Você está na página 1de 3

1

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE DIREITO
GRADUAÇÃO EM DIREITO
DISCIPLINA: PESQUISA JURÍDICA
DOCENTE: JOSÉ GERALDO DE SOUSA JUNIOR
DISCENTE: ALESSANDRA OLIVEIRA BARBOSA

FREIRE, Ana Maria Araújo (Nita). Acesso à Justiça e a pedagogia dos vulneráveis. In:
SOUSA JÚNIOR, José Geraldo et al (org.). O Direito Achado na Rua, Volume 8:
Introdução Crítica à Comunicação e à Informação. Brasília: FAC - UnB, 2016.
O texto “Acesso à Justiça e a pedagogia dos vulneráveis”, de Nita Freire, foi
incialmente escrito para uma conferência da Escola de Serviço de Justiça, em programa
de Magistratura, ocorrida em Buenos Aires, no ano de 2014. A autora, baseada no
pensamento de Paulo Freire, entende o Direito como “prática para a libertação” (FREIRE,
2016, p. 69), tema que defende e aborda durante todo seu discurso, posto que para ela, o
Direito deve voltar-se para aqueles que por muito tempo foram abandonados e excluídos
pela lei: “os vulneráveis, os esfarrapados [...], os oprimidos à própria sorte e desgraça”
(FREIRE, 2016, p. 69).

Segundo Nita Freire, a origem da ciência jurídica, encontrada nas faculdades


brasileiras de Direito, é resultado de um processo de evolução da sociedade que passou a
internalizar a ideia de que Direito resume-se às leis vigentes, que elaboradas pela elite
social, não voltam o olhar para as mulheres e homens marginalizados, que são excluídos
e abandonados todos os dias, fadados a viverem sem voz, submissos a vontade dos “donos
das leis e do poder” (FREIRE, 2016, p. 69). Entretanto, nos últimos tempos vem surgindo
uma nova compreensão do Direito, uma “abordagem dialética do Direito Social”
(FREIRE, 2016, p. 69), fruto da “luta política no Brasil” (FREIRE, 2016, p. 69).

A partir desta nova ótica empregada ao Direito, objetiva-se atingir “igualdade a


todos e todas” (FREIRE, 2016, p. 69) e uma justiça que possibilite diálogo entre a
legislação e a realidade, situação que exige grande esforço em uma sociedade classista e
elitista como a brasileira. Dessa forma, a autora apoia-se a grandes escritores, como
Roberto Lyra Filho, Pedro Rezende Santos Feitoza e o próprio Paulo Freire, para embasar
suas proposições.
2

Roberto Lyra Filho, idealizador do projeto “O Direito Achado na Rua (DAnR)”,


entende o Direito como prática libertadora nascida nas ruas, diante das lutas dos
espoliados e dos oprimidos, ou seja, o Direito é fruto de um processo social, baseado nos
movimentos sociais, que nega um Direito fadado ao esgotamento de leis e longe do
clamor do povo. Como resultado, Justiça e Direito estão intrinsecamente unidos e são
inseparáveis, caso que não ocorre com Direito e lei. Para ele, o processo histórico é parte
fundamental da Justiça real, uma vez que a partir dele as lutas sociais emergem cessando
a exploração e a opressão, a que Lyra Filho denomina de antidireito, isto é, a imposição
de normas jurídicas e leis sobre a sociedade.

Na mesma linha de pensamento, Pedro Rezende Santos Feitoza entende que a


síntese jurídica é fator importante dentro da práxis social justa, pois a partir da dialética
social do Direito torna-se tangível o cessar da exploração do homem pelo próprio homem.
Além disso, ao abordar a concepção de Paulo Freire, a autora utiliza-se da fala do
professor José Humberto de Góes Júnior, que ao citar o pedagogo, entende que o Direito
é um “fenômeno social, cultural e histórico” (2008, p. 173, apud FREIRE, 2016, p. 72)
que se constrói em favor da justiça, restabelecendo o fenômeno jurídico às pessoas
cotidianas, às lutas sociais e à rua. Destarte, o Direito deve estar voltado para a
emancipação social.

Atrelado a isso, Nita Freire reitera a grande participação de Paulo Freire na


concepção d’O Direito Achado na Rua, visto que - apesar de Lyra Filho não citá-lo em
nenhuma de suas obras - a teoria epistemológica-ético-político-antropológico-crítica de
educação de Freire está em perfeita consonância com a Teoria Dialética Social do Direito
do DAnR.

Paulo Freire, como filósofo, educador e pedagogo, atuou de forma mais concisa
no que ele denominou de “pedagogia do oprimido”, teoria que preocupava-se em inserir
homens e mulheres nas sociedades, dando-lhes mais voz, autonomia, justiça e libertação,
fatores que para ele desempenhavam função primordial na educação política. O educador
entendia a necessidade de permitir a estes homens e mulheres

serem sujeitos também da história e não apenas objetos da exploração,


de servidão a serviço das classes opressoras, assim, essa busca de
dignificar os oprimidos/as é a luta pelos direitos humanos mais
autênticos para os vulneráveis, os esfarrapados, os oprimidos/as
(FREIRE, 2016, p. 73).
3

Por conseguinte, a luta de Paulo Freire em torno da humanização das pessoas,


independentemente de sua classe social, de sua idade, de seu gênero ou opção sexual, está
alicerçada nos direitos da pessoa enquanto humana, isto é, dos direitos humanos, campo
este ferrenhamente defendido por Roberto Lyra Filho no que concerne ao O Direito
Achado na Rua. Paulo Freire e o DAnR estão fundamentalmente ligados pela luta
incessante em levar aos homens e mulheres a libertação restringida pela ideia de Direito
que prende, sufoca e pune. Para ambos, o Direito é prática que conduz a libertação.

Por fim, Nita Freire finaliza seu discurso pondo em relevância a educação, como
“Tratado do Direito Social Dialético a partir do Direito Achado na Rua” (FREIRE, 2016,
p. 76), que nas obras de Paulo Freire ganharam espaço a partir da “politicidade,
eticidade/esteticidade, amorosidade e problematicidade nascido do real e concreto, em
favor dos oprimidos e oprimidas” (FREIRE, 2016, p. 76).

Consoante a isso, o discurso proferido por Nita Freire concretiza e põe em


destaque a ligação do projeto idealizado por Roberto Lyra Filho e as teorias oriundas de
Paulo Freire, visto que ambos entendem a necessidade de desencarcerar o Direito, para
assim, possibilitar aos excluídos socialmente a oportunidade de terem seus direitos
reconhecidos e suas vozes ouvidas.

Ana Maria Araújo Freire, conhecida também como Nita Freire, é graduada em
pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Moema (1975), possui mestrado em
Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1980)
e doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1994). Atualmente,
dedica-se a organizar, publicar e divulgar o trabalho de seu falecido esposo, Paulo Freire, como fez
no discurso em questão, presente agora na oitava edição da série “O Direito Achado na Rua:
Introdução Crítica ao Direito à Comunicação e à Informação”.

Referências bibliográficas

1. FREIRE, Ana Maria Araújo (Nita). Acesso à Justiça e a pedagogia dos vulneráveis. In:
SOUSA JÚNIOR, José Geraldo et al (org.). O Direito Achado na Rua, Volume 8:
Introdução Crítica à Comunicação e à Informação. Brasília: FAC - UnB, 2016.
2. ESCAVADOR. Ana Maria Araújo Freire. Disponível em:
<https://www.escavador.com/sobre/2506081/ana-maria-araujo-freire>. Acesso em: 02
out. 2017.

Você também pode gostar