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Além disso, para o libertárianismo, o Estado não pode interferir até certo ponto na
propriedade individual, pois dependendo das medidas aplicadas pelo Estado são
capazes de arruinar os patrimônios individuais. A cobrança exorbitante de
impostos seria um exemplo disso.
Comércio livre
Privatização de serviços
Os serviços básicos que normalmente são prestados pelo Estado, devem vir da
iniciativa privada, isto é, devem ser privatizados.
Cooperação da sociedade
Além disso, existe a ideia de que a troca voluntária entre os indivíduos (como uma
troca de serviços, por exemplo) seja um dos pilares da sustentação das
sociedades.
Libertárianismo Anarquismo
A prestação de serviços básicos deve vir da O Estado é responsável por garantir educação, saúde,
iniciativa privada. trabalho e segurança.
Defende a troca, força de trabalho por salário. É contra a relação troca de trabalho por salário.
Princípios do libertárianismo
O libertárianismo remonta ao jusnaturalismo, isto é, uma teoria que
afirma que existe um conjunto de direitos naturais com os quais o
homem já nasce, a saber, o direito à vida e à sua manutenção. Ao direito
à vida, o libertarianismo acrescenta o direito à propriedade
privada como sendo um direito natural no qual todos os direitos
individuais estariam contidos e pagos.
Sendo assim, o ser humano tem o direito ao seu próprio
corpo (autopropriedade) e ao recurso sem proprietário anterior em que
produzisse alguma forma de trabalho (apropriação original), o qual
poderia ser trocado voluntária ou comercialmente, bem como doado ou
destinado como herança, em um sistema de títulos construído a partir de
uma sociedade de livre mercado.
A apropriação original se daria por meio do trabalho, ou seja, não
bastaria cercar uma terra, mas trabalhar nela antes de qualquer outra
pessoa para considerá-la uma propriedade sua. As trocas de propriedade
também só seriam consideradas legítimas se feitas voluntariamente, sem
nenhum tipo de coerção.
A base ética do libertárianismo é o princípio da não agressão à vida e à
propriedade de outrem. O Estado que interfere é considerado ilegítimo
em virtude de seu caráter coercivo e soberano que se impõe a todos sob
a forma de leis, impostos e monopólio do uso da violência, sem que os
indivíduos possam separar-se (secessão) ou se negar a cumprir suas
determinações sem sofrer sanções.
Os impostos, bem como toda e qualquer intervenção estatal,
são considerados uma agressão, logo, o Estado em si mesmo
representaria uma violação ao princípio da não agressão, e a livre
iniciativa seria a única possibilidade de plena aplicação desse princípio.
Conforme os libertários, esse tipo de serviços ofertados pelo Estado, tais
como defesa, segurança e justiça, não têm um caráter essencialmente
público, por isso com o tempo vão sendo ofertados também pela
iniciativa privada.
O caminho para uma sociedade livre seria o capitalismo de livre
mercado, no qual as trocas comerciais seriam voluntárias e pacíficas,
em contraste com o capitalismo de Estado, em que há monopólios,
privilégios, cartelização, compadrio, entre outros desvios, que, para os
anarcocapitalistas, são inerentes e restritos a intervenções estatais, ou
seja, não ocorreriam se houvesse somente a livre iniciativa, cuja dinâmica
de oferta e demanda propiciaria uma concorrência equilibrada,
diversificação produtiva, preços e qualidade acessíveis sem a necessidade
de regulação ou ações direcionadas por um comando central.
A ideologia anarcocapitalista é individualista. Admite trocas e
associações voluntárias entre as pessoas, mas parte da premissa da ação
individual e autointeressada. Portanto, em uma sociedade
anarcocapitalista, as trocas econômicas seriam marcadas pela
individualização, privatização e descentralização.
Entre os lemas mais conhecidos, está a ideia de que imposto é roubo e a
defesa da livre circulação de qualquer tipo de moedas, como ouro e prata,
e as criptografadas.
Características do
Anarcocapitalismo é de direita?
Na segunda metade do século XX, a Escola Austríaca de Economia
reformulou, sob o protagonismo do economista Ludwig von
Mises, o liberalismo econômico, conformando seus pressupostos à
conjuntura de um capitalismo globalizado e complexificado.
Discípulo de Mises, Rothbard teorizou o anarcocapitalismo, combinando
ideias liberais, ideias jusnaturalistas (considerando o direito à vida, à
propriedade, à não agressão e à soberania do indivíduo como direitos
naturais) e a ideia de extinção do Estado a partir de teóricos anarquistas
individualistas. Essa mistura pode gerar a dúvida: afinal, o
anarcocapitalismo é de qual espectro ideológico se junta elementos de
ideologias diversas?
A resposta é que a base predominante do anarcocapitalismo é o
liberalismo; trata-se, portanto, de uma ideologia de direita. Ele vai
além da ideia de Estado mínimo do neoliberalismo, propondo a
dissolução do Estado e a privatização de todos os serviços, logo está
localizado mais à direita de outras correntes liberais, ocupando
uma posição radical dentro desse arco ideológico.
Anarcocapitalismo utilitarista
O maior representante do anarcocapitalismo de vertente utilitarista é o
economista David Friedman, da Escola de Chicago. Diferentemente de
Rothbard, que ancora sua idealização de uma sociedade anarcocapitalista
no Direito Natural (jusnaturalismo), Friedman ancora sua idealização de
uma sociedade anarcocapitalista no utilitarismo, isto é, nas vantagens
econômicas, em uma perspectiva racional de maximizar os benefícios e
diminuir os custos, portanto norteada pela eficiência econômica, e não
por direitos individuais.
O David
Friedman é o nome mais conhecido da vertente utilitarista do
anarcocapitalismo. [1]
A crítica de Friedman ao Estado assenta-se na justificativa da ineficiência,
e não na moralidade ou imoralidade das intervenções estatais. Para
Friedman, conflitos deveriam ser resolvidos por meio da arbitragem, isto
é, por agências de leis privadas, fora de um Poder Judiciário. Tribunais
privados concorreriam entre si e apresentariam diferentes legislações,
assim, as empresas de segurança contratariam os tribunais conforme a
legislação preferida pelos seus clientes.
Acesse também: Contratualismo – teoria pautada no contrato social
Anarcocapitalismo e libertarianismo
Rothbard, pai do anarcocapitalismo, era considerado um
libertário, embora de formação liberal e influenciado pelo liberalismo de
von Mises, sob as premissas do laissez-faire, isto é, o Estado provendo
somente uma gama restrita de serviços, como defesa e proteção.
A partir de certo ponto, Rothbard concluiu que mesmo esses serviços
poderiam ser ofertados pela iniciativa privada, logo não haveria
necessidade de manter o aparato estatal sob nenhuma justificativa. Essa é
a diferença básica entre liberalismo e libertarianismo.
No liberalismo, ainda que o Estado seja reduzido, permanece com o
monopólio do uso da força. O libertarianismo rejeita esse monopólio e
prega que toda e qualquer atividade seja realizada no âmbito do livre
mercado|1|.
Dentro do anarcocapitalismo, existem diversas correntes de
libertarianismo. Algumas compatíveis entre si, outras não.
A corrente utilitarista e a corrente jusnaturalista, por exemplo, são
divergentes. A primeira não parte de uma ética comum, mas da ideia de
custo-benefício de múltiplas legislações, e a segunda é guiada por um
princípio (não agressão) considerado universal e que não poderia ser
quebrado, ainda que isso fosse considerado útil por um grande número
de pessoas.
Há também os libertarianistas brutalistas, os gradualistas e
os agoristas. Os primeiros pregam uma extinção imediata do Estado; os
segundos, uma extinção gradual, valendo-se, inclusive, de votar em
eleições, apoiar privatizações e de ocupar posições para modificá-lo por
dentro; e os últimos são os que, em alguma medida, boicotam as leis e
impostos, sonegando, participando de transações paralelas etc.
Anarcocapitalismo e anarquismo
O anarcocapitalismo não guarda relação com o anarquismo histórico,
porém seu principal teórico, Rothbard, foi influenciado por alguns
anarquistas estadunidenses do século XIX de vertente individualista, tais
como Benjamin Tucker e Lysander Spooner. Embora possuam em sua
nomenclatura o radical comum, anarcocapitalismo e anarquismo contêm
ideais não só distintos, mas também opostos.
No anarquismo, a liberdade de iniciativa e de associação é permeada
pelo desenvolvimento do indivíduo – em múltiplos aspectos – por meio
da experiência coletiva em agrupamentos voluntários. Não se trata de
uniformidade, mas de uma harmonia na equalização entre direitos iguais
e liberdade individual.
Em uma sociedade anarquista, a abolição do Estado seria substituída por
livre acordo entre iguais por intermédio de associações e federações,
sem que houvesse governantes e governados, patrões e empregados ou
qualquer outro tipo de autoridade legitimada por alguma forma de
coerção.
Além disso, o anarquismo é anticapitalista e é uma ideologia de
esquerda. O anarcocapitalismo, por sua vez, é uma ideologia de direita,
pautada pelo individualismo e pelo livre mercado, identificando nesses
dois pilares a expansão máxima da liberdade. Portanto, o único ponto
convergente entre essas duas ideologias é o antiestatismo. Para saber
mais sobre a teoria política que visava ao fim do Estado e do capitalismo,
leia nosso texto: anarquismo.
O anarcocapitalismo funciona?
O anarcocapitalismo é uma teorização filosófica, política e econômica, a
construção de um modelo, um tipo idealizado de sociedade de matiz
ultraliberal. Não há experiências práticas de anarcocapitalismo.
Embora alguns de seus adeptos evoquem exemplos de sociedades
antigas em que não havia Estado, uma sociedade orientada por esse
ideário não existe e nunca existiu.
Trata-se de uma utopia política que só pode ser avaliada como se
existisse no campo da imaginação. Se imaginássemos como seria uma
sociedade anarcocapitalista, não demoraríamos muito para
encontrar dificuldades metodológicas:
Seria possível manter a coesão social em uma sociedade que não
tivesse uma lei comum?
Como as demandas seriam resolvidas em tribunais privados com
legislações distintas se cada parte tivesse diferente orientação
ideológica e diferente condição financeira?
Em situações de crise, tais como guerras e epidemias, o livre
mercado teria condições de suprir as necessidades que se
apresentassem?
Se é o Estado a instituição que garante a posse de propriedade e as
liberdades individuais, quem garantiria legalmente a posse de
propriedade e as liberdades?
O funcionamento da lei de oferta e demanda impediria a formação
de oligopólios?
Quem tivesse menores rendimentos em uma sociedade
anarcocapitalista ficaria impedido de desfrutar de bens e serviços?
Em um contexto de segurança privada, como se asseguraria que o
princípio da não agressão seria respeitado em todas as
circunstâncias?
A associação entre pessoas para pagamento de um serviço comum
(tratamento de praças, limpeza de ruas, etc.) se daria de forma
totalmente voluntária ou impositiva à semelhança dos impostos?
Na prática, seria muito difícil que uma sociedade totalmente
desregulamentada e descentralizada tivesse condições de equalizar os
inúmeros conflitos entre seus membros, o que se tornaria ainda mais
inviável sem uma legislação comum e uma mediação comum em
questões de justiça e segurança, por exemplo.
Além disso, os desníveis de capacidade aquisitiva excluiriam um grupo de
pessoas do acesso aos serviços privados, e o objetivo primordial do
lucro poderia entrar em conflito com a finalidade de alguns serviços
essenciais – justiça e saúde –, por exemplo, e com circunstâncias de
calamidade, como pandemias e catástrofes naturais.
O anarcocapitalismo é uma doutrina política e econômica que prevê a
adoção da ética libertária, as teorias de livre mercado e a ausência
completa da centralização administrativa do Estado e da cobrança de
impostos.
Anarcocapitalismo e anarquismo
Anarcocapitalismo utilitarista
O anarcocapitalismo funciona?
Você provavelmente já ouviu falar sobre anarquismo, e, caso não tenho ouvido,
temos um texto pra te explicar esse conceito. A ideologia anarquista contém
algumas vertentes (como o anarquismo individualista, anarquismo coletivista),
e o anarcocapitalismo é uma delas. Não conhece? Calma que neste texto a gente
te explica.
Gradualistas e Brutalistas
Os anarcocapitalistas se dividem em “gradualistas” e “brutalistas”.
Gradualistas defendem maior número de privatizações e redução de impostos a
partir da participação na democracia, com o intuito de diminuir o Estado
gradativamente. Como representação desse grupo no Brasil, existe o Partido
Libertários (LIBER).
Já o lado brutalista, defende que não é possível realizar a eliminação do Estado
de forma gradual, mas de uma única vez, pois esse pode aumentar seus poderes
de outras formas e não ser eliminado, esse conceito é baseado nas ideias de
Hans-Herman Hoppe (1949-), filósofo e economista brutalista.
A Demarquia
O anarcocapitalismo deseja a eliminação da classe política, assim, defendem a
escolha de representes do povo por acaso, através de um sorteio denominado
Demarquia. Os representantes selecionados formariam a Assembleia Legislativa e
teriam papel representativo e participativo. Essa assembleia é responsável pela
contratação das empresas privadas que cuidariam dos sistemas de saúde,
educação etc.
Os benefícios da Demarquia são:
nenhum partido político;
candidatura de pessoas comuns;
rotatividade – os representantes passariam um curto período no poder e depois
voltariam a suas vidas privadas;
redução de custo com aparelho político, além da eliminação de qualquer gasto
com campanhas eleitorais.
Implementação
Não pode ser implementado através da força, pois tem como princípio a não-
agressão. Por isso, para ser legitimado em uma sociedade, só pode acontecer por
ação voluntária dos cidadãos, através da autolibertação do indivíduo e de seus
deveres impostos pelo Estado.
Liberdade individual
A liberdade individual é altamente respeitada. Na ideologia anarcocapitalista, são
válidas apenas leis que estejam em harmonia com a natureza humana, assim, não
é necessário que exista legislações estatais para reforçá-las. A existência de todas
as outras leis que não fazem parte da natureza humana, são tidas como forma de
coerção realizada pelo Estado.
Neste sistema, é defendido uma cooperação de forma horizontal entre os
indivíduos, e não uma coordenação hierárquica de atividades, como existe no
governo atual. Todas as regras sociais não devem infringir o direito da propriedade
pessoal, assim o “direito da maioria” para governar um indivíduo é tido como
ilegítimo. Além disso, com base no princípio de não coerção, defendem a livre
posse de armas.
Argumentos favoráveis
De acordo com o defensor do anarcocapitalismo, Murray Rothbard, esse sistema
proporciona maior desenvolvimento econômico para o país, pois não é
possível que a economia prospere sobre restrições tributárias. Ao privatizar a
administração pública, não haveria impostos e devido a isso, a renda da
população pobre aumentaria e o custo de vida se tornaria mais barato.
Rothbard ainda argumenta que os serviços como educação e saúde seriam de
maior qualidade, devido a competitividade entre as empresas privadas. E sem
governo, o indivíduo seria livre de violações, pois não tem que responder com
suas obrigações impostas pelo Estado, como o alistamento obrigatório, por
exemplo.
Argumentos contrários
Thomas Meyer, cientista político alemão, argumenta que o anarcocapitalismo não
abole o Estado, mas apenas privatiza suas funções. Assim, o indivíduo teria a
falsa sensação de liberdade, porém o contexto de dominação continuaria, só que
através de empresas privadas.
Segundo Harry Binswanger, filósofo americano, o capitalismo requer Estado, o
passo certo é um sistema que limite o governo para que ele seja restringido por
uma Constituição e não completamente abolido, como deseja o
anarcocapitalismo. Outra preocupação apontada é de que o capitalismo mantém
uma estrutura de classes, empresas operando fora do Estado ficam livres para
alterar as condições do trabalhador, o que poder resultar em uma forma de
opressão.
1. Externalidades
Uma externalidade existe quando uma terceira parte é afetada durante uma
troca entre dois agentes. Por exemplo, uma empresa produz um produto
qualquer que despeja como subproduto resíduos tóxicos em um rio,
contaminando a água. Os compradores desse produto que moram longe do
rio são apenas beneficiados com esse arranjo, ao passo que as pessoas que
residem ao longo do rio são prejudicadas com tal sistema produtivo, já que
não podem mais utilizar o rio para qualquer atividade produtiva, como a
pesca, pois os peixes morrem todos.
Murray Rothbard, ciente desse tipo de problema, criou uma regra de ordem
prática para resolvê-lo: aquele que se estabelecer primeiro no local tem o
direito à produção da externalidade ou à compensação pela externalidade.
Se a empresa se estabeleceu antes na margem do rio, ela tem o direito de
produzir a poluição que for, já se se estabeleceu depois, ela tem o dever de
pagar pelo prejuízo causado aos ribeirinhos, ou, em última instância, ser
fechada.
Ocorre que essa é uma solução de ordem jurídica que não necessariamente
produz o melhor arranjo econômico. A solução que produz o melhor
resultado no bem-estar social é aquela que iguala os custos marginais
sociais aos custos marginais privados. O arranjo encontrado por Rothbard é,
portanto, ineficiente do ponto de vista econômico.
Pode-se argumentar que pode-se chegar no arranjo eficiente através apenas
de trocas no mercado. Esse é o famoso Teorema de Coase. Ocorre que a
condição que o teorema estabelece para se chegar num arranjo privado
eficiente é a ausência de custos de transação, e isso pode nem sempre
ocorrer na prática. Por isso que o Teorema de Coase se aplica a um conjunto
restrito de situações, como o caso de um fazendeiro vizinho de um apicultor.
Em todas as demais situações, uma terceira parte deve estabelecer regras
que forcem os custos privados a igualarem-se aos custos sociais. Essa
terceira parte se chama Estado e a principal forma utilizada para se chegar
no arranjo economicamente eficiente se chama imposto sobre a produção
marginal.
Enquanto o custo marginal social (MSC) diferir do custo marginal privado (MPC), há perda
de bem-estar social.
oo
O exemplo utilizado é um caso de externalidade negativa, mas existem
também casos de externalidades positivas. Neste caso, os benefícios
marginais sociais diferem dos benefícios marginais privados, e o governo
pode melhorar a situação através de subsídios ou provimento direto do bem
ou serviço. Nosso site já fez um texto muito esclarecedor sobre a existência
de externalidade positiva no campo da pesquisa em ciência e como essa
situação pode ser analisada graficamente.
2. Problemas de coordenação
Problemas de coordenação são casos em que todos concordam que uma
determinada ação seria a melhor, mas o livre mercado não pode coordená-
los para tomar essa ação.
Para deixar claro o que quero dizer, segue abaixo um trecho traduzido e
levemente adaptado da FAQ Não-Libertária feita por Scott Alexander:
Como um experimento mental, considere a atividade de piscicultura (criação
de peixes) em um lago. Imagine um lago com mil piscicultores. Cada
piscicultor aufere um lucro de R$ 1000/mês. Até aqui tudo bem. Ocorre que
cada fazenda de peixes produz resíduos que poluem a água no lago.
Digamos que cada piscicultor produz poluição suficiente para reduzir a
produtividade no lago em R$ 1/mês.
Mil piscicultores produzem resíduos suficientes para reduzir a produtividade
em R$ 1000/mês, o que significa que nenhum dos piscicultores está
ganhando dinheiro. Então alguém inventa um complexo sistema de filtragem
que remove resíduos, que custa R$ 300/mês para operar. Todos os
piscicultores a instalam voluntariamente, a poluição acaba, e eles agora
estão lucrando R$ 700/mês.
Mas um piscicultor (vamos chamá-lo de Pedro) se cansa de gastar o dinheiro
para operar seu filtro e decide não pagar pelo filtro. Agora a produtividade do
lago está reduzida em R$ 1 para cada piscicultor. Pedro ganha R$ 999 de
lucro e todo mundo ganha R$ 699 de lucro.
Todo mundo vê que Pedro é muito mais lucrativo do que os demais, porque
ele não está gastando com os custos de manutenção do filtro. Eles resolvem
também desconectar seus filtros. Uma vez que quatrocentas pessoas
desconectam seus filtros, Pedro está ganhando US R$ 600/mês — menos do
que seria se ele e todos os outros tivessem mantido seus filtros! E os pobres
usuários de filtros virtuosos estão ganhando apenas R$ 300. Pedro então
tem uma ideia, reúne todos e diz: “Espere! Todos nós precisamos fazer um
pacto voluntário para usar filtros! Caso contrário, a produtividade de todos
diminui.”
Todos concordam com ele, e todos assinam o Pacto dos Filtros, exceto uma
pessoa. Vamos chamá-lo de João. Agora todos estão usando filtros
novamente, exceto João. João ganha R$ 999/mês e todo mundo ganha R$
699/mês. Lentamente, as pessoas começam a pensar que elas também
deveriam estar ganhando muito mais dinheiro, como João, e desconectam
seu filtro por um lucro extra de R$ 300.
A moral da história é que uma pessoa auto-interessada nunca teria qualquer
incentivo para usar o filtro. Uma pessoa auto-interessada tem algum
incentivo para assinar um pacto para fazer com que todos usem o filtro, mas
em muitos casos tem um incentivo mais forte para esperar que todos os
outros assinem tal pacto, exceto ela própria. Isso pode levar a um equilíbrio
indesejável no qual ninguém assinará tal pacto.
A solução mais razoável para esse problema é que um agente ascenda e
imponha como obrigatório o uso do filtro para todo mundo. Esta solução
regulatória leva a uma maior produtividade total para as mil pisciculturas do
que um mercado livre.
A solução libertária clássica para esse problema é tentar encontrar uma
maneira de privatizar o recurso compartilhado (neste caso, o lago). Foi
intencionalmente escolhido a piscicultura para este exemplo porque a
privatização não funciona. Mesmo depois de todo o lago ter sido dividido em
parcelas e vendido a proprietários privados (proprietários de água?), o
problema permanece, pois os resíduos se espalharão de uma parcela para
outra, independentemente dos limites de propriedade.
Retorno aqui de novo. Pois bem, onde ocorre problemas de coordenação no
mundo real? As mudanças climáticas são um exemplo. É de interesse de
cada nação que todas as demais assinem um pacto restringindo a emissão
de gases do efeito estufa, exceto ela própria. Assim, ela obterá o benefício
com poucas mudanças climáticas ao mesmo tempo que obterá o benefício
de poder poluir sem restrição alguma. É por isso que os acordos climáticos
fazem pouco pela desaceleração das mudanças climáticas. Há claramente
um problema de coordenação.
Outra área em que há problemas de coordenação são os bens públicos.
Estes merecem um tópico especial.
3. Monopólios Naturais
Um mercado é eficiente no sentido de Pareto se seu preço se igualar ao seu
custo marginal. Monopólios naturais são mercados em que o escopo de
produção não permite com que o custo marginal se iguale ao preço, pois,
nesse ponto, o preço estaria abaixo da curva de custo médio, gerando
prejuízo para a empresa. Geralmente indústrias desse tipo são aquelas em
que os custos fixos são muito altos e os custos marginais são muito baixos.
Como exemplo, podemos citar a distribuição de energia elétrica, o
fornecimento de água, a distribuição de gás natural, sistemas de segurança
pública, serviços de transporte público e o sistema jurídico.
Nos monopólios naturais, o ponto em que a curva de demanda (D) encontra a curva de
custo marginal (MC) fica abaixo da curva de custo médio (ATC), de modo que se a
empresa igualar o preço ao custo marginal, ela terá prejuízos.
5. Informações Assimétricas
Muitas teorias econômicas começam com a suposição de que todos têm
informações perfeitas sobre tudo. Por exemplo, se os produtos de uma
empresa não são seguros, essas teorias econômicas presumem que os
consumidores sabem que o produto não é seguro e, portanto, comprarão
menos dele. Nenhum economista acredita literalmente que os consumidores
têm informações perfeitas — informação perfeita é apenas uma ferramenta
simplificadora utilizada em modelos econômicos. De fato, Stiglitz e
Grossman provaram que, dados certos pressupostos, mercados com
informação perfeita são impossíveis.
No pensamento não-libertário, as pessoas se preocupam tanto com coisas
como segurança e eficácia do produto, ou a ética de como um produto é
produzido, que o governo precisa garantir que o produto é seguro, eficaz e
foi produzido de forma ética. No pensamento libertário, se as pessoas
realmente se preocupam com a segurança, a eficácia e a ética na produção
do bom, o mercado as garantirá, e se elas não se importam, tudo bem
também.
Mas o que há de errado com a posição libertária? Ocorre que uma das
escolhas irracionais mais consistentes que as pessoas fazem é comprar
produtos sem gastar tanto esforço para coletar informações quanto o tanto
que elas se importam com essas coisas sugeriria. Então, de fato, os não-
libertários têm razão: se não houvesse regulamentação governamental, as
pessoas que se importam com coisas como segurança e eficácia ficariam
constantemente presas a produtos inseguros e ineficazes, e o mercado não
corrigiria essas falhas.
Como exemplo de irracionalidade generalizada, podemos citar o caso da
fosfoetanolamina. Em 2016, o Congresso liberou o tratamento de câncer com
essa substância, sob pressão popular, mesmo com absolutamente nenhuma
evidência apontando a segurança e a eficácia dessa substância no combate
ao câncer. Tudo isso porque um charlatão fez propaganda enganosa. As
vítimas de câncer, entendivelmente, se agarraram a essa esperança. O que
não é entendível é o Congresso passar por cima da Anvisa, dos especialistas
no assunto, e liberar o uso do produto sem nenhuma garantia de segurança
por parte dos técnicos.
E isso ocorre apesar do governo regular a segurança, a eficácia e a ética na
produção do bem. Imagine se não regulasse? Imagine o tanto de bens
produzidos de forma anti-ética não estariam livremente sendo vendidos no
mercado? Imagine o tempo que não iria demorar para as pessoas
perceberem que um produto é ineficaz, tempo este mais do que suficiente
para os acionistas da empresa que o produz lucrarem bastante? Imagine o
tanto de charlatões vendendo produtos milagrosos não estariam lucrando
em cima da esperança das pessoas?
Uma área específica em que a assimetria de informações se faz presente é
no setor bancário. Sem regulação governamental, as pessoas não saberiam
se o banco iria manter seguro o seu dinheiro, permitindo que elas
demandem sua devolução a hora que quiserem. Os bancos têm um incentivo
perverso para emprestar o dinheiro depositado mais do que a prudência
permitiria, pois apenas eles têm a informação do quanto de dinheiro tem
depositado em seus cofres. Os bancos sofrem daquilo que se chama
de moral hazard. O governo pode, então, melhorar a situação, estabelecendo
uma cota mínima de dinheiro a ser mantida no cofre dos bancos, uma
reserva compulsória.
Em que áreas a existência de informações assimétricas justifica a
intervenção do governo?
Ela justifica as regulamentações de segurança dos produtos, como as
regulamentações dos alimentos e dos remédios.
Justifica o estabelecimento de regras no mercado bancário, como a
exigência de reservas compulsórias.
Conclusões
Esses são os pontos principais que justificam a existência do Estado do
ponto de vista econômico, que creio serem mais do que necessários para
convencer qualquer um da necessidade da existência do mesmo. Cabe
ressaltar, ainda, que o Estado pode ser justificado em outras bases que não
a econômica, como a base ética: pode ser que seja ético a redistribuição de
renda feita pelo Estado; ou pode ser ético o fornecimento de rua para todos,
permitindo a livre circulação de pessoas.
É logicamente possível não haver qualquer tipo de crime? Claro que sim. Todas as
pessoas poderiam voluntariamente escolher respeitar os direitos das outras. Assim,
não haveria crime algum. É fácil imaginar. Porém, dada a nossa experiência com a
natureza humana e suas interações, é seguro dizer que sempre haverá crimes.
Contudo, mesmo em face da inevitabilidade de sua recorrência, ainda consideramos
que o crime é algo maligno e injustificável. Portanto, à minha afirmação de que o
crime é imoral seria estupidez e hipocrisia redarguir dizendo que "trata-se de uma
visão impraticável" ou "mas isso não funcionaria," "uma vez que crimes sempre
existirão". O fato de que sempre existirão crimes — que nem todos irão
voluntariamente respeitar os direitos alheios — não significa que é algo impraticável
se opor a eles; também não significa que o crime é justificável. Não há qualquer
"falha" na proposição de que o crime é errado e imoral.
Assim como existem criminosos e socialistas entre nós, não é surpresa alguma que
exista um grau de propensão à criminalidade na maioria das pessoas. Afinal, o
estado depende do consentimento tácito das massas, que erroneamente aceitaram a
noção de que o estado é legítimo. Mas isso não significa que todos os
empreendimentos criminosos tolerados pelas massas sejam justificáveis.
Aliás, o que mais surpreende é que muitos daqueles que alegam ser a favor da
liberdade não aceitam a inevitável conclusão de suas próprias premissas: que o
governo é ineficiente e opera através de meios agressivos. Se essas pessoas — os
minarquistas em geral — alegam que o estado não deveria gerenciar a educação
porque os resultados são monstruosos, então por que elas não aplicam o mesmo
raciocínio para as outras funções que o estado cumpre, tais como a segurança, a
defesa, a justiça e os tribunais? Elas se opõem à educação estatal, ao entretenimento
estatal e a todas as outras atividades estatais, porém quando se trata da polícia, da
justiça e das leis, muitas delas — muitas mesmo — dão seu consentimento e seu
total apoio!
Notas