. Ain-
da, sobre essa questão provocativa, abordada anteriormente, sobre a manutenção
ou os perigos eminentes de destruição da vida, diríamos, caro(a) aluno(a), que,
se comparássemos o que estamos tratando a um jogo de xadrez, o ser humano
estaria tomando um xeque mate da própria vida. Isso mesmo, um xeque mate
158
daqueles! Aliás, você sabe jogar xadrez? Se porventura não,“xeque mate” significa

UNICESUMAR
decretar o final da partida. Nessa situação, o rei não pode ser coberto por nenhu-
ma outra peça nem pode ser movido para nenhuma outra casa, sem ser tomado
por uma peça do adversário. Assim, quem deu xeque mate vence, e quem tomou
o xeque mate perde, ou seja, a partida está encerrada. Agora, em nosso caso, em
relação à questão provocativa, ou seja, sobre a manutenção das reais condições de
vida existentes, sem a devida atenção e preservação do nosso meio ambiente, não
é tão simples assim, pois envolvem muitos interesses, isto é, mesmo que estejam
formadas ou dadas todas as condições necessárias para se aplicar um xeque mate,
o ser humano se cria ou/e se recria, apresenta ações alternativas/criativa.
5. Quinta razão: a realidade em que vivemos é complexa. Acredite, caro(a)
aluno(a), ela é assim não porque os intelectuais, os estudiosos ou os pes-
quisadores a complicam, mas porque ela é assim mesmo, ou seja, a vida é
complexa porque o ser humano é complexo. Não somente em sua cons-
tituição física, mas também nas suas diversas dimensões: mentais, psico-
lógicas, políticas, sociais, econômicas, culturais, religiosas, dentre tantas
outras. Lembra-se da superioridade da Teologia à Filosofia no período
Medieval? Então, questione, investigue e analise! Tire as suas próprias
conclusões, se você, de fato, é um ser vivo e ativo do seu tempo.

Continuando sobre essa questão da manutenção ou os perigos de destruição da


vida humana e das formas que existem e se relacionam, temos:
6. Sexta razão: o ser humano tem percebido que a sua sobrevivência, na
face da Terra, depende muito dos cuidados que devem ser despendidos
por meio de todas as ações e recursos, de forma direta ou indireta, para
com o meio ambiente ou a toda e qualquer organização humana e social
que o atinja.

Logo, essas ações indiretas não são menos danosas do que às diretas, ou seja, o
fato, por exemplo, de não se ter políticas ambientais sustentáveis de destinação
do lixo, que são produzidos nas grandes cidades, não é mais danoso do que o
cumprimento e a fiscalização de leis ambientais e preservação da biodiversidade,
por exemplo, lançar plásticos na natureza, e a preservação e proteção dos direitos
dos povos indígenas ou quilombolas. E aí? O que você acha? Proponho que você
observe, criticamente, a sua própria realidade, em sua cidade ou em seu bairro,
ou, até mesmo, em suas relações pessoais ou profissionais. Exercite o pensamento
159
crítico! Agora, continuaremos falando mais sobre o porquê da ética e da moral
UNIDADE 4

hoje, porém de uma maneira mais intimista. Você entenderá!

Em uma dimensão socioambiental e


desenvolvimento humano

Segundo o Dicio ([2020], on-line)12 o termo “sociedade” é um substantivo femi-


nino que significa:


• Reunião de homens e/ou animais que vivem em grupos organi-
zados; corpo social.

• Conjunto de membros de uma coletividade subordinados às mes-


mas leis ou preceitos.

• Cada um dos diversos períodos corresponde à evolução da espécie


humana: sociedade primitiva, feudal, capitalista.

• União de várias pessoas que acatam um estatuto ou regulamento


comum: sociedade cultural.

Logo, a sociedade deve ser compreendida como um conjunto complexo de pes-


soas que se estabelecem em associação, conforme determinados padrões culturais
e próprios, para garantir a continuidade da sua existência. Portanto:
7. Sétima razão: na sociedade, reside uma ideia de necessidade imprescindí-
vel da convivência e do relacionamento recíproco, ou seja, a cumplicidade
em prol da vida, e, sem esse componente, a sociedade implode. Por isso, as
relações, em todos os sentidos e níveis, têm que ter princípios e normas
que possam regular o funcionamento da sociedade.

Pensemos: um agricultor, um transportador, um industrial, e um comerciante que


não cumprissem o seu papel de cuidar dos produtos, certamente, a sociedade e
eles mesmos sofreriam as consequências danosas de seus próprios atos. Por isso,
a sociedade, como um todo, espera ou, melhor, confia que cada pessoa cumprirá
o seu papel, da melhor maneira. Assim, também, deve agir, eticamente, o médico,
o bombeiro, o professor, o político, a assistente social, o administrador, o religioso
etc. Imagine, ainda: um profissional que não faz o que lhe compete, por exemplo,
160
o fiscal não fiscaliza; o professor não ensina; o advogado não defende a justiça;

UNICESUMAR
o médico veterinário não cuida dos animais; ou seja, seria um verdadeiro caos
ou, melhor, seria o fim da sociedade. Esta não existiria, pois não haveria coesão
social ou uma ordem social mínima para que ela sobrevivesse. Diante disso, é
pertinente, caro(a) aluno(a), considerar algumas questões sobre a importância
dos temas da ética e da moral como elementos importantes para o desenvolvi-
mento da sociedade, bem como para que o estudo da ética possibilite atitudes
morais razoável para a convivência social. Nesse sentido, Baczko (1996), ao tratar
sobre o imaginário social, observa a importância deste como fator estruturante
da sociedade em seu desenvolvimento:
■ Platão utilizava os mitos como forma de coesão social, diante da frag-
mentação social dos novos tempos da filosofia, e os empregava por meio
do pensamento crítico.
■ Durkheim, por sua vez, ressaltava as estruturas sociais e os sistemas de
representação coletivas com o intuito de assegurar o consenso e a coesão
social, o fato social.
■ A Psicanálise (Freud) afirmava a “imaginação” não como uma “faculda-
de” nem como um poder psicológico autônomo (como a fé, a vontade, o
desejo, nesse sentido restrito), mas, sim, como uma “atividade global do
sujeito” para dar sentido e organizar um mundo ajustado as suas neces-
sidades e aos seus conflitos.

Diante do exposto, caro (a) aluno(a), acredito que você tenha notado que o ser
humano produz conhecimentos que deem conta de explicar determinados fe-
nômenos sociais, por exemplo, a questão da coesão social. Conforme vimos
anteriormente, o imaginário social pode dar coesão social bem como pode ser
identificado a partir das elaborações de alguns teóricos da área social.
8. Oitava razão: o entendimento da moral e da ética é necessário para a for-
mação intelectual do estudante em nível superior, contudo muito mais se
faz quando esse(a) aluno(a) tem que exercer as suas funções e contribuir
com a sociedade onde vive.

Assim, o estudo filosófico das elaborações e dos fundamentos da ética e da moral


são muito necessários, pois as próprias condições dos sistemas capitalista e liberal
possibilitam essa forma de vida complexa e, também, a necessidade de respostas
às situações que surgem, em relação a essa complexidade, aos conflitos sociais,
161
originados dos posicionamentos dos grupos e aos segmentos ou setores da so-
UNIDADE 4

ciedade, como reflexo desses sistemas (capitalismo e liberalismo). Trazendo para


um plano, ainda, mais próximo da nossa realidade, caro(a) aluno(a).
9. Nona razão: a sociedade precisa de pessoas que desenvolvam o pensa-
mento crítico sobre os comportamentos (moral) e sobre os valores bem
como princípios (ética) que regem, por sua vez, esses comportamentos.

Desta maneira, o desenvolvimento crítico sobre o conhecimento e o entendi-


mento dos fundamentos da moral e da ética têm a ver com todas as pessoas
que vivem em sociedade, porque, quanto mais tivermos pessoas habilitadas no
pensamento crítico sobre o comportamento humano e a sua relação com todos
os organismos existentes, estaremos criando condições de uma sociedade que, de
alguma forma, defenda a nossa existência, mas não descole o seu olhar do outro
(não como ameaça superior, inferior ou diabólica, mas como um igual-diferente);
ainda, esses temas têm a ver, também, com as pessoas que se profissionalizam,
como nós, professores, que já somos profissionais ou como você que está se pro-
fissionalizando, agora, em um Nível Superior.
10. Décima razão: nós, humanos, somos, também, responsáveis pela elaboração,
organização e desenvolvimento da sociedade; o médico na sociedade médica,
o professor na sociedade escolar, o artista na sociedade cultural e todos em
relação à sociedade em geral, que não é de um ou de outro, mas de todos.

Dessa forma, o aluno de medicina precisa do professor para se formar médico,


assim como o professor precisa do médico para cuidar da sua saúde. Assim, quan-
do todos cuidam do que é de todos, cuidamos do que é público. Portanto, o que
é público não é e não pode ser compreendido como sendo de ninguém ou não
tendo valor; pelo contrário, o que é público deve ser o mais valorizado, porque
é, justamente, de todos e de todas. Seguindo essa lógica, caro(a) aluno(a), temos:
11. Décima primeira razão: a pessoa que inicia a carreira universitária tem
o direito e dever de refletir sobre a sua formação acadêmico-profissional,
a qual implica, necessariamente, em perceber e desenvolver o seu grande
diferencial: a racionalidade. Tem o direito de saber o que é profissão; por
que o ato de ser profissional; ou para que a profissão, ou seja, tem o direito
de refletir sobre quais são as implicações de sua profissão, no contexto
social mais abrangente, assim como nas dimensões políticas, econômicas,
religiosas, dentre outras.
162
Sem isso, o acadêmico é alijado de sua condição princi-

UNICESUMAR
pal, como ser racional, o ser crítico. Sem uma compreen-
são crítica, portanto, podemos afirmar que a formação
desse profissional está comprometida negativamente,
pois “arranca” dele a sua alma, a sua essência. Nesse sen-
tido, é que se coloca a importância da moral e da ética,
como bem ressalta Rios (2013), ao falar de competência
profissional:
12. Décima segunda razão: toda e qualquer profissão
passa pelo saber “fazer bem feito” e o que tem de
ser feito, e isso é praticar o seu dever. Isso aponta
e ressalta o agir moral como um aspecto impor-
tante do ser profissional na sociedade.

Assim, em uma formação acadêmica em Nível Superior,


faz-se necessário não somente saber apertar o botão,
mas saber: o que ele é, o por que dele, como ele funcio-
na, quando ele deve ser acionado, para que ele serve ou
para quem esse botão é importante ou onde esse botão
deve ficar. Com essa exemplificação, queremos afirmar
que qualquer curso de Nível Superior, além de nos pos-
sibilitar exímios técnicos, faz-se necessário, hoje, desen-
volver o senso crítico da humanidade, que é, na realidade,
o grande diferencial que nos fez chegar até aqui; por isso,
é justo que se priorize a racionalidade crítica, qualidade
da inteligência humana, para discutir os fundamentos
da ética e da moral como forma de nortear os compor-
tamentos em uma sociedade que, constantemente, está
em construção. Simples não é, portanto, são necessários
todos os esforços para minimizar os problemas que são
variados e significativos.
13. Décima terceira razão: filosoficamente, todo e
qualquer comportamento humano necessita ser
fundamentado pela ética, pois não há comporta-
mento moral que não tenha uma determinada éti-
ca, seja ela qual for (isso veremos na próxima aula).
163
Entender essa dinâmica teórica e prática é imprescindível para quem é ou será
UNIDADE 4

ator social na construção da sociedade, pois há milhares de pessoas que depen-


dem da atitude de cada um, em uma rede complexa que envolve a todos nós, ou
seja, crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Diante dessas considerações
iniciais, há uma necessidade premente de se ter uma consciência ética por parte
de todas as pessoas e de uma maneira especial dos profissionais. Mas:
14. Décima quarta razão: essa consciência ética, arbitrada pela autocrítica,
não pode ser tomada de assalto por uma determinada moral como sen-
do esta única e exclusiva expressão da ética. Dessa maneira, deve haver
sempre o senso crítico refinado e apurado na constituição e na busca do
bom senso da ética.
15. Décima quinta razão: compete, portanto, àqueles que, de alguma maneira,
contribuem para o desenvolvimento da sociedade e não separam a vida
profissional da dimensão ética dos valores e normas que possibilitam
a convivência justa e social entre as pessoas. Cabe, portanto, a todo e
qualquer profissional conquistar essa consciência crítica da ética como
questão limite de sobrevivência de si e da coletividade onde está inserido.

Diante das considerações e das razões, apontadas anteriormente, por fim, caro(a)
aluno(a), ainda, há uma última razão que destacaremos a seguir:
16. Décima sexta razão: a realização atenta dessa própria tarefa, cheia de
razões e motivos listados anteriormente, que se impõe como exercício
prático para uma consciência ética e moral em prol de uma sociedade o
quanto mais inclusiva. Essa tarefa não é em absoluto fácil ou rápida, mas,
extremamente, necessária e urgente. Ela se inicia com a sua formação
consistente e sólida filosoficamente.

Por isso, caro(a) aluno(a), convido você a continuar a nossa viagem ao mundo
maravilhoso da Filosofia; para tanto, reflita sobre suas atitudes morais e os prin-
cípios e valores que as fundamentam nesse momento de sua vida, pois, assim,
você já estará vivenciando o conteúdo desta Unidade 4; então, vamos às demais
aulas, para que você possa ter, ainda, mais elementos para a sua formação e au-
toavaliação.

164
2
COMPREENDENDO OS TERMOS

UNICESUMAR
“MORAL” E “ÉTICA”
em filosofia

Como vimos, na aula anterior, caro(a) aluno(a), quando listamos as razões da


ética e da moral, ressaltamos que todo e qualquer comportamento humano pre-
cisa, necessariamente, ter fundamentos (princípios e valores) que o justifiquem.
Sendo assim, o ser humano sempre tem as suas razões e motivos que o fazem
agir da maneira que se propõe ou realiza as suas ações. Em Filosofia, há áreas
que estudam, teoricamente, o comportamento humano, que é a ética e a moral.
A primeira é o estudo teórico dos fundamentos e dos argumentos que justificam
a ação moral, e a segunda estuda os elementos constitutivos da própria moral, ou
seja, como ela se apresenta e se expressa na realidade humana, no mundo prático,
por meio da cultura, por exemplo: na sociedade, nas organizações ou instituições,
como nas empresas, na família e na escola.

Definição de ética e de moral

Caso, em seu cotidiano, você, ainda, não tenha ouvido falar sobre ética e moral,
esses assuntos são tratados e valorizados em Nível Superior. Afinal, as organi-
zações, por exemplo, têm normas e regras a serem seguidas para o bom funcio-
namento de suas existências. Portanto, quando nos referimos a essas normas e
regras, estamos, justamente, tratando dos temas da ética, moral e seus códigos.
Assim, o código de ética possui valores, princípios e regras, que são expressões,
165
tipicamente, da moral desejada, para que esta seja cumprida, são chamadas nor-
UNIDADE 4

mas morais. As palavras “ética” e “moral” são dois termos importantíssimos que
temos de entender logo de início, para melhor aproveitar o estudo dessa aula.
Antes de entramos no mundo da filosofia, propriamente dito, vejamos o que nos
diz Dicio ([2020, on-line)13 sobre a ética:


• Segmento da filosofia que se dedica à análise das razões que oca-
sionam, alteram ou orientam a maneira de agir do ser humano, ge-
ralmente tendo em conta seus valores morais.

• [Por Extensão] Reunião das normas de valor moral presentes numa


pessoa, sociedade ou grupo social: ética parlamentar; ética médica.

Sobre a moral, Dicio ([2020], on-line, grifo nosso)14 diz que esta palavra pode
funcionar como substantivo ou como adjetivo. Vejamos:


Substantivo:
• Preceitos e regras que, estabelecidos e admitidos por uma socieda-
de, regulam o comportamento de quem dela faz parte.

• Leis da honestidade e do pudor; moralidade.

• [Informal] Qualidade do que se impõe, influência ou exerce certa


soberania em relação a: não tinha moral para falar do adversário.

• [Filosofia] Parte da filosofia que trata dos costumes, dos deveres e do


modo de proceder dos homens nas relações com seus semelhantes.

Adjetivo:
• Que está de acordo com os bons costumes; que explica, disciplina,
ensina.

• Em conformidade com o considerado ético, legal, correto.

• Que é próprio para favorecer os bons costumes.

• Refere-se às regras de conduta, ao âmbito do espírito humano.

• Que significa um comportamento delimitado por regras fixadas


por um grupo social específico.

• Relativo ao espírito intelectual em oposição ao físico, ao material.


166
É importante, ainda, ressaltar que, apesar dessas duas palavras serem de origens

UNICESUMAR
diferentes (ética vem do grego e moral vem do latim), ambas têm sentido aproxi-
mado de uma palavra da nossa língua: “costume”. Porém, vamos nos aprofundar
mais um pouco o que significa moral e ética. A palavra moral, do latim, moris,
quer dizer: “[...] o conjunto de normas e regras destinadas a regular as relações dos
indivíduos numa sociedade dada” (VAZQUEZ, 2017, p. 45). Tem a ver, portanto,
com a prática, com o comportamento, propriamente dito, da pessoa em suas re-
lações no cotidiano em uma determinada sociedade. Isso aponta que a moral é
sempre relativa a uma determinada sociedade, ainda, ela, segundo Srour (2005, p.
62),“é um dos mais poderosos mecanismos de reprodução social, porque define o
que é permitido e proibido, justo e injusto, lícito e ilícito, certo e errado. Ao arrolar
obrigações, fins e responsabilidades, suas normas são prescrições que pautam as
decisões e moldam as ações dos agentes”. Ou, dito de outro modo, é a “maneira
de se comportar regulada pelo uso” de um determinado grupo social. Veja esses
dois exemplos: “Devo cumprir a promessa “x” que fiz ontem ao meu amigo “y”,
embora hoje perceba que o cumprimento me causará certos prejuízos? Devo
dizer sempre a verdade ou há ocasiões em que devo mentir?” (VAZQUEZ, 2017,
p. 35). Esses questionamentos, por sua vez, remetem-nos a atitudes práticas, e isso
quer dizer que estamos no campo da moral. Moral, por fim, são normas, regras
ou leis adquiridas que devem ser observadas pelos participantes, por exemplo,
de uma empresa, de uma igreja ou de uma família.
A palavra ética, vem do grego, ethos, que quer dizer: “reflexão a respeito das
noções e princípios que fundamentam a vida moral” (VAZQUEZ, 2017, p. 56).
Portanto, refere-se ao campo, estritamente, teórico. Nas palavras de Sung e Silva
(2011, p. 30), a ética é “uma reflexão teórica que analisa e critica ou legitima os
fundamentos e princípios que regem um determinado sistema moral (dimensão
prática)”. Os seguintes exemplos podem ajudar: “A definição do que é bom não
é um problema do cotidiano, do particular, mas um problema geral de caráter
teórico, da ética. A reflexão não é um ato prático, mas um ato teórico, do mundo
das ideias” (VAZQUEZ, 2017, p. 38). Essas afirmações, por sua vez, remetem-nos
a atitudes teóricas e gerais, e não ao mundo da prática, por isso, a ética está no
campo da reflexão, enquanto a moral está no campo do comportamento propria-
mente dito. Conforme Srour (2005, p. 34):


Enquanto a moral tem uma base histórica, o estatuto da ética é teóri-
co, corresponde a uma generalidade abstrata e formal, diria racional.
167
Logo, a ética estuda as morais e as moralidades, analisa as escolhas
UNIDADE 4

que os agentes fazem em situações concretas, verifica se as opções


se conformam aos padrões sociais.

Isto não quer dizer que ética e moral estejam separadas; pelo contrário, ambas se
relacionam reciprocamente, enquanto ação humana: teoria e prática, ou, ainda,
conhecidas como práxis que significa ação-reflexão, que seriam lados de uma
mesma moeda. Nesse sentido, ética e moral caminham juntas, ou seja, como já
dissemos, todo comportamento precisa de fundamentos teóricos, o primeiro é a
moral e o segundo é a ética.
Portanto, conforme foi exposto, os termos “ética” e “moral” se aproximam e se
distanciam um do outro e, algumas vezes, podem até se confundir, por exemplo:
quando, em um processo de seleção, o entrevistador pede para que o entrevistado
leia o código de ética da empresa; porém, na realidade, o código de ética é um
código moral da empresa, no sentido prático, ou seja, aquilo que a empresa quer
que a pessoa, sendo selecionada, faça, pratique ou viva segundo os valores que a
empresa acredita. Contudo o importante é que você tenha claro o sentido e os
campos aos quais esses termos fazem parte e estão relacionados: ética é teoria, re-
flexão, princípio, valor, fundamento necessário, argumento teórico, a partir de uma
determinada perspectiva de vida ou existência do mundo religioso, humanístico,
epistemológico, filosófico ou ideológico.
Dessa maneira, a ética se relaciona ao abrangente, ao fundamental ou ao univer-
sal. Ela discute sobre as elaborações teóricas dos valores imprescindíveis, como, por
exemplo o Bem, a Justiça, a Vida, a Liberdade, o Amor, a Alegria, a Saúde, a Paz, dentre
outros, bem como se o sentido desses valores é realmente único ou diverso; assim,
procede sempre a reflexão filosófica sobre a ética. A moral, por sua vez, é prática, ação,
comportamento, atitude, norma, regra, lei, padrão social que se faz e é instituída a
partir de valores e princípios de uma determinada sociedade ou organização. Dessa
maneira, a moral está relacionada a uma condição construída social e culturalmente
e aceita por um determinado grupo de pessoas ou de uma sociedade específica; as-
sim pode-se afirmar que se tem várias morais, ou seja, tipos de comportamentos para
uma determinada situação, como: comer à mesa, falar a verdade, relacionamento
conjugal ou afetivo, vida religiosa ou espiritual, dentre tantas outras situações que
o ser humano realiza no mundo, as quais, a partir da observação, manifestam-se de
formas distintas, diversas ou, até mesmo, de formas contraditórias, por exemplo, o
certo como sendo o errado e o errado como sendo o certo.
168
Além disso, essas formas contraditórias, ainda, são dependentes do sentido

UNICESUMAR
dado pelo ser humano em cada uma de suas ações, e esse sentido, por sua vez,
é considerado pela ética e pela moral como sendo importante para se fazer a
chamada avaliação moral ou ética dos atos humanos. O Direito utiliza muito
os fundamentos filosóficos do sentido, da intenção e das condições da ação, com
o intuito de julgar, avaliar e, assim, aplicar as penas a serem dadas referentes a
um determinado comportamento moral que a sociedade – representada pelo
juiz – considera como sendo algo que atinge à organização social e às normas
estabelecidas, por exemplo: crimes, delitos, infrações ou desrespeitos à ordem
social ou individual.

3
OS TIPOS DE ÉTICAS:
DA GRÉCIA À
atualidade

Caríssimo(a) aluno(a), nesta aula, prosseguindo com a nossa viagem, veremos


como que o tema da ética, especificamente, foi tratado e apresentado pelos fi-
lósofos, ao longo da nossa história; ainda, apresentaremos a influência dela nos
campos dos saberes e das práticas de atuação do ser humano. Antes, porém, de dar
continuidade, caríssimo(a), faz-se necessário refletir sobre o ato do conhecimento
referentes à ética e à moral, em especial, sobre a sua construção. Assim, traremos
para esta reflexão as palavras de Aranha e Martins (2005, p. 219): “a experiência
169
efetiva da vida moral supõe o confronto contínuo entre a moral constituída (isto
UNIDADE 4

é, os valores herdados) e a moral constituinte, representada pela crítica aos valores


ultrapassados e pela gestação de novos parâmetros de avaliação”.
Nessa direção, quando se estuda sobre esses temas, temos que estar dispostos
e abertos ao conhecimento, no sentido de sermos receptivos a dinâmica ao que
observamos e como o objeto observado se mostra e transforma diante de nós.
Assim, especificamente, quando estudamos o tema da ética, apesar de você ter
um determinado entendimento a respeito dela, mesmo que seja por um lapso
temporal, todos nós devemos aprender que, na busca da preservação da vida, o ser
humano sempre se refaz em sua própria maneira de pensar e agir na sociedade.
Isso significa que os valores que regem a vida moral do ser humano, em socie-
dade, podem ser pensados, repensados ou criados ou recriados para atender aos
objetivos e às finalidades estabelecidas pelo próprio ser humano, diante de suas
mais diversas necessidades identificadas.

A Ética numa parte da história da humanidade

O tema da ética, logo, nos primeiros anos do surgimento da Filosofia, entre os gregos,
foi tratado com atenção. Isso se justifica pelo fato desse tema estar relacionado à con-
vivência social na pólis, em especial, em Atenas. Do passado antigo aos nossos dias,
a vida em sociedade é um tema sempre caro a todos os conhecimentos, em especial,
aos conhecimentos filosófico, sociológico, psicológico e ciências sociais. Assim, no
período clássico, com Sócrates, Platão e Aristóteles temos uma produção significativa
e expressiva sobre o tema da ética e da moral, porém nosso objetivo não é abordar
esses temas extensivamente, pelo contrário, tratar-nos-emos de forma sumarizada.
Assim sendo, segundo Vazquez (2017), Sócrates, um dos primeiros a tratar
desses temas, compreendia que bondade, conhecimento e felicidade se entrelaçam.
Então, quando o ser humano conhece o Bem, age conforme deve, e, à medida que
vai conhecendo-o, não pode deixar de fazê-lo, do mesmo modo, quando aspira o
bem, o ser humano conhece a si mesmo, sente-se seguro e dono de si, e, assim, con-
sequentemente, torna-se feliz. Nessa mesma direção, virtude e vício se diferenciam
substancialmente; a primeira é sabedoria e conhecimento, e o segundo é ignorância.
É importante ressaltar que o saber, em Sócrates, é o saber sobre o ser humano, ou
seja, conforme a célebre afirmação socrática, “conhece-te a ti mesmo e conhecerás
o universo e os deuses e o universo”.
170
Para Platão (2002 apud VASQUEZ, 2017), a ética e a moral estavam relacio-

UNICESUMAR
nadas à vida na pólis, na qual as ideias, somente, poderiam ser identificadas pelo
filósofo, e este poderia ajudar as pessoas, que vivem em sociedade, a viverem de
uma forma mais educada e coerente. Assim, as virtudes se dividem, conforme a
classe social, respectivamente: a prudência e a sabedoria (os governantes e filóso-
fos); a fortaleza e a valentia (os guerreiros); temperança e autodomínio (artesão e
comerciantes); e a justiça seria como equilíbrio de todas as virtudes e, a partir dela,
deveria haver harmonia entre todas as partes (classes sociais) da sociedade, ou seja,
uma vida harmônica por todos os cidadãos e cidadãs da pólis. Para Aristóteles
(2004), o ser humano era um animal político, social e racional. A felicidade seria
o fim último do ser humano em sociedade. Assim, compreendia que havia três
formas de se obter obtê-la: pela virtude, pela sabedoria e pelo prazer. Desse modo,
todos esses meios, necessariamente, deveriam ser orientados pela razão.
Nos primeiros anos da Era Cristã, Cícero (106 a.C a 46 d.C), dentre os romanos
influenciados pela filosofia grega, foi um dos grandes elaboradores que observava
a importância da filosofia como uma grande solução para a conduta das pessoas
em sociedade, com o seu caráter e seus costumes. Entre os romanos, também, as
virtudes eram, sobremaneira, destacadas como aspectos da moral. Os romanos
compreendiam que elas deveriam ser exercidas por meio da retidão e da hones-
tidade (ARANHA, 2012). Segundo Vasquez (2017), a moral era compreendida
como um conjunto de deveres que a natureza impôs ao ser humano, tanto em
seus aspectos individual quanto social. No Período Medieval, os valores éticos e as
normas morais foram determinados pelas referências da religião cristã, ou seja, a
partir dos ensinamentos de Jesus Cristo. Na prática, os princípios e a moral cristã
eram determinados pelas lideranças religiosas, isto é, pelo Papado. Um dos grandes
nomes do período medieval é São Thomas de Aquino; este afirmava que Deus era
o legislador, e os padres, os intérpretes da lei. Assim, o poder da determinação da
moral e dos costumes do povo, durante todo o período, foram regidos pelo poder
da Igreja e de seus representantes, os padres. Na modernidade, por fim, a moral é
compreendida como uma expressão vinda do interior do próprio ser humano. Um
dos principais nomes desse período é Immanuel Kant, filósofo alemão. Para ele, a
moral é autônoma no sentido que a lei é ditada pela própria consciência moral do
ser humano (MARIANO, 2007).
Por fim, a ética, está relacionada à política em relação ao poder e ao seu exercí-
cio e finalidade; a bioética (é uma área do conhecimento que estuda os problemas e
implicações morais despertados pelas pesquisas científicas em biologia e medicina)
171
em relação à vida humana e às melhorias da qualidade de vida do ser humano; e a
UNIDADE 4

Sociologia (estudo cientifico da organização e do funcionamento das sociedades


humanas e das leis fundamentais que regem as relações sociais, as instituições, den-
tre outras), por sua vez, está relacionada às leis sociais que podem reger o desenvol-
vimento social e o estudo sobre o desenvolvimento social e o comportamento ético
esperado, na sociedade, como um bem coletivo. A ética, também, está relacionada
ao Direito, uma vez que o ser humano, em uma sociedade burocrática, está sujeito
às normas que regulamentam as condutas da vida social. Por fim, apresentaremos
uma última informação mais técnica: segundo Aranha e Martins (2005), desde a
década de 70, vão sendo formados, nos espaços acadêmicos universitários, conhe-
cimentos filosóficos aplicados a outras áreas do conhecimento, ressaltando, por sua
vez, o caráter interdisciplinar e transdisciplinar. São novos conhecimentos a partir
de filosofias que surgem do diálogo entre os saberes e os fundamentos da ética:
bioética, ética ambiental, ética dos negócios.

A classificação da Ética

Agora, caro(a) aluno(a), trataremos de um assunto muito importante sobre ética.


Esse assunto é, de certa forma, árido, ou seja, não é tão simples assim, mas se faz
necessário. Ele trata da classificação da ética, a qual é necessária e fundamental
para orientar o conhecimento e comportamento humano. Vamos lá: Você já ou-
viu o ditado popular “toda ação tem uma motivação”? Expomos esse ditado, pois
ele reflete os objetos de estudo da Filosofia, ou seja, as razões e as motivações do
comportamento humano. Dessa forma, abordaremos, a seguir, a classificação da
ética que quer, justamente, dar base teórico-filosófica aos mais diversos compor-
tamentos humanos, ou seja, veremos como ela se classifica em relação às princi-
pais ideias que orientam e organizam as atitudes e ações humanas. Assim sendo,
segundo Mariano (2007), a ética pode ser classificada como: Ética Empírica, Ética
de Bens, Ética Formal e Ética Valorativa (MARIANO, 2007).
1. Ética Empírica: esta doutrina ética afirma que a experiência e a observação
dos fatos são a fonte para orientar e entender o comportamento humano.
Para essa compreensão, os preceitos disciplinadores do comportamento es-
tão implícitos no próprio comportamento, ou seja, na prática, no cotidiano

172
da vida. A concepção empírica não questiona o que o ser humano “deve

UNICESUMAR
fazer”, mas examina o que “o ser humano, normalmente, faz”. Sendo, assim,
cada ser humano age de uma maneira e isso nos leva para o relativismo
ético. Parafraseando um ditado popular,“cada pessoa tem seu próprio jeito
de ser”. Podemos citar, pelo menos, três correntes filosóficas que seguem
essa concepção empirista: anarquismo, utilitarismo e ceticismo.
Exemplo prático: para a compreensão anarquista, o ser humano tem que
aceitar, em primeiro lugar, as leis naturais que o acompanham ao nascer.
São elas que regem o verdadeiro comportamento, ou seja, as chamadas
necessidades básicas, por exemplo, comer, beber e sexo. O anarquista não
admite que as leis da sociedade civil organizada, como as proibições ou
restrições, inibam desejos e prazeres naturais.
2. Ética de Bens: esta doutrina é bem diferente da ética empírica. Ela advoga
que há um bem supremo fundamental. Segundo Nalini (2001, p. 75), “a
criatura humana é capaz de se propor fins, eleger meios e colocar em práti-
ca os últimos, para alcançar os primeiros”, ou seja, para essa compreensão,
o ser humano tem fins superiores que orientam o comportamento hu-
mano. Contudo, dentro dessa doutrina, há posições que diferem qual é o
bem supremo que deva orientar o comportamento humano. Sendo assim,
dentre estas, temos três grandes posições que influenciaram os grandes fi-
lósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles, sendo elas: a primeira refere-se
ao eudemonismo, que acredita que o bem supremo é a felicidade, pois esta
nasce com o ser humano; a segunda refere-se ao idealismo ético, o qual
defende que o bem supremo refere-se à prática dele; e, por fim, a terceira
que se refere ao hedonismo, o qual entende que é o prazer o bem maior.
Exemplo prático: para a pessoa que é orientada pelo idealismo ético,
praticar o bem, independente das consequências que possa vir a sofrer
ou tenha de enfrentar. Portanto, importa a realização da prática do bem,
da maneira que ela exige por meio dos seus princípios e valores, pois a
felicidade e o prazer pessoal são consequências necessárias dessa prática.
Isto quer dizer, por exemplo, que o ato de devolver o dinheiro achado ao
seu verdadeiro dono é uma prática do bem superior, o qual proporciona,
verdadeiramente, a felicidade ou o prazer a despeito do valor do dinheiro
e do que este possa proporcionar a quem o achou.

173
3. Ética Formal: esta concepção defende a consciência racional,a partir da
UNIDADE 4

lei moral. É dado esse nome “Ética formal”, porque vem de racional, do
campo da lógica. O importante, portanto, é cumprir, logicamente, o que
tem de ser feito. Deve-se cumprir, conforme às exigências da consciência
racional e não conforme os sabores do ambiente externo. O filósofo por
excelência dessa doutrina é Kant, e ele advoga que o certo é fazer o que é
lógico ou racional.
Exemplo prático: segundo Kant, as regras ou as leis do comportamento,
que são estabelecidas, segundo a consciência racional, devem ser cum-
pridas independente das condições e consequências externas. Veja esta
situação: uma turma da faculdade, com 40 pessoas (conscientes racio-
nalmente), determinou que faria um churrasco em um final de semana e
que cobraria R$ 10,00 reais para o pessoal da turma, R$ 5,00 para amigos
(externos) e familiares bem como R$ 20,00 reais para seus professores.
Isso quer dizer que foram estabelecidas três categorias com seus respec-
tivos valores para o pessoal da turma, amigos e familiares bem como
seus professores. Diante disso, deve-se cumprir o que fora combinado,
portanto, não é justificável, racionalmente, alguém, como uma pessoa da
turma, mesmo que tenha participado, diretamente, da organização do
churrasco, ser isento de pagar os R$ 10,00 reais. Isso porque a consciência
racional acusa que essa atitude não é lógica nem coerente, pois funciona
de maneira irracional influenciada pelas questões externas e não seguem
as normas estabelecidas e acordadas racionalmente. Por essas razões, esta
atitude deve ser considerada antiética.
4. Ética Valorativa: esta doutrina ética defende que o comportamento mo-
ral deve ser orientado e pautado por aquilo que é valioso. Isso é, facilmen-
te, constatável, pois qualquer pessoa pode dar valor a objetos materiais,
sentimentais e ideais, por exemplo. Contudo não se pode ter uma ideia
arbitrária ou aleatória do valor, como se cada pessoa, ao seu bel prazer,
determinasse, para o conjunto da sociedade, o que é ou não valioso. Do
ponto de vista da organização social, a existência do valor está associada
aquilo que a sociedade, por sua vez, compreende, aceita e respeita como
sendo valioso, e isso é determinado pela maioria, ou seja, os valores são
uma convenção, e eles se expressam nas leis ou nos códigos morais apro-
vados pela sociedade por meio do legislativo municipal, estadual e federal.

174
UNICESUMAR
Exemplos práticos: do ponto de vista pessoal,
em nossa cultura, amar ou odiar uma pessoa
revela um determinado valor compreendido
como positivo, se houver amor, carinho; ou,
como negativo, se houver ódio, raiva. Do pon-
to de vista social, a vida biológica, no Brasil,
é um valor social supremo defendido pela
Constituição. Pode-se dizer que a vida biológi-
ca deve ser garantida e respeitada pelo Estado
e por todos que, aqui, vivem. Nesse sentido,
o valor determina o comportamento moral
de um povo, no caso do Brasil, a vida é com-
preendida como um valor superior, por isso,
do ponto de vista legal, é um crime matar a
vida de uma outra pessoa.

Diante das considerações e informações apresenta-


das anteriormente, acreditamos que tenha ficado claro
que a ética é um tema importante, desde sempre, em
uma sociedade letrada, na qual a filosofia é uma forma
de conduzir o pensamento e a ação humana. Desse
modo, esperamos, também, que você, caro(a) aluno(a),
tenha compreendido que esse tema está relacionado
ao desenvolvimento do comportamento humano e às
outras áreas do saber, como administração, medicina,
ecologia, dentre outras; assim como, também, existem
várias filosofias que dão conta de expressar os mais
diversos conteúdos que podem orientar e organizar
o pensamento e o comportamento humano em so-
ciedade.

175
4
A MORAL E SUAS TEORIAS
UNIDADE 4

E SEU CARÁTER
sócio-histórico

Caro(a) aluno(a), estamos, neste momento da nossa unidade, caminhando para


o seu fim. Contudo esta aula se coloca como um verdadeiro divisor de águas: de
um lado, enquanto as elaborações e construções filosóficas da ética estão para os
conceitos e as teorias para a abstração ou para o mundo das ideias, como diria
Platão se estivesse vivo, agora; de outro lado, estão, justamente, as conversas que
se iniciam sobre o mundo prático, o mundo vivido, a moral. Assim, apesar de ser
um texto e uma elaboração teórica sobre a moral, ele trata de uma teoria sobre a
prática. Nessa direção, de forma básica, sistemática e objetiva, além de estudar-
mos as teorias que fundamentam o fazer, a ação e a prática moral na atualidade,
estudaremos se a moral ressalta o caráter eminente como expressão construída ou
constituinte (transformadora) na relação que se estabelece no contexto histórico
e social, do indivíduo com o outro indivíduo, do indivíduo com determinado
coletivo (e vice-versa) e do coletivo com outro coletivo (ARANHA, 2012).

Aprofundando a conversa sobre critério ético e


posturas morais

Já é consenso que o nosso tempo é complexo e muito dinâmico. Contudo não se


pode, de maneira nenhuma, ficar inerte ou indiferente diante das situações que se
apresentam na sociedade. Para isso, é necessário ter critério(s) para avaliar, julgar
176
e agir na realidade bem como compreender as posturas morais, como forma de

UNICESUMAR
ajudar no entendimento da própria realidade, em que se está inserido; para as
tomadas de decisões que se apresentam, constantemente, na dinâmica social:
família, trabalho, política, dentre outras.

Critério ético

Antes de avançar, o que vem a ser um critério? Segundo Dicio ([2020], on-line)15,
critério é uma palavra que, do ponto de vista morfológico, é um substantivo:


• Capacidade para distinguir o verdadeiro do falso, o bom do ruim.

• Parâmetro usado para estabelecer uma comparação, escolha, jul-


gamento ou avaliação: não cumpria os critérios da empresa.

• Capacidade para opinar ou julgar acertadamente; discernimento.

• Modo particular de avaliar pessoas, circunstâncias, coisas.

• [Filosofia] Conceito imprescindível que, num sistema de pensa-


mento, estabelece a diferença de julgamentos entre categorias (o
bem e o mal); avaliação.

Dessa maneira, o critério é uma parte importante para se pensar sobre a moral,
uma vez que orienta e constitui as condições, propriamente ditas, para o agir
humano; um determinado critério funciona como um start (começo) da própria
ação moral, ou seja, age-se nessa ou naquela situação que, por sua vez, é oriunda
de determinado critério avaliativo, que remete a uma situação identificada como
sendo necessária para o agir (MARIANO, 2007). Nesse sentido, o critério ético se
coloca como meio necessário para proceder a avaliação ou o julgamento de uma
determinada situação vivida, uma vez que o ser humano é um ser racional. Sobre
essa questão da construção do critério ético, Boff (2011, p. 18) observa que “foi
a razão crítica, articulada pelos grandes filósofos Platão e Aristóteles, aquele que
deu o salto do daimon (percepção ética fundamental ou moral) ao ethos (sistema
racional de princípios)”.
Assim, seguindo esse tipo de critério, constituído anteriormente, que tem os
elementos conceituais e filosóficos observados, apontamos a vida, como critério
177
ético. Não, apenas, no sentido orgânico ou biológico, mas vista nas dimensões
UNIDADE 4

do respeito e da dignidade do outro, da outra e do meio, da diversidade e dos


ecossistemas. Nesse sentido, Boff (2011, p. 18), também, corrobora que a vida é
um fundamental elemento para fundamentar os conteúdos da ética e da moral
para os nossos dias:


O medieval não tinha a sutileza dos gregos. Eles usaram o palavra
moral (que vem de mos / moris, hábito é hábito) tanto costumes,
caráter e princípios e valores. Eles o moldam. Tudo isso foi designa-
do pelo termo “moral”. Mas dentro da moralidade eles distinguiram
entre moral teórica (filosofia moral), que estuda os princípios e ati-
tudes que iluminam as práticas e moral prática, que analisa os atos
à luz da atitudes e estudar a aplicação dos princípios à vida.

A vida, portanto, é o princípio que deve ordenar e pautar o comportamento humano,


ou seja, a prática moral. Ela é o ponto de saída da ação e o ponto de chegada da ação.
Sendo assim, compete à moral ser normatizadora (norma normata) das relações en-
tre as pessoas, as organizações e a coletividade como um todo, em um dado contexto.

Posturais morais

Inicialmente, conforme Dicio ([2020], on-line)16, por postura, como substantivo


feminino, deve-se entender:


• Posição do corpo: postura reta.

• Expressão facial própria; semblante, fisionomia.

• Comportamento de quem sabe se portar; compostura.

• Modo de agir; comportamento: sua postura foi inadequada.

• Maneira de pensar; ponto de vista, opinião, posicionamento.

• [Zoologia] Os ovos que as aves põem durante certo número de


dias; ação ou efeito de pôr ovos.

178
Logo, postura, utilizada neste texto, tem o sentido relacionado ao modo de pensar

UNICESUMAR
como posicionamento adquirido, a partir de uma determinada concepção. Nesse
sentido, conforme Boff (2011 p.16), a moral “faz parte da vida concreta. Trata da prá-
tica real das pessoas, que se expressam por meio dos costumes, hábitos e valores cul-
turalmente estabelecidos”. Assim, caro(a) aluno(a), como apresentado anteriormente,
reiteramos a vida humana como critério fundamental para avaliação e julgamento
dos comportamentos do ser humano em sociedade. Nesse sentido, abordaremos
tipos de posturas morais, como comportamentos que as pessoas têm tido na atua-
lidade. Portanto, a seguir, apresentaremos, três posturas morais mais comuns que as
pessoas adotam, diante de determinadas situações em que é preciso agir, sendo elas:
Moral Essencialista, Moral Individualista e Ética da Responsabilidade.
Moral Essencialista: esta postura é uma das mais comuns. Ela defende que
as pessoas agem sempre orientadas por um conjunto de normas herdadas, que
devem servir de base para o comportamento moral das pessoas em toda e qual-
quer situação. São normas que funcionam como “regulação” ou como os “meus
deveres”. São assim imperativos categóricos que legitimam toda e qualquer ação
(ARANHA; MARTINS, 2005). Na maioria das vezes, o sentido é absoluto e uni-
versal, ou seja, o que é mentira, aqui, onde moro, também, é mentira, lá longe, do
outro lado do mundo. A pessoa que possui essa postura é muito comum conceber
uma determinada prática moral, como sendo uma verdade universal. O espírito
altruísta é muito forte nessa postura, isto é, sempre valoriza o que é externo e não
interno. Um bom exemplo disso é a pessoa religiosa que acredita em verdades
absolutas, sem a mínima possibilidade de exceções ou justificativas que possam
ser consideradas como válidas. Para esse tipo de pessoa, não há contextualização
ou reforma daquilo que se tem afirmado. Desse modo, a Moral Essencialista é
típica das sociedades mais tradicionais e conservadoras.
Moral Individualista: esta postura advoga uma posição bem diferente da
Moral Essencialista. Não há verdades universais ou absolutas, mas cada um, se-
gundo a sua consciência, tem a sua própria verdade. A razão humana é que de-
termina quando e como agir. Não há um ser superior ou um plano divino que
pré-estabelece e orienta as ações humanas, ou seja, cabe ao ser humano cuidar de
si mesmo, pois seu detentor é ele mesmo. É isso que é pregado na modernidade
atual: autonomia e liberdade dos indivíduos. A máxima individualista é: “Cada
um cuida de si mesmo”. Um exemplo dessa moral é a pessoa que só faz as coisas
pensando em obter vantagem pessoal em tudo que faz. A Moral Individualista é
própria da sociedade capitalista e de mercado atual.
179
Ética da Responsabilidade: por fim, esta postura moral acredita que é o
UNIDADE 4

grupo ou o meio coletivamente que decide, de maneira consensual, os padrões


de conduta que devem ser praticadas. Esses padrões, por sua vez, não são vistos
como universais, imutáveis ou que favoreça a um indivíduo em particular, mas é
relativo a cada situação, tendo sempre – como norma normata – o julgamento
da coletividade que analisa o mérito para mudar ou reconduzir os padrões es-
tabelecidos. A Ética da Responsabilidade se diferencia das outras duas posturas
morais no sentido de que não são, somente, nos princípios, mas, principalmente,
pelo contexto e pelos efeitos ou pelas consequências oriundas das ações realiza-
das. Essa postura é compreendida como a serviço dos seres humanos como ser
coletivo e não o inverso. Para essa postura moral, a vida do ser humano é o bem
que catalisa e irradia entendimento da realidade e vida social e, por consequên-
cia, orienta o comportamento moral a favor dos interesses daqueles que vivem
socialmente. Um exemplo oportuno é a consciência ecológica no processo de
desenvolvimento sustentável em que se defende a diversidade e os ecossistemas
existentes. Não adianta a exploração das riquezas naturais se estas não poderão
ser usufruídas, continuadamente, pelas novas coletividade e gerações futuras.

180
5
ÉTICA, MORAL

UNICESUMAR
E SOCIEDADE

Chegamos à reta final desta unidade. Agora, caro(a) aluno(a), estudaremos um


dos aspectos mais importantes da ética e da moral para o ser humano, que é con-
vivência social. Nessa direção, a reflexão sobre a ética ou a moral só tem sentido
e significado quando ambas estão relacionadas à convivência do ser humano
entre si, com outros indivíduo e com o meio em que vive, ou seja, seu locus, sua
cidade ou sociedade. Antes de aprofundar ou precisar os caminhos a serem tri-
lhados, no sentido de abordar os assuntos desta aula, o que é mesmo sociedade?
Para relembrar, caro(a) aluno(a), como vimos, na primeira aula desta unidade,
sociedade pode ser, segundo Dicio ([2020], on-line)12:


• Reunião de homens e/ou animais que vivem em grupos organi-
zados; corpo social.

• Conjunto de membros de uma coletividade subordinados às mes-


mas leis ou preceitos.

• Cada um dos diversos períodos corresponde à evolução da espécie


humana: sociedade primitiva, feudal, capitalista.

• União de várias pessoas que acatam um estatuto ou regulamento


comum: sociedade cultural.

181
Como se pôde observar, o sentido dado a palavra “sociedade” é diverso, contudo
UNIDADE 4

os sentidos, apresentados anteriormente, apontam para a ideia de convivência


social. Assim, nesse sentido mais propriamente dito, é que reside a importância
capital da ética e da moral para o ser humano e, em especial, para os nossos
objetivos deste estudo. Especificamente, os clássicos da filosofia trataram sobre
o tema da ética e sociedade, dentre eles, temos Aristóteles (2004) que tratou, de
forma brilhante, o tema da ética relacionada à vida social sob a compreensão
distintiva do ser humano como ente natural. Ainda, identificou, nessa perspectiva,
que a racionalidade, a socialização e a ética eram aspectos próprios da natureza
humana. Para Aristóteles (2004), o ser humano é, naturalmente, racional, social e
ético, assim como é dotado de condições intelectuais e racionais, que são essen-
ciais para a convivência social e desenvolvimento da ética como condutora do
comportamento em sociedade.
Dessa forma, especificamente, esses aspectos social e ético do ser humano,
conforme compreende o filósofo, são duas características que se inter-relacionam
necessariamente, isto é, de forma a expressar o seu ser natural, assim como é na-
tural o ser racional conduzir a vida social e a ética do ser humano na sociedade.
Portanto, caro(a) aluno(a), objetivamente, a ética e a moral, a partir de Aristóteles
(2004), pode nos credenciar a afirmar que, tanto a reflexão sobre a ética quanto
a do senso moral sobre normas ou regras, estão destinadas, ou seja, têm, como
propósito, possibilitar a boa, justa e feliz convivência social entre os seres huma-
nos na sociedade.
De forma objetiva, caro(a) aluno(a), a sociedade precisa que seus componen-
tes se comportem de maneira ética, no sentido de praticar a devida moral, pois
há uma questão fundamental em jogo: a sobrevivência da vida e, com ela, as mais
diversas manifestações da raça humana na Terra. Isso, por sua vez, tem a ver com
todas as pessoas que vivem em sociedade, principalmente, com os profissionais de
uma maneira geral, os quais são um dos grandes responsáveis pela organização e
o sentido da sociedade. A partir dessa brevíssima introdução sobre a importância
da ética e da moral para o ser humano viver em sociedade, estudaremos a ética
profissional, um tema sempre importante e recorrente. Nossa intenção não é
tratar desse assunto como mais um modismo, ou seja, algo que que possui valor
temporário; pelo contrário, ética profissional não é nada disso, não é modismo,
é uma questão necessária e urgente para a sociedade e para a vida de quem quer
ser, realmente, um profissional.

182
A ética, em especial, em uma perspectiva profissional, segundo Dowbor

UNICESUMAR
(2002), é o eixo central das condições de sobrevivência do sistema atual, pois os
tipos de produtos e insumos que se manipulam hoje, se não houver um compor-
tamento ético, ou seja, uma predisposição individual e institucional de buscar o
bem comum, poderá destruir a vida humana. É isso que se pode imaginar devido
às novas tecnologias de alta potência, e o fácil acesso a elas são fatores que, tam-
bém, contribuem para a destruição da vida humana, um exemplo disso é o uso
de produtos químicos, como o Mercúrio na garimpagem de ouro, que causam
prejuízos nefastos ao meio ambiente e a humanidade.
Afirmar, portanto, a necessidade da ética, no exercício profissional, é uma
abrupta redundância que agride não só a nossa língua, mas, principalmente, o ser
profissional. Sabe por quê? Porque profissão, segundo Nalini (2016, p. 60), “é uma
atividade pessoal, desenvolvida de maneira estável e honrada, ao serviço dos ou-
tros e a benefício próprio, de conformidade com a própria vocação e em atenção
à dignidade da pessoa humana”. Isto quer dizer que ninguém é profissional para
si mesmo, ou seja, a finalidade do exercício profissional é estar a serviço do bem
comum, em outras palavras, a serviço do outro e de sua autorrealização, objeti-
vos de uma mesma ação que tem como grande beneficiada à sociedade. Há uma
expectativa, portanto, da sociedade pelo cumprimento do papel do profissional.
Dessa forma, reflita conosco, caro(a) aluno(a): quantas atividades, modalidades
e tipos de profissões que são envolvidas, diariamente, na produção, na comerciali-
zação e no serviço para garantir a nós as condições básicas de vida (como a água
tratada que chega a nossa casa, o pão que comemos diariamente, a roupa, o lazer,
a moradia, a saúde, a educação, o transporte, a telefonia etc.)?
Continuando a nossa reflexão, veja este exemplo agora: quando ingerimos um
alimento, como a carne de boi, em nossas refeições diárias, fazemos isso natural-
mente, ou seja, não passa pela nossa cabeça que a carne não foi cuidada e super-
visionada como devia. Se não fosse dessa maneira, não a colocaríamos na boca e,
muito menos, não a ingeriríamos. Nós chamamos isso de credibilidade profissional;
é isso que pensamos sobre a empresa que nos vende a carne bem como do profis-
sional que nos atende na hora da compra. Por isso, a ética profissional é um bem
necessário. Contudo agir de maneira conjugada, pensando no seu próprio bem e
na coletividade, é algo que não é muito simples de fazer, quando vivemos a reali-
dade do dia a dia. Muitas vezes, somos tentados a tirar esse objetivo nobre do bem
comum da nossa vida profissional. Isso ocorre quando você não somente ouve, mas

183
escuta vozes, dizendo sedutoramente que você vai ganhar mais sem precisar fazer
UNIDADE 4

muito esforço, como: “ninguém está vendo”,“se for pego, eu nego até a morte”,“todo
mundo faz”, “não se preocupe, isso não vai dar em nada”, “as pessoas não merecem
que eu faça o melhor para elas”. Ao dar atenção a essas máximas, você, enquanto
profissional, estará negando o papel de um profissional sério, decente e ético.

Ética, moral e ética profissional

Caríssimo(a), há uma expectativa muito grande por parte da sociedade em rela-


ção aos profissionais que se lançam para o exercício de suas especialidades. Essa
expectativa, inicialmente, é, extremamente, positiva, contudo, quando o profissio-
nal não cumpre, no sentido moral, de exercer o que se espera dele, essa expectativa
se torna muito frustrante, negativa em todos os sentidos, pois é comum entender,
por profissão, o “exercício habitual de uma tarefa, a serviço de outras pessoas” (SÁ,
2009, p. 155). Para que o profissional atenda à expectativa positiva da sociedade,
ele tem de estar ciente que são as atitudes profissionais que vão demonstrar, de
fato, o ato de ser profissional. Nesse sentido, portanto, a competência, a respon-
sabilidade e o compromisso são atitudes necessárias que marcam o ato de ser
profissional (FREIRE, 2001).
Um indivíduo que se diz profissional, porém não faz uso dessas atitudes elen-
cadas por Freire (2001), na realidade, conforme Rios (2013), não é um profissional
competente, ou seja, não cumpre o primeiro quesito exigido socialmente, que é
o domínio do conhecimento teórico e prático da técnica que se especializou: ter
competência. Deve, portanto, o profissional buscar, continuadamente, conheci-
mento para dominar, de maneira qualificada, a sua profissão. Com essa atitude,
deve, também, haver motivação, dedicação e humildade como dimensões neces-
sárias do ato de ser profissional. Como se diz, no dia a dia, ser competente é uma
questão de profissionalismo; assim deve, por sua vez, todo e qualquer profissional
responder na hora em que é chamado a desempenhar as suas funções. Por isso, a
falta de competência é a mais absoluta negação do ato de ser profissional.
A segunda atitude profissional é a responsabilidade. Como vimos, Na Uni-
dade 3, essa está relacionada à capacidade profissional de escolher caminhos que
têm de ser tomados no processo decisório, quer em sua vida profissional, quer
para os empreendimentos ou negócios. É imprescindível notar que a responsa-
bilidade profissional necessita, também, do entendimento apurado das ações
184
tomadas nas intenções e efeitos, ou seja, cabe ao profissional responsável medir,

UNICESUMAR
muito bem, quais as intenções e efeitos ou consequências que envolvem as deci-
sões. Portanto, ser responsável, enquanto profissional, é um dever, é uma máxima
absoluta, não se pode eximir das obrigações. Segundo Srour (2005, p. 68), “todo
agente social poder ser responsabilizado pelas escolhas que faz. Não lhe é per-
mitido alegar neutralidade ou desconhecimento de causa”. Essa afirmação deve
ser um mote na vida profissional, em número e grau, para quem quer trilhar os
caminhos de uma profissão ética.
Por fim, a terceira atitude é o compromisso. Ao profissional cabe desenvolver
uma relação baseada em valores sólidos consigo mesmo e com o seu local de
trabalho. Ser comprometido é cumprir com os deveres que são esperados pelas
contrapartes da profissão. Peguemos como exemplo um empresário. Este deve
ser comprometido com seus colaboradores, com seus clientes e com a sociedade
como um todo. Esta consciência profissional “do compromisso”, também, é uma
máxima que deve ser encarada como absoluta. Empreendedores que não são
comprometidos com seus colaboradores começam mal. E o tempo mostrará que
isso, também, ocorrerá com clientes e com a sociedade. Ser comprometido é ter
uma relação de pertença ao lugar e as pessoas em que vive, ou seja, ter uma relação
forte profissional com as pessoas e com o lugar onde está inserido.

explorando Ideias

Vontade distingue-se de desejo. O desejo não depende de escolha, surge involuntaria-


mente em nós. Já a vontade supõe a disposição consciente para agir e depende do poder
de reflexão para satisfazer ou não o desejo.
Fonte: Aranha (2012, p. 204).

pensando juntos

Uma sociedade que tem como bem maior a vida humana, poder ser considerada huma-
nista, filosoficamente uma sociedade liberal. Contudo, quando se observa que seus fun-
damentos legais, por exemplo, não dignificam o ser humano, ela é de fato uma sociedade
liberal?
185
CONSIDERAÇÕES FINAIS
UNIDADE 4

Os tempos não estão para peixe. Essa afirmação suscita, imediatamente, a seguinte
questão: em que sentido ou em que área do nosso tempo não está bom? Sem ser
catastrófico, é claro, mas sendo o mais realista possível, na área das relações e dos
comportamentos entre as pessoas na sociedade. Isso nos remete à ética e à moral.
Dizer que a sociedade está em crise seria redundante e pouco original. Contudo
negar que há comportamentos e atitudes morais, na sociedade, que atinge à pró-
pria vida humana, não é uma loucura. Afinal, pode-se fazer algo, moralmente,
aceito, mas não eticamente. Esse entendimento pode ser compreendido como
um substrato precioso de que estudou todas as aulas desta unidade e pôde apre-
ciar, entender, distinguir e aprofundar conceitos fundamentais sobre os temas
abordados nesta unidade, em especial.
Com sequência selecionada do plano de estudo, objetivamos construir um
entendimento e compreensão crítica dos temas estudados: o porquê da ética e da
moral hoje; compreendendo os termos “moral” e “ética” em Filosofia; os tipos de
éticas: da Grécia à atualidade; a moral e suas teorias e seu caráter sócio-histórico
e ética, moral e sociedade; bem como ter alcançados objetivos: assinalar a impor-
tância da ética e da moral na atualidade; diferenciar filosoficamente os termos
“ética” e “moral”; abordar os fundamentos e as concepções de ética; apresentar as
principais teorias e fundamentos da moral e analisar a relação entre ética, moral
e sociedade.
Assim como é importante o estudo sobre o conhecimento humano para
apreender a realidade e, dessa maneira, possibilitar ações construtivas para pre-
servação da própria espécie humana, também, é importante o estudo sobre ética
e moral bem como a relação desses temas com a realidade social, uma vez que,
por meio do agir e do comportamento humano, pode-se alcançar a tão desejada
e anelada convivência social. É importante ressaltar que, sem esta, é impossível
haver condições para o desenvolvimento da vida individual e social.

186
na prática

1. Na primeira aula desta unidade, caríssimo(a) aluno(a), vimos as razões da ética e da


moral para os nossos dias. Elas foram vistas em duas dimensões, uma planetária
e a outra em uma dimensão mais intimista, no sentido que ela tem mais a ver com
a nossa vida cotidiana e prática: uma dimensão socioambiental e desenvolvimento
humano. A seguir há razões e motivos da ética e da moral. Assinale a alternativa que
é uma das razões que fundamentam a importância da ética e da moral na dimensão
planetária:

a) Na sociedade, reside uma ideia de necessidade imprescindível da convivência e


do relacionamento recíproco: cumplicidade em prol da vida.
b) O entendimento da moral e da ética é necessário para a formação intelectual do
estudante em nível superior, contudo muito mais se faz quando esse(a) aluno(a)
tem que exercer as suas funções e contribuir com a sociedade onde vive.
c) A sociedade precisa de pessoas que desenvolvam o pensamento crítico sobre os
comportamentos (moral) e sobre os valores e princípios (ética) que regem, por
sua vez, esses comportamentos.
d) A pessoa que inicia a carreira universitária tem o direito e o dever de refletir
sobre a sua formação acadêmico-profissional, a qual implica, necessariamente,
em perceber e desenvolver o seu grande diferencial: a racionalidade.
e) Observa-se a necessidade de critérios que sirvam de parâmetros para auxiliar no
julgamento ético das ações dos países em relação ao meio ambiente.

2. Os temas da ética e da moral fazem parte do nosso cotidiano, por exemplo, quando
um entrevistador, em uma seleção de emprego, solicita ao entrevistado a leitura do
código de ética da empresa em que ocorre o processo seletivo. Assim, o código de
ética possui os valores, princípios (os quais estão no campo da ética) bem como as
regras e normas que expressam as exigências da empresa (as quais estão no campo
da moral). Leia, atentamente, as afirmações a seguir:

I - Princípios.
II - Ação-Reflexão.
III - Leis.
IV - Ação-Comportamento.

Assinale a alternativa correta sobre a forma do conhecimento discursivo:

187
na prática

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

3. Estudamos, na terceira aula desta unidade, a classificação da ética a partir de algu-


mas filosofias e filósofos, como base teórico-filosófica dos mais diversos comporta-
mentos humanos, as quais sejam: Ética Empírica, Ética de Bens, Ética Formal e Ética
Valorativa (MARIANO, 2007). Leia, atentamente, as afirmações a seguir e assinale a
alternativa verdadeira sobre a Ética Empírica e Ética Formal:

a) Valorização da experiência/consciência racional.


b) Valorização de um bem supremo/consciência racional.
c) O valor é seu maior bem/valorização de um bem superior.
d) Valoriza o que, realmente, o ser humano faz/valorização de um bem supremo.
e) O ser humano tem fins que orientam o comportamento humano/consciência
racional.

4. Na quarta aula, foi advogado, do ponto de vista filosófico, que a vida humana é o
critério fundamental para avaliação e julgamento dos próprios comportamentos do
ser humano em sociedade; contudo ressalta-se que o sentido dado a vida é mais
amplo possível. Nessa direção, do ponto de vista moral, foram estudadas posturas
morais, como comportamentos esperados das pessoas na atualidade, sendo elas:
Moral Essencialista, Moral Individualista e Ética da Responsabilidade. Leia, atenta-
mente, e marque a alternativa correta sobre a moral essencialista:

a) Não há verdades universais.


b) As normas não funcionam como regulação ou como meus deveres.
c) As normas funcionam como regulação ou como sendo os meus deveres.
d) É o grupo ou o meio coletivamente que decide, de maneira consensual, os pa-
drões de conduta que devem ser praticados.
e) Diferencia-se das outras duas posturas morais no sentido que não são, somente,
nos princípios, mas, principalmente, pelo contexto e pelos efeitos ou as pelas
consequências, oriundas das ações realizadas.

188
na prática

5. Como vimos, ao longo dos nossos estudos, a Filosofia é um conhecimento que


abarca temas específicos, como a teoria do conhecimento, estética, artes, moral e
ética. Essas duas últimas estão no campo da reflexão axiológica, ou seja, do valor
moral. Na quinta aula, abordamos a ética aplicada a vida profissional. Vimos que há
expectativa positiva sobre o exercício da profissão, contudo, quando o profissional
não atende a essa expectativa, a sociedade fica frustrada. Nesse sentido, estudamos
as atitudes necessárias para qualificar o ato de ser profissional. Leia, atentamente,
as afirmações a seguir sobre as atitudes necessárias para o exercício profissional,
conforme Freire (2001):

I - Atitude de criticidade.
II - Atitude de competência.
III - Atitude de responsabilidade.
IV - Atitude de compromisso.

Assinale a alternativa correta:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

189
aprimore-se

ÉTICA DA RESPONSABILIDADE

No âmbito da ética, seja ela antiga, moderna ou contemporânea, uma das questões
centrais é aquela que trata da fundamentação ou justificação de princípios ou nor-
mas morais. Para que se responda de modo seguro e sistemático e, portanto, não
fragmentário e precário à pergunta “o que devo fazer?”, que no entender de Kant é
aquela que resume todos os esforços no campo da moral, mais do que uma indica-
ção, é necessário oferecer razões.
Com efeito e, até mesmo, para além do campo de investigação filosófica, os seres
humanos não se contentam simplesmente em obedecer cegamente e o tempo todo
uma regra, autoridade ou instituição, sem que se interpelem a respeito da validade
ou legitimidade da mesma. Cortina (2003, p. 79) acertadamente observa que: “Dian-
te da imposição ou da proposição de normas, ante o convite para se seguir deter-
minados ideais de conduta, os homens perguntam – com tanto mais frequência,
quanto mais críticos – ‘porquê?’”.
Deste modo, ao filósofo da moral cabe a tarefa de se posicionar de maneira
definida com relação à exigência de apresentar as razões para que determinados
princípios ou formas de conduta possam ser aceitos e seguidos por todos os seres
racionais.
No cenário filosófico contemporâneo as múltiplas perspectivas ou tentativas de
resposta ao problema de se conceber e justificar um princípio para a moralidade su-
gerem de modo indireto que isso é quase impossível ou que, no melhor dos casos,
teremos apenas tentativas menos problemáticas que outras ou, como afirma Tu-
gendhat em suas Vorlesungen über Ethik, respostas mais plausíveis ou menos plau-
síveis (1993, p. 30)1. De um lado este incessante recomeçar ou reelaborar no plano
de fundamentação da moral fortalece o caráter eminentemente crítico da filosofia
da moral e propicia um aprimoramento dos argumentos, o que resulta num perma-
nente desenvolvimento da própria ética. Por outro lado, a pluralidade de perspecti-
vas sinaliza indiretamente uma crise de orientação que, pode até mesmo reforçar a
justificação de uma postura de ceticismo ou relativismo ético2.

190
aprimore-se

As propostas de Hans Jonas, que defende uma ética da responsabilidade, e de


Karl-Otto Apel, que procura defender igualmente uma idéia de responsabilidade a
partir de sua ética do discurso, apresentam-se, neste debate, como possibilidades
para um posicionamento ante à pergunta “o que eu devo fazer?”. Ambos situam-
-se diante do problema da civilização contemporânea, marcada desde o início do
século passado por guerras e pela escalada nuclear, pela crescente crise ecológica,
como preço da civilização industrial, enfim pelo predomínio de uma racionalidade
cientificista que, de certa forma, procura reduzir problemas morais à questões rela-
cionadas à subjetividade, ou a questões de preferências pessoais ou emocionais e,
portanto, irracionais.
Enquanto Jonas oferece um tratamento para a questão que parte do descompas-
so entre as éticas da tradição e os desafios totalmente novos de nossa época, apre-
sentando a responsabilidade como dever fundamental do ser humano, sobretudo
para com as gerações futuras, Apel privilegia o enfrentamento do problema de uma
fundamentação última de princípios e normas morais. Segundo Apel o conflito fun-
damental de nossa época é que ela está marcada simultaneamente pela necessida-
de de uma ética universal e a aparente impossibilidade de se estabelecê-la. Partindo
desta consideração ele reflete sobre a ética do discurso como possibilidade de saída
para tal impasse. De modo sucinto: ambos partem de uma preocupação comum e
pretendem oferecer um princípio, porém com uma substancial diferença no que se
refere à justificação de suas propostas.
Fonte: Santos (2010, p. 140-141).

191
eu recomendo!

livro

Nos Labirintos da moral


Autores: Mario Sergio Cortella e Yves de La Taille.
Editora: 7 Mares.
Ano: 2017.
Sinopse: que época poderia ser mais propícia do que nossa rea-
lidade para a discussão do que é moral, do que se entende por
ética? Com diferentes percursos profissionais, os autores apre-
sentam um debate palpitante acerca de várias questões de nosso cotidiano. Por
exemplo, eles começam indagando até que ponto, quando se ouvem comentá-
rios acerca do comportamento dos jovens, queremos nos referir a um conflito
moral da sociedade ou, na verdade, queremos, apenas, resolver um problema de
conduta. O que é honra? E que tipo de pais e professores se tornaram os jovens
rebeldes dos anos 1960? Como o tema é muito rico, as reflexões desses impor-
tantes pensadores de nosso tempo se relacionam com diferentes realidades: é
recorrente a questão da educação – tanto escolar como familiar –, mas também
é abordado o que ocorre no mundo do trabalho, nas relações sociais (quem é o
outro: um de nós ou um estranho?). Essa edição ampliada traz dois novos textos:
no primeiro, Yves de La Taille comenta, retrospectivamente, a publicação original,
a de 2005. Na sequência, Mario Sergio Cortella busca iluminar caminhos para que
possamos pensar melhor a formação de crianças e jovens hoje. Com suas expe-
riências e culturas, os autores mostram que as reflexões desse livro continuam
muito atuais e necessárias.

192
anotações



































5
POLÍTICA E
SOCIEDADE

PROFESSOR
Me. Rubem Almeida Mariano

PLANO DE ESTUDO
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • O porquê da política hoje • As
teorias políticas clássicas: da Grécia à atualidade • Política e as teorias liberais • Política e as teorias
socialistas • Política, direitos humanos e políticas públicas.

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Apontar a importância da política hoje • Expor filosoficamente as ideias e as teorias políticas • Listar as
características fundamentais do pensamento político do liberalismo • Identificar as características fun-
damentais do pensamento político do socialismo • Analisar as implicações político-sociais da relação
entre as políticas públicas e os direitos humanos.
INTRODUÇÃO

As afirmações de Aristóteles sobre o que caracteriza o ser humano, de for-


ma distintiva, ecoam, ainda, hoje, como referência nos estudos sobre o ser
humano ser um animal racional, político, social e ético; e essas afirmações
continuam sendo válidas e necessárias. No quesito, especificamente, políti-
co, a História nos brinda com eventos que demonstram essa característica,
em especial, no mundo grego e romano e, depois, na Europa e na América,
de ontem e de hoje. Contudo, sem dúvida, a política é uma atividade impor-
tante para a sobrevivência do homo sapiens, nas sociedades organizadas
sob o manto da racionalidade filosófica e científica.
O ser humano demonstra saber enfrentar uma das maiores tarefas que
se lhe impõe como ser social, ao construir diversas concepções e teorias
políticas, as quais abordaremos a seguir, ou seja, saber conviver na socie-
dade com um outro ser humano, tarefa difícil, mas necessária para o bem
comum e a própria sobrevivência da nossa espécie. Por isso, caro(a) alu-
no(a), nesta unidade, temos a pretensão de atingir os seguintes objetivos:
apontar a importância da política hoje; expor filosoficamente as ideias e
as teorias políticas; listar as características fundamentais do pensamento
político do liberalismo; identificar as características fundamentais do pen-
samento político do socialismo; analisar as implicações político-sociais da
relação entre as políticas públicas e os direitos humanos.
Nesse sentido, caro(a) aluno(a), nesta Unidade 5, trataremos as seguin-
tes aulas: o porquê da política hoje; as teorias políticas clássicas: da Grécia
à atualidade; política e as teorias liberais; política e as teorias socialistas; e
política, direitos humanos e políticas públicas. Por fim, espero, caríssimo(a),
que os temas escolhidos contribuam para a sua formação acadêmica e o
qualifique, cada dia mais, no entendimento do seu papel político como
profissional do serviço social e ser humano, na concepção aristotélica, de
animal racional, político, social e ético no espaço público.
1
O PORQUÊ
UNIDADE 5

DA POLÍTICA
hoje

Nesta aula, diferentemente das outras, as quais exporemos uma lista, de certa
forma, considerável de razões ou motivos sobre o objeto a ser abordado, quere-
mos ressaltar e destacar algumas ideias principais sobre a importância da política
para uma sociedade democrática, a partir do filósofo Aristóteles, uma vez que,
nas próximas aulas, haverá tempo e espaço para apresentar outros pensadores
sobre esse mesmo tema. Antes, porém, de dar continuidade, caríssimo(a), abor-
daremos um outro tema importantíssimo para o pensamento crítico: o óbvio.
Isso mesmo! Sobre aquilo que é evidente, inquestionável e irrefutável. Contudo,
quando se estuda esse tema – o óbvio –, é necessário fazer algumas considerações
imprescindíveis, neste momento.
Dessa forma, iniciaremos, dando um brevíssimo passeio sobre os sentidos da
palavra “óbvio”, conforme Dicio ([2020], on-line)17. A origem etimológica desta
palavra vem do latim obvius e é empregada, morfologicamente, como substan-
tivo ou adjetivo: como substantivo masculino óbvio é “o que é evidente”. Veja
esse exemplo singular de Albert Einstein: “Tornou-se chocantemente óbvio que
a nossa tecnologia excedeu a nossa humanidade”. Isso quer dizer que o óbvio
está associado aquilo que é incontestável como se tivesse vendo, absolutamente,
tudo a olho nu; observa-se que o óbvio se apresenta e se coloca não em todo o
tempo, mas pode surge em um dado momento da nossa percepção, ou seja, nem
sempre ele se dá desde o primeiro momento que olhamos ou pensamos sobre
determinada situação. Estarrecedor! Possivelmente.
196
Nessa direção, o óbvio sempre chama a atenção acentuadamente quando ele se re-

UNICESUMAR
vela e se apresenta de forma impositiva, taxativa ou inquestionável, como se o mesmo
fosse um verdadeiro insight (clareza súbita na mente, no intelecto de um indivíduo)
na concepção psicanalítica (teoria fundada por Sigmund Freud, que advogava que o
processo de entendimento da vida consciente se dá quando a consciência apreende
verdades ocultas do mundo inconsciente da própria pessoa). Como adjetivo, óbvio
significa que “cujo teor é de fácil entendimento; que salta aos olhos; claro e evidente.
Que não é suscetível de dúvidas; em que não há incerteza; evidente ou incontestável”.
Neste último sentido da palavra óbvio, ou seja,“ser algo evidente”, Descartes, o pai
da Filosofia Moderna, teve como um dos grandes objetivos do seu pensamento ra-
cionalista ter a mais absoluta certeza sobre o que é o óbvio. Todavia o filósofo nunca
considerou essa tarefa como sendo algo de fácil realização, pois, para ele, a existência
da verdade só seria possível por meio da exposição das condições necessárias que
legitimaram o ser das coisas, ou seja, a verdade está na demonstração da sua mais
pura evidência; logo, Descartes acreditava que a verdade só seria possível quando
ela se apresentasse de tal forma, isto é, em hipótese alguma, poderia ser contestada
ou questionada nos seus fundamentos, mas expressa única e exclusivamente na-
quilo que ela é. Por isso, Descartes chegou à conclusão que, somente, o pensamento
é a única coisa que não se pode negada, sendo assim afirmou: “Penso, logo existo”
(DESCARTES, 2001).
Do ponto de vista filosófico, porém, em especial, o óbvio nem sempre é tão ulu-
lante, pois o que, para um filósofo, estava dado como certo e definitivo, para outro,
não era assim, ou seja, a partir de novas elaborações, este filósofo (que discordava
do outro sobre algo ser certo e definitivo) via o óbvio como um novo elemento,
totalmente, diferente do outro filósofo, ou, até mesmo, construía teorias e metodo-
logias contrárias às afirmações que havia se constituído como verdades absolutas
e inquestionáveis, como são os casos entre Platão e Aristóteles; Estoicismo e Epi-
curismo; Descartes e Locke; e um dos casos mais emblemáticos: entre o mestre e
seu discípulo, ou seja, os filósofos Hegel e Marx, respectivamente, que produziram
epistemologias divergentes com o idealismo e o materialismo alemães.
Explicaremos melhor, acompanhe, caro(a) aluno(a), o seguinte raciocínio:
quando temos dois seres humanos, indivíduos, tratando sobre qualquer assunto
em questão, um deles, ao olhar de um determinado ponto de vista (lugar, seja este
físico ou não. Se for físico, de cima de uma mesa, a partir de uma cidade do interior,
ou, se não for físico, de uma determinada classe social, religião, estilo de vida, pers-
pectiva, cenário, realidade, experiência etc.), afirma, de uma determinada maneira,
197
que uma coisa pode ser assim ou assada; porém, o outro pode diferir dessa opinião.
UNIDADE 5

Por que isso ocorre? Possivelmente, o óbvio que é visto por um e não por outro se
deva porque ambos estão olhando um mesmo objeto a partir de lugares diferentes.
Explicando melhor: isso ocorre, caríssimo(a), por causa da “posição”, do lugar,
que o ser humano se coloca, o chamado “ponto de vista”, ou seja, o que é visto é visto
sempre a partir de um determinado ponto (lugar); dessa maneira, o que é dito, afir-
mado, discutido ou defendido por uma determinada pessoa pode não ser vista e,
assim, defendida por uma outra, pois esta se coloca, por sua vez, em uma “posição”
(lugar) diferente; dessa maneira, esta última pode não considerar óbvio aquilo que é
tido como verdade absoluta pela primeira pessoa. Devido à divergência de pontos de
vista é que surgiram a necessidade de construir as condições políticas e sociais para
a convivência social entre as pessoas e a importância da elaboração e da aplicação
das leis, das normas, da ética, da moral, dos padrões linguísticos e da política.
Esta última, portanto, é um bem necessário e fundamental para esta sociedade,
a qual vivemos. Por exemplo, se afirmarmos que “a política, no seu sentido mais
amplo, é a única saída para o ser humano conviver em sociedade”. Sabe o que você
pode fazer? Dar aquela olhada nessa afirmação acima, afasta-se da tela do seu note
ou computador, encosta-se na sua cadeira ou poltrona e abrir aquele grande, largo e
questionador sorriso e dizer consigo: “esse professor deve está de brincadeira comigo
– a política, a única saída para a sociedade brasileira – trabalhar sim, essa é a saída!
Esse aí deve ser um daqueles doutrinadores fanáticos, tentando doutrinar pessoas
com seus pensamentos envelhecidos”.
Primeiramente, caríssimo(a), respeito a sua posição e concordo, em parte, que o
trabalho sempre é a saída de uma sociedade como a nossa, pois é ele que produz, de
fato, a nossa riqueza. Mas não acredito que você pense que não seja importantíssimo
buscar a convivência social, pois, para se poder trabalhar, a convivência é funda-
mental. Quero lembrá-lo que essa minha afirmação tem o objetivo de fazer única
referência à forma e não ao conteúdo, isto é, não estou defendendo uma política par-
tidária A ou B ou C, aqui; mas estou afirmando, categoricamente, que necessitamos
de ter uma forma(s), maneira(s) ou modo(s) que possibilita(m) a convivência social,
pois, sem a qual, não teremos sequer a possibilidade de produzir, pois muito do que
fazemos por meio do trabalho é de forma coletiva, em grupo, dupla, turma ou equipe.
Compreendo que o ser humano, definitivamente, não se basta assim mesmo. Agora,
a verdade tem que ser dita que essa(s) forma(s), maneira(s) ou modo(s), pode(m)
até vir dos céus, como um milagre, mas ela(s) terá(ão) de passar, necessariamente,
pela política, seja ela partidária ou não.
198
No Brasil, as leis e normas sociais são feitas e aprovadas nos parlamentos mu-

UNICESUMAR
nicipais, estaduais e federais, a partir dos conflitos sociais que surgem e se estabe-
lecem dentre os mais diversos grupos, segmentos e movimentos sociais, os quais,
também, buscam o seu espaço na determinação da forma de ser do Estado, ou seja,
como indutor da convivência social entre seus habitantes. Desse modo, seja qual for
a forma encontrada para promover a convivência social, esta sempre se dará por
meio do fazer político; quer partidário, institucional, dos movimentos sociais ou,
até mesmo, dos anseios individuais. Assim, pode ser que a convivência social não
se faça, necessariamente, por meio desses meios organizados coletivamente, mas,
sim, a partir de interesses individuais, como bem ressaltava Weber (1999) ao tratar
dos anseios coletivos, que não, necessariamente, expressam-se por meio de ações
sociais e políticas organizadas sistematicamente, por exemplo, o momento do voto
nos sistemas democráticos.
Portanto, caríssimo(a), o que “liga”, dá “sentido” ou “possibilita” a convivência
social, em uma sociedade democrática de direito, como a nossa, é a construção e a
constituição, por meio da cena do espaço público, no qual forças e interesses sociais
atuam e se expressam na ocupação política dos três poderes do Estado brasileiro
(legislativo, executivo e judiciário), que se inter-relacionam, de forma independente
e harmônica. Sendo assim, a política não se reduz, em absoluto, à política partidá-
ria, esta, porém, necessariamente, expressa aquela bem como as outras instituições
presentes na sociedade, como os meios de comunicação, as forças produtivas do
capital, do trabalho e do poder simbólico, como as religiões, as forças armadas, os
movimentos sociais e os mais diversos indivíduos que se fazem presentes na socie-
dade (MARIANO, 2007). Dessa maneira, aquilo que é ou pode parecer óbvio para
um, pode não ser ou não parecer para outro e assim vice-versa; por isso, a tarefa da
filosofia é, mediante o conhecimento racional, buscar entendimentos, por mais con-
flituosos que sejam ou pareçam em uma determinada situação, e utilizar a reflexão
filosófica crítica para construir saídas e condições para a convivência social entre
as pessoas e seus interesses, em sociedade.
É importante ressaltar que, do ponto de vista filosófico, cada pessoa e certamen-
te você, desenvolve as condições e a capacidade de pensar por si só (ler e analisar,
atentamente, tudo que lhe for apresentado pela sua própria condição intelectual, me-
diante o exercício da reflexão crítica). Por isso, é importante que você se atente que,
na sociedade em que vivemos, ou seja, a do conhecimento, a conquista das mentes e
das consciências das pessoas é o grande objetivo para se fazer delas correligionárias
ou adeptas a uma determinada forma de pensar ou agir sobre qualquer tema que
199
esteja relacionado, por exemplo, à economia, política, comportamento social ou à
UNIDADE 5

prática religiosa. Esse domínio é, portanto, a “alma do negócio”, principalmente, em


uma sociedade democrática, que visa conquistar, convencer, persuadir, ou seja, no
fazer político (MARIANO, 2007).
Nesse sentido, é importante destacar, ainda, que, quando uma pessoa pensa de
uma determinada maneira, seja ela qual for, ela está pensando politicamente, ou
seja, ela está pensando de uma das várias concepções que existem, o que estamos
querendo dizer, portanto, que, em uma sociedade democrática de direito, o princípio
fundamental é haver concepções ou olhares diferentes. Essa realidade é própria da
organização democrática, a qual tem, no respeito às diferenças existentes, a motiva-
ção do sistema democrático, que, no limite, deve sempre haver a busca pela preser-
vação da convivência social entre os que pensam e vivem diferentemente, mas que
vivem (necessitam um dos outros, em uma complexa rede de interdependência)
em um mesmo espaço, bairro, cidade, estado, região, país, continente ou planeta
(MARIANO, 2007).
A palavra política vem do grego ta politika, e esta, por sua vez, provém de pólis,
conforme já vimos, que quer dizer cidade, lugar de convivência organizada e cons-
tituída pelos que vivem na cidade. Dessa forma, surgiram os termos “cidadãos” ou
politikos, isto é, pessoas que nascem “dentro” cidade. Para os gregos, nascer na cidade
é ser livre e igual. Ter direitos inquestionáveis, como a isonomia (igualdade perante
a lei) e a isegoria (o direito de expor e discutir, em público, suas opiniões e ações).
Civitas, por seu turno, é a tradução latina de pólis, a cidade como “ente público” e
coletivo. Res publica, ainda, é a tradução latina para ta politika, que significa: os
negócios públicos dirigidos pelo populus romanus, isto é, os cidadãos livres e iguais,
nascidos em Roma (CHAUÍ, 2015).
Nesse sentido, a política (tanto para gregos quanto para romanos) é quando os
próprios cidadãos dão direção aos seus próprios negócios no espaço público e não,
simplesmente, são determinados pelo tirano, soberano, monarca, rei, senhor. Logo,
a política é para a sociedade como o oxigênio é para o corpo humano. Um dos mais
eminentes filósofos que tratou sobre o tema da política, em uma sociedade demo-
crática, foi Aristóteles, porém não há, somente, ele dentre os clássicos, mas foi um
dedicado estudioso sobre a questão da política. Por isso, a seguir, caro(a) aluno(a),
estudaremos algumas de suas ideias sobre a política como forma de expor as razões
da importância desta para uma sociedade como a nossa hoje.
Aristóteles, em seu livro “Ética a Nicômaco” (2000), o qual dedicou o título ao
nome do seu pai, Nicômaco, aborda suas preocupações sobre a necessidade de uma
200
educação racional, que leve as pessoas a refletirem sobre as suas ações e que tenham

UNICESUMAR
a razão acima de suas paixões para se estabelecer a convivência social, na qual haja
uma vida feliz, individual e coletiva. Esse intendo é feito por Aristóteles, a partir de
sua concepção sobre o ser humano como ser social, que, necessariamente, precisa
ter seus comportamentos voltados, única e exclusivamente, para o bem comum,
uma vez que, naturalmente, o ser humano precisa conviver com outros como, única
e exclusivamente, forma de preservação da própria vida humana. Portanto, para o
filósofo, cabe à política a tarefa de constituir todas as condições para que ocorra a
tão esperada convivência social e, com ela, necessariamente, a felicidade individual
e coletiva; contudo, para Aristóteles, o fim último da sociedade democrática, a qual,
também, repousa na finalística do bem comum, só é possível se houver a prática da
política como atitude de todos que vivem na sociedade, valorizando e preservando a
própria constituição e condição da sociedade, da pólis, da cidade, como espaço vital
de convivência (existência do coletivo, de todos), uma vez que o ser humano é um
animal social e, também, político. Assim, Aristóteles (1998, p. 7) argumenta sobre
a importância da cidade, da sociedade, como sendo o bem supremo, na qual todos
devem, necessariamente, buscar o bem comum como fim último da preservação
da humanidade:


Vemos que toda a cidade é uma espécie de comunidade, e toda co-
munidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de
todos os homens são praticadas com vistas ao que lhes parece um
bem; se todas as comunidades visam a algum bem, é evidente que
a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras visa
ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade, isto é, a
comunidade política.

Nesse sentido, cabe a todos, que vivem em sociedade, buscar preservá-la como bem
de todos os bens, isto é, os quais só são possíveis serem usufruídos se houver a va-
lorização da própria sociedade como bem maior e supremo, uma vez que todas as
coisas têm uma finalidade e todos os que vivem em sociedade têm suas ações que,
necessariamente, devem cooperar para a manutenção da cidade, da sociedade, ou
seja, do espaço público que se vive, a cidade. Por isso, Aristóteles (1998) entende que,
assim como há muitas ações, artes e ciências (profissões), em uma sociedade, que
buscam realizar o seu determinado fim, sem, contudo, perder o sentido maior para
onde todos devem convergir, que é para o bem maior, para o filósofo, a sociedade,
201
cabe à política, como um traço natural do ser humano, conduzir as ações, as artes e
UNIDADE 5

as ciências para um único fim por meio do bem comum, que é a convivência social
para a felicidade individual e coletiva.
Dessa maneira, o filósofo aborda a política como sendo de natureza da pólis, da
cidade, que tem o bem humano, como finalidade, e o bem do Estado, como bens
maiores (em que prevalece o Estado em relação ao indivíduo, como forma de pre-
servar, fundamentalmente, o ser humano em todas as suas dimensões), os quais têm,
como finalidade, por sua vez, a preservação das condições da vida humana para a
sua felicidade individual e coletiva:


Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é ela que determina
quais as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais são as
que cada cidadão deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as
faculdades tidas em maior apreço, como a estratégia, a economia e
a retórica, estão sujeitas a ela. Ora, como a política utiliza as demais
ciências e, por outro lado, legisla sobre o que devemos e o que não
devemos fazer, a finalidade dessa ciência deve abranger as das ou-
tras, de modo que essa finalidade será o bem humano. Com efeito,
ainda que tal fim seja o mesmo tanto para o indivíduo como para o
Estado, o deste último parece ser algo maior e mais completo, quer
a atingir, quer a preservar. Embora valha bem a pena atingir esse
fim para um indivíduo só, é mais belo e mais divino alcançá-lo para
uma nação ou para as cidades-estados (ARISTÓTELES, 1998, p. 3).

Portanto, caríssimo(a), espero que tenha entendido que a política é uma atividade hu-
mana necessária e indissociável da sociedade democrática, pois, segundo Aristóteles,
esse modo de viver, em sociedade, só é possível quando todos estão convencidos de
que devem buscar o bem comum, para que todos sejam felizes, no sentido de preser-
vação da própria sociedade, que deve ser lida como a preservação da espécie humana.
Nessa direção, por fim, a felicidade precisa, necessariamente, de condições para se
estabelecer e se tornar uma realidade. Portanto, a nossa Constituição (BRASIL, 1988,
p. 25) afirma, no Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo II, Dos
Direitos Sociais, no Art. 6º, que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimen-
tação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social,
a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição”. Para finalizar, caríssimo(a), afirmaremos que é óbvio, portanto,
que a política é o único meio que se coloca como necessário, em uma sociedade de-
202
mocrática, para que as condições de uma vida digna e feliz, no sentido aristotélico,

UNICESUMAR
seja cumprida e garantida, individual e coletivamente, a todos os cidadãos e cidadãs
indistintamente.

2
AS TEORIAS POLÍTICAS
CLÁSSICAS:
da grécia à modernidade

Caríssimo(a), nesta aula, estudaremos, de forma elementar, algumas das princi-


pais teorias clássicas da política. Algumas porque, na realidade, a área da filosofia
política não é tão simples quanto se parece. A apresentação, em linhas gerais, que
se segue, não pode esconder a diversidade considerável de estudos e discussões
que existem sobre as diversas concepções políticas, bem como um sem-número
de discussões existentes no próprio interior de uma mesma concepção política
com as suas respectivas nuances. Tal observação é propícia para quem pretende
ter um maior aprofundamento e entendimento sobre esse tema, contudo, aqui,
não se tem essa pretensão e espaço para tal empreitada.
Antes de avançar em nossos estudos, precisaremos a origem e significado da
palavra “política”. Essa palavra vem do grego pólis (cidade-estado) e designa o
campo de atividade humana que se refere à cidade, ao Estado, à administração
pública e ao conjunto dos cidadãos e cidadãs, conforme nos informa Cotrim
(2006). Nesse sentido, para uma melhor precisão do uso da palavra “política” e
203
seus respectivos sentidos e significados utilizados na atualidade, Chauí (2015, p.
UNIDADE 5

476) faz uma apresentação em que distingui o significado da palavra política em


relação ao uso generalizado e vago bem como em relação ao uso mais específico
e preciso, vejamos:


1. O significado de governo, entendido como direção e adminis-
tração do poder público, sob a forma do Estado. O senso comum
social tende a identificar governo e Estado, mas governo e Estado
são diferentes, pois o primeiro diz respeito a programas e projetos
que uma parte da sociedade propõe para o todo que a compõe,
enquanto o segundo é formado por um conjunto de instituições
permanentes que permitem a ação dos governos [...].

2. O significado de atividade realizada por especialistas – os ad-


ministradores – e profissionais – os políticos -, pertencentes a um
certo tipo de organização sociopolítica – os partidos -, que dispu-
tam o direito de governar, ocupando cargos e postos no Estado.
Neste segundo sentido, a política aparece como algo distante da
sociedade, uma vez que é atividade de especialistas e profissionais
que se ocupam exclusivamente com o Estado e o poder. A política é
feita “por eles” e não “por nós”, ainda que “eles” se apresentem como
representantes “nossos”.

3. O significado, derivado do segundo sentido, de conduta duvido-


sa, não muito confiável, um tanto secreta, cheia de interesses par-
ticulares dissimulados e frequentemente contrários aos interesses
gerais da sociedade e obtidos por meios ilícitos ou ilegítimos. Este
terceiro significado é o mais corrente para o senso comum social
e resulta numa visão pejorativa da política. Esta aparece como um
poder distante de nós (passa-se no governo ou no Estado), exercido
por pessoas diferentes de nós (os administradores e profissionais da
política), através de práticas secretas que beneficiam quem as exerce
e prejudicam o restante da sociedade [...].

A partir da exposição da referida filósofa, estudaremos, caríssimo(a), por sua vez,


o sentido filosófico e teórico que pode reger os governos ou o Estado bem como
as formas e organizações dos destes, por exemplo, a cidade ser governada por um

204
soberano ou um único líder ou, ainda, por um grupo restrito de entendidos ou, até

UNICESUMAR
mesmo, pelo povo, de forma direta ou participativa, ou, ainda, e por fim, por meio
de seus representantes, como acontece, em nosso país, quando elegemos vereadores,
deputados estaduais e federais para as respectivas câmaras, municipal, estadual e
federal. Nesse sentido, caríssimo(a), estudaremos, de forma panorâmica, alguns dos
pensadores que contribuíram ou foram referências quando elaboraram filosofias ou
teorias a respeito do tema da política ou do modo de como se deveria organizar a
sociedade em que estes se encontravam inseridos, como são os casos dos pensado-
res: Platão (427-347 a.C.) (do período clássico, uma vez que já estudamos algumas
das ideias de Aristóteles); alguns dos filósofos, teólogos e pensadores medievais,
principalmente, Agostinho (354-430 d.C.), Dante Alighieri (1265-1321 d.C.) e Mar-
sílio de Pádua (1275-1342 d.C.); no Renascimento, com Maquiavel (1469-1527
d.C.); no início da modernidade, com os contratualistas, Thomas Hobbes (1588-
1679 d.C.), John Locke (1632-1704 d.C.) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778 d.C.).

Platão (427-347 a.C.)

Caro(a) aluno(a), você se lembra da afirmação que fizemos anteriormente: “todo


ponto de vista é a vista de um ponto”? Assim, para iniciar a apresentação objetiva
das ideias de Platão sobre política, é necessário apontar o lugar de onde ele a vê
e fala. Assim senso, Platão é do meio da aristocracia. Segundo Dicio ([2020],
on-line)18, a aristocracia é uma “organização sociopolítica que, se baseando nos
privilégios de uma classe social, é composta por pessoas nobres que monopolizam
o poder, normalmente, garantido por herança”. Dessa forma, pode-se entender
que as críticas que Platão faz à Democracia, no seu entendimento, mataram seu
mestre, Sócrates. Logo, também, ele compreendia que o governar, dar rumo, dire-
cionar a política da pólis deveria estar nas mãos das pessoas mais bem preparadas.
Em sua obra,“A República”, um brilhante texto literário que ilustra a cidade, Platão
(2008) compreendia, que havia três classes distintas na sociedade; o filósofo leva-
va em consideração a capacidade intelectual de cada indivíduo, ou seja, a primeira
classe refere-se, de forma geral, aos lavradores, artífices e comerciantes, que deve-
riam cuidar da produção e distribuição dos bens e gêneros para a comunidade; a
segunda classe refere-se aos soldados, que deveriam cuidar da defesa da cidade; e
a terceira classe, a classe superior, refere-se aos sábios ou intelectuais, amigos da

205
sabedoria, que, com poder político, deveriam sair do meio dos filósofos. Portanto,
UNIDADE 5

a concepção de política de Platão é que há os escolhidos naturalmente, que advém


da aristocracia, e aqueles que, por meio do uso da força física, devem executar o
que é determinado pela aristocracia ou sábios; enquanto, por fim, cabe aos sábios
a tarefa de apresentar os melhores rumos de direção dos destinos comuns para
todos na cidade (ARANHA; MARTINS, 2005).
No período medieval, uma concepção de pensamento único varreu, inicial-
mente, aquele tempo: o poder pertencia a Igreja de Cristo, senhora absoluta e
representante de Deus na terra. Assim, cabia à Igreja os rumos (política) da vida:
decidir o que era o bem e o mal, o certo e o errado, a verdade e a mentira; quem
deveria estar ou não no poder temporal. Desse modo, à Igreja cabia o poder atem-
poral, enquanto aos homens, o poder passageiro e efêmero, como afirmavam as
ideias platônicas, no início do Período Medieval. Contudo todo esse período não
foi, em absoluto, tomado pelo poder da Igreja, mas, ao final, ou mesmo durante,
outros pensadores advogavam ideias distintas, como veremos, conforme nos
informam Aranha e Martins (2005).
Agostinho (354-430 d.C.): logo no início da Era Medieval, Agostinho afir-
mava, categoricamente, que todo o poder vem de Deus e deve ser compreendido
como bom e justo a todos aqueles que o seguem e são batizados em nome de
Deus, pai de Jesus Cristo. Dessa maneira, o pensamento do poder atemporal da
Igreja se estabeleceu e foi determinante na ação desta, como entidade de poder
político, no mundo temporal, o qual era passageiro; por isso todos deveriam
seguir, absolutamente, as ordens vindas da Igreja. Então, o poder político ficou
atrelado à ordem e aos ditames da moral cristã a todos que viviam na sociedade
medieval. Contudo, aqui e acolá, durante esse período, haveria conflitos entre os
defensores do poder papal e os defensores dos nobres e dos reis.
Dante Alighieri (1265-1321 d.C.): Alighieri foi um dessas pessoas que di-
vergiu, profundamente, da Igreja. Escreveu um livro chamado a “Divina Comé-
dia”, no qual apresenta sua concepção de autonomia e defesa do poder temporal
autônomo da Igreja. Essa forma de pensar a política difere, significativamente,
da ideia majoritária existente.
Marsílio de Pádua (1275-1342 d.C.): assim como um movimento, ainda,
nessa mesma época, Pádua recusava a autoridade da igreja sobre a determinação
da vida pública e privada, à luz da religiosidade cristã, bem como já defendia os
primeiros rudimentos do pensamento republicano que, paulatinamente, já esbo-
çava algumas manifestações como o poder advir da vontade do povo. Segundo
206
Aranha e Martins (2005, p. 301-302), Pádua afirmou que “sob uma máscara de

UNICESUMAR
honestidade e de decência, o papado é tão perigoso para o gênero humano que
causaria, senão detiveram, um prejuízo intolerável à civilização e à pátria”.
No Período do Renascimento e da Idade Moderna, quando contemporâneos,
de então, voltaram o seu olhar para a Grécia Antiga, a partir das novas descobertas
e dos novos escritos da tradição grega e romana, por exemplo, com a finalidade de
lançar luzes para os novos tempos que estavam se descortinando ou emergindo
com novos valores, em que se destacam os valores humanísticos e científicos,
diante de um contexto de desenvolvimento das cidades, da ascensão da burguesia
comercial e do fortalecimento das monarquias nacionais, esse contexto, por sua
vez, dinamicamente, era constituinte e constituído, ao mesmo tempo, pelos novos
ventos, pensamentos e entendimentos de sociedade surgiam alimentando a nova
realidade que ia se fazendo a cada momento. Como expressão desse momento
fértil e dinâmico, temos pensadores que assinalaram ideias como manifestação
de anseios de todo um tempo como, também, eles mesmos foram influenciadores
do seu próprio tempo com suas ideias, como é caso do ilustre filósofo Maquiavel
(1469-1527 d.C.), no Renascimento, considerado um dos principais filósofos
da ciência política; na modernidade, temos os filósofos contratualistas: Thomas
Hobbes (1588-1679 d.C.), John Locke (1632-1704 d.C.) e Jean-Jacques Rousseau
(1712-1778 d.C.).
Maquiavel (1469-1527 d.C.): não é por um mero acaso que este filósofo é
considerado um dos principais filósofos da ciência política. Enquanto os Períodos
Clássico e Medieval compreendiam a política a partir da normatização, ou seja,
a idealização do bom governo, seja ele cristão ou não, Maquiavel, por meio do
seu olhar (relatado em sua obra “O Príncipe”) voltado para a realidade, elaborou
ideias como se deveria fazer política para se conquistar o poder e não perdê-lo;
assim, a partir desse olhar fixo em direção do mundo vivido e não do mundo das
ideias desejadas, Maquiavel olhava a política como ela, de fato, era, mediante as
relações que se davam entre as pessoas, suas posições, seus interesses e da relação,
principalmente, do monarca com seus súditos e seus respectivos climas de con-
flitos e instabilidades, que assolavam a Itália, na época de então, sob a expectativa
de unificação, marcadas pelas lutas internas e externas (ARANHA; MARTINS,
2005). Nesse sentido, a obra principal desse filósofo, “O Príncipe”, é, sem dúvida
nenhuma, o coroamento e a passagem de uma forma de ver a política, isto é, vê-la
não mais de forma idealizada, para atingir e interferir uma determinada realidade,
mas, sim, como a partir daquilo que os seres humanos fazem para conquistar e
207
manter-se no poder político. Nesse sentido e a partir desse contexto, Maquiavel
UNIDADE 5

elaborou verdadeiras pérolas de entendimento sobre a polícia como:


1. Sobre a violência, afirma que não é ela que restaura, mas é a violência que
pode destruir o que é preciso condenar.
2. Cabe ao príncipe, a partir da realidade concreta e não a partir de ideias
abstratas e utópicas, ter os olhos fixos na realidade para identificar as
forças em conflito a fim de agir com eficácia.
3. Na ação política, os valores morais não devem estar acima dos valores
políticos, uma vez que esses últimos são mais amplos e envolvem o des-
tino dos cidadãos na sociedade, bem como os valores coletivos diferem
dos valores individuais ou privados, o que, justamente, era propalado nos
Períodos anteriores, o Clássico e o Medieval.
4. Em relação às célebres expressões “maquiavelismo” e “os fins justificam
os meios”, que são vistas com tom pejorativo, sobre as atitudes do rei, são,
muitas vezes, interpretadas fora do contexto em que viveu nosso filósofo.
Essas interpretações, frequentemente, têm produzido diversos entendi-
mentos que escondem os verdadeiros significados daquele momento, ou
seja, o nascimento de uma nova ordem de governar que se deslocava do
mundo privado (Igreja) para o espaço público (república) e da ordem
moral privada (de um determinado segmento ou grupo) para a ordem
moral pública (o respeito de todos para com todos), para dar conta de
um novo tempo que se apresentava diverso e que possibilitava riquezas
e condições para qualificar e melhorar a vida social daqueles que viviam
os novos tempos que estavam se constituindo na Europa. Ainda, é im-
portante lembrar, caríssimo(a), que este período, entre o Renascimento,
a Modernidade e o Período das Luzes, de alguma forma, são momentos
que guardam significativa importância para o nosso entendimento dos
nossos estudos realizados, não somente o que já se foi tido até aqui, mas
também o que apresentaremos, ainda, sobre os nossos três outros filósofos
contratualistas ou, até mesmo, sobre as teorias clássicas do liberalismo,
socialismo e neoliberalismo que abordaremos nas próximas aulas desta
unidade. Assim, quem faz uma excelente síntese do momento e das pers-
pectivas que se descortinava face ao Iluminismo referente ao contexto
histórico, social e político da época é Chauí (2015, p. 57), ao dizer que:

208

• Pela razão, o homem pode conquistar a liberdade e a felicidade

UNICESUMAR
social e política (a Filosofia da Ilustração foi decisiva para as ideias
da Revolução Francesa de 1789);

• A razão é capaz de evolução e progresso, e o homem é um ser per-


fectível. A perfectibilidade consiste em liberar-se dos preconceitos
religiosos, sociais e morais, em libertar-se da superstição e do medo,
graças as conhecimento, às ciências, às artes e à moral;

• O aperfeiçoamento da razão se realiza pelo progresso das civili-


zações, que vão das mais atrasadas (também chamadas de “primi-
tivas” ou “selvagens”) às mais adiantadas e perfeitas (as da Europa
Ocidental);

• Há diferença entre Natureza e civilização, isto é, a Natureza é o


reino das relações necessárias de causa e efeito ou das leis naturais
universais e imutáveis, enquanto a civilização é o reino da liberdade
e da finalidade proposta pela vontade livre dos próprios homens,
em seu aperfeiçoamento moral, técnico e político.

Diante do exposto e a partir dessa contextualização histórica, social, política e


religiosa, observa-se o surgimento de novos entendimentos e elaborações da
ordem e da vida política. Surgem os contratualistas com as suas teorias e concep-
ções esboçados nos chamados “contratos sociais”, que guardavam as mais diversas
aspirações oriundas dos novos tempos que apontavam tanto para o desenvolvi-
mento quanto para o enfrentamento social dos conflitos, oriundos de interesses
que emergiram dos vários setores da sociedade. Dessa forma, veremos, a seguir,
os contratualistas e suas ideias no campo da política.
Thomas Hobbes (1588-1679 d.C.): Hobbes era inglês, de família pobre,
viveu das benesses da nobre, onde teve condições de se formar. De concepção
empirista, suas principais obras foram: “De Cive” e “Leviatã”, ambas apresentam as
suas ideias sobre a natureza humana, o governo e a sociedade. Sua compreensão
sobre a natureza humana se pauta e influencia na sua concepção política, pois,
para ele, a natureza humana é anárquica, em que gera insegurança, angústia e
medo entre os que convivem. Predomina-se o egoísmo. Dessa compreensão, sur-
giu-se a célebre frase: “o homem é um lobo para outro homem”. Hobbes, entendia,
por sua vez, que tal estado de coisas, todos contra todos, geraria “[...] graves e
profundos prejuízos para a indústria, agricultura, a navegação, o desenvolvimento
da ciência e conforto para todos” (ARANHA, 2012, p. 422). Diante desse estado
209
de coisas naturais do ser humano, cabe aos indivíduos, na busca da convivên-
UNIDADE 5

cia social, realizar um contra social entre todos, em que todos abririam mão de
seus direitos à liberdade e a transferiram a uma única pessoa ou a um grupo de
pessoas. Essa nova ordem deve ser celebrada como um novo pacto onde todos
passam suas vontades e desejos para alguns poucos governarem, determinando
o que, quando e como se pode fazer socialmente. Assim, a compreensão de Es-
tado de Hobbes deve ser entendido como pactuado ao soberano, isto é, quando
a sociedade outorga a uma pessoa ou a um grupo de pessoas o poder para de-
terminar as regras e as condições de vida em sociedade. Dessa forma, uma vez
concedido o poder ao Estado este não pode ser contestado, mas respeitado. Por
isso, também, que este, na concepção hobbesiana, pode utilizar do poder da força
para garantir a ordem entre aqueles que, de uma forma ou de outra, concederam
toda a autoridade ao Estado.
John Locke (1632-1704 d.C.): Locke era filósofo, médico e filho da burgue-
sia comerciante. Defensor da concepção empirista, apoiou as ideias da implanta-
ção do liberalismo do seu tempo, participando das revoluções liberais ocorridas
na Europa e nas Américas. Um dos grandes teóricos do liberalismo, em sua obra
“Dois tratados sobre o governo civil”, apresenta os fundamentos do liberalismo
nascente. Sobre a natureza humana, afirmava a necessidade de o ser humano se
unir em um contrato social para constituir a sociedade civil organizada. Ainda,
Locke sempre afirmava que os direitos naturais humanos deveriam ser obser-
vados para limitar o poder do Estado; assim, o Estado, ciente da possibilidade
das insurreições, quando ocorre de o governo trair a confiança depositada nele
mesmo, caberia, portanto, ao próprio Estado viabilizar e tutelar o livre exercício da
propriedade, da palavra e da iniciativa econômica. Nesse sentido, caberia, ainda,
ao Poder legislativo, como poder supremo, o qual todas as instituições devem
fazer referência e estarem submetidas ao que seria legislado, votado ou decidido.
É importante, ressaltar, por fim, assim como a democracia ateniense era limitante,
excluindo pessoas dela, a concepção política apresentada por Locke, também,
entendia que, somente, os que tinham fortunas podiam gozar, plenamente, da
cidadania, podendo votar e ser votado (ARANHA, 2012).
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778 d.C.): guardadas as devidas e justas
proporções, Rousseau era um crítico do absolutismo de governo. Com esse filó-
sofo é que surgiu a modalidade do contrato social da democracia direta. Quem

210
deve governar ou ter o poder político não é uma pessoa ou um grupo restrito

UNICESUMAR
de iluminados ou soberanos, mas o povo, de forma direta. Isso porque o ser
humano nasce livre e bom, contudo este, quando emerge na sociedade, que é
desigual entre ricos e pobres, poderosos e fracos, senhores e escravos, sofre as
consequências e, assim, corrompe-se. O poder, nas mãos do povo, deve ser ma-
terializado e expressado por meio de leis, e estas, como sendo a vontade geral
de todos os cidadãos e cidadãs, devem ser aprovadas e legitimadas por meio de
assembleias. Assim, as leis, quando feitas ou ratificadas pelo povo cuja soberania
é inalienável, devem, também, honrá-las e respeitá-las como sendo a elas seus
súditos (ARANHA, 2012).
Ainda, na modernidade e posteriormente na contemporaneidade, surgiram
teorias e concepções políticas como o liberalismo, socialismo e neoliberalismo,
além disso, fortaleceu-se a concepção de Estado, instituição mais forte e comple-
xa, criada e sustentada pelos mais diversos países e governos, trataremos desses
assuntos nas próximas aulas. Por ora, para concluir esta parte, é fundamental
ressaltar que a política nasce como um forma idealizada de organização social,
onde ocorrem normatizações e determinações a partir de referenciais filosóficos
específicos; contudo, ao longo dos tempos, o ser humano, como grande artífice da
política, percebe que esta é um meio necessário de organização social e que não
está associada, necessariamente, à vida privada, mas sempre deve ser considerada,
uma vez que cabe à política atender às necessidades mais elementares e básicas
do ser humano, individual e socialmente.
A partir de Maquiavel e dos novos tempos de uma nova forma de governar,
porém, estabelece-se: do privado para o público; em que os fundamentos da
política deem conta de atender ao espírito republicano, não mais do poder a
um soberano ou a um grupo de iluminados, mas construir novos sistemas po-
líticos, instituições e organizações, que possibilitem o livre exercício desse novo
homem que se faz a partir do Renascimento e que, até hoje, está em construção,
em especial, pela esfinge do Estado republicano, democrático de direito e liberal
bem como as suas mais diversas nuances, as quais se constituem verdadeiras
antíteses, como as concepções do totalitarismo, das ditaduras democráticas e do
fascismo italiano e alemão; dos sistemas de governos social-democráticos, do
socialismo, do socialismo democrático, do liberalismo democrático e totalitário,
dentre outros.

211
3
POLÍTICA E AS
UNIDADE 5

TEORIAS
liberais

Inicialmente, guardaremos este primeiro momento, nesta aula, caríssimo(a), para


definir duas palavras importantes: “teoria” e “liberal”, uma vez que ambas serão
muito utilizadas nas próximas aulas. Segundo Dicio ([2020], on-line)19, a palavra
“teoria” é um substantivo feminino, que tem a origem proveniente do latim teoria
ou pelo grego theoría, que significa:


• Conhecimento não prático, ideal, independente das aplicações.

• O que se desenvolve por suposição; de teor hipotético; conjuntura:


tenho uma teoria, mas ainda não consegui comprová-la.

• Conjunto de regras, de leis sistematicamente organizadas, que ser-


vem de base a uma ciência; essas regras.

• Conjunto sistematizado de opiniões, de ideias sobre um assunto.

• Julgamento ou opinião que se pauta nestas opiniões.

• Conhecimento geral, não específico; generalidade.

• [Popular] Coisa irrealizável; utopia ou ilusão.

• [Astronomia] Agrupamento dos elementos utilizados para medir


ou calcular os movimentos de um astro, ou planeta.

212
Nota-se, de antemão, que essa palavra é polissêmica e, por isso, inspira cuidados

UNICESUMAR
na busca de um sentido específico. Em nosso estudo, portanto, o sentido mais
aproximado que se deve entender por teoria é um conjunto sistematizado (ra-
cionalmente lógico e científico) de ideias ou leis sobre um assunto. Por Liberal,
conforme Dicio ([2020], on-line, grifo nosso)20, essa palavra pode ser empregada
como adjetivo ou substantivo:


Adjetivo:

• Não conservador; de ideias favoráveis à liberdade individual.

• Que segue o liberalismo, doutrina que defende a liberdade indivi-


dual nos âmbitos político, religioso, econômico e intelectual.

• Generoso; em que há generosidade; que não é apegado ao dinheiro.

• Tolerante; que respeita opiniões contrários ou ideias diferentes


das suas.

• [Por Extensão] Independente; que é livre; não subordinado: tra-


balhador liberal.

• [Brasil] Política. Diz-se dos partidos políticos de ideias conserva-


doras em relação às questões sociais.

Substantivo masculino e feminino:

• Pessoa de ideias liberais, favoráveis à liberdade individual.

• [Brasil] Política. Partidário de ideias contrárias às melhorias sociais.

Assim, do ponto de vista morfológico (substantivo ou adjetivo), a palavra “libe-


ral” nos remete ao seguinte sentido das ideias liberais: como um corpo de ideias
ou doutrina que defende a liberdade individual nos âmbitos político, religioso,
econômico e intelectual. Do ponto de vista histórico, o liberalismo surge, mais
especificamente, a partir das ideias dos filósofos John Locke, Montesquieu, Kant,
Humboldt, Benjamin Constant, Stuart Mill e Tocqueville, entre os séculos XVII
e XIX, e dos economistas Adam Smith e David Ricardo, no século XVIII. Desse
modo, destaquemos John Locke e Adam Smith. O primeiro, como vimos an-
teriormente, empirista, médico e filho da burguesia comerciante, defendia as

213
ideias de liberdade intelectual e o respeito à tolerância, as quais se constituem
UNIDADE 5

com algumas das principais ideias liberais, que iriam florescer, mais exatamente,
no Período Iluminista francês, ainda, no século XVII. O segundo, formado em
filosofia e economia, nascido na Escócia, mas, radicalizando, vivido na Inglaterra,
foi considerado o pai da economia moderna e um dos grandes elaboradores do
liberalismo econômico. Viveu em um cenário turbulento no século XVIII.
Segundo Cotrim (2006), inicialmente, o Estado surge para possibilitar as con-
dições de convivência social entre aqueles que vivem em uma mesma cidade ou
região. Assim, “o estado teria a função de garantir a segurança dos indivíduos
e de seus direitos naturais, como a liberdade e a propriedade, conforme expõe
Locke em sua obra ‘Segundo Tratado sobre o Governo’” (COTRIM, 2006, p. 278).
A seguir, apresentaremos algumas ideias dessa obra, “Segundo Tratado sobre
o Governo”, que revela as fontes filosóficas e teóricas do liberalismo em Locke
(1876, p. 82-94):
■ Sobre o poder político, segundo Locke, "é o direito de fazer leis, aplicando a
pena de morte ou [...] qualquer pena menos severa, a fim de regulamentar e
de preservar a propriedade, assim como de empregar a força da comunida-
de para a execução de tais leis e a defesa da república contra as depredações
do estrangeiro, tudo isso tendo em vista apenas o bem público".
■ Compreende Locke: "é muito melhor o estado de natureza, onde os ho-
mens não são obrigados a se submeter à vontade injusta de outro homem:
e, onde aquele que julga, se julga mal em causa própria ou em qualquer
outro caso, tem de responder por isso diante do resto da humanidade”.
■ Sobre o estado de guerra, entende Locke: "evitar este estado de guerra [...]
é uma das razões principais porque os homens abandonaram o estado de
natureza e se reuniram em sociedade".
■ Sobre a escravidão “o homem, pela sua liberdade natural, deve estar livre
de qualquer poder superior na terra, exceto se há um poder estabelecido,
por consentimento na comunidade civil, que rege leis decretadas pelo le-
gislativo, de acordo com a confiança nele depositada".
■ O poder legislativo (novo estado) possui como objetivo primordial manter
o bem coletivo, proporcionar segurança, paz, enfim atuar em prol de todos
que abriram mão da sua liberdade e confiaram no poder da sociedade
para representar os indivíduos e aplicar as leis estabelecidas - conhecidas
pelo povo. A função do poder supremo no exterior é prevenir ou reparar
as agressões do estrangeiro.
214
Ainda, contemplando o aspecto histórico, Chauí (2015, p. 521) observa que, na

UNICESUMAR
teoria liberal, o Estado tem função tríplice:


• por meio das leis e do uso legal da violência (exército e polícia),
garantir o direito natural de propriedade, sem interferir na vida
econômica, pois, não tendo instituído a propriedade, o Estado não
tem poder para nela interferir. Donde ideia de liberalismo, isto é,
o Estado deve respeitar a liberdade econômica dos proprietários
privados, deixando que façam as regras e as normas das atividades
econômicas;

• visto que os proprietários privados são capazes de estabelecer as


regras e as normas da vida econômica ou do mercado, entre o Esta-
do e o indivíduo intercalar uma esfera social, a sociedade civil, sobre
a qual o Estado não tem poder instituinte, mas apenas a função de
garantidor e de árbitro dos conflitos nela existentes. O Estado tem
a função de arbitrar, por meio das leis e da força, os conflitos da
sociedade civil;

• o Estado tem o direito de legislar, permitir e proibir tudo quanto


pertença à esfera da vida pública, mas não tem o direito de intervir
sobre a consciência dos governados. O Estado deve garantir a liber-
dade de consciência, isto é, a liberdade de pensamento de todos os
governados e só poderá exercer censura nos casos em que se emitam
opiniões sediciosas que ponham em risco o próprio Estado.

Diante disso, o liberalismo defende um Estado não intervencionista no sentido


amplo, que tem força de arbitrar os conflitos sociais existentes e legislar na es-
fera pública. Além disso, o Estado possibilita os direitos naturais aos cidadãos
e cidadãs, como a liberdade de expressão, de propriedade e de consciência re-
ligiosa, política e econômica bem como o direito da utilização da força para a
manutenção das garantias individuais e a preservação do Estado liberal. Segundo
Aranha (2012), o liberalismo pode ser entendido sob três enfoques: político, ético
e econômico.
Na concepção política, o liberalismo difere da posição absolutista real, pois
busca a legitimidade, por meio do poder nas teorias contratualistas e no consenti-
mento dos cidadãos, em que há o fortalecimento das instituições republicanas, da
representação, da autonomia dos poderes e da limitação do poder central. No viés
215
ético, o liberalismo prega o Estado de direito, o qual deve rejeitar a culpa presumi-
UNIDADE 5

da sem amplo direito de defesa e estimular a tolerância aos direitos individuais,


liberdade de pensamento, de expressão e de religião. Por fim, diferentemente
do absolutismo que pregava e incentivava a invenção do rei nos negócios por
meio da economia mercantilista, o liberalismo defende a propriedade privada
dos meios de produção e a economia do livre mercado em que se valoriza a livre
iniciativa e competição, sem a intervenção estatal.
Aranha (2012) ressalta mudanças no desenvolvimento do liberalismo. Ao
longo do tempo, surgiram novas elaborações e visões reformistas de realinha-
mento da teoria liberal face à realidade social, econômica e comportamental na
sociedade capitalista. O liberalismo democrático surge, por volta do século XVIII,
diante da realidade social e econômica do desenvolvimento do capitalismo, es-
pecificamente, na sua expansão produtiva e concentração de riqueza, em que se
intensificam conflitos entre capital e trabalho. Dessa forma, o liberalismo previa
o distanciamento, cada vez mais, entre a riqueza e a pobreza bem como a jornada
de trabalho de quatorze a dezesseis horas, inclusive, com mão de obra infantil e
feminina bem como salários muito baixos.
Além do liberalismo, surgia uma alternativa ao modelo liberal, o socialismo.
Com medo desse novo modelo conquistar as massas humanas, surgiu, assim, o
liberalismo democrático com ênfase no discurso que defendia a igualdade so-
cial e a alteração das precárias condições de vida das massas oprimidas. Um dos
nomes desse movimento foi John Stuart Mill (1806-1873) que, além de defender
a liberdade de expressão e do voto para as mulheres, sugeria, como proposta, a
coparticipação na indústria e representação proporcional na política dos ope-
rários. Nessa mesma direção, surgiram, ainda, no século XIX, teorias como o
anarquismo e o socialismo, as quais trataremos, com maior profundidade, na
próxima aula (ARANHA, 2012).
Já no início do século XX, diante da crise 1929, nos Estados Unidos, a “quebra
da bolsa de Nova York”, o liberalismo e o capitalismo passaram por uma de suas
maiores crises a ponto de, inicialmente, mudar uma de suas concepções mais
básicas e fundamentais do liberalismo: a não intervenção do Estado na econo-
mia. Essa crise não atingiu, somente, os americanos, mas também os europeus,

216
assim, respostas diferentes foram dadas,

UNICESUMAR
na Itália e na Alemã, surgiu o fascismo
e o nazismo. Contudo, na América e na
Inglaterra, a resposta foi a intervenção do
Estado na economia com a política do es-
tado do bem-estar social (Welfare State),
que consiste, basicamente, no controle da
economia pelo Estado. O principal nome
que fundamenta essa concepção foi John
Maynard Keynes (1883-1946) (ARA-
NHA, 2012).
Por fim, a mais recente transformação
do liberalismo seguiu no caminho, dia-
metralmente, inverso da saída da crise de
1929, o caminho foi o aprofundamento
do liberalismo, diante da recuperação da
economia, mas face às alegações que o
Estado estava sendo pesado ao desenvol-
vimento. Assim, na década de 60, diante
da crise fiscal do Estado e o aumento do
déficit público da inflação e da instabili-
dade social, surgiu a teoria do novo libe-
ralismo, denominado neoliberalismo que
prega, basicamente, o retorno do Estado
mínimo, ideia fundamentada, nas teorias
do austríaco Friedrich von Hayek (1899-
1992). Na prática, Estados Unidos e Ingla-
terra implementaram políticas de privati-
zação em massa (universidades, prisões,
serviço de aposentadoria e empresas esta-
tais), cortes com políticas sociais e gastos
com pessoal (ARANHA, 2012).

217
4
POLÍTICA E AS
UNIDADE 5

TEORIAS
socialistas

Caríssimo(a), nossa viagem está se aproximando do seu final. Fizemos um per-


curso significativo, e aqueles que se interessaram por alguns dos temas abordados,
certamente, terá que se aprofundar. Nesse sentido, antes de desenvolver esta aula,
faremos menção à ideologia, um dos temas caro e importante para o desenvolvi-
mento do pensamento crítico. Quando tratamos esse tema, na Unidade 3, ele foi
relacionado ao conhecimento humano. Observamos que o aspecto da ideologia
sempre objetiva a naturalização do pensamento, como se uma determinada ideia
ou maneira de pensar fosse natural, assim como a água de um rio, a brisa do vento
ou as gotas de uma chuva que cai. Fica, aqui, o registro que essa naturalização,
é um dos grandes objetivos da ideologia. Aplica-se um sofisticado processo de
convencimento na busca de conquistar mentes e corações para se ter correligio-
nários e adeptos que divulguem e defendam ideias ou tenham atitudes como
absolutamente “naturais”. Nessa perspectiva, a História é rica em nos oferecer
exemplos dessa naturalização das ideias como pensamentos hegemônicos ou
inquestionáveis. Um bom exemplo é quando o filósofo Zizek (1996, p. 7) trata
sobre o tema da ideologia e a sua importância para os nossos dias, vejamos:


A guisa de simples reflexão sobre como o horizonte da imaginação
histórica está sujeito a mudança, vemo-nos, in medias res, obrigados
a aceitar a inexorável pertinência do conceito de ideologia. Até uma
ou duas décadas atrás, o sistema produção-natureza (a relação pro-
218
dutivo-exploratória do homem com a natureza e seus recursos) era

UNICESUMAR
percebido como uma constante, enquanto todos tratavam de imagi-
nar diferentes formas de organização social da produção e do comér-
cio (o fascismo ou o comunismo como alternativas ao capitalismo
liberal); hoje, como assinalou Fredric Jameson com muita perspicá-
cia, ninguém mais considera seriamente as possíveis alternativas ao
capitalismo, enquanto a imaginação ao popular é assombrada pelas
visões do futuro «colapso da natureza”, da eliminação de toda a vida
sobre a Terra. Parece mais fácil imaginar o «fim do mundo” que uma
mudança muito mais modesta no modo de produção, como se o
capitalismo liberal fosse o «real» que de algum modo sobrevivera,
mesmo na eventualidade de uma catástrofe ecológica global. As-
sim, pode-se afirmar categoricamente a existência da ideologia qua
matriz geradora que regula a relação entre o visível e o invisível, o
imaginável e o inimaginável. Bem como as mudanças nessa relação.

Essa citação nos possibilita, por meio de um exemplo histórico, como o citado
pelo autor, pensar sobre quantas outras questões, ideias, comportamentos, atitu-
des e ações que temos como certas ou absolutamente certas ou, até mesmo, como
sendo “naturais”, mas que, na realidade, somos tomados e levados ou pelo calor
da hora ou pelas circunstâncias que se apresentam como sendo verdades que se
evidenciam por si mesmas, mas que, na realidade, não são testadas e verificadas
com seriedade ou cientificidade.
Quando tratamos de teorias políticas, estamos, na realidade, “mexendo” nos
fundamentos e na constituição estruturante de uma sociedade, no imaginário
social de um povo, ou seja, os milhares de anos que constituíram o Homo Sapiens,
os mais de vinte e cinco séculos de religiosidade cristã no ocidente, os mais de
trezentos anos das revoluções científica, burguesa e industrial e estas últimas sob
o manto do sistema capitalista e as suas revisões. Todos esses elementos históri-
cos se mostram, por sua vez, como elementos culturais determinantes e, assim,
arraigados, de tal maneira, na vida das pessoas e de nossa história, como se esses
(elementos culturais) fossem uma segunda pele (expressão cunhada, certa vez,
pelo jogador Marcelinho Carioca quando, então, jogador do Corinthians, ao fazer
menção do seu grande amor pelo time); logo, tornando-se difícil dissociar ou
tentar separar o que, na realidade, foi uma ideia pensada e colocada em prática
como alternativa para resolver os problemas que os seres humanos enfrentam
num dado momento.
219
Veja, uma rápida reflexão, para terminar essa parte: a nossa consciência sobre
UNIDADE 5

a verdade das coisas está regredindo. A verificação dos fundamentos básicos da


razão está, no dia a dia, sendo destruída. Hoje, acredita-se que algo para ser com-
provado não precisa mais de nenhuma prova ou evidência, basta, apenas, uma
convicção. É comum vermos pessoas acreditando que algo é dessa ou de outra
maneira, ou seja, elas tomam esse algo como verdade e, por isso (por, apenas,
acreditar, ter convicção), defendem e afirmam, mediante a retórica, que não se
tem a menor dúvida sobre a veracidade esse algo. Um exemplo dessa situação é
quando esses tipos de pessoas passam adiante uma informação que a receberam
de terceiros (pessoas de confiança), conferindo a elas a sua fundamentação, como
de boa procedência, por meio das redes sociais. Assim, estes, também, não veri-
ficam a fonte ou a procedência da informação de quem diz que acredita que seja
verdade bem como passam, também, a acreditar e, consequentemente, repassam
a informação como sendo uma verdade absoluta. E, assim, está formada uma rede
de informação falsa, irreal, sem base na verdade, que tem alta confiança e crédito.
Tudo isso porque ninguém ou quase ninguém verificou se a informação é proce-
dente ou tem provas que fundamentam o que se diz ser a mais absoluta verdade.
Portanto, caríssimo(a), fica a minha observação sobre o pensamento crítico.
Essa criticidade está no DNA da filosofia. Sempre que estivermos diante de ideias,
pensamentos ou ações, temos que submeter ao crivo do bom senso da razão. Ob-
servar se há coerência, provas ou evidências que fundamentam o que se tem como
verdadeiro. O pensamento crítico deve ser exercido sempre. Toda e qualquer
teoria tem o intento de querer naturalizar o que não é natural, mas é social e de
interesse político, principalmente, das teorias ou concepções de regimes políticos
e econômicos reivindicar a condição de ser natural; por isso, deve-se seguir e
viver sem o mínimo questionamento e, somente, a aceitação. Feita a observação
e reflexão, voltemos para o assunto desta aula: as teorias políticas do socialismo.
Caríssimo(a), acredito que você, nessa nossa viagem, já tenha percebido que
o ser humano é um ser autônomo. Que cria e recria ideias, comportamentos,
sistemas e teorias. O surgimento das teorias socialistas está ligado, como sempre,
à insatisfação humana, pois o que move o ser humano a realizar novos intentos,
até mesmo quando estes não são compreendidos ou criticados por outros seres
humanos como impossíveis, é o desejo de mudança. Mas ninguém muda por
acaso, assim como o liberalismo diante da crise de 1929 mudou e “consentiu” a
intervenção do Estado na economia; assim, também, o ser humano viu surgir o
socialismo como crítica contundente aos fundamentos do liberalismo político,
220
ético e econômico. Segundo Aranha (2012), no século XX, as teorias socialistas

UNICESUMAR
ganharam espaço diante das péssimas condições de vida dos trabalhadores den-
tro do sistema liberal capitalista vigente. Houve a reformulação na compreensão
do direito à propriedade e uma maior interferência do Estado na economia para
garantir a igualdade social.
Ao individualismo exacerbado, as teorias socialistas apresentam propostas de
solidariedade, cooperação e responsabilidade social. Atribuem-se aos filósofos e
teóricos Saint-Simon, Fourier e Proudhon e Owen, inicialmente, como os socia-
listas utópicos, e, depois, com Marx e Engels, que cunharam o nome de socialis-
mo científico. Essas ideias tornam-se reais quando, em 1917, a Revolução Russa,
liderada por Lênin, deu origem a União Soviética (URSS), a primeira república
socialista, seguida, depois, por China, Cuba e alguns país do continente Africano.
Ainda, também, surgiam novas concepções e movimentos interessados em
criticar o modelo capitalista, como ocorreu com o Anarquismo no século XIX.
Essa concepção não aceitava, em absoluto, nenhum tipo de gerenciamento de
qualquer tipo de autoridade, sobretudo o Estado. Pregava ações não-coercitivas
e defendia a cooperação e a autodisciplina mútua. As decisões deveriam vir, ne-
cessariamente, de baixo, pois, somente, esses conhecem a sua própria realidade.
Além disso, o anarquismo defendia um sistema igualitário, assim, seus ideais
identificavam-se com as ideias socialistas, de uma forma geral, defendidas por
Marx e Engels, contudo fazia sérias críticas ao conceito de autoridade marxista,
que se relaciona ao conceito de ditadura do proletariado. (ARANHA; MARTINS,
2012; CHAUÍ, 2015).
De forma geral, uma das principais bases das teorias socialistas está nas ideias
de Marx e Engels, principalmente, em relação à política, no Manifesto Comunista.
Aranha e Martins (2012) informam que o clima da época, por volta do ano da
publicação do manifesto, em 1848, era marcado por conflitos muito fortes entre
as forças conservadoras da nobreza e do clero contra a burguesia, de tal maneira
que, em um único conflito, entre liberais e socialistas, dizimou cerca de 10 mil
mortos. Na base do pensamento socialista, na versão marxista, estava, justamente,
o propósito do operariado vir ao poder. Dividir o poder não era ou não estava
nos planos da nobreza ou da burguesia certamente; assim os conflitos tornam-se
constantes. Essas ideias, que faziam circular, por meio do manifesto, eram vistas
com muito receito.
Do ponto de vista teórico, uma das bases do pensamento socialista se deve, es-
pecificamente, ao conceito marxista: o materialismo histórico dialético (CHAUÍ,
221
2015). Esta teoria defende o inverso do idealismo, ou seja, a matéria ou o real é
UNIDADE 5

prioridade na relação com as ideias. Isso quer dizer que é a realidade material
que deve ser valorizada, em primeiro lugar, na produção do conhecimento. As
ideias, pelo contrário, são resultados das experiências concretas da vida. Exem-
plo: a realidade econômica, social e política é que determina as ideias que as
pessoas têm de sua cultura e do meio em que vivem. Dessa maneira, o modo de
produção capitalista, ao explorar a mão de obra do trabalhador, cria todo um
sistema que legitima o status quo do sistema capitalista como sendo um sistema,
absolutamente, natural, o que, de fato, não é, porque, em primeiro lugar, o sistema
capitalista nem sempre foi um modo de produção, pelo contrário, é um modelo
mais recente na humanidade.
Por fim, tem-se diversas experiências socialistas no mundo, por exemplo, a
da União Soviética com a ideia do proletariado no poder, mas o que veio a se
efetivar foi a ideia do partido único. Houve conflitos das mais diversas ordens,
internas e de enfrentamento de opositores à revolução. Contudo, em 1940, os
russos eliminaram o analfabetismo e se projetaram como uma superpotência
mundial (ARANHA, 2005). De fato, nesse sentido, o socialismo se tornou uma
ameaça direta às pretensões do liberalismo e do capitalismo, como alternativa dos
países em processo de produção e de vida para a humanidade. Ainda, registra-se
que, da mesma maneira que o liberalismo criou versões para a superação de
suas contradições, o socialismo passou por reformulações e, coincidentemente,
a concepção social democrática foi uma das saídas. No mundo socialista, essa
concepção possibilitou experiências exitosas de conquistas sociais com políti-
cas de um Estado forte e distribuição de riqueza, como quem deve pagar mais
impostos são aqueles que mais ganham. Países como Suécia, Noruega, Finlândia,
Grã-Bretanha, Alemanha ocidental, na Áustria, Holanda e Bélgica são exemplos
dessa concepção que originou experiências bem-sucedidas.

222
5
POLÍTICA, DIREITOS

UNICESUMAR
HUMANOS E
políticas públicas

Nossa viagem está chegando ao fim com esta aula, e, como toda viagem, passa-
mos por lugares desconhecidos, que nos chamaram a atenção e que nos leva-
ram a outras realidades bem diferentes daquelas que já pudéssemos ter vivido.
Contudo o nosso trajeto sempre primou pela formação e informação intelectual
da tradição filosófica de espírito crítico e autocrítico. Certamente, é uma gran-
de pretensão. Esperamos tê-lo alcançado, mas é o futuro que dirá. Mais do que
fazer uma aula para trazer informações sobre o que são os direitos humanos e
as políticas públicas, é possibilitar a você a construção do conhecimento crítico
sobre esses assuntos ou demais assuntos relacionados aos que temos tratado neste
livro. Pois tenho certeza, caro(a) aluno(a), que você pode fazer essa busca em um
simples clique, acessando, de forma rápida, com um bom buscador da internet,
informações de entidades, universidades e órgãos associados aos temas, como a
Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os direitos humanos, que são de
extrema confiança e credibilidade.
Nosso objetivo, nesta aula é nos posicionar, diante desses dois temas, dentro
dos nossos estudos, em especial, nesta Unidade 5, que aborda o tema da política
como tema maior. Dessa maneira, objetiva-se oportunizar uma reflexão filosó-
fica crítica sobre esses temas e a política e vice-versa, no atual contexto. Sobre o
atual contexto político, corroboraremos com algumas das conclusões que Harari
(2018) faz e chega sobre o tempo presente. A narrativa liberal venceu o fascismo
de Hitler e Mussolini, os quais não vivem mais, e o comunismo soviético, com
223
a queda emblemática do muro de Berlim em 1989, ou seja, democracia política,
UNIDADE 5

direitos humanos e capitalismo de livre mercado parecem destinos a conquistar


o mundo. Contudo a História é dinâmica e sempre nos surpreende: vislumbra-se,
após um tempo de uma forte ideologia do fim da história, a sua continuidade,
apesar dos constantes anúncios e profecias, aqui e acolá do fim dela.
Não obstante, de fato, o liberalismo vitorioso não se mostra senhor absoluto, mas
claudicante e, de certa forma, emperrado: por exemplo, na América Latina, após uma
onda fortíssima do neoliberalismo, governos fascistas e ditaduras civis-militares bem
como o próprio surgimento da extrema direita e a volta de governos de esquerda
ou de centro esquerda, como ocorre na Bolívia com Evo Morales, no Equador, com
Lenín Moreno, na Argentina, com Alberto Fernández e os conflitos nunca vistos
no Chile, diante das políticas neoliberais do governo Sebastián Piñera. Para onde
caminhamos, pergunta Harari?
Como já observamos, em outros momentos destes nossos estudos, em especial,
sobre a política, os vários modelos de Estados e governos nacionais construíram e
constroem saídas e ajustes, independentemente da concepção política adotada entre
as teorias liberais e socialistas. Dessa maneira, deve-se entender, fundamentalmente,
que a declaração dos direitos humanos bem como as políticas públicas são medidas
dos países e/ou dos Estados para, de alguma forma, atender realidades que atingem
a vida humana, individual e social, de forma prejudicial e que impede as pretensões
do desenvolvimento, em especial, do ideário liberal.
Posto isso, é importante ressaltar que a preocupação sistêmica da grande maioria
dos governos e dos estados nacionais é pelas condições de vida das pessoas, as quais
chegaram a um estado tão abaixo da linha da falta de dignidade e, assim, atingem,
contraditoriamente, os próprios interesses e àqueles que, de alguma forma, favo-
recem-se com o status quo dessas condições de sobrevida humana, estampada ou
oculta, socialmente, nas cidades. Nesse sentido, há quem afirme que as políticas dos
direitos humanos ou as políticas públicas, dialeticamente, fazem parte de um grande
sensor político, como se houvesse um radar da política sobre a macro política do
sistema liberal/capitalista, que atinge, de fato, muitos países e lugares em que o ser
humano é levado a viver sob condições de vida subumanas.
É importante ressaltar, de forma oportuna, um dos conceitos de ideologia ad-
vogado por Zizek (1996); este afirma, categoricamente, que uma ação ideológica
independe de uma dada realidade vivida como verdade, ou seja, é muito mais forte
uma ação ideológica quando ela se apresenta em uma realidade de conteúdo ver-
dadeiro. De fato, os intentos ideológicos sempre se colocam acima e utilizam a pró-
224
pria realidade, criando condições espetaculares de hegemonias que redundam em

UNICESUMAR
dependência e subserviência, mesmo que, de fato, ocorram situações de combate a
situações, realmente, desumanas. Compreendemos, então, que aí está um dos grandes
“X” da questão que se coloca para a formação de profissionais críticos e que estarão
nas trincheiras do serviço público, organizacional ou na sociedade como um todo.

explorando Ideias

Os “pais” fundadores da área de políticas públicas foram: Laswell (1936), que introduz a
expressão policy analysis (análise de política pública), ainda, nos anos 30, como forma de
conciliar conhecimento científico/acadêmico com a produção empírica dos governos e,
também, como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interes-
se e governo; Simon (1957) introduziu o conceito de racionalidade limitada dos decisores
públicos (policy makers), argumentando, todavia, que a limitação da racionalidade poderia
ser minimizada pelo conhecimento racional; Lindblom (1959) questionou a ênfase no
racionalismo de Laswell e Simon bem como propôs a incorporação de outras variáveis à
formulação e análise de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração
entre as diferentes fases do processo decisório, o qual não teria, necessariamente, um
fim ou um princípio; e Easton (1965), que contribuiu para a área ao defini-la como um
sistema, ou seja, como uma relação entre formulação, resultados e o ambiente.
Fonte: adaptado de Souza (2002, p. 3-4).

Em relação aos direitos humanos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos


(DUDH) foi promulgada no dia 10 de dezembro de 1948, diante das duas guerras
mundiais e da busca de um ideário que garantisse ao ser humano, em qualquer parte
desse mundo e sob quaisquer circunstâncias, condições de sobrevivência e cresci-
mento em ambiente digno de respeito e paz, igualdade e liberdade. Isso tem tudo a
ver com o conhecimento filosófico, em especial, com a ciência política, uma vez que
a ela é concedida a condição não natural, como acreditava Aristóteles, mas como
entendimento dos seres humanos como sendo, extremamente, necessário para o
desenvolvimento da vida, de sua manutenção e, principalmente, da convivência social
entre as pessoas. Fazer política é estar ciente que há um bem maior e inestimável, o
qual deve ser a busca de todos, mesmo que ocorra divergências de princípios e cul-
turas; contudo, em absoluto, o aniquilamento da vida humana não é e não pode ser
entendido como um fim e, muito menos, como um meio de se estabelecer o poder. A
concepção de políticas públicas se iniciou como política, a partir dos diversos países
da Europa e dos Estados Unidos, e que já ocorre no Brasil a um bom tempo.
225
UNIDADE 5

pensando juntos

O aspecto ideológico independe da realidade vivida, se ela é falsa ou verdadeira. Uma


ideologia se firma, ainda, melhor quando o conteúdo é positivo. O que importa, ideologi-
camente, não é o conteúdo afirmado, mas a maneira como este se apresenta nas relações
de interesses e na construção da realidade social.

Segundo Souza (2002, p. 5), a política pública pode ser entendida como:


O campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o
governo em ação” e/ou analisar essa ação (variável independente)
e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas
ações (variável dependente). Em outras palavras, o processo de for-
mulação de política pública é aquele através do qual os governos
traduzem seus propósitos em programas e ações, que produzirão
resultados ou as mudanças desejadas no mundo real.

A partir dessa definição e à luz do nosso entendimento exposto, até aqui, as polí-
ticas públicas têm papel preponderante no direcionamento dos conflitos sociais,
em nosso caso, no sistema capitalista, que aflige a coletividade ou uma parte sig-
nificativa da sociedade com o desemprego, a miséria, a fome, as doenças, a falta
de moradia e de condições básica e mínimas de vida, bem como têm o papel de
servir no contingenciamento da não formação de novos bolsões de excluídos
ou miseráveis, tornando-se, assim, o meio social menos instável, crítico ou in-
flacionado, com um certo controle por parte de governos e de estados; por sua
vez, na medida do possível, não atingir aqueles, em última instância, que são
considerados como os seus grandes mantenedores, ou seja, as elites políticas,
econômicas, sociais e religiosas, uma vez que elas detêm o poder do capital ou o
poder simbólico.

226
CONSIDERAÇÕES FINAIS

UNICESUMAR
Caríssimo(a) aluno(a), esperamos que, ao final desta unidade estudada, o nos-
so tema tenha ganhado uma nova significação. Assinalamos isso, uma vez que
a desinformação e a própria falta de formação sobre o que significa de fato a
política. Essa situação coloca o ser humano na condição de presa fácil daqueles
que, cientes da importância capital da política, usufruem de suas benesses, ape-
nas e tão somente, individual e, raríssimas vezes, coletivamente. Como vimos a
política é uma atividade humana que nasce como uma atividade indissociável
do ser humano como ser social. Assim, a política é, como pensavam os gregos,
a ciência mais excelente, pois é ela que tem a tarefa de construir a realidade da
vida daqueles que vivem em sociedade, principalmente, em relação ao fator da
sobrevivência coletiva e das necessidades individuais do ser humano. Logo, essa
tarefa coloca-se como, extremamente, necessária.
A convivência social, portanto, mostra-se como um desafio, que vem desde
que o ser humano convive com outros seres humanos, há milhares de anos, antes
mesmo da criação e da invenção da política, pelos gregos, como nós a conhe-
cemos. Assim, procuramos dar aos temas tratados, além das informações mais
precisas possíveis e fundamentais, um tom, sempre, crítico e autocrítico do co-
nhecimento filosófico, por meio de conteúdos apresentados, rigorosamente, à luz
da boa tradição filosófica corrente, em nosso país e no mundo atual.
Esperamos, mais uma vez, que os temas e assuntos estudos, nesta unidade,
tenham atendido os objetivos expostos na introdução: apontar a importância
da política hoje; expor filosoficamente as ideias e as teorias políticas; listar as
características fundamentais do pensamento político do liberalismo; identificar
as características fundamentais do pensamento político do socialismo; e analisar
as implicações político-sociais da relação entre as políticas públicas e os direitos
humanos.

227
na prática

1. Na primeira aula desta unidade, tratamos dos motivos e das razões da política hoje.
Vimos, à luz do pensamento clássico, em Aristóteles, que a política tem papel impres-
cindível para a formação da cidade-estado do tempo do nosso filósofo e revelava,
ainda, uma característica distintiva do ser humano: um animal político. Diante disso,
leia, atentamente, as afirmações a seguir e assinale a alternativa correta sobre a
importância da política para o ser humano como ser social.

a) Convivência social.
b) Convivência individual.
c) Convivência dos maiorais.
d) Convivência dos que, realmente, trabalham.
e) Convivência, apenas, entre homens e mulheres.

2. Caríssimo(a), na segunda aula, estudamos, de forma elementar, algumas das prin-


cipais teorias clássicas da política. Algumas porque, na realidade, a área da filosofia
política não é tão simples quanto se parece. Fizemos um esforço de apresentar, em
linha gerais, os fundamentos e as ideias sobre as principais concepções políticas.
Leia, atentamente, as afirmações a seguir sobre o pensamento de Maquiavel:

I - Ao olhar o mundo vivido, a política, de fato, deve vir a partir das relações que se
estabelecem entre as pessoas, suas posições e seus interesses.
II - A política da pólis deveria estar nas mãos das pessoas mais bem preparadas.
III - Afirmava, categoricamente, que todo o poder vem de Deus e deve ser compreen-
dido como bom e justo a todos aqueles que o seguem e são batizados em nome
de Deus, pai de Jesus Cristo.
IV - O homem é um lobo para outro homem.

Assinale a alternativa correta:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

228
na prática

3. Na terceira aula, estudamos as teorias liberais, vimos suas bases e fundamentos


históricos e teóricos, em especial, na História recente com a elevação da burguesia
ao poder e a consolidação do sistema capitalista. Vimos, ainda, teóricos e filósofos
que foram os grandes porta vozes dessas compreensões políticas, que, ainda, têm
forte influência no pensamento atual. Leia, atentamente, as afirmações a seguir e
assinale a alternativa correta sobre o que faz parte das teorias liberais:

a) O Estado não tem a função de garantir a segurança dos indivíduos e de seus


direitos naturais, a propriedade.
b) Promove a divisão igualitária das riquezas entre todos os seus cidadãos e cidadãs.
c) Defende o Estado intervencionista na economia.
d) O Estado tem a função de arbitrar, por meio das leis e da força, os conflitos da
sociedade civil.
e) É defensor da luta de classes e imputa a ela o principal motor da História e dos
conflitos sociais no mundo.

4. Na quarta aula, quando tratamos as teorias socialistas, ficou a nítida impressão que
o ser humano é um ser autônomo que, diante de suas necessidades, cria alterna-
tivas. Assim, as teorias socialistas foram alternativas aos avanços das teorias, dos
governos e do estado liberal que proporciona a uma grande e expressiva parcela da
sociedade, em especial, na Europa e Estados Unidos, condições de vida subumana.
Leia, atentamente, as afirmações, a seguir, e assinale a única que é verdadeira com
relação aos pontos defendidos pelas teorias socialistas:

a) Solidariedade, empreendedorismo e responsabilidade social.


b) Solidariedade, propriedade privada e responsabilidade social.
c) Solidariedade, cooperação e empreendedorismo.
d) Solidariedade, cooperação e meritocracia.
e) Solidariedade, cooperação e responsabilidade social.

229
na prática

5. Na última aula, abordamos a política, os direitos humanos e as políticas públicas,


com um objetivo bem claro e específico: posicionar-se diante desses dois últimos
temas para oportunizar uma reflexão filosófica crítica, no atual contexto. Diante dis-
so, leia as afirmações, a seguir, sobre as observações feitas a respeito dos intentos
de Estados e governos nacionais sobre as políticas referentes aos direitos humanos
e as políticas públicas:

I - É atender e alinhar as necessidades principalmente econômicas.


II - É de fazer reformas e ajustes que possibilitem manter o sistema funcionando
sob a égide do sistema liberal e capitalista.
III - É promover uma revolução tão esperada pelos socialistas.
IV - É acabar definitivamente com os problemas que produzem as grandes neces-
sidade sociais.

Assinale a alternativa correta:

a) Apenas, I e II estão corretas.


b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.

230
aprimore-se

NICOLAUS MACLAVELLUS:
MAGNÍFICO LAURENTIO MEDICI LUNIORI SALUTEM

Aqueles que desejam conquistar a graça de um príncipe costumam obsequiá-lo o


mais das vezes com o que possuem de mais valioso ou que possa deleitá-lo de
modo especial; por isso os príncipes são frequentemente presenteados com cava-
los, armas, tecidos de ouro, pedras preciosas e ornamentos desse gênero, todos dig-
nos de sua grandeza. Desejando por meu turno oferecer-me à Vossa Magnificência
com um testemunho da servidão que lhe devoto, não encontrei entre os bens que
me são mais caros, ou tanto estime, senão o entendimento das ações dos grandes
homens, aprendido por mim numa longa experiência das vicissitudes modernas e
no estudo contínuo das antigas: as quais, tendo eu com grande diligência examina-
do e cogitado demoradamente, agora as condenso neste breve volume, que envio
a Vossa Magnificência.
E, conquanto julgue esta obra indigna de sua presença, ainda assim muito confio
em que, por sua humanidade, ela deva ser acolhida, considerando que de minha
parte não lhe poderia ser ofertado maior dom que proporcionar-lhe a faculdade de
poder, em brevíssimo tempo, entender tudo o que eu, em tantos anos e por tantas
aflições e perigos, conheci e entendi. Não adornei nem recheei esta obra de orações
amplas ou de palavras pomposas e magníficas ou de quaisquer outros artifícios
ou ornamentos extrínsecos, com os quais muitos soem descrever e adornar suas
coisas; porque quis que nada mais a honrasse ou tornasse grata senão a exclusiva
amplitude da matéria e a gravidade do assunto. Tampouco pretendo que se consi-
dere presunção o fato de que um homem de baixo e ínfimo estado ouse discorrer e
ditar regras sobre o governo dos príncipes; isto porque, assim como os desenhistas
de paisagem se põem num nível baixo a fim de discernir a natureza dos montes e
dos lugares altos, e no topo dos montes para observar as zonas baixas, do mesmo
modo, para bem conhecer a natureza dos povos, é preciso ser príncipe, e, para co-
nhecer bem a dos príncipes, é necessário pertencer ao povo.

231
aprimore-se

Aceite, pois, Vossa Magnificência esta pequena oferenda com o mesmo espírito
com que lha envio; obra que, se for lida e considerada com diligência, tornará paten-
te meu extremo desejo de que o Senhor alcance a grandeza que a fortuna e outras
suas qualidades lhe prometem. E, se do ápice de sua altura Vossa Magnificência por
momentos volver os olhos para estes lugares baixos, saberá quanto eu desmereci-
damente tenho suportado uma grande e contínua adversidade da fortuna.
Fonte: Maquiavel (2017, p. 30).

232
eu recomendo!

livro

O Príncipe
Autor: Nicolau Maquiavel.
Editora: Edipro.
Ano: 2016.
Sinopse: este “opúsculo” (como o próprio Maquiavel o chamou)
escrito por um cortesão italiano da época renascentista, endere-
çado “ao magnífico Lorenzo de Medici “ (na época, o Duque de
Urbino, em Florença) e publicado, somente, após a sua morte, acabou por ser
reconhecido pela posteridade como um dos tratados políticos mais fundamentais
elaborados pelo pensamento humano e que teve um papel crucial na construção
do conceito de Estado como o conhecemos na modernidade. Mais uma excelente
leitura para seu crescimento na literatura mundial. Vale a pena conferir.

233
conclusão
conclusãogeral
geral

conclusão
conclusão
geral
geral

Caro(a) aluno(a), chegamos a nossa última parada. Espero que você tenha aprovei-
tado todos os temas abordados sobre o conhecimento filosófico e que estes contri-
buam para habilitá-lo(a), propedeuticamente, para a realização do seu curso. Nessa
jornada, vimos a importância do pensamento filosófico crítico para a nossa socieda-
de, a qual é considerada sociedade do conhecimento, pois é imprescindível o senso
crítico face à Era da Pós-verdade, no tempo das redes sociais.
Observamos, de forma panorâmica, a formação e o desenvolvimento do conhe-
cimento filosófico, por meio do testemunho da História, do contexto histórico, social
e político, na trama da produção dos pensamentos, do surgimento dos filósofos
e de suas importâncias para as mais diversas épocas. Analisamos, de forma rela-
cional, os conhecimentos (epistemologias), a antropologia e a importância do ato
criativo, transformador e dignificante do ser humano, por meio do trabalho. Reser-
vamos, também, um espaço para o estudo crítico sobre a ética e a moral; dessa for-
ma, vimos que ambas são necessárias para a convivência social em uma sociedade
democrática.
Apresentamos as teorias políticas clássicas do liberalismo e do socialismo bem
como as suas implicações na relação com o poder dos estados e dos governos na-
cionais, mediante as ações políticas. Utilizamos, como exemplo de reflexão, as polí-
ticas dos direitos humanos e das políticas públicas, como forma de enfrentamento
dos conflitos existentes, oriundos dos problemas sociais como desemprego, fome,
miséria, doenças, falta de moradia, falta de seguridade social, dentre outras.
Assim, esperamos, por fim, que você tenha gostado da nossa viagem ao mun-
do maravilhoso da Filosofia, porém, como já dissemos, mais importante do que a
chegada é o próprio transcurso da viagem, da passagem, ao longo da história da
humanidade, dos seus contextos econômicos, sociais e políticos na produção e no
desenvolvimento do conhecimento humano. Até a próxima!

234
234
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ZIZEK, S. (org.). Um mapa da ideologia. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.

REFERÊNCIAS ONLINE

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3 Em: https://www.dicio.com.br/moderno/. Acesso em 16 abr. 2020.

4 Em: https://www.dicio.com.br/contemporaneo/. Acesso em: 16 abr. 2020.

5 Em: https://www.dicio.com.br/porque-2/. Acesso em: 16 abr. 2020.

6 Em: https://dicionario.priberam.org/p%C3%B3s-verdade. Acesso em: 2 jun. 2020.

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238
referências

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Em: https://www.dicio.com.br/obvio/. Acesso em: 30 abr. 2020.
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Em: https://www.dicio.com.br/teoria/. Acesso em: 30 abr. 2020.
20
Em: https://www.dicio.com.br/liberal/. Acesso em: 30 abr. 2020.

239
gabarito

UNIDADE 1 UNIDADE 4

1. D. 1. E.

2. D. 2. A.

3. A. 3. A.

4. C. 4. C.

5. B. 5. D.

UNIDADE 2 UNIDADE 5

1. D. 1. A.

2. A. 2. C.

3. C. 3. D.

4. C. 4. E.

5. B. 5. A.

UNIDADE 3

1. A.

2. A.

3. C.

4. E.

5. D.

240

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