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Carlos Alberto Faraco (1950) é um conceituado linguista brasileiro que possui em seu

currículo graduação em Letras Português/Inglês pela Pontifícia Universidade Católica do


Paraná (1972), mestrado em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (1978),
doutorado em Linguística - University of Salford (1982) e pós-doutorado em Linguística na
University of California (1995-96). Sua eminência, também, se dá pelo fato de ser um dos
especialistas brasileiros na obra de Mikhail Bakhtin.
Enquanto Professor Sênior do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade
Federal do Paraná (UFPR), Faraco publicou um artigo que muito contribui para o
entendimento das questões que norteiam a gramática brasileira. Trata-se de: “Ensinar x Não
ensinar gramática: ainda cabe essa questão?”

Ao longo de pelo menos vinte séculos, desde que os gregos - e depois os romanos - conceituaram gramática
como a arte do uso correto da língua, quando se fala em gramática logo se pensa em um conjunto de
ensinamentos sobre a maneira correta de falar e escrever uma língua. Por isso, não é tão simples assim sintetizar
todo esse percurso e as transformações que a língua sofreu desde a antiguidade neste espaço virtual.
A gramática nasceu de um lado, como uma regra; um modelo de língua e, por outro lado, completando-a, a
retórica, como um conjunto de preceitos para tornar a palavra uma maneira de convencer, de persuadir e de
seduzir o interlocutor.
Não há dúvida de que os gregos e os romanos produziram um saber sobre a linguagem que não podemos menosprezar e que
poderíamos resumir em três aspectos:
a) constituíram um vocabulário para se falar sobre a língua (o que hoje chamamos de metalinguagem) que continua circulando
entre nós
(por exemplo, na organização dos dicionários);
b) formularam grandes perguntas sobre a linguagem humana, muitas das quais continuam bem presentes nas nossas
especulações lingüísticas e filosóficas modernas;
c) sistematizaram três grandes direções para o estudo da língua que ainda hoje caracterizam alguns dos nossos modos de
investigação da língua.

(FARACO, 2006, p. 18)

É no final do século XV, que a situação estava mais madura para os estudos das línguas vernáculas, quando vem a
necessidade de se sistematizar uma descrição dessas línguas e de registrar uma referência normativa, que
atendesse aos objetivos de unificação linguística trazidos pela criação dos novos Estados unificados. Essas
línguas, principalmente o português e o castelhano, apareciam como línguas imperiais e isso favorecia os
movimentos unificadores.

Os gramáticos trouxeram como modelo de descrição das línguas vernáculas as antigas gramáticas latinas,
principalmente a de Prisciano, modelo bem enraizado entre nós.

Todo esse esforço tinha como objetivo contribuir para fixar um padrão de língua.

" O estudo da língua entre os gregos e os romanos visava primordialmente o domínio das habilidades de certos
tipos de fala e de escrita". Portanto, estudar gramática deveria contribuir para o desenvolvimento daquelas
habilidades vistas como ideais a serem cultivados. "Desse modo, ela não era uma matéria que se esgotava em si
mesma: não se tratava de estudar a gramática pela gramática, mas de refletir sobre a estrutura da língua, sobre
os padrões sociais de correção e sobre os recursos retóricos com vistas a melhor manejar a fala e a escrita."
No Brasil, o modelo medieval do ensino da língua veio com os jesuítas no século XVI embasado em um modelo
elitista e artificial do ensino da língua materna. De lá para cá, a gramática tradicional prevalece e a escola
continua a ensinar no século XXI uma norma padrão artificial, que se denominou a forma correta de escrever e
falar.

"Dentre os mecanismos de imposição da norma cultuada, encontra-se a escola. Está nela entranhada uma
verdadeira neurose normativista, além de um arraigado compromisso com a gramatiquice." (FARACO, 2006, p.
23)
Não se trata, porém, de abondonar a gramática, ou menosprezá-la, mas o ensino da língua deve ocorrer de modo
reflexivo, levando o aluno a diversos materiais escritos , partindo sempre do texto trabalhado e garantindo a
progressiva aquisição de recursos que permitam ampliar sua competência leitora e escritora. nesse sentido, o
ensino da língua acompanha atividades de observação, do levantamento de hipóteses e de inferências. Sempre
em contextos significativos, onde o aprendiz é incentivado a conhecer e a dominar o sistema da escrita. "O lema
aqui deve ser: reflexão gramatical sem gramatiquice e estudo da norma padrão sem normativismo."

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